sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17910: Agenda cultural (601): A festa do José Saúde: apresentação do seu último livro, na Casa do Alentejo, no sábado passado, dia 21: fotos


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4


Foto nº 5

Foto nº 6


Foto nº 7


Foto nº 8

 Foto nº 9


Foto nº 10


Foto nº 11


Foto nº 12


Foto nº 13


Foto nº 14

Lisboa  > Casa do Alenteho > 21 de outubro de 2017 > Sesssão de apresentação do livro do José Saúde, "AVC- Recuperação do Guerreiro da Liberdade" (Lisboa, Chiado Editora, 2017). 

Fotos: ©  Luís Graça(2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. O  nosso camarada José Saúde, ex-fur mil op esp/ranger, CCS / BART 6523, Nova Lamego/Gabu, 1973/74,  natural de Vila Nova de São Bento, Serpa, a viver em Beja, é uma figura popular na sua terra e na sua região, é um amigo do seu amigo, um camarada do seu camarada.  Não admira, por isso, que ele tenha conseguido, mais uma vez, encher o salão da Casa do Alentejo, no passado dia 21, sábado, na sessão de apresentação do seu último livro (fotos nºs 3, 4, 5, 6).

De Serpa e de Beja trouxe também dois grupos que animaram a festa: o Grupo Musical Os Alentejanos (foto nº 7) e o Grupo Coral Os Desassossegados (fotos nºs 13 e 14).  Da sua atuação, temos registo em vídeo, que apresentaremos noutro poste.

Dos nossos camaradas presentes, recordo-me de ver e de estar com o José Martins, o José Colaço, o Juvenal Amado, o Luís R. Moreira e a sua companheira, Irene (foto nº 9, em segundo plano), o Manuel Joaquim e esposa, o Fernando Calado e a esposa (Dra. Rosa Calado, da direção da Casa do Alentejo, com o pelouro da cultura) (foto nº 8), e ainda o Manuel Oliveira Pereira, que veio de propósito, de comboio de Ponte de Lima: é amigo da Luisinha, a esposa do José, antigos colegas de trabalho  (foto nº 10)... Além da Alice Carneiro, que acompanhou o Luís Graça, nosso editor [foto nº 2, de costas, vendo a exposição de Silva Júnior (1868-1937), o arquiteto da remodelação e decoração do Majestic Club, antepassado da Casa do Alentejo (foto nº 1).

Estava longe de imaginar que iria encontrar, aqui, na Casa do Alentejo, o  Manuel Oliveira Pereira (ex-Fur Mil da CCAÇ 3547 - "Os Répteis de Contuboel", Contuboel, 1972/74). Foi um dos participantes do histórico I Encontro Nacional da Tabanca Grande, em 2006, na Ameira, Montemor-O-Novo, e não sabia que ele era de Ponte de Lima e vizinho do também nosso camarada e amigo, Mário Leitão.

A apresentação do livro esteve ao cuidado do nosso editor Luís Graça. A sessão foi presidida pela dra. Rosa Calado que aproveitou o ensejo para nos dizer duas palavras sobre a história daquela casa, que é o orgulho dos alentejanos.
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Nota do editor:

Último poset da série > 25 de outubro 2017 Guiné 61/74 - P17904: Agenda cultural (600): lançamento do livro "Aristides de Sousa Mendes: memórias de um neto", de António Moncada S. Mendes. Lisboa, 31 do corrente, 3ª feira, às 18h30, no Salão Nobre do Palácio da Independência. Apresentação a cargo da historiadora Irene Pimentel.

Guiné 61/74 - P17909: Os nossos seres, saberes e lazeres (236): Alguns dos últimos trabalhos de pintura do nosso camarada e amigo Dr. Adão Cruz


1. Em mensagem do dia 21 de Outubro de 2017, o nosso camarada Adão Pinho da Cruz, Médico Cardiologista, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), enviou-nos fotografias de alguns dos seus último trabalhos, que aqui reproduzimos com a sua autorização.

Lembramos que o Dr. Adão Cruz, além de um excelente Cardiologista, compõe poesia e é um pintor de nomeada, já com algumas exposições colectivas e individuais[1].

Ver no Blogue "Jardim das Delícias" um apontamento biográfico deste artista.

Ficamos à espera de notícias sobre próximas exposições de que daremos notícia com todo o gosto.









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Notas do editor

[1] - 20 de setembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16505: Agenda cultural (502): Rescaldo da inauguração da exposição de pintura de Adão Cruz, levada a efeito no passado dia 17 de Setembro de 2016, no Museu de Ovar (Carlos Vinhal)

Último poste da série de 25 de outubro de 2017 Guiné 61/74 - P17903: Os nossos seres, saberes e lazeres (235): De Eskdalemuir para Dumfries, à procura de Robert Burns (6) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P17908: Notas de leitura (1008): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (6) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Setembro de 2017:

Queridos amigos,
O texto que ora se remete parece concludente com a análise já feita aos olhares da gerência da filial de Bolama: possuidores de um lastro informativo invejável, passavam inúmeros dados para Lisboa: sobre personalidades controversas, a situação da praça, o funcionamento político da colónia.
Convém não esquecer que o pós-guerra deixo a Guiné em péssimas condições e que o pessoal político escolhido não trazia, regra-geral boas credenciais.
É espantoso a mistura de papéis na mesma pessoa: funcionário e comerciante; produtor e militar; ajudante do governador, podendo estar em múltiplas instâncias, é uma impressionante acumulação de prebendas. E tudo numa atmosfera de permanente intriga, de cupidez, enquanto Bolama já não pode disfarçar a decadência, pelo menos a económica.

Um abraço do
Mário


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (6)

Beja Santos

O processo narrativo do gerente da filial de Bolama é muito abrangente, inclui retratos de figuras controversas, mostra a situação na praça, e no período em curso, estamos em 1919 e vamos considerar factos até 1921, não se omite o estado caótico em que se encontra a administração.

Em 23 de Setembro de 1919, esclarece-se Lisboa, a propósito de um protesto apresentado por Jaime Augusto da Graça Falcão, que foi prestigioso militar, e que se queixou de não ter recebido umas ações do BNU, mandou-se cópia extraída do cadastro de clientes redigido pelo gerente Cabrita e outros, de Bissau. Diz Cabrita:
“Não goza de boa fama e não é bom pagador. É político assanhado e com mania de fazer escândalos e acusações a tudo e a todos, nos jornais. É mau caráter”. Outro gerente presta a seguinte informação: “Não me conformo inteiramente com a opinião acima. Tem inimigos bem colocados na colónia, tem sido perseguido diversas vezes e naturalmente defende-se. Já se propôs a deputado pela Guiné em 1916 tendo sido derrotado para que o governador Sequeira não escolheu meios empregando toda uma casta de pressões, transferências e patifarias. Não é todavia um lídimo caráter”. E depois a informação do gerente Cotter: “Foi oficial do Exército e pediu a demissão; mais tarde pediu para ser reintegrado mas não conseguiu devido a ter más informações, apesar de ser condecorado com a Torre e Espada e ter medalha de bons serviços. É criatura perigosa. É preciso cautela com ele e crédito só por si não o merece. O Governador Manuel Maria Coelho nomeou-o administrador interino da circunscrição dos Bijagós em 1917; dispõe da influência entre o gentio. É mau caráter; não é pagador e tem praticado várias baixezas. Foi este indivíduo quem fez uma emissão de vales de vários tipos para circularem como dinheiro no arquipélago dos Bijagós”. E por último a informação do gerente Lereno: “Amigo do Governador Henrique Guerra. Foi nomeado administrador da circunscrição civil de Bissau deixando os Bijagós”. Se dúvidas houvesse do poder informativo dos homens do BNU na Guiné, elas dissipam-se com o que fica dito do antigo herói Graça Falcão.

Mas esse poder informativo estende-se ao conhecimento profundo dos comerciantes. Vejamos o que diz a filial de Bolama no seu relatório de 1920 sobre um conjunto de comerciantes:
“António Silva Gouveia, esta firma tem agora de lutar com grande concorrência, sendo uma casa muito forte, se for bem administrada deve poder vencer a concorrência ou pelo menos não decair. António Mateus Gomes de Pina, fez bastante negócio e tirou apreciáveis lucros. Não é porém firma que se abalance a grandes negócios.

Sá Leitão e Araújo Lda, ignoramos o resultado do exercício findo, mas não podem ser muito animadores. O sócio Araújo que era ativo e gozava de muitas simpatias na praça, saiu da sociedade. Victor Gomes Pereira vendeu a sua colheita de mancarra e parte de coconote para o estrangeiro, auferindo importantes lucros. Durante o ano adquiriu mais propriedades para a cultura da mancarra. Tem hoje a sua escrita bem montada, à testa da qual está o nosso ex-empregado Salvador Pinto, seu cunhado.

Empresa Comercial da Guiné Lda, o sócio gerente Bull está cumprindo degredo em Angola; esteve aqui, com aquele ainda o sócio Caetano Alves, que assumiu a gerência, retirou depois para a Europa. Compagnie Franco-Écossaise, foi-lhe aberta falência; continua o arrolamento dos bens.
Empresa Agrícola e Comercial dos Bijagós Lda, deixou a gerência desta empresa o gerente Botelho, veio geri-la Daniel Pereira, muito ativo e trabalhador, antigo gerente de António Silva Gouveia, de quem é hoje inimigo”.

Cinema de Bolama em ruínas

Pela primeira vez um gerente de filial diz abertamente que vai fazer apreciações de caráter político e económico. É um documento severo, como vamos ver:

“Poucos são os serviços públicos que sejam sofríveis. Os empregados que alguma coisa trabalham são os naturais da colónia ou os cabo-verdianos. Os que vêm da metrópole, chegam aqui com um único fito: arranjar seja como for algum dinheiro sem trabalhar. Muitos que aqui aparecem como empregados, devemos com verdade dizê-lo, antes deveriam vir como degredados. Os cargos superiores são todo mais ou menos desempenhados interinamente por indivíduos que, na maioria aliam à incompetência a falta de dignidade. A magistratura que deveria ser desempenhada por indivíduos competentes, atendendo à responsabilidade das decisões, vem há tempos sendo estropiada por quem desconhece por completo a legislação e é incapaz de interpretar a doutrina do mais simples artigo. Como Juiz de Direito, tem estado há meses que nada compreendendo do assunto se entregou nas mãos do delegado que estando aqui apenas há uns 18 meses arranjou uma dezenas de contos, tendo em seguida retirado para a metrópole. Na sua vaga foi nomeado o ajudante e sobrinho do governador, um alferes miliciano que basta trocarmos com ele duas frases para concluirmos que estamos na frente de um desequilibrado. Nenhuma noção tem do cargo que exerce.

Em 21 de Junho último, tomou posse do governo o atual governador que na leitura do discurso de apresentação disse coisas agradáveis. A nosso ver, julgamos ter ele vindo animado das melhores intenções, desejando fazer alguma coisa acertada, coibindo abusos e castigando os que prevaricassem. Mas tudo isso poderia ser levado a efeito que no indivíduo independente, o que com ele se não dá, pois um fanático pela política partidária.

Podemos dizer que quem sempre teve um certo predomínio na província foi a colónia de Cabo Verde, que com verdade devemos dizer foi a que colonizou esta província, sendo a ela que se deve algum progresso que esta tenha experimentado. A maioria dos empregados são cabo-verdianos, o comércio em grande parte lhe pertence e entre eles constam indivíduos de bastante valor. Tudo isto tem redundado em prejuízo de uma boa administração. O governador procurando o bem dos seus correligionários tem tirado de lugares indivíduos que regularmente desempenhavam as suas funções, para lá colocar outros que em pouco devem para a sua dignidade e que, tendo em mira ganhar somente conseguiram que fossem aumentados quase ao dobro os vencimentos e pagas as diferenças deles desde Janeiro de 1921.

Os administradores das circunscrições compram automóveis que são para seu uso pessoal. Uma repartição há que não deve ser atingida por estas apreciações, pois que devido ao seu diretor caminha com regularidade e disciplina. É a direção dos Serviços de Marinha. As alfândegas deixam muito a desejar pelo procedimento brusco do seu diretor. Contra ele foi levantado um processo por irregularidades cometidas, mas que, como partidário do atual governador, ficou o processo sem andamento.

O elemento militar é apenas no nome, pois que os soldados não têm a mais leve noção do que valem e os oficiais procuram é de tratar da sua vida particular. Como administrador do concelho está um oficial do exército colonial que tem feito um regular lugar. A ele se deve talvez uma estrada que vai de Bolama a ponta do Oeste, há pouco concluída e única que existe na ilha de Bolama. Falemos da câmara municipal que se distingue pela incúria e negligência. É constituída por indivíduos que não tendo conhecimento algum das necessidades do município ainda menos têm de tacto administrativo, o que dá em resultado caminhar tudo quando depende de serviços da câmara num desleixo imperdoável. Em Bolama há um hospital cujo tratamento é péssimo, o de Bissau é pior. Há perto de seis meses que existe apenas um médico em Bolama.

Sobre o censo da população da colónia não nos é possível com precisão qual seja. São variáveis as opiniões, sendo a mais admissível a de ser a população aproximadamente de 800 mil almas".

(Continua)
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Notas do editor

Poste anterior de 20 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17887: Notas de leitura (1006): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (5) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 23 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17896: Notas de leitura (1007): Memórias boas da minha guerra, volume II, por José Ferreira; Chiado Editora, 2017 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P17907: Em busca de... (280): pai de Elisa Gomes, nascida em Geba, em 2/12/1968, filha da lavadeira Maria Assunção Sábado Teixeira, já falecida (em Bafatá, em 1990). O progenitor pode ser um militar da CART 1690 (Geba, 1967/69). A Elisa vive e trabalha em Albufeira (Fernando Chapouto, ex-fur mil op esp, CCAÇ 1426, Geba, Camamudo, Banjara e Cantacunda, 1965/67)


1. Mensagem do nosso camarada Fernando Chapouto, originalmemnte com data de 2/12/2016. Por lapso, só agora é publlicada.

[O Fernando Chapouto foi Fur Mil Op Esp/Ranger da CCAÇ 1426, Geba, Camamudo, Banjara e Cantacunda, 1965 e 1967]

Assunto - Pedido de Ajuda para encontrar o pai de Elisa Gomes, um  militar português,

Peço aos meus amigos ex combatentes da Tabanca Grande, a encontrar o pai (ou o próprio que se pronuncie,)  de Elisa Gomes, nascida a 2 de dezembro de 1968, em Geba, Guiné – Bissau.

É filha de Maria Assunção Sábado Teixeira lavadeira do pessoal que morava por baixo ou ao lado da igreja.  A mãe faleceu em 1990 em Bafatá, onde se encontra sepultada.

Nesta altura a companhia que ali estava era a CART 1690 [, Geba, 1967/69] que rendeu a minha CCAÇ 1426 [Geba, 1965/67], por este motivo será fácil saber qual o pelotão aí destacado fins de fevereiro,  principio de março de 1968.

Como aqui junto a mim moram alguns africanos, especialmente da Guiné – Bissau,  alguns mesmo de Geba e com quem falo todas as semanas, um deles é primo da Elisa,  falou-me que a prima gostava muito de conhecer o pai, porque todo ser humano tem o direito de conhecer o pai, ela não apareceu por obra e graça do Espírito Santo.

Eu pergunto; de certeza que o referido militar quando regressou,  constituiu família e não abandonou os filhos.

Já falei várias vezes pelo telemóvel com ela, mora em Albufeira onde trabalha, as fotos que envio tirei-as do Facebook,  ao qual eu ainda não me adaptei muito bem.

Espero ter notícias e agradecia esta publicação.

Abraços

Fernando Chapouto

Fotos: Página do Facebook da Elisa Gomes (com a devida vénia...)


2. Comentários dos editores:

Fernando: Lapso nosso, acontece, e não é a primeira vez... Peço-te muita desculpa, a ti e à Elisa... Ainda vamos a tempo de publicar a tua mensagem, como vês... Diz-nos apenas se tens mais alguns elementos novos... A Elisa deve ter tido, através da mãe, mais dados sobre o pai: apelido, posto, especialidade e até, eventualmente, naturalidade... O pai (ou outra pessoa de família) poderá contactar a Elisa Gomes através da sua página do Facebook. Ou contactar os editores que estão obrigados, em casos como este, ao dever de sigilo.

Daqui a pouco menos de um mês, a Elisa vai fazer 49 anos...E que melhor poderia ela desejar ? Um sinal do seu pai ou da família do seu pai!... Oxalá ele esteja ainda vivo e de boa saúde!...

3. Comentário do nosso colaborador permanente José Martins:

Mais um caso acerca dos chamados "filhos do vento".

A boa prática, pelo menos na actualidade, era de que devia ter sido feito o reconhecimento de paternidade e o acompanhamento dos filhos gerados, mesmo que à distância. Tal não aconteceu neste e em muitos casos.

Mas entrando no que interessa: há que saber quem é que é o pai do neófito. Com base no nome, e nos meios militares, não é previsível o acesso ao seu processo individual porque só o mesmo o pode fazer ou, passados pelo menos 25 anos após a sua morte, por outro elemento.

Portanto,  só nos "meios civis" é possível obter os dados para a localização do visado. Quando só havia um operador telefónico e não havia telemóveis,  era possível através das informações da operadora obter alguns elementos. Agora isso é impraticável.

De qualquer forma, se puder ajudar, disponham.

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Nota do editor:


7 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17740: Em busca de... (279): Arq. Luís Vassalo Rosa, ex-Cap Mil, CMDT da CART 1661 (Henrique Matos e João Crisóstomo)

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17906: Os Nossos Enfermeiros (11): O 1.º Sargento Enfermeiro Reformado José Bragança Ferreira, HM 241, Bissau, 1970/72... Com 86 anos, vive em Abrantes e dedica-se ao voluntariado. Foi homenageado, em 2013, pelo Rotary Club de Abrantes


Clicar na imagem para leitura mais confortável

Com a devida vénia ao Jornal de Abrantes, edição de dezembro de 2013 >
Entrevista por Hália Costa Santos, pag. 2


1. Mensagem de 8 do corrente, do nosso amigo e camarada (ex-
Manuel Traquina (ex-Fur Mil Mec Aurro, da CCAÇ 2382, Buba, 1968/70), que vive em Abrantes [, foto atual, à direita]


Amigo Luís,
Agradeço esta publicação.

Estou certo que muitos se recordam de enfermeiro Bragança.

Um abraço.
Traquina


2. Os Nossos Enfermeiros > O Enfermeiro Bragança

Muitos daqueles que nos anos 70/72 passaram pelo hospital militar 241 em Bissau, decerto lembram o Primeiro Sargento Enfermeiro José Bragança Ferreira. 

Agora com 86 anos,  reside nesta cidade de Abrantes, exercendo a sua actividade como voluntário em várias instituições (Liga dos Amigos do Hospital de  Abrantes, Centro Social Interparoquial de Abrantes, entre outras). 

O Rotary Club de Abrantes,  no ano de 2013, decidiu homenageá-lo como o “Profissional do Ano”. É conhecido na cidade como o "enfermeiro Bragança". Ver aqui entrevista dada então ao "Jornal de Abrantes", em dezembro de 2013.

 O enfermeiro Bragança,  depois de uma comissão em Angola e outra em Moçambique (onde nasceu um dos seus filhos), viria a ser colocado no Hospital Militar de Bissau [HM 241] (1970/72).

No jantar realizado em sua homenagem, referiu-se àqueles anos passados no HM 241, como sendo o ponto alto da sua carreira. Colocado nas enfermarias de Cirurgia  A e 2,  onde era responsável por 40 doentes, recorda que de um modo geral não tinha horário, tudo dependia do número de sinistrados que os helicópteros ali “descarregavam”, quase sempre com diagnósticos “poliestilhaçados”,  outros amputados e alguns até com perda de visão. 

Recorda que por vezes era chocante ver o militar da cama ao lado a ler a carta da família ao amigo que tinha acabado de perder a visão em combate. 

Segundo a sua opinião, naqueles anos aquele hospital possuía a melhor aparelhagem hospitalar e, também o melhor pessoal médico e de enfermagem,  pelo que qualquer militar gravemente ferido ansiava por ser evacuado, pois sabia que naquele hospital poderia estar a sua salvação.  Em caso de evacuação Ypsilon,  dizia-se ou pensava-se: "Se chegar ao hospital vivo,  já não morro".

Recordamos que as evacuações no interior da Guiné por vezes não eram fáceis, no período nocturno era quase impossível, de um modo geral os helicópteros de noite não tinham condições e, por vezes também o terreno e o clima condicionavam as evacuações. 

A todos aqueles que com ele trabalharam e também aqueles a quem prestou os seus cuidados,  ele envia um grande abraço.

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17905: (D)o outro lado do combate (13): Jovens recrutas do PAIGC... (Jorge Araújo)


Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivo Amílcar Cabral > Pasta: 05222.000.172 > Título: Jovens durante treino militar para o Exército do PAIGC > Assunto: Jovens durante treino militar para incorporarem o Exército do PAIGC e a luta de libertação nacional > Data: 1963-1973 >  Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral.

(Reproduzido com a devida vénia...).

1. Mensagem do Jorge Araújo, nosso colaborador permanente, com data de hoje:

Caro Luís,

Parabéns pela tua síntese/reflexão construída a partir dos meus últimos postes sobre as propostas de Amílcar Cabral (AC) a Sekou Touré (ST) (setembro de 1972).

Caso entendas incluir uma foto dos jovens guineenses em instrução (futuros guerrilheiros do PAIGC) no poste  P17902 (*), aqui vai uma...

Citação:
(1963-1973), "Jovens durante treino militar para o Exército do PAIGC", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_43792 (2017-10-25)

Ab.
Jorge Araújo.



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Contuboel > Centro de Instrução Militar de Contuboel > 1969 > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > > O Valdemar Queiroz, com os recrutas Cherno, Sori e Umarau (que irão depois para a CCAÇ 2590 / CCAÇ 12). Estes mancebos aparentavam ter 16 ou menos anos de idade. Eram do recrutamento local.

Foto: © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. Comentário do editor LG:

Obrigado pela foto dos "jovens recrutas" do PAIGC. "Arrebanhados à força" ? De facto, não têm, aparentemente,  as caras mais felizes do mundo...  Vão a marchar, é certo, a aprender "a ordem unida", que é o princípio da disciplina militar em toda parte...Vão mal fardados..

Já na foto que acima se publica, de instruendos do CIM de Contuboel (talvez de finais do 1º trimestre ou início do 2º trimestre de 1969), tens outros recrutas, com "outro ar"... Quem está "mal fardado" é o graduado metropolitano, o fur mil Valdemar Queiroz... O jovem (ou adolescente, mais corretamente) da direita, o mais pequeno, com ar de "djbi",  o Umaru Baldé (1953-2004) (membro a título póstumo da nossa Tabanca Grande), escreveria mais tarde, refugiado em Portugal,  o seguinte sobre o seu recrutamento e partida para a tropa, em carta comovente,  sem data, enviada ao Valdemar Queiroz ("Amor Nunca Acaba"):

O Umaru Baldé um ano e picos depois,
já combatente calejado  da CCAÇ  12 (1969/71), 
em Bmbadinca,  ao tempo da CCS/BART 2917 (1970/72).
Foto de Benjamin Durães (1970).
(...) "Ninguém esquece o passado, seja bom ou mal, eu  me lembro do dia 12 de março de 69, quando fui chamado para a vida militar portuguesa. Na verdade eu tinha poucos anos de idade e era filho único de meu pai. Minha mãe revoltou-se, dizendo que eu não tinha idade para ir para a guerra. Mas o alferes, que tinha vindo para nos levar, não podia ouvir esse grito de revolta. O alferes disse: 'Somos todos portugueses,  viemos de muito longe para defender a Pátria Portuguesa, e então,  para o povo saber que em Portugal não há raças nem cores, todos os cidadãos têm que ir cumprir o serviço militar português'.

"Minha mãe chorou, e disse: 'Ai, meu Deus, tenho o meu único filho que me vai deixar para ir morrer na guerra'... Essa data foi dia de tristeza e de lágrimas para o povo de Dembataco e de Taibatá. E lá ficamos até às 4 horas da tarde para depois entrarmos nas viaturas militares e sguirmos para Bambadinca" (...) 

[Revisão e fixação de texto: LG] (**)

Guiné 61/74 - P17904: Agenda cultural (600): lançamento do livro "Aristides de Sousa Mendes: memórias de um neto", de António Moncada S. Mendes. Lisboa, 31 do corrente, 3ª feira, às 18h30, no Salão Nobre do Palácio da Independência. Apresentação a cargo da historiadora Irene Pimentel.



Convite da editora Desassossego (nova chancela do Grupo Saída de Emergência) para a sessão de apresentação do livro "Aristides de Sousa Mendes: memórias de um neto", no dia 31 de outubro, às 18h30, em Lisboa, no salão Nobre do Palácio da Independência, Largo de S. Domingos, 11. A apresentação está  a cargo da  historiadora Irene Pimentel.

Recorde-se também aqui o papel que tem tido na reabilitação da memória de de Aristides de Sousa Mendes o nosso camarada João Crisóstomo (Nova Iorque, EUA) (sem esquecer o seu amigo, e também mordomo reformado, António Rodrigues, hoje a viver na Batalha).

O autor do livro, António Moncada S. Mendes,  é licenciado em Ciências Políticas,  possui um mestrado em Estudos Russos (Teatro) obtido na Universidade de Montreal, Canadá. Com o seu primo Álvaro Alpoim de Sousa Mendes, major do exército português, dedicou-se à difusão da memória do seu avô no início dos anos 90 e em 2000 aceitou o convite deste primo para criarem a Fundação Aristides de Sousa Mendes.

Ficha técnica:

Título: Aristides de Sousa Mendes - Memórias de um neto
Autor: António Moncada S. Mendes
Chancela: Desassossego
Data 1ª Edição: 13/10/2017
ISBN: 9789899987548
Nº de Páginas: 352
Dimensões: [160x230]mm
Encadernação: Capa Mole
Preço: 15, 93€

Sinopse:

"A história do cônsul Aristides de Sousa Mendes, e de como desafiou as ordens de Salazar para salvar as vidas de 30.000 refugiados durante a II Guerra Mundial, é hoje um legado de coragem e nobreza que constitui um orgulho para todos os portugueses.

Mas quem era Aristides de Sousa Mendes? Por trás da figura heroica esconde-se um homem complexo, profundamente íntegro e religioso, devoto à família e ao país, e que foi forçado a fazer uma escolha terrível entre a sua consciência e o dever profissional, sabendo que as consequências para si seriam implacáveis.

Com recurso a um extenso arquivo fotográfico e documental, em grande parte inédito, o seu neto, António Moncada S. Mendes, desvenda o lado pessoal do cônsul e da sua família, lançando assim uma nova luz sobre a figura de um diplomata que se sacrificou para salvar a vida de muitos inocentes."


GRUPO SAÍDA DE EMERGÊNCIA

Taguspark - Rua Prof. Dr. Aníbal Cavaco Silva,
Edifício Qualidade - Bloco B3, Piso 0, Porta B
2740-296 Porto Salvo, Portugal
Tel: +351 214 583 772
Tlm: +351 963 441 979
www.sde.pt
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Guiné 61/74 - P17903: Os nossos seres, saberes e lazeres (235): De Eskdalemuir para Dumfries, à procura de Robert Burns (6) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 2 de Agosto de 2017:

Queridos amigos,
É tocante encontrar no meio de charnecas, num dos locais onde muito chove e a humidade é mais elevada da Escócia, um criativo espaço comunitário, onde as escassas centenas de habitantes locais têm polo de atração bem como as localidades próximas, é o saber fazer transformando uma velha escola num aprazível ponto de encontro onde se cruzam formação, palestras e conferências, venda de produtos locais, um espaço de saúde e um restaurante a preços abordáveis.
Foi ali que comprei um livro de contos de Dino Buzzati, em francês e italiano, uma edição curiosa e uma velha edição de Oliver Twist, de Dickens, com belíssimas gravuras. Daqui seguiu-se para Dumfries, no rasto do bardo nacional da Escócia, Robert Burns.
Uma tarde magnífica, mas é doloroso visitar uma povoação outrora florescente graças ao têxtil, hoje numa pungente e indisfarçável decadência.

Um abraço do
Mário


De Eskdalemuir para Dumfries, à procura de Robert Burns (6)

Beja Santos

Alguém que me acompanha, na véspera à noitinha sugere um passeio às charnecas mais húmidas da Escócia, ali chove torrencialmente uma boa parte do ano, há quem procure o Esk Valley pelo fresco do verão, não passa de um mês, o resto do ano é tempo desolador. O local chama-se Eskdalemuir entre Langholm e Lockerbie. A sugestão é para que eu tenha conhecimento ao vivo de uma experiência de desenvolvimento comunitário dentro de uma velha escola, agora um polo dinâmico de criatividade, há ali refeitório, venda de produtos tradicionais, cursos de formação, exposições, teatro, o resultado e o pleno entusiasmo dos cerca de 265 habitantes que obtêm bons serviços, educação comunitária, acesso a terapias, troca de livros e discos e muito mais. De Moffat até ao Esk Valley são estas charnecas espantosas, ao viandante deu para pensar na atmosfera em que se desenrola a famosa novela de Conan Doyle, O Cão dos Baskervilles. E depois de almoço o grupo, em estado de felicidade, marchou para Dumfries.


Já foi muito próspera, Dumfries, atravessada pelo rio Nith, entra-se no casco histórico e o sentimento de abandono é indisfarçável, fachadas estaladas e corroídas, muitos estabelecimentos encerrados. É um dos pesadelos das autoridades escocesas, levantar estas vilas e cidades onde pontificava a riqueza têxtil, em decadência com a globalização. O viandante aproveitou a pouca luz para mostrar esta corrente de água num dos pontos mais graciosos da pequena cidade.


É umas das contradições destes espaços que outrora tiveram ostentação e marcas de água. No centro do mais buliçoso comércio, tomado por lojas de fancaria e muitos espaços de vendas caritativas, um sinal da velha prosperidade, a torre tem uma excelente volumetria, é uma preciosa escala humana, perguntou-se a meio mundo que serviços estão agora instalados, não houve resposta cabal. Mas não custa a crer que foi lugar de honra da municipalidade de Dumfries.


Viemos em romagem ao lugar onde viveu e morreu o poeta nacional da Escócia, Robert Burns, nesta casa passou os últimos anos da sua vida, hoje é casa-museu. Burns ganhou a sua imortalidade pela poesia afetiva, o uso gostoso dos aforismos e quadras populares, exprimiu-se em inglês e dialeto escocês, os ingleses dão-lhe pouco valor, os escoceses tratam-no como o seu bardo nacional. Vale a pena ao leitor procurar Robert Burns na wikipedia e ver o que sobre ele e o seu génio escreveu um crítico literário tão exigente como Jorge de Sena.



Antes de entrar na casa-museu colheu-se esta imagem relacionada com os afazeres agrícolas de Burns, que era funcionário nas alfândegas locais, muito estimado pela sua extroversão, um crónico frequentador de tascas e tabernas onde sabia escutar e tinha auditório. O seu currículo, que se inicia em meio rural, a sua frequência de meios populares, a sua satisfação por uma poesia mordaz, a sua faceta no tratamento da questão amorosa, deslizando subtilmente para um erotismo contido, preparou-lhe a fama em vida e a imortalidade quando morreu em 1796, com 37 anos.


A companha avança agora para outro lugar de peregrinação, a igreja de S. Miguel, em cujo cemitério está o mausoléu de Burns. Dentro das vicissitudes do chamado tempo inglês, depois de uma manhã de céu plúmbeo, tudo se aclarou, as ameaçadoras nuvens negras afastaram-se, parecia um dia de verão. É impressionante o efeito desta pedra de areia, ressalta todos os pormenores, dá mesmo alguma majestade às linhas austeras do templo. A envolvente do cemitério ainda se torna mais impressionante.



Não é a primeira vez que o viandante se confessa atraído por estes espaços de tranquilidade, sem imagens do horror da morte, é verdade que se fala quase sempre na memória amorosa de quem partiu, ali se juntam pais, filhos, irmãos e até netos. No seu mausoléu, Burns está sepultado com o filho que nasceu exatamente no dia da sua morte. Há aqui uma atmosfera romântica, exacerbada pela presença da natureza, por vezes tão forte como estas raízes que se expandiram atirando uma lápide ao chão. Para que conste que a vida é muitíssimo mais poderosa do que os materiais com que se julga preparar a eternidade de cada um. Amanhã muda-se de rumo, vai-se de Moffat até Thornhill e daqui a Drumlanrig Castle, desde já advirto que foi um dia de arromba, ia à espera de contemplar um quadro de Leonardo da Vinci, célebre por ter sido roubado desta casa e ter sido recuperado incólume, tivesse o viandante procurado informação pertinente e saberia que os proprietários têm agora o quadro emprestado à galeria nacional, em Edimburgo. Mas estava um dia lindo e Drumlanrig Castle tem uns belos jardins, como se irá mostrar.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 18 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17876: Os nossos seres, saberes e lazeres (234): Passeio pedestre por algumas entranhas de Moffat (5) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P17902: (D)o outro lado do combate (12): Amílcar Cabral e Sékou Touré, em setembro de 1972: alianças e dependências... Dos desertores do PAIGC à recolha de fundos... (Luís Graça)


Amílcar Cabral, secretário geral do PAIGC > c. 1970 > Foto  incluída em O Nosso Livro de Leitura da 2ª Classe, editado pelos Serviços de Instrução do PAIGC - Regiões Libertadas da Guiné (sic). Tem o seguinte copyright: © 1970 PAIGC - Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde. Sede: Bissau (sic)... A primeira edição teve uma tiragem de 25 mil exemplares, tendo sido impresso em Upsala, Suécia, em 1970, por Tofters/Wretmans Boktryckeri AB.


Comentários do nosso editor aos postes P17898, P17480 e P17537 (*) 


I. Jorge, também se escreve nas entrelinhas ... E até Deus escreve por linhas tortas, segundo a sabedoria popular. Pois, devo dizer-te que do teu paciente e valioso trabalho de leitor e analista da papelada do Amílcar Cabra (AC),  retive duas ideias: o PAIGC tinha problemas comuns com os governos de Salazar e, depois, de Caetano:

(i) a falta de efetivos era dramática e o nº de "refractários, faltosos e desertores" tirava-lhe o sono;

e, por outro lado, (ii) o patacão que não chegava para tudo, muito menos para "alimentar o ventre da guerra"...

Ambos os atores principais desta guerra tinham problemas demográficos, logísticos e orçamentais, o que é normal em todas as guerras... (Daí que todas as guerras têm um princípio, meio e fim,  mesmo a guerra dos cem anos...)..

Em relação ao primeiro ponto, leia-se com atenção uma das propostas que o AC faz ao seu anfitrião, Sekou Touré (ST):

(...) "Em cooperação com as autoridades locais, a JRDA [Juventude da Revolução Democrática Africana] e a Milícia Popular guineense [organização a quem foi oficialmente atribuído, a partir de 1969, um papel equivalente ao exército], recuperação imediata dos combatentes [do PAIGC] que desertaram [sic] da frente para se refugiarem na República da Guiné Conacri (Cadinhá, Djabada, Kanfrandi, Boké, Boffa, Koba, Conacri, Koundara, Gaoual, etc.). O seu retorno imediato às frentes da luta para serem reintegrados nas nossas Forças Armadas." (...)

O AC não escamoteia o problema: o PAIGC tem desertores e não são poucos, diluídos entre a população refugiada, em diversas prefeituras do território vizinho, mais próximas (são referidas explicitamente nove!)...

Não temos números sobre a "deserção" nas fileiras do PAIGC... Mas o problema devia ser "sério", senão mesmo "grave"...

Sabemos que o PAIGC, como no caso de outros movimentos revolucionários em África e por todo o mundo, não podia contar "só" com a militância política, o idealismo e a generosidade dos jovens, o sentimento anti-colonialista do povo, a consciência nacionalista, etc. Tinha que fazer uso de métodos menos "ortodoxos" como o recrutamento forçado, a coação, o rapto, a violência...

O AC não era ingénuo, conhecia bem a realidade da Guiné e de África...

Por outro lado, a vida no mato era duríssima (tanto para as populações sob controlo do PAIGC como para a guerrilha), havia uma refeição por dia, quando havia, as "barracas" (acampamentos do mato) não tinham estruturas fixas, as baixas eram elevadas, os cuidados médicos e de enfermagem muito precários, não havia hospitais no interior da Guiné, apenas "postos de primeiros socorros" na melhor das hipóteses, os feridos e os doentes levavam vários dias a chegar à Guiné-Conacri ou ao Senegal, a guerra prolongava-se sem fim à vista, o moral era necessariamente baixo...

Um homem insuspeito, que combateu ferozmente o PAIGC, como Alpoim Calvão, fez, em tempos, antes de morrer, numa entrevista que deu, uma implícita homenagem ao guerrilheiro do PAIGC que, embora melhor adaptado ao terreno do que os soldados metropolitanos portugueses, era frugal, combativo e sobretudo revelava uma grande capacidade de resiliência, resistência, sofrimento... (Os "meus homens", fulas, da CCAÇ 12, "desarranchados", levavam para dois dias de operações no mato duas mãos cheias de arroz cozido, embrulhado num lenço; nós, os graduados, metropolitanos, tínhamos direito a duas "malditas" rações de combate que, com o tempo e a experiência,. ficavam no quartel em Bambadinca...).

Jorge, um dia destes tens que pegar de novo  neste tema... que tem a sua "delicadeza". Ninguém gosta de falar de desertores, mas a verdade é também os incentivávamos a entregar as suas armas nos nossos quartéis... Não sei se a campanha foi frutuosa, mas houve casos.... Tu estiveste no Enxalé, e sabes do que falo: no teu tempo acolheram-se lá dezenas e dezenas de "refugiados", vindos do "mato"...

Enfim, há muitos mitos, de um lado e do outro do combate. Nós, que já não somos "meninos de coro" (, ou será que ainda os há ?), temos a obrigação de identificar e desvendar esses mitos... Por uma razão simples: é também a nossa história e a história não se faz com historietas da carochinha...


II. Para colmatar as "brechas" nas fileiras do PAIGC, e já que o recrutamento no interior da Guiné, passados os primeiros anos, deixou de ser possível, a base demográfica do PAIGC era cada vez mais restrita, circunscrevendo-se aos núcleos de população "refugiada" nos países vizinhos (Guiné-Conacri e Senegal)... e, em muito menor escala, em Cabo Verde (onde o PAIGC foi buscar sobretudo quadros, bons quadros, de resto).


Daí a explicação para este pedido, algo insólito, ao Sékou Touré:

(...) "Permissão para o recrutamento de jovens (de 17 aos 25 anos), cidadãos imigrantes do nosso país ou descendentes de imigrantes na República da Guiné Conacri.

a) – Concentração destes recrutas em Conacri.

b) – Formação acelerada, em Kindia, no campo de treino da OUA [Organização da Unidade Africana] (...) . A formação dos recrutas visa a sua integração nas frentes da luta." (...).

Kindia fica  a cerca de 130 km a nordeste de Conacri e já era então uma importante base militar da Guiné-Conacri. Era, pois, para lá que eram encaminhados os jovens guineenses da "diáspora", apanhados pelo recrutadores do PAIGC (,seguramente com a cobertura das autoridades da Guiné-Conacri). Temos que admitir que uma boa parte ou até uma grande parte desses jovens recrutas não iria de livre vontade para Kindia e depois para o interior da Guiné, sabendo como se tinha intencificado a guerra, de um lado e do outro. 

Estas propostas do AC ao ST datam 14 de setembro de 1972, quase dois anos depois da invasão de Conacri, em 22 de novembro de 1970 (Op Mar Verde) e a escassos 4 meses da conspiração contra o líder do PAIGC e do seu assassinato (em 20 de janeiro de 1973, em Conacri). Como sabemos, ainda hoje está por esclarecer o papel de ST no assassínio contra AC.


III.  Um dos problemas do AC é que não tinha diamantes nem petróleo. O AC teve que estender a mão à "caridade" internacional: os países do bloco soviético, a China. mas também a Suécia (a partir de 1969) e outros países e organizações ocidentais... A Suécia vai doar quase   6 milhões de euros (em avalor atual) ao PAIGC antes da independência, entre 1969 e 1973.

O Amílcar Cabral humilha-se claramente perante o Sékou Touré, estendendo literalmente a mão à "caridade" do seu anfitrião... para mais sendo a Guiné-Conacri, também ela, um país pobre... 

Era ingenuidade do Amílcar Cabral ou apenas uma forma (cínica)  de lisonjear um homem que, tanto quanto sabemos, tinha ciúmes da craveira intelectual e do prestígio internacional do histórico dirigente do PAIGC ? No fundo, seria uma forma de associar também o ST ao "sucesso" da luta que se travava no território vizinho...

Releia-se, com atenção, esta  outra proposta do AC ao ST:

(...) "No domínio financeiro

1. Comprar, ao melhor preço para o Ministério do Comércio, as quantidades de certos produtos de primeira necessidade (gasolina, sabão, fósforos, alguns tecidos, etc.) quando as nossas disponibilidades não ultrapassem as possibilidades para o consumo imediato.

2. Permissão para que o nosso Partido possa receber quotas (voluntárias) dos cidadãos do nosso país instalados [residentes] na República da Guiné Conacri, para o desenvolvimento da luta.

3. Realização, por intermédio do PDG. [Partido Democrático da Guiné], especialmente da JRDA [Juventude Revolucionária Democrática Africana], da CNTG  [Confederação Nacional dos Trabalhadores da Guiné] e da UNFG [União Nacional das Mulheres da Guiné], de festas, missões, quermesses, etc., para a obtenção de receitas destinadas à luta.

Estas medidas poderiam ajudar o nosso Partido, de modo significativo, a fazer face às exigências cada vez maiores da luta no domínio financeiro." (...)

Também nunca saberemos (, porque os principais dirigentes do PAIGC morreram e poucos  foram ao "confessionário da História"...) quanto rendeu ao PAIGC estas e outras formas de "recolha de fundos" na terra do Sékou Touré... Não acredito que o AC, homem inteligente, tivesse expetativas muito altas em relação  à recetividade e sobretudo à implementação destas propostas (e das outras propostas) apresentadas ao ST em setembro de 1972.

Enfim, é a leitura (seguramente superficial e descontraída...) que eu faço, dos documentos que tu, Jorge, tiveste  a pachorra e a gentileza de ler (em francês) e traduzir para nós...


IV. Jorge: uma guerra, como qualquer conflito, é sempre uma relação (de antagonismo) entre duas partes, ou atores (como dizem os sociólogos). Cada uma da partes, tem depois os seus apoios (externos, internos...) e os seus trunfos, os seus pontos fortes e fracos...No final, há que está melhor posicionado para negociar do que o outro...

Sékou Touré não deve ter sido um "aliado fácil" do Amílcar Cabral e do seu partido, mas é evidente que a Guiné-Conacri foi, desde o início, um "santuário", absolutamente imprescindível para o PAIGC (contrariamenet ao Senegeal de Senghor)... Sem essa retaguarda estável e relativamente segura (não obstante a invasão de Conacri em 22/11/1970...), nunca a luta de guerrilha teria ido tão longe...

É muito interessante o documento que divulgas, para conhecimento de todos nós, até porque é revelador das fragilidades do PAIGC a nível logístico, por exemplo.. O AC tinha plena consciência de que as bolanhas das "regiões libertadas" nunca poderiam alimentar a guerrilha e a população que vivia no mato, sem falar do "estado maior" e forças operacionais e de apoio em Conacri e nas bases de retaguarda, nas zonas fronteiriças.. Amilcar tem que negociar a compra de 100 toneladas de arroz ao "amigo e camarada" Sékou Touré... Ninguém faz a guerra de estômago vazio, apesar do "estômago espartano" do homem africano...

Quando Amílcar Cabral pede 100 toneladas de arroz para o seu pessoal instalado na Guiné-Conacri, incluindo os combatentes junto à fronteira, mesmo que o arroz seja "pago pelo Partido" (o mesmo é dizer, pelos "amigos" suecos, russos e outros...), isso coloca-o numa posição de subalternidade e dependência em relação ao Sékou Touré...

O papel e a personalidade deste homem ainda estão em grande parte por esclarecer.  O brilho intelectual e o prestígio do Amílcar Cabral, dentro e fora de África, deviam-no ofuscar...Amílcar Cabral era de outro planeta, da estatura de um Nelson Mandela... E o Sékou Touré apenas um aprendiz de ditador, com um passado de sindicalista e de nacionalista de "duro de roer" aos olhos dos franceses...

O maior erro de Amílcar terá sido, a meu ver, nunca ter percebido a "pedrinha do sapato" do PAIGC que era a liderança dos cabo-verdianos que estavam a anos-luz dos guineenses... Veja-se como os guineenses aplaudem o miserável golpe de Estado de 'Nino' Vieira contra Luís Cabral..., ditando o fim do mito da unidade Guiné-Cabo Verde... 'Nino' que eu conheci pessoalmente em 2008,  não era uma "estadista", não era um "líder", era apenas um "senhor da guerra", como milhares de "cabos de guerra" que emergiram no caos do pós-colonialismo,  por exemplo, o Ansumane Mané...

Mas... e o combustível para os camiões e os célebres BRDM-2, as viaturas blindadas anfíbias de patrulha e reconhecimento, que ainda hão de aparecer no fim da guerra para dar um arzinho da sua graça ? Chamar-lhes "carros de combate" é uma grosseria, é um insulto à arma de cavalaria... E, tal como as nossas velhas "latas" (as Daimler. as Panhard...), deveriam gastar 100 aos 100 ou mais... Não sei se eram a gasolina ou gasóleo...

Este assunto, das BRDM-2, já aqui mereceu honras de primeira página no nosso blogue... Mas convirá chamar a atenção para os incautos leitores: nesta altura, em setembro de 1972, o PAIGC não tinha viaturas blindadas, nem muito menos combustível para pôr a marchar a sua "cavalaria"... Em qualquer guerra, os "cavalos" são mais mais difíceis de "alimentar" do que os "infantes", para mais nas dificílimas condições de terreno e do clima da Guiné...

Jorge, não podes acabar este conjunto de três artigos sem nos dares algumas pistas sobre o seguimento das propostas: ficou tudo em águas de bacalhau, ou o Amílcar ainda conseguiu,  em vida, ver concretizadas algumas das suas propostas ?

Um abraço com todo o meu apreço pelo teu trabalho de pesquisa, roubado ao tempo de descanso e da família e... se calhar também ao "tempo do patrão"...(**)


Vd. postes anteriores:

17 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17480: (D)o outro lado combate (8): Regime de Sékou Touré e PAIGC: propostas de reforço da cooperação militar, elaboradas por Amílcar Cabral, 4 meses antes de ser assassinado (Jorge Araújo)

3 de julho de 2017 > Guiné 61/74 - P17537: (D)o outro lado do combate (9): Regime de Sékou Touré e PAIGC: propostas de reforço da cooperação militar, elaboradas por Amílcar Cabral, 4 meses antes de ser assassinado (Jorge Araújo) - Parte II