sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Guiné 61/74 - P17038: Militares mortos na 1.ª Guerra Mundial e Guerra do Ultramar do concelho de Torre de Moncorvo (Armando Gonçalves) - Parte IV: TO de Angola, Guiné e Moçambique, a Primavera Marcelista e o fim do Estado Novo


Torre de Moncorvo: logo da câmara municipal (cortesia da página do município). 
O município erigiu, em 2013, um monumento aos combatentes da guerra do ultramar.



Eduardo Mondlane (1920-1969)

"Fundador e primeiro Presidente da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), arquitecto de Unidade Nacional, nasceu em Manjacaze, Província de Gaza, a 20 de Junho de 1920 e faleceu a 3 de Fevereiro de 1969, vitima de um livro armadilhado com bomba que ao explodir pôs termo a sua vida.

"Filho de um chefe tradicional, Mondlane estudou na missão presbiteriana suíça, próxima de Manjacaze, terminou os seus estudos secundários numa escola da mesma igreja na África do Sul, depois de uma curta passagem pela Universidade de Lisboa, foi ainda financiado pelos suíços para fazer os estudos superiores nos Estados Unidos da América, onde se doutorou em sociologia".

(Foto e e legenda > Fonte: Frelimo, com a devida vénia)



1. Continuação do trabalho de pesquisa do nosso amigo Armando Gonçalves, professor de História, do Agrupamento de Escolas Dr. Ramiro Salgado, em Torre de Moncorvo, e que aceitou integrar a nossa Tabanca Grande, passando a ser o nº 733 (*)

Parte IV (pp. 16-19)

Guiné 61/74 - P17037: Parabéns a você (1207): José Brás, ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 1622 (Guiné, 1966/68)

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Nota do editor

Último poste da série de 8 de Fevereiro de 2017> Guiné 61/74 - P17031: Parabéns a você (1206): Constantino (Tino) Neves, ex-1.º Cabo Escriturário do BCAÇ 2893 (Guiné, 1969/71)

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Guiné 61/74 - P17036: FAP (99): Alerta aos FIATs (António Martins de Matos, Ten Gen Pilav)

Caça-bombardeiro, subsónico, Fiat G-91, da FAP. Desenho de Nelson Teixeira (2011). Imagem do domínio público. 
Cortesia da Wikipedia.


1. Mensagem do nosso camarada António Martins de Matos, Ten General, (ex-Tenente Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74), com data de 8 de Fevereiro de 2017, narrando uma aventura matinal nos ares da Guiné.


ALERTA AOS FIATs

Guiné 1973, há já alguns meses que a guerra estava assanhada mas o dia anterior até fora bem tranquilo, apenas uma missão ao inicio da tarde, à noite tinha ido jantar ao Pelicano, a ementa habitual, pão e azeitonas, um “ninho de camarão”, seguido de um tornedó, arroz de acompanhamento (o barco da metrópole não tinha chegado com as batatas), a refeição regada com um Dão de 13º, nada de café (que me podia dar alguma insónia), de sobremesa e para facilitar a digestão mais um (ou dois?) Old Parr, em balão e sem gelo.
O regresso à Base também tinha sido normal, a minha bela e roxa Yamaha 200 a dois tempos até devia ter piloto automático, já conhecia o caminho de cor, pés “alevantados” não fosse atropelar alguma jibóia, durante a viajem apenas um ou dois moscardos a esborracharem-se no capacete.
O dia tinha corrido bem, foi bastante mais tarde que as coisas se complicaram.

Ainda o sol não tinha nascido e já alguém me batia à porta do quarto.
- “Sr Tenente, acorde, ALERTA AOS FIATs”.
Caramba, escusava de gritar, muito estremunhado lá me levantei, um pouco de água pela cara, enfiei-me no fato de voo, calcei as botas e deixei que me levassem até ao Land-Rover estacionado em frente aos alojamentos, o qual, numa imediata corrida que mais parecia do tipo “ Emergência do 112”, logo me transportou até à “linha da frente” dos aviões de alerta.
À chegada, o mecânico de serviço apontou-me um dos Fiat G-91 estacionados na placa, com um gesto do polegar garantiu que a máquina estava 5 estrelas, entregou-me o capacete e, sem mais conversas e até mesmo com uma certa brusquidão, logo me empurrou para dentro da aeronave.
Não gostava nada destas missões, irem-me buscar à cama e partir à alvorada, ainda meio a dormir, sem ter a mínima ideia de para onde ia ou o que ia encontrar, sem o mapa da zona, sem o obrigatório equipamento de sobrevivência e, ainda por cima, sem nada no estômago, nem uma simples bolachinha ou café que me pudessem reconfortar, era um astral muito, mais que muito… negativo.
Pensamentos sombrios a invadirem-me a cabeça, na minha nomeação para o Ultramar até podia ter escolhido Luanda, uma bomba ao meio-dia (dos dias pares), praia e ski cinco dias por semana, um dolce fare niente… certamente que lá ninguém me vinha acordar à cama, que raio de ideia ter preferido esta terra de calor, humidade, mosquitos e… guerra.
A esta distancia reconheço que a escolha foi mal esgalhada, tinha preferido a Guiné por uma razão simples, começar pelo pior, depois era sempre a melhorar, que, não era preciso ser um grande estratega e até um ceguinho via, aquelas guerras em África iam-se prolongar por muitos e longos anos…

Já sentado na máquina e ainda a tentar despertar, muito a custo lá descortinei o botão da bateria, logo inúmeras luzes e ponteiros acordaram, demasiada luminosidade e informação para aquela hora matinal, olhei-os sem os conseguir ver, se o mecânico disse que tudo estava bem, … certamente que estava.
Ainda a bocejar fiz sinal ao mecânico que ia “pôr em marcha”…
Dei ao starter (ao cartucho, para os mais entendidos destas coisas), não pegou, segunda tentativa, nada,.., a máquina continuava silenciosa, também devia estar ensonada e recusava-se a arrancar. - “Deve ter o motor de arranque xanado, vamos tentar de empurrão”, logo gritou o Sargento Chefe da Linha, homem anafado, façanhudo e de poucas palavras mas batido nestas coisas da aviação.
Dito e feito, destravei a máquina, engatei a segunda e fiquei à espera que o empurrão em esforço do pessoal me desse algum balanço para tentar aquela manobra alternativa.
Arrancou, muito aos soluços e aos ratéres… mas lá arrancou, numa nuvem de fumo preto e malcheiroso.
Depois nem tive tempo de aquecer o motor (o chamado ponto fixo), saída do estacionamento de rompante, com a manete a fundo e respectivo “burnout”, os pneus a chiarem no alcatrão e ala que se faz tarde até ao destino que, entretanto, alguém pelo rádio, me tinha sussurrado.
O sol ainda a nascer, não fosse a guerra e aquela terra até era bonita.

Apenas chegado ao local da contenda logo verifiquei que alguma confusão estava instalada lá pela zona, havia demasiados pedidos, requisitos e solicitações (tudo coisas diferentes), uns queriam que bombardeasse todas as matas da região, outros queriam saber do correio, um terceiro armado em rambo assegurava não precisar de ajuda, dizia que se tivesse mortos ou feridos os trazia às costas, um outro queria boleia para Bissau, ia de férias e tinha medo de perder o TAP.
Com algum esforço e palavreado a condizer, muito a custo lá consegui que se calassem e, depois de umas voltas para estudar a zona, conclui que, a existir, o inimigo devia estar emboscado por detrás de umas árvores de cor verde, numa área de mata de cor verde e bem para lá do risco verde que, no chão, demarcava a fronteira.
Há muito que o Gen. Spínola nos proibira de ultrapassarmos aquele risco verde mas, como ele não estava a ver, tal restrição não me impedia de lhes dar umas bordoadas, bastava, à posteriori, meter no relatório da missão umas quaisquer coordenadas do lado de cá do risco, certamente que o pessoal do CTIG não ia topar a marosca, já que liam sempre a papelada em viés e, desejosos de acabar com a guerra, há muito que só sublinhavam os feitos e o potencial do IN, sempre que possível realçando a sua crescente frota de MIGs e de carros de combate (que nunca ninguém viu).

Larguei as bombas no local que me pareceu mais suspeito mas logo tive uma surpresa já que o inimigo, em vez de se manter quieto e calado (como era suposto), ripostou, atirando-me com um Strela.
Não gostei nada daquela reacção, não estava prevista, já que na esquadra só havia um piloto autorizado a levar com strelas, dei uma volta larga para tomar balanço e logo voltei à carga ou como agora se diz, fiz um re-ataque, desta vez despejei-lhes as metralhadoras, todas as 800 munições num único passe, eu sei que o manual diz que não se pode fazer, que dá cabo dos canos, mas sabe bem, …, tinha aprendido esta técnica com um outro piloto mais velho que, qual cereja no bolo, ainda costumava abanar o avião para, dizia ele, espalhar melhor a metralha.
Levei com outro Strela.
De repente fez-se-me luz, aquela vontade de me acertar só podia ser do turra Manuel Santos, o “Manecas dos Strelas”, já que, conforme muito mais tarde acabou por confidenciar em entrevista ao Joaquim Furtado, só ele sabia disparar aqueles foguetes.
Já não tinha mais munições mas a vontade de o calar era grande, se lhe acertasse já não iria escrever aquelas bocarras do tipo “I love me, You stupid” que, uns anos mais tarde conseguiu meter à má fila, lá nas últimas páginas do livro do Major (Cor) Calheiros…
Voltei ao local do confronto e, à falta de melhor… atirei-lhe com os droptanks, no mínimo partia-lhe a cabeça.

Só depois desta terceira investida é que caí em mim.
Suspeitava que o Manecas se tinha ficado a rir e a comentar com os seus amigos cubanos que os aviadores tugas eram de uma nulidade confrangedora, por mais que tentassem nunca acertavam em nada, ainda estava para nascer o primeiro guerrilheiro que levasse com uma bomba nos… pés.
Triste, acabrunhado e um pouco a contragosto lá resolvi pedir pelo rádio que outros pilotos viessem tentar desatar aquele nó górdio que não tinha conseguido resolver.

Depois foi o regresso à Bissalanca, só então me percebi do novo problema que, sem querer, acabara de criar, deitara fora os droptanks e agora, luz da reserva acesa, mal tinha combustível suficiente para chegar a Bissau.

Era sempre nestes momentos de stress que as frustrações vinham ao de cima.
Alguém reconheceria o esforço que nos era pedido no cumprimento das missões?
Em tempos anteriores um aviador tinha-se ejectado, tinha olhos azuis, logo alguém se apressou a dar-lhe uma Cruz de Guerra, por estes dias o meu amigo Kurica também se tinha ejectado, castanhos, deram-lhe… um molho de brócolos (dos pequeninos).
Alguns meses antes um outro piloto tinha levado com uns tiritos, como demonstração e prova da sua grande operacionalidade, no fio ao pescoço ostentava orgulhosamente uma bala, quando mais tarde ouviu falar nos Strelas logo desistiu de voar, que um Strela ao pescoço não era exequível.
Outras ideias negras e (muito) recalcadas a emergirem, só chatices, encrencas e merdices, que diabo, por que razão não conseguia ser um piloto bem esgalhado do tipo “Major Alvega” ou “Top Gun”, ou de outros iluminados que faziam parte dos “La Crema de La Nata”, como um outro que, sozinho, conseguia resolver toda a guerra?

Embrenhado nestes pensamentos, o tempo foi passando e a coisa até acabou por correr bem, sem males maiores lá consegui chegar a Bissau.
Ainda não eram 07:00 e a missão estava quase completada, já imaginava o pequeno almoço e o que iria escrever no tal relatório que os do CTIG não iam ler, quando o Princípio de Murphy me voltou a lixar com nova emergência, ao fazer-me à pista o trem de aterragem não saiu, o alarme sonoro de “trem não bloqueado” começou a tocar, …
Tudo me acontecia…
Já com pouco combustível e sem trem, preparei-me para o pior, certamente o que me iria acontecer seria uma aterragem de barriga, ou papada, como é habitual dizer-se nos meios aeronáuticos, nada a ver com outras situações ou figurinos.
Cintos bem apertados, lá me mentalizei o melhor que pude para o contacto e raspanço pelo asfalto da pista, aquela estória do pássaro ui ui a vir-me à mente.
Inexplicavelmente, consegui aterrar normalmente.
Só então me apercebi que algo não estava conforme a lógica das coisas, o combustível já se tinha esgotado mas o motor continuava a trabalhar, estava a rolar na pista e no entanto o alarme do trem não bloqueado continuava a tocar, cada vez com maior intensidade…

Acordei.
Desliguei o despertador.

PS. Dedicado a todos os Malteses, Rambos e Alvegas deste país.
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Nota do editor

Último poste da série de 16 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16496: FAP (98): "Pedaços das nossas vidas" - "Marte, saia a Força Aérea, o Pirata ejetou-se em Gandembel", por TGeneral PilAv José Nico - II Parte (Miguel Pessoa)

Guiné 61/74 - P17035: Inquérito 'online' (105): "Estás reformado? E sentes-te bem?"... Total de respostas: 114. Resultados: 93% (n=106) estão reformados; e destes, cerca de 38% (n=40) sente-se "muito bem" e cerca de 45% (n=51) sente-se "bem"...


Viseu > Rua Formosa (frente ao antigo mercado municipal 2 de Maio) > Escultura do escritor Aquilino Ribeiro (Sernancelhe, 1885 - Lisboa, 1963) >  O monumento, em bronze, de homeagem ao escritor beirão, autor de Terras do Demo (1919), A Casa Grande de Romarigães (1957) e Quando os Lobos Uivam (1958), entre outras obras relevantes da literatura portuguesa da 1º metade do séc. XX  O trabalho é da autoria de Yuraldi Rodríguez Puentes (2013). Na foto, o nosso editor Luís Graça e a sua cunhada Nitas, ambos da mesma colheita de 1947... O nosso editor acaba de se reformar...mas eapera poder continuar a ser um artesão da palavra e da imagem...


Foto (e legenda): © Luís Graça 2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


A. Inquério 'on line':


"Estás reformado ? E sentes-te bem ?"


Respostas definitivas (n=114)


1. Estou reformado e sinto-me muito bem > 40 (35,1%)

2. Estou reformado e sinto-me bem  > 51 (44,7%)

3. Estou reformado e sinto-me assim-assim, 
nem bem nem mal > 8 (7,0%)

4. Estou reformado e sinto-me mal  > 5 (4,4%)

5. Estou reformado e sinto-me muito mal  > 2 (1,8%)

6. Ainda não estou reformado  > 8 (7,0%)

Total de respostas > 114 (100,0%)


O inquérito terminou em 9/2/2017, às 7h52


2. Comentários dos nossos leitores:

(i) Henrique Cerqueira (*):

Então é assim: Eu estou reformado e na maior parte das vezes eu não me sinto bem.
Explicando: Para mim a situação de reforma foi das piores coisas que me aconteceu .Isto porque quando estava na situação de trabalho eu tinha muita actividade e embora eu não tivesse necessidade de grande actividade e devido ao meu feitio era muito presente junto do meu pessoal visto que estava a chefiar e administrar uma equipe de manutenção industrial multidisciplinar (Electricidade, mecânica e serralharia mecânica). 

Inicialmente a minha actividade estava ligada à industria da biotecnologia e nos últimos anos da minha carreira passei a laborar na industria da fundição de ferro.Nesta ultima actividade todo o equipamento era de alto desgaste a todos os níveis e daí muito exigente em termos técnicos. Por esse motivo eu acompanhava muito de perto o meu pessoal.

Ora assim sendo,  quando me vi na situação de reforma, eu fui afastado de toda essa actividade e ainda hoje eu não sei o que fazer ao tempo extremamente longo que é o dia a dia . Já experimentei muitas actividades de ocupação de tempo mas nada tem sido capaz de me dar o gosto pelo dia a dia que tinha quando estava no activo.
Bom e para já fico por aqui na esperança que este sentimento de inutilidade passe um dia destes . Até lá vou me arrastando "feliz e contente por ainda estar vivo".
Um abraço e ainda fico a pensar qual o propósito deste tema.

PS - Na realidade eu não tive grande tempo de planear a minha reforma,porque de certo modo fui empurrado para essa situação, já que fui obrigado por insolvência da firma onde trabalhava a optar por essa situação de reforma antecipada.
No aspecto monetário até que não tenho que me queixar muito, pese embora o facto de ser mais um dos reformados que tem contribuído principescamente com os desaires económicos do nosso "pobre"país.
Na verdade eu até ia pensando nos meus devaneios enquanto estava no activo o que gostaria de fazer um dia que fosse reformado,mas,como bom Português que sou,  fui deixando esses planos para a última da hora. Até que mais ao menos de um momento para o outro a "crise" instala-se na empresa e foi uma "pressinha" a tomar decisões de reformas-te ou não. E as opções foram :então vamos lá e logo se vê.
Alguns planos que eventualmente tinha foram por água abaixo e a vontade de reagir demora a aparecer e vai-se sempre arranjando desculpas para adiar algumas das opções e que até coincidem um pouco com as que descreveste. No entanto eu creio que virá o dia que se há-de dar a volta.

(ii) Beja Santos (**):

Queridos amigos, percebo a inquietação do Luís Graça, de um dia para o outro quebraram-se rotinas, desapareceram horários, compromissos, estabeleceu-se uma nova relação entre o passado e o presente, procuram-se novas continuidades e incomodo as recentes descontinuidades.

No meu caso, preparei cenários com uma certa previsão: quis manter-me ativo num trabalho que fazia há várias décadas, com um elevado sentido de realização, na política dos consumidores. Ofereci-me para voluntário, dão-me uma sala e um computador, todos os dias viajo por muitíssimos sites em vários continentes para saber se ainda existem consumidores organizados e reivindicativos; mantive os meus compromissos com uma organização ligada à saúde e aos direitos dos doentes, continuo a aprender muito, até porque é indispensável procurar atualização sobre o que se passa em novos conhecimentos quanto a envelhecimento bem-sucedido nos quadro da multimorbilidade; não abrandei o meu interesse pelos estudos guineenses, a minha presença no blogue atesta-o, continuo um infatigável devorador de papel, alavanca para um conjunto de livros que já escrevi e outros que quero escrever; na atualidade, introduzi elementos novos, uns que chagaram com um enorme acolhimento, estou a escrever um romance, outros que andam associados ao apoio a familiares que subitamente adoeceram e que precisam do meu amparo, é o caso da aminha única irmã. Quanto ao resto, zelo para que não se degrade a saúde, convive com os amigos, sempre que posso invisto aos sábados na Feira da Ladra, e com assinaláveis sucessos.

E olho para o meu passado sem remorsos, procuro comportar-me dentro dos princípios do Cristianismo onde mantenho a minha fé, procuro respeitar a dignidade de toda a gente, não molestar ninguém, não denegrir ninguém e não perder tempo a comprar guerras. É assim que eu vivo, e estou feliz porque não vivo em desacordo com o que penso, tendo ainda o privilégio, após 50 anos de trabalho, de ter feito concursos para subir na carreira, de não ter atropelado ninguém, de ter uma reforma condigna em que posso ajudar os meus.

Não sei se me exprimi bem, é este o depoimento que vos entrego com o mesmo abraço de estima de sempre.

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Notas do editor;

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Guiné 61/74 - P17034: Agenda cultural (540): Ação da Diáspora pela Proteção do Parque Natural das Lagoas de Cufada, contra o projeto governamental de construção de uma barragem termoelétrica: Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 6ª feira, 10 de fevereiro de 2017, das 14h-18h45




















Ver aqui o vídeo Guiné-Bissau: Bemba di Vida [Celeiro da Vida] (9' 37'')
produzido pelo  IBAP - Instituto da Biodiversidade e Áreas Protegidas, 
Bissau, Guiné-Bissau (2009). 

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Nota do editor:

Último poste da série > 31 de janeiro de 2017 >  Guiné 61/74 - P17009: Agenda cultural (539): Lançamento do livro "A Colonização Portuguesa da Guiné", do prof João Freire, sociólogo (Lisboa, Comissão Cultural de Marinha, 2017), em Belém, na Biblioteca Central da Marinha, no próximo dia 8, 4ª feira, às 18h

Guiné 61/74 - P17033: In Memoriam (277): Carlos Filipe Coelho (Porto, 1950 - Lisboa, 2017), ex-Sold Radiomontador, CCS/BCAÇ 3872 (Galomaro, 1971/74) (Juvenal Amado)


Carlos Filipe Coelho (Porto, 1950 - Lisboa, 2017)... Foi Soldado Radiomontador da CCS/BCAÇ 3872 (Galomaro, 1971/74). Era membro da nossa Tabanca Grande desde 2009. Tem mais de 25 referências no nosso blogue.


O Carlos Filipe e o Cripto Gomes, em Bafatá


O seu avô, Deodato Soares Azevedo, morto em 1941 a bordo de um navio inglês onde era tripulante, atingido por um submarino alemão durante a II Guerra Mundial. Nasceu na Foz do Douro, Porto, em 1881. (Fonte: Cortesia do blogue Navios à Vista, de Rui Amaro.)


Georges VI, TI [Rex Imperator]: This scroll commemorates D. S. De Avevedo, Able Seaman Merchant Navy, held in honour as one who served King and Country in the world war of 1939-1945 and gave his life to save mankind from tiranny. May his sacrifice help to bring the  peace and freedom for which he died. (Fonte: Cortesia do blogue  Navios à Vista, de Rui Amaro.)

Tradução: "Jorge VI, Rei de Inglaterra: Este pergaminho celebra a memória do Marinheiro de 1ª classe [AB Seaman], da Marinha Mercante, D. S. de  Azevedo, tendo sido mandado passar em honra de quem serviu o  Rei e o  País na guerra mundial de 1939-1945 e deu sua vida para salvar a humanidade da tirania. Que seu sacrifício ajude a trazer a paz e a liberdade àqueles por quem ele morreu." (tr. de LG)


1. O falecimento do Carlos Filipe Coelho (ex-Soldado Radiomontador, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74)

por Juvenal Amado

O Carlos Filipe não era pessoa social, simpática nas suas opiniões, não fazia o favor de se calar, dizia o que tinha a dizer, quer estivesse em maioria ou não. Nem toda a gente gostava da sua forma de estar e, como se sabe, cada cabeça sua sentença e só o ouro agrada a todos.

Em Galomaro eram conhecidas as suas posições contra a guerra e um número mais restrito envolvia-se com ele em discussões politicas a que alguns tentavam por água na fervura. Depois de ser evacuado, na recolha dos seus pertences, havia vária documentação a que se teve que dar descaminho, sob pena de ela cair em mãos menos aconselháveis e criar-lhe mais problemas.

Foi evacuado de Galomaro com 10 meses. Hospitalizado em Bissau com hepatite [, hoje C], viu chegar o seu comandante de pelotão, o Alferes Mota, gravemente doente, que veio a falecer três dias depois.

Evacuado para o Hospital Militar de Lisboa, vem aí a fazer a  sua recuperação, passando à vida civil. 

Natural da Foz do Douro, Porto, acaba por ficar em Lisboa como técnico de rádio na emissora da Rádio Renascença, funda família e não custa acreditar que facilmente se ligou aos meios mais conspiratórios contra o regime de então.  É aí que se encontra quando finalmente o seu batalhão desembarca 20 dias antes do 25 de Abril de 1974.

Como militante de esquerda radical, toma parte dos acontecimentos da Rádio Renascença, que acabam com a explosão dos emissores e o despedimento de todos os implicados no processo de autogestão da referida emissora, que entretanto tinham surripiado ao controlo da igreja católica. A emissora volta para as mãos da igreja e ele e outros ficam desempregados.

No desemprego, monta uma oficina de técnico de rádio e corre o país na montagem de emissoras das rádios livres ainda clandestinas. Com a sua legalização são terreno fértil para a sua capacidade como técnico.

Findo esse período, mantém a oficina onde vai buscar o seu sustento.

Volto a encontrá-lo no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, em 2007, mas já não trabalha, está reformado. Trocámos correspondência online, combinamos encontrarmo-nos. Conta-me que está viúvo da sua mulher e camarada, que ele próprio sofre de cancro no pulmão e que se ofereceu para cobaia de novos tratamentos experimentais. 

Dou-me conta do isolamento, e sua  solidão, mas não consigo que ele passe a fronteira e que vá aos almoços do batalhão, muito menos conviver com a minha família.  Entretanto perco o seu contacto. Não atende o telefone, não responde aos e-mails. Como não tenho conhecimento com familiares dele, fiquei quase um ano sem saber onde parava.

Finalmente o telefone toca e é o Carlos Filipe. Conta-me que ficou com o esófago todo queimado da radioterapia e só agora consegue falar.

Expande-se então pela Net em páginas de discussão politica. Cria um blogue chamado  Recortes Para o Meu Neto, no facebook o Galomaro Destino e Passagem e, a seguir ao golpe de estado na Guiné-Bissau que derruba o Carlos Gomes, funda o Bissau-Resiste como blogue [, o último poste é de 8/1/2017] e como página do facebook, onde explana as suas ideias sobre a sociedade guineense, através de contactos denuncia corrupção, golpismo, ligações aos narcotráfico dos militares etc. 

Isto granjeou-lhe muitos amigos da Guiné na diáspora e, se calhar, muitos mais inimigos. 
Passa a viver para aquilo, fica chateado por eu não ser participativo na sua actividade e não comungar abertamente das suas opiniões. Mas na verdade eu não sabia em que me estava a meter, eu não conhecia a realidade fundamentada da situação política na Guiné-Bissau e em que águas turvas ela se movia. Deixou de me atender o telefone, de responder aos meus emails.

Um dia telefonou-me como se nada se tivesse passado. Fala-me da sua mãe e avó e do seu avô Deodato, morto a bordo de um navio inglês onde era tripulante, atingido por um submarino alemão   durante a II Guerra Mundial. (Vd. Blogue Navios à Vista, de Rui Amaro, cuja visita recomendo).

Até hoje não deixei de o apoiar, para tomar um café, para o ir buscar ao hospital, para  lhe fazer companhia e no domingo, pela a última vez, falei com ele no Hospital Pulido Valente. Hoje fui vê-lo pela última vez e, nem uma hora depois de estar em casa, recebo a notícia da sua morte. 

O nossa camarada Carlos Filipe foi uma personalidade complexa, esquiva, solitária, solidária, qual cavaleiro andante de causas e ideais muitos deles perdidos. Nunca esqueceu a Guiné, amava aquela terra de uma forma arrebatada. Não teria tido bom fim se lá tem ficado e envolvido na politica pós-independência, como facilmente se pode prever, mas todos nós, e até os detractores, ficamos mais pobres com a sua partida. Lamento que a sua voz, discordante tantas vezes, se tenha calado para sempre.

Descansa em paz camarada Carlos Filipe e que a terra te seja leve.
Os meus sentidos pêsames à filha, neto e genro, pois penso serem os únicos familiares. 

Camaradas, penso ter aqui retratado o Carlos Filipe como ele gostava de ser retratado e recordado . Como um lutador, nunca se rendeu, nunca se dobrou, nunca rastejou para obter o que quer que fosse e homens assim não precisam de palavras bonitas, não querem compaixão, porque são o que são, engrandecem-nos e tornam-nos imensos.

Um abraço, como ele diria, a todos e cada um.


2. Comentário do editor:

Já em novembro de 2016, o Juvenal Amado nos tinha alertado para a situação do Carlos Filipe Coelho (ex-Soldado Radiomontador, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74); enfrentava graves problemas de saúde, e estava internado no Hospital Pulido Valente (*)...

Nessa altura falei com ele ao telefone. Ficou sensibilizado por ter notícias da nossa Tabanca Grande. Mais recentemente voltou a  ser reinternado, segundo mensagem que me mandou, em 10/1/2017, o seu fiel e dedicado amigo e grande camarada  Juvenal Amado. Há muito que o seu estado de saúde nos causava preocupações. Acabei de chegar do Norte, e recebo esta notícia triste. É mais um dos nossos que parte para a última viagem. Ficam aqui as palavras, singelas, mas de grande ternura, que o seu neto, Guilherme Filipe, escreveu na página do Facebook do avô, ontem, às 14 horas:

(...) "Bem, nem sei por onde começar, não estava nada à espera que isto fosse acontecer, porque é que tinha de ser logo a ti,  avô?... Agora sem ti já não vou ter com quem desabafar dos meus problemas, não vou poder dar-te a saber as minhas notas da escola, não nada...  Sei que estavas a sofrer devido à tua doença, mas eu precisava de ti... Nem sabes o quanto eu gostava quando era pequeno e íamos dar os nossos passeios a Trafaria, queria-os repetir mas sei que não foi possível, gostava que tudo fosse diferente, queria ter-te dito um último adeus mas não consegui... Vou ter saudades do teu "Olá, meu neto, como estás?" e do "Obrigado por teres telefonado" ... Gosto muito de ti, meu grande amigo e avô, descansa em paz".

À filha, ao genro, ao neto, demais família, amigos e camaradas, a Tabanca Grande deixa aqui expressa a sua solidariedade no luto e na dor. O Carlos Filipe ficará connosco, agora do alto do poilão da nossa Tabanca Grande,  no "cantinho" daqueles que da lei da morte já se foram  libertando. (**)

PS - O Juvenal Amado ficou de nos informar sobre a data, a hora e o local da cerimónia fúnebre.

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 8 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16698: Banco do Afecto contra a Solidão (19): Carlos Filipe Coelho (ex-soldado radiomontador, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74): está hospitalizado, com graves problemas de saúde... Vamos mandar-lhe uma palavrinha solidária (Juvenal Amado)

(**) Último poste da série > 20 de janeiro de  2017> Guiné 61/74 - P16971: In Memoriam (276): o 1.º cabo sapador Glória, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74, um tripeiro de gema: até sempre, camarada ! (Juvenal Amado)

Guiné 61/74 - P17032: Os nossos seres, saberes e lazeres (198): Lembranças de um passeio entre Batalha, Mira de Aire e Minde (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 29 de Setembro de 2016:

Queridos amigos,
É bom ter uma neta exigente, que gosta de passear e não casmurra quando se vai a mosteiros ou a centros interpretativos de batalhas.
O início da viagem foi só para ver, confirmar e registar que a região Oeste, a despeito da crise, prospera. Era período de férias e a Foz do Arelho, S. Martinho do Porto e Nazaré dispunham de multidões a banhos, passeios vagarosos e ociosidades. O nosso programa estava centrado na Batalha e Mira de Aire, compromisso entre a história de Arte, um parque aquático onde destruí um calções na roda-viva com a neta e a surpresa desse esplêndido museu de aguarela Roque Gameiro, em Minde, há anos que sonhava com esta visita, fiquei com grande vontade de voltar, tal é a magia da casa e o prodígio das aguarelas do grande mestre.

Um abraço do
Mário


Batalha, Mira de Aire e Minde

Beja Santos

Era uma vez um avô que prometera à neta levá-la às grutas de Mira de Aire e ao parque aquático, três dias de boa-vai-ela. Primeiro, a Foz do Arelho, onde o avô e a mãe passaram férias, seguiu-se S. Martinho do Porto e depois a Nazaré, dormitou-se ali para os lados do centro de interpretação da batalha de Aljubarrota, fez a visita do campo militar de S. Jorge, a Benedita manifestamente indiferente à colocação das tropas, queria era saltitar pelos campos, regalou-se a ver o vídeo, terá tido a convicção que era desenho animado. E seguiu-se para o Mosteiro da Batalha, aí a Benedita manifestou interesse e ouviu as perlengadas do avô: olha filha, aqui é a Capela do Fundador, aqui estão os primeiros reis da dinastia de Avis, olha para a beleza da cúpula, olha o túmulo de D. João I e D. Filipa de Lencastre, não achas uma beleza? Já tínhamos visto a porta, com todos aqueles pormenores das catedrais góticas, andámos pela nave central da igreja, falei-lhe na abóbada de nervuras. E o passeio prosseguiu, passámos para os claustros.



O claustro de D. João I prima pela harmonia das proporções e pela elegância do seu trabalho, é exuberante mas é comedido, para dizer a verdade até se chegar às Capelas Imperfeitas e ao seu grande portal, não se pode falar em ostentação mas sim em harmonia e equilíbrio, o mesmo direi da casa do capítulo, do antigo refeitório e até do claustro afonsino.


Entramos agora no mundo das Capelas Imperfeitas, aqui não se esconde a magnificência de D. Manuel I, um rei que não olhou a meios para o enaltecimento da arte, recorde-se a Charola do Convento de Cristo e a respetiva porta, pense-se nos Jerónimos. O grande portal faz parte desse programa grandioso com que o monarca decidira terminar as capelas, mandadas fazer pelo rei D. Duarte. O viajante só dispõe de informação primária, desconhece o súbito e repentino plano de austeridade que impediu que estas obras se concluíssem, D. João III ainda tentou concluir as capelas, no seu tempo ficou o belíssimo balcão que apraz contemplar. Belíssimo por dentro e belíssimo por fora, talvez por isso mesmo, por incompleto.



Concluída a visita ao Mosteiro de Santa Maria da Vitória, caminhou-se prestes para Mira de Aire, esperam-nos dois dias de regalo. Primeiro o parque aquático, foi até estafar, avô e neta dentro daquela tubagem e expelidos dentro da piscina, começar e recomeçar sempre. Não surpreendeu quando a Benedita se bateu com um bife bem macio, batatinhas e legumes. E disse categoricamente: estou cansada, e sei que amanhã há muito mais.
Ao amanhecer, avança-se para as grutas, ditas as maiores de Portugal, descobertas em 1947, dispõe de 3 mil lâmpadas, há ali umas boas centenas de metros para deambular em espaços todos nomeados, lê-se e depois esquece-se: Algar, cavidade natural com a forma de um poço, derivado da dissolução do calcário na vertical pela subida e descida do nível das águas; temos também a sala grande, a maior sala da gruta, o teto é formado por largas bancadas de calcário que se elevam entre os 10 e os 30 metros de altura; mas há muito mais, há a sala vermelha, a cascata, os ossos, o púlpito, a joalharia, a galeria grande, o esparguete, a alforreca, a cascata da fonte das pérolas, a galeria do polvo, o órgão, os pequenos lagos, o bar, a cara da velha, o rio negro, o lago final, as vagas de erosão. Enfim lá vamos com a prudência necessária visitar esses 600 metros de grutas que têm uma extensão total superior a 11 500 metros. Vê-se e maravilhava-se, pois então. Aqui fica um convite à visita.




No último dia regressa-se por Minde, com paragem no Museu de Aguarela Roque Gameiro, sediado na Casa dos Açores, casa espantosa, o projeto do desenho é provavelmente de Raul Lino onde o arquiteto Martins Barata introduziu benfeitorias. O museu trabalha numa lógica de rotatividade das obras daquele que foi seguramente, entre o século XIX e o século XX um dos nomes maiores da aguarela em Portugal. Coube-nos visitar a exposição “Roque Gameiro – a felicidade de observar, entender, sentir”. Primeiro enamorámo-nos da casa antes de partir na viagem pelas aguarelas. Porquê o tema? Porque o mestre Roque Gameiro nunca esqueceu as suas origens, vivendo próximo da natureza. Escreve-se no catálogo: “Todos o conheciam sempre vestido de surrobeco castanho, chapéu de abas largas e gravata ou lenço de seda, sempre de verde-escuro com bolinhas brancas. No verão mudava para outro tipo de fato, linho grosso, sempre de cor crua”. Tradicionalista e atreito às ressonâncias da paisagem, as suas aguarelas falam no mar de seres humanos expressivos, e portanto iremos ver falésias, o rendilhado branco da espuma, paisagem com rios e lavadeiras, ruas da velha Lisboa, retratos de familiares. São estas as duas imagens que vos deixamos, estamos ainda naquele tempo de calor tórrido mesmo ao fim do dia e no regresso a Benedita, mesmo muito cansada, vai perguntando quando é que voltamos ao aquaparque… E o avô promete-lhe que será na próxima oportunidade.


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Nota do editor

Último poste da série de 1 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17011: Os nossos seres, saberes e lazeres (197): Pelos caminhos de Trancoso até chegar a Foz Côa (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P17031: Parabéns a você (1206): Constantino (Tino) Neves, ex-1.º Cabo Escriturário do BCAÇ 2893 (Guiné, 1969/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 6 de Fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17026: Parabéns a você (1205): Ana Duarte, amiga Grã-Tabanqueira; Fernando Franco, ex-1.º Cabo Caixeiro do PINT 9288 (Guiné, 1973/74); Hugo Moura Ferreira, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1621 (Guiné, 1966/68) e José Teixeira, ex-1.~Cabo Aux Enf da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70)

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Guiné 61/74 - P17030: Estórias avulsas (87): Tudo começou a 9 de Janeiro de 1967 (Abel Santos, ex-Soldado Atirador Art.ª)

GACA 3 - Companhia de Instrução


1. Em mensagem do dia 2 de Fevereiro de 2017, o nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69) fala-nos do seu começo nas fileiras no Exército Português.


Tudo começou a 9 de Janeiro de 1967 

A cidade de Espinho era detentora de uma unidade militar denominada Grupo de Artilharia Contra Aeronaves, (GACA3) unidade na qual me apresentei para começar a cumprir o serviço militar, ficando adstrito à 1.ª companhia.

Na minha passagem pelo GACA3, ficou na minha memória um episódio entre mim e um Tenente,  por uma suposta falta de respeito, segundo ele por não fazer a continência que lhe era devida, onde mostrou todo o "poder" dos galões que usava, obrigando-me a fazer flexões sobre uma poça de água, ficando eu todo encharcado, pois chovia imenso nesse dia, e sem farda para continuar a instrução já que tinha utilizado a outra durante a manhã, que estava molhada e a secar. O dito oficial ainda não estava satisfeito com o castigo aplicado e, vai daí cortou-me o fim-de-semana, o que me provocou uma certa revolta interior.

Mas, com atitude deste oficial, comecei a aprender o que era a imposição do serviço militar obrigatório e tudo o que lhe estava subjacente, porque queiramos ou não, havia oficiais naquela época que abusavam da patente para enxovalhar e espezinhar o seu semelhante, dando assim prazer ao seu ego.

 Abel Santos no GACA 3, é o terceiro a partir da direita na fila de baixo.

Abel Santos no RAP 2, é o primeiro à direita.

Passado o tempo de recruta, fui colocado no Regimento de Artilharia Pesada 2, ao tempo sediado em Vila Nova de Gaia, onde me apresentei a 28 de Abril de 1967, para me especializar em atirador, sendo colocado na 3.ª companhia - 3.º pelotão.

Durante o tempo passado no RAP2 analisei que as chefias tinham uma postura diferente em relação aos seus subordinados, em relação ao que se passou comigo no GACA3, talvez por serem milicianos, ou tinham mandado às malvas a educação nacionalista. O que sei, é que souberam reunir à sua volta aqueles rapazes incutindo nas suas mentes o sentido da amizade e solidariedade, construindo assim uma família de grande fervor castrense.

O Batalhão que estava a ser formado, do qual não me recordo do número, foi mobilizado para Angola, tendo eu ficado no RAP2, e adstrito à Companhia de Comandos e Serviços (CCS) até ser mobilizado para a Guiné. Apesar da instrução ministrada durante a especialidade ser dura, não dando tréguas ao pessoal, mas que aproveitei ao máximo, pois mais tarde usufrui dessa preparação na frente de combate.

No dia 20 de Junho de 1967 estando eu na formatura para o almoço, o comandante da CCS, Tenente Campos, convocou-me para uma reunião no seu gabinete pelas 14 horas, o que me levou a ficar desconfiado que algo se estava a passar, e coloquei a pergunta; estou mobilizado? Respondendo com um gesto de cabeça que sim, e após insistência minha me diz que o meu destino era a Guiné.

A cidade de Penafiel no distrito do Porto era ao tempo detentora de uma unidade militar denominada Regimento de Artilharia Ligeira n.º 5, (RAL5) na qual me apresentei, ido do RAP2, no dia 21 de Junho de 1967, sendo colocado na CART 1742 “ Os Panteras” sob o comando do saudoso capitão Álvaro Lereno Cohen.

 Antigo RAL 5 de Penafiel

Chegado a Penafiel, a CART já lá não se encontrava, estando a aguardar embarque no Regimento de Infantaria n.º 6 na cidade do Porto, para onde me dirigi, apresentando-me a 22 de Junho, sendo incorporado no 4.º grupo de combate - 3.ª secção do Alferes Magalhães.

Caros camaradas, assim foi o meu começo nas fileiras do Exército Português, ao qual ainda hoje me orgulho de ter pertencido.

Abel Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 26 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16643: Estórias avulsas (86): O velho problema da falta de meios nas Transmissões (José Luís Gonçalves, ex-Soldado Radiotelegrafista, 2ª CCAV/BCAV 8320/73, Olossato, 1974)

Guiné 61/74 - P17029: Estórias do Juvenal Amado (55): O Dia da Defesa Nacional



1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), autor do livro "A Tropa Vai Fazer de ti um Homem", com data de 2 de Fevereiro de 2017:

Meus caros,
Vamos misturando o passado com presente, salvo as devidas diferenças e vamos mesmo assim saboreando a vida.

Um abraço para todos
Juvenal Amado


ESTÓRIAS DO JUVENAL AMADO

55 - O DIA DA DEFESA NACIONAL

A minha neta telefonou-me a pedir se ia levá-la a Queluz, pois tinha que ir ao R.A. Antiaérea para estar presente no Dia de Defesa Nacional, que era obrigatório. Que chatice, pensaram os garotos e garotas por terem que ir gramar esta pastilha, ainda por cima num dia com aviso meteorológico amarelo a poder passar a laranja. Mas de que raio se haviam de lembrar eles?

Bem, quando lá chegámos vimos vários grupos dispersos, que com ar pouco animado esperavam pelas 9 horas da manhã, para assim ficarem a saber o que se ia passar.

A minha Luana ficou dentro do carro até ao último momento. Estava visivelmente enervada e dizia-me que não conhecia ali ninguém. Eu tentei sossegá-la dizendo-lhe que logo se ia sentir integrada entre aqueles rapazes e raparigas com ar de estudantes, roupas à moda, etc. Lembrei-lhe que quando foi para universidade também se tinha sentido assim, pois tinha ido para uma terra estranha, com colegas de casa que não conhecia e agora, dois anos depois, encara a aventura do Erasmo em terra de costumes e língua estranha .


Era impossível não me vir à memória e também acabei por lembrar o dia da minha inspecção.

Nasci na localidade de Fervença, porque a minha mãe tinha ido visitar a irmã e por isso fiquei para sempre ligado a uma terra e uma freguesia onde nunca vivi.
No dia da inspecção lá estava eu. Também não conhecia ninguém pois não tinha frequentado escola e embora alguns trabalhassem na mesma empresa que eu, não os conhecia, nem eles a mim.
Mas que diferença. Em 1969 os jovens na província eram duros, curtidos pelo o trabalho nos campos e nas fábricas, ou dos dois. Falavam com uma irreverência, ao verem-se nus, gozavam uns com os outros mau grado e mau olhado dos militares recrutadores, que faziam a parte que inspeccionavam alguém. Só cegos, ou sem uma perna, ou sem um braço eram rejeitados. Se tivessem outro problema escondido, a seu tempo ele viria a lume e se veria o que fazer.

Ainda tenho na memória a cena na Junta de Freguesia. Despíamos-nos numa sala e lá íamos em fila, todos como viemos ao mundo, uns mais tímidos, outros mais descarados, as bocas, os dichotes e as risadas sucediam-se.

Três militares já com alguma idade, tentavam impor a ordem ameaçando já com porradas, etc. Mas aquilo ainda eram frangos do campo e ia ser difícil metê-los na capoeira. Não perdíamos pela demora, pensavam os examinadores e com razão.

Na verdade, pese o problema da guerra, ninguém queria ficar livre, pela carga negativa que isso acarretava, pois ficar livre era ficar à parte, era ter qualquer coisa grave, enfim era uma grande porra.

O dia da inspecção era pois transformada numa grande festa, era chegar à idade adulta, éramos uns homens a partir dali. A farra durava até às tantas, com copos e uma visita à Espinheira, onde éramos acolhidos por umas senhoras “benfeitoras”, que aviavam a malta à vez, com a certeza que a GNR não aparecia nesses dias para estragar um “convívio” tão salutar.

Era de praxe e foi ali na fresquidão dos pinheiros e eucaliptos, em locais criteriosamente “seleccionados”, que muitos de nós tiramos as dúvidas que nos assaltavam noite e dia. Se era a direito ou atravessado!

Às 17 horas lá estava eu no largo fronteiro ao quartel, quando vi os nossos jovens participantes neste dia, a saírem ordeiramente em duas filas perfilando-se com a Bandeira Nacional à sua direita, para assistir ao arrear da dita, com toda a cerimónia, pompa e circunstância, que o momento impõe. Com grande pena minha, do facto não tenho fotos, pois esqueci-me do telemóvel. Seguidamente destroçaram até porque começava a chover muito.

Hoje levantei-me bem cedo pois andar na IC19 não fácil. Olhei pela janela e vi gaivotas a sobrevoarem os prédios construídos pelo J. Pimenta nesta enorme urbe que é a Reboleira há quase cinquenta anos. Tão longe do mar denota o mau tempo que se lá faz sentir. Também me fizeram vir à memória de quando elas poisaram nos mastros do Niassa, dois dias antes de chegar a Lisboa, mas nessa altura não era o mar revolto que elas anunciavam, eram notícias de boas-novas.

Quanto ao Dia da Defesa Nacional já no carro, disse-me ela que tinha sido uma seca e eu acredito.

Um abraço
JA
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16711: Estórias do Juvenal Amado (54): Aida, lembras-te de quando eu quis ir a Huelva?