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domingo, 26 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12636: Em busca de... (235): Nelson Silva, natural de Oliveira do Hospital, o qual terá pertencido a uma Companhia de Comandos, e que terá desertado (Rui Poeira)... Resposta do nosso colaborador José Martins

1. Mensagem de nosso leitor Rui Poeira, com data de 23 do corrente:

Caro Senhor,

Somente agora descobri o vosso blog, precisamente por tentar encontrar o rasto de um familiar desaparecido.

Na verdade, tenho um primo, de seu nome Nelson Silva, natural de Oliveira do Hospital, o qual, segundo o pouco que sei, terá pertencido a uma Companhia de Comandos que desertou na Guiné.

Como sou mais novo que ele, somente me recordo de ouvir dizer que o mesmo se tinha tornado mercenário, que tinha casado com uma italiana,  e que residia na Rodésia, mas que certo dia teve que fugir...
Se souber algo deste meu familiar, se o conheceu, ou mesmo alguns pormenores sobre as eventuais motivações da dita deserção,  agradeço, desde já, que me faça chegar alguma ínformação.

Com os melhores cumprimentos, Rui Poeira

2. Pedido de informação, com data de 23 do corrente,  ao nosso colaborador José Martins:

(i) Zé: Tens alguma ideia ? Haverá alguma lista de desertores ?

Já tenho encontrado alguns (desertores e prisioneiros) no Arquivo Amílcar Cabral > vd. Casa Comum, site da Fundação Mário Soares. Estamos autorizados a reproduzir fotos e outros documentos mas em formato reduzido... Os documentos,  transcrevo-os...

Queres responder ao leitor, em nosso nome ? Um abraço. Luis

(ii) Zé: Tu estás em boas condições de fazeres trabalhos nesta área. És um camarada consensual... Sabes que o assunto é fraturante... Vejam-se as polémicas que já deu... no blogue. Mas faltam-nos nomes, números e até histórias, porque não? Se não formos nós, outros fá-lo-ão por nós... E nós temos mais legitimidade para falar dos desertores (não dos refractários)... Os desertores foram nossos camaradas, os outros, os refratários, não...

Um abraço. LG

3. Resposta, com data de 24 do corrente,  do José Martins [, foto atual, à esquerda,] ao nosso leitor Rui Poeira:

Caro Rui Poeira:

Acusamos a recepção do e-mail que enviou a Luís Graça e Camaradas da Guiné e coube-me a mim, na qualidade de colaborador, tentar dar alguma pista sobre o assunto que nos coloca.

Desde o inicio da II Série deste blogue, em junho de 2006, que o tema DESERÇÃO, não sendo tabu, nunca foi levantado para discussão. Entendemos que é um assunto do foro íntimo de cada um e que  foram várias as motivações que originaram tal situação.

Também não conhecemos, ou pelo menos algum de nós partilhou tal informação, da existência de estatísticas sobre refractários ou desertores, termos utilizados para referir quem sai do âmbito da organização [militar], apesar de terem significados diferentes, consoante a altura em que acontece.

A única estatística conhecida, e que por mim foi organizada a partir de diversas fontes, refere-se a quem não se apresentou à inspecção (refractários), que não ultrapassou os 20% dos mancebos recenseados. [Pode ser vista em  http://ultramar.terraweb.biz/CTIG_JoseMartins_Recrutados2Guine.htm]

No caso especifico que nos coloca, apenas o nome e a possibilidade de ter sido tropa Comando são poucos elementos, uma vez que, na Guiné além de 3 Companhias de Comandos Africanos, estiveram 9 companhias formadas na metrópole/continente, além de alguns grupos que, localmente, foram voluntariados.

Para saber mais elementos do seu primo Nelson Silva, poderá pedir informações ao Arquivo Geral do Exército, instalado no Largo de Chelas - 1949-010 Lisboa; E-mail: arqgex@mail.exercito.pt, Telefones 218391600 e 218391619 e Fax 218391611, ou à Associação de Comandos.

Sabendo a unidade a que o seu primo pertenceu, poderá solicitar elementos ao Arquivo Histórico Militar, instalado no Largo dos Caminhos de Ferro, nº2 - 1100-105 Lisboa; E-mail: ahm@mail.exercito.pt, com o telefone 218842563 e Fax:218842514.

Lamentamos não ter meios de poder fornecer as informações que nos solicita, fazemos votos para que consiga obter esses elementos do seu família, apresentamos as nossas saudações.

José Martins
____________

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6787: Estórias cabralianas (62): À Tesão, Pelotão!... Este é o Alfero Souza, meu amigo (Jorge Cabral)


1. Estórias cabralianas (*),
por Jorge Cabral

À TESÃO,  PELOTÃO! 

Com o Pelotão [, o Pel Caç Nat 63,] em Bambadinca, preparando-me para arrancar para o Xime, eis que deparo, com um Gandhi,  de camuflado, que avança para mim com os braços abertos. É o Souza, com "z", meu amigo e camarada de Vendas Novas.

Indiano de Damão, logo em 1961, partira para a Inglaterra, onde se doutorara em Física. Não conhecia Portugal, mas em Fevereiro de 1968 teve que vir ao funeral da Tia. Foi quanto bastou, foi incorporado. Já tinha 34 anos, era casado, Professor Universitário, pai de 3 filhos, quase não falava português. Pois bem, atirador de artilharia, meu companheiro de Pelotão [, em Vendas Novas]. Magríssimo, usava uns oculinhos redondos e nunca se queixava.

Fazia parte da nossa instrução, dar voz de comando, apresentando o Pelotão.  Começava, " Atenção Pelotão…", mas quando calhou ao Souza, ele clamou:
- À Tesão,  Pelotão! -  (Não me lembro se nós respondemos afirmativamente…).

De passagem por Bambadinca em trânsito, para o Leste do Leste, o Souza estava ainda mais magro, conservava os pequeninos óculos e aquele ar de suprema resignação. De partida, sem tempo para conversas, quis que conhecesse os meus Soldados. Reuni o Pelotão e disse:
– À Tesão,  Pelotão! Este é o Alfero Souza, meu Amigo!

Muitos anos passaram. Mas ainda hoje, quase como uma divisa, em momentos de chatice, desânimo ou tristeza… eu penso "À Tesão Pelotão!" …e as coisas melhoram…

Jorge Cabral

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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 21 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6769: Estórias cabralianas (61): Os Poderes do Professor Wanatú... (Jorge Cabral)

sábado, 8 de agosto de 2009

Guiné 63/74 - P4801: (Ex)citações (37): Propaganda (Vítor Junqueira)

1. Caros companheiros

Mais uma vez estou a chamar a vossa atenção para os momentos menos bons do nosso Blogue, criados por alguns, poucos, mas reincidentes, camaradas que fervendo em pouca água, começam a usar de uma agressividade que nada tem a ver com o espírito do Blogue.

Vamos assentar uma coisa. A partir de hoje sempre que um comentário menos feliz despoletar outros mais violentos, eu, pura e simplesmente retiro-o assim como aos sequentes.

Reafirmo que devem resolver os vossos desentendimentos pessoais via mail, onde poderão à vontade usar palavras mais ou menos acintosas sem poluírem o Blogue.

A propósito de mais este desentendimento, recebi hoje uma mensagem do nosso camarada Vítor Junqueira com um comentário que deve ser lido com atenção.


2. Mensagem de Vítor Junqueira (*), ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753 - Os Barões, (Madina Fula, Bironque, Saliquinhedim/K3, Mansabá , 1970/72, de hoje.

Carlos,

Começo a temer que a minha insistência se torne enfadonha. Mas, com sabes, ultimamente foram publicadas matérias que agitaram um pouco as águas. O que é óptimo. Se por um lado, são as que mais aprecio, por outro noto que alguns camaradas se deixam embalar nos comentários, podendo gerar-se alguma crispação. Ora é nessas alturas que me apetece dizer de minha justiça...

Se achares que o texto pode merecer a atenção de alguns dos nossos camaradas, publica p.f.

Com amizade e ao dispor,
VJ


Meus queridos amigos e ex-camaradas, da direita ou da sinistra, refractários, faltosos e desertores, visitantes e seguidores habituais deste Blog;

A todos, o meu abraço fraterno e descomprometido, e o pedido de desculpas por estar a aparecer com demasiada frequência.

Peço-vos uns momentos da vossa atenção para, em conjunto, reflectirmos sobre uma matéria publicada recentemente, que já fez saltar algumas tampas. O que na nossa idade é muito perigoso como já acautelei!

Começo por me corrigir a mim próprio: Quando me dirijo aos meus ex-camaradas, no mínimo estou a cometer uma blasfémia. Porque, no âmbito daquilo que aqui nos traz, ex-camaradas é coisa que não existe! Enquanto durar a nossa viagem à volta do sol, havemos de ser camaradas. O laço pode ser ténue ou forte, mas é indestrutível. Por isso, daqui em diante, aos da família passarei a tratar por camaradas, simplesmente.

Camaradas, poderá haver igual, mas não há ninguém que aprecie mais uma boa peleja do que eu. De qualquer natureza! E quando os contendores se batem por ideias, valores, princípios, honra e dignidade, coisas que para mim, como para vós todos são muito mais do que simples palavras, aí tiro-lhes o meu chapéu. Que fique bem claro que está nos antípodas do meu pensamento, fazer qualquer apelo à calma, armar em medianeiro, interpor-me no seio daqueles que sentem os pêlos do espinhaço arriçados. E se houver de correr sangue, que corra até que os cães o bebam de pé. Mas, por favor, não ofendam a vossa inteligência. Nem a minha. Vamos ao osso! Antes permitam-me que escreva um parágrafo justificativo.

Como já o afirmei nesta sede, fui voluntário para a tropa, fui voluntário para a Guiné, passei lá dois dos melhores anos da minha vida e notem que até então, ela, a vida, não me tinha dado razões de queixa. Participei, compartilhei o fardo convosco. Fi-lo consciente e convictamente, por respeito ao meu julgamento de então. Se a História se repetisse e as circunstâncias fossem as mesmas, hoje voltaria lá, certamente.

E no entanto, quero abraçar:

Os compelidos, faltosos e refractários que, à força ou depois de pensarem melhor, lá acabaram a fazer a queda na máscara ao meu lado.

Aqueles que espalhados pelo Mundo, obtiveram junto dos consulados as suas Licenças Militares definitivas, podendo dar continuidade às respectivas actividades profissionais, e remeter para a Pátria, as paletes de francos, marcos, dólares etc., que tanto jeito nos deram quando a pesada herança bateu no fundo. Os da sinistra, p.f. não levem a mal esta farpa! Abraço também os que por alergia ao teatro de operações, preferiram servir o país de outra forma, como por exemplo, integrarem a frota bacalhoeira (sabiam?);

E quanto aos desertores, porque tiveram a coragem de arriscar a prisão ou uma vida inteira no exílio, obedecendo a respeitáveis e nobres ideais, ou partiram por amor à pele, atitude que não se revestindo de uma nobreza por aí além, é igualmente compreensível, envolvo-os também no meu amplexo, mas sem direito a aplauso.

Por outro lado, não são meus camaradas:

Aqueles que vestindo a nossa farda, eram objectivamente combatentes do IN, a quem forneciam informações e até segredos de que tinham conhecimento por força das funções que desempenhavam;

Os que tendo integrado as FA de Portugal e jurado fidelidade à sua bandeira, saltaram para o outro lado da paliçada, oferecendo-se para colaborar activamente em planos que visavam a liquidação física de ex-companheiros de armas, incluindo os amigos;

Todos quantos encapotadamente, tal qual laboriosas toupeiras, se colocaram ao serviço de ideologias, objectivos e interesses de potências estrangeiras e pela escrita, pela palavra ou pela acção conspiraram, visando o desprestígio e aniquilação do exército fascista, nós! Esses não são meus camaradas.

Mas, notem bem, o facto de não serem meus (nossos) camaradas, não me dá o direito de os julgar sob qualquer prisma e ainda menos de os condenar, cabendo esse desígnio a outras instâncias, entre elas a História, que amparada pelo Tempo há-de apreciar de forma asséptica e distanciada os Homens e os factos do último quartel do séc. XX português.

Se estou certo até aqui, cabe-me deixar algumas perguntas:

Porquê então litigar à volta de acontecimentos sobre os quais, todos o sabemos, haveremos de discordar até ao fim dos nossos dias? De que serve apontar factos do passado ou nomes de pessoas que nunca nos caíram no goto, mas que sabemos serem objecto de grande estima e admiração por parte de importantes franjas da sociedade? Porque não cuidar da forma, para que não pareça cáustica, amarga ou revanchista, como avaliamos comportamentos de tempos idos, sabendo que o que foi já não é e o que ontem era uma virtude, amanhã será uma aberração? Admitamos por absurdo que à luz dos princípios e valores de hoje, uma qualquer entidade intemporal se punha a escrutinar os factos que consideramos mais relevantes da nossa história como nação. Apenas alguns exemplos:

A usurpação de terras à moirama, que para não criar chatices futuras era passada à espada, aquém e além mar, os trabalhos da Santa Inquisição, o holocausto dos Judeus de que os sobrantes tiveram que fugir ou viver escondidos até ao 25 de Abril, a execução (assassinato) dos Távoras a golpes de marreta no peito, com esposas e filhos a assistir enquanto aguardavam o mesmo destino, o genocídio de milhares de negros, índios e indianos, a escravatura mais obscena, negócio que controlámos através de famosos entrepostos ao longo da costa ocidental de África (ex. Senegal), o envio de homens para as trincheiras das Ardenas, pagos por cabeça como carneiros, as campanhas de África cujos protagonistas mais importantes dão o nome a muitas praças, ruas e avenidas cá do burgo, a nossa participação em bandalheiras como as que estão a ocorrer no Iraque e Afeganistão, em que um dos porteiros da guerra – lembram-se da conferência dos vendidos nos Açores? –, foi recompensado com um alto cargo na EU? Bem, com um currículo destes não haverá muitas nações no mundo, e a haver julgamento, hoje, estaríamos feitos!

Quer isto dizer que devamos assumir algum complexo de inferioridade ou culpa? Não, e por muito que estas manchas nos incomodem, a verdade é que factos do passado têm que ser visto à luz de contextos muito diferentes das envolventes sociais, económicas, religiosas etc., dos nossos dias.

Então as rádios Voz da Liberdade e Portugal Livre, mentiam? Claro que mentiam e desbragadamente! E a velha Emissora Nacional de Radiodifusão (buuuun…) se calhar não lhes ficava atrás! O Manuel Alegre desertou? Bem, ninguém o nega. Para uns, ele e muitas figuras gradas da nossa democracia, desertaram. Para outros, foram combater além fronteiras. Há ainda quem considere que todos não passam de um bando de oportunistas ressabiados com o regime. O Manuel Alegre foi para Argel onde seria difícil a polícia ir buscá-lo. Houve quem se fartasse de sofrer em Paris, Londres, Estocolmo … E depois?

O que eu pergunto é o seguinte; alguém quer ser juiz, alguém tem folha de serviço e tomates para os julgar? Eu digo já que não tenho!

Por isso camaradas, aqui vai o pedido de um amigo. Quando o tema for quente como este, não deixemos que ele nos fique atravessado na garganta com receio de melindrar alguém. Dissequemo-lo com o frio escalpelo da ponderação, deixando as acaloradas emoções de reserva para os nossos encontros!

Duas notas finais:

1.ª - Acabo de ouvir na TV que dois líbios detidos no inferno de Guantánamo, virão para Portugal. Se estão inocentes e foram vítimas de arbitrariedades monstruosas, dou-lhes as boas vindas. Se têm culpas no cartório, ou são potencialmente perigosos, têm ou tiveram ligações com redes terroristas, devemos exigir um esclarecimento exaustivo por parte das nossas autoridades.

Também li recentemente na Net que uma comissão do Senado dos States vai exigir a presença de Bush, Rumsfeld, Dick Cheney e mais uma série de personalidades importantes da anterior administração. Como arquitectos das guerras em que o país se envolveu no médio oriente, vão ter de se explicar quanto a um conjunto de atoardas cozinhadas pelas suas agências de informações, como aquela das armas de destruição massiva, que serviram para justificar perante o seu povo e o mundo, a catastrófica decisão de avançar para a guerra. Deverão ser também questionados acerca dos métodos utilizados no interrogatório de prisioneiros aos quais deram cobertura. No reino Unido, uma comissão com idênticos poderes e pelos mesmos motivos, vai chamar o Blair à pedra.

E aí, comecei a pensar: Querem lá ver que um dia o nosso Barrosito ainda vai assentar o cu no mocho?

2.ª - No Post 4785, em que se fala da propaganda by rádio, deixei um daqueles comentários rápidos citando sem citar Boake Carter “Em qualquer guerra, a primeira vítima é sempre a verdade”. Aqui fica o nome do pai da frase, assim como a sua tradução correcta: “Em tempo de guerra a primeira vítima é a verdade

Como sabem, para publicar é preciso ter conta no Google. Por isso usei o meu alias naquele browser que é JUAN de JUnqueira ANastácio, e é o mesmo com que assino um Blog cuja construção iniciei há pouco: http://kurtviagens.blogspot.com/

Quando o Juan voltar a atacar, já sabem que se trata do Vítor Junqueira.

Com muita amizade,
VJ
__________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 6 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4789: (Ex)citações (36): As minhas lágrimas há muito secaram (Vítor Junqueira)

(**) Vd. poste de 5 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4785: Estórias avulsas (47): Rádio “Voz da Liberdade” também mentia! (José Marques Ferreira da CCAÇ 462, Ingoré 1963/65)

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Guiné 63/74 - P4242: Histórias da CCAV 3420, comandada pelo Capitão Salgueiro Maia (2): Curiosidades, humor, histórias do Gasparinho (José Afonso)

1. Continuação do texto anexo à mensagem de José Afonso, ex-Fur Mil da CCAV 3420, comandada pelo Capitão Salgueiro Maia, com data de 22 de Abril de 2009, sobre a sua Companhia e seu Comandante, Capitão Salgueiro Maia.


CURIOSIDADES / CCAV 3420 (Bula, 1971/73)

[Fixação / revisão de texto / subtítulos: L.G.]

Quando a Companhia de Cavalaria embarca em Lisboa, leva já consigo a sua 1.ª receita: um jogo de Matraquilhos que em 6 dias de viagem esteve sempre ao serviço. Trabalhava de dia e noite sem parar. Foi um bom Fundo de Maneio. Quando chegámos a Bula, o mesmo jogo foi posto em frente do alçado da caserna dos soldados da Companhia, continuando ali a dar a receita pretendida.

Talvez vendo a fonte de receita que ali tínhamos, o Comandante do Batalhão pede a Salgueiro Maia que mande retirar dali os respectivos Matraquilhos, pois estavam em local central do Batalhão e não davam muito bom aspecto.

Não se tendo conseguido nessa altura demover a tomada de posição do Comandante do Batalhão, lá tiveram que ir os Matraquilhos para o Esquadrão de Reconhecimento Panhard. Aqui a receita era insignificante já que os homens eram muito menos, e também nem sempre o pessoal da Companhia ou Batalhão se deslocava cerca de 300 metros para jogar matrecos.

Salgueiro Maia tinha de arranjar maneira de os matrecos regressarem à origem. Como o Batalhão tinha falta de padeiros e os dois da Companhia estavam emprestados ao Batalhão, Salgueiro Maia vai dar a volta ao Comandante, dizendo que, com a falta de pessoal que tinha, necessitava dos padeiros da Companhia para alinharem para o mato. Levava já na manga a hipótese de deixar os padeiros onde estavam e, como contrapartida, os Matraquilhos regressarem ao Batalhão e colocados nas traseiras da caserna.

A esta proposta o Comando do Batalhão cedeu e uma vez mais Salgueiro Maia venceu.





Uma heli-evacuação

Quando a 28 de Novembro de 1971, um elemento da Companhia acciona uma mina, ficando sem uma perna e outro elemento também ferido, ambos do 3.º Grupo de Combate,  é solicitada a evacuação por Via Aérea para o Hospital de Bissau.

Ao chegar o helicóptero, sai dele uma enfermeira, que ao ver o soldado Santos sem roupa diz que assim não leva o ferido. Para ser socorrido, utilizaram-se os restos das calças para fazer garrotes à perna e ao braço. E com tiras da roupa seguram-se alguns pensos que tapam feridas menores. O homem estava nu.

Para satisfazer o pedido da enfermeira, foi pedido ao enfermeiro que tinha uma camisola interior vestida para que a tirasse e com ela tapasse o soldado ferido.


As vacas roubadas que andam de mão em mão, acabam sempre comidas em boa ocasião


Em Abril de 1972 aos elementos da Companhia que estavam no período de descanso, Salgueiro Maia pede voluntários para ir ao Km 13 da Estrada Bula – S. Vicente onde o 1.º Pelotão da Companhia estava emboscado e necessitava de apoio devido a um grupo de Balantas, que vinha do Senegal onde tinha ido roubar vacas, ter caído no campo de minas e algumas vacas andarem na estrada. Assim vão elementos da CCAV 3420 até ao local.

São apanhadas 2 vacas que são carregadas numa GMC. Satisfeitos os elementos da Companhia, com Salgueiro Maia à frente entram em Bula, gritando:
- Queremos carne.

À entrada do Batalhão está o Comandante que manda parar a coluna de 4 viaturas. Quando se pensava que ia dar um louvor aos voluntários, houve-se uma reprimenda do Comandante por a tropa vir a fazer muito barulho e, dá ordens para que a coluna entre na sede do Batalhão (a CCAV 3420 era uma Companhia de Cavalaria independente mas de reforço ao Batalhão de Infantaria). Toda a actividade mais perigosa era desempenhada pela 3420.

Contrariando as ordens do Comandante, Salgueiro Maia manda avançar a coluna para o Esquadrão de Reconhecimento Panhard 2641 que ficava aí a 300 metros do Batalhão pois, era ali que as vacas iriam ser comidas. Ao regressar ao Batalhão o Comandante dá ordem a Salgueiro Maia para que entregue as vacas porque diz ele que todo o material capturado ao IN tem de ser entregue ao Batalhão. Salgueiro Maia diz então que as vacas não foram capturadas, mas sim oferecidas e que foi o pessoal da Companhia que as foi buscar estando de descanso e o Batalhão não mandou sair nenhumas forças.

Mais diz Salgueiro Maia:
- As vacas roubadas que andam de mão em mão, acabam sempre comidas em boa ocasião.

O Fur Mil Afonso de calções... à POP

Um dia no Destacamento de Capunga aparece um helicóptero a sobrevoar a Zona e, de seguida, faz-se para pousar no minicampo de futebol. Desconhecia-se quem vinha nele, pois não havíamos sido informados. O furriel Afonso, que na altura estava a comandar o Destacamento, dirigiu-se tal como estava para receber quem nele vinha. Está vestido como normalmente se anda nos destacamentos. De chinelos, sem bivaque, de t-shirt e calções que já tinham sido calças, agora transformados em calções que, com as vezes que tinham ido a lavar e como não tinham baínhas, se encontravam todos desfiados.

Vinha no helicóptero o Coronel, Comandante do COP de Teixeira Pinto e o Comandante da Companhia 3420. Ao ver o Furriel naquela figura, o Coronel pergunta se está apresentável... Antes que o furriel Afonso diga alguma coisa, Salgueiro Maia olha para o Coronel e diz:
- Não vê, meu comandante,. que está com uns calções à POP!

O Velhinho, antigo refractário

Havia na Companhia um soldado que quis fugir à tropa e, então deu o salto para França. Mas, quando o irmão foi nomeado padre e disse a 1.ª Missa, não resistiu e, porque era de Monção, atravessou a fronteira para assistir à missa. Com a informação da Pide, o nosso amigo, foi preso e acabou por ter que fazer a tropa pelo que apareceu na Companhia já com os seus 30 anos. Era por isso conhecido como o Velhinho. Este era um elemento do 3.º Grupo de Combate que nas operações gostava de ir sempre à frente com a HK21 e faca de mato à cintura e dizia para o Capitão:
- Se um dia apanho um turra morto, o capitão vai deixar-me cortar uma orelha para fazer um porta-chaves e os testículos para fazer uma bolsa.

Era homem para isso, só que não estava autorizado a fazê-lo.


Guardando as costas dos senhores da guerra do ar condicionado


Havia determinadas datas em que se fazia a chamada Guerra de Bissau. Datas como Natal e Páscoa, datas do aniversário do PAIGC e datas em que Bissau sofreu alguns ataques.

Assim fazia-se deslocar tropa para os sítios donde o IN alguma vez atacou Bissau ou para zonas de onde era possível atacar. Assim, 2 Pelotões da CCav 3420 por duas vezes foram mandados para Nhamate. Foi o 1.º pelotão por 2 dias duma vez e o 3.º de 19 a 24 de Novembro de 1971.



Fizemos Bula – Binar - Nhamate a pé, para ali passar 5 dias. Em Nhamate, estava a Companhia de Artilharia 3330, não só aqui como nos destacamentos de Manga, Unche e Changue mas era em Nhamate a sua sede de comando.

Achamos estranho quando no primeiro dia, ao pôr-do-sol, toca o clarim para a formatura do arriar da Bandeira. É formada a secção em frente mas o engraçado é que depois da bandeira descida, em vez de o Furriel mandar direita volver, manda meia volta volver. E, nesta posição, de costas para o pau da bandeira, cantava-se:
- E viva a Pátria, viva o nosso General! 

Ao mesmo tempo mandavam como que um coice e gritavam:
- PUM!!!

Histórias do Gasparinho

O Comandante desta Companhia inicialmente foi o célebre Capitão Gaspar, mais conhecido por Gasparinho, que como foi promovido a Major foi para a COP de Mansabá. Na altura que estivemos ali, o Capitão Gaspar, já não estava mas as histórias contadas são hilariante e nem parecem ser reais. Eis algumas delas:

1 - Semanalmente de Nhamate ia uma coluna a Binar buscar os reabastecimentos. Era uma longa picada que deveria ser picada devido à hipótese de haver minas na zona. Isso não se fazia. Ou se montava uma HK21 na primeira viatura e se varria a picada à rajada ou então o Capitão Gasparinho picava-a à rajada de G3, tendo para isso sempre ao lado um homem que assim que acabava um carregador de imediato lhe passava outra G3. Era como ele dizia o reconhecimento pelo fogo.

2 - Em Junho de 1971, Bissau é atacado por foguetões de 122 mm. À Companhia do Capitão Gaspar é dada ordem para ocupar a Ponta Cuboi com um Pelotão, evitando outra possível flagelação de Bissau. Era difícil a esta Companhia dividir-se por 4 locais e a Companhia também não tinha rádios para o pessoal a destacar.

O Capitão Gaspar pedia muitas vezes através de mensagem algum material de que necessitava. Como já era demais conhecido em todas as Repartições de Bissau, quase nunca lhe era dado um sim. Desta vez pediu rádios AVP1. Responderam-lhe que Teixeira Pinto tinha sido o homem que havia pacificado a Guiné e conseguiu fazê-lo sem rádios. Resposta por mensagem:
- Então mandem-me o Teixeira Pinto.

Teixeira Pinto não veio mas o Capitão teve de cumprir a missão. Depois do Pelotão ter saído para Ponta Cuboi, enviou nova mensagem para Bissau:

Em referência às vossas mensagens, informo missão cumprida. Solicito autorização contratar 40 guardas-nocturnos a fim de garantir segurança às minhas posições.

O Pelotão de Ponta Cuboi fazia rotação entre os 4 da Companhia e patrulhava a zona 24 horas por dia. Ao sair para este patrulhamento, o Pelotão saía de modo muito original, com os homens equipados e armados em coluna de dois, cantando em coro, ao ritmo da marcha:

Cá vai a 30
Com arquinhos e balões
Vai P’rá Ponta Cuboi
Ver passar os foguetões!


3 - A Companhia de Nhamate necessitava de uns botes para um dos destacamentos patrulhar um rio. Claro que se pedem uns novos a Bissau pois os que existem metem água. Como sempre, a mensagem chega com um não. Mas, como o Capitão Gasparinho não era de desistir, manda nova mensagem dizendo que estava em época das chuvas, o quartel era subterrâneo, as casernas estão inundadas e o 1.º sargento não sabe nadar. E, assim sendo, que mandassem com urgência pelo menos um bote.

4 - Em Nhamate, como em toda a Guiné de vez enquanto aconteciam pequenos tornados, anunciando que pouco tempo depois iria chover torrencialmente. Uma das vezes voaram as chapas que cobriam algumas casernas do destacamento de Nhamate. Então o Capitão Gasparinho envia uma mensagem a todas as Unidades, com grau de urgência relâmpago, nos seguintes termos:

- Solicito e informem se viram passar as minhas chapas de zinco!

(O grau de urgência relâmpago obrigava a cessarem todas as comunicações rádio, pois era normalmente utilizado para pedir evacuações aéreas, quando havia vidas em perigo)

5 - Durante o período do Natal, o General Spínola visitava todas ou quase todas as tropas aquarteladas na Guiné, mesmo aquelas estacionadas em sítios mais perigosos. Deslocava-se quase sempre de Heli e um Heli-Canhão de apoio. Nestas deslocações toda a zona onde ele circulava e os sectores envolventes tinham instruções para toda a rede de rádios estar em escuta permanente. Como estava prevista a ida a Bula, o Comandante do Batalhão de Bula, ordenou que a Companhia do Capitão Gaspar informasse a sede do Batalhão logo que os hélis sobrevoassem Nhamate e se deslocassem para Bula.

Considerando a importância da missão, o Capitão Gaspar achou conveniente ir pessoalmente para o rádio e, assim, logo que ouviu barulho dos hélis a aproximarem-se chamou o comando do Batalhão de Bula ao rádio e informou:

- Informo Vexa (vossa excelência) que Sexa (sua excelência) passou na mecha !!! Terminado.

No dia seguinte todas as unidades do Teatro de Operações da Guiné receberam a seguinte mensagem:

- A partir desta data é expressamente proibido o uso de abreviaturas SEXA e VEXA.

São muitas e muitas as histórias do Capitão Gaspar ou Gasparinho, não só as passadas na Guiné mas também as de Moçambique. O Furriel de Transmissões desta Companhia deve ter um rol delas para contar pois por ele passavam todas as mensagens ou, pelo menos, tinha acesso a elas como responsável. E foi ele um dos que nos contou algumas quando por apenas 5 dias ali estivemos, não estando já lá o Capitão Gasparinho.

6 - E para terminar este rol de aventuras do Capitão Gasparinho, só mais uma história que, segundo consta, chegaram a vender-se cópias a 20$00 em Bissau. Era uma nota enviada de Nhamate em Março de 1971, ao Comandante de Engenharia de Bissau, com conhecimento do Comando Operacional n.º 3, às Repartições de Operações, População, Assuntos Civis e Acção Psicológica e ao Comandante de Batalhão de que dependia a Companhia.

O assunto da nota era o Quartel de Nhamate ou, mais propriamente “O ABARRACAMENTO.”

1 - Exponho a V. Ex.ª um dos assuntos mais vitais para a continuidade militar e humana de Nhamate.

2 - Passo a descriminar:

a) Depósito de Géneros: quando chover fico sem pão pelo menos 15 dias. Julgo que não é muito agradável.
Informo V. Ex.ª que não como pão.
Gordo, estou eu.
E os outros géneros?
E os autos subsequentes?
Só problemas.

b) Casernas: barracas de lona, todas oficialmente dadas incapazes. Na Birmânia, viveu-se assim um ou dois meses. Os quadros vivem-no há dez anos e os milicianos (os meus, de certeza) dão o litro até ao fim.

Os soldados dão tudo. Há que tudo lhes dar na medida do possível.

c) Cantina: e o tabaco? Desde Napoleão e Fredy da Prússia que o tabaco era uma das bases da eficiência do Exército.

Como combater ou trabalhar sem o velho cigarrinho? E os outros Géneros?
V. Exª. mais experiente meditará sobre o assunto.

d) Caserna de cimento: É único exemplar. Vou demoli-lo. Não tenho materiais. Solicito auxílio da Engenharia.

e) Messe: Desde o início das chuvas não necessita de garrafas de água. Basta as mesmas estarem abertas para que se encham com a água da chuva que cai na referida messe; Ponchos e gabardines: já temos.

f) Chapas de Zinco: ao mínimo vento já voaram no Quartel.

g) Gabinete do Comandante e 1.º Sargento: Com as chuvas, eu e o 1.º Sargento só temos como solução entrar no gabinete de escafandro, visto estar 2 metros abaixo da superfície do solo.

h) O meu pessoal só poderá transitar em canoas balantas. E, alguns não sabem nadar.
Conclusão: Siga a marinha!

3 - Este quartel tem de ser revisto por um oficial de Engenharia, senão começo a construir um novo com os materiais dos Reordenamentos, contra a norma, o que é aborrecido, contende com a disciplina e eu não gosto.

4 - Agradecendo a boa atenção de V. Ex.ª, gostaria de aqui ter como convidado um Sr. Oficial de Engenharia por vários dias, a fim de concordar ou condenar as minhas asserções supras.

Cumprimentos

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Nota de CV:

Vd. postes de:

26 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1213: A CCAV 3420, do Capitão Salgueiro Maia, em socorro a Guidaje (José Afonso)

23 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4240: Histórias da CCAV 3420, comandada pelo Capitão Salgueiro Maia (1): Era uma vez... (José Afonso)

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3605: Blogoterapia (81): Sempre gostei do meu país mas nem de todos os que cá vivem (António Santos)

1. Mensagem do António Santos (*), com data de 30 de Novembro:


Eu sou daqueles que falo pouco, observo e gosto mais de actuar, por vezes nem penso, e já sofri na pele por ser assim, inclusive monetariamente.

Fala-se tanto dos que passaram ao lado da guerra, por isto ou por aquilo, não interessa agora para o caso o porquê, recentemente veio juntar-se aquela frase escrita por um olheiro do nosso blogue - "velhos a lamentarem-se", ou coisa parecida... Não merece importância.

Bem vamos ao assunto que me leva desta vez a falar, escrever, primeiro. Há dias ouvi na Antena 2 uma entrevista com o Artur Agostinho, em que a dado momento disse "que gostava de PORTUGAL e não de muitas pessoas". Ora esta frase despertou em mim certas lembranças que passo descrever: eu também sou como o Sr. Artur, gosto muitíssimo de Portugal e não gosto de muitas pessoas, especialmente se são políticos, dou valor aos amigos do seu amigo, esses sim é que têm valor.

Tenho um tio que esteve na Guiné, em 63/65, na CCAÇ 557, companhia do nosso camarada José Colaço. Depois de regressar, passado algum tempo foi clandestino para França, a salto, como todos os outros, antes do tratado de Maastritch, e ainda la está.

Quando estava a aproximar-se a data de eu ser forçado a dar o nome para a tropa, ele apareceu e quis levar-me com ele. Pois já adivinharam que não conseguiu que eu fosse, primeiro por que gosto muito da minha terra, depois não me estava a ver viver noutro país que não o meu e na altura a Guiné, para onde acabei também por ir parar, diziam ser Portugal. Ele bem que me contou coisas da guerra da Ilha do Como e não sei mais quê, mas... não me demoveu.

Não sou herói, porque não os há, há sim indivíduos mais corajosos que outros, indivíduos que perante certas situações se transcendem e/ou se passam dos carretos, e cometem actos de bravura, mas nem sempre são os medalhados.

Tudo isto para dizer que Portugal é um país muito querido, antigo como poucos e com muita História, aqui sim com H grande.


A. Santos
SPM 2558

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Notas de L.G.:

(*) Ex-Sold Trms, Pel Mort 4574/72, Nova Lamego, 1972/74; membro da nossa Tabanca Grande desde 15 de Maio de 2006; residente em Caneças, concelho de Odivelas.

Vd. último poste do A. Santos > 21 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3496: Hospital Militar Principal: Fazendo mini-caixões antes de ser mobilizado (António Santos)

(**) Vd. último poste desta série > 5 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3566: Blogoterapia (73): Um elogio vindo da Bélgica (Soldado Carvalho / Santos Oliveira)