terça-feira, 6 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15207: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (23): De 27 de Outubro a 12 de Novembro de 1973

1. Em mensagem do dia 3 de Outubro de 2015, o nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), enviou-nos a 23.ª página do seu Caderno de Memórias.


CADERNO DE MEMÓRIAS
A. MURTA – GUINÉ, 1973-74

23 - De 27 de Outubro a 12 de Novembro de 1973

Da História da Unidade do BCAÇ 4513:

(...)

OUT73/27Iniciaram-se os trabalhos de Engenharia na estrada A. FORMOSA-BUBA, frente de A. FORMOSA. [Sublinhados meus]

- Efectuou-se uma coluna a BUBA e outra ao R. CORUBAL para trazer população com vista ao acto eleitoral do dia 28 e festas do RAMADAN.

OUT73/28 – Processou-se o acto eleitoral e iniciaram-se as festas do RAMADAN, que trouxeram a A. FORMOSA muita população de BUBA, NHALA e SALTINHO.

OUT73/29 – Pelas 1800 horas apresentaram-se em A. FORMOSA 3 elementos de população, naturais da REP GUINÉ, um homem, uma rapariga e um rapaz. - Realizou-se mais uma coluna a BUBA para transportar de regresso as populações que se deslocaram a A. FORMOSA.

OUT73/30 – Esteve em A. FORMOSA o Exmº Comandante do CAOP-1, regressou a BISSAU mesmo dia. - Iniciaram-se os trabalhos de Engenharia da estrada A. FORMOSA-BUBA, frente de BUBA.

******

Das minhas memórias:

Novembro de 1973: as primeiras férias

As férias de quem está na guerra não são como as outras. Pode descansar-se o corpo, repor-se o sono, disciplinar o metabolismo e, mais importante, encher a alma com as atenções daqueles que mais amamos. Mas, no fim, o doloroso regresso ensombra todas as coisas boas recém-adquiridas. Pelo menos no meu caso foi assim. Se a minha guerra tivesse sido a do Vietname, que não sendo pior nem melhor que a minha, pelo menos dava a benesse aos soldados de, com alguma regularidade, irem a Saigão desanuviar nas bebedeiras e na pele macia das vietnamitas. Com esse desanuviar eu poupar-me-ia a um doloroso regresso não fazendo estas férias. Mas quase nove meses de saudades, no caldo das agruras e do isolamento no mato, foram mais fortes que a razão. Melhor fora que tivesse ido até Bolama, por exemplo. Mas não fui. Por isso, ao princípio, senti a euforia e a impaciência dos preparativos como qualquer outro. Era a excitação de uma pessoa normal.

Quando levantei voo de Buba com destino a Bissau, essa excitação teve um pico alto, associada a uma sensação de libertação de efeitos quase sedativos. Mas o arrastar dos dias em Bissau até ao embarque, quatro dias, quase mataram a minha excitação e, quando embarquei, foi sem grande entusiasmo e com muitas dúvidas de que estava a fazer as coisas certas. Fora demasiado tempo para reflectir. Fora demasiado tempo a deambular naquela cidade estranha e egocêntrica que, ora se agita com efervescência, ora se arrasta com sonolência; onde até as crianças vivem de expedientes, esquecidas no último escalão da sociedade; onde a vasta tropa em trânsito extravasa tensões acumuladas e maluqueiras que já eram deles, num sentimento de quase impunidade, (nisso era parecida com Saigão); onde são reis e senhores os grandes comerciantes, os funcionários e os militares residentes. Não que tivesse razões de queixa destas gentes, mas fizeram-me sentir deslocado no seu seio. Se isto que digo não era bem assim, não deve andar longe da realidade mas, quatro dias em Bissau, excessivos para mim, talvez não fossem suficientes para ver mais fundo, concedo, mas foram excessivos – dolorosamente excessivos, para a minha resiliência. Como grata lembrança ficaram-me as ostras e a cerveja, mais as fragrâncias da avenida à noite, dissolvidas no ar morno dos trópicos, quando, solitário e finalmente em sossego, por aí descia até ao cais. Ainda sinto nostalgia.

Recuando um pouco no tempo para datar a partida: Nhala, 2 de Novembro de 1973 (sexta-feira), em carta para a Metrópole, “(...) daqui a cinco dias sigo para Buba onde tomarei uma avioneta que fretei com os camaradas de lá que também vão de férias. De Bissau devo partir, como já disse, no dia 13”.

Afinal, partiria de Buba às 9 horas do dia 9 de Novembro (sexta-feira). De Bissau, como previsto, parti ao fim da tarde do dia 13 (terça-feira). Não recordo detalhes do embarque, tão pouco da viagem mas, a chegada ficou gravada para sempre. Pouco antes, ouviu-se a mensagem que a todos deixou em polvorosa: “Atenção senhores passageiros: acabamos de passar a costa algarvia. Agradecemos que apaguem os vossos cigarros [!!!] e apertem os cintos. Dentro de momentos aterraremos no Aeroporto Internacional de Lisboa. A temperatura neste momento em Lisboa é de 9 graus. Obrigado.”

E depois surge o Tejo e a cidade espraiada junto dele, melancólica, sonolenta e escura, apesar dos milhares de pontinhos luminosos que se distinguiam lá de cima. Lisboa, finalmente, passados quase 9 meses. Lisboa, tantas vezes cantada no mato por tantos que nem sequer a conheciam, mas que a cantavam como o objecto da saudade da Mãe Pátria, “Cheira bem, cheira a Lisboa...”. Era quase meia-noite.

Não guardo grandes memórias destas férias de Inverno, tirando uma ida à Serra da Estrela com a namorada e família, para meu desconsolo, porque não gosto de neve nem de frio. De resto, visitas a familiares e alguns amigos, sempre com o desconforto das conversas “como é que está a guerra lá Guiné?”, mas logo patenteando um desinteresse enfadado, ou arrependimento da pergunta, mal começava a resposta... Dos amigos, alguns preferia nem ver, devido a lembranças do primeiro embarque, (Lisboa, 16-03-1973), coisas assim do género: “Vens despedir-te para ir para aquela guerra? Tu? Não acredito! E o que é isso aí nos ombros? Oficial? Ainda por cima vais como oficial? Não te estou a reconhecer, Murta! Pois não, não estás a reconhecer-me, porque se eu tivesse um papá rico como o teu, também estaria aqui no conforto de Lisboa na faculdade e, quando ela acabasse, punha-me nas putas para Paris, Berna, Londres ou o caraças, era só dizer ao papá para onde queria ir e ele punha-me lá de malas, bagagem e com a coerência impoluta, estás a perceber? Porque a coerência não está ao alcance de todos, tal como o popó, a faculdade e o fato de marca, estás a perceber, revolucionário de merda?”

Com a aproximação da data do regresso, a ansiedade foi-se avolumando, os semblantes ensombrando, à frente da minha mãe fingia que estava tudo bem comigo, fingia que não percebia a angústia dela. Mas, ambos sabíamos, irmos reabrir uma ferida que nunca fechara completamente. A favor, só o facto de eu ter regressado a casa como prometera. — Eu não te dizia, mãe, que não me aconteceria nada e que regressaria rijo como um pêro? — tentava eu animá-la, e fazendo-lhe crer que desta vez iria ser da mesma maneira. Sonhasse ela que por mais de uma vez podia ter ficado impedido de cumprir a promessa...

A despedida de Lisboa foi péssima. Noite de muita chuva, grande confusão no aeroporto e mau serviço, subida a um céu carregado de água e ventania. Logo após a passagem do Tejo, sentimos uma sacudidela que deixou todos estarrecidos e o pior estava para vir. Com insistentes apelos a que não se desapertassem os cintos, voámos aos safanões quase até ao Algarve, as asas do avião vibrando como se fossem papel de alumínio. Os deuses estavam contra nós mas, aos poucos, entrámos no limbo e quase todos adormecemos.

Já disse noutra ocasião, e não é novidade para ninguém porque a maioria dos que vieram de férias passaram pela mesma experiência: o difícil deste regresso era sabermos, com realismo, ao que íamos. A fantasia de conhecer África com as suas idílicas paisagens mais as suas gentes e os bichos tão diferentes e variados, enfim, nada disso fazia já parte do nosso imaginário no regresso de férias. O nosso pensamento estava na guerra. Todavia, todo o encanto africano se mantinha lá mesmo antes de virmos de férias, mas poucos ainda o viam.

Daí que, ainda no ar, ao sobrevoar o arquipélago de Cabo Verde e, ao sentir de novo a pele a humedecer-se (dentro do avião, sim) e o rosto a ficar como que gorduroso, pensasse que me ia afundar na angústia. Era aquele clima de novo e a guerra outra vez. Pior, só quando se abriu a porta do avião, já em chão da Guiné, e senti aquele bafo quente e húmido bater-me na cara. Senti-me fragilizado e sem ânimo, quase em estado de choque. A hospedeira arredou-se e eu desci as escadas como um autómato. E assim deambulei dois dias por Bissau até ao regresso a Nhala. A agravar tudo, as notícias a circular em Bissau eram as mais desanimadoras: perspectivas de endurecimento da luta do PAIGC; a cidade de Bissau ia ser atacada no Natal por aviões que o PAIGC já possui... Passei pelo QG, pela messe de oficiais, pelo Pelicano e outras repartições, sempre sem ânimo e, quase sempre, incomodado com o ânimo dos outros, os seus excessos e bebedeiras (detesto bêbados!). Não procurei companhias e só por acaso elas se chegaram, à roda de uma ou outra mesa, bem guarnecida de ostras e muita cerveja.

Certa vez, na esplanada da 5.ª REP, reconheci um ex-camarada de Mafra integrado num grupo muito agitado. Levantei-me e fui cumprimentá-lo, indagando da zona em que estava e de como era por lá. Sem grandes atenções, mais concentrado nas parvoeiras dos outros, foi-me dizendo que estava no leste e que, pior que aquilo, só o Inferno. Estava por tudo e estava-se cagando em tudo, dizia ele, já sem sequer estar a falar para mim. Virei-lhe as costas e fui-me sentar na minha mesa. Num instante, sem perceber como, ouço impropérios, cadeiras pelo ar e viro-me para o grupo que, feroz, parecia disposto a não deixar pedra sobre pedra. Levantei-me e berrei para o que estava mais próximo: — Não tarda, têm aí a PM em cima de vocês! — Que se f... a PM! Muita sorte era levarem-nos a todos presos! — Saí dali rapidamente, não me querendo misturar em embrulhadas. E, se conto isto, é só para se ter uma ideia do estado de espírito daquela onda de tropas que estava sempre em trânsito por Bissau. Em finais de 1973.

Embarco finalmente num Nord Atlas, com destino a Aldeia Formosa e já com ânsias de chegar a “casa”, farto de dois dias de Bissau. Para meu espanto, o aparelho, ronceiro e a gingar, levantou de Bissalanca em espiral até ganhar altitude como se estivesse no mato... Foi também em espiral que desceu em A. Formosa, mas isso já era assim há muito tempo. Estávamos a 21 de Dezembro de 1973 (sexta-feira). No dia seguinte saí cedo para Nhala e recordo que me senti bem ao chegar, farto de férias e de boémia forçada.

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Na minha ausência de Nhala, muitas coisas ocorreram no Sector, de que darei conta mais à frente em “postes” posteriores, extraindo resumos da História da Unidade, de onde sobressai o grande avanço na construção da estrada nova. Na tabanca de Nhala houve um incêndio que podia ter tido consequências maiores, não fora a intervenção dos militares da minha Companhia, dirigidos pelo Capitão Braga da Cruz, na ajuda à população. Com oportunidade, e para memória, alguém fotografou o sinistro, e é da série de fotografias que então adquiri, que faço agora uma selecção para partilhar. Não carecem de legenda.













Da História da Unidade do BCAÇ 4513:

NOV73/06 – Forças da CCAV 8351, detectaram a base de fogos utilizada pelo IN na última flagelação ao DEST CUMBIJÃ em GUILEGE 3 E 2-54. Assinalado o local de instalação do CAN S/R 82 e 12 ninhos de atiradores. (...).

NOV73/09 – A 3ª CCAÇ/4516 por determinação superior, é rendida no Sector pela CCAV 8350, deslocando-se para BUBA a fim de posteriormente seguir para BISSAU. A CCAV 8350 fica sedeada em COLIBUIA.

- Forças da CCAV 8351 procedem à implantação de um campo de minas na região da base de fogos IN detectada. (...).

NOV73/11 – As forças do Sector além da protecção aos trabalhos de Engenharia, continuam a executar em permanência patrulhamentos para a região de fronteira e contra-penetrações nos corredores tradicionais.

NOV73/12 – Realizou-se mais uma coluna de reabastecimento a BUBA, para transporte de material de Engenharia e víveres. Esteve em A. FORMOSA uma equipe da RTP a efectuar gravações para mensagens de NATAL.

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 29 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15174: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (22): De 09 a 23 de Outubro de 1973

Guiné 63/74 - P15206: Lembrete (13): Todos os dias, de 2ª a 6ª feira, na Antena Um, às 14h55, o programa de António Luís Marinho, "Canções da Guerra"... Destaque para "Lágrima da preta": poema de António Gedeão (1961), musicado por José Niza e interpretado por Adriano Correia de Oliveira (1970)



Portal da RTP > "Canções da Guerra": programa de rádio, passa todo os dias, de 2ª a 6ª na Antena Um, às 14h55. Os episódios mais antigos e os mais recentes podem aqui ser vistos.

 O nosso blogue noticiou o arranque do programa e tem dado sugestões à equipa de produção e realização (*). Os ex-combatentes da guerra colonial na Guiné também têm o seu "cancioneiro", os seus versos e canções têm vindo a ser recolhidos ao longo dos anos pelo nosso blogue: aqui vão alguns dos nossos marcadores/descritores:

cancioneiro (63)
Cancioneiro de Bambadinca (3)
cancioneiro de Bedanda (2)
cancioneiro de Canjadude (2)
cancioneiro de Gadamael (1)
Cancioneiro de Gandembel (10)
Cancioneiro de Mampatá (4)
Cancioneiro do Niassa (2)
canção de Coimbra (1)
Canções do Niassa (4)
fado (37)
Fado da Guiné (7)
música (86)
música da tropa (1) [recordada hoje por guineenses, homens e mulheres]


Mas há mais cancioneiros (dispersos): Xime, Mansoa, Cufar, Bafatá, Buba, Empada... São alguns que me lembro de cor, e que têm recolhas de letras...

Um dos nossos camaradas, que está a colaborar com o programa "Canções da Guerra", é o José Martins com uma canção do Cancioneiro de Canjadude, que era uma paródia à canção "Óculos de Sol", interpretada por Natércia Barreto (**)...

Está na altura de ir, novamente, rapar o baú das nossas memórias (neste caso, poéticas e musicais)... Vamos criar uma nova série, "O Nosso Cancioneiro", para reunir todos estes materiais... Algumas das letras não eram musicadas ou perdeu-se a música... LG


1. Sinopse > “CANÇÕES DA GUERRA”

A Antena 1 apresenta "As Canções da Guerra".

A guerra colonial, tendo em conta o seu enorme impacto social, foi motivo de canções.

Desde o hino “Angola é Nossa”, criado após o início da rebelião em Angola, que levou a uma guerra que durou 14 anos.

As canções ligadas à guerra, falam da vida dos soldados, da saudade da terra, ou criticam de forma mais dissimulada ou mais directa, a própria guerra.

De 2ª a 6ª feira, às 14h55 na Antena1, ou nesta página, escute as canções da guerra colonial, enquadradas por uma história. Que pode ser a da própria canção, do seu autor ou de um episódio que com ela esteja relacionado.


Um programa: António Luís Marinho
Produção: Joana Jorge



2. Lágrima da preta, de António Gedeao (letra) e José Niza (música). Intrepatação de Adriano Correia de Oliveira.

Dos episódios mais recentes, permito-.me destacar este poema do António Gedeão, retirado do seu livro livro Máquina de Fogo (1961).

A "Lágrima de Preta" vai ser musicada  por José Niza, e cantada por Adriano Correia de Oliveira, em 1970 (, incluída no seu álbum Cantaremos). 

"O poema é um magnífico hino à igualdade de todas as raças. Apesar disso, ou talvez por causa disso, a censura proibiu a canção.", diz o realizador do programa, António Luís Marinho,

Aqui fica, a seguir,  o poema,que não me lembro de ter ouvido no meu tempo na Guiné: compreensivelmente ainda não fazia parte do reportório dos nossos "baladeiros" no mato... Popularizou-se depois do meu regresso, em março de 1971.

Nas noites de insónia, música e  álcool de Bambadinca, o que estava em voga (em 1969/71) era um outro poema do António Gedeão, a "Pedra Filosofal", cuja letra tinha para alguns de nós um segundo sentido... O último verso ( "ELES" não sabem nem sonham"...)  era cantado a plenos pulmões para "ELES", ali ao lado, ouvirem: o comando de batalhão, os oficiais superiores (tanto do BCAÇ 2852 como sobretudo do BART 2917)...

Para quem a quiser recordar, aqui está, disponível o poema no portal do CITI. É um poema de 1956, do livro Movimento Perpétuo

A interpretação de Manuel Freire ,no progama Zip-Zip, tornou-se "viral", como diríamos hoje... Espero que o Luís Marinho a inclua na sua seleção de "Canções da Guerra"... Muita malta sabia a  letra (e a música) de cor!... (LG). (***)


Lágrima de preta,  de Anónio Gedeão (1961)


Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

Nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.


(Cortesia do portal CITI - Centro de Investigação para Tecnologias Interativas)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 18 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15127: Agenda cultural (424): "Canções da Guerra", um programa da Antena 1, todos os dias, a partir de 14 do corrente, de 2ª a 6ª feira, às 10h45, 14h55 e 20h55, com António Luís Marinho...

(**) Vd. poste de 28 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4595: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos) (2): Binóculos de Sol (José Martins)

Vd. também poste de 28 de fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - P576: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos)

Guiné 63/73 - P15205: O nosso querido mês de férias (15): em agosto de 1971, entre a praia da Nazaré e as tertúlias de Vila Franca de Xira... enquanto em Lisboa, tudo na mesma, isto é, a vida corria... (Hélder Sousa)













Nazaré > Sítio da Nazaré > 24 de novembro de 2007 >  A terra que é, toda ela,  um magnífico "postal ilustrado",  e onde o Hélder Sousa,  passou 15 dias das suas férias da Guiné em agosto de 1971...

Fotos: © Luís Graça (2007). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]



1. Mensagem de Hélder Valério de Sousa [ ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche eBissau, 1970/72]


Data: 30 de setembro de 2015 às 15:21
Assunto: Ainda as "viagens de férias". A propósito da "sondagem/inquérito".

Caros camaradas

Incentivado pelo comentário do Carlos V e, já agora, pelo que ele escreveu relembrando as suas férias, posso acrescentar mais alguma coisa às minhas, que entretanto foram sendo relembradas. Enquanto escrevia vi o comentário do Luís sobre o casamento, mas sobre esse assunto, as razões, os motivos, podem ficar noutro artigo.

Realmente o custo das viagens de ida e volta deveria ter sido então os tais 6.190$20 que foram liquidados em prestações. Acho que sim.

É bem verdade que isto que nos foi proposto para relembrarmos as nossas férias (*), onde foram passadas, se é que foram, e quantas vezes, não é uma verdadeira sondagem (palavra agora muito em voga), é apenas um inquérito, um incentivo à participação e que também pode servir para 'medir' mais coisas, por exemplo os nossos "estados de alma", a situação da chegada, a ansiedade, ou não, do regresso, e também sobre a capacidade económica de quem veio gozar férias à "Metrópole".

Não é certamente surpresa para ninguém que naqueles tempos a diferenciação 'social' e por extensão a hierarquia militar originasse situações de potencial económico diferentes para as diferentes 'camadas'. Por isso as respostas ao "inquérito" acabam por reflectir isso mesmo, não vejo razão para criticar a existência, em si mesmo, da "sondagem", basta mudar o nome e concluir o que já foi referido e que é que também, ainda hoje é assim, aqueles que tinham um enquadramento mais baixo tinham, em regra, menores habilitações, menores rendimentos e como tal, também de um modo geral, acedem menos a estes meios informáticos, pelo que a sua "amostra" fica prejudicada. Mas explicada.

Voltando às viagens...

A Guiné tinha a 'vantagem' em relação aos outros TO (Angola e Moçambique) de ser mais perto e os custos das viagens serem menores. Daí que, para aqueles que tinham meios económicos próprios, ou que os conseguiram obter, a partição (quando possível) do período da comissão em três permitia as tais duas viagens. Foi o que aconteceu comigo. Cheguei lá na primeira metade de Novembro de 70 e vim de férias na segunda metade de Julho de 71, oito meses depois, sensivelmente. A 2ª viagem foi de meados de Março a meados de Abril de 72, também sensivelmente.

Quanto às reacções quando cheguei e às vésperas do regresso, acho que não foi muito diferente do que já li por aqui, claro que com a 'nuances' próprias.

O Hélder Sousa no seu quarto em Bissau
(c. 1971/72)... Elegantíssimo
Não me recordo se avisei da data exacta da chegada para me irem buscar ao aeroporto mas acho que sim pois já tenho ouvido dizer que vinha 'muito magro e que um braço dava para agarrar pela cintura' (tomara agora essa 'elegância'....).

Retenho que no imediato me sentia como se estivesse num local estranho, as coisas, o movimento à minha volta não se encaixavam no meu (re)conhecimento. Parecia que estava 'no ar'. 

Aos poucos fui-me habituando mas o que mais me caracterizava era o meu mutismo, coisa estranha para a maioria dos amigos, já que eu era um tanto expansivo. Visitei os vários familiares procurando vincar que 'estava bem'. Fiz uma quinzena de férias na Nazaré, na casa do costume, da D.ª Maria José e do Sebastião Pinto Caneco.

Lembro-me de olhar por vezes à volta e aquela alegria toda do pessoal na praia, ao sol, no mar, etc., me incomodava quando o pensamento voava para a Guiné (e isso acontecia frequentemente), sendo que aí recordava uma passagem dum poeta português que, estando em Angola, reflectia sobre o que se passava na rectaguarda e escrevia ".... em Lisboa, na mesma, isto é, a vida corre!". Assim era ali também.[O poeta é o Manuel Alegre, que escreveu o já clássico "Nambuangongo, meu amor", e que curiosamente voltou a Nambuangongo, 48 anos depois, em 2010.] [LG].

O emblema da UDV - União
Desportiva Vilafranquense
Estive com amigos da "vida artística", de várias interpretações de como a sociedade devia evoluir.

Tive uma longa confraternização (quase um dia) com um amigo que entretanto tinha mudado de nome e de morada, onde se discutiu muito sobre a situação do País e da guerra, em particular da Guiné. Estive com outros que me davam outras perspectivas. Cada um procurava captar a minha atenção e simpatia. Fui-me mantendo equidistante, mas atento.

Em Vila Franca, terra da minha formação de cidadania, fiquei também um tanto perplexo como as coisas evoluíam. Antes de me ir embora havia uma Pastelaria, a "Lezíria", que era um local normalmente frequentado pela classe média e onde as 'mães de família' passavam o tempo com as suas meninas, bebendo chá, bolos, galões e outras coisas próprias das pastelarias. Era um local com pesados reposteiros a decorar os vãos de janela.

Pois esse local foi-se transformando aos poucos num 'ponto de encontro' em horas mais tardias, para aqueles de nós que saíam
 da Secção Cultural da UDV  [, União Desportiva Vilafranquense] 
e que iam beber um copo de leite quente retemperador, em tempo de inverno. Esse local rapidamente passou a ser conhecido entre os jovens como o "Kremlin", como alusão à actividade conspiratória que ia acontecendo.

Aquando dessas minhas férias, em Agosto de 71, já era mais conhecido como "Mesopotâmia".... acho que injustamente, mas era um 'sinal dos tempos'....

Quando se aproximou a data do regresso as coisas ficaram um bocado mais tensas. Os silêncios maiores. O olhar mais vago, mais "ausente". Mas a determinação mantinha-se e com maior ou menor angústia lá se embarcou para o regresso a Bissau, com passagem e paragem sem saída, no Sal. À chegada o tal choque térmico já por várias vezes aqui relatado, foi tal e qual como descrito.
Depois,.... depois foi o retomar da actividade!

Da 2ª viagem darei conta depois.

Abraços

Hélder Sousa

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Nota do editor:

(*) Último poste da série >  5 de outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15204: O nosso querido mês de férias (14): À procura de aconchego, e de amor temperado com algumas paródias, que um mês, naquele tempo, passava muito depressa (José Manuel Matos Dinis)

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Guiné 63/73 - P15204: O nosso querido mês de férias (14): À procura de aconchego, e de amor temperado com algumas paródias, que um mês, naquele tempo, passava muito depressa (José Manuel Matos Dinis)

1. Mensagem do nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 2 de Outubro de 2015:

Olá Luís!
Em Fevereiro de 71, entrado no segundo ano da comissão, vim de férias pela segunda vez, antes que um balázio me limpasse o sarampo. Saudades de outras guerras também deram impulso.

Em Bissau, como de costume, acampei no Grande Hotel, onde uma ventoinha de pé alto era capaz de me compensar das feridas dos mosquitos, e da canícula de trilhos e picadas do leste da Guiné. Mas a cidade estava ali, e as suas atracções não se compadeciam com sestas e outros descansos, pelo que havia de procurar azimutes afluentes de boas conversas e agradáveis pingas.
Nesse deambular, dei com um sargento do esquadrão de Bafatá, onde pernoitei uma ou duas vezes, cuja malta conhecia das colunas em Piche. Foi uma festa, tínhamos que celebrar, e correram whiskies e cervejas à fartazana, que as necessidades aumentavam à medida de novos encontros.

No dia aprazado, voltei a encontrá-lo em Bissalanca, e fiquei a saber que embarcávamos juntos com destino à capital do império. Com ele vinha outro cavaleiro do mesmo esquadrão. O engraçado, é que antes de, já evidenciávamos estar meio​-​embarcados. Pudera​!​ Com os calores de Bissau só à custa de muito beber compensávamos a transpiração abundante. A Lacoste que envergava deixaria transparecer o que afirmo pela humidade acumulada nos sovacos. Ninguém se importava, ninguém estranhava poucos dias depois de experimentarmos o território.

Juntámo-nos numa fiada de 3 cadeiras do avião. A alegria da viajem e os ​vultosos ​contos que o bafatense exibia para gastar durante a deslocação, davam-nos a certeza de borga bem regada.
Mal o passarão subiu nos céus, e a luz autorizou a libertação dos contos de segurança, os 3 espalhafatosos passaram a requisitar a presença de uma hospedeira, por sinal bonita e simpática, que servia destilados escoceses com evidente cumplicidade e espírito comercial. Uma ocasião que ela se esticou para fechar a mala de um passageiro do outro lado do corredor e, esticando-se, deixou ver uns centímetros a mais das meias de seda que agitavam cogitações gulosas, à força de cotoveladas que alertavam para a feliz contemplação, cabeceámos uns nos outros com a avidez do deslumbre.

Nova requisição que sossegasse os espíritos, e a consequente recomendação ao passageiro do outro lado para abrir a mala sobre a coxia dele. Quando a deusa voltou com os cristais a regurgitar daquele fluido colorido a ouro, onde as pedras de gelo adquiriam brilhos diamantinos, o do meio começou a cotovelar os das pontas, enquanto chamava a atenção da beldade dos transportes aéreos, para a situação da bagageira aberta, a que ela correspondeu com um sorriso, e com diligente esticanço para a fechar regulamentarmente a arrumação, enquanto os felizes viajantes trocavam marradas entre si, no afã de não perderem ângulos na visualização de tão importante tarefa. A viajem decorreu sem sobressaltos.

Em Lisboa corria o Inverno mais que fresco, fazia frio, ao que constava, rondava os 3 graus positivos, qual compensação dos exagerados calores climáticos da proveniência tropical. Naquele tempo apanhava-se o autocarro que deslocava os passageiros desde o avião até ao edifício da alfândega e às correias onde se recolhiam as bagagens. Quando nos despedimos efusivamente, quase corri até à área de espera, onda a minha namorada me aguardava. Abraçámo-nos com saudade, e abalámos para o encontro em casa com a família, e logo depois ​para​ o encontro com a malta.
Já seriam umas dezanove horas, quando no meio da euforia, ​apesar de​ sempre agarrado a ela, confessei estar a sentir algum frio, e logo me alcançou uma camisola ​de lã ​que providenciara.

Afinal, a energia que acumulara na Guiné, tinha sido suficiente até quatro horas depois de ter aterrado no inverno.
E depois foi sempre à procura de aconchego, e de amor temperado com algumas paródias, que um mês, naquele tempo, passava muito depressa.

Abraços fraternos
JD
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15185: O nosso querido mês de férias (13): Os soldados não se podiam dar o luxo de ter férias (José Manuel Cancela, ex-sold ap metr, CCAÇ 2382, 1968/70) / Proporcionei a alguns soldados do meu grupo de combate umas modestas férias em Bolama (António Murta, ex-alf mil inf., 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513, 1973/74)

Guiné 63/74 - P15203: Notas de leitura (763): “Memória e Império, Comemorações em Portugal (1880-1960)”, por Maria Isabel João, Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação para a Ciência e Tecnologia, 2002 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Novembro de 2014:

Queridos amigos,
A leitura é atrativa, por vezes obsidiante, a lógica monárquica, a lógica republicana e a lógica ditatorial enformaram inúmeras celebrações, definiram momentos históricos, como o 10 de Junho, traduziram-se em comemorações de centenários, sessões públicas, monumentos e lembranças, exposições, cortejos, moedas, medalhas e selos, a panóplia foi farta e esta tese de doutoramento tudo detalha e sempre com muito interesse.
Repescamos o que demais significativo aconteceu à Guiné que entrou no carrossel dessas memórias a propósito do V Centenário do seu hipotético descobrimento.

Um abraço do
Mário


A Guiné nas comemorações imperiais

Beja Santos

“Memória e Império, Comemorações em Portugal (1880-1960)”, por Maria Isabel João, Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação para a Ciência e Tecnologia, 2002, é um repositório esclarecedor dos múltiplos eventos de vária espécie que se realizaram em Portugal no momento crítico relacionado com os imperativos da ocupação do território, as suas celebrações a pretexto de grandes vultos associados aos descobrimentos, exposições, centenários, cortejos, conferências, estatuária, colóquios, medalhística, filatelia, entre outras iniciativas. Foi à volta deste tema que Maria Isabel João preparou a sua tese de doutoramento e dada à estampa neste livro. A narrativa é densíssima, abarca o tricentenário de Camões, o duplo centenário da conquista de Ceuta e da morte de Afonso de Albuquerque, o centenário da morte de Fernão de Magalhães, a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, isto entre a monarquia já em decomposição e a I República, ciente do perigos e ameaças que impendiam sobre o império africano, o desmembramento de Angola e Moçambique para satisfazer os interesses alemães. O Estado-Novo lançou-se rapidamente na empreitada do dever de memória.

O centenário do Cabo Bojador, em 1934, passou quase despercebido, todas as atenções estavam concentradas na Exposição Colonial, no Porto, onde a Guiné fez furor, mais não seja pela fofoca, as senhoras respeitáveis andavam coléricas com aquelas Bijagós de mamas ao léu. Três anos depois, a Exposição Histórica da Ocupação exaltava as campanhas africanas do final do século XIX. Seguiu-se o duplo centenário de 1940, o regime deu tudo por tudo por uma festa de arromba. Mas não ficaram por aqui os eventos da década de 1940, basta pensar no centenário do descobrimento da Guiné (1947), o da Reconquista de Angola, por Salvador Correia de Sá, e o nascimento de António Eanes (1948). Dos anos de 1950 para 1960 houve comemoração dos centenários de dois grandes mitos da memória da expansão e do império: o nascimento de Mouzinho de Albuquerque (1955) e a morte do Infante Dom Henrique. Temos pois oito décadas entre o tricentenário de Camões e o quinto da morte de Dom Henrique, três regimes políticos distintos. Nenhum destes regimes esqueceu o culto dos grandes homens, a chamada de atenção para os sinais de progresso nas parcelas imperiais, associar nomes como Camões à epopeia dos Descobrimentos. Nesses anos de 1880 comemoraram-se o centenário do Marquês de Pombal e até o aniversário da morte de D. Afonso Henriques. É lista quase infindável, na agonia do regime monárquico houve celebrações do heroísmo militar das guerras peninsulares. Resta dizer que estas glorificações inseriam-se perfeitamente no surto do imperialismo europeu do século XIX, a opinião pública sentia-se bem, passara a ter curiosidade com as colónias, os heróis da ocupação e da pacificação davam jeito para um país que vivia desencantado, esbraseava-se a visão mítica do passado e assim se punha uma esponja no quadro decadente do presente.

Maria Isabel João trata de forma exímia esta leitura, entre continuidades e roturas, faz-nos perceber como Salazar necessitava de uma comemoração depois do interregno da Ditadura e da consagração do Estado Novo pela Constituição de 1933 (recorde-se que em 1930, com Salazar na pasta das Colónias, foi publicado o Ato Colonial, era ali que se falava no Império Colonial e na função histórica de possuir, civilizar e colonizar domínios ultramarinos. As comemorações do descobrimento da Guiné foram uma iniciativa do comandante Sarmento Rodrigues, Avelino Teixeira da Mota foi o seu braço-direito. A tradição atribuía a Nuno Tristão a proeza de ter sido o primeiro a atingir as terras da antiga colónia portuguesa, questão que continua controversa e sem resposta. Aliás esta polémica historiográfica animou as comemorações do centenário. De Janeiro a Fevereiro de 1947, Rui de Sá Carneiro, Subsecretário das Colónias percorre a Guiné, apoiou as comemorações que se deviam centrar sobre a história passada e recente: Descobrimentos e o progresso dado pela estratégia de Sarmento Rodrigues. Este marcou indelevelmente o território e as gentes, entre 1945 e 1949. Sarmento Rodrigues será Ministro das Colónias de 1950 a 1955. A autora detalha a importância dos comissões organizadoras dos centenários e as suas atividades, era uma mobilização que envolvia as instituições do Estado e as científicas, professores, Forças Armadas, imprensa, museus, municípios, tudo e todos estavam em movimento.

O Duplo Centenário, a grande celebração de Portugal imperial fez do terreiro de Belém um espaço magnificente, as colónias, incluindo a Guiné, marcaram presença no jardim colonial. Sarmento Rodrigues colheu ensinamentos do Duplo Centenário, observando: “primeiro que tudo deve atender-se à descoberta, ocupação e pacificação; depois dar-se-á o devido relevo ao esforço das gerações contemporâneas; finalmente não serão esquecidos os projetos de futuro”. Sarmento Rodrigues estipulou que fossem consagradas as maiores figuras da história da colónia guineense e apareceram estátuas que a seguir à independência transitaram para a fortaleza de Cacheu e que ali estão, inexplicavelmente, à espera que as autoridades se recordem que nenhum país pode viver sem história, sem imagens do passado, superados que estão os conflitos profundos ditados pela luta armada. No âmbito das comemorações da Guiné reuniu-se em Bissau a II Conferência Internacional dos Africanistas Ocidentais, isto enquanto decorria na Sociedade de Geografia de Lisboa o Congresso Comemorativo do V Centenário do Descobrimento da Guiné. A autora recorda-nos as publicações que emanaram de todos estes eventos, no caso da Guiné o grande legado foi o Boletim Cultural da Guiné Portuguesa e as monografias que ainda hoje são marcos referenciais.

Em 1898, houve romaria cívica para comemorar o descobrimento do caminho marítimo para a Índia, coisa grandiosa, a sociedade portuguesa nunca tinha visto tal. Era uma forma de afirmar a confiança no futuro do país e a crença liberal no valor da educação. Os cidadãos das colónias estiveram representados no cortejo por um grupo de africanos de Cabo Verde, da Guiné e de Inhambane que atraíram a atenção do público com os seus singulares trajes, ornatos e instrumentos, cantos e danças exóticos. No âmbito das comemorações do descobrimento da Guiné realizou-se em Bissau uma exposição que incidiu ma história colonial, na geografia e etnografia da Guiné. O Palácio do Governo, em construção na altura, foi adaptado para Pavilhão de Honra. Uma nota curiosa: coube ao pintor Fred Kradolfer ter executado no Duplo Centenário a viagem de volta da Guiné pelo mar alto, ou seja, a vitória sobre o oceano Atlântico. Voltando um pouco atrás, aos monumentos e estatuária, recorde-se que a Estátua de Nuno Tristão é da lavra de António Duarte, Diogo Gomes, moço da câmara do Infante Dom Henrique, foi projeto do arquiteto Fernando Peres que também foi responsável pela coluna com inscrições que continua junto a Porto Gole, tem resistido a destruições e mutilações, incluindo a estátua do presidente Ulisses Grant, que estava em Bolama e que terá sido reduzida a metal lucrativo. Recorde-se ainda na Guiné a estátua do Infante Dom Henrique que ficou na Avenida Marginal da capital da colónia, em 1960. Muito mais haveria a dizer sobre iconografia, produziram selos, uma bela coleção que um dia destes aqui se reproduzirá. Trata-se de uma série de sete selos desenhados por Alberto de Sousa, vão ver que gostam.

Coluna existente em Porto Gole, fotografia do blogue 

Monumento comemorativo do centenário do Infante Dom Henrique, Avenida Marginal, Bissau
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Nota do editor

Último poste da série de 2 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15189: Notas de leitura (762): “Morto em Combate”, de António Silveira, publicado na Caminho Policial, Editorial Caminho, 1990 (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P15202: Os jogos de cabra-cega: Sinchã Jobel (A. Marques Lopes) (Parte V): a partir da Op Invisível, de 18-19/12/1967, passa a ser uma ZLIFA (Zona LIvre de Intervenção da Força Aérea)... O alf mil Fernando da Costa Fernandes, de Santo Tirso, é morto, não sendo possível resgatar o seu corpo, e o soldado Manuel Fragata Francisco, de Alpiarça, é gravemente ferido, aprisionado e levado para Ziguinchor onde é tratado pelo dr. Mário Pádua e mais tarde, em 15/3/1968, entregue à Cruz Vermelha Internacional

1.  Continuação da publicação desta série, "Jogos de Cabra-Cega: Sincha Jobel", com a reedição de alguns postes do A. Marques Lopes, que tem por objeto central a descoberta e a tentativa de destruição, pelas NT, de Sinchã Jobel, uma base ("barraca") do PAIGC, em pleno coração da Guiné, na zona leste, no regulado de Mansomine, entre Mansambá e  Bafatá 

São os postes nº 35, 36, 39, 40, 45 e 763, originalmente inseridos na I Série do nosso blogue, e como tal como pouco lidos e conhecidos... Fizemos a revisão de texto (e atualizámos o texto de acordo com a ortografia em vigor). (*)

Estes "jogos de cabra-cega" fazem parte da trama do romance que o A. Marques Lopes lançou, recentemente, em junho passado, sob a chancela da Chiado Editora (capa ao lado). O autor, João Gaspar Carrasqueira, é pseudónimo literário. Aiveca, a personagem central do romance, é o "alter ego" do A. Marques Lopes. A editora meteu o livro na sua coleção "Bios", classificando-a como "biografia" e não como "romance"... Na realidade, é uma autobiografia ficcionada, de 582 pp.

Todos nos lembramos do jogo da cabra-cega, do nosso tempo de infância e de escola? "Tapam os olhos ao que é apontado para ser cabra-cega, Dão-lhe várias voltas para perder o sentido de orientação. Dão-lhe empurrões para o desorientar ainda mais e não saber para onde se virar" (, preâmbulo do livro). A vida (e a guerra) é um jogo de cabra-cega.

Há uma versão anterior, publicada no poste P45, de 5 de junho de 2005, portanto, há mais de 10 anos.... : Sinchã Jobel VII (Marques Lopes)

Quanto à CART 1690, recorde-se o seguinte:

(i) foi mobilizada pelo RAL 1, fazendo parte do BART 1914 (Tite, 1967/1969);

(ii) partiu para a Guiné em 8/4/1967 e regressou à Metrópole em 3/3/1969;

(iii) esteve em Geba e em Bissau;

(iv) comandantes: Cap Art Manuel Carlos da Conceição Guimarães [, morto na estrada Geba-Banjara, em 21 de agosto de 1967, com 29 anos,] e Cap Mil Art Carlos Manuel Morais Sarmento Ferreira;

(v)  tem um dos mais trágicos historiais da guerra da Guiné: 10 mortos em combate, incluindo o Cap Art Manuel Guimarães, 2 alferes milicianos e um furriel miliciano; 12 militares "retidos pelo IN" (e levados para Conacri), dos quais 2 morreram no cativeiro; 5 militares, feridos em combate, e evacuados para o Hospital Militar Principal, da Estrela, em Lisboa, incluindo dois alferes milicianos, o A. Marques Lopes e o Domingos Maçarico.

2. Sinchã Jobel VII  

por  A. Marques Lopes:

O alferes Fernandes, referido no relatório que se segue, foi, mais tarde, substituído pelo alferes Carlos Alberto Trindade Peixoto, o Aznavour, por ser parecido com o Charles Aznavour, que morreu também, em 8 de Setembro de 1968 num ataque a Sare Banda (ver relatório).

[Este alferes Fernando da Costa Fernandes, natural de Santo Tirso,  tinha vindo para a CART 1690, para substittuir o A. Marques Lopes, entretanto evacuado parta o HMP, na sequência da mina A/C acionada em 21/8/1967, na estrada Geba-Banjara, que vitimou mortalmente o cap art Manuel Guimarães. O Fernandes será "dado como desaparecido" em campanha, nesta Op Invisível, em 19 de Dezembro de 1967... Na realidade, foi morto e o seu corpo nunca foi recuperado].


Foto de um militar português, prisioneiro do PAIGC, em
"tratamenmto hospitakar"... Podia ser o Fragata, da CART 1690, mas não é,
segundo informação que recolhemos junto do seu antigo comandante de pelotão,, o
A. Marques Lopes.. Cortesia do portal Casa Comum / Aqruivo Amílcar Cabral,
da Fundação Mário Soares
O soldado Fragata (Manuel Fragata Francisco), um alentejano de Alpiarça, do meu grupo de combate, ficou nesta operação [, isto é, foi ferido e feito prisioneiro pelo IN].

Mas a história toda foi-me contada pelo comandante Gazela [do PAIGC ]: ficou furado por vários estilhaços de uma roquetada e foi levado, em maca, pelos guerrilheiros desde a mata do Óio até a um hospital de Ziguinchor, na Casamansa,  Senegal. Foi obra,  hão-de concordar, e não foi fácil, como calculam. Aí, em Ziguinchor, foi tratado pelo portugês dr. [Mário] Pádua, um médico desertor, e que me confirmou isto quando, há alguns anos, o encontrei em Lisboa.

Depois desse tratamento, o Fragata foi repatriado pela Cruz Vermelha Internacional e foi para o Anexo do HMP, na Rua Artilharia Um, em Lisboa. Disse o comandante Gazela que, com a simplicidade própria daqueles nossos soldados, o Fragata, ao apanhar o avião de regresso, disse: "Obrigado. Graças ao nosso partido – referia-se ao PAIGC - "posso voltar para casa".

Infelizmente, o Fragata, passado pouco tempo após a saída do Anexo, morreu num desastre de
motorizada na sua terra.


[Foto à direita:  Amílcar Cabral e Osvaldo Lopes da Silva por ocasião da entrega pelo PAIGC de prisioneiros de guerra portugueses à Cruz Vermelha do Senegal, em Dakar, em 15/3/1968: os militares portugueses eram o Eduardo Dias Vieira, o José Vieira Lauro e o Manuel Fragata Francisco (não sabemos a ordem por que aparecem, ams o A. Marques Lopes não tem dúvidas em reconhecer o primeiro, à esquerda, de muletas, como sendo o Fragata.  

Cortesia do portal Casa Comum / Arquivo Amílcar Cabral, da Fundação Mário Soaresa].



Depois desta operação, aquela zona foi considerada ZLIFA (Zona Livre de Intervenção da Força Aérea), isto é, só os T6 e os Fiat G 91 é que passaram a voar para lá para despejarem toneladas de bombas e napalm sobre a floresta que rodeava a clareira de Sinchã Jobel. Sem grande efeito prático, pois as bombas rebentavam no cimo das copas das árvores, deixando praticamente intactas as partes no solo. E a guerra continuou...

Em 1998, o Comandante Gazela confidenciou-me que, naquele dia 24 de Junho de 1967, eles não se aperceberam que eu tinha ficado na bolanha. Só o souberam dois dias depois, quando o Suleiman Baldé, chefe dos milícias de Sare Madina, lhes disse que me tinha emprestado uma bicicleta.

Este Suleiman Baldé, embora nas milícias, era do PAIGC e acabou por ser morto mais tarde pelas NT. Quando consegui sair de Sinchã Jobel, no dia 25, cheguei a essa tabanca de Sare Madina e foi, de facto, o Suleiman Baldé que me emprestou uma bicicleta. E foi de bicicleta que cheguei à sede da companhia, em Geba.

Fui chamado, depois, ao Comando do Agrupamento [, em Bafatá]. Primeira preocupação dele: se eu tinha trazido a G3... e, não sei se a sério se a brincar, “há um problema, é que você passou 24 horas no campo do inimigo”… Não fiz boa cara, com certeza, pois o Comandante do Agrupamento teve de sorrir e disse-me: "Você, agora, tem aí história para contar num livro”. Não sei quando ele aparecerá, mas estou a trabalhar para isso.

Uma reflexão: na Guiné, e estas operações são prova disso, quem fez a maior parte da guerra dura e prolongada não foram as tropas especiais (sem pôr em causa o seu valor), mas sim o sacrificado Zé Soldado, isolado no mato, sem farras em Bissau, pau para toda a colher e, as mais das vezes, sacrificada carne para canhão.





Guiné-Bissau > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Sinchã Jobel > 22 de Abril de 2006 > Um  bomba da Força Aérea Portuguesa, das muitas que terão sido  lançadas sobre a base do PAIGC, durante a guerra, e que não chegou a explodir. Na foto, o nosso amigo e camarada A. Marques Lopes quansdo voltoui "local do crime", 40 anos depois...

Foto: © Xico Allen (2006). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]


3. Op Invisível I, 18-19 de dezembro de 1969 (Excerto do relatório)

“Situação particular:

Em face das ações realizadas sabe-se que o IN atua no regulado de Mansomine onde possui a base de Sinchã Jobel.

“Missão:

Executar uma batida nesta região tentando desalojar o IN.

“Força executante:

Dest A – CART 1742, a 2 Gr Comb.

Dst B - CART 1690 a 2 Gr Comb ref. c/ 1 PEL MIL 110 / C MIL 3


“Desenrolar da ação:

"Em 18 de Dezembro de 1967, às 22h00, as forças intervenientes saíram autotransportadas de Geba em direção a Sare Gana, progredindo em seguida apeadamente em direção a Ganhagina, que atingiram em 19 , às 04h00.

"Não se pôde efetuar a cambança da bolanha nessa altura, em virtude do guia não conhecer o caminho, para atingir a bolanha pelo que as forças intervenientes se instalaram, montando a devida segurança.

“Pelas 06h00 as forças intervenientes iniciaram novamente a progressão à bolanha, que atingiram pelas 07h50 hora a que se iniciou a cambança da mesma.

"Nesta altura foram avistados elementos IN em cima de árvores, pelo que se tomaram as devidas medidas de segurança para a travessia da mesma. A cambança terminou às 08h50, iniciando-se em seguida a progressão à base de patrulhas.

"Cerca das 11h50 fez-se um alto, devido novamente ao guia se ter perdido e precisar de se orientar. Foi destacada 1 Secção reforçada para fazer a proteção ao guia, enquanto a restante força interveniente montava segurança no local de estacionamento.

“Às 12h45 iniciou-se novamente a progressão à base de patrulhas que foi atin-gida às 15h52. Nesta altura ouviram-se vozes de elementos IN, o que levou as forças intervenientes a supor que o IN se encontrava instalado naquele local. Devido a este facto a missão foi alterada e estabeleceu-se que o Dest B faria o assalto ao objetivo enquanto o Dest A faria a detenção do IN. Para o assalto ao acampamento IN o Dest B nomeou 1 Gr Comb, enquanto o 2º. Gr Comb faria a proteção ao 1.º e serviria de reserva.

“Estabeleceu-se também o ponto de reunião das forças intervenientes. Quando o 1º Gr Comb progredia em direção do acampamento IN, foi emboscado e surpreendido por um súbito desencadear de intenso e nutrido fogo IN. Tentou anular-se o mesmo reagindo as NT fortemente. Como o 1° Gr Comb fosse o que nessa altura se encontrasse mais submetido ao fogo IN, veio o2º Gr Comb em auxilio do primeiro, mas o mesmo foi atacado pela retaguarda e, portanto, não pode proteger a retirada do primeiro.

“Começou também nessa altura o IN a fazer fogo com o Mort 82, com que abateu o alferes miliciano Fernandes. Verifiquei que nessa altura já o Dest B tinha as seguintes baixas: alferes miliciano Fernandes, 1º. cabo Sousa,  da CART 1742 (que estava a fazer fogo com a ML MG-42), soldado metropolitano Fragata e um soldado milícia que não consegui identificar, além de vários feridos.

“Procurei trazer o alferes miliciano Fernandes para a retaguarda, e quando o puxava pêlos pés, fui surpreendido por um grupo IN, que corriam em direção aos furriéis milicianos Marcelo e Vaz e em minha direcção gritando que nos iriam apanhar vivos.

"Note-se que neste grupo IN avistei elementos brancos os quais usavam o cabelo bastante comprido (a cobrir as orelhas), facto também confirmado pelos já citados furriéis milicianos. Devido a tal, tive que abandonar o corpo do alferes miliciano Fernandes e retirar.

"Quando retirava em direção ao ponto de reunião, encontrei uma secção da CART 1742, e 4 soldados da minha companhia que me informaram ser impossível entrar em contacto com a CART 1742, enviei 5 soldados desta última companhia afim de averiguar tal impossibilidade, enquanto se montava a segurança com os restantes elementos. Logo após esses 5 soldados regressarem, fui informado que a CART 1742 já retirara. Devido a tal e uma vez que o IN já nos estava a envolver, iniciei a retirada em direção à bolanha.

“Durante a retirada fomos constantemente perseguidos pelo IN que disparava incessantemente rajadas de armas automáticas ligeiras e metralhadora pesada, além de encontrarmos diversos elementos IN já instalados ao longo do caminho que conduzia à bolanha e que fez com que este grupo tivesse que atravessar a bolanha num local diferente do que inicialmente estava previsto, e que batiam o caminho por onde nos deslocávamos.

“Quando atravessámos a bolanha o IN bateu a mesma com granadas de morteiro 82 (algumas das granadas estavam equipadas com espoleta de tempos), rajadas de armas pesadas, ligeiras e roquetadas, tendo o mesmo entrado na bolanha em nossa perseguição, e ainda após concluída a travessia depararam-se-nos alguns elementos IN instalados deste lado da bolanha. Conseguimos, no entanto, fazer a travessia da mesma e iniciarmos a progressão em direção a Sare Ganá, que atingimos às 21h00.

"Chegados a Sare Ganá, verifiquei que a CART 1742 já aí se encontrava e que faltavam 16 elementos da minha Companhia e 1 elemento da CART 1742. [Estes militares foram recuperados no dia 21 de dezembro de 1967, durante a Op Invisível II, realizada com esse objetivo] .

“Resultados obtidos: Baixas sofridas pelo IN: Mortos confirmados 14; numerosas baixas prováveis.»

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Nota do editor:

(*) Último poste da série >  24 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15150: Os jogos de cabra-cega: Sinchã Jobel (A. Marques Lopes) (Parte IV): Op Insistir (27/10/1967): com a 5ª CCmds e dois 2 grupos de combate de cassanhos, da CART 1690

domingo, 4 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15201: Em busca de... (261): Rui Vilarinho, filho do ex-Tenente Miliciano Armando dos Santos Ferreira da CCAÇ 1497/BCAÇ 1876, procura camaradas de seu pai já falecido

1. Mensagem de Rui Vilarinho, filho do nosso camarada Armando dos Santos Ferreira (na foto à direita ainda como Aspirante), ex-Tenente Miliciano da CCAÇ 1497/BCAÇ 1876 (Fajonquito, Binar, Bissum e Bissau), com data de 13 de Setembro de 2015:

Assunto: Guerra Colonial - Companhia de caçadores 1497 (1966-1967) Guiné Portuguesa

Exmos senhores,
Recorro ao vosso contacto, após consulta do site http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/
Hoje, ao fazer arrumações em casa, encontrei uma daquelas bandeiras pequenas de mesa que pertenceu a meu pai, Armando dos Santos Ferreira (Esposende – Braga), que serviu o exército português na Companhia em assunto.
O meu Pai cumpriu o serviço militar obrigatório como Tenente Miliciano entre Setembro/1964 e Dezembro/1967 com comissões de serviço nos Açores e na Guiné Portuguesa.
Presumo que já tenham ocorrido encontros dos seus camaradas de armas. O meu pai faleceu em 20/08/1982, com apenas 39 anos, vítima de cancro.
Apesar de eu ser muito novinho (tinha 11 anos quando ele faleceu) lembro-me do quanto a Guerra o marcou. Sei que ele teve um acidente automóvel grave na instrução nos Açores, em que um jipe capotou e por pouco ele não perdeu a vida. Ele foi mobilizado após conclusão do seu curso de Engenheiro Técnico de Eletricidade e Máquinas no Instituto Industrial do Porto, onde foi um aluno brilhante.
Não sei se alguns dos Senhores se recorda do meu Pai. Nem sei se os seus camaradas de armas tiveram conhecimento do seu falecimento.
O intuito deste e-mail é apenas de dar essa nota e se por ventura algum dos seus camaradas possuam fotografias do meu pai, agradecia se possível me enviassem uma cópia por e-mail.

Muito Obrigado e Bem Hajam
Rui Vilarinho
e-mail: rui.vilarinho@outlook.com

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2. Mensagem de resposta enviada no dia 22

Caro amigo Rui Vilarinho
Antes de publicar o seu pedido para encontrar camaradas do senhor seu pai, queria perguntar-lhe se não tem uma foto do pai fardado, eventualmente ainda como alferes, que me mande para se publicar no Blogue.
O pai devia ser operacional, atirador de Infantaria, poderia ser ou não de minas e armadilhas, ou poderia ser ainda de Operações Especiais.
Uma vez que o Rui ainda era muito miúdo quando o pai faleceu, não saberá estes pormenores. Se arranjar a saber, diga-me.
Na nossa tertúlia não temos camaradas da 1497 pelo que não o podemos ajudar muito, mas no site do nosso camarada Jorge Santos encontrei um pedido de contacto de alguém da CCAÇ 1497 de nome Domingos Ramos com o endereço ajsramos@hotmail.com e o telemóvel 968 055 718.
Pode começar por aqui, mas também vamos publicar no nosso Blogue a sua mensagem. Diga-me só se tem alguma foto do pai. Aguardo as suas notícias.
Abraço
Ao seu dispor
Carlos Vinhal

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3. Mensagem de Rui Vilarinho chegada ao nosso Blogue no dia 27

Boa tarde Sr. Carlos Vinhal,
Estive à procura de fotos do meu pai na tropa mas ainda não encontrei as da Guiné. Todavia, encontrei outras tiradas em Mafra em Fevereiro de 1965 e em Ponta Delgada em Maio de 1965. Coloquei as fotos online aqui: http://1drv.ms/1QH5JmR com as legendas originais colocadas pelo meu Pai no verso. A qualidade não está muito boa e a maioria foi tirada de longe.
Efetuei alguns recortes para sinalizar o meu pai.



Ilha de S. Miguel - Ponta Delgada - Arrifes - BII 18 - Maio de 1965 - Parte do Pelotão de Recrutas do Aspirante Armando dos Santos Ferreira

O Aspirante Armando dos Santos Ferreira, de cócoras, ao centro



Armando dos Santos Ferreira, o segundo a partir da esquerda, de frente


Mafra, Fevereiro de 1965 - Manobra de Força - Cabrilha de duas pernas

Mafra, Fevereiro de 1965 - Ponte de cavaletes belgas

Mafra, Fevereiro de 1965 - Transposição de cursos de água


Mafra, Fevereiro de 1965 - Passadiço flutuante

Mafra, Fevereiro de 1965 - Passadiço B.P.

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4. Comentário do Editor:

Aqui fica o apelo do nosso leitor Rui Vilarinho, filho do nosso camarada Armando dos Santos Ferreira, ex-Ten Mil da CCAÇ 1497/BCAÇ 1876, falecido em 1982, que embarcou para a Guiné em 20 de Janeiro de 1966 com regresso em 04 de Novembro de 1967, para encontrar camaradas de seu pai.

Publicam-se as fotos que nos foram enviadas assim como um pequeno resumo da Actividade Operacional da 1497.


Sobre a CCAÇ 1497:




(Da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África - 1961-1974 - 7.º Volume - Fichas das Unidades - Tomo II - Guiné)

C.V.
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Nota do editor

Último poste da série de 8 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15089: Em busca de... (260): José Carlos, taxista em Vila do Conde, ex-Soldado Atirador do 2.º Pelotão da CCAÇ 4152, procura camaradas (Vasco Santos)

Guiné 63/74 - P15200: (Ex)citações (295): Fui advogado e amigo de Luís Cabral, e até agora não encontrei uma explicação racional para o assassinato (gratuito) dos 4 oficiais portugueses no chão manjaco nem para o fuzilamento, no pós-independência, de muitos ex-militares guineenses que serviram lealmente as NT (António Martins Moreira, ex-alf mil inf, CART 1690, Geba, 1967/69)


Lisboa > Jantar de Natal 2007 > Os quatro magníficos da CART 1690 (Geba, 1967/69), todos eles alferes milicianos... e todos eles membros da nossa Tabancca Grande: da esquerda para a direita,
(i) o António Moreira, (ii) o Domingos Maçarico,  (iii) o Alfredo Reis e (iv) o A. Marques Lopes,

Natural de de Idanha-a-Nova, o Moreira é advogado em Torres Vedras e fez parte, no triénio de 2008/2010,  do Conselho Geral da Ordem dos Advogados;

Foto (e legenda) : © A. Marques Lopes (2007). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do António Martins Moreira, ex-alf mil inf, CART 1690, Geba, 1967/69; ten mil inf, EPI, Mafra, 1970/71, e hoje advogado:




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Nota do editor:

Último poste da série > 19 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15128: (Ex)citações (294): A vida é uma cabra-cega (A. Marques Lopes)