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sexta-feira, 16 de março de 2018

Guiné 61/74 - P18426: Fauna & flora (14): quando os animais emigram para o vizinho Senegal... (Cherno Baldé)


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > A caminho de Djufunco > 9 de maio de 2013 >  O deserto do Cacheu

Foto (e legenda): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Cherno Baldé, Bissau
1. Comentários de Cherno Baldé, nosso colaborador permanente,  ao poste P18410 (*):

Caros amigos,

É muito triste, mas é verdade, torna-se cada vez mais difícil encontrar animais selvagens, de um modo geral e em particular macacos, no território da Guiné-Bissau. O caso dos babuínos deve ser mais evidente mas não é único.

Para além das razões apontadas por Luís Graça no seu comentário ao poste anterior, com os quais concordo plenamente, deve-se ter em conta, também, a emigração dos mesmos para os territórios vizinhos, nomeadamente para o vizinho Senegal (Casamança, Parque Niokolo-Koba e outros) onde foram criadas condições favoráveis para a vida dos animais selvagens, com infraestruturas de retenção de águas da chuva bem como poços equipados com painéis e outros equipamentos (sistemas solares) de água,  disseminados em vários pontos do território inclusive na savana. 

A propósito deve-se dizer que o Senegal é um pais com uma visão económica e política virada para o futuro e que trabalha com uma estratégia de longo prazo desde os anos 70/80. Mas, ao mesmo tempo e paradoxalmente, são algumas dessas realizações (construção de barragens e pontos de retenção das águas fluviais e das bolanhas) aliadas à incúria e à ausência de Estado digno desse nome no país que se chama República da Guiné-Bissau,  é que estão a contribuir para aniquilar a vida selvagem (fauna e flora) das terras baixas mais ao sul das suas fronteiras e os efeitos são por demais evidentes e cada vez suas consequências serão mais alarmantes.

2. No passado mês de Fevereiro, o antigo Presidente do Senegal [Abdoulaye Wade,]  publicou uma carta aberta sobre a questão da construção de uma barreira de proteção  na zona marítima da cidade de St. Louis, antiga capital do Senegal, ameaçada de destruição pelas vagas marítimas que já consumiram parte importante da velha cidade. A publicação da carta tinha sido feita na sequência da visita do presidente francês, Emanuel Macron,  que prometeu o financiamento do empreendimento com largos milhões de euros a fim de recuperar e proteger a antiga capital.

A carta foi publicada no site senegalês www.seneweb.com, tendo sido alvo de muitos comentários a nível do Senegal. Na altura e aproveitando a deixa, inseri um comentário mostrando a incoerência das autoridades do Senegal relativamente aos argumentos postos em relevo para mostrar as sua preocupações ecológicas e dos cuidados a ter em relação à natureza a nível planetário quando na verdade nem se preocupavam com os vizinhos mais próximos, como é o caso da Guiné-Bissau, cujas regiões do Norte e do Leste sofrem as consequências de ações humanas realizadas no outro lado da fronteira, cujo conteúdo vou copiar em baixo seguido da sua tradução em português.

Comentário inserido no site www.seneweb.com, a propósito de uma carta aberta de Abdoulaye Wade, antigo Presidente do Senegal, sobre os problemas ecológicos na nossa sub-região e no mundo:

"Le sage conseil de M. Abdoulaye Wade, ancien Président du Sénégal, semble refléter une préoccupation écologique d'une grande dimension humaine et universelle, mais il oublie que des importants barrages de rétention d'eau ont été construites le long de la frontière sud du Sénégal, en Casamance, qui ont déjà des effets qui se font sentir durement sur le territoire de la Guinée-Bissau, avec la mort des rivières et bas-fonds, causant de grands dommages à la nature, la faune et la flore qui meurent lentement à cause de l'insuffisance de l'eau qui, du territoire sénégalais (Casamance), en route jusqu'à la mer, alimentait en chemin toutes les espèces de vies qui habitaient ces territoires, et qui aujourd'hui sont simplement obligés d'aller tres loin pour trouver les éléments vitaux qui constituent le base de leur survie.

Les effets combines des barrages d’Anambé et de Ndiandouba sont en train de tuer la vie naturelle au-delà de la frontière et je ne crois pas qu’ont été effectué des études scientifique d'impact environnemental sérieux, comme il tente de nous démontrer, et non plus de préoccupation humanitaire légitime par rapport au partage équitable des eaux afin de sauvegarder la vie animale, forestière et humaine de l'autre côté.

Tout ça pour démontrer que le discours de l'ancien président du Sénégal dans sa lettre ouverte ne peut qu'être hypocrite et populiste, imprégné d'un faux humanisme qui n'a en réalité rien. D'ailleurs, je ne crois pas que leurs préoccupations soient partagées avec les autres pays, notamment occidentaux, qui ont déjà fait mille et une constructions le long des côtes de l'Atlantique sans se préoccuper des effets qui pourraient en résulter dans les côtes africaines et autres.


3. Tradução em português:

"Os sábios conselhos do Senhor Abdoulaye Wade, ex-Presidente do Senegal, parecem reflectir uma preocupação ecológica de uma grande dimensão humana e universal, mas o mesmo esquece que foram construídas importantes barragens de retenção de águas ao longo da fronteira sul do Senegal, nomeadamente em Casamança, cujos efeitos já se fazem sentir duramente no território da Guiné-Bissau, com a morte dos rios e correntes de água das bolanhas, causando grandes prejuízos à natureza, à fauna e à flora que estão a morrer lentamente em consequência da insuficiência de água que, do território senegalês (Casamança), corria para o mar, alimentando no caminho todas as espécies de vidas que habitavam naqueles territórios e que hoje, simplesmente, são obrigados a deslocar-se para longe a fim de encontrar os elementos vitais que constituem a base da sua sobrevivência.

As barragens de Anambe e de Ndiandouba estão a matar a vida natural do outro lado da fronteira e não creio que tenham sido efectuados estudos científicos sérios de impacto ambiental, como ele tenta demonstrar, nem da legítima preocupação em relação à repartição equitativa das águas de forma a salvaguardar a vida animal, florestal e humana do outro lado. 

Isto para demonstrar que o discurso de antigo presidente do Senegal na sua carta aberta só pode ser hipócrita e populista, imbuído de um falso humanismo que na realidade não tem nada. Para além de que, não acredito que as suas preocupações sejam partilhadas com os países ocidentais que já fizeram mil e umas construções ao longo das costas do Atlântico sem que tivessem a mínima preocupação com os efeitos que daí poderiam advir."
____________

Nota do editor:

(*) Último poste da série > 13 de março de 2018 > Guiné 61/74 - P18410: Fauna & Flora (13): De Cassumba, na ponta mais a sul de Quitafine, até Bissau, em 300 km, de um lado e do outro da estrada, não encontrei um único macaco-cão... Até há poucos anos atrás, era capaz de encontrar meia dúzia de bandos, alguns com dezenas de indivíduos (Patrício Ribeiro, Bissau)

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P16966: Memória dos lugares (357): Ilha de Orango, uma pérola do arquipélago dos Bijagós, num dos sítios mais ameaçados do mundo, devido às alterações climáticas (Foto e legendas: Patrício Ribeiro, Bissau)


Foto nº 1 >  Rio para Anor... e riquíssima avifauna da ilha


Foto nº 2 > Rio para Anor


Foto nº 3 > Vedação para hipopótamos de água salgada, animais que são sagrados para os bijagós... É uma espécie única no mundo


Foto nº 4 > Transporte de um gerador para o hotel


Foto nº 5 >Bar do hotel 


Foto nº 6 > O "repouso do guerreiro!...

Guiné -Bissau  > Região de Bolama / Bijagós > Ilha de Orango >  Hotel de Orango > 6-7 de outubro de 2008 >Viagem pelos hotéis do mato: o Orango Parque Hotel, em  pleno Parque Nacional de Orango  um  projeto de ecoturismo [Ver aqui a excelente página na Net, do hotel, lamentavelmente "apenas" em espanhol e inglês]

Fotos (e legendas): © Patrício Ribeiro  (2008). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Poucos (ou nenhum de nós) terão ido à(s) ilha(s) de Orango, no tempo da guerra colonial. Nem sequer a Bubaque, mais conhecida do turista... Orango é a ilha mais afastada do continente, e só a viagem é uma aventura...

As praias do arquipélago dos Bijagós eram só para alguns, privilegiados... O Patrício Ribeiro é "o último dos tugas" na Guiné-Bissau, que por razões sentimentais e profissionais lá vive há 3 décadas... Tem a sabedoria dos "africanistas", sabendo conciliar trabalho e lazer ou, como a gente dizia no nosso tempo, "serviço e conhaque"...

Recorde-se que ele é sócio e diretor técnico da Impar Lda, a empresa que tem levado a energia elétrica, produzida por equipamentos fotovoltaicos, aos mais recônditos sítios da Guiné-Bissau... E este é mesmo um sítio recôndito, de difícil acesso, mas deslumbrante. Uma sugestão para  a tal "viagem da minha vida" que alguns de nós gostariam de poder fazer antes de morrer... [Vd. aqui mais fotos de Orango no Google Imagens.]

Estas fotos de Orango resultam dessas andanças do "pai dos tugas" (como ele é carinhosamente conhecido em Bissau)... Andavam por aqui "adormecidas" nas nossas bases de dados.

Lembremos, entretanto, que a Guiné-Bissau está em segundo lugar na lista dos 10 países mais vulneráveis do mundo, devido às mudanças climáticas provocadas pelo aquecimento global do planeta... A seguir ao Bangladesh e antes da Serra Leoa... Seis desses dez países são africanos... A Guiné-Bissau pode mesmo vir a ser riscada do mapa... num futuro não muito distante... (LG)


Mapa da região de Bolama / Bijagós. Cortesia da Wikipédia. Orango é a mais distante das ilhas.


2. Comentário de hoje,  do Patrício Ribeiro,  a estas fotos com mais de oito anos, a pedido do editor [, o nosso camarada encontra-se ainda em Portugal onde veio passar a quadra festival, em Lisboa; está agora na sua terra natal, Águeda, onde foi  fazer "as podas de janeiro",  estando em vésperas de regressar ao trabalho no fim do mês: está  previsto um almoço de despedida, com os amigos "tugas", no restaurante do costume , em Alcântara];


 Já lá vão alguns anos, desde estas fotos agora editadas.

Iniciei os meus passeios pelas diversas ilhas de Orango em 1995, para ajudar na construção do Parque Natural de Orango, PNO.

É um  local de difícil acesso, a 100 km de Bissau. O transporte faz-se durante 7 horas sem paragem, nas canoas nhomincas, pelo mar.

Uma das minhas maiores surpresas  foi como as pessoas falavam português comigo. Por toda a Guiné-Bissau, é o local onde melhor falam português. Talvez seja porque no dia a dia, só falam o Bijagó, utilizando pouco o crioulo. Ou porque na escola de Iticoga, com mais de 200 alunos, os professores pratiquem o ensino em Português.

A tabanca de Eticoga, é a maior dos Bijagós, tem mais de 100 casas, tem aeroporto, (quando o mato está cortado), uma Casa Museu da Rainha Pampa, Centro de Saúde e a sede do PNO.

Nestes meus anos de viagens, muitas vezes com lama até à cintura, já dormi muitos meses nas ilhas de Orango, a maior parte das vezes, na minha tenda junto a uma praia. E algumas vezes no Hotel Parque de Orango, construído por um amigo em 1998. Um local lindo, de sonho.

Claro que também dormi com os hipopótamos por perto, foi necessário fazer fogueiras para os afastar, na tabanca de Anor e no mato da ilha Orangozinho, com os crocodilos em Imbone, etc. etc.

E agora com zero graus, à lareira na minha tabanca [de Águeda], à espera de regressar a estes lugares quentes .