quarta-feira, 8 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4657: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (17): Dias em Binar -2

1. Mensagem de Luís Faria, ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72, com data de 4 de Julho de 2009:

Carlos Vinhal

Aos Homens da Ponte da Tabanca Grande - Paquete das Recordações - e a todos os embarcados, não enjoados ou enjoados, mando o meu abraço e um bem-haja.
Mando também esta bagagem de “ Viagem…” na esperança que sirva para atenuar algum enjoo ou que pelo menos não o provoque ou agrave!

Até breve
Luís Faria


Dias em Binar – 2

Um a um os dias iam passando, por norma em batalhas com a mosquitada, com a canícula e com a falta de abastecimentos. Não recordo porque havia esta falta. Talvez por a estrada para Bula ser perigosa e tivesse que ser picada quase na sua totalidade, o que obrigava à respectiva segurança nas orlas das matas de entrada para o Choquemone? Por sermos só um grupo meio desfalcado, não sendo suficiente para as tarefas exigidas?? Não recordo, é uma branca!!

Na verdade a minha passagem por Binar está envolvida por um denso nevoeiro com algumas abertas. Espero bem que alguém que por lá tivesse andado dê uma ajuda na dispersão desta nevoeirada. Tenho esperança!


O Primata voador

Nessas abertas, para além do já narrado em poste anterior vejo a nossa camarata, num dos pavilhões, com as camas encimadas pelos omnipresentes dosséis aramados com pendentes anti-mosquito e cirandando por cima deles um pequeno e refilão macaco sagui (?) , pertença e companheiro do Fur Mil Madaleno, que muito o estimava. O bicho era um tanto agressivo mas ao mesmo tempo dado e não desdenhava uma boa brincadeira, se para aí estivesse virado!

A brincar a brincar, um a certa ocasião mandou-me uma dentada, o que provocou uma reacção rápida: uma punhada forte no dossel onde ele estava sentado, pela lei física da acção/reacção, fez com que o bichano não tivesse tido tempo de se agarrar e fosse catapultado, qual homem-bala para o espaço, conseguindo por sorte (?) ficar pendurado no travejamento de sustentação do telhado, que ainda ficava a uma considerável altura!

Como o primata voador de lá saiu não recordo, mas teve ajuda com certeza! Recordo sim a fúria do meu amigo Madaleno perante a situação. Quanto ao atleta voador, durante algum tempo, sempre que me via os seus olhos faiscavam, guinchava e dava às pernas e braços para longe.

Claro que a situação acabou por ter certa piada, e passou a ser normalíssimo vermo-nos, Madaleno incluído, a fazer do mosquiteiro catapulta, se bem que de modo mais suave. De início o bicho não descolava da rede, tal a força com que se agarrava com as patitas, mas quando se apercebeu que ninguém lhe queria fazer mal, começou a alinhar… e era um gozo apreciar a técnica elevatória equilibrista do artista e a sua aterragem, sempre uma incógnita!!

Afinal ele, a vedeta, também gostava de dar espectáculo e dos mimos que ganhava de seguida, desde que a catapulta não fosse accionada por alguém que aparentasse estar chateado!! Podia não conseguir agarrar o travejamento…!!!


Picagem automática

Um dia, creio que pelo final da manhã, fomos surpreendidos por disparos de G3 vindos da direcção da estrada de Bissorã e cada vez mais próximos. Ficados à defesa, depara-se-nos uma nuvem de pó cada vez mais próxima, até que avistámos duas viaturas que a antecediam: da primeira, com a pica G3 na mão, apeia-se o Cap Gaspar (Gasparinho) que era por demais falado pelas estórias que dele se contavam e contam (já referenciadas neste Blogue**) e que, veio de Nhamate ao nosso burgo, se bem recordo, em missão de cortesia apresentar os cumprimentos de boas-vindas ao Cap Mil Mamede e dar uma de conversa com o pessoal e uns copos à mistura bem bebidos!!

Apesar do pouco tempo em presença, recordo-o como um homem educado e alegre, simpático e bonacheirão, terra-a-terra sem papas na língua e valente, que me pareceu gozar com a guerra e com o sistema, em especial com a hierarquia dominante, (seria curioso ver a resposta que daria ao nosso AB, o Almeida Bruno!!) o que julgo, contribuía em parte para a estima que a sua rapaziada lhe tinha e demonstrava. Podiam dizer que ele funcionava assim por estar bem encostado!? Que fosse? Não me pareceu nada dar-se ares de importante e muito menos egocêntrico, como outros!

Acabada a visita, lá se montaram ele e a sua rapaziada nas viaturas, qual vedeta cinéfila aos olhos do pessoal sorridente que presenciava a sua partida, na esperança de um regresso para breve, mas que não mais aconteceu. Foram na verdade umas horas diferentes e marcantes, pela positiva.

Pena não ter havido muitos como o Gasparinho, que com todos os seus defeitos e virtudes era ao que parece, um raio de sol para a sua Rapaziada e por aquelas terras de sofrimento. Que esteja em Paz!

Com um abraço
Luís Faria
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 1 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4619: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (16): Dias em Binar - 1

(**) Vd. poste de 2 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4628: Estórias avulsas (38): Histórias passadas na Guiné (José Borrego)

Guiné 63/74 - P4656: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (4): CCAÇ 816, Operação faísca em Cansambo

1. Mensagem de Rui Silva, ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67, com data de 7 de Junho de 2009:

Camaradas,

Recebam um grande abraço e votos de muita saúde, extensivos a todos os ex-combatentes da Guiné, ainda mais para aqueles que, de algum modo, ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

FOGO DE ARTIFÍCIO em CANSAMBO às 03 h da madrugada do dia 6 de Abril de 1966

(Das minhas memórias “PÁGINAS NEGRAS COM SALPICOS COR-DE-ROSA”)

Operação Faísca. Não sei se foi coincidência, mas que lá muito faiscou naquela noite (e não foi intempérie), lá isso foi verdade.

Estávamos então a 5 de Abril de 1966. A “casa-de-mato” de Cansambo era a que ficava mais perto do Olossato. [Vd. carta de Binta].

Éramos quase vizinhos, só que… dávamo-nos muito mal.

Esta operação revestiu-se de grande ineditismo, pois, pela primeira vez, pelo menos no que dizia respeito à minha Companhia, o assalto ao refúgio inimigo foi perpetrado em PLENA NOITE!

O Capitão, como sempre e como era das suas atribuições, planeou a operação, e, desta feita, de uma forma muito inteligente e sobretudo audaciosa: Atacar em plena obscuridade da noite! Não lembrava ao diabo (e ele que andava sempre por ali).

O nosso guia era o Joaquim, outrora “turra” de boa estripe, que conhecia muito bem tal “casa-de-mato”, ou não fosse ele de lá oriundo.

Desta vez o Joaquim decidiu-se da melhor maneira para… nós, e também para a integridade física dele, pois o ele nos ter enganado uma vez custou-lhe ficar com a cara que o deixou irreconhecível, para não falar do corpo, de tanto murro, pontapé, etc.

Basta dizer que, senão toda, quase toda a Companhia, nesse dia do engano, molhou a sopa no pobre Joaquim. Coisas de então.

Bom, como ia dizendo, o Joaquim desta vez resolveu colaborar e então pôs o Capitão ao corrente e a par e passo do que ia na “casa-de-mato” de Cansambo.

O Capitão soube então que eles colocavam sentinelas nas árvores a partir das 4 horas da madrugada, portanto muito antes do alvorecer, altura esta que normalmente a tropa atacava.

Assim prevenidos, pois se a tropa resolvesse atacar, como era seu hábito e norma daquela guerra, ao romper do dia, as sentinelas dariam por isso muito antes e alertariam o pessoal da “casa-de-mato” que teria entretanto tempo para nos receberem com uma bem montada, ainda que normalmente improfícua, emboscada.

O Capitão lembrou-se então e em boa hora (isto dito depois) de a Companhia atacar o refúgio inimigo às 3 horas da madrugada, isto é, uma hora antes de as sentinelas tomarem as suas posições e formarem o seu dispositivo de segurança.

Portanto eles seriam apanhados quando despreocupadamente deveriam estar a dormir.

Mas, o atacar em plena noite, coisa que até aí nunca tinha acontecido, implicava alguns problemas e receios, entre estes o posicionamento e ordenamento na altura do ataque, pois como era noite cerrada e não se visava um palmo à frente dos olhos, isto teria de ser feito com muito cuidado e disciplina, e sobretudo sem ponta de barulho, o que era ainda o mais importante.

Bom, o Capitão planeou bem em todo o pormenor e a malta mostrou-se confiante, até porque o Joaquim parecia agora ser um grande trunfo.

À frente foi o meu Grupo de combate e a primeira secção era a do Baião.

O Capitão pôs o Furriel Mil José Baião com a sua Secção à frente da coluna como represália de ele se ter demorado em Bissau mais tempo do que ele tinha permitido, para ele tratar de um assunto qualquer. Eu desta feita não fui, pois estava em Bissau a contas com uma super-alergia e então estava a ser medicado pelo hospital e em regime de internamento.

Para surpreender o inimigo evitou-se o percurso habitual de saída (estrada Olossato-Farim) evitando também assim a passagem pela ponte sobre o rio Olossato aonde o inimigo também vigiava as 24 horas do dia.

Assim atravessámos em canoa rudimentar e em pequenos grupos o dito rio, algumas centenas de metros da dita ponte e a jusante e depois a progressão foi feita em corta-mato.

O Capitão mandou a malta levar balas tracejantes, pois como estas deixam um rasto luminoso perfeitamente visível à noite, a malta poderia melhor acertar com o alvo, ou pelo menos ver para onde elas iam, alvo esse que era certamente o refúgio inimigo.

Aos homens dos morteiros mandou o Capitão levar very-lights - granadas de morteiro, mas apenas de efeito luminoso.

Os very-lights uma vez lançados, apenas serviam para iluminar o espaço aéreo circundante durante uns breves segundos e permitir assim, neste curto espaço de tempo, uma razoável visão da zona do objectivo.

Portanto o maior problema seria o da instalação da malta relativamente ao refúgio, que teria de ser feita sem hipótese de detecção por parte do inimigo.

Uma vez a malta instalada e devidamente camuflada -a noite nesse aspecto ajudava e de que maneira - era só abrir fogo e então com a ajuda dos very-lights o fogo logo se concentraria no refúgio.

E tudo aconteceu, para felicidade nossa, como o Capitão planeara e nós todos confiávamos.

Foi tão grande a surpresa para eles que os 2 Grupos de combate mobilizados para o assalto instalaram-se em dispositivo adequado e em meia lua e sem dar azo ao mais leve pressentimento da sua presença, e então foi só aguardar o sinal de FOGO(!)

Este deu-se na hora H. O potencial de fogo era grande. As granadas de bazuca e de morteiro choveram aqui e acolá em ritmo bem cadenciado e de vez em quando surgia no ar um very-light para ajudar a malta a aferir melhor a pontaria.

O Capitão comandava o assalto utilizando um megafone.

Quem não soubesse que se tratava de um episódio da guerra até julgava que era um S. João bem festejado com bombas de Carnaval e fogo de artifício ao mesmo tempo.

Eles mal tiveram tempo para fugir quanto mais ocuparem os abrigos que tinham na periferia do refúgio e, ainda assim, eram muitos os rastos de sangue ali encontrados. Abandonaram praticamente o armamento todo e tudo o mais. Reagiriam depois ao longe com algumas rajadas de flagelação. O costume…

Assim, desta feita, foram-lhes apanhadas 5 Pistolas-metralhadoras, diversos carregadores para aquelas, diversas granadas de mão, de morteiro e de LGF (ver foto) e o morteiro 82 por pouco não foi apanhado.

Digo que por pouco, pois viu-se bem o rasto dele a pressupor dificuldade de transporte. Essa foi a maior pena.

O Capitão sabia que aquele morteiro dava a volta por algumas “casas-de-mato” do Oio, e então ele aguardou a altura, por indicação de Joaquim, que ele lá estivesse para a Companhia tentar capturá-lo.

Mas, claro, apanhar uma arma destas era sempre muito difícil, pois eles tinham o máximo cuidado em não se verem privados deste tipo de armamento.

Falava-se em represálias severas se o perdessem, mesmo ainda que alguém se tivesse de sacrificar para o salvar e, assim, do morteiro 82 que na ocasião reforçava a “casa-de-mato” de Cansambo, só se ficou com o cheiro.

Foi então quase (este quase pelo morteiro) um êxito de 100% a operação em Cansambo, de Faísca de seu nome.

Apanhámos praticamente todo o armamento que eles possuíam naquele refúgio, provocámos, senão baixas, bastante feridos a julgar pelos rastos de sangue bem visíveis, e destruímos completamente o refúgio inimigo de Cansambo.

Não tivemos qualquer azar, pois tão grande foi a surpresa, pela hora e pelo método, que eles só se preocuparam em fugir bem e depressa, daí não ter havido qualquer esboço de reacção.

“Parecia o S. João meu Furriel”, dizia-me um soldado mais tarde. Referia-se ele ao efeito dos very-lights e das balas tracejantes. “Pareciam bichas de rabear”, acrescentou outro.

Que espectáculo, imaginei eu. Foi formidável a ideia do Capitão, foi mesmo bestial - concordámos todos nós - mas ao fim e ao cabo deveu-se também em grande parte à colaboração do “ex-turra” e agora nosso grande amigo, de seu nome Joaquim, pois ele, em todo o pormenor, informou o Capitão tal e qual como a coisa funcionava em Cansambo.


Armamento capturado na Operação Faísca: Em 1.º plano: 3 pistolas-metralhadoras PPSH (a famosa costureirinha) e 2 “Thompson” (c/ um balázio de cerca de 12 mm. de diâmetro) e ainda 1 carregador PPSH; atrás 2 granadas de Lança-granadas-foguete e um carregador Kalashnikov; mais atrás: algumas granadas de mão e 8 granadas de morteiro 60, entre outro material de menor importância.

O Joaquim a partir daí passou a ser o melhor do mundo. Podia era ter-se livrado daquela grande sova aquando da primeira tentativa de assalto à “casa-de-mato” de Cansambo, ele que, intencionalmente, fez-nos andar à deriva, (não foi só ele a fazê-lo pois haviam guias que até davam o jeito possível, para ficarmos à mercê de mira inimiga), fazendo assim gorar os nossos propósitos.

Como sempre acontecia, o Joaquim, um “turra” então renegado, começou a compartilhar da vida comum de Olossato. Vestia agora bem e até tinha direito a gravata e comia do rancho.

A partir daí, sim, foi dada toda a liberdade ao Joaquim agora Senhor, pois a gente também sabia que ele jamais fugiria.

Sim, um “turra” depois de ter denunciado os colegas jamais regressaria ao seu convívio, pois era óbvio que estes lhe tratariam imediatamente da saúde, fazendo-o desaparecer do mundo dos vivos, pagando assim a sua traição.

O Joaquim, claro, escolheu ser um pacato cidadão da típica e pacata povoação do Olossato.


P.S. Devo dizer que o “Páginas Negras com salpicos cor-de-rosa” foram escritas, ou vá lá rabiscadas, praticamente todas, em pleno tempo de guerra e acabadas logo a seguir ao meu regresso.

Escrevia à noite e ao outro dia já estava a pôr as cartucheiras à cintura e a G3 ao ombro outra vez, para passar por algo que poderia depois contar… se pudesse.

Naquela altura tinha os meus vinte e poucos anos e fora empurrado para uma guerra que já na altura não a compreendíamos muito bem. Ia impregnado de patriotismo e honradez e outras coisas assim, lutar contra o terrorismo, dizia-se.

Hoje tudo era contado de maneira diferente (ou noutra perspectiva) ficando desde logo subjacente o respeito por aquele massacrado povo africano que, afinal, só queria a sua terra e não queria ser escravizado. Naquele tempo ainda se via muito branco a bater no preto…

Quero com isto dizer que os excertos que vou mandando (com todo o gosto), para este magnífico blogue, são transcrições absolutamente fiéis à minha escrita feita naquele preciso tempo (espaço, maneira e modo).

Só assim haveria razão e cabimento de as querer mostrar tal e qual.

As minhas memórias começam assim e em jeito de intróito.

“PÁGINAS NEGRAS COM SALPICOS COR-DE-ROSA”

Este pequeno livro, que encerra uma modesta prosa, foi elaborado, a maior parte, nos últimos dias da minha comissão na Guiné, e concluído logo depois do meu regresso.

As páginas que se seguem, ilustram (ainda que de uma maneira sumária) o que foi a vida da minha Companhia e de um modo particular a minha, naqueles dois inesquecíveis anos de episódios multifacetados, os quais estive ao serviço da Pátria na defesa da sua integridade territorial, entre milhares de assim servidores, que integrados na Aviação, na Marinha ou no Exército, com galhardia e raro estoicismo defendiam aquele pequeno pedaço de terra no longínquo ocidente africano que corajosos portugueses de então descobriram, galgando mares e marés, e de uma forma assaz atribulada.

Das melhores e das piores recordações da minha vida dali as guardo até à morte.

As “páginas negras” escreveu-as a guerra…, que era o que afinal me levou ali, e estas eram as do quotidiano.

Os “salpicos cor-de-rosa” foram os bons momentos de alegre confraternização entre a malta, foram os jogos de mesa ou de campo, as “piscinas” (“cocktail” de bebidas - todas as que houvesse na altura - num grande alguidar de aço inox, que cada um bebia por sua vez e até dava direito a mergulhar o farfalhudo bigode), as brincadeiras entre uns e outros e…. a chegada da “Dornier” que trazia os aerogramas da família e até, às vezes, sardinhas.

Fotos: © Rui Silva (2009). Direitos reservados.

Um abraço,
Rui SIlva
___________
Nota de M.R.:

(*) Vd. último poste da série em:

Guiné 63/74 - P4655: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (4): Mãos à obra, rapaziada ! (Patrício Ribeiro)


Guiné-Bissau > Bissau > Sítio da AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > "Construindo um porto" > Foto publicada em 28 de Junho de 2009 (e tirada em 16 de Maio último).

"A comunidade da tabanca de Catesse, situada na foz do rio Cacine, é constituída por habitantes muito activos, dinâmicos e empreendedores, o que os levou a tomar a decisão de construir, em pleno mangal, um embarcadouro que os retire do isolamento geográfico a que estão sujeitos.

"Com uma canoa que construíram e um motor fora-de-bordo que lhes foi atribuído a título de crédito, a população local poderá chegar mais rapidamente a Catió, Ilhéu do Melo, Kamsar na Guiné-Conakry, ou mesmo Cacine, para colocarem os seus produtos agrícolas e de pesca excedentários.

"Constituirá também uma porta de entrada e saída para os turistas que demandarem as Ilhas de Orango, João Vieira e Poilão, Tristão e ilhéu dos Pássaros, oferecendo novos itinerários ecoturísticos".

Foto (e legenda): © AD - Acção para o Desenvolvimento (2009). Direitos reservados


1. Mensagem do Patrício Ribeiro, membro do Grupo dos Amigos da Capela de Guileje, membro da nossa Tabanca Grande, empresário na Guiné-Bissau onde reside há mais de 25 anos, antigo fuzileiro em Angola, onde nasceu (*):

Bom dia

Ao grupos de amigos e outros...

Junto uma lista de materiais necessários para a reconstrução da Capela (**), que me foi pedida pelo Camilo.

Segue também alguns desenhos, para vosso conhecimento, de apoio a construção, que fiz quando da minha última viagem a Guileje.

Vou esta semana novamente a Guileje, para contratarmos o mestre da Obra em Quebo (Aldeia Formosa). Para iniciarmos de imediato os trabalhos.

Nota: Não consigo anexar os desenhos, vou enviá-los mais tarde.

Um abraço.

Patricio Ribeiro

IMPAR Lda

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Tel / Fax 00 245 3214385, 6623168, 7202645
Guiné Bissau
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2. LISTA DOS MATERIAIS NECESSÁRIOS PARA A RECONSTRUÇÃO DA CAPELA DE GUILEJE

950 – Blocos 40 x 20 x 15 já feitos, pela ONG AD)

25 – Varões de ferro de 8 x 12,00

15 - Varões de ferro de 6 x 12,00

2 – Kg de arame queimado

1 – Carrada de Cascalho (vamos aproveitar os restos da capela) (a ONG AD , vai tratar)

2 – Carradas de areia ( a ONG AD vai tratar)

5- Latas de tinta (já temos, oferta do Camilo)

- Contrato com o mestre da Obra (Já se pediu orçamento).

FALTAS

75 - Chapas galvanizadas 2,00 x 0,90 x 0,4 (para a capela e casa do gerador)

700 – Pregos especiais para chapas galvanizadas.

1 – Casa para o gerador 2,00 x 2,50

1 – Gerador 7 Kva, com motor Lister , para arrancar por manivela e bateria

100 – Fio 3 x 4

50 – Fio FVV 2 X 1,5

5 – Suportes de lâmpadas, para fixar nas paredes.

5 – Olhos de boi, com lâmpadas de baixo consumo.

50 – Lampadas de baixo consumo


3. Comentário de L.G.

Como fazer chegar estes materiais em falta para a reconstrução da capela ? Quanto poderão custar em euros, aqui em Portugal, ou em CFA, em Bissau ? Como levá-los até Guileje ?

Como poderemos ajudar os nossos Amigos da Capela da Guileje - Patrício Ribeiro, António Cunha, Manuel Reis e António Camilo, a que se juntou agora, a partir de 20 de Junho de 2009, na Ortigosa, por ocasião do nosso IV Encontro Nacional, o advogado lisboeta Dr. João Seabra, ex-Alf Mil da CCav 8350 (Guileje e Gandembel, 1972/73) ?

Por que é que outros camaradas que passaram por Guileje, de 1964 até 1973, ainda não manifestaram a sua eventual adesão a esta iniciativa, que tem um tremendo valor simbólico, para além do seu impacto no desenvolvimento do ecoturismo do Cantanhez e do seu lugar (material) no projecto de musealização do antigo quartel de Guileje ?

______________

Notas de L.G.:


(*) Vd. postes de:

5 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1402: Um bom ano de 2007 a partir de Mejo, Guileje (Patrício Ribeiro).

6 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3705: As Boas Festas da Nossa Tabanca Grande (13): O jacaré da praia do Biombo (Patrício Ribeiro)

29 de Janeiro de 2009Guiné 63/74 - P3812: Dicas para o viajante e o turista (7): Viagens pelo sul da Guiné-Bissau (Patrício Ribeiro)


(**) Vd. postes de:

16 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4535: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (3): Já começámos a pôr a mão... na massa do Camilo, e a 20/1/2010 haverá ronco (Pepito)

16 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4534: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (2): António Camilo oferece 300 sacos de cimento e 150 litros de tinta

6 de Junho de 2009 > Guiné 64/74 - P4469: Grupo dos Amigos da Capela de Guileje (1): Já temos três: Patrício Ribeiro, António Cunha e Manuel Reis

terça-feira, 7 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4654: Estórias avulsas (42): O whisky e a Coca-Cola do nosso contentamento (António Tavares)

1. Mensagem de António Tavares (*), ex-Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72, com data de 4 de Julho de 2009:

Caro Vinhal,

A minha 1.ª noite na Guiné foi passada no cais do Pidjiguiti em 01-05-1970... a guardar 21 caixas de whisky... era o sargento de reabastecimentos do BCAÇ 2912.

Chegados a Galomaro distribuiu-se o whisky só pelos oficiais e sargentos, segundo ordens expressas do comando.

Havia duas qualidades de whisky - velhos e novos - vendidos a 95$00 e 50$00 cada garrafa, respectivamente.

Só vendíamos nos bares - oficiais e sargentos – as garrafas de 50$00 por 65$00, porquanto medido o líquido dava 13 cálices ao preço unitário de 5$00.

A título de comparação refiro que uma bazuca - cerveja de 0,6 l - custava 6$50.

O principal consumidor era um major, que se deixou vencer pelo álcool... foi evacuado para a Metrópole... enquanto durava a bebida não existia oficial... quando lhe faltava até de noite vinha à minha procura... lá íamos os dois, no seu jeep, ao armazém levantar o whisky.

Certo dia, ao abrirmos uma caixa selada faltava uma garrafa... obrigou-me a fazer um auto da ocorrência e enviá-lo para a Intendência em Bissau... obviamente que nem resposta obtivemos, embora ele fosse testemunha no auto!

Outra vez precisou da bebida mas não havia em armazém... lá arranjam a bebida... foi feita uma sindicância ao whisky... o circuito – armazém, bares e venda – estava correcto.

Começaram a fazer um rigoroso controlo ao whisky quando começaram a vir menos caixas da Intendência.

Às escondidas vendia às praças cada garrafa a 65$00.

O whisky era vendido no Café/Restaurante do Francisco Augusto Regalla e em Bafatá quase pelo dobro do preço.

Recordo que após uma dificultosa e poeirenta picada, com um banho, uma coca-cola e um whisky sentíamo-nos jovens e sadios... era a cocaína com os seus efeitos... os guinéus mascavam a coca... nós bebíamo-la.

Esta foi uma história passada no mato – Galomaro 1970/72 – onde o whisky era uma estrela e brilhante... quem nunca esteve naquelas tórridas e frias terras e na guerra colonial não sabe o valor de tão precioso líquido... houve outros camaradas na Guiné que nunca o saborearam pelos mais diversos motivos!

A venda da coca-cola em Portugal Continental era proibida.

1 de Maio de 1970 > Chegada a Bissau

Bar de Sargentos

Um abraço do,
António Tavares
Foz do Douro
04 de Julho de 2009
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de24 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4573: Tabanca Grande (154): António Tavares, ex-Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72

Vd. último poste da série de6 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4647: Estórias avulsas (41): Fotos de Gamdembel e Ponte Balana (Manuel Oliveira)

Guiné 63/74 - P4653: Dando a mão à palmatória (21): A verdadeira fotografia do Alf Mil Cav Mosca, assassinado no dia 21 de Abril de 1970 (Os Editores)


1. A propósito de um equívoco que se manteve durante largo tempo no nosso Blogue, relacionado com a identificação dos camaradas representados nas fotos alusivas ao Massacre do Chão Manjaco, com a devida autorização do nosso camarada e tertuliano Álvaro Basto (*), ex-Fur Mil Enf da CART 3492/BART 3873, reproduzimos o Poste 184, do Blogue da Tabanca Pequena de Matosinhos, por ele publicado.




2. Domingo, 7 de Junho de 2009
P184-desfazer as confusões


Um dos nossos mais queridos e assíduos companheiros de tertúlia na Tabanca de Matosinhos tem sido este simpático casal.

O Dr. Fernando Giesteira Gonçalves e a D. Joaquina Silva, sua simpática esposa.

Praticamente não falham à quarta-feira e não raro, vêm acompanhados de gente ligada à Guiné, quer ex-combatentes quer naturais de lá.
Ele é médico e vai abrir em breve uma clínica em Bissau com a ajuda da esposa que corajosamente o irá acompanhar desde a primeira hora.
Gente simpática, afável e sobretudo dotada de grande humanismo, basta relembrar como têm vindo a acompanhar o processo de auxilio às crianças da Clínica Pediátrica de Bor.

Há dias olhando para a foto abaixo que vinha publicada num destacável que é publicado todas as quartas feiras pelo Correio da Manhã diz surpreso: - Olha... eu estou aqui com os majores.
Logo um coro se fez ouvir... - Oh Dr. tem a certeza? Olhe que esse é o Alferes Mosca que foi morto juntamente com os majores. Ele não desarma e reafirma: - Desculpem, este sou eu, tenho a certeza. O Mosca foi-me substituir uns meses mais tarde à data desta foto ter sido tirada; o Mosca nem na Guiné estava nesta altura. Era eu que fazia parte do CAOP e ele foi-me substituir por ter chegado ao fim a minha comissão.
Bom... foi a estupacção total... tem vindo a ser propalado que esta foto reunia os quatro massacrados, mas afinal não.
Só agora é que o Dr. Giesteira viu esta foto porque habitualmente não vai à inernet e muito menos ao Blogue do Luís. Doutra forma, já teria obviamente desfeito o equívoco há mais tempo.


Fica aqui desfeita a confusão pois já na altura da primeira publicação da foto no Blogue do Luís quem o fez não estaria seguro quanto à identidade do alferes que nela aparecia.
Assim se vai fazendo História meus caros.
Álvaro Basto
__________

3. Para desfazer definitivamente quaisquer dúvidas fica agora a foto com os verdadeiros mártires do Chão Manjaco


Já no Poste 1510 o nosso camarada Paulo Raposo punha a hipótese de na foto estar um seu camarada de Mafra de apelido Giesteira.

Ao Dr. Fernando Giesteira Gonçalves e à família do nosso malogrado camarada Alf Mil Cav Joaquim João Palmeiro Mosca, apresentamos as nossas desculpas pelo lapso que grassou durante todo este tempo.

Se este poste chegar ao conhecimento do Dr. Giesteira, fica desde já convidado a aderir à nossa Tabanca Grande. Será um prazer para nós contar com a sua colaboração, quer falando do passado, como combatente, quer do presente, como médico interventivo na saúde daquele pequeno e pobre país.

Embora tardiamente, fica reposta a verdade.
CV

OBS:- Nos postes onde constavam as duas fotos acima publicadas, já foram substituídas pela que se apresenta mais abaixo, já como verdadeiro mártir Alf Mil Mosca. (**)
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 9 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4310: Tabanca de Matosinhos (11): As crianças da Guiné-Bissau precisam da nossa ajuda (Álvaro Basto)

(**) Vd. postes de 8 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1503: Dossiê: O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M. F. Sousa) (6): Fotografia dos três majores (Sousa de Castro)

9 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1510: Os heróis do Chão Manjaco e o Alferes Giesteira (Paulo Raposo)

27 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P2004: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (Anexo A): Depoimento de Fur Mil Lino, CCAÇ 2585 (Jolmete, 1970)

30 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P2008: Dando a mão à palmatória (1): A fotografia dos saudosos majores Pereira da Silva, Passos Ramos e Osório (João Tunes / Editores)

1 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2320: Relatórios Secretos (1): Massacre do Chão Manjaco: O resgate dos corpos (Virgínio Briote)

Vd. último poste da série de 25 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4412: Dando a mão à palmatória (20): O Arsénio Puim, capelão do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), só foi expulso em Maio de 1971

Guiné 63/74 - P4652: O mundo é pequeno e a nossa Tabanca... é grande (14): O mundo é do tamanho duma ervilha (António Matos)

1. Mensagem de António G. Matos (*), ex-Alf Mil MA da CCAÇ 2790, Bula, 1970/72, com data de 3 de Julho de 2009:

Caros editores,
Aqui fica uma contribuição modesta para o blog quando nos preparamos para mais um fim de semana.
Se o agendamento das publicações o permitir, que agradável seria vê-lo publicado gozando do contexto meteorológico estival...

Um abraço,
António Matos


O Mundo do tamanho de uma ervilha

Sexta-feira à tarde...
Lisboa...
Esplanada de A Brasileira....
15 horas....
Sento-me a escassos 4 metros do Pessoa...

O cosmopolistismo lisboeta nesta zona confunde o observador circunstancial sobre as nacionalidades dos passantes nas suas têzes morenas e cabeleiras dum loiro oxigenado deixando a dúvida se se trata duma sueca quem acaba de passar ou simplesmente uma destas moçoilas das bandas da Trafaria habituada à travessia diária do Tejo abordo dum cacilheiro....

Sejam elas (ou eles) de onde forem, o bom do "Camões do séc. XX" não tem descanso perante as poses que lhe são solicitadas para os milhares de fotos de quem passa!

Há os que, de roteiro turístico na mão, percebem estar frente a um vulto superior e há também aqueles que disparam flashes em catadupa perante a curiosa e coloquial postura do homem do chapéu e papillon...

Há coxas nuas e sugestivamente traçadas, num ímpeto de arejo estival às partes pudibúndicas e um zunzum poliglota a dar a entender que o €uro ainda permite a alguns virem lavar a vista arremelgada dum ano inteiro em cima dos livros de contabilidade das suas empresas ou dos écrans dos computadores a vasculharem as redes sociais...

Numa mesa próxima da minha, um azeiteiro disfarçado de jet set coça, displiscentemente, os tomates enquanto o António Vasconcelos, no canto oposto, capta imagens para mais um filme...

Entretanto o meu computador que mantenho aceso e ao qual tinha já plugado na USB a minha net de banda larga através desta maravilha tecnológica chamada PEN, dá um PIUUUU!!

Fui ver...

O Facebook registava a entrada da resposta que aguardava e que, no fundo, justifica este meu post no blog.

O José Saraiva acabava de entrar em contacto comigo e transportava-me para a Guiné.
Foi um ex-combatente no Leste e também foi daqueles para quem o arame farpado não o acoitava...
Falou-me do seu As Lágrimas de Aquiles.

Já me dirigi à livraria do Diário de Notícias no Rossio e deixei a encomenda...
A sinopse entusiasmou-me...
Voltarei ao tema depois da leitura...

Até lá fica a referência e a constatação de que, de facto, o Luis Graça & Amigos é grande e o mundo... é uma ervilha...

António Matos
__________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 26 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4582: Os Nossos Camaradas Guineenses (11): Ernesto… procuro saber algo sobre este meu Amigo guineense (António Matos):

Vd. último poste da série de25 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4577: O mundo é pequeno e o nosso Blogue... é grande (13): Encontro de dois atabancados em terras da América (José da Câmara)

Guiné 63/74 - P4651: Estórias cabralianas (51): Alfero esfregador entre as balantas (Jorge Cabral)



Guiné > Região do Oio > Mansoa > Bajuda Balanta > Série de postais ilustrados do tempo da Guiné Portuguesa, s/d nem editor... Colecção do nosso amigo e camarada José Casimiro Carvalho (ex-Fur Mil Op Esp, CCAV 8350, Guileje e Gadamael, 1973/74).

Foto: © José Casimiro Carvalho (2006). Direitos reservados.


1. Mensagem do Jorge Cabral (*), ex-cmdt do Pel Caç Nat 63, Fá Mandinga e Missirá, Sector L1 - Bambadinca, Zona Leste, 1969/71, hoje jurista e professor do ensino superior universitário (*):


Caros Amigos!

Passada a euforia do nosso glorioso Encontro, eis-me perante mais uma grande Alegria – a colaboração do Cherno Baldé (**). E assim eu que havia resolvido finalizar as cabralianas, vejo-me obrigado a continuar pois ele consegue trazer-me à lembrança mais estórias.

Aí vai uma.

Abraços
Jorge Cabral



2. Estórias cabralianas (***) > Alfero esfregador entre Balantas


Tanto nas Tabancas Fulas como nas Mandingas, o Alfero actuava à vontade com as Bajudas, perante a complacência dos Homens e Mulheres Grandes… Aliás não ia além de um acariciar voluptuoso, acompanhado com promessas de encontros no Quartel. Na altura teria merecido o cognome de Apalpador.

Em Novembro de 1969, visitou uma Tabanca Balanta, Bissaque [, a norte de Fá, ](****), e ficou deslumbrado com a beleza das Bajudas, designadamente peitoral… Face à pouca simpatia com que foi recebido, não ousou sequer qualquer gesto que fizesse jus ao referido cognome.

Mas aquela visão idílica espevitou-lhe a imaginação e logo uma semana depois voltou.

Através do intérprete Albino, seu único Soldado Balanta, explicou que ia proceder a um tratamento com uma boa mezinha, afastadora de doenças… Para tanto, colocadas em fila todas as bajudas, o Alfero esfregou-lhes o peito com um bálsamo, ao mesmo tempo que proferia umas palavras, mágicas é claro… Na semana seguinte regressou e repetiu. As melhoras das Bajudas eram já evidentes…

À terceira vez aconteceu porém um facto extraordinário. Chegado à Tabanca, constatou que nem uma só Bajuda se vislumbrava.

Esperando o Alfero, já em fila e preparadas para a função encontravam-se todas as velhas da aldeia, de seios pendentes, quase pelos joelhos…

Estoicamente o Alfero esfregou, esfregou…

Não houve quarta vez…

Jorge Cabral

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Notas de L.G.:


(*) Vd. poste de 10 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4403 - P4494: A Tabanca Grande no 10 de Unho de 2009 (2): Cabral só há um, o de Missirá e mais nenhum (Luís Graça)

(**) Vd. poste de 25 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4580: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (3): A chegada dos primeiros homens brancos a Cambajú em 1965: terror e fascínio


(***) 3 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 – P4455: Estórias cabralianas (50): Alfero, de Lisboa p'ra mim um Fato de Abade (Jorge Cabral)


(****) 16 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2354: Estórias cabralianas (29): A Festa do Corpinho ou... feliz o tuga entre as bajudas, mandingas e balantas (Jorge Cabral)

(...) Bissaque era uma aprazível aldeia balanta. Logo nessa noite, à volta de uma fogueira, reparei na beleza das raparigas, tendo passado a frequentar semanalmente a Tabanca, numa acção sócio-erótica, a qual consistia numa esfregação mamária às belíssimas bajudas. Habituado às bajudas mandingas, verifiquei experimentalmente a superioridade dos seios balantas, tendo, e disso me penitencio, contribuído para um conflito étnico-mamário.

Afim de me redimir, em Janeiro de 1970, de férias em Lisboa, comprei 35 corpinhos (soutiens) no armazém Fama, sito à Calçada do Garcia, junto ao Rossio, onde agora se reúnem os guineenses. (...)

Guiné 63/74 - P4650: (Ex)citações (33): A Tabanca Grande ou... Global: de Contuboel, Fajonquito e Bissau com amizade (Cherno Baldé)

Guiné > Zona Leste > Contuboel > CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 > Junho de 1969 > Uma fotografia politicamente incorrecta do meu álbum... Furriéis Levezinho e Henriques (eu...), no oásis de paz que era então Contuboel, no bem-bom da instrução de especialidade dada aos soldados, do recrutamento local, da futura CCAÇ 12 (na altura CCAÇ 2590)...

No fim da instrução, passado um meio e meio, a companhia, em farda nº 3 (!), estava a levar porrada da grossa, em Madina Xaquili... Em Contuboel, havia tempo para tudo, para longos passeios no Geba, viagens de carro, sem escola, e até para brincadeiras estúpidas... ou tão inocentes como esta simulação de um catana a exercer o seu mister no delicado pescoço de um tuga (o Levezinho)... Não tenho, no entanto, ideia de ter ido até Fajonquito, na fronteira... A Sonaco, sim... E, claro, Bafatá... (LG)

Foto: © António Levezinho (2006). Direitos reservados



1. Publicámos ontem o último texto das memórias do Chico, menino e moço, hoje o Sr. Eng. Cherno Baldé (*). Eis o mail que lhe mandei:


Querido amigo e irmão: Publiquei tudo o que me mandaste... Passaste a figurar, permanentemente, na lista dos membros da nossa Tabanca Grande... Espero que estejas bem, com a tua querida família, e que Deus, Alá e os bons irãs protejam o teu povo e o teu país... Conta connosco. Mantenhas. Luís Graça.

2. Ele acabou de responder-me nestes termos, o que quer dizer que
vivemos de facto na mesma Tabanca, a Tabanca Global:

Amigo e irmão Luis Graça,

Foi com muita satisfação que segui a publicação das minhas crónicas que chamei de 'memórias' . Pela reacção e comentários que se seguiram, acho que as pessoas compreenderam, e melhor que isso aceitaram, mesmo que só por algum momento, uma forma diferente de ver e de interpretar as coisas.

Agradeço a todos os amigos que fazem parte desta nossa Tabanca Grande e faço votos para que este ambiente de amizade e tolerância continuem a ser a pedra angular da nossa confraternização e irmandade.

Eu, apesar de pertencer a uma geração um pouco mais nova e nunca ter pegado em armas para combater, tive o grato privilégio de viver junto dos protagonistas da guerra de um lado e d´outro. Com os portugueses antes e os combatentes do PAIGC depois. Uns e outros apresentam forças e fraquezas, vantagens e inconvenientes, mas eu não tenho qualquer pretensão de julgar ou emitir juízos de valor, mas tão somente apresentar o meu modesto testemunho sobre factos e experiências que influenciaram a minha forma de ver e viver o mundo.

Não tenho quaisquer receios em especial na apresentação do meu testemunho e procurarei ser fiel ao principio da verdade e da imparcialidade e, fiquei admirado pela forma como todos conseguiram entender e penetrar lá dentro do meu espírito apesar das poucas palavras e do medíocre falar português.

Prometo continuar a colaborar na medida do possível e , nomeadamente, responder a algumas perguntas formuladas na sequência desta primeira publicação. A toda a equipa do Blogue e em especial ao meu amigo de Contuboel o meu obrigado e até breve.

Cherno A. Baldé

PS - O Luis Graça está, certamente, ao corrente de que entre Contuboel e Fajonquito, duas localidades vizinhas, existia e ainda hoje existe uma forte rivalidade e os seus encontros de futebol, por exemplo, sempre terminam na confusão porque nenhuma das duas partes admite a derrota.

_________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 6 de Julho de 2009 >Guiné 63/74 - P4646: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (5): A família extensa, reunida em Fajonquito, em 1968

Guiné 63/74 - P4649: Blogoterapia (114): A Honra da Companhia, os fantasmas de Guileje, os limites da tolerância (José Brás / António Matos)

1. Duas mensagens, recentes, que entendo dever ser publicadas na série Blogoterapia (*) onde, em vez de histórias e memórias, há sobretudo reflexões sobre nós próprios, o nosso blogue, a nossa Tabanca Grande, a nossa identidade, a nossa caserna virtual ...

[Revisão / fixação de texto / bold, a cores: LG]


(I) Do José Brás (foto, à direita):

Caro camarada Carlos Vinhal:

Vejam bem como são as coisas. O que me apetecia era cantar como Sérgio Godinho, "chegas agora, vais-te logo embora", falando sobre e para mim próprio.

E, antes de quaisquer outras considerações, falo de imediato sobre a questão que tão subitamente me tramou a felicidade de tertuliano novato e do gosto pelo convívio com gente viva, gentil, clarividente e solidária, arrastando-me para esta situação de desgosto.

Constantino... se chama o motivo (**). Não apenas Constantino... porque sei de saber experiente que de Constantinos está o mundo cheio e que, como fala do povo, "não me (nos) ofende quem quer, só ofende quem pode".

Também sei que na "escravatura" da minha cultura democrática estarei sempre condenado a ter de aceitar o seu (deles) direito a, existindo, expressar-se, mesmo sem ilusões sobre a oportunidade que tal gente (não) me daria para expressar a minha visão das coisas e do mundo, se por acaso, como já aconteceu prolongadamente, dispusessem de poder para tal.

Portanto, existem, expressam-se porque têm direito à expressão e, provavelmente, a sua existência e expressão não confirmam senão a outra canção do Sérgio, "a democracia é o pior de todos os sistemas com excepção de todos os outros".

A minha angústia começa mesmo é quando me pergunto se terei de conviver, de habitar sob o mesmo teto (leia-se, tabanca), de chamar amigo e camarada, a um tipo com a mentalidade que exibe o senhor, discutir com ele questões que me arrepiam porque debatê-las assim é já, de alguma forma, aceitar-lhes um pó de razoabilidade nas diatribes sobre a vida de seres humanos, seus conterrâneos (e ainda que não fossem), arrebanhados contra vontade para uma empresa sobre a qual tinham mais que muitas dúvidas (sic).

Tudo em nome de uma alegada "honra da companhia", do dever de imolação no altar da Pátria, de um heroísmo velho e anacrónico face ao movimento da história e à existência dos restos do Império sonhado (com outra desculpa histórica) pelos nossos antanhos.

Para este peditório já dei.


O fascismo salazarengo ainda estrebucha por aí porque era de todo impossível que lhe tivessem desaparecido as marcas e os sinais, cinquenta anos de atraso e repressão.

Finalizando.

O tal Constantino tem todo o direito a remoer a frustração do cabo de secretaria em Guileje, lugar cómodo no momento, mas potenciador de traumas hoje, por não lhe ter proporcionado as oportunidades de heroísmos, quiçá mesmo, uma morte gloriosa na defesa do seu País e da civilização ocidental.

Nem abordo aqui a questão da Retirada, porque essa tarefa, com legitimidade, direito e sólidos argumentos a têm desempenhado João Seabra, Manuel Reis, Coutinho e Lima e outros, mas sobretudo pela essencialidade de ser ou não ser justo e correcto o acto de retirar naquelas condições, excluindo dessa forma à morte e/ou à prisão pelo PAIGC a mais de cento e cinquenta jovens portugueses sem culpas no cartório, nem verdadeira Pátria para defender ali.

Já disse e repito. Não sou alheio à admiração pelo acto de coragem e doação de tantos militares portugueses na África, mesmo daqueles (e foram muitos) com quem discordo profundamente mas a quem admiro a valentia e a convicção.

Não era, contudo, o caso, nem dos cento e cinquenta jovens de Guileje, não contando os civis que têm também de ser contados, nem o da larguíssima maioria dos que deram a vida inutilmente numa guerra de ocupante contra libertador, ainda por cima nas costas dos ventos da história.

O próprio Comandante Chefe [, Spínola,] de quem não sou admirador por aí além, mas a quem não recuso as qualidades de militar e a coragem física e psicológica, ele próprio, assumira há muito que a guerra estava perdida e que era apenas possível salvar a face do exército se os políticos estivessem ao seu nível.

E era num quadro destes e na realidade da situação que se vivia naquela altura em Guileje, que a honra da Companhia teria de ser salva com a resistência total e assumindo que isso poderia custar dezenas e dezenas de vidas jovens, provavelmente mais que as dezenas que o Constantino aceita ceifadas em Guidaje.

Em termos de opinião aceito abertamente e com amizade a camaradas que a expressam de modo diferente da minha porque pensam de modo diferente e aceitam também qualquer cotejo ou debate sério sem dispensarem o abraço solidário.

Quem lê Vindimas no Capim pode encontrar mesmo o perigoso exercício que realizo (eu e o Filipe Bento) de entender motivações e mecanismos sociais que levavam jovens à Legião Portuguesa e até à Pide, podendo, se tivessem outras oportunidades, ser gente diferente e na outra margem.

Tenho grandes dificuldades, confesso, para aceitar a expressão de desumanidades, mesmo quando brotam de uma profunda ignorância sobre as aspirações dos seres humanos em qualquer ponto do Globo, independentemente de credos políticos ou religiosos. E menos ainda quando procuram apoucar outros seres humanos que comeram do mesmo prato no calor da Guiné e tinham a responsabilidade das vidas que pais, esposas e filhos lhe haviam entregue à despedida e esperavam a devolução correndo o tempo certo.

A Tabanca Grande tem todo o direito de aceitar dentro de si ta(l)is indivíduo(s). Provavelmente nem seria correcto negar-lhe(s) entrada quando a requerem.

Caso diferente, ou pelo menos a mim me soou, é o convite gentil, com uma simpatia que me pareceu exagerada e salamalequeira(?).

Obviamente. Sei e sempre o pratiquei como dirigente sindical, que à mulher de César não basta ser séria. Tem também que o parecer, às vezes até por exagero.

O defeito é meu, está visto. E sendo meu, o defeito, algumas dúvidas se levantaram sobre a obrigação de dividir o ar caloroso da Tabanca Grande com gente assim.

Deus me perdoe. E que o Luís também.

Abraços
José Brás


(ii) Do Antóno Matos (foto, à esquerda):


Neste momento, as minhas reflexões assumem um estatuto declaradamente indefinido quer pela catadupa de postes e comentários, quer por alguma ininteligência que me coarta a hipótese de perceber, não só o teor mas, fundamentalmente, as ideias do(s) autor(es) na voragem de ataques e contra-ataques na derradeira finalidade de uns ficarem a ganhar em relação a outros ...

O insulto explícito ou mesmo soez começou a dar passos decisivos para que se institucionalize o seu uso no blog sem que se vislumbre outra coisa que não seja demonstramos que somos possuidores da verdade única e indesmentível e que será atirado para a pira justiceira quem fôr contra mim ...

Claro que não fico indiferente às manifestações de protagonismos exacerbados, não por que me melindrem, mas antes porque são ofensivos de todos aqueles que não têm capacidade para intervir;

Claro que escouceio perante primarismos políticos (melhor será dizer pseudo-políticos) dos que gritam a sua verborreia facciosa, convictos de uma autoridade que estão por demonstrar serem portadores;

Claro que não recebo lições de pretensos estrategas militares que mais se parecem com os treinadores de bancada que saem da cova do seu anonimato às 2ªs feiras, de preferência na cadeira do barbeiro ou na tasca lá do bairro para discutirem aquele pontapé para as bancadas, aquela cabeçada desajeitada, aqueloutra contratação do técnico que não percebe nada de futebol e se esquecem, tão simplesmente, que a bola ... é redonda;

Uma vez mais (isto é cíclico!) Guileje está na moda no blog. Que bom deve ser a avaliar pela literatura produzida ....

Não conheci o major Coutinho e Lima nem conheço o coronel. Estou àvontade para construir a imagem que muito bem me aprouver sobre ele e sobre quem hoje relata os mesmos acontecimentos das formas mais opostas possível.

Considero entediante voltar ao tema mas há pormenores dignos de reflexão. Da célebre retirada heróica, humana e humanitária, passa-se, num esfregar d'olhos, a uma fuga cobarde e incompetente.

Dum quartel cercado e sem qualquer hipótese de ripostar a um eminente massacre, passa-se a uma retirada ordeira, em fila indiana, as pessoas com as malas feitas, armas a tiracolo, em pleno dia (é o que mostram as fotos publicadas à exaustão) , e com aquele espectáculo digno do ilusionista Luís de Matos onde várias centenas de pessoas passam despercebidas dos sitiantes, sem que estes, sequer, pestanejassem!

E o actual coronel, de besta, passou a bestial em meia dúzia de meses aqui neste blog e há quem idolatre a temeridade do nosso inimigo e hoje o cubra de elogios para quem só faltava os condecorássemos!

Não se queiram branquear os célebres relatórios fantasmas!

Já escrevi neste blog o que se passou comigo em Augusto Barros quando, após uma flagelação que sofremos de alguma intensidade, e perante a alarvidade do comando em Bula (na tentativa de esconder a Bissau que a zona não estava limpa), foi forjado um RELIM para o COM-CHEFE onde se desautorizava a informação emanada do destacamento com a simples justificação de que tudo não passou duma confusão do pessoal uma vez que comemoravam na altura, o aniversário dum furriel !!!

Querem um relato cronológico ? Lá vai:

1º - Em 05/11/1971, às 22 horas, flagelação ao destacamento ;

2º - Segue RELIM para Bula ;

3º - O comando em Bula decide que "aquilo" não foi uma flagelação e pára o RELIM ;

4º - Na troca de operador de transmissões na madrugada, o soldado que entra de serviço, desconhecendo a "moscambilha" e vendo um RELIM, de imediato o mandou para Bissau;

5º - De manhã, o comandante, sabedor da gafe, emite outro RELIM a desdizer o inicial;

6º - Entretanto o general Spínola, conhecedor do 1º RELIM, fez o habitual - voou para Augusto Barros;

7º - Cumpridas as formalidades, o general regressou aos seus aposentos;

8º - Uma vez em Bissau, apercebe-se do 2º RELIM e diz : "estão a gozar comigo" ?

9º - Querem saber o resto da história ?

10º - A 16 de Novembro fomos mandados para a sede do batalhão para a construção da estrada Bula-Binar;

11º - E depois desmontar as 16.000 minas !!!

E com todas estas "habilidades" ainda há quem se faça de entendido e tome os outros por parvos ...

Por respeito aos que morreram em Guileje ou em Bula ou em qualquer outro pedaço de terra daquele território, sejamos comedidos nas apreciações pessoais à realidade daqueles tempos e tenhamos a honestidade intelectual de perceber que cada um viveu os acontecimentos sob um determinado ponto de vista diferente do do camarada que estava ao seu lado, com motivações igualmente diferentes e nem por isso menos verdadeiras.

Deixemos a retórica para os livros e resguardemos o blog, então, para as nossas estórias.

António Matos

(iii) Comentário de L.G.:

Não me fica bem comentar os comentários... Mas, de vez em quando, temos que olhar para o nosso umbigo, contra-parafraseando o nosso Alberto Branquinho... Devo dizer que não sei para que serve, o umbigo. Mas a natureza, se o lá pôs, é por que algum préstimo tem (ou já teve)...

E aqui devo começar por dizer que o mais importante do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, não é o Luís Graça, mas sim os camaradas da Guiné... Nem sequer gostaria de ser o primus inter pares, o primeiro entre iguais... Se o sou, é por razões históricas, circunstanciais... Além disso, o primeiro poste é dirigido ao Carlos Vinhal, que é o editor de serviço. Se sou interpelado, é por causa da minha ambição (quiçá excessiva e utópica) de tentar criar e alimentar,desde Abrild e 2005, um blogue inclusivo (onde caiba tudo ou quase tudo, ou melhor, todos ou quase todos...).

Concordo com o António de Matos: o nosso blogue é um blogue de histórias/estórias, de actores, não de espectadores (muito menos de treinadores de bancada ou comentadores desportivos...). Acontece é que crescemos, talvez demasiado... E com 350 moranças e mais de 4600 postes, às vezes há crise de matéria-prima, e começam a falhar as histórias e as memórias.... (Esgota-se o poço, como diz o Miguel Pessoa)...

Mesmo numa caserna virtual como é a nossa Tabanca Grande, onde teoricamente o espaço é expansivel, há problemas de tolerância, de convivialidade, de identidade, de interacção, de comnunicação... O José Brás vem publicamente, e com a frontalidade que é timbre da sua maneira de ser e de estar, pôr a questão (delicada) do desconforto que é de ter de tratar por tu (e chamar camarada a) certos camaradas...

Mas esta é a regra de ouro do nosso blogue: camarada não implica mais nenhuma afinidade do que a de se ter estado na guerra da Guiné (do ultramar ou colonial, como se queira) e de ter dormido, fisica ou simbolicamente, na mesma cama (camerata, em latim), no mesmo abrigo, no mesmo Bu...rako. Camarada não tem mais nenhum outro significado ou conotação.... (Claro que tem, inevitavelmente: vestíamos a mesma farda, usávamos a mesma G3, tínhamos a mesma bandeira, falávamos a mesma língua, pisávamos as mesmas minas, éramos alvejados, mortos ou feridos pelas mesmas balas, etc.).

Agora o que nós tentamos, aqui, todos os dias, é fazer deste blogue um lugar de tolerância, de respeito mútuo, de partilha de valores essenciais como os da liberdade, da verdade e da equidade, etc.

O nosso maior denonimador comum é a guerra da Guiné, nem sequer é a Guiné ou Portugal, muito menos uma certa ideia para a Guiné ou para Portugal... Não somos um blogue ideológico, escrevemos hstórias, partilhamos afectos...

Claro que a partilha de memórias e de afectos também impõe limites à nossa liberdade de expressão... Daí as dez regras de ouro, que criámos, e que são os marcos que balizam o nosso caminho ou melhor o nosso convívio (hoje, não o do passado). Como andam esquecidas, vou aqui relembrá-las (no fim, em anexo).

Dito isto, e pegando ainda nas palavras do José Brás, eu só queria acabar citando uma frase que, permitam-me a vaidade (cá está o umbigo!), é imputada ao célebre Camilo Castelo Branco e a um tal Luís Graça: Questões de honra (e, por extensão, de propriedade e de razão) acabam ao tiro em Trás-os Montes, à chapada ou à paulada no Minho e no Douro Litoral e... em gestos obscenos e demissão de ministros, em Lisboa.

Um Oscar Bravo pelos vossos comentários. Um Alfa Bravo, do camarada Luís Graça.


PS 1 - É importantíssimo que o blogue tenha semppre pessoas críticas, como vocês, ou o meu amigo Vitor Junqueira, tertuliano das primeiras horas, cujo saudosismo saudável e desalinhamento bloguístico, eu aprecio e partilho, em parte: "Ah, quantas saudades do Blog dos primeiros tempos! Tudo se contava na primeira pessoa. Era tão simples, directo e autêntico" (*)...

Os críticos, os pertencentes tanto a grupos estratégicos como grupos conservadores (incluindo os velhos do Restelo, os reaccionários e os resistentes à mudança pela mudança...), são importantes, nos grupos, para se prevenir efeitos preversos com o autismo social, a formatação do pensamento de grupo, o desvio de objectivos, a confusão do desejo com a realidade ou a tragédia da liderança do cego que leva outros cegos para o abismo... (Veja-se o que aconteceu com a élite político-militar do Estado Novo a quem coube, historicamente, fazer a liquidação do Império Colonial).

PS 2 - "Quer é calma" era o nome de um barco de pesca que encontrei, há tempos, em São Jacinto, na Ria de Aveiro, a apodrecer... É também uma expressão típica do meu velhote, que vai fazer 89 anos em 19 de Agosto de 2009, se lá chegar... Usava a expressão, quando as vozes se alteravam no seio da família... A expressão, às vezes, irritava-me... Comecei mais tarde a perceber a sua filosofia de fundo, não como a maneira típica de gerir conflitos entre nós, portugueses, evitando-os ou atenuando as diferenças (de valores, de percepção, de recursos...) entre os protagonistas, mas como condição prévia para se construir consensos (uma arte difícil, que exige tempo, sabedoria, paciência, capacidade de negociação, etc., já que consenso não é unanimidade ou unanimismo nem muito menos paz podre)...

Com muito ruído, histeria, excessos de linguagem, insultos, fulanização, tiros para o ar, cheiro a pólvora e a sangue, emoções à flor da pele, etc., não há condições para se resolver, de maneira positiva e construtiva, os conflitos que nos dividem (e que nos podem destruir, ou pelo menos dar cabo das melhores ideias, intenções e projectos de que o inferno, aliás, está cheio)...

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As nossas regras de convívio da nossa Tabanca Grande:


Neste espaço, de informação e de conhecimento, mas também de partilha e de convívio, decidimos pautar o nosso comportamento (bloguístico) de acordo com algumas regras ou valores, sobretudo de natureza ética:

(i) respeito uns pelos outros, pelas vivências, valores, sentimentos, memórias e opiniões uns dos outros (hoje e ontem);

(ii) manifestação serena mas franca dos nossos pontos de vista, mesmo quando discordamos, saudavelmente, uns dos outros (o mesmo é dizer: que evitaremos as picardias, as polémicas acaloradas, os insultos, a violência verbal);

(iii) socialização/partilha da informação e do conhecimento sobre a história da guerra colonial, luta de libertação ou guerra do Ultramar (como cada um preferir);

(iv) carinho e amizade pelo nossos dois povos, o povo guineense e o povo português (sem esquecer o povo cabo-verdiano!);

(v) respeito pelo inimigo de ontem, o PAIGC, por um lado, e as Forças Armadas Portuguesas, por outro;

(vi) recusa da responsabilidade colectiva (dos portugueses, dos fulas, dos balantas, etc.), mas também recusa da tentação de julgar (e muito menos de criminalizar) os comportamentos dos combatentes, de um lado e de outro;

(vii) não-intromissão, por parte dos portugueses, na vida política interna da actual República da Guiné-Bissau (um jovem país em construção), salvaguardando sempre o direito de opinião de cada um de nós, como seres livres e cidadãos (portugueses, europeus e do mundo);

(viii) respeito acima de tudo pela verdade dos factos;

(ix) liberdade de expressão (entre nós não há dogmas nem tabus);

(x) respeito pela propriedade intelectual, pelos direitos de autor... mas também pela língua (portuguesa) que nos serve de traço de união, a todos nós, lusófonos.

Luís Graça & Camaradas da Guiné


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Notas de L.G.:

(*) 5 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4643: Blogoterapia (113): Saudades do blogue dos primeiros tempos, em que tudo se contava na primeira pessoa (Vítor Junqueira)

(**) 3 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4634: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (13): A desonra da CCAV 8350 ou o direito a contar a minha versão... (Constantino Costa)