sexta-feira, 1 de junho de 2012

Guiné 63/74 - P9975: Efemérides (101): Ataque ao navio Patrulha Hidra, dia 20 de Maio de 1973 (António Dâmaso)

1. Em mensagem do dia 29 de Maio de 2012, o nosso camarada António Dâmaso (Sargento-Mor Pára-quedista do BCP 12, na situação de Reforma) enviou-nos o seu relato da emboscada perpetrada à LFG Hidra no dia 20 de Maio de 1973, no Norte da Guiné.


Navio Patrulha HIDRA navegando no Tejo
Com a devida vénia ao Blogue da Reserva Naval


ATAQUE AO NAVIO PATRULHA HIDRA

António Dâmaso

No dia 20 de Maio de 1973, depois da CCP 121 participar na Operação ”Ametista Real”, cerca das 19h30, não posso precisar a hora sei que era de noite, embarcámos em Ganturé, juntamente com alguns Comandos Africanos no Navio Patrulha HIDRA com destino a Binta, julgava eu que íamos regressar a Bissau.

Entrei à conversa com um camarada da guarnição 1.º Sarg. Artilheiro Joanás, fomos até uma salinha, depois de uma cervejinha bem fresca e de uma conversa, estávamos sentados e eu deixei-me vencer pelo sono, repentinamente cerca das 24h00, sou acordado com uma série de rebentamentos, o convés do navio tinha sido atingido*, havia granadas a arder (pólvora), tive a sensação que o paiol tinha sido atingido, mais tarde li algures que o que foi atingido foi um reservatório das peças Bofors de um dos canhões que equipavam o navio. O Joanás agarrou imediatamente num extintor, eu passei-lhe outro e com um em cada mão, apagou o incêndio naquele local, fiquei impressionado com a rapidez e destreza dele, não há dúvida que na Marinha, as guarnições dos navios estão muito bem preparadas para combater incêndios a bordo, quando vi as granadas incendiadas, fiquei com receio que estas rebentassem, o que teria acontecido se não tivessem sido extintas atempadamente.

A reacção ao ataque por parte da CCP 121 foi rápida e eficaz, dando origem a que os guerrilheiros do PAIGC tivessem desistido de mandar mais granadas para o convés do navio, porque se tivessem continuado, teriam provocado mais vítimas e estragos de maior monta, como era de noite não me apercebi bem dos efeitos do ataque, quanto à localização julgo ter sido na curva de Jugali.

De cada vez que eu tentava subir as escadas para o convés, aparecia-me um ferido que eu encaminhava para a enfermaria, tarefa dificultada por ser feita no escuro, isto repetiu-se várias vezes, um dos feridos era do meu pelotão, apontador do morteiro e ficou ferido num calcanhar. Recordo que no meio daquela confusão toda, alguém ter dito que faltava um Zebro (barco de borracha), chegamos a Binta na madrugada do dia 21. Pela manhã os feridos foram evacuados e nós lá ficamos, ao meu pelotão coube para alojamento um barracão de madeira junto do cais que ficava do lado esquerdo, Binta tinha sido em tempos um entreposto madeireiro.

Depois de ter desembarcado dei por falta de um rádio (banana), que só podia ter desaparecido no Patrulha, uma vez que tinha feito conferência de material antes de embarcarmos e o militar que o tinha à guarda foi ferido no ataque, como recebiam prémios por armamento ou equipamento, apreendido ou encontrado, mais tarde o rádio apareceu como tendo sido dado como achado por um Comando Africano na zona de Bigene.

À noite, estava a dormir, pelo quarto dia consecutivo, sou acordado com um ataque dirigido aos barracões, com lança granadas de foguete (RPG 2 e 7), vindo do outro lado do rio Cacheu, não ouve baixas mas além de termos ripostado ao ataque, tivemos de apagar um incêndio num dos barracões que ficava em frente ao nosso. Nesse barracão estava uma viatura carregada com caixões com destino a Guidage, os ataques já se tinham tornado uma rotina. Ainda ficamos em Binta mais um dia e uma noite, à espera de uma coluna de viaturas que viria de Farim com destino a Guidage.

Mais tarde quando me encontrei com o Joanás em Cacine, quando este andava a apoiar Gadamael Porto, disse-me que tinha sido louvado que a CCP 121 tinha tido uma citação elogiosa pela sua acção.

Um Ab
A. Dâmaso
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Notas de CV:

Vd. último poste da série de 31 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9972: Efemérides (66): Guidaje foi há 39 anos... A coluna do dia 29 de maio de 1973: a participação da 38ª CCmds (Pinto Ferreira / Amílcar Mendes / João Ogando)

(*) Ver poste de 16 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1665: Operação Larga Agora, Tancroal, Cacheu, local maldito para a Marinha (Parte I) (Lema Santos)

Em 20 de Maio de 1973 a LFG Hidra, frente à clareira de Jagali, a juzante da foz do rio Buborim, foi emboscada da margem Norte com RPG, armas ligeiras e morteiro 60 mm. O primeiro RPG deflagrou contra os cunhetes de munições da Boffors de vante, provocando rebentamentos e um grave incêndio, tornando a peça inoperativa. Reagiu de imediato e tudo acabou por se compor, não sem alguns estragos.

Foi elogiada a colaboração de elementos da CCP 121 e BCCmds (Baltalhão de Comandos) que, seguindo a bordo, conjuntamente com o navio, reagiram prontamente com o armamento de que dispunham. O resultado foram 3 feridos graves (Comandos) e 6 feridos ligeiros (Comandos, Paras e LFG).

Guiné 63/74 - P9974: Notas de leitura (365): Guiné e Cabo Verde: elementos para a sua unidade (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 18 de Abril de 2012:

Queridos amigos,

A unidade Guiné-Cabo Verde foi uma bandeira de guerra, um toque a reunir em nome da emancipação de um só povo. Sabemos como tal bandeira nunca foi aceite, no íntimo, por cabo-verdianos e guineenses, a despeito do sopro que avassalou África em torno da unidade e da formação de blocos regionais. Com raríssimas exceções, tudo falhou. No caso particular da Guiné e Cabo Verde foram apregoadas razões históricas que, quando rigorosamente dissecadas, são indemonstráveis. É verdade que se vive de mitos mas estes podem ser desvelados. Pegue-se no artigo de António Carreira e veja-se que aquela unidade também era fantasiosa. E Amílcar Cabral usou-a internamente, como se sabe sem proveito nenhum.

Um abraço do
Mário


Guiné e Cabo Verde: elementos para a sua unidade

Beja Santos

Em 1969, no decurso de uma conferência de quadros, em Conacri, Amílcar Cabral exibiu um texto de António Carreira acerca da unidade histórica e populacional da Guiné e Cabo Verde, evocando que até os historiadores do regime defendiam a mesma unidade que a do PAIGC. O texto de António Carreira tinha sido publicado na revista Ultramar, no número alusivo à viagem de Américo Tomás à Guiné, em 1968.

Vejamos o que escreveu Carreira que tanto gratificou o construtor exclusivo da tese de que a Guiné e Cabo Verde eram verso e reverso da mesma medalha.

Primeiro, Careira discreteia sobre o conceito de Guiné já que, como é por demais sabido, desde o século XV ao século XVII toda a costa entre o Senegal e o rio Orange era conhecida por Costa da Guiné. Quando estamos chegados ao século XIX o conceito retraiu-se até se confinar ao território que do sul do rio Gâmbia ou da embocadura do Casamansa até à parte norte da Serra Leoa. Num período intermédio também se usou a designação de Senegâmbia com várias aceções. O que interessa é que durante estes séculos em que os descobridores portugueses e depois outras potências aportaram à Costa Ocidental Africana, todos ávidos de comércio, incluindo o de escravos, à volta de um conceito diluído de Guiné processou-se a transferência de gente destas paragens para o povoamento das ilhas de Cabo Verde. Este povoamento do arquipélago processou-se com donatários e capitães-mores europeus e mestiços cabo-verdianos resultantes do cruzamento com mulheres negras levadas da Costa da Guiné. Era Cabo Verde quem administrava as praças e presídios do que hoje se aproxima do território da Guiné-Bissau e que foi a província da Guiné depois da Convenção Luso-Francesa de 1886: Cacheu, Farim, Bissau, Geba, Bolama, Buba. Analisando a história de Cabo-Verde percebe-se rapidamente que a fixação de populações, a natureza das atividades económicas, a coesão linguística, a presença cabo-verdiana nos negócios, etc., era totalmente distinta do que existia na Guiné. Só por extrapolação abusiva é que estas duas populações podem ser apresentadas em paridade, com coexistência cultural, social e económica.

Segundo, é facto que a Guiné e Cabo Verde tiveram economias complementares e pode dar-se parcialmente razão a Carreira quando diz: “A Guiné deu a massa humana que entrou no cadinho da mestiçagem; Cabo Verde desenvolveu-a. Daí a dificuldade de, em certos aspetos se falar de um território sem considerar o outro. Cabo Verde recebeu da Guiné uma contribuição humana inestimável. Para o seu povoamento concorreram, no geral, todas as etnias do continente fronteiro – do sul do Senegal à Serra Leoa, em particular. O quantitativo de cada uma delas é que é difícil de determinar. Das outras áreas a sul, à parte um ou outro elemento esporádico, nada se conhece com relevância”. Temos assim a nebulosidade da proveniência das mulheres africanas. E não se discute a evolução da mestiçagem como se esta fosse um dado imóvel. Nada subtrai à identidade cabo-verdiana ou facto de se saber que ao longo de séculos foram levados para as ilhas cabo-verdianas, escravos e imigrantes procedentes dessa vasta zona compreendida entre o rio Senegal e a Serra Leoa, a identidade não se forja só a partir de uma ancestralidade, requer língua, ilustração, pauta de usos e costumes, atitude religiosa, um quadro de aspirações – é este somatório que permite traçar o perfil dos povos e habilitar a distinguir e a aproximar de outras culturas.

Terceiro, é o próprio Carreira a abonar a identidade cabo-verdiana a partir da ocupação humana. Para além dos escravos e de imigrantes voluntários, o arquipélago assistiu a uma evolução do conceito de escravatura, urdiu-se uma classe de agricultores e camponeses, o catolicismo tomou conta praticamente de todos, o português foi assumido muito cedo como língua veicular e criou-se um crioulo totalmente autónomo. Carreira estuda as etnias dos diferentes grupos de escravos que chegaram à Guiné e não se esquece de dizer que eram naturais do Futa, da Gâmbia, de Goréa, do rio Nuno, do Senegal, de Angola, de Cabinda, da Costa da Mina, do Rio de Janeiro. Foi esta a miscelânea de povos que deu o cabo-verdiano com uma escravidão do tipo caseiro, tão pobre como as ilhas, sem nada a ver com as sociedades esclavagistas do Brasil. Só com uma grande dose de boa vontade é que se pode assegurar a unidade populacional Guiné-Cabo Verde. É facto que vamos encontrar cabo-verdianos como ponteiros em diferentes pontos da Guiné. Carreira refere mesmo que em 1900 ou talvez antes, cabo-verdianos oriundos de Santiago, para fugir às secas, criaram pontas no rio Farim. E diz mais: “Puderam recrutar trabalhadores balantas, papéis, manjacos para o desbravamento do mato e estruturação dos camalhões, valas de irrigação e todo o complexo de trabalho exigido por esta cultura. Os cabo-verdianos não abastados enveredaram pelos trabalhos que demandavam menores esforços físicos: trapicheiros, especialistas em fermentação de garapa e de alambicagem, etc. Como mestiços, não demonstraram possuir as qualidades de resistência física dos seus ascendentes de origem africana. Por isso mesmo, a colónia africana na Guiné encaminhou-se para o funcionalismo público e para o comércio. E desse modo exerceram uma influência cultural relevante sobre a massa nativa, miscigenando-se progressivamente”. Está pois esclarecido o que se entende por unidade, um conceito mítico, tão mítico que nessa unidade o cabo-verdiano é sempre cristão e o guineense muçulmano ou animista, no período colonial os cabo-verdianos dessa administração pública e desse comércio viviam separados dos guineenses dado que se consideravam civilizados.

De um artigo manifestamente apologético de uma Guiné historicamente ligada a Portugal por via de negócios de diferente índole, uma Guiné suficientemente elástica nas suas bases territoriais para ter dado séculos de gerações de cabo-verdianos que nunca se reviram em nenhuma pátria guineense, de um arquipélago de onde partiam funcionários e outra gente que se habituou a mandar, a organizar e a dispor das culturas, a intervir nos negócios, sempre junto da administração da colónia, houve capacidade para ficcionar uma unidade histórica e populacional, para proveito da propaganda do PAIGC. Ao não medir-se a dimensão da fábula, muitas vezes o confabulador sofre dolorosas consequências. Como, desde cedo, saltou à vista de toda a gente.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9953: Notas de leitura (364): Mitos Revolucionários do Terceiro Mundo, por Gérard Chaliand (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P9973: (Ex)citações (181): Revisitando as cartas do alf mil Carlos Geraldes (José Freitas, ex-fur mil minas e armadilhas, CART 676, Pirada, 1964/66)





Guiné > Região de Gabu > Pirada > CART 676 (1964/66) > O bom do senhor Barbosa, Chefe de Posto de Pirada na intrincada tarefa de fazer o recenseamento civil. Foto nº 59 do álbum de Carlos Geraldes (1941-2012).

Foto (e legenda): 
© Carlos Geraldes (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, Todos os direitos reservados.


1. Comentário de José Freitas, com data de 16 de maio último, ao poste P4980 (*):

Eu pertenci à mesma CART  676  (**) como o alferes Geraldo [sic]. Sou o José Guilherme  Teixeira da Silva Freitas,  furriel miliciano de minas e armadilhas,  e  confesso-me  muito surpreendido com as suas narrações. 


O Alferes Geraldes  conta muitas histórias com que eu não concordo. Só para dar um exemplo: eu é que ajudei com a tradução em francês várias vezes [, nos contatctos com as autoridades senegalesas]. Até ensinei aos  cabos que trabalhavam na secretaria com o 1º sargento,  na escola em  Pirada. 

Também fui eu que usei granadas ofensivas como armadilhas para  proteger os sargentos que moravam numa pequena casa fora do  aquartelamento, [em Pirada]. Fui também com o Capitão [Álvaro Santos Carvalho]  Seco e mais 15 soldados,  fomos num Unimog devido a informação recebida dum grupo terrorista e fomos  emboscados,  perdendo a viatura. Tivemos que desertar [sic] pois eles eram um grupo de 200,  pelo menos. 

O que li de você,  Alferes Geraldes,  é a SUA HISTÓRIA, mas há outros que tiveram uma importância também...

2. Comentário do editor:

Obrigado, José Freitas, nosso leitor e camarada, pela visita ao blogue e pelo comentário ao poste do Carlos Geraldes, ex-Alf Mil da CART 676, Pirada, Bajocunda e Paúnca, 1964/66. Trata-se de um série, Cartas, que cobrem o período da vossa comissão de serviço (maio de 1964 a março de 1966), e de que se publicaram dez postes. Espero que os tenha lido todos (*).


Certamente por lapso de memória, você - que presumo viva no Brasil, não ? - começou por tratá-lo por Geraldo. O seu nome é Carlos Adrião Geraldes. Ou melhor, era: o Carlos já não está entre nós, faleceu de ataque cardíaco, em Viana do Castelo,  no princípio deste ano. Infelizmente ele já não poderá acrescentar mais nada ao que deixou escrito no nosso  blogue, e que é muito e é valioso. Às vezes quando lemos os escritos dos outros, "vemos a árvore mas não a floresta". 


De qualquer modo, o José Freitas fica desde já convidado a integrar o nosso blogue, bastando para tal mandar-nos duas fotos da praxe e contar-nos uma ou mais histórias, as suas histórias. O nosso blogue existe (desde há 8 anos), justamente por que todos fomos e somos  importantes. Todos, sem exceção. Você, o Carlos, eu, todos os camaradas de armas que passaram pelo TO da Guiné. (***)


Alguns camaradas nossos fizeram comentários elogiosos,  a propósito desta série epistolar, em que o Carlos Geraldes descreve, entre a ternura e a ironia, o seu quotidiano nos sítios do setor por onde passou (Pirada, Bajocunda, Paunca), as relações entre camaradas e as relações dos militares da CART 676 com os comerciantes e as autoridades locais... Alguns destes comentadores conhecem a região, por lá terem estado em data posterior à vossa saída. Aqui ficam uma seleção desses comentários:


(...) Uma série de altíssima qualidade, que, a meu ver, prestigia o blogue (Carlos Cordeiro, 16/9/2009);

(...)  A tua guerra está cheia de episódios fortes e delicados. Talvez esta chuvada possa serenar o ambiente, ademais a senhora já abalou. Quanto às libertinagens referidas, eram frequentes nos vinte aninhos, e punham a nú a fragilidade da NT. Acho eu que isso ainda vai acabar bem. Continua (José Manuel Diniz, 11/9/2009);

(...) Não há duvida que os nomes maçaricos e piriquitos se deve a duas espécies de pássaros muito comuns na Guiné, os maçaricos amarelos os periquitos verdes.
Mas a razão de a tropa portuguesa ser cognominada com esses termos. As madrinhas foram as nossas ex-lavandeiras que iam esperar os militares e oferecerem os seus préstimos de lavandeira. De tal modo a malta formada a preceito de farda amarela mais pareciam os tais bandos de maçaricos. Então elas diziam, 'jubi chegaram mais manga de maçaricos'. Mas eis que em mais uma nova chegada de militares mas todos de farda verde, surpresa total nas lavandeiras, 'jubi agora maçarico cá tem! Agora só manga de piriquito'. Se há outros motivos quem sou eu para discordar.
(José Colaço, 9/9/2009)

(...) Com que então sardinha assada? Como dizia o outro: ele há guerras... e guerras! Mas as descrições que fazes compensam com delícia as dificuldades passadas. Um Ford T? Outra maravilha só possibilitada em África. Aguardo os próximos episódios. (José Manuel Dinis, 3/9/2009)

(...) estive lendo o teu P4892 e quando falas de Bajocunda deixa-me uma grande alegria pelo tempo que lá estive se bem que com oito anos de diferença, mas o engraçado é que quando lá cheguei em Nov 73 havia três frigoroficos a petróleo um maior que os outros já não funcionava e se calhar era o mesmo que tu lá encontraste no dia 8 Fev 65. (Amílcar Ventura, 2/9/2009);


(...) Bela vida e boa descrição. Já não conheci Pirada com essa tranquilidade, mas sei que era assim, e que o Soares era homem-grande. Sei que, dessas cumplicidades, foi permitido viver com tranquilidade. E sei de uma senhora que se deslocava de Bajocunda usando um jeep. Ali vivia-se como em África, romântica, misteriosa, solidária.
Manda mais sff.
(José Manuel Dinis, 28/8/2009)

(...) Aqui o Carlos, por meio de períodos claros e sucintos, faz descrições muito interessantes sobre a saga da nossa tropa por matos e bolanhas da Guiné.  Quando pode ainda dá umas ferroadas, ora no regime, ora na estrutura repressiva. Não nos dignifica, mas retrata comportamentos de mal-amados.  Tem havido manifestações exageradas na defesa da honra no convento, mas para a história verdadeirq não podemos ignorar as nossas fraquezas e alguns comportamentos deploráveis.Os meus parabéns. (José Manuel Dinis, 25/8/2009) (...) Curiosamente ao ler os aerogramas que fui trocando com a familia, também sou levado a chegar à conclusão que a guerra da Guiné era um mar de rosas, mas era de tal maneira que nem os familiares acreditavam. Como nós haverá muitos camaradas que o fizeram. (César Dias, 14/8/2009)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 20 de setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4980: Cartas (Carlos Geraldes) (9): 2.ª Fase - Janeiro a Março de 1966


Vd. os restantes postes da série (no total são dez):


23 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4997: Cartas (Carlos Geraldes) (10): 2.ª Fase - Abril de 1966 - Epílogo - O Regresso

15 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4958: Cartas (Carlos Geraldes) (8): 2.ª Fase - Outubro a Dezembro de 1965

10 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4933: Cartas (Carlos Geraldes) (7): 2.ª Fase - Julho a Setembro de 1965

7 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4916: Cartas (Carlos Geraldes) (6): 2.ª Fase - Abril a Junho de 1965

3 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4892: Cartas (Carlos Geraldes) (5): 2.ª Fase - Janeiro a Março de 1965

28 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4875: Cartas (Carlos Geraldes) (4): 2.ª Fase - Outubro a Dezembro de 1964

25 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4861: Cartas (Carlos Geraldes) (3): 1.ª Fase - Agosto e Setembro de 1964

21 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4848: Cartas (Carlos Geraldes) (2): 1.ª Fase - Maio a Julho de 1964

14 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4821: Cartas (Carlos Geraldes) (1): Apresentação e Prólogo


(**) CART 676:  Mobilizada pelo RAP 2. Partida: 8 de maio de 1964. Chegada: 27 de abril de 1966. Localização: Bissau, Pirada, Bissau. Comandante: Cap Art Álvaro Santos Carvalho Seco.

(***) Último poste da série > 30 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9965: (Ex)citações (180): Defendendo a honra do BCAV 8320/72, Bula, 1972/74, que foi acusado de rebelião, em agosto de 74, e cujo pessoal vai fazer sábado, dia 2 de junho, na Trofa, o seu XXVI Encontro anual (Zeca Pinto)

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9972: Efemérides (100): Guidaje foi há 39 anos... A coluna do dia 29 de maio de 1973: a participação da 38ª CCmds (Pinto Ferreira / Amílcar Mendes / João Ogando)







1. Reprodução, com a devida vénia, de um artigo, da autoria de João Ogando e Amílcar Mendes, publicado no Boletim Informativo da delegação de Comandos de Almada e Seixal, nº 11-II Série, Dezembro de 2011, p. 8. Acrescenta, à guisa de explicação, o nosso camarada Amílcar Mendes, grã-tabanqueiro: 

"Todo o relato desta coluna é feito na 1ª pessoa pelo então comandante da 38ª Companhia de Comandos Sr Capitão de Inf Cmd Victor Manuel Pinto Ferreira e constante na história da companhia. Foi publicado neste Boletim com arranjos meus e do ex-furriel mil cmd João Ogando".

Este recorte já tinha sido publicado por nós, em poste de 25 de março último, mas está  lá com resolução mais fraca, e portanto menos legível ou pouco amigável para o leitor... (*). Esta republicação do recorte faz sentido na série Efemérides, numa altura em que estamos a reviver os 39 anos da "batalha de Guidaje" (**) (***), fazendo jus aos vivos e aos mortos.

2. Sobre o "novo tipo de minas", usadas pelo PAIGC em Guidaje, e que é referido  no artigo supra,  logo no segundo parágrafo,  cite-se José Moura Calheiros (A Última Missão, Lisboa: CR - Caminhos Romanos, 2010, pp. 460/461): 

"(...) em quase todos os relatórios  eram referidos rebentamentos de minas anticarro por simples acção de 'picagem' e era-lhes atribuída a designação  de minas antipessoal reforçada com mina anticarro. Apenas o Cap Mil Inf Carlos Alberto Pereira da Silva, comandante da [2ª CCaç/BCaç] 4512/72 (que realizou a coluna de 15 de Maio) refere no seu relatório datado de 1JUN73 que o inimigo utilizava minas com dispositivo eléctrico antipicagem. E, apesar de a Repartição de Operações do Quartel-General ter sido alertada para o novo tipo de mina no final da coluna realizada pela CCP 121 e DFE4, em 23 de Maio, a coluna realizada a 30 de Maio ainda utilizou o mesmo método de detecção de minas, o que originou mais uma morte.

"No seu realatório, o Cap Cav Fernando Salgueiro Maia refere 'face ao accionamento de minas por picas, é de substituir estas por paus aguçados' (...)".

3. Ainda segundo esta fonte (Moura Calheiros, 2010, pp. 458/459), a operação para a abertura de novo itinerário, realizada a 29 de maio de 1973, teve a participação de seis agrupamentos, "cada um deles com efectivos de cerca de uma Companhia"):

(i) Agrup A: 38ª CCmds + Pel Sap / BCaç 4512;
(ii) Agrup B: 1ª CCaç / BCaç 4512 + GEsp Mil 342 (Olossato);
(iii) Agrup C: CCav 3420 + grupo de picadores de Binta;
(iV) Agrup D: CCP 121 / BCP 1;
(v) Agrup E: DFE1;
(vi) Agrup F: CCaç 3414 (Cumeré).

Os agrupamentos A, B, C e F partem de Binta, comandados pelo Cap Inf Comando Pinto Ferreira, da 38ª CCmds.  Os agrupamentos D e E (os páras e os fuzos) partem de Guidaje.

4. Depois da "batalha de Guidaje" e do seu regresso a Mansoa,  foram concedidos ao pessoal da 38ª CCmds 15 dias de descanso operacional em Bolama, na 2ª quinzena de junho de 1973, conforme se pode ler na história da unidade (vd. excertos a seguir):





38ª CCmds (Brá, 1972/74): História da Unidade > Atividade operacional entre os dias 25 de maio  e 19 de junho de 1973 (Documento disponibilizado pelo Amílcar Mendes)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9662: Guidaje, Maio de 1973: 2ª coluna a 4 companhias, a caminho de Guidage - 29/05/1973 (Amílcar Mendes/João Ogando)


(**) Último poste da série > 31 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9970: Efemérides (65): Guidaje foi há 39 anos: Relembrando a primeira trágica coluna, dos dias 8 e 9 de maio de 1973 (Manuel Marinho, 1ª CCAÇ / BCAÇ 4512, Nema, Farim e Binta, 1972/74)

(***) Sobre a participação do Salgueiro Maia e dos seus homens, nesta coluna, ver o poste 26 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1213: A CCAV 3420, do Capitão Salgueiro Maia, em socorro a Guidaje (João Afonso)

Guiné 63/74 - P9971: Agenda cultural (205): Convite para o lançamento do livro "A Viagem do Tangomau", de Mário Beja Santos, dia 19 de Junho de 2012 no Auditório da Associação Nacional das Farmácias em Lisboa

CONVITE

Lançamento do livro "A Viagem do Tangomau", de autoria de Mário Beja Santos, dia 19 de Junho de 2012, pelas 18h30, no Auditório da Associação Nacional das Farmácias (Museu da Farmácia) Rua Marechal Saldanha, 1 em Lisboa.
Serão apresentadores, o escritor Carlos Vale Ferraz e o investigador Leopoldo Amado.


OBS: - Os interessados na visita guiada ao Museu da Farmácia a levar a efeito pelas 17h30 devem confirmar a sua presença através deste endereço: aferreira@circuloleitores.pt



1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 28 de Maio de 2012:

Meus queridos amigos,
É com muita satisfação que venho convidar todos aqueles que se possam deslocar no dia 19 de Junho, pelas 18h30, ao Museu da Farmácia, a estarem presentes ao lançamento deste livro que, no essencial, nasceu no blogue.
É um livro de 42 anos de memórias, como numa sinfonia tem quatro andamentos: os preparativos para a guerra, os dois anos no rio Xaianga, a retoma da vida civil e persistente presença de sinais guineenses, a eclosão de todas as memórias e o regresso à Guiné.
É um livro que pertence a dois países, tal a natureza do testemunho. E mais não digo. Apelo à vossa companhia, toda a viagem do Tangomau apareceu redigida em primeira mão no nosso blogue, houve momentos em que me senti numa missão coletiva.
Considero o filão esgotado. O que tenho pela frente é uma empreitada valente, de parceria com Francisco Henriques da Silva, aquele nosso camarada que cobriu de glória a diplomacia portuguesa durante o conflito político-militar de 1998-1999, todos os outros ilustres embaixadores saltaram do barril de pólvora, ele ficou a pé firme, correndo todos os riscos numa Bissau em chamas. Pretendemos elaborar um levantamento documental intitulado “Da Guiné Portuguesa à Guiné-Bissau: Um roteiro”. Uma investigação pacífica, nada de sobressaltos para o coração.

Agradeço antecipadamente o bom acolhimento que possam dar ao meu convite.

Um abraço do
Mário
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9948: Agenda cultural (204): Convite ISCTE-IUL, para o Lançamento do livro digital sobre "Militares e sociedade, marinha e política

Guiné 63/74 - P9970: Efemérides (99): Guidaje foi há 39 anos: Relembrando a primeira trágica coluna, dos dias 8 e 9 de maio de 1973 (Manuel Marinho, 1ª CCAÇ / BCAÇ 4512., Nema, Farim e Binta, 1972/74)




A fatídica picada Binta -Genicó - Cufeu -Ujeque - Guidaje...



1. Oportunos esclarecimentos do Manuel Marinho em relação ao poste P9961 (*):

Esta coluna parte para Guidaje a 10 [de maio de 1973] e regressa a 13 a Farim, o camarada Amílcar Mendes até publicou as cópias dos relatórios da 38ª Ccmds referentes a esta coluna.

Quanto às baixas mortais das 1ª e 2ª colunas, são estas.

1ª – Coluna Dias 8 / 9 Maio:

1º Cabo Mil Bernardo Moreira Castro Neves,  1ª/Bcaç 4512

Sold António Júlio Carvalho Redondo,  3ª/Bcaç 4512

Fur Mil Arnaldo Marques Bento,  Ccaç 14

Sold Lassana Calissa,  Ccaç 14


 2ª – Coluna Dia 10:

Manuel Maria Rodrigues Geraldes, 2ª/ Bcaç 4512 (enterrado em Guidaje).

Baixas mortais da Ccaç 19ª, que saem ao encontro desta coluna:

1º Cabo Abdulai Mané, Ccaç 19

Sold Jancon Turé,  Ccaç 19

Sold Mamadu Lamine Sanhá,  Ccaç 19

Sold Sadjó Sadjó,  Ccaç 19

Sold Suleimane Dabó,  Ccaç 19

Estes corpos ficaram no terreno, portanto contam-se 9 desditosos camaradas das NT, o que não contradiz o testemunho do Amílcar, porque as baixas do IN foram em número superior, e presumo que não tivessem sido todos levados.

Dias 12 e 13 no aquartelamento de Guidaje > Baixas mortais:

Sold Cond Auto David Ferreira Viegas,  Comando Agrup Op nº 1/CTIG

Sold José Luís Inácio Raimundo,  38ª Ccmds

Sold Cond Auto Ludjero Rodrigues Silva, CCS/Bcaç 4512.

Por último, lembro que tenho o P4957 (**), que descreve o que foi a 1ª emboscada.
E correspondendo ao teu pedido, estou a ultimar uma descrição das colunas de e para Guidaje, valem o que valerem, mas quero apenas deixar uma nota: O meu Batalhão 4512 teve 9 baixas, 6 são pela luta por Guidaje. 

2. Em relação à constituição da coluna do dia 10, não são 5 Gr Comb do Bcaç 4512, mas apenas 2, um de Nema (2º) e um de Jumbembem (2º). Mas se juntarmos os 2 Gr Comb da Ccaç 14, mais 1 Gr Comb da Ccaç Afr de Cuntima, dá 5 Grcomb, embora estejam sob o Comando do Bcaç 4512, o Cmdt desta coluna foi o Cmdt do Bcaç 4512, Ten Cor Inf [António] Vaz Antunes.

No dia 10 a 2ª coluna é assim constituída:

-1 Gr Comb (2º) da 1ª /Bcaç 4512,  de Nema
-1 Gr Comb (2º) da 2ª/ Bcaç 4512,  de Jumbembem
-2 Gr Comb da 14ª Ccaç, de Farim

-1 Gr Comb da Ccaç Afr Eventual, de Cuntima

-2 Gr Comb da 38ª Ccmds, [de Mansoa, CAOP1]

-1 Secção do Pel Mort 4274, de Farim. 

Abraço

Manuel Marinho
ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512,
Nema, Farim e Binta, 1972/74  [, foto à direita].

_____________


(...) GUIDAJE - A PRIMEIRA GRANDE EMBOSCADA
por Manuel Marinho


A nossa Companhia [, 1ª CCAÇ / BCAÇ 4512,] estava sediada desde meados de Janeiro em Nema, aquartelamento avançado de Farim, com dois Gr Comb, o 1.º e o 2.º os outros dois, 3.º e 4.º em Binta.

No dia 8 de Maio, o 1.º Gr Comb recebe ordens para juntamente com um Grupo da CCAÇ 14,  de Farim, escoltar uma coluna de abastecimento, 2 Berliet mais 2 Unimog com armamento e mantimentos para socorrer um aquartelamento que era Guidaje, e do qual apenas sabíamos que era flagelada com bastantes ataques de morteiros. De noite, em Nema avistavam-se os clarões dos rebentamentos e ouviam-se, ainda que remotamente, os estrondos das explosões.

Deslocámo-nos de tarde para Binta, fortemente armados, escoltando as viaturas carregadas. O trajecto foi feito sem problemas e quando começava a findar o dia, a ordem de avançar para Guidaje foi dada,  já começava a anoitecer, quando esperávamos seguir apenas ao raiar o dia seguinte. Havia apreensão, porque escoltar viaturas de noite era complicado já que nos retirava a mobilidade necessária em caso de ataque.

Avançamos com os picadores na frente da coluna para a detecção de minas enquanto foi possível, depois foi dada ordem para a subida para as viaturas, porque já não se via para fazer a picagem, e foi a primeira viatura a fazer de rebenta-minas.

O roncar dos motores das viaturas, com as luzes acesas, fazia-nos temer o pior, até que aconteceu o rebentamento da mina na primeira Berliet, cerca das 19 horas [...] , causando desde logo dois feridos, entre os quais o nosso Alferes que comandava a coluna.

Depois dos saltos para o chão dos que seguiam nos Unimogs após o rebentamento da mina, ficamos emboscados, e apenas víamos o camarada à nossa esquerda e o outro à direita. Cerca de 10 a 15 minutos depois, o restolhar de passos no mato, vindo do nosso lado esquerdo,  obrigou muitos de nós a fazer a respectiva rotação, porque de imediato começou o primeiro ataque, e único desse dia.

O IN avançou até à picada, disparando rajadas curtas e, dada a proximidade, chegando eu a divisar na noite a silhueta dum IN de tão próximo eles se aproximaram, provavelmente esperando o efeito de desorientação da nossa parte, (posteriormente soubemos que estavam emboscados mais à frente com a picada cortada por abatises), o rebentamento da mina A/C, apenas precipitou os acontecimentos, a julgar pelo que aconteceu depois, ainda podia ser pior. Também RPG,  LGFOG e MORT foram utilizados no ataque.

Depois de intenso fogo de resposta da nossa parte, houve a retirada estratégica do IN para logo de seguida lançarem very-lights e granadas que iluminaram a picada, no sentido de medirem a extensão da nossa coluna.

Este primeiro contacto foi de 15 a 20 minutos. Tivemos de pernoitar no local sem possibilidades de retirada, pois não era possível retirar as viaturas, ficando com a desvantagem de o IN ter tempo de montar a sua estratégia de ataque durante a noite para nos emboscarem, com mais precisão.

Ao raiar o dia 9 de Maio somos novamente atacados, sofremos logo o primeiro morto, e durante cerca de 4 a 5 horas os ataques foram ininterruptos, atacavam-nos revezando-se, ora do lado direito, ora do esquerdo da picada, causando-nos mais 3 mortos e bastantes feridos e, como no local o mato era denso, os estilhaços dos RPG e LGF fizeram-nos muitos estragos.

Era um cenário desolador e trágico o que nos rodeava, até pelo facto de estarmos rodeados de camaradas feridos, alguns com gravidade, eu apenas fui carimbado com pequenos estilhaços sem gravidade, mesmo perante esta situação limite, resistíamos, já tínhamos experiência de combate, mas isto era inimaginável.

Nem o apoio de fogo aéreo conseguiu aliviar a pressão. Sem munições e muito desgastados física e psicologicamente, e já no limite, fomos socorridos por forças de Binta que nos ajudaram a retirar e resgatar os feridos, aguentamos até onde foi humanamente possível, e é com mágoa que relembro a impossibilidade da retirada dos nossos mortos, 1 do meu Grupo, 1 da 3.ª CCAÇ do meu Batalhão, e 2 da CCAÇ 14.

Hoje tenho a impressão que o IN, já nesta fase, esperava a nossa retirada para o saque das viaturas.

A demora na chegada de reforços contribuiu, na minha opinião, para que tal acontecesse, e a prioridade eram os feridos, a ordem de destruir as viaturas, de imediato (?)... é ainda hoje um mistério para mim, porque havia feridos junto às viaturas.

Mas é a agonia e o sofrimento atroz do meu camarada, que atingido gravemente, por duas vezes, acabou por morrer, mau grado todos os esforços, feitos debaixo de fogo do IN pelo nosso enfermeiro para atenuar o seu sofrimento, e perante a nossa impotência para o retirar. É o meu maior pesadelo de guerra até morrer, honra à sua memória.

Infelizmente fomos nós a sofrer esta emboscada que.  se não foi a maior, seguramente foi das piores que aconteceram na Guiné, e deu início ao fatídico mês de Maio de Guidaje.

Mais tarde se o entenderem, direi o que penso sobre o resgate dos corpos.
Omito os nomes dos meus camaradas mortos por razões de respeito.

Algumas clarificações que valem o que valem a esta distância quando a memória começa a falhar, mas este testemunho é o de quem viveu praticamente todas as incidências de e em Guidaje, que apenas e só pretende dar mais um passo na reconstituição dos factos.

Depois falarei sobre a minha chegada a Guidaje integrado na última coluna, do dia 29 [de maio], e de alguns episódios que ocorreram nesse mês. (...)


Guiné 63/74 - P9969: Em busca de... (190): Contactos de pessoal da CCAV 1662 (Manuel Fonseca) )




1. Com data de 19 de Maio último recebemos a seguinte mensagem do nosso leitor (e camarada) Manuel Fonseca. 

Contactos da malta da
CCAV 1662 

Amigo e senhor Luís: 

Apresento-me como ex-combatente em Moçambique, pertencente ao BCAÇ 2914 do qual este ano sou o organizador do convívio do respetivo pessoal, que se realiza amanhã, dia 20, em Tomar. 

Eu tenho um irmão que esteve na Guiné, com a CCAV 1662, e queria ter contatos, para efeitos de convívios, com ex-camaradas.

Agradeço-lhe a possível ajuda desse blogue.

Nome - António Azevedo Fonseca, mais conhecido por o Viseu, soldado condutor [Está emigrado na Alemanha e vem cá passar férias no verão]. 

Um abraço e os meus agradecimentos 
Manuel Fonseca
Tlm: 917 529 096

Emblema e Mini-guião: © Colecção de Carlos Coutinho (2012). Direitos reservados.
___________ 
Notas de M.R.: 
  • A CCAV 1662 foi mobilizada pelo RI7. Partiu para o TO da Guiné em 1/21967 e regressou a 19/11/1968. Esteve em Nova Lamego e Piche. Comandante: Cap Mil Art António de Sousa Pereira. 
Vd. último poste desta série em: 



Guiné 63/74 - P9968: Convívios (441): 2.º Encontro do pessoal da CCAÇ 6 - Bedanda - dia 9 de Junho na Mealhada (António Teixeira)







1. O nosso camarada António Teixeira, ex-Alf Mil da CCAÇ 3459/BCAÇ 3863 -Teixeira Pinto, e CCAÇ 6 - Bedanda, 1971/73 dirige a seguinte mensagem a todos os "bedandenses": 

CCaç 6 (Bedanda) 

2º Encontro 


Meus caros amigos: 

Estamos na recta final. 

Todos os preparativos para a montagem da emboscada no próximo dia 9 de Junho, estão a ser ultimados. 

Como devem calcular, torna-se necessário muito em breve (durante esta semana que hoje começa) fornecer ao restaurante o número o mais aproximado possível de pessoas que vão estar presente. Claro que um a mais ou um a menos não vai fazer grande diferença... o problema está se forem muitos uns. 

Assim, vou passar a transcrever aqui a lista do pessoal que está confirmado. 

Peço-vos então que, com a máxima URGENCIA entrem em contacto comigo (mail to: ahoct@netcabo.pt, TM: 917 803 681) caso haja alguma alteração e só se houver alguma (caso não possam ir ou queiram levar mais alguém). 

Fica também aqui uma chamada de atenção: há amigos que vão levar familiares, como filhos ou esposa. Claro que não há problema nenhum. Se houver mais alguém que queira levar também a legítima, que mo diga, por favor: 

A lista neste momento é a seguinte: 

Teixeira 
Hugo Moura Ferreira 
Vasco 
Carlos Azevedo 
Naia 
Mário Bravo 
Joaquim Carvalho 
Nuno Nunes Ferreira 
Luís Nicolau 
Jorge Pires 
Amaral Bernardo 
Mário Oliveira 
Rui Santos 
Enfermeiro Dias 
Amigo Dias 
Meira 
José Fragateiro 
António Fernandes Ribeiro 
Mário Azevedo 
Carvalho (Fur. do grupo do alf. Carvalho-Famalicão) 
António Augusto Gens 
Vermelho 
Filha Vermelho 
Filho Vermelho 
Licineo Cabeça 
Cândido Monteiro 
Fernando Carvalho 
José Figueiral 
Fernando Sousa 
José Guerra 
Vitor Luz 
Gualdino Silva 
Joaquim Silva 
Pedro Dinis 
Amará Camará 
Carlos Carronda 
Capitão Mateus Trindade 
Esposa 
Acílio Godinho 
Artur Ferreira (enfermeiro) 
Aníbal Marques 
Esposa 
Filho 
Renato Vieira de Sousa 
José Caetano 

Ainda existem uns casos pendentes, que quer eu, quer o Hugo Moura Ferreira (que tem também desempenhado um papel importantíssimo na organização deste encontro e que muito tem ajudado), resolveremos em breve. 

Agradeço portanto que confiram esta lista, e se houver alguma alteração ma comuniquem com a máxima urgência. 

Creio francamente que não me esqueci de ninguém, mas não me admirava se tal acontecesse... a cabeça já não é a mesma. 

Se alguém não estiver na lista, o que desde já peço as minhas desculpas, entre logo em contacto comigo. 

E por hoje é tudo... 

Um grande abraço 

António Teixeira 
___________ 
Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 

                                                                                                                                         

Guiné 63/74 - P9967: Parabéns a você (427): Mário Beja Santos, ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52 (Guiné, 1970/72)

Para aceder aos postes do nosso camarada Mário Beja Santos, clicar aqui
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 29 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9957: Parabéns a você (424): António Vaz, ex-Cap Mil Art, CMDT da CART 1746 (Bissorã e Xime, 1967/69)

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9966: Efemérides (98): Guidaje foi há 39 anos: Operação "Mamute Doido" (4): O Regresso (António Dâmaso)

1. Quarta e última parte da narrativa da "Operação Mamute Doido", de autoria do nosso camarada António Dâmaso* (Sargento-Mor Pára-quedista da CCP 121/BCP 12, na situação de Reforma Extraordinária)  que participou nesta operação levada a efeito no fatídico mês de Maio de 1973.

Fotografia de alguns elementos do 3.º Pelotão da CCP 121, tirada dias antes de partir para Guidage

Legenda:
1 - Cabo Gonçalves, foi ferido no ataque ao Navio Patrulha em 20MAI73
2 - Soldado António das Neves Vitoriano, morto em combate na emboscada de Cufeu em 23MAI73 (a) (b)
3 - Soldado José de Jesus Lourenço, morto em combate na emboscada de Cufeu em 23MAI73 (a) (b)
4 - Soldado A Ferreira Carvalho, morto em Combate em 22JUL73 em Cubonge
5 - Soldado Manuel da Silva Peixoto, morto em combate na emboscada de Cufeu em 23MAI73 (a) (b)
6 - Soldado Fernando Jorge Ferreira Dias, morto na Operação «Gato Zangado I» Nova Lamego em 05FEV74

(a) Ficaram sepultados em Guidage
(b) Os restos mortais foram resgatados e entregues às famílias em Julho de 2008


OPERAÇÃO ”MAMUTE DOIDO” (4)

 O REGRESSO

No dia 30 de Maio pelas 06H30 saímos do Guidage, saí com um misto de alívio por me ver livre daquele inferno e uma tristeza enorme por deixar para trás aqueles três Bravos rapazes que abnegadamente tinham dado a sua vida pela Pátria. Ao sair deitei um último olhar para as campas desejando paz às suas almas, mesmo armado em “duro”, senti um nó na garganta e um ardor nos olhos, foi como se tivesse deixado ali três irmãos mais novos que não consegui proteger, o Lema dos Pára-quedistas “NINGUÉM FICA PARA TRÁS” tinha sido quebrado.

A minha Companhia ia em guarda de flanco esquerdo no sentido Guidage-Binta, os Fuzileiros iam no flanco direito, estávamos arrasados, alguns dos meus homens estavam mesmo em baixo. Antes da saída pedi-lhes que fizessem um esforço, pelo que acederam e lá nos dispusemos a palmilhar os quase 20km de distância, mas depois de passar a zona mais perigosa, ordenei aos que estavam com maior dificuldade para subirem para as viaturas, mas eu como tinha de dar o exemplo, fiz um esforço para aguentar.

Ao passar pela última vez pelo Cufeu lá estavam os esqueletos espalhados comidos pelos bichos, dando uma imagem fantasmagórica, um dos meus homens ia a olhar para a esquerda, de repente olha em frente, depara-se com dois esqueletos junto a uma árvore, fez uma ligeira paragem repentina, mais de respeito do que medo e no momento lembro-me de lhe ter dito para não se preocupar que aqueles já não lhe faziam mal. Ao todo passei pelo Cufeu quatro vezes. Desta vez os guerrilheiros do PAIGC, optaram por não nos incomodar, fiquei com a impressão que eles gostavam mais de atacar pessoal que passava lá pela primeira vez, pelo que chegamos a Binta sem incidentes. Ficámos a aguardar por uma lancha que no dia 01JUN73 nos transportou até Farim, nessa noite fomos dormir no Kapa3, no dia 02JUN73 seguimos em escolta a uma coluna de viaturas de Farim para Bissau, na estrada entre o Kapa 3 e Mansabá, que eu quatro anos antes tinha por lá andado a fazer segurança à construção da mesma. Viam-se algumas viaturas na berma que tinham sido incendiadas, no trajecto entre Mansabá e Mansoa, reconheci os pontos críticos por também ter feito segurança a várias colunas quatro anos antes. Chegamos a Bissalanca pelas 15 horas depois de 15 dias de martírio.

Era fim-de-semana, depois de proceder à operação de recolha do material e do entregar na arrecadação, deixei os homens na camarata e dirigi-me aos meus alojamentos, como o bar de sargentos ficava em caminho, fui lá para matar a longa sede. Ao chegar ao jardim fronteiriço dei uma cambalhota em frente e soltei um grito estridente, deixando escapar toda a raiva e emoções contidas naqueles dias, os presentes já estavam informados do que tinha acontecido, as más notícias sabem-se logo, entreolharam-se e pensaram: "Este tipo vem apanhado de todo, este não é o primeiro-sargento que nós conhecemos". Não se enganaram porque nunca mais fui o mesmo que tinha de lá saído quinze dias antes, noutras circunstâncias ter-se-iam fartado de gozar mas a situação era grave, soube disto por confidência de um deles mais tarde em conversa.

Resumindo, naquelas duas Operações, “Ametista Real” e “Mamute Doido”, sofremos ataques/flagelações em Bigene nos dias 18 e 19 de Maio à noite; na noite de 20 quando érammos transportados no Navio Patrulha que navegava no rio Cacheu, este foi atacado, tendo o meu Pelotão sofrido um ferido que teve ser evacuado. Na noite de 21 fomos atacados no Cais de Binta; no dia 23 sofremos uma emboscada na Zona do Cufeu, onde o meu Pelotão teve três mortos e o 2.º teve um ferido grave que acabou por morrer mais tarde, das seis vezes que passamos na zona de Ujeque, fomos flagelados três; não contabilizei as vezes que fomos flagelados em Guidage nos oito dias que lá estivemos onde num desses ataques uma só granada provocou sete vítimas.

“Diz-se que foram quinze dias para esquecer” mas o pior de tudo é que não se consegue esquecer, têm-me dado muitos pesadelos e tirados milhares de horas de sono.

Curiosamente, apesar de ter tomado notas há muitos anos, tenho uma “branca” desde o espaço de tempo que passei por Genicó e desembarquei em Farim, dizem-me que fomos pernoitar em Binta mas não me lembro de nada

Um Ab
Dâmaso
____________

Notas de CV:

- Sobre a a batalha de Guidaje (ou Guidage), é obrigatório ler o livro de José de Moura Calheiros - A Última Missão (Lisboa, Caminhos Romanos, 2010, 638 pp) e em especial as pp. 437 - 491: cap 31 (A batalha de Guidage) e cap 32 (Como morrem os soldados)...
- Há referências sobre Moura Calheiros (que era na altura o Segundo Comandante e Oficial de Operações do BCP 12) (Guiné, 1971/73)
(http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/Moura%20Calheiros%20%28Cor%20P%C3%A1ra%29)

Vd. postes anteriores da série de:

 27 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9951: Efemérides (60): Guidaje foi há 39 anos: Operação "Mamute Doido" (1): Estadia em Binta e saída até Cufeu (António Dâmaso)

28 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9954: Efemérides (61): Guidaje foi há 39 anos: Operação "Mamute Doido" (2): Desenrolar da emboscada na zona do Cufeu (António Dâmaso)
e
29 de Maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9963: Efemérides (63): Guidaje foi há 39 anos: Operação "Mamute Doido" (3): Permanência em Guidaje (António Dâmaso)

Guiné 63/74 - P9965: (Ex)citações (180): Defendendo a honra do BCAV 8320/72, Bula, 1972/74, que foi acusado de rebelião, em agosto de 74, e cujo pessoal vai fazer sábado, dia 2 de junho, na Trofa, o seu XXVI Encontro anual (Zeca Pinto)

1. Comentários, de 29 do corrente, do nosso leitor (e camarada) Zeca [Pinto], que tem entre outros o blogue zecapinto:

(i) Muita coisa que aqui é dita (*), não é verdadeira. É mentira que se tenha hasteado qualquer bandeira, com foice e martelo. É verdade que na viagem para o cais,  vindos do Cumeré, muitos vinham com panos vermelhos e lenços da mesma cor. 


Que o comandante do batalhão[, ten cor cav Alfredo Alves Ferreira da Cunha,]  tenha negociado, nunca tivemos conhecimento disso, manifestávamos a nossa indignação, pelo facto de [haver tropa] muito mais nova do que nós e que vinha nos TAM, nos aviões militares, e nós por lá estávamos...

Quando fomos para a Guiné,  fomos uma companhia de cada vez, e o regresso tinha que ser de barco, daí não aceito que nos considerem indisciplinados. Por vezes é fácil falar, eu por mim, em minha defesa, fazia o que necessário fosse, mas não reconheço autoridade a ninguém para nos classificarem como o fazem, para mim injustamente. A História, o Exército pode fazer a que quiser, eu digo a verdade e só a verdade.
Como já disse noutro comentário, a tal História não diz que militares regressados da Guiné desembarcaram como civis, certamente não interessava para a História que o Exército quer contar. Eu sei que o Comandante era o Spínola, que foi substituído aquando da publicação do famigerado livro [Portugal e o Futuro,], pelo Bettencourt Rodrigues, e este por sua vez pelo Carlos Fabião. 

Esta é uma de muitas situações vividas na Guiné, no próximo [sábado, dia 2, em Santiago do Bougado, Trofa], devamos festejar o XXVI encontro do tão falado batalhão, rei da insubordinação, muitos colegas meus já faleceram e por isso peço respeito pelo que lá sofremos

(iI) Não é verdade que tenhamos embarcado de madrugada, pois foi à meia noite, por isso não nos viram, certamente contaram mais essa história de muitas outras. O [ten-cor] Cunha, depois da 3ª refeição,  não foi para Bissau, nós é que fomos, pois ele não nos queria deixar sair, mas nós desobedecemos e deu-se até um episódio que podia resultar em tragédia, pois nós caminhávamos em fila indiana, uns de cada lado da estrada, e uma Mercedes do tipo das Berliet, virou-se e, por sorte, não apanhou ninguém, e fomos nós que a colocamos novamente na estrada a pulso. 

Mais uma vez digo que podia ter sido uma tragédia o que felizmente não aconteceu, esta é uma de muitas histórias pelas quais passei. 

Abraços a todos e muita saúde mas não se diga BATALHÃO da indisciplina, haja respeito.

(iii) O referido Batalhão [, BCAV 8320/72,] do qual eu fazia parte, não se pode dizer que era indisciplinado, pois não o era... Mas com 26 meses e companhias com 13 e 14 meses a virem embora e nós a ficarmos por lá não se sabia a fazer o quê... foi essa a razão da indignação,  não revolta. 

O comandante não teve nada a ver com a tal indignação, pois ele tentou impedir a nossa saída, do quartel, sem êxito. Ele quando teve conhecimento da nossa intenção disse que só saíamos por cima do seu cadáver, e nós respondemos que,  se isso fosse o motivo para nos virmos embora, então passávamos. 

E foi quando caminhamos para Bissau, e fomos parados por uma força militar, já não me lembro se foi em João Landim, sei que era um cruzamento para Bula, e estava uma companhia aí instalada que se solidarizou connosco, e disseram que se algo nos fizessem teriam que se haver com eles, pois nós tínhamos razão.

Depois de conversações vieram os carros dos Adidos, para nos levarem de regresso com a promessa de embarque, o que veio a acontecer. Nós fomos colocados dentro do barco e,  como tinha sido uma semana muito chuvosa, quiseram reter-nos no cais em Bissau. Foi quando nós ameaçamos que tudo que estava no cais ia para a água, e o Carlos Fabião deu ordens, para partir. 

Podem dizer que isto era indisciplina, eu digo INDIGNAÇÃO. 

Quanto às ditas bandeiras, foi no transporte do Cumuré até ao cais de embarque. E falta dizer que em Lisboa desembarcámos à civil, pois o espólio foi feito ao largo de Lisboa dentro do barco.

Muitas mais estórias tenho para contar, mas fico-me por aqui com a certeza que esclareci uma estória que está (ou estava)  mal contada. 

Abraços a todos quantos por lá passaram. 

2. Comentário do editor:

A honra e o bom nome dos nossos camaradas estão acima de todas as considerações. Uma coisa são os factos e outra a sua leitura ou interpretação. O nosso blogue não é tribunal de nada nem de ninguém. Interessa-nos apenas a partilha de histórias e memórias da guerra colonial na Guiné. O vosso embarque foi notícia. Até agora só tínhamos uma pequena versão dos acontecimentos. Obrigado pelos teus esclarecimentos. Gostaríamos de saber mais coisas sobre ti e sobre os teus camaradas. Fica aberta a porta da nossa Tabanca Grande (e do nosso blogue) para esse efeito.  Desejamos  a todos os camaradas do BCAV 8320 um feliz e alegre convívio no próximo sábado. Volta sempre.

_____________

Notas do editor:

(...) Bissau, 22 de Agosto de 1974

"... História do Batalhão de Cavalaria nº 8320  do Tenente-Coronel Ferreira da Cunha, que se pôs a andar do CUMERÉ, depois da 3ª refeição, em direcção a Bissau, a pé, sob chuva inclemente. Minha actuação [...]. "

(...) Bissau, 23 de Agosto de 1974

"... Durante o dia, as 'resistências' do Batalhão indisciplinado vieram ao de cima [...] e não teve remédio (o Comandante Militar) senão [...] ceder!, fazendo embarcar o pessoal amanhã à tarde! Eu não desisti e chamei sempre à atenção para a gravidade da situação. ..."

(...) Bissau, 24 de Agosto de 1974

"... O UIGE com o Batalhão do Cunha, o 'famigerado' Batalhão de Cavalaria nº 8320 de Bula, partiu a princípio da madrugada para Lisboa. Estive atento no Cais a vê-los partir! Disseram-me que até hastearam uma bandeira vermelha com a foice e o martelo!..." (...).


(...) BCAV 8320/72: Mobilizado pelo RC 3, partiu para a Guiné em 21/7/1972 e regressou a 25/8/1974. Esteve sediado em Bula. Comandante: Ten Cor Cav Alfredo Alves Ferreira da Cunha. Constituído por 1ª Companhia (Bula, Pete, Nhamate, Bissau), 2ª Companhia (Bula, Nhamate) e 3ª Companhia (Bula, Bissorã, Catió, Pete). Todos os comandantes de companhia eram capitães milicianos. (...)

Guiné 63/74 - P9964: Tabanca Grande (341): Adriano Moreira (Admor), ex-Fur Mil Enf, CART 2412 (Bigene, Guidaje e Barro, 1968/70), grã-tabanqueiro n.º 560

1. Há muito que o nosso camarada Adriano Moreira (Admor) (ex-Fur Mil Enf.º da CART 2412, Bigene, Guidaje e Barro, 1968/70) intervém no nosso Blogue, do qual é leitor diário.
Sabendo disso resolvi endereçar-lhe um convite para ele se instalar com armas e bagagens na nossa Tabanca Grande, sabendo que o seu coração pende para aquele grupo de bandalhos pertencentes ao Bando do Café Progresso - Das Caldas até à Guiné, capitaneado pelo nosso outro camarada e tertuliano Jorge Teixeira, também este da 2412.

Porque os amigos são para as ocasiões, para poupar trabalho, fomos ao Blogue do Bando do Café Progresso e, com a anuência do Presidente Jorge Teixeira, copiamos, com a devida vénia, a apresentação do Admor, como segue:


Apresenta-se o Soldado Recruta do CSM,  em 12 de Setembro de 1966,  na EPC, Santarém, Adriano Moreira.
 
Quem é que lhe perguntou o nome? Você aqui é um número! 

Em 3 de Janeiro de 1967 fui para Lisboa para o BSCF, em Campo de Ourique, como pensionista (dormir e comer) para tirar o Curso de Enfermagem na ESSM onde estive até Maio para fazer também o pré Estágio no Hospital Militar Principal.

Depois regressei ao velho burgo do Porto,  ingressando no HMR1 onde estive até junho de 1968, altura em que fui para o RAP2  integrar a CART 2412 com destino à Guiné.

Embarquei em 11 de Agosto no Uíge e lá desaguei na Foz do Geba,  com as trouxas às costas para um batelão que me pôs em terra firme de Bissau.

Após tudo isto e as praxes militares, seguimos para Brá onde ficamos instalados no Depósito de Adidos até 31 de Agosto. No dia seguinte fomos de LDG até Ganturé, onde saímos e dirigímo-nos para Bigene onde ficamos até 14 de Outubro a fazer treino operacional sob o comando do COP3 do Major Correia de Campos e com a CART 1745.

No dia 15 chegamos a Binta para render a CART 1648, tendo seguido quase de imediato o 2.º Pelotão da nossa Companhia para Guidaje a fim de substituir o Pelotão da 1648 que estava lá.

No dia 17 seguiu o 1.º Pelotão mais o Comando da Companhia para Guidaje por este destacamento ter sido considerado mais importante do que Binta em termos operacionais. Assim, a partir desta altura um pequeno destacamento que vivia com a população dentro do arame farpado ficou a rebentar pelas costuras com 3 Pelotões de brancos e um de naturais da CCAÇ 3 que nos apoiou sempre enquanto lá estivemos.

Em 9 de Março de 1969 fomos outra vez Cacheu abaixo em direcção a Ganturé para trocarmos com a CCAÇ 3 de Barro onde ficamos até finais de Abril de 1970.

Regressamos a Bissau onde embarcamos no Carvalho Araújo em 5 de Maio. Ainda passamos pela Ilha de S. Vicente em Cabo Verde, tendo aportado em Lisboa a 14 do mesmo mês. Já nessa altura o barco fez o percurso a cambar para a esquerda. Não sei se era defeito ou premonição.

Um grande abraço para todos
ADMOR - Adriano Moreira


2. Comentário de CV:

Caro camarada Adriano Moreira, estás oficialmente apresentado à tertúlia. Já por cá andas há muito, mas só agora resolveste, a meu convite, fazer parte desta imensa família de ex-combatentes da Guiné.

Foste um dos poucos a fazer o percurso inverso, ou seja vir de uma Tabanca dita mais pequena para a nossa, já que a esmagadora maioria dos camaradas começou a frequentar as que foram surgindo de norte a sul de Portugal, inspiradas pela do Luís Graça & Camaradas da Guiné. É um sinal de vitalidade e capacidade de associação que os ex-combatentes da Guiné demonstram, discutindo e registando as suas memórias em Blogues, livros e redes sociais.

Queremos continuar a contar contigo e com a tua colaboração activa dando, por que não notícias das vossas andanças enquanto bandalhos do Café Progresso.

Não te dou as boas vindas porque já és da casa, mas deixo-te um abraço em nome da tertúlia onde ficas com o número 560. Nem aqui escapaste a um número. Não leves a sério,  é apenas uma referência que amanhã estará esquecida.

O teu camarada e amigo
Carlos Vinhal
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Nota de CV:

Vd. último poste da série:

20 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9928: Tabanca Grande (340): Lázaro Ferreira, ex-fur mil art, GA 7 (Bissau, Gadamael e Ingoré, 1974), hoje advogado em Braga