terça-feira, 4 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8856: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (25): De Bissau a Kiev ou o percurso de um ex-rafeiro (Parte I) (Cherno Baldé)

1. Mensagem, de ontem, do nosso querido amigo e irmãozinho Cherno Baldé [, foto à esquerda, quando estudante em Kiev, em Maio de 1986]:


Caro amigo Luís Graça,

Juntamente, envio um texto de algumas páginas, onde transcrevo recordações do meu tempo de estudante em Bissau e das peripécias de uma viagem para estudos na ex-URSS.

Este texto também se enquadra, se concordarem, nas crónicas de memórias do Chico, menino e moço (*), versando um  ângulo diferente das crónicas anteriores a que os bloguistas, membros da nossa Tabanca Grande,  estarão habituados, mas tratando-se do mesmo estilo e da mesma vontade de informar, trocar impressões e de discutir ideias e paixões que me animaram desde o princípio, quando descobri, pela primeira vez,  os trilhos que me levaram à sombra deste poilão onde se abrigam alguns dos irreverentes soldados que outrora conheci e a que me juntei, por força do destino, nos aquartelamentos e nos campos de futebol improvisados, para viver alguns dos momentos mais divertidos da minha infância e que me marcaram para sempre, influenciando a minha forma de ser e de estar na vida, o trajeto de um antigo rafeiro que se fez homem da nossa atualidade emergente e global.

Se acharem que tem algum interesse para divulgação, dou o meu consentimento para publicarem conforme lhes convier.  

Um grande abraço deste vosso amigo e irmão,

Cherno Abdulai Baldé - Chico de Fajonquito.


2. DE BISSAU A KIEV OU O PERCURSO DE UM EX-RAFEIRO (Parte I)

por Cherno Baldé


(i) De Bafatá, a cidade de todos os sofrimentos, a Bissau onde  irá terminar, em 


Após cinco longos anos passados na cidade de Bafatá, em Setembro de 1979, o Chiquinho rumou para Bissau onde devia continuar os estudos. Do grupo de mais de cinquenta estudantes que com ele tinham vindo de Fajonquito e Contuboel, já não restavam, na corrida, mais do que cinco.

A viagem de Bafatá a Bissau já não se fazia de barco, como antigamente, mas por via terrestre, em autocarros de uma empresa pública (Silo Diata) que seguiam por uma estrada tortuosa penetrando o Óio pelas localidades de Banjara e passando depois por Mansabá e Mansoa, com as suas vendedeiras de sandes a enxamear a estrada de saída para Bissau. Nesta época de magras receitas, são muitas as famílias que vivem do labor fortuito destas incansáveis Bideiras de rua.

Mesmo se a euforia dos primeiros anos da independência ainda continuava a alimentar as nossas jovens esperanças, entretanto, muita coisa tinha mudado, pode-se dizer mesmo que, passados os primeiros cinco anos de independência, a auréola do partido libertador estava muito ofuscada. Tinham conseguido, em pouco espaço de tempo, relativo sucesso na industrialização do país, com fábricas e importantes investimentos em projetos agrícolas para experimentação e vulgarização de técnicas e variedades de arroz (DEPA’s), mas ao mesmo tempo, a fome que grassava nas cidades, apelidada por fome de Luís Cabral, ameaçava criar fissuras no novo e frágil edifício da construção da unidade nacional.

O governo, recusando-se a importar alimentos, apostava na capacidade da produção interna numa economia pequena, fraca e extrovertida caraterizada por uma baixa produtividade e com nível elevado de pobreza. Nessas condições, tratava-se de uma decisão politicamente bem justificada, mas economicamente mal aplicada cujas consequências imediatas serviriam de pretexto para o golpe militar de 1980 que tinha posto fim ao primeiro governo saído da independência.


(ii) De Bissau a Quinhamel: 

Em Bissau o Chiquinho encontrou o que não havia em Bafatá, sítios ideais para fugir da realidade e esconder-se da fome, chamavam-se bibliotecas. Foi nessa altura que ele deixou de ser o estudante aplicado, de caderno na mão, que sempre fora e passar a ser um rato de biblioteca, donde só saía para ir às aulas.

Adquiriu uma predileção especial na leitura de biografias de destacadas personalidades do mundo político, desde figuras sublimes e pacifistas onde pontilhavam o Mahatma Ghandi e Martin L. King, a algumas sulfurosas e místicas como Adolf Hitler ou do tipo subversivo e oportunista como Joseph Goebbels e Vladimir I. Lenine que, no fundo eram tão infelizes e solitários como ele próprio.

Quando terminava esta série, passava para os romances de Jorge Amado, vivendo os destinos trágicos dos seus personagens sui generis, tirados das favelas e praias de pescadores do nordeste brasileiro.

Dessas leituras deve ter cultivado, o Chiquinho, certa irreverência, sentido crítico e o pessimismo que ainda o caracterizam, assim como certa tendência para a evasão. Ele vivia no Bairro de Cupelum-de-Baixo em casa de um familiar, ex-combatente, e o sítio mais próximo era a embaixada da Líbia, na rua Pansau-Na-Isna, que liga o QG ao Hospital Simão Mendes, e onde metade do espólio era constituído por livros de Muahamar Kadhafi de conteúdo intragável mesmo para um aprendiz de revolução, ainda verde.

Em Junho de 1982, com o término do ensino secundário no liceu Kwame N’krumah (antigo Honório Barreto) de Bissau, tinha-se cumprido, finalmente, uma meta importante na sua vida que, alguns anos antes, não passava de um sonho longínquo. Tinha sido necessário percorrer um caminho bastante atribulado e consentir um enorme sacrifício pessoal. Fazer o 7° ano dos Liceus ou finalizar, como se dizia na altura, era um objetivo a que muito poucos jovens da sua geração e condição social podiam almejar.

Pensando agora no futuro, ele tinha feito um pedido no Ministério da Educação solicitando um lugar para lecionar como voluntário, condição que, em princípio todos deveriam preencher antes de pretender candidatar-se a bolsa de estudos para o exterior, mas a que, na verdade, alguns conseguiam esquivar-se, acedendo diretamente às bolsas para países da sua escolha. Eram todos iguais, mas uns eram mais iguais que outros. Mais que poder continuar os estudos, a sua maior expetativa residia, de facto, na possibilidade de poder voar para longe, conhecer outros países, outras gentes, outras bibliotecas.

(iii) Mais vale a sétima sorte do que o sétimo ano, diziam os vizinhos invejosos de Fajonquito

A seguir, ele aproveitou para visitar a família durante as férias grandes (de Agosto a Setembro) em Fajonquito. Na verdade tratava-se de uma visita de regozijo pessoal para acenar aos colegas o seu estatuto de finalista. Durante muitos anos tinha sonhado com este dia, imaginando os mais diversos cenários, como se o mundo fosse mudar com este trivial acontecimento. No fim, não só não aconteceu nada de especial, mas ainda teve que ouvir e engolir alguns ditos maldosos de colegas e de pais invejosos que diziam na sua cara preferir a sétima sorte em lugar do sétimo ano.

A sétima sorte, onde estava ela!?... O Chiquinho não sabia que o trabalho e o esforço pessoal pudessem dar a tal sétima sorte. Tratava-se de palavras ocas, carregadas de inveja e de mesquinhez de gente que era incapaz de fazer melhor. O seu pai, esse, estava feliz, imaginando poder contar em breve com a sua contribuição no sustento da numerosa família.

Quando voltou à capital já tinham feito a colocação sem contar com ele. Por preencher restavam somente alguns postos de escolas situadas em localidades pouco atrativas. Assim, ele teve que escolher entre uma escola de Susana e outra de Quinhamel. Sendo originário do leste, era a primeira vez que ouvia falar dessas duas localidades, pelo que se deixou guiar pela intuição e pela música da intonação. Escolheu Susana, bonito nome, e parecia-lhe estar a ver a aparência das meninas locais, susanamente lindas. Devia voltar no dia seguinte para as formalidades.

“Deus ki ta bana baka ki katen rabu” (É Deus quem afasta as moscas da vaca sem rabo), diz um provérbio guineense e foi o que aconteceu com ele. No dia seguinte já só restava uma única possibilidade, a de Quinhamel, alguém tinha ocupado o posto de Susana. Ainda bem. Só muito mais tarde saberia da sorte que acabava de ter. Nesse mesmo dia pegou na guia de marcha sem perder mais tempo e foi descobrir,  não muito longe de Bissau,  uma pequena vila adormecida à volta de palmeirais e cajueiros e pendurada nos dois lados da estrada entre Bissau e Pikin, nas margens do oceano atlântico.

No fundo, o local de afetação era-lhe indiferente desde que não se chamasse Bafatá, a cidade de todos os sofrimentos. Assim, Quinhamel ultrapassaria todas as suas expetativas. Tinha uma escola nova, construída e equipada pela cooperação sueca, um excelente ambiente de vida e camaradagem entre os educadores pouco educados que eles eram, longe dos rigores religiosos do chão fula e muçulmano onde o gesto mais banal era um sacrilégio, onde jovens ainda na flor da idade tinham que encher os ouvidos com sermões obscuros em que o último dos profetas distribuía lugares no cruzamento entre o fogo do inferno e a frescura da glória.

Em Quinhamel residiam meninas simpáticas vindas das localidades circunvizinhas. Os costumes locais, superficialmente tocados por uma igreja católica que o advento da independência colocara fora de jogo, eram muito brandos,  o que favorecia um convívio mais livre e saudável entre os jovens. Nos fins de semana ele voltava a Bissau para informar-se das notícias da família.

Aqui, de forma inesperada, ele começou a frequentar a missão católica local onde fez amizade com uma diocesana brasileira (Irma Beatriz) que lhe ensinava a arte de tocar violão com a Bíblia por baixo e, também, começou a colaborar nas atividades da Juventude do partido (JAAC) através de colegas que faziam parte da sua direção regional e, por esta via, circulava muito entre as aldeias da zona, integrando, por vezes, as comissões de redação no decorrer das conferências do partido que se organizavam todos os anos.

Se bem que colaborasse com a Juventude [do PAIGC], no seu forro íntimo, detestava o partido pelos crimes cometidos na sua terra natal e tinha guardada dentro de si a promessa de nunca integrar as suas fileiras. Estes encontros, já sem qualquer interesse político, eram momentos de verdadeiras orgias festivas onde as bebedeiras eram uma constante. Não era raro acontecer em plena reunião que grande parte dos distintos camaradas delegados estivesse a dormir numa boa, embalados pela monotonia dos discursos e pelo vinho de caju, abundante na região. Sem o saber, esta sua aparente adesão viria a ser importante para a obtenção da bolsa de estudos.

Dois anos mais tarde, o Chiquinho fez o pedido da bolsa para o estrangeiro, com boas referências da comissão regional da juventude de que fazia parte, ainda assim, só viria a ser atendido em 1985. Neste ano, ele fez parte do grupo de estudantes contemplados com bolsa de estudos para a URSS.

Depois de ter encabeçado durante muitos anos a sua lista de preferências, curiosamente, [a URSS] já não era o país que mais desejava, mas seria uma grande sorte se conseguisse partir. Durante alguns meses reinou a dúvida e a incerteza quanto à viagem, devido a informações contraditórias e às mudanças de última hora nas listas de bolseiros. Ele acreditava tratar-se da tal “sétima sorte” de que tanto ouvira falar na sua aldeia, durante as férias.

Pensando bem, havia muito tempo que convivia com ela, a sétima sorte, desde os dias em que ainda criança, armado com um simples bastão, seguia atrás de manadas de gado bovino em louca correria, fugindo das rajadas de vento carregadas de chuva, pelas bolanhas de Berecolon, zonas deixadas há muito para a gente do mato ou quando se pendurava escondido, nas traseiras de um velho Unimog que ia buscar água para a tropa em Contuboel, no rio Geba, a uma distância de 30 km, colocando o seu amigo Dias perante o facto consumado.


(Continua)

[Fixação / revisão de texto, L.G.]

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Nota do editor:
 
Último poste da série 23 de Março de 2011 > Guiné 63/74 - P7986: Memórias do Chico, menino e moço (24): Versos da juventude (Kiev, 1987/90; Bissau, 1990) (Cherno Baldé)


Guiné 63/74 - P8855: Convívios (379): 1º Encontro da CCAÇ 6, Onças Negras, e outro pessoal de Bedanda... Dia 5 de Novembro, na região da Bairrada: 2.º anúncio (António Teixeira)



Como chegar

1. Mensagem do nosso camarada António Teixeira (ex-Alf Mil da CCAÇ 3459/BCAÇ 3863 - Teixeira Pinto, e CCAÇ 6 - Bedanda; 1971/73), datada de 3 de Outubro de 2011, com notícias sobre o I Encontro dos "Bedandenses" a ocorrer no próximo mês de Novembro:

Camaradas e Amigos
Já está confirmado o local do nosso 1.º Encontro.
Será no Restaurante Portagem, na Mealhada.

Escolhi sobretudo este local, pois tem um acesso muito simples, sendo praticamente impossível alguém não o encontrar.

Utilizando a A1 (Porto/Lisboa), é só sair na saída Mealhada e cerca de 1Km após a portagem, vêem logo do vosso lado direito um grande prédio (trata-se também de uma pousada) com o nome do restaurante. Junto anexo também um mapa para mais fácil identificação.

A ementa constará do seguinte:

- Entradas (rissóis, pastéis de bacalhau, croquetes e afins)
- Sopa
1 prato de bacalhau ( já me disseram qual era, mas francamente não o fixei)
- Leitão da Bairrada
- Sobremesa
- Bolo comemorativo do encontro
- Vinhos da casa
- Espumante

O preço deste repasto que consegui arranjar foi de €28,00 por pessoa.

A quem não agradar a ementa, há sempre bianda com fartura.

Agora vou precisar com a máxima urgência que me confirmem a vossa presença, pois necessito de comunicar ao restaurante o número de pessoas presentes.

Para já confirmaram:

Figueiral, Vasco, Carvalho, Mário Bravo, Nuno Ferreira, Dino, Carlos Azevedo, Naia, Luis Nicolau e Hugo Ferreira. O Luis Graça (Padrinho do encontro), também vai estar presente, nem que a gente o traga de cadeira de rodas ou moletas, visto que uns dias antes irá ser operado.


Já agora gostaria de saber se alguém sabe destes dois que tão bem tratavam os leitões. Sei que eram bos, um o Gonçalves que trabalhava na messe de oficiais e que creio era de Braga e o outro era o Cabo Fará, creio que transmontano. Se alguém souber dos seus paradeiros, por favor contactem comigo.

E por agora é tudo. Até breve e aquele grande abraço.

António Teixeira

Fotos (e legendas): © António Teixeira (2011). Todos os direitos reservados.

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Nota de CV:

Guiné 63/74 - P8854: In Memoriam (93): Homenagem do povo de Vale de Espinho aos seus filhos que perderam a vida na Guerra do Ultramar (José Corceiro)


1. Mensagem de José Corceiro* (ex-1.º Cabo TRMS, CCaç 5 - Gatos Pretos , Canjadude, 1969/71), com data de 2 de Outubro de 2011:

Caros amigos, Luís Graça, Carlos Vinhal, J. Magalhães.
Deixo ao vosso critério publicar, ou não, o texto que envio, assim como as respectivas fotos, que junto em anexo.

Um Abraço
José Corceiro


Homenagem do povo de Vale de Espinho aos filhos que perderam a vida na Guerra do Ultramar

Estimados amigos
Estive no passado mês de Agosto, em Vale de Espinho, Sabugal, minha Terra Natal. A minha sensibilidade enterneceu-se num estranho miscigenado, de satisfação, sofrimento, orgulho e saudade, ao deparar e ser surpreendido, com um singelo memorial erigido pelo povo de Vale de Espinho, a homenagear os dois combatentes, mancebos Valespinhenses, que tombaram e derramaram o seu sangue, em terras de África, onde perderam a vida na Guerra do Ultramar. Foram eles: Francisco Vaz Silva e José Martins Cobrado.

Foto 1 - Memorial, erigido pelo povo, de Vale de Espinho, a homenagear os dois combatentes Valespinhenses que tombaram na Guerra do Ultramar.

O monumento é simples, mas transmite o resumo duma mensagem carregada de respeito e estima. É um memorial constituído por um pedestal de granito, pedra hirta, consistente e nobre, da zona, no qual foram cravadas três lápides de mármore preto, a simbolizar a saudade e o luto, lápides onde foram gravadas letras em baixo relevo, banhadas a ouro, exprimindo o carinho e o reconhecimento dum povo. Foi colocado num espaço público ajardinado, à entrada do Largo das Eiras, em frente do Centro Social Paroquial, da aldeia, junto ao café do “Freu”. Os meus dois conterrâneos, que tombaram em combate, tinham praticamente a minha idade e deixaram-nos no auge da sua mocidade, no ano de 1969.

Fiquei agradado e muito agradecido, ao Sr. Presidente da Junta da Freguesia, de Vale de Espinho, José Faixa, por ter tido a humanidade e a lembrança de honrar e recordar os dois jovens, filhos da povoação, que tão novos perderam a vida a lutar, numa guerra injusta, no solo do Ultramar. Guerra indevida, para mim, porque os nossos estadistas e governantes não souberam interpretar e respeitar o sopro dos ventos, que há muito se faziam sentir, através de sinais e acontecimentos explícitos, que exigiam mudanças históricas, mas não foram devidamente ajuizados para evitar que a guerra se desencadeasse…

Eu escrevi, no dia 1 de Junho, de 1969, em Bissau, nos meus apontamentos diários onde anotei, quando tinha somente dois dias de Guiné, mais ou menos o seguinte: “...Sou por natureza bucólico, encanta-me o campo, a paisagem a floresta, e admirou-me o percurso que medeia entre o DGA e Bissau, de aspecto árido e tórrido, a contrastar com o arvoredo frondoso e acolhedor da bolanha, onde umas mulheres lavavam a roupa…. Foi muito agradável ver as lavadeiras, algumas completamente nuas e sem ruborescerem perante os “mirones” presentes. De entre elas, sobressaiu uma, mais atrevida e desinibida, que ao ver o nosso olhar maroto carregado de intenção maliciosa e aveludado de desejo concupiscente, dirigiu-se a um dos meus amigos em termos críticos e desafiantes, gesticulando e prenunciando palavras provocadoras...

Para o meu íntimo, estes momentos a que venho assistindo, já são reveladores do fosso cultural existente entre nativos e metropolitanos. Começam-me a aliciar a idiossincrasia e a genuidade do povo guinéu, despido de formalismos e preconceitos; para mim este modo de vida, é pureza, conduta simples e natural, é como um ode da natureza a louvar a criação do homem… Assim se inicia mais um despertar em mim! Por um lado a intuição, por outro o raciocínio, começo a ficar sobressaltado e a entender que aqui há outra cultura, outra forma de ser e estar na vida, eles, os nativos, estão no seu habitat. Temos o dever de os respeitar, pois nós estamos desintegrados, eu sou invasor!...”

O primeiro mancebo da minha terra, Vale de Espinho, que tombou em combate, no Ultramar, Francisco Vaz Silva, era meu tio, irmão da minha querida e saudosa mãe. Além de tio, foi amigo e companheiro de infância, nas nossas brincadeiras de meninice, pois éramos praticamente da mesma idade e frequentámos a mesma turma escolar.

Foto 2 - Sepultura, no cemitério de Vale de Espinho, onde jazem os restos mortais de Francisco Vaz Silva.

Recorte com a notícia que saiu na imprensa regional, quando se realizou o funeral do meu tio.

O meu tio, juntamente com outros amigos, como era frequente na época, 1965, com apenas 18 anos, foi “a salto” para terras de França, à procura de melhor qualidade de vida e porque não dizê-lo, também para se alhear da Guerra do Ultramar… Estava profissionalmente bem integrado na sociedade do país que o acolheu, onde era estimado e valorizado, quer no trabalho que executava, quer nas relações inter-sociais com os amigos de convivência, e tinha sempre presente os meus avós, para os quais enviava com regularidade dinheiro. Mas um grito interior agitava-lhe as entranhas, e ouvia a voz bradante do chamamento da Pátria amada, que clamava pelos seus ditosos filhos e, com 21 anos, regressou voluntariamente à terra que o viu nascer, carregado de animosidade e cheio de esperança, desejava calar o grito que lhe invadia a alma e o impulsionava de regresso às origens… O bramido das Raízes!…

Foto 3 - Da esquerda para a direita: (eu) José Corceiro, Filipe Neto, José Manuel Pedro e meu tio Francisco Vaz Silva. Quando a foto foi tirada, tínhamos de idade 13, 14 anos.

Na companhia do meu e seu grande amigo, também emigrado, José Manuel Pedro, regressaram os dois ao seu País Natal e apresentaram-se de seguida no Regimento Militar, da área de residência, para se disponibilizarem a cumprir o dever de cidadania e serem integrados no serviço militar, para servir a Pátria. Tiraram a recruta, no Batalhão de Caçadores 6, em Castelo Branco, finda a qual foram logo mobilizados, pelo RC 4, para Angola, integrados na CCav 2431/BCav 2854 colocado em Zala. Após curta estadia em Angola, ainda com 21 anos de idade, o dia 4 de Fevereiro, de 1969, tombava em combate, Francisco Vaz Silva, na presença do seu grande e inseparável amigo, José Manuel Pedro.

O funeral do meu tio realizou-se, em Vale de Espinho, o dia 23 de Junho, de 1969, passados quatro meses e meio após a sua morte, já eu tinha sido mobilizado para o Ultramar e estava na Guiné.

Foto 4 - O nome do meu tio, na Venera Nacional, entre a extensa lista dos Combatentes que tombaram na Guerra do Ultramar, cujas placas estão junto do Monumento Nacional aos Combatentes do Ultramar, em Lisboa.

Foto 5 - Monumento Nacional aos Combatentes do Ultramar, em Lisboa.

O José Manuel Pedro, após o regresso do Ultramar, iniciou o namoro com uma prima minha e acabaram por contrair matrimónio. Constituíram e organizaram bem a vida, com sucesso e desafogo e dessa união, nasceram duas filhas. Mas a vida às vezes é madrasta, e reserva-nos traiçoeiras surpresas e tragédias. O casal, meu amigo e parente, ofereceu há cerca de dez ou onze anos um carro e um apartamento à filha mais velha, que vivia em Viseu, onde trabalhava e estava a tirar o mestrado. Na passagem do ano, quando se dirigia sozinha para uma festa de amigos, a filha perdeu a vida num acidente, em Viseu, ao volante do carro que conduzia.

Mas a tragédia e o sofrimento não terminaram por aqui e, passado pouco mais de meio ano, após se ter dado o acidente que vitimou a filha querida, eis quando também é roubada a vida à outra amada e já única filha, com 16 ou 17 anos de idade! Ficaram estes pais, num desespero arrepiante, de causar dó e piedade, mergulhados numa vida vazia, a abarrotar de dor, angustia, desmotivação, saudade, recordações de tantos sonhos idealizados e não concretizados! Foi tudo num ápice, e afundaram-se vidas até então bem estruturadas, deixando o casal num turbilhão de incertezas existenciais, em que a vida se transformou num vácuo desabitado, em que o pendor da balança do infortúnio ficou a pesar só, num só sentido… em declive, com o peso do luto doloroso e insuportável, no prato da desesperança!

Um abraço e boa saúde para todos
José Corceiro
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 28 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8832: Filhos do vento (6): Os que ficaram por Canjadude (José Corceiro)

Vd. último poste da série de 8 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8750: In Memoriam (92): Homenagem às Grandes Mulheres, as nossas Enfermeiras Pára-quedistas que nos deixaram (Rosa Serra, ex-Enf.ª Pára-quedista / António Almeida, Fur Mil em Angola / Teresa Almeida, Liga dos Combatentes)

Guiné 63/74 - P8853: Parabéns a você (321): Artur Conceição, ex-Soldado TRMS da CART 630 (Guiné, 1965/67) e Inácio Silva, ex-1.º Cabo da CART 2732 (Guiné, 1970/72)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 3 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8848: Parabéns a você (320): Carlos Alberto Prata, Coronel de Infantaria, na situação de Reforma, ex-Cap CMDT das CCAÇ 4544/73 e CCAÇ 13 (Guiné, 1973/74) e Hélder Sousa, ex-Fur Mil TRMS TSF (Guiné, 1970/72)

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8852 Recortes de imprensa (50): Medalha de mérito militar chega 43 anos depois... A história do 2º Srgt Mil Libério Candeias Lopes, de Penamacor (CCAÇ 526, Bambadinca e Xime, 1963/65)

 1. A prova de que o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande, é ir encontrar um camarada de Penamacor, um raiano, no Jumbo de Alfragide, a fazer compras...

Estávamos os dois, lado a lado, na secção do leitinho meio gordo... Foi ele quem me reconheceu... Ou melhor, pusemo-nos a olhar um para o outro, feitos parvos... Demos um abraço e desatámos logo a falar do Xime, de Bambadinca, do blogue, de Penamacor, dos seus médicos, o Martins, o Ribeiro Sanches, e por aí fora... 

Quem haveria de ser ? Não o conhecia pessoalmente, só do blogue... Pois tratava-se do  Libério Lopes, Libério Candeias Lopes, professor do ensino básico reformado, 2º Srgt Mil,
CCAÇ 526 (Bambadinca e Xime, 1963/65)...  

Faz parte da nossa Tabanca Grande desde Fevereiro de 2009.  Com 71 anos, está em grande forma... mas não escreve mais coisas, no nosso blogue,  porque não se considera um às em informática...  Numa pesquisa na Net, encontrámos mais alguns elementos informativos sobre este camarada, que tem uma rica história de vida... e a quem eu desejo muita saúde, longa vida, e boa escrita!

O Prof Libério Lopes fez parte, recentemente,  da comissão de homenagem aos Combatentes da Guerra do Ultramar do Concelho de Penamacor (, iniciativa sobre a qual ele, de resto, me prometeu escrever, à despedida). Também conhece pessoalmente o nosso camarada C. Martins.


Guiné > Zona leste > Sub-sector do Bambadinca  >  CCAÇ 526 (1963/65) > Aquartelamento do Xime, onde estava destacado o pelotão do Libério Lopes
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Guiné > Zona leste > Sub-sector do Bambadinca  >  CCAÇ 526 (1963/65) > Aquartelamento do Xime, onde estava destacado o pelotão do Libério Lopes >  "À esquerda a nossa vivenda; á  direira o comércio do libanês Amin" (LCL)



Guiné > Zona leste > Sub-sector do Bambadinca  >  CCAÇ 526 (1963/65) > Aquartelamento do Xime, onde estava destacado o pelotão do Libério Lopes >  Da esquerda para a direita,  Fur Mil Virgílio e Tibério (falecido), Alf Mil Correia Pinto (falecido) e Fur Mil Libério.




  Guiné > Zona leste > Sub-sector do Bambadinca  >  CCAÇ 526 (1963/65) > Saltinho > O Fur Mil Libério Lopes na ponte do Saltinho

Fotos (e legendas): © Libério Candeias Lopes (2009). Todos os direitos reservados.

2. Resumo da actividade operacional da CCAÇ 526 (Bambadinca e Xime, 1963/65):

Recorde-se aqui os passos essenciais da vida do Libério Lopes, no TO da  Guiné, entre 19634 e 1965:

(i) Mobilizada pelo RI 7, a CCAÇ 526 embarcou, a 2 de Maio de 1963, a bordo do paquete «India», juntamente com o Comando dos BCAÇ n.º 506, 507, 599, e 600;

(ii) Comandante da subunidade: Cap Inf Luís Francisco Soares de Albergaria Carreiro da Câmara;
 
(iii) Até 30 de Junho de 1963, a Companhia ficou aquartelada em Brá; ainda neste período, de a 28/6/63, partiu um pelotão para Catió, tendo tomado parte em operações que aí se realizavam;

(iv) A 1/7/63, partiu a Companhia para a Zona Leste ficando a depender do Batalhão de Bafatá;.

(v) Foi-lhe atribuído um sub-sector com a área aproximada de 1.500km2  constituída pelos Regulados de Badora, Xime, Cossé, Cabomba e Corubal (parte Norte);

(vi) O Comando da Companhia ficou instalado em Bambadinca, tendo sido destacado um pelotão para Xime, nesse mesmo dia 1 de Julho;

(vii) A 15/7/63, outro pelotão da Companhia seguiu para o Xitole,  em reforço das tropas ali aquarteladas, donde regressou a 5/8/63;

(viii) Em 26/8/63, assumiu o Comando da Companhia o Capitão Hleder José Franbçois Sarmento;

(ix) No sub-sector, tomou parte nas seguintes operações de conjunto:

«8JUL63 e 12JUL63 na margem direita do Rio CORUBAL»;
«INGLÊS - JAN64»; 
«MARTE - FEV64»;
«BALA - MAR64»;
«VAI À TOCA - NOV64»; 
«BRINCO - DEZ6»;
e «FAROL - JAN65».

(x) Fora do sub-sector, actuou nas seguintes operações:

«OPERAÇÃO VERDE - NOV63»; 
«ESTRADA DO XITOLE - AGOSTO -OUTUBRO - NOV63»;
«MATO MADEIRA-CHICRI - JAN64»; 
«PATON - AGO64».

(xi) No sector à sua responsabilidade, o IN que já actuara a Oeste e Sul de Xime até ao Rio Corubal, levando para os matos uma parte da população e fazendo fugir a restante, tentou expandir a sua acção para Leste para o que atacou tabancas e quartéis, roubou culturas, emboscou as NT e procurou tornar intransitáveis as estradas;

(xii) A Companhia, por uma permanente actividade operacional à base de pequenas acções de combate, emboscadas, constantes patrulhamentos de estradas e caminhos e protecção às populações, permanecendo nas tabancas e locais de trabalho, conseguiu manter em completa normalidade a zona a Leste de Xime e levar a guerrilha a acantonar-se no mato;

(xiii) Durante os 21 meses de permanência no sub-sector, a Companhia teve 108 acções de fogo em contactos com o IN;

(xiv) Em resultado dessas acções, o IN sofreu 48 baixas confirmadas pelas NT, havendo contudo um número muitíssimo superior de mortos e feridos referido por prisioneiros;

(xv) Foram apreendidas 5 espingardas, 5 pistolas-metralhadoras, 1 pistola, grande número de granadas de mão de diversos modelos e vários milhares de cartuchos;

(xvi) Na tentativa de cortar os itinerários, o IN utilizou 15 engenhos A/C e 3 minas A/P. Um fornilho A/C destruiu um jipe  e os restantes 14 engenhos A/C foram detectados e levantados; as 3 minas A/P funcionaram, causando dois feridos: um às NT e outro à população;

(xvii) A Companhia só teve duas baixas por acidente e nove feridos em combate, um dos quais evacuado para a Metrópole. (Para saber mais, clicar aqui).


3. Reproduzido, com a devida vénia, do Jornal do Fundão, edição 'on line' de 29 de Abril de 2009 (Recorde-se que o prestigiado jornal  beirão, onde trabalha a nossa mui querida Ana Mendonça, foi fundado pelo António Palouro em 1946) (**)


Raia (JF Diário)

Medalha de Mérito chegou 43 anos depois  >  Libério Candeias Lopes [, foto a seguir, do nosso blogue,] teve uma surpresa há dias quando o informaram da atribuição de uma medalha de mérito
 
Após regressar da Guiné onde cumpriu serviço militar como sargento miliciano, Libério Candeias Lopes, [ , foto a seguir, crédito fotográfico do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné,] , volta à actividade na vida civil, professor do ensino primário. 

Decorria o ano 1965, tinha então vinte cinco anos. Desempenhou a profissão em diversas escolas do distrito de Castelo Branco, tendo sido posteriormente destacado na Educação de Adultos e Ensino Recorrente, exercendo nas freguesias de Salvador, Aranhas, Penamacor e Benquerença, entre outras do concelho. Foi delegado sindical, criou e dirigiu o Posto da Telescola de Aranhas, proporcionando, então, o acesso ao 2.º ano, aos jovens de Salvador e Aranhas.

As actividades sociopolíticas são no entanto os motivos justificativos do nosso trabalho. É que o professor Libério foi, à data, muito provavelmente, o presidente da Junta de Freguesia mais jovem do país. Tinha vinte e sete anos quando o presidente da Câmara, dr. António Moutinho,  lhe endereçou o convite. Recusado inicialmente, a persistência foi tanta que não lhe restou alternativa. Acabou por encabeçar a única lista concorrente e foi eleito presidente da Junta de Aranhas, sendo sucessivamente reeleito até 1975.

Cargo de difícil manutenção, pois as autarquias não dispunham de qualquer tipo de financiamento, como actualmente dispõem. As receitas provinham de alguns atestados, venda de sepulturas, e do que fosse conseguido junto do presidente da Câmara Municipal. A persistência do jovem presidente era de tal ordem que o presidente da Câmara ao vê-lo comentava: “lá vem o jovem pedinchão”.

Conseguidas algumas centenas de escudos, Libério Lopes pedia ao pároco da freguesia para anunciar uma reunião com o público na sede da Junta. O povo comparecia. Era informado das receitas conseguidas e indicava-lhes dois ou mais caminhos a precisar de arranjo. A população decidia qual o mais necessitado. Como o dinheiro era pouco, o professor “tocava” o coração do povo de modo a que cada família com propriedades servidas pela via a reparar, contribuísse com um dia de trabalho efectivo ou o seu valor monetário. E o caminho era reparado.

 Por este e outros motivos, aquando do 25 de Abril, as Forças Armadas na sua passagem por Penamacor sugeriram a substituição de todos os órgãos autárquicos eleitos antes da revolução, o que aconteceu em diversas localidades. Em Aranhas a população apareceu em massa defendendo a continuidade do professor Libério à frente da Junta de Freguesia. Só mais tarde, a lei o destituiria. Mas no decurso da sua vida mais activa, conquistou um palmarés invejável, no desempenho de várias actividades, tendo dificuldade em definir do que mais gostou de fazer ou que teve pena de não ter feito.
 
“O maior prazer foi a criação da Liga dos Amigos de Aranhas e mais tarde o Centro de Dia. Isto ajudou a resolver inúmeros problemas a nível cultural, recreativo, desportivo e social dos habitantes de Aranhas”, refere.

A construção da ponte sobre a ribeira da Baságueda, no sítio do Freixal, foi uma excelente conquista. O dr. Moutinho opunha-se, mas o jovem através de amizades e conhecimentos levou a sua àvante. Outra coroa de glória prende-se com a reactivação do Rancho Folclórico de Aranhas,  em 1971, tendo para além das deslocações, uma semana no Casino Estoril e outra no Hotel Balaia, no Algarve, conseguindo que o mesmo fosse admitido na Federação Portuguesa de Folclore em 1983. 

Inúmeros episódios dignos de nota fazem parte do seu historial, porém destacaremos os mais significativos. Numas eleições para o qual foi nomeado presidente da mesa de votos, – “após encerrar a mesa peço para contarmos os votos. Os meus colegas de mesa (todos com mais de 60 anos) dizem-me que era hábito descarregar alguns nomes. Eu opus-me. Um deles, polícia reformado, disse-me: o sr. professor é que manda, mas olhe que vai ter chatices. Não liguei. Contámos os votos, 126, e mandei os resultados para a Câmara Municipal. Mal adivinhava a noite que iria passar. Por volta da meia-noite o dr. Moutinho foi a minha casa pedir explicações porque não tinha descarregado os votos. Queria saber se o povo de Aranhas estava descontente e porquê. Passámos a noite a elaborar um relatório, a explicar o porquê de só aparecer aquele número de votantes. No dia seguinte o jornal 'O Século' noticiou que Aranhas teve a percentagem de votantes mais baixa do país. Na verdade no concelho de Penamacor e talvez do país, Aranhas foi o que apresentou a votação real”.

Na última manifestação “espontânea” dos portugueses a Marcelo Caetano, foram colocados autocarros gratuitos para a população se deslocar a Lisboa. Cabia aos presidentes de junta mobilizar o povo. O de Aranhas não fez caso do assunto. Da terra ninguém foi a Lisboa. Entretanto a Junta candidatou-se à atribuição de um televisor para a Delegação da Casa do Povo em Aranhas. Todas as localidades foram contempladas. Menos Aranhas. Quando inquiriu o presidente da Casa do Povo de Penamacor do porquê da sua exclusão, foi-lhe respondido que a delegação de Aranhas não a merecia, pois não mandaram ninguém a Lisboa.

Invulgar e digno de nota, foi a surpresa que Libério Lopes teve há alguns dias. Um amigo, militar no activo, em conversa sobre a guerra colonial informou-o que tinha lido por acaso, a atribuição da Medalha de Mérito Militar de 4.ª classe, com base num louvor, por ter participado em acções de combate, ao furriel miliciano Libério Candeias Lopes. Ora a data da condecoração é de 28 de Fevereiro de 1966. O condecorado soube disso, casualmente 43 anos depois.
Jolon

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Notas do editor:


(**) Do seu sítio institucional, na Net:

(...) "O Jornal do Fundão, fundado em 1946 por António Paulouro, é hoje um marco referencial no panorama da imprensa regional portuguesa. Com uma tiragem semanal de 14.000 exemplares e um universo de audiência que atinge os 53.000 leitores, foi distinguido com a Ordem do Infante D. Henrique e tem no seu historial outros galardões como o Prémio Gazeta, homenagens das Universidades de Salamanca e da Comunidade Portuguesa em França.

"O Jornal do Fundão faz parte da matriz de identificação da Beira Interior e é reconhecidamente um elemento da sua coesão social bem como do desenvolvimento económico e cultural da região.
 

"O Jornal do Fundão tendo vindo a reforçar a sua influência no eixo geográfico que vai desde a região da Guarda, Covilhã, Fundão e Castelo Branco. É líder destacado de audiência da Imprensa Regional no distrito de Castelo Branco e tem ainda expressiva audiência nacional." (...)

Guiné 63/74 - P8851: O nosso blogue em números (10): Três milhões de visitas em Novembro de 2011... Período de reflexão e de reorganização



Amigos/as e camaradas:
Caminhamos para os 3 milhões de visitas, a atingir previsivelmente na 1ª quinzena de Novembro de 2011. Recordo que atingimos os 2 milhões de visitas em meados de Setembro de 2010. 
Em termos de visitas, desde Julho de 2010 (em que passámos a ter estatísticas do nosso servidor, o Blogger), o melhor mês de todos foi o Janeiro de 2011 (com 97,9 mil) e o pior o mês de Agosto de 2011 (59,9 mil).
Pelo gráfico acima reproduzido, percebe-se que os meses de verão são sempre de algum abrandamento, devido às férias escolares e laborais.
É esperado que, a partir de agora, o blogue retome o seu ritmo normal, que é de 2500 visitas/dia, em média (ou sejam, 75 mil/mês).
Nos meses de verão, a produção de postes também se ressente. De qualquer modo, vai ser difícil este ano ultrapassar a produção de 2010, que foi superior a 1900 postes. Nesta altura do ano, a três meses do fim de 2011, estamos com pouco mais de 1300 postes (c. 145/mês). (*)
As razões são explicáveis: menos disponibilidade, menos tempo, de alguns elementos da equipa de editores,  e sobretudo menos material a entrar para publicação... Por outro lado, temos, felizmente, mais concorrência: outros blogues, outras páginas, o Facebook... (Muitos camaradas têm a sua própria página no Facebook, cuja manutenção diária consome muito tempo!). Duas, três, muitas... Tabancas têm aparecido no nosso "teatro de operações", o que só pode constituir motivo de orgulho para todos nós.
É bom lembrar que o nosso blogue vai fazer 8 anos de vida, em 23 de Abril de 2012, ao serviço da reconstituição e preservação das memórias dos camaradas da Guiné, e atingiu a simpática cifra de 520 membros, formalmente registados (vd. lista alfabética, de A a Z, na coluna do lado esquerdo)... Está, além disso, em marcha a organização, em 2012,  do nosso VII Encontro Nacional...
Em jeito de balanço, mas também de comemoração (estes números são reveladores da nossa vitalidade enquanto comunidade de combatentes e amigos da Guiné!), gostaríamos de poder contar com  as críticas, sugestões e comentários de todos/as os/as nossos/as leitores, quer pertençam ou não formalmente à nossa Tabanca Grande... 
Estamos internamente num processo de "reorganização" (repensando os  conteúdos mas também o "layout" do blogue, revendo as nossas "regras do jogo", redefinindo os papéis e a composição da equipa de editores  e do conselho de consultores,   etc.).
É uma boa altura, chegado o Outono, de conhecer melhor o "moral" das tropas... Mais: conhecer melhor (para melhor satisfazer) as  necessdidades, expetativas e preferências de quem nos visita e lê...  O blogue só faz sentido se for feito por todos e para todos, num espírito de liberdade, pluralismo, rigor, consenso, tolerância, amizade e camaradagem...
Para já, peço-vos que vão respondendo, até ao dia 10 do corrente, à nosso sondagem 'on line' (*)... A resposta é anónima, mas podem fazer-nos chegar, por mail, os vossos comentários, sinceros e frontais (ou comentar diretamente aqui) : por exemplo, as vossas razões sobre uma eventual menor assiduidade na visita ao blogue, nos últimos dois ou três meses.... 
Por outro lado, não se se esqueçam, caros/as leitores e visitantes, e sobretudo caros/as amigos/as e camaradas da Guiné,  que o blogue precisa de materiais para publicação, e de novas entradas de camaradas... Cada um de vocês pode (e deve...) trazer mais outro camarada para a nossa Tabanca Grande... não para a estatística mas para aumentar a riqueza (leia-se: a diversidade) da nossa "pool"... genética!
Um grande abraço a todos/as em meu nome, dos de mais editores e colaboradores. Luís Graça


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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 2 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8365: O nosso blogue em números (9): 78.500 visitas mensais desde Julho de 2010; mais de 500 tabanqueiros; 5,5 postes e 45 comentários, em média, por dia; uma em cada quatro visitas vem fora de Portugal...

(**) Ver pergunta ao quanto superior esquerdo:

Sondagem 'on line',  em curso (votação até 10/10/2011): 

Com que  frequência tens visitado ultimamente o nosso blogue ?
Todos os dias
Quase todos os dias
Dia sim, dia não
1 vez por semana
2 a 3 vezes por mês
1 vez por mês
Raramente
Nunca, ou hoje por mero acaso

Guiné 63/74 - P8850: Notas de leitura (282): Do Cacine ao Cumbijã, 67 Guiné 69, de Guilherme da Costa Ganança (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Setembro de 2011:

Queridos amigos,
Quero ser muito franco, o livro “Do Cacine ao Cumbijã”, cativa pelo ingenuidade e até pelo deslumbramento de quem regressa, pelo dever da memória, à reconstituição da formação de uma Unidade, de uma viagem marítima, de um treino operacional, tudo feito sem arrebiques, com a intenção de matar saudades na comunicação que pôde estabelecer com os seus camaradas. Só que quem lê vai ficar aturdido com os pormenores especiosos com que a obra arranca até ao súbito cansaço do autor que parece ter desfalecido quando as suas personagens estão bem vivas e a emergir num grande trauma.
É o sabor que lemos metade de um romance e temos de ficar à espera que o autor retome energia e recomece a sua comissão…

Um abraço do
Mário


Do Cacine ao Cumbijã

Beja Santos

“Do Cacine ao Cumbijã, 67 Guiné 68”, por Guilherme da Costa Ganança (Chiado Editora, 2011) é um livro singelo, supostamente um romance histórico alicerçado em personagens fictícias. Comporta uma ficha de autor, um funchalense nascido em 1945 e que depois de prestar serviço militar na Guiné entre 1967 e 1969 se licenciou em Engenharia Electrotécnica. É de presumir que Guilherme Ganança seja Gabriel Silva e tudo quanto escreve ande por portas e travessas no caminho autobiográfico. O jovem Gabriel Silva chega ao Funchal já promovido a aspirante, da Madeira regressará ao campo de instrução militar de Santa Margarida para formar uma Companhia de intervenção com destino à Guiné. Do aeroporto chega à freguesia da Lombada e apresenta-se à família, a notícia da mobilização deixa o rancho familiar transtornado. Gabriel despede-se da família e dos amigos, vai pedir ânimo à Senhora da Conceição. Toca-nos pela sinceridade.
Sai da capela, admira o vale profundo que vai beijar as águas da Ribeira da Ponta do Sol.

Temo-lo agora no dia 28 de Outubro de 1967 a embarca no paquete do Uíge. O Alferes Silva faz parte da Companhia 78081 comandada pelo Capitão Germano Neves. Espraia-se o autor na descrição da viagem e é feliz na descrição do jantar de despedida, já estão à beira de entrar no estuário do Geba, relata um jantar abrilhantado pelas ressonâncias de um concerto: “Os acordes, ora vigorosos, ora repousantes, desfilaram em cinco harmoniosos clássicos que arrebataram os passageiros, ao serem servidos as iguarias.

Os Capitães Rocha Leão e Alcides Faria confraternizaram à mesa do Alferes Silva e do Capelão Honório Ferraz. Enquanto saboreava uma canja à portuguesa apreciara o tema “Colas Breugnon – Abertura”, de Kabelavsky.

Momentos depois, vem uma lagosta à Parisiense e irrompeu a Sinfonia número 1 de Prokofief.

Sentiam-se os efeitos do vinho quando os espargos à Antártico acompanharam a Companhia Ligeira, de Suppé, que fez as delícias de primeira classe. Quando já todos falavam sem ouvir ninguém, voou para as mesas um peru assado à americana. Gabriel, de ouvido apurado, entrou na notalgia do concerto em dó menor de Grieg, ao escutar a subtileza dos sustenidos e bemóis.

Não acabaram sem o sabor de um Corbeille de Morangos e frutas diversas. O jantar de despedida aproximava-se do fim, tinha de acabar em festa. Ressoou uma Polca: “Relâmpagos e Trovões”, de Strauss. Festejaram de braços no ar e maças rosadas no rosto. As bebidas e os brindes desfilavam, eufóricos, no meio dos relâmpagos”.

De Bissau foram levados para o aquartelamento de Brá, daqui seguirão para Contuboel. É um período de adaptação, de descoberta, um outro camarada explica a Gabriel Silva quem eram as madrinhas de guerra e o apoio que podiam dar aos militares como retaguarda de suporte moral. Ao princípio Gabriel está reticente, depois escreve aerogramas para várias direcções. Percorrem Bissau, visitam o Pilão, chegou a hora do treino operacional. Nunca saberemos como irão de Bissau por camião até Contuboel (com muita imaginação, o autor diz que o percurso que ligava Bissau à cidade de Bafatá, não era considerado perigoso, se bem que não dispensasse medidas de segurança…). O capitão Germano já se impusera como líder, segundo o autor é um homem de grande humanismo. Em Contuboel vão fazer patrulhamentos e ter um cheirinho de guerra na região do Caresse. Tratou-se de um baptismo de fogo, a Operação Invicta moralizou a Companhia 78081.

Ficamos entretanto a perceber que há uma madrinha de guerra de eleição, de nome Raquel. Continuam as Operações na região e vão até à Bolanha de Sototo, tudo corre bem, concluído o treino operacional, chegou a hora de partirem para Bula, vão participar na Operação Bolo-rei, na região de Choquemone. Só há um ferido ligeiro, a estrela da sorte continua a acompanhar esta Companhia de intervenção.

Escoltados pelos fuzileiros, vão partir para Cabedu, entre Cacine o Cumbijã, é este o local que lhes foi atribuído. Temos uma descrição do quartel e da tabanca, como se procedia à defesa do perímetro, onde estavam as peças de artilharia, como foram cordiais logo os primeiros contactos entre o chefe da tabanca, de nome Duraman, e o capitão Germano Neves. O Capitão procura esclarecer-se da situação das forças do PAIGC na região de Cabedu, o Cantanhez está muito perto, posicionam-se nas tabancas de Catifine e Cafal, bem como em Cabanta e Catesse, os rios em torno da península de Cabedu são controlados pelo PAIGC. O Comando em Catió determina um conjunto de patrulhamentos. Apercebendo-se das inúmeras dificuldades impostas pelo terreno, Germano Neves cria um Pelotão com maior capacidade ofensiva que irá ficar conhecido como “Os Corsários”, dirigidos por Gabriel Silva, também conhecido como Grupo Especial de Comandos. Os aerogramas chegam e partem, a relação entre Raquel e Gabriel estreita-se. Há obras em Cabedu. Operação fatídica, nesse dia a Companhia 78081 perdeu o seu muito estimado Comandante na operação Alto Quilate. Acabara-se a estrela da sorte, é neste relato que o livro de Guilherme Ganança tem as suas melhores páginas.

Se até agora o autor entendia que o seu relato devia ser minucioso, imprevistamente tudo vai acelerar, ser alvo de uma inesperada síntese, Gabriel e os seus corsários ainda vão à ilha de Melo, as acções de vigilância nas matas prosseguem. Passadas umas semanas, chegou o substituto do Capitão, este novo Comandante veio trazer normalidade a uma Companhia esmorecida. Não se compreendera muito bem, a trama galopa para o final, o autor dá como encerado os capítulos desta história da Companhia 78081. E tudo termina assim: “Gabriel Silva tornara-se mais duro. Nos tempos que se seguiram muitas nuvens sombrias escondiam-lhe o azul do céu e esmoreciam a cor dos seus olhos. Mesmo assim nutria a certeza de vir a encontrar um futuro melhor. Um provir a que a sua juventude tinha direito”. O livro é apresentado como as memórias reais de um alferes salpicadas de momentos de pura ficção.

Não se fica a compreender o que leva Gabriel Ganança a escrever estas memórias. Percebe-se a transição entre o jovem inocente e o combatente que endureceu. Entende-se como aquela Companhia ficou enlutada com a perda de um Capitão muito especial. Mas há muito pouco entre o Cacine e o Cumbijã, é impossível que o leitor, seja ele qual for, não se sinta defraudado por não ficar a saber o que é que os Corsários fizeram nos meses seguintes. Estamos perante um estranho romance histórico, fica-se mesmo com a ideia que o jovem Alferes se desencantou com a sua escrita e deixou-nos em Cabedu à espera que a história continue…
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 30 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8840: Notas de leitura (279): Os Anos da Guerra Colonial, de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes (Mário Beja Santos)

Vd. último poste da série de 3 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8849: Notas de leitura (281): Nha Bijagó, de António Estácio. Prefácio de Eduardo J. R. Fernandes