quinta-feira, 6 de junho de 2013

Guiné 63/74 - P11678: Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau: de 30 de abril a 12 de maio de 2013: reencontros com o passado (José Teixeira) (4): Visita ao Cantanhez e ás tabancas de Iemberém e Farim do Cantanhez... O poilão de Amílcar Cabral... Recordações do tempo de guerra: Contabane e Mampatá (eu e Abdu Indjai, avô da Alicinha); e Jumbembem (o Francisco Silva e o Galissá)


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Parque Nacional do Cantanhez  > 3 de maio de 2013 > O majestoso poilão Amílcar Cabral (1)



 Guiné-Bissau > Região de Tombali > Parque Nacional do Cantanhez  > 3 de maio de 2013 > O majestoso poilão Amílcar Cabral (2)


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Parque Nacional do Cantanhez  > 3 de maio de 2013 > O poilão Amílcar Cabral (3)... Na foto, a Armanda, esposa do Zé Teixeira.

Fotos (e legendas): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: LG]

2. Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau  (30 de Abril - 12 de maio de 2013) - Parte IV

por José Teixeira 

[, Membro sénior da Tabanca Grande e ativista solidário da Tabanca Pequena, ONGD, de Matosinhos; partiu de Casablanca, de avião, e chegou a Bissau, já na madrugada do dia 30 de abril de 2013; companheiros de viagem: a esposa Armanda; o Francisco Silva, e esposa, Elisabete; no dia seguinte, 1 de maio, o grupo seguiu bem cedo para o sul, com pernoita no Saltinho e tendo Iemberém como destino final, aonde chegaram no dia 2, 5ª feira; na 1ª parte da viagem passaram por Jugudul, Xitole, Saltinho, Contabane Buba e Quebo; no dia 3 de maio, 6ª feira, visitam Iemberém, a mata di Cantanhez e Farim do Cantanhez] (*)


No dia seguinte ], 3 de maio, 6ª feira,] bastante cedo, depois de um pequeno-almoço bem recheado de compotas, fruta e mel das famosas lassas [, abelhas], visitamos a Tabanca de Iemberém no que ela tem de melhor, os seus habitantes. Cumprimentos e sorrisos, desde as crianças que nos disputavam os dedos das mãos, às mulheres grandes,  passando pelos homens e jovens que nos sorriam e acenavam com um bom dia.

Aqui em Iemberém ou em qualquer lugar onde parássemos,  tínhamos sempre um sorridente bom dia, Em português, crioulo ou na sua língua nativa, e logo entabulavam conversa, para saber quem éramos e de onde vínhamos. Ao saber que éramos portugueses, o sorriso abria-se e havia uma pergunta sacramental, sobretudo quando se tratava de um homem:
– Estiveste cá na guerra, onde?

Uns identificavam-se alegremente como antigos soldados portugueses como nós e havia,  logo ali, histórias sem fim para contar, como o motorista que nos acompanhou em todo o nosso deambular pela Guiné. O simpático,  e sempre disponível, motorista fez parte de uma Companhia de caçadores nativos e gostava de reencontrar os amigos com quem conviveu.

Outros identificavam-se como antigos combatentes do PAIGC. Localizavam-se as terras por onde andamos, nós e eles. Rapidamente, descobríamos que nos cruzamos algures no mato uma vez, duas, três…Logo começava um rosário de histórias,  seguidas com pormenores de ataques ou emboscadas.

Por exemplo, vim a descobrir que o avô da Alicinha, a menina que a Alice, esposa do Luís Graça, apadrinhou e cuja jovem mãe [, a Cadi,]  faleceu recentemente, foi um dos que em 22 de Junho de 1968 participou, como comandante, no ataque a Contabane, onde estava estacionada a CCaç 2382, destruindo e queimando a Tabanca, não ficando uma morança para recordação. Felizmente,  sem vítimas a registar. Posteriormente e depois me ter ido visitar em Mampatá Forreá, voltou ao local, talvez para saborear os estragos que provocou e caiu numa minas A/P,  que lhe roubou uma perna acabando por ter de se deslocar à Holanda para colocar uma prótese, terminando assim a sua guerra ativa.

Parece que o objetivo era demonstrar ao Régulo de Contabane, o Sambel, o poderio do PAIGC e sobretudo informar Bissau que aquele caminho para a mata do Boé não podia ser usado pelas forças portuguesas. Hoje sabe-se que o Régulo Sambel,  ao ter conhecimento que algumas tabancas do seu regulado, existentes na Guiné Conacri,  davam apoio ao PAIGC fez uma deslocação a essas tabancas para dissuadir os seus habitantes a não colaborarem com o partido, e o resultado foi a destruição da Tabanca pelo fogo em ataque cerrado debaixo de uma tremenda tempestade.

Um homem sorridente e bem-disposto com aspeto jovem apresenta-se ao grupo, pergunta-nos se somos ex-combatentes. Ao respondermos afirmativamente os seus olhos tomaram um brilho especial, que me impulsionaram para lhe fazer uma pergunta:
–  Bó bi. Abó bandido da mato?
– Eu mesmo, em Jumbembém.

O Francisco Silva,  ao ouvir falar em Jumbembém [, na região de Farim], pergunta-lhe em que ano esteve por lá. E não é que tinham estado do lado oposto da barreira no mesmo período de tempo, ou seja durante o tempo em que o Silva comandou o Pelotão Caçadores de Nativos 51!?

É fácil imaginar o diálogo que se seguiu, depois de selarem o feliz encontro com um apertado abraço. Um a dizer quando e como atacou a tabanca, o outro a dizer como se defendeu e contra atacou. Aninhados no chão alinharam as posições das suas armas. Nas suas mentes bailava de forma nítida a fotografia do terreno calcorreado há quarenta anos. Com o dedo traçaram as coordenadas do terreno no chão de Iemberém, para melhor justificarem as ações que desenvolveram. Para mim, foi um prazer imenso acompanhar este diálogo entre dois antigos inimigos, agora libertos do fantasma da guerra, a conversarem de forma desapaixonada sobre as técnicas e ardis usados para atacar ou defender posições.



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém >  3 de maio de 2013 >  O segundo encontro do Francisco Silva com o PAIGC. O Abraço do Galissa e a discussão dos planos de defesa e ataque a Jumbembém, na altura em que o Francisco era o comandante do Pel Caç Nat 51.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém >  3 de maio de 2013 >  Esta velhinha também me pediu um abraço...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém >  3 de maio de 2013 > Aspeto da sala de jantar do restaurante da Satu, em Iemberém.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém >  3 de maio de 2013 > Um das várias hortinhas que existem junto às moranças

Fotos (e legendas): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição: LG]

Nesta deslocação por Iemberém apreciamos a forma artesanal como fabricam o óleo de palma em que os homens apenas sobem às palmeiras para recolher o coconote, sendo reservado às mulheres o seu transporte e tratamento para produzir o saboroso e alimentar óleo de palma, desde a cozedura, a trituração no conhecido pilão, a separação e purificação do produto. A propósito de todo este trabalho, a AD tem em S. Domingos uma escola oficina de metalurgia onde fabrica máquinas para simplificar e reduzir o esforço humano, mas ainda não chegaram a Iemberém.







Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém >  3 de maio de 2013 > Destilação de óleo de palma em que todos ajudam até as criançinhas. O Francisco Silva ainda deu uma ajuda no pilão e até tentou subir à palmeira.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém >  3 de maio de 2013 > Uma bajudinha com a cesta de coconote que trouxe da bolanha.

Fotos (e legendas): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


Tivemos a oportunidade de conhecer as gentes da etnia tanda, com menos de dois mil indivíduos radicados na Guiné-Bissau, muito bem acolhida pelos membros da etnia fula de Iemberém, onde se fixou um grupo tanda e criou a sua Tabanca.

As bajudas solicitaram à AD [, a ONG do Pepito,] apoio para a criação de uma escola de costura. Organizaram-se em associação e avançaram. A Tabanca Pequena [, de Matosinhos,] deu a mão e colocou em Iemberém três máquinas de costura. O projeto avançou e proliferou até Cabedú e Catesse. Dele falaremos em poste próprio.

Ainda nesta manhã que começou muito cedo, embrenhamo-nos na Mata do Cantanhez para saborear toda a sua beleza. Espetacular monumento à natureza que está a ser criminosamente destruído por indivíduos sem escrúpulos. Abatem as árvores de grande porte para venderam aos chineses e desbastam o que fica para adaptarem o terreno à produção de caju. Por exemplo a salacunda é uma árvore enorme em extinção que só existe em três matas da Guiné. No Cantanhez apenas se conhece uma, a que nós pudemos apreciar.

Mas o grande desafio estava no poilão a que batizaram “poilão Amilcar Cabral”. Deve ser uma das maiores árvores de África, bem escondida no coração da Mata do Cantanhez. É um monumento digno de ser ver e apreciar, pelas dimensões do seu tronco e pelo tamanho e beleza da sua copa. Sobretudo pelo que representa. A Natureza com todo o seu esplendor.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Farim do Cantanhez >  3 de maio de 2013 > O avô da Alicinha, Abdu Indjai, antigo combatente do PAIGC, amputado de um perna na sequência de uma mina A/C, acionada em Mampatá, em finais de 1968, ma altura em que lá estava o Zé Teixeira.

Fotos (e legendas): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


Galinha com molho de mancarra, preparado com todo o carinho pela Satu, foi o pitéu que nos levou de novo até Iemberém para o podermos saborear. Um merecido descanso e nova partida até Farim do Cantanhez à procura da Alicinha.

Fomos recebidos por ex-combatentes do PAIGC, entre os quais o avô da menina. Foi a minha vez de falar do tempo da guerra e dos desencontros que tive com ele próprio, quando estava em Mampatá. Parece que foi um dos que em Novembro de 1968, juntamente com o Braima Cassamá que conheci em 2008, tentou ocupar a tabanca, pelas duas horas da tarde. Eles sabiam que nessa noite uma sentinela abateu uma vaca junto ao arame farpado. Eles sabiam que iriamos ter almoço melhorado e pacientemente esperaram nas redondezas pela hora do almoço. Quando se aperceberam que o almoço ia ser servido,  avançaram envolvendo a tabanca e penetrando pelo lado da estrada que ligava a Buba.

Tinham as armas com balas incendiárias apontadas às moranças e logo onze delas começaram a arder. Tão depressa entraram (alguns) como logo tiveram de sair.  para não sacrificarem as suas vidas, como testemunhou o Braima, um dos que ainda entrou dentro do arame.

A minha homenagem póstuma ao grande Aliu Baldé, o régulo, que com o morteiro 60, escutava para localizar a origem do fogo e… lá vai uma, duas, até se calarem. Logo mudava de posição sempre seguido por dois milícias com um cunhete de granadas e recomeçava a cena. Eu que,  desorientado com tanto “sakalata” (ou chocolate, como nós os europeus dizíamos, o que significa barulho/festa/ronco), deslocava-me pelo interior da tabanca à procura de supostos feridos, o que felizmente não aconteceu. Nem uma beliscadura.

Zé Teixeira

Guiné 63/74 - P11677: Agenda cultural (277): Lançamento do livro "Gente Com Coragem", do nosso camarada Castro Ferreira - Padrão, em Espinho, dia 22 de Junho. Convite.

1. O nosso camarada Castro Ferreira - Padrão, enviou-nos o seguinte convite para o lançamento do seu novo romance: 




Bom dia!



Antes de tudo o meu antecipado pedido de desculpa por estar a utilizar este endereço electrónico para tal fim.

Como conheço o V/trabalho e considero deveras meritório o que tem sido feito – o convívio que proporcionam entre as pessoas bem como dar a conhecer factos da nossa passagem por todo o Ultramar -, julgo “poder” utilizar tal espaço para endereçar um convite.

Assim, venho por este meio enviar um CONVITE (um meu e outro da Editora) para o lançamento do meu novo romance.

Passados quarenta anos da nossa partida para a Guiné-Bissau resolvi escrever um livro que de certa forma também lembrasse momentos da nossa passagem por terras de África (Guiné/Bissau, Cacine e Gadamael-Porto).É um livro escrito no género ficção mas que também ‘retracta’ alguma realidade por todos nós vivida.

A sua apresentação (dia 22/06/2013, sábado, às 16 horas, na Biblioteca Municipal José Marmelo e Silva, em Espinho) estará a cargo do Senhor General Manuel Monge.

Nota: para ter a certeza de que foi bem acolhido P.F. acusar a recepção.

C o n v i t e   d a   e d i t o r a:

Durante o lançamento do meu mais recente romance ‘O Quarto das Exóticas’ que se realizou a 6 de Setembro de 2012, foi-me feita a pergunta: - Para quando será o próximo? E eu respondi: - Se tudo correr bem será lá para Abril/Maio. Pois então, eis chegada a hora (um pouco atrasado) de mais uma aventura, o lançamento de um outro livro, será o quinto, este tem o título – Gente Com Coragem -, que ocorrerá no dia 22 de Junho de 2013, sábado, pelas 16 horas, na Biblioteca Municipal José Marmelo e Silva, em Espinho.

A apresentação do livro estará a cargo do Amigo, Senhor General Manuel Monge.

Editora é a Edita-me.

Sobre o romance: 

Um militar «propõe-se» a uma aventura, constatar in loco uma autêntica zona guerra (Ex-Ultramar Português), mas tal propósito para alguns com quem se vem a cruzar não é bem aceite e não falta até quem não consiga esconder uma certa desconfiança com tais intenções e os dissabores e a hostilidade tomam o seu lugar…

Como sempre, e mais uma vez, espero poder contar com a Vossa Presença pois ela será o melhor, o maior e mais salutar contributo para poder continuar a rascunhar qualquer coisa.

Até lá, um abraço Amigo, 
José António de Castro Ferreira - Padrão
_____________ 
Nota de M.R.:

Vd. também o último poste da série em:



Guiné 63/74 - P11676: Convívios (528): XXV Almoço-Convívio do BCAÇ 2884 (José Firmino)

1. O nosso Camarada José Rodrigues Firmino, que foi Sold. Atirador da CCAÇ 2585/BCAÇ 2884, Jolmete, 1969/1971, enviou-nos notícias do Almoço /Convívio da sua unidade.

XXV Almoço-Convívio do BCAÇ 2884 

Teve lugar no passado dia 1 de Junho do ano 2013, desta vez no Fundão, o XXV almoço do nosso Batalhão com cerca de 140 participantes, composto pelas seguintes companhias: 2584 - “Có”, 2585 – “Jolmete”, 2586 e CCS –“Pelundo”, que serviram o Estado Português no período 1969/1971 na Guiné. 

Com uma viagem bastante longa para muitos, onde não faltou por vezes alguns enganos no percurso, a ponto de nem todos poderem chegar a tempo ao local de concentração, com a hora marcada para as 11:00h, no Seminário do Fundão e 11:30h celebração de missa pelos camaradas falecidos e finda a cerimónia religiosa rumar até ao Hotel Palace do Fundão, pôr alguma conversa em dia, algumas fotos pelo meio para mais tarde recordar: fica antes de mais a minha sugestão pessoal e porque não outras que durante o almoço fui ouvindo, porque não escolher futuramente um local fixo, que seria por exemplo a zona de Fátima ou arredores? Seria como se diz na gíria um meio-termo para todos, local que, como referência, tivesse o mínimo de condições para tal evento. 

Terminada a cerimónia religiosa (missa) e depois da sugestão atrás referida, há que rumar até junto do hotel, uns em viaturas próprias, outros como vai sendo habitual, no autocarro. Mais algumas fotos, alguns abraços, um olhar às barrigas duns e doutros, algumas com tamanho xxl…  pois já todos nós somos avós. 

Algumas formalidades cumpridas ordem de entrada no hotel, e pela primeira vez fazer reparo aquilo que entendo não correu bem, ou seja as entradas nada a condizer com os pergaminhos do batalhão 2884 (MAIS ALTO). Pouco para tantos, mesmo que todos saibamos que a nossa presença seja mais pelo convívio, há mínimos a respeitar. Dizer que onde devia estar a chouriça grelhada, estavam era folhas de couve, e o resto em pouca quantidade. Para muitos ficou apenas o cheiro. 

No início do almoço servem a sopa, seguidamente batatas a murro com bacalhau onde as postas não tinham lá muito tamanho, e eis que peço ao empregado para que me pusesse um pouco de azeite nas batatas, o qual não respondeu, pois se calhar nem vocacionado para tal tarefa estava, ou quem sabe não teve formação para uma razoável atitude diferente. Sinais dos tempos onde os mais novos por vezes não respeitam aqueles que já têm cabelos brancos. 

Segundo prato servido, mais algumas fotos pelo meio, e segue-se a sobremesa, bebidas, café, digestivos e bolo comemorativo do Batalhão. 

Lembrar que a animação esteve a cargo do nosso camarada ANTÓNIO CAMPOS e sua esposa CELESTE CAMPOS de Braga e uma ou outra voz desafinada. Enquanto o ANTÓNIO ia tocando afinadinho, a pandeireta desafinava, o mais importante foi e será sempre o convívio, esse sim é que motiva e convida a estar presente. 

Quero dar uma palavra de agradecimento a todos quantos queriam estar presentes e que por motivos vários não puderam. Como eu vou lembrando, o tempo vai escasseando e depois, um dia, quando gostaríamos de participar já por cá não andamos. 

Àqueles que mesmo não podendo estar mandaram mensagens para a rapaziada do Batalhão fica o nosso obrigado. Chegados ao fim de mais um convívio e com anúncio do próximo a ter lugar em Rio Maior, esperamos todos estar mais uma vez presentes. 

Para todos ex.camaradas e famílias fica meu abraço de amizade. 

Um até pró-ano e bem hajam. 
JOSÉ RODRIGUES FIRMINO (RÉGUA)








Para quem quiser ver todas as fotos, eis os respectivos links:

Fotos de Manuel Resende (Ferreira)

Fotos de José Rodrigues Firmino:
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Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

28 DE MAIO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11645: Convívios (527): Convívio da CCAÇ 84 (Alberto Nascimento)


Guiné 63/74 - P11675: Parabéns a você (586): Belarmino Sardinha, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista do STM (Guiné, 1972/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 5 de Junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11672: Parabéns a você (585): Manuel Traquina, ex Fur Mil Inf da CCAÇ 2382 (Guiné, 1968/70)

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Guiné 63/74 - P11674: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (15): Analfabetismo, um outro combate

1. Em mensagem do dia 3 de Junho de 2013, o nosso camarada  Manuel Joaquim (ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, BissauBissorã e Mansabá, 1965/67), enviou-nos a sua décima quinta "Carta de Amor e Guerra".


CARTAS DE AMOR E GUERRA 

15. Analfabetismo: um outro combate 

Bissorã, 24 fev 1966 
(… … …). 
Minha querida D., desculpa o meu silêncio. Diversas circunstâncias o provocam. Há uns tempos para cá tenho a meu inteiro cargo a instrução primária de 44 soldados, o que me ocupa todas as tardes e princípio das noites, precisamente o tempo mais propício ao descanso. Mas eu trabalho com gosto. Até porque é o meu único trabalho oficial [que acho] válido. E os alunos compreendem e acarinham-me. O que é certo é que o tempo livre voou quase todo. (…). 
Como vês, o tempo que tenho para descansar é diminuto e, além disto, ainda tenho a correspondência e a leitura. Sim, porque todos os dias leio alguma coisa. É pena não poder adquirir os livros que quero. Mas, como daqui em diante começam a ir aí à Metrópole camaradas meus, já tenho um meio de os adquirir. (… … …). 

Fotos 1 e 2 > Bissorã > Edifício da escola missionária. Fotos tiradas com cinco anos de intervalo; a 1ª, em Out./1965, na altura da minha chegada e a 2ª, em 1970 
(© de Carlos Fortunato, fur. mil. CCaç 13). 


Lisboa, 1-Março-1966 
(… … …) 
Meu querido M. peço a tua benevolência para o facto de nem sempre saber controlar-me quando, por qualquer motivo, há um período mais longo sem que me apareçam informações tuas. Também não sabia das tuas novas funções. 
Sei que essa actividade te dá bastante prazer e folgo muito com isso. Sei agora que me roubas mais umas horas (…) de convívio contigo e, a ti, um período de descanso que te seria também favorável. Mas, quando o trabalho nos enche completamente as horas, só faz bem. Por um lado, em momentos livres, não nos deixa lugar a pensamentos menos optimistas; por outro lado, dá-nos a sensação de não sermos imbecis, inúteis, de que afinal produzimos alguma coisa ou que ainda temos vontade em não nos deixarmos mergulhar no charco ou no fosso imundo que se abre aos nossos pés e para onde, (…), querem empurrar-nos. Evidentemente que a tua situação aí é um pouco diferente e, por mais trabalho que tivesses, não conseguirias alhear-te da situação ignóbil para que te atiraram. 
(… … …). 


Mansabá, 2.Jan.1967 
(… … …). 
Na minha última carta parece-me que te falei em férias que iria gozar este mês. Os planos falharam. À última hora cortaram-me as férias! Porquê? 
Precisamente para me enfiarem a ensinar uma classe de militares e uma outra de civis, de garotitas. Julgo que ganhei com a troca. Devido a este meu serviço diário, deixei de ir para o mato. (…). Esta é a primeira alegria que o benjamim [Ano Novo] me trouxe. Entrei com uma “grandecíssima” bebedeira. Não, não te atemorizes, meu amor, que não é para continuar. Não sou alcoólico, longe vá o agoiro! 
(…). Vou ter um trabalho estafante mas “quem trabalha por gosto não cansa”. (…). 
(… … …). 

Fotos 3 e 4 > Mansabá, no início de Jan/1967: “escola” na rua e à sombra de uma mangueira. 
© Manuel Joaquim 

[Aproximava-se o fim da comissão do BCaç 1857 e eu continuava a dar aulas, voluntariamente, aos soldados da minha CCaç 1419. Por directiva superior fui, então, incumbido de dinamizar a inscrição de crianças para a frequência escolar, organizando também o trabalho didáctico e pedagógico necessários ao funcionamento de uma escola já que tinha qualificação profissional para o poder fazer. Iniciou-se, em paralelo, a construção acelerada de um pequeno edifício escolar, de uma só sala, enquanto os seus futuros utentes começaram a frequentar as aulas em espaços improvisados. Para dar estas aulas formou-se uma equipa constituída por mim e pelos furriéis António Correia e Germano Passeiro (CCaç 1421) e distribuímos os alunos pelos três, eu fiquei com as meninas. Quando o edifício escolar ficou pronto, recebeu de imediato as crianças, assumindo eu todo o serviço docente e os meus camaradas as atividades de animação circum-escolar.]

Cacém, 9- Janeiro- 1967 
(… … …). 
Que feliz me sinto, também, pela oportunidade surgida que te pôs a salvo de saídas para o mato. Como é óbvio, essa felicidade é ainda mais completa quando as perspectivas de um regresso antecipado começam a avolumar-se. 
(… … …).


Mansabá, 9-1-1967 
(… … …). 
Estou bem, com saúde e muitas saudades tuas. Já quase me faço compreender pelas miuditas a quem dou aulas todos os dias. É um trabalho que me está a agradar imenso, até porque me ajuda a passar o tempo, agora que ele me parece tão difícil de passar. 
(… … …). 

Foto 5 > Mansabá, Fev/1967: alunas em recreio escolar. 
© Manuel Joaquim 

Mansabá, 23 Jan. 1967 
(… … …) 
Falar-te do meu dia a dia (…). Como já sabes, não ando no mato. Sábados de tarde e Domingos, não trabalho. Nos outros dias dou duas horas de aulas, da parte da manhã, às crianças e outras duas, da parte da tarde, aos soldados. (…). Vistas bem as coisas, comparando a minha situação actual com a anterior, é caso para andar bem satisfeito, e ando.(…). 
Penso que daqui a três meses já devo estar aí agarradinho a ti. 
(… … …). 


Mansabá, 6-Março-1967 
(… … …). 
Às vezes tenho estados de espírito estranhos, tal como o de começar a ter saudades de alguma coisa que por cá existe. Refiro-me, muito em especial, às “minhas” pequenitas que, todos os dias, eu no caminho da escola, disputam em corrida qual delas chega primeiro para me agarrar e dizer “bom dia!”. Então, quando acaba a aula, é uma “chatice”. Elas ainda mal falam o português mas já sabem dizer “adeus, amor di mim”, “adeus, querido di mim” e outras frases similares. Na sua ingenuidade repetem o que ouvem dizer lá por casa às irmãs mais velhas, namoriscando com soldado branco. 

Foto 6 > Mansabá, Março/1967: professor “Amor di mim” com quase todas as suas alunas. 
© Manuel Joaquim 

(…). Enfim, são uns tempos muito bem passados, estes em que lido com as crianças. Cá na terra toda a gente me conhece pelo nome. Passo pelas ruas e às vezes até chateia a frequência com que dizem “M.el Joaquim”. Não dizem muitas vezes mais nada, só esperam que me volte e sorria. (…). 
Alegra-me saber que fiz algo de bom por aqui. E é, sim, com um pouco de saudade que vou deixar esta gente. (… … …) 

Foto 7 > Mansabá, Março/1967: uma aluna apresenta a sua linda maninha. 
© Manuel Joaquim 

Cacém, 14.3.1967 
“Adeus amor de mim” 
Enterneceram-me sobremaneira estas palavras proferidas com pura ingenuidade por essas grandes e dedicadas amigas – almas jovens reconhecidas que, atendendo ao carinho e vontade com que lhes ensinas o ABC, o entusiasmo e compreensão com que as deves escutar, (…), te oferecem essas palavras como única mas valiosa recompensa. 
Oh meu amor, (…), deves orgulhar-te disso e aceitá-las como recompensa por tantos sacrifícios inúteis, como lenitivo para não sentires que a tua estadia aí foi de todo estéril. Mas não foi mesmo, querido. A prova está aí, sai da boca dessas miuditas que te encantam. (…). 
Eu sei, (…), quando regressares à Metrópole não faltarão momentos em que recordarás saudosamente alguma coisa de ti que por aí vai ficar. E, simultaneamente, talvez com saudades serás recordado nessas terras (…). 
Mas vem, (…), vem depressa (…) porque, por aqui, as saudades começam a abrir ferida (…). A espera é dolorosa e eu começo a sofrer os seus efeitos.(…). 
(…) a data do regresso pode ser protelada mas a mesma força e o mesmo entusiasmo abrirão caminho para efusivamente nos abraçarmos (…). 
Não vamos agora desesperar (…) quando estamos quase a transpor a porta do nosso céu. (…) 
Muitos e muitos beijos (…). Adeus, meu amor. N.


Mansabá, 10-Abril-1967 
(… … …). 
Toda esta semana, passei-a a fazer exames [4ª classe do ensino primário]. (…) para que muitos soldados venham a ter o diploma nas mãos. Reconheceram-no e ontem à noite organizaram uma festinha muito simples e comovente, em minha honra. Senti-me confundido com a sua atitude, o seu reconhecimento por tudo o que fiz por eles (…), foi alguma coisa sem outro qualquer intuito que não fosse o de instruí-los. A festinha terminou com razoáveis bebedeiras e por pouco que não apanhei também uma “perua”. Senti-me feliz, deveras satisfeito. 
(… … …). 


Bissau, 25-Abril-1967 
(… … …). 
(…) vai aqui um excerto do Diário da Guiné. (…). Na fotografia, a minha presença vai assinalada com uma seta. (…). Consola-me ver que a minha actividade [docente] não passou despercebida. Até fui abraçado pelo general. A exibição coral foi, na verdade, um sucesso. Palavra que me chegaram as lágrimas aos olhos, eu à frente das crianças, quando a exibição coral passou muito para além do que eu pensava. Dois dias depois ouvi a sua transmissão pela rádio e fiquei visivelmente orgulhoso (…). 
Saí de Mansabá com as lágrimas nos olhos pois não consegui conter-me perante a despedida afectiva daquelas crianças. Ver criancinhas negras com lágrimas na face, abraçadas a mim, foi demais. Nunca pensei que as coisas chegassem a este ponto. Foi qualquer coisa de inolvidável, minha N. 
(… … …) 
Meu amor, calma, muita calma na espera. Eu já quase estou aí. Pouco falta. São só uns dias. 
Adoro-te e é nesta adoração que me despeço. 
Sou o teu, muito teu M.

Foto 8 > Mansabá, Jan/1967 : e à sombra da mangueira se começou a aprender o “ABC”
© Manuel Joaquim 

Foto 9 > Mansabá, Abril/1967: cerimónia da inauguração da escola pelo Governador e Com.Chefe, general A. Schultz. 
Foto da respectiva reportagem publicada no Diário da Guiné.
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Nota do editor

Último poste da série de 29 DE MAIO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11650: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (14): Ciúmes

Guiné 63/74 - P11673: Álbum fotográfico de Carlos Fraga (ex-alf mil, 3ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1973) (9): 3 vistas aéreas de Guileje


Guiné > Região de Tombali > Guileje > Foto nº 1 > Foto aérea, tirada no sentido sul-norte. A leste de Guileje ficava a estrada Aldeia Formosa - Gandembel - Cacine e a fronteira (em linha recta, cerca de  8 km, ao alcance portanto da nossa artilharia: peça 11.4 e depois, no final, em maio de 1973, o obus 14)



Guiné > Região de Tombali > Guileje > Foto 1 A > Pormenor da foto aérea, tirada no sentido sul-norte, mostrando o essencila da área ocupada pelo quartel e tabanca. A vermelho, a fiada de arame farpado. À direita, ficavam os 3 espaldões de artilharia (peças 11.4, apontadas para a fronteira).


Guiné > Região de Tombali > Guileje > Foto nº 2 > Foto aérea tirada no sentido norte -sul. Do lado esquerdo, é visível o começo da pista de aviação e uma aeronave.  Também é bem nítida a  a rede de arame farpado, os abrigos subterrâneos,  as principais instalações das NT, e as viaturas. O aquartelamento era atravessado pela estrada (, ao conto superior direito,) que levava à fonte, no rio Afiá,   e a Mejo).


Guiné > Região de Tombali > Guileje >Foto 2 A > Pormenor do aquartelamento ( com as suas  instalações mais importantes).


Guiné > Região de Tombali > Guileje >Foto 3  >  Outra vista aérea, a preto e branco,  tirada no sentido sul-norte.




Guiné > Região de Tombali > Guileje > Fotop nº 3A > A preto, assinalada a rede de arame farpado; e a vermelho os três espaldões da artilharia (apontedaos para a fronteira, a leste)



Guiné > Região de Tombali > Guileje > Foto 3B > A preto,  a rede de arame farpado...m A vermelho, a capelinha, erigida no tempo do Zé Neto (CART 1613, 1967/68) e reedificada pela Ad - Acção para o Desenvolvimento, no âmbito do Núcleo Museológico Memória de Guiledje.

Fotos: © Carlos Fraga (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: L.G.]




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Guiné > Região de Tombali > Guileje > 1966: Planta do aquartelamento. Orientação Norte-Sul. Guileje ficava entre Mejo, a noroeste, na estrada que dava a Bedanda, e a estrada do sul, Quebo-Gandembel-Gadamel-Cacine, paralela à fronteira com a Guiné-Conacri. Mapa desenhado por Nuno Rubim (1998).

Infografia: © Nuno Rubim (2005). Todos os direitos reservados. 






Guiné > Região de Tombali > Guileje > 1973 > Croquis do aquartelamento e tabanca, desenhado à mão pelo fur mil op esp José Casimiro Carvalho (CCAÇ 8350, 1972/73), e enviado pelo correio a seu pai.

Legenda:

(i) Pelo que se consegue perceber nes infografia, o aquartelamento e a tabanca de Guileje formavam um rectângulo (ou mesmo um quadrado, em 1967, segundo o Zé Neto, com 250 m x 250 m]. todo minado à volta, na parte desmatada, com minas, armadilhas e fornilhos;

(ii) A orientação parece ser leste-oeste, estando  as peças de artilharia de 11.4, em número de três, apontadas para a fronteira com a República da Guiné-Conacri;

(iii) Podem ver-se ainda as posições dos morteiros, a verde: dois 81 (incluindo o 'meu', o que era operado pela secção do Furriel Carvalho, do lado oeste, junto a um dos abrigos) e dois 10,7;

(iv) No lado esquerdo (, neste caso, a norte do aquartelamento), há um campo de futebol, uma pista de aterragem de aeronaves e um heliporto;

(v) Ao longo do perímetro do aquartelamento, há arame farpado, postos de iluminação, postos de sentinela (cinco), abrigos e valas, todos devidamente assinalados;

(vi) As palhotas da tabanca situam-se dentro do perímetro do aquartelamento;

(vii) O trilho que corre a noroeste da pista de aviação era o trilho da água, o que significava que as NT e a população precisavam de sair do perímetro defensivo para se abastecer do precioso líquido;

(viii) A esttrada que atravessava o aquartelamento e a tabanca, no sentido leste-oeste,  era a que seguia para Mejo e Bedanda (a noroeste) e ligava a sul à estrada de Quebo- Gadamael - Gadamael Cacine, ao longo da fronteira.

Infografia: © José Casimiro Carvalho (2005)/ Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.



Guiné < Região de Tombali > mapa de Guileje (1956) > Escala 1/50 mil > Pormenor: posição relativa da povoação de Guileje, situada a cerca de 8 km da fronteira com a Guiné-Cronaki (a leste).

Infografia: © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013). Todos os direitos reservados.

1. Comtinuação da publicação do álbum de Carlos Fraga, que alf mil,  na 3ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, na segunda metade do ano de 1973, indo depois comandar, como capitão,  uma companhia em Moçambique, a seguir ao 25 de abril de 1974).

Quando o alf mil Carlos Fraga chegou ao TO da Guiné, por volta de meados de 1973, já Guileje tinha sido retirada pelas NT (em 22 de maio de 1973). O acontecimento deve ter tido algum impacto  no moral das NT, a ponto de se venderem, em Bissau e noutros sítios (como Mansoa),  fotos como estas.

São três fotos (a um preto e branco) que fazem parte do álbum do Carlos Fraga e que, naturalmente, não foram tiradas por ele que nunca esteve em Guileje. Ele disse-nos explicitamente que as comprou. E é difícil, se não mesmo impossível, identificar a autoria das fotos.

Guileje fazia parte dos 3 G: Guidaje, Guileje e Gadamael... Estes três topónimos eram pronunciados,  em Bissau e noutros sítios do território,  em meados de 1973, com respeito. Tal como Madina do Boé e o Rio Corubal,  quando eu cheguei a Bissau, em finais de maio de 1969... (LG)

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Nota do editor:

Último poste da série > 22 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11609: Álbum fotográfico de Carlos Fraga (ex-alf mil, 3ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1973) (8): Mansoa, espaldão do morteiro 81, e pessoal na caserna matando o tempo a jogar cartas...

Guiné 63/74 - P11672: Parabéns a você (585): Manuel Traquina, ex Fur Mil Inf da CCAÇ 2382 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE JUNHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11664: Parabéns a você (584): António Azevedo Rodrigues, ex-1.º Cabo do Agrupamento 2957 (Guiné, 1968/70)

terça-feira, 4 de junho de 2013

Guiné 63/74 - P11671: Efemérides (128): Comemorações do dia 10 de Junho em Leça da Palmeira e Matosinhos (Carlos Vinhal)

1. No próximo dia 10 de Junho de 2013 vai o Concelho de Matosinhos mais uma vez homenagear os seus combatentes da Guerra do Ultramar (1961/1974).

Este ano o nosso 10 de Junho terá como pontos altos a inauguração de uma placa toponímica com o nome Rua dos Combatentes do Ultramar, na cidade de Matosinhos, na nova artéria paralela à Rua Alfredo Cunha, que sai da Rua Augusto Gomes (em frente ao Quartel dos Bombeiros Voluntários de Leixões) em direcção à Rua de Goa, e o lançamento da "primeira pedra" de um monumento ao Combatente do Ultramar do Concelho de Matosinhos, que vai ser erigido no gaveto da Rua Augusto Gomes com a Rua Alfredo Cunha.

Nesta imagem Google está esquematizado o traçado da Rua dos Combatentes do Ultramar e o local onde será implantado o futuro memorial aos Combatentes de Matosinhos da Guerra do Ultramar. (Carlos Vinhal)

2. De acordo com o programa estabelecido para este dia, as cerimónias começarão pelas 09h50 na freguesia de Leça da Palmeira com o hastear da Bandeira Nacional no edifício da Junta, seguindo-se uma Missa pelas 10h00 na Igreja Matriz, celebrada pelo Pe. Francisco Andrade. 
Às 11h00 será feita a habitual romagem ao Cemitério n.º 1, onde junto ao Talhão da Liga dos Combatentes será prestada homenagem aos militares de Leça da Palmeira mortos em campanha na Guerra do Ultramar. 

Pelas 12h00, já na sede do Concelho, será então descerrada a placa toponímica na Rua dos Combatentes do Ultramar e lançada a primeira pedra do Monumento aos Combatentes na Rua Augusto Gomes.

Programa pormenorizado



Embora justas, estas manifestações, não podemos deixar de realçar a preciosa abertura do Senhor Presidente da Câmara, Dr. Guilherme Pinto e da sua equipa; da indispensável colaboração do Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes, na pessoa do seu Presidente, TCor Armando Costa e restantes elementos da Direcção; do Presidente da Junta de freguesia de Leça da Palmeira, Dr. Pedro Sousa; e da persistência de um pequeno grupo de ex-combatentes que não descansou até ver algo que materializasse o esforço de uma geração que ao longo de 13 anos levou o nome de Matosinhos até terras de África.

Queremos ver, no próximo dia 10 de Junho, Matosinhos em peso, ou pelos menos todos os ex-combatentes, a partir das 12h00 em frente ao Quartel dos Bombeiros Voluntários de Leixões.
Como em tempos de guerra, "passem palavra".
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Nota do editor

Último poste da série de 22 DE MAIO DE 2013 &gt; Guiné 63/74 - P11612: Efemérides (127): O 10 de junho da minha indignação: em 2006 o Paulo Teixeira Pinto, em 2013 a Isabel Jonet... a invocar, em vão, o nome dos combatentes! (José Colaço)

Guiné 63/74 - P11670: Blogpoesia (343): Recuso dizer uma oração / ao Deus que te abandonou... (José Manuel Lopes, CART 6250/72, Mampatá, 1972/74)

 1.  Poema, sem título, do nosso camarada José Manuel Lopes (ex-fur mil, CART 6250/72, Mampatá, 1972/74), mais conhecido na região de Tombali pelo seu pseudónimo literário Josema...

Retirado das lides literárias (de resto, eu acho que ele nunca se levou a sério como poeta, embora escrevesse todos os dias alguma da melhor poesia da guerra colonial!), é hoje vitivinicultor na região demarcada do Douro, produzindo belos nectares com a ajuda da sua mulher  Maria Luísa Valente (, uma mulher de armas!) e com o talento do filho de ambos, Vasco Lopes, enólogo (mas também DJ)...

Apesar de já ter sido publicado, no poste P2739, de 20/4/2008, juntamente com mais outros cinco poemas do seu "poemário" (ou do que restou do seu "poemário", em grande parte destruído, num noite de descrença e de fúria),  achamos que é tempo de dar-lhe o devido destaque, agora na nossa série Blogpoesia... 

É um texto, duro, de 1972, escrito em Bolama, no início da comissão... Admito que alguns leitores poderão inclusive achá-lo iconoclasta, se não mesmo blasfemo... Mas quem é que, perante a morte de um camarada no TO da Guiné, não passou por estes momentos de desespero, angústia, raiva ? E, sendo cristão, não chegou mesmo a invectivar Deus e a sua "momentânea distração" ?

É mais um poema do nosso camarada José Manuel Lopes, que vai estar connosco em Monte Real em 8/6/2013, mas que está a passar por um mau momento na sua árdua vida de empresário, tal como a grande maioria dos portugueses, quer trabalhem por conta de outrem , quer trabalhem por conta própria.. Enfim,  é mais  um belo poema do nosso Josema, que merece ser lido em voz alta, pausadamente, nestes dias tristes, de perplexidade e de angústia,   "quando [, citando um poema de Sophia de Melo, do Livro Sexto, 1962, que me acaompanhou no TO da Guiném, em 1969/71 ] a pátria que temos não a temos,  / perdida por silêncio e por renúncia, / até a voz do mar se torna exílio / e a luz que nos rodeia é como grades". Até Monte Real, camarada, amigo e poeta ! L.G.

PS - Muito oportunamente, o António Carvalho, que foi fur mil enf da mesma companhia, e grande amigo do poeta, fez este comentário ao  poste: "Este pungente poema é um brado de dor e revolta em que todas as amarras de ordem religiosa e cultural se quebram num absoluto desafio aos deuses. Não é um insulto ao Criador mas a busca desesperada de uma explicação.O contexto ou o cenário em que este poema foi escrito? Não pode ser outro acontecimento, trata-se da morte do soldado Mata, no acidente com um dilagrama, no dia 10 de Julho de 1972, quando morreu também o alferes Figueiredo do BART 6520. É também para mim um belíssimo poema."


2. Recuso dizer uma oração
ao Deus que te abandonou,
não sei se é do nó
que me aperta a garganta
ou da revolta que brota do meu peito,
só sei que não consigo
desculpa...
sinto ganas de arrancar
o fio preso ao teu pescoço
e atirar dentro da mata essa cruz
no local...
onde encontraste a tua,
onde perdeste a vida
e eu a minha fé, entorpecida;
recuso deixar de pensar
no que aqui nos trouxe,
para onde nos levam,
quero encontrar respostas
a todas as perguntas
que se soltam em turbilhão
dentro de mim,
quero encontrar
algo que justifique,
achar uma razão,
por pequena que seja,
irmão,
para acalmar esta dor
e não encontro
e não encontro... não!

Bolama, 1972
josema

[Fixação de texto: L.G.]
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Nota do editor:

Último poste da série > 29 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11648: Blogpoesia (342): Antologia: Poemas de Maio, de Ovar a Mafra, entre o céu e o inferno, com as bolanhas de Tombali ao fundo (J. L. Mendes Gomes)

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Guiné 63/74 - P11669: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (37): 38.º episódio: Memórias avulsas (19): Mafra, Junho de 1964

Mafra, 26 de Janeiro de 1964 > O 1.º pelotão, da 1.ª Companhia ao 2.º dia de tropa.


1. O nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67), em mensagem do dia 22 de Maio de 2013, enviou-nos mais uma história ocorrida durante "Os melhores 40 meses da sua vida", mais propriamente durante a recruta, naqueles belos primeiros dias de tropa.


OS MELHORES 40 MESES DA MINHA VIDA

GUINÉ 65-67 - MEMÓRIAS AVULSAS

19 - MAFRA, JUNHO DE 1964

Entretanto vieram as marchas finais.
Era Junho de 1964 e o local, uma zona de pinhais e mato rodeando as culturas próprias dos pequenos agricultores que se esgadanhavam para tirar um pouco proveito daquele trabalho árduo.
Viam-se por ali, de sol a sol, escavando... escavando, só parando ao ver os escanzelados militares em manobras a quem ofereciam um cigarrito, um copo do vinho que faziam para consumo próprio... uma fruta.
E digam lá se a isto não se chama solidariedade?

Esta iria ser a última semana difícil em Mafra, terminando assim os cinco meses de recruta e passávamos a ser quase 1.ºs cabos-milicianos, ou seja, a mola real do Exército Português, ou melhor ainda, aqueles que sabem como é na verdade.

Houve rigor e tudo parecia ser mesmo uma guerra a sério e até nos era permitido o acesso a verdadeiras balas embora de madeira. As situações treinadas assemelhavam-se à realidade das matas africanas e sempre supervisionadas por Oficiais Instrutores oriundos da Academia Militar, com experiência quer na preparação de homens, quer até, alguns, já conhecedores da verdadeira tormenta africana.

Ambicionávamos que aquele malvado tempo passasse depressa, porque logo após, teríamos o gozo de um mesito de férias, antes do reinício do que se chamava especialidade, que todos nós escolhêramos, acreditando ser possível. Claro que a maior parte foi cair na de atirador, com'a mim.

Feitas as pazes com o inimigo, outros d'outras companhias e também instruendos, procedeu-se ao regresso, em passeio pedonal de trinta e cinco quilómetros. O estado físico geral era pior que mau, mas o ânimo voltou quando, ao chegarmos às imediações do quartel, fomos subitamente atacados pelo Hino Nacional abrilhantado pela Banda Musical Militar.

E o inimaginável aconteceu: aqueles verdadeiros homens cansados, arrebentados, tristes e acabrunhados, revigoraram... marcharam garbosamente... endireitaram-se... honraram a farda... tornaram-se capazes até... de chorar.

Domingo à espreita... e deu-se a cerimónia do "Juro, como Português e Militar... defender a minha Pátria... mesmo com o sacrifício da própria vida".

Presentes muitos dos familiares das tropas em presença, nanja os meus e bem pena tive, mas a crise d'agora já eles tinham então e desde que tinham vindo ao Mundo.

Fomos então autorizados a sair e pela primeira vez, de civis vestidos, para o retorno não definitivo à vida, que sim, essa era a nossa de antes e que iria ser a de depois. Descer aqueles 135 degraus do 5.º andar até cá baixo, nunca me atrevera a pensar que me saberia tão bem. Foi o correr para a boleia do Miranda que fez o favor de me deixar em Sta. Apolónia.

Depois... o chegar a casa... o reencontro com os familiares... a festa... a galinha assada nas brasas... o reconhecer de novo de que "como é bom ser gente"... poder ir à pesca... nadar nas águas límpidas do rio Sôr... o colher da fruta na horta... o comer uns passarinhos fritos... dormir que nem um justo.

Até que um dia e só haviam passado trinta, lá veio a desmancha prazeres da informação de que me devia apresentar em Tavira para completar o processo e poder usar as divisas de duas riscas encarnadas viradas para o cachaço e ainda outra mais pequena apontando o chão e inseridas ainda num paninho verde.
E daí em diante seria e fui para todos o "NOSSO cabo-miliciano".

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 19 DE MAIO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11596: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (36): 37.º episódio: Memórias avulsas (18): Aquando no CSM, Mafra, Maio de 1964

Guiné 63/74 - P11668: Blogoterapia (227): É por tu que se entendem os tabanqueiros (Joaquim Cardoso)

Penafiel - Jardim do Sameiro
Com a devida vénia ao site da CM


1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Cardoso (ex-Soldado de TRMS do Pel Mort 4574, Nova Lamego, 1972/74), com data de 31 de Maio de 2013:

Caríssimos amigos,
Luís Graça e Carlos Vinhal:
Dando cumprimento à regra, (é por tu que se entendem os tabanqueiros), escrevo com o total à-vontade que por vós me foi dado, para agradecer terem-me aceite como novo tabanqueiro*.
O meu muito obrigado a todos.

Dirijo-me agora ao Luís Graça para dizer que fico contente em saber que conhece e gosta de Penafiel. Não é a minha verdadeira terra, (nasci em Carvalhosa-Marco de Canaveses) mas, vivendo há cerca de 37 anos em Castelões-Penafiel, (Terra do Zé do Telhado!) e, sendo estas duas freguesias separadas apenas pelo pequeno rio Odres, é propriamente a mesma coisa.

O conteúdo seguinte é para o C.Vinhal
Compreendo a frustação de quem, tem por norma estar sempre atento ao "serviço," perca de vista algo que, não sendo nada de especial, lhe tenha passado despercebido. Porém, o simbolismo do velhísssimo episódio de Egas Moniz a que recorreste, trazido ao caso, só se tornaria aceitável por mim se invertidas as personagens, ou seja: tu o rei Afonso VII de Castela e eu, Egas Moniz aio do primeiro rei de Portugal, Afonso Henriques, que já de corda ao pescoço, te dava toda a liberdade para a apertares, não como resgate da falta à palavra dada mas sim, como merecido castigo de ter sobrecarregado com mais trabalho alguém já de si muito carregado.
Peço desculpa a todos, especialmente aos professores de história que certamente na tabanca os haverá, por estar a brincar com coisas sérias mas, aproveitei o momento para exercitar a minha fraca memória.

Mudando para outros assuntos, quero também agradecer o facto de teres enviado o meu primeiro mail ao amigo A. Santos que prontamente me ligou e com muito entusiasmo trocamos as primeiras impressões. Falámos dos convívios para nos encontrarmos, mas desta vez não me é possível por motivos que lhe expliquei. Ficará para outra vez.

Aproveito para dizer que tenciono brevemente escrever a minha historieta militar para vos enviar.

E por hoje acho que chega de conversa.
Despeço-me com um abração para todos não esquecendo os amigos José Saúde e José Colaço que me enviaram e-mails de felicitações pela minha entrada na tabanca.

Até breve.
J.Cardoso
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Nota do editor

(*) Vd. poste de 29 DE MAIO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11651: Tabanca Grande (401): Joaquim Moreira Cardoso, ex-Soldado TRMS do Pel Mort 4574 (Nova Lamego, 1972/74)

Último poste da série de 10 DE ABRIL DE 2013 > Guiné 63/74 - P11368: Blogoterapia (226): Aos 60 regressam em força as amizades, principalmente entre combatentes (Joaquim Mexia Alves)