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sábado, 4 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25476: 20.º aniversário do nosso blogue (14): Alguns dos melhores postes de sempre (X): O fatídico dia 12 de outubro de 1970: a emboscada de Infandre, Zona Oeste, Setor 04 (Mansoa) (Afonso Sousa, ex-fur mil trms, CART 2412, 1968/70)


O José da Cruz Mamede, de Casal Comba, Mealhada, morto em 12 de outubro de 1970:  foto de álbum da família. Cortesia de Lucília da Cruz Mamede (2007). A legenda é do Afonso Sousa.

Entretanto, por pesquisa na Net, ficámos a saber que a Câmara Municipal da Mealhada, em reunião ordinária de 26 de junho de 2021, aprovou por unanimidade "a alteração toponímica, na localidade de Casal Comba, da atual 'Rua de Traz das Eiras' para 'Rua José da Cruz Mamede'. Por ser esta a rua onde nasceu e viveu o homenageado antes da sua mobilização para a Guerra Colonial e onde viveu a sua família." 


1. A pedido da irmã, Lucília Cruz Mamede (Casal Comba, Mealhada) do nosso infortunado camarada, o ex-1.º cabo, de rendição individual, José da Cruz Mamede, do Pel Caç Nat 58, morto na emboscada de Infandre, em 12 de outubro de 1970, o nosso camarada Afonso Sousa, depois de dois anos de pesquisa (desde setembro de  2005) (*), organizou este dossiê (**), que merece honras de antologia e de ser republicado por ocasião dos 20 anos de existência do nosso blogue. (***)

O Afonso Sousa é um histórico do nosso blogue, é um dos primeiros de nós a  integrar a nossa tertúlia (logo em junho de 2005): tem 63 referências, foi fur mil trms, CART 2412 (Bigene, Binta, Guidage e Barro, 1968/70), vive em Maceda, Ovar (a 70 km a noroeste da Mealhada, ambos os concelhos pertencendo ao distrito de Aveiro).


O fatídico dia 12 de Outubro de 1970: 
a emboscada de Infandre

por Afonso Sousa

“Recordar é manter a memória colectiva 
ao transmitir os factos do passado às novas gerações”.

 
I. Sete horas da manhã. Militares do Pel Caç Nat 58 e da CCAÇ 2589, acantonados em Infandre (cerca de 10 km a NW de Mansoa), partem deste aquartelamento em direcção a Mansoa, em 2 viaturas Unimog, a fim de efectuarem mais um reabastecimento da Unidade.

Para a deteção de minas, um grupo de militares segue à frente das viaturas, fazendo a habitual picagem da estrada (de terra batida). Duas horas depois a coluna chega a Mansoa.

As viaturas são colocadas nas posições de reabastecimento. Alguns dos militares, como sempre o fazem (sempre que se deslocam à vila), procuram de imediato o único estabelecimento de comidas onde poderão refrear todo o seu justificado apetite pelo esforço destas 2 horas de marcha.

II. Encaminham-se, como sempre, para a Casa Simões, ali mesmo ao lado da Igreja de Mansoa. 

O Simões havia também cumprido o seu serviço militar na PM (Polícia MIlitar). em Bissau, e resolveu continuar na Guiné, abrindo em Mansoa um pequeno restaurante, sobretudo para apoio à comunidade militar desta zona. Por aqui, ele estava na boca de quase todos. Os que vinham da periferia não hesitavam em fazer uma visita ao restaurante. Assim aconteceu com estes militares do aquartelamento de Infandre. Era como que reviver, por instantes, sabores e momentos da saudosa Metrópole.


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) > Igreja > Aqui estiveram as urnas dos militares mortos na emboscada de 12 de outubro de1970 , para as devidas honras e formalidades


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) > Casa Simões > Na esplanada do restaurante almoçam os fur mil César Dias e Caetano


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) >  O fur mil César Dias (à direita) e o 1º cabo Brogueira


IV. Reconfortados, estes militares lá voltaram ao espaço do reabastecimento. A operação de carga conclui-se. 

Eram cerca de 11 e meia. Ia começar a viagem de regresso a Infandre. Alguns civis, como de costume, acomodam-se nas viaturas, com as suas compras. A velocidade ronda os 50 - 60 km/h. 

Por volta das 11,45h a coluna está à vista do aquartelamento de Braia. Resolvem parar para um cumprimento rápido aos seus vizinhos e camaradas amigos e tomarem uma bebida. Deixam as viaturas sobre a direita da picada e vão até ao interior do fortim. A visita é rápida, não mais que 10 minutos.


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) >  Braia > O fortim do destacamento


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) >  Braia  > Efectivos do destacamemto > Parte do 3.º Pelotão da CCAÇ 2589 ("Os Peras") mais quatro elementos do Pel Caç Nat 58 (um deles é o fur A Silva Gomes). Os restantes elementos destes dois Pelotões, juntamente com um Grupo de Milícia, constituiam o efectivo.


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) >  Braia > 
Interior do aquartelamento (Messe). O fur mil António Silva Gomes, de perfil, a ler um jornal ou revista.


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) >  Braia  > Em posição de continência,  o fur A Silva Gomes,  do Pel Caç Nat 58


V. É agora quase meio-dia. Vão retomar o caminho rumo a Infandre. Faltam apenas pouco mais que 4 Km.

Decorrem cerca de 5 minutos, após a partida. Os militares de Braia ouvem um intenso tiroteio para o lado do caminho que a coluna de Infandre seguia. Pressentiram, de imediato, que estava a ser atacada. A sua reacção foi instantânea. As duas viaturas do fortim, puseram-se estrada fora, a toda a velocidade. 

A estrada descreve uma curva à direita. Há um fardo de palha (talvez colmo) na estrada. Contornam-no. Cerca de trezentos metros depois da curva avistam-se as duas viaturas do aquartelamento de Infandre. Estão paradas na estrada. Em cima delas, nativos de armas apontadas ripostam à progressão dos homens de Braia. 

Estes saltam das viaturas e começam a progressão de forma mais cautelosa, pelas bermas da picada, junto ao capim. O furriel António Silva Gomes refere que teve necessidade de reposicionar-se para não ser atingido. Alguém lhe estava a chamar a atenção para isso. A nossa reacção foi determinada e eficaz. Os elementos do PAIGC começam a evadir-se no mato. 

Os militares socorristas aproximam-se. Junto às duas viaturas o ambiente é desolador, dramático... Militares mortos e feridos, no chão, em redor das duas viaturas. Os feridos em estado desesperado. Começam a ouvir-se o estrondo das granadas dos obuses de Mansoa que caíam para o lado da fuga do inimigo. Alguém já tinha dado o alerta. Procura-se o socorro possível aos feridos e estabelece-se a comunicação para as necessárias evacuações. 

O cenário é dantesco e de profunda emoção e tristeza. Um pelotão inteiro está ali, naquele pequeno espaço, completamente abatido. Os olhos humedecidos são de tristeza e de raiva. O inimigo tinha atingido os seus desígnios de forma cruel e bárbara. Diz o furriel António Silva Gomes: 

− Deparámos depois que a cerca de 50 metros, para o lado contrário da emboscada, junto a um bagabaga, aí se haviam escondido cinco dos nossos militares, sobreviventes sem ferimentos, que de forma instantânea e algo feliz conseguiram evadir-se através do alto capim, para o outro lado da picada.

Entretanto chegavam também, em socorro, militares de Infandre. Estes demoraram mais porque tiveram que fazer a deslocação a pé (as duas únicas viaturas existentes eram as que tinham sido emboscadas).

VI. Introduzo aqui um parêntesis para referir que tive, entretanto, conhecimento que o 1.º cabo enfermeiro António Oliveira, do Hospital Militar 241 de Bissau, chegou exactamente ao local da emboscada, por volta das 12,30h. 

Ele era um dos elementos que integrava a equipa do helicóptero que procedeu à evacuação dos feridos de maior gravidade.

Por ironia do destino, o Oliveira também é da Mealhada e morava a pouco mais de 2 km do José da Cruz Mamede. Este tinha estado a gozar férias em Bissau onde, conforme combinação prévia, deveria ter visitado o António Oliveira, no Hospital Militar. Por qualquer circunstância,  o José não esteve com ele e voltou a Infandre uns dias antes da fatídica emboscada.

O António Oliveira reconheceu, no capim, o seu amigo.  Estava do lado esquerdo (conforme a orientação das viaturas), a cerca de 10/15 metros da berma da estrada. Já estava sem vida. À minha observação para a distância a que se situava em relação ao local exacto da emboscada, disse-me que, provavelmente, ainda se terá arrastado naquele espaço, enquanto as forças lho permitiram.

Quanto ao Serifo Djaló, que morreu em Bissau, cinco dias depois, e o Natcha que morreu em 20 de novembro, confirma que se tratavam de elementos apanhados nesta emboscada e que haviam sido evacuados para Bissau.

Dada a quantidade de feridos, deram instruções imediatas para que de Bissau, partissem 2 ambulâncias, por estrada. Os 3 ou 4 feridos de maior gravidade, foram, de imediato, evacuados de helicóptero.

Refere que, antes de procederem à descida, no local, um T6 procedeu a bombardeamentos no enfiamento de Morés e Canquebo.

O António Oliveira não põe de lado a hipótese da coluna ter parado entre o fortim de Braia e a zona da emboscada, para dar boleia a alguém da população. Continua, por isso, a haver alguma dúvida se terão parado, para esse efeito. 

A paragem poderia ser tácita com os elementos do PAIGC. Por ora, é ainda uma questão difícil de investigar ou concluir. Sobre esta questão, o ex-furriel António Silva Gomes (um dos socorristas de Braia) afirma de forma quase peremptória que não houve qualquer paragem, dado que entre a saída de Braia e o momento da emboscada, apenas decorreu um intervalo de cinco minutos.

Quem sabe se algum daqueles 5 militares que estavam ilesos, atrás de um bagabaga, poderiam ajudar a esclarecer o assunto.

O problema é que ainda não se descobriu os seus nomes. Supõe-se que um deles terá sido o 1.º cabo Costa (Laureano Augusto Costa ?) que esteve emigrado em França e que acaba de regressar à sua terra, em Mirandela. O seu depoimento seria de grande interesse, mas não foi ainda possível contactá-lo.

VII. Segundo o António Oliveira, quem esteve também no local, nesse momento ou no dia seguinte, foi o Marcelino da Mata. 

O seu testemunho também poderia ajudar na pormenorização de uma ou outra questão sobre as quais pareça subsistir ainda alguma dúvida ou menor clarificação, como, por exemplo, esta: o ex-furriel César Dias diz que só no dia seguinte (13 de outubro) foram evacuados, de Mansoa, 6 elementos do Pel Caç Nat 58. 

O cabo enf António Oliveira diz que, de imediato (12 de outubro), foram chamadas ambulâncias, de Bissau, para procederem à evacuação de todos os feridos que o transporte de helicóptero não pôde contemplar.

Falta saber, quanto ao atado de palha, deixado na estrada (logo após a curva, pouco mais de 1 km à frente de Braia), se foi ou não aí colocado pelo IN e, em caso afirmativo, se o terá feito antes ou depois da passagem da coluna emboscada.

Os taipais das viaturas encontravam-se muito esburacados por força das rajadas, feitas quase à queima-roupa, já que a emboscada foi executada por elementos do PAIGC, camuflados no alto capim (lado N), a escassos 2 metros da borda da picada. Os nossos militares estimaram que seriam cerca de 100 guerrilheiros, com um relevante potencial de armamento.

O furriel Dinis César de Castro foi capturado, tendo-lhe sido exigido que tirasse a farda. Recusou-se, com grande determinação e enorme sentido de patriotismo. Foi cruelmente rasgado, de lado a lado, com rajada de metralhadora. 

Este incomensurável gesto de patriotismo haveria de ser reconhecido pelo Estado português, quando, na cerimónia do 10 de Junho de 1971, Dinis César de Castro foi condecorado, a título póstumo, com a Cruz de Guerra.

VIII. Introduzo aqui um testemunho, recente, de alguém que, na altura, seguiu e viveu este acontecimento:


"12-10-1970 é uma data que recordo com tristeza. Como muitas outras, era mais uma coluna a passar naquele itinerário, (Braia-Infandre), mas daquela vez havia à volta duma centena de guerrilheiros emboscados com morteiros, lança-granadas-foguete e armas automáticas. Chegaram mesmo a lutar corpo a corpo. 

"Sofremos 10 mortos (entre os quais, do Pel Caç Nat 58, o 1.º cabo José Mamede, o 1.º cabo Joaquim Baná e os soldados Cumba, Seidi, Mundi, e Baldée da CCAÇ 2589 o meu amigo Furriel Mil de Op Esp Dinis Castro, e os soldados Joaquim M Silva, Joaquim J Silva, Duarte Gualdino, a quem presto sentida homenagem), 9 feridos graves, 8 feridos ligeiros e um soldado capturado. 

"Recorri aos documentos que guardo com muito carinho, e mais uma vez fiquei emocionado" (Furriel mil César Dias – CCS / BCAÇ 2885, Mansoa, 1969/71)


IX. Em 20 de Novembro de 1970, o furriel Carlos Fortunato, da CCAÇ 13, que se dirigia para Bissau para participar na Operação Mar Verde, passou no local da emboscada e viu, espetada num tronco, uma granada de RPG-7, que não tinha explodido. Estimava em cerca de 3 Km a distância até Braia. E, de facto, esse cálculo não estava muito longe da realidade.

Mais duas informações, entretanto recolhidas:

- Às 18,35h do próprio dia 12 de outubro de 1970, o IN flagelou Mansoa, com canhão sem recuo, a partir de Cussanja (junto ao Rio Geba) - 4,4 Km a SE de Mansoa, no entroncamento da estrada Mansoa-Cussaná-Cussanja com a estrada de Jugudul-Porto Gole. Cussanja, pela sua situação, junto à margem do Rio Geba, o IN tinha-a como um ponto privilegiado para flagelações de Mansoa. 

Tudo indica que esta flagelação terá surgido como retaliação aos bombardeamentos aéreos feitos pelas nossas tropas, logo a seguir à emboscada e teriam como objectivo surpreender os efectivos de Mansoa que estavam preocupados com a recolha dos mortos e feridos e com todas as acções inerentes ao desfecho da emboscada. Cussanja ficava precisamente do lado oposto de Braia/Infandre, a NW de Mansoa.

As pesquisas levam-nos, por vezes, a resultados surpreendentes, como é este caso que me acaba de ser relatado pelo 1.º Cabo Luís Camões, à altura, em Mansoa: 

O condutor de uma das duas viaturas emboscadas, quase dado como desaparecido, surgiu, à noite, em Mansoa (com a sua G3), depois de ter percorrido, pela mata, cerca de 9 km, previsivelmente em puro sofrimento (*). Falta averiguar o seu nome e se ainda permanece entre nós para, neste caso, procurar obter o seu testemunho e o porquê deste seu arriscado procedimento. (Pertencia à CCaç 2589 e estava adstrito ao Pel Caç Nat 58, em Infandre.)

X. O trajeto e os momentos do fatídico dia 12 de outubro de 1970

Momentos:
  • 7:00  >  Saída de Infandre
  • 9:00 >  Chegada a Mansoa
  • 9:30 - 10:00 >  Alguns dos elementos da coluna fazem a habitual visita à Casa Simões 
  • 10:00 - 11:30 >  Carregamento do reabastecimento
  • 11:50 >  Chegada a Braia
  • 11: 45 - 11:55 > Paragem em Braia
  • 12:00 >  Emboscada
  • 12: 04 >  Ajuda de Braia (chegada a 300 m do local da emboscada)
  • 12: 10 > Termo dos confrontos – evasão dos guerrilheiros do PAIGC

Distâncias:
  • Braia ao local da emboscada: 2,26 Km (0,8 Km na parte recta)
  • Braia a Infandre: 4,69 Km
  • Local da emboscada a Infandre: 2,43 Km
  • Infandre – Mansoa: 9,56 Km
  • Infandre – Namedão: 8 Km

Guiné > Região do Oio > Mansoa (1954) > Carta de 1/50 mil >  Trajeto Infandre - Braia - Mansoa, em 12 de outubro de 1970


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) > Estrada Mansoa - Braia -Infandre > 
Reta de 800 metros, entre a estrada da emboscada e a entrada do aquartelamento de Infandre


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) > 
Local: a cerca de 500 metros do cruzamento para Infandre. Deslocação de uma das viaturas de Infandre, para apanhar lenha precisamente junto à estrada, a cerca de 1500 metros, onde, mais tarde, havia de acontecer a emboscada


Guiné-Bissau > Região do Oio > Mansoa > s/d > Estrada Mansoa-Bissorã, algures, após o antigo fortim de Braia


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) > Uma 
 coluna da CCAÇ 13 acaba de atravessar a bolanha e o rio Braia e aproxima-se do aquartelamento de Braia


Guiné > Região do Oio > Mansoa > BCAÇ 2885 (1969/71) >
Uma coluna da CCAÇ 13 após atravessar a bolanha, junto ao Rio Braia


XI. Mortos e feridos

A trágica ocorrência redundou em 10 mortos, 9 feridos, 8 feridos ligeiros e um soldado capturado. (6 mortos e 6 feridos eram do Pel Caç Nat 58 e os restantes da CCAÇ 2589 e população) . 

Dois dos feridos do Pel Caç Nat 58  vieram depois a falecer em Bissau, o que elevou o número de mortos, do Pel Caç Nat 58, para oito.

Listagem de mortos do Pel Caç Nat 58 e da CCAÇ 2589

As listas dos combatentes falecidos no Ultramar, que podem ser consultas no site da APAV, ou da Liga dos Combatentes, nem sempre são rigorosas, neste caso omitiram o falecimento do sold Joaquim Manuel da Silva da CCAÇ 2589 (12/10/1970).

Lista dos mortos do Pel Caç Nat 58
  • Bomboro Joaquim - 21-08-1969
  • Joaquim da Silva Magalhães, 1.º Cabo - 30-08-1969
  • José da Cruz Mamede, 1.º Cabo - 12-10-1970
  • Joaquim Banam, 1.º Cabo - 12-10-1970
  • Idrissa Seidi, Sold - 12-10-1970
  • Tangina Mute, Sold - 12-10-1970
  • Betaquete Cumbá, Sold - 12-10-1970
  • Gilberto Mamadú Baldé, Sold - 12-10-1970
  • Serifo Djaló, Sold - 17-10-1970
  • Natcha Quefique, Sold - 20-11-1970

Lista dos mortos da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885
  • José Luciano Veríssimo Franco - 29-05-1969
  • António José Penhasco da Costa - 09-11-1969
  • Joaquim Moreira Marques - 09-11-1969
  • Dinis César de Castro, fur mil - 12-10-1970
  • Duarte Ribeiro Gualdino, sold - 12-10-1970
  • Joaquim João da Silva, sold - 12-10-1970
Em 20-11-1970, o fur mil Henrique Martins de Brito, do Pel Caç Nat 58, foi evacuado para a Metrópole.

Feridos do Pel Caç Nat 58 evacuados de Mansoa, para o HM241 de Bissau, no dia seguinte ao da emboscada:
  • Augusto Ali Jaló – 2.º sarg mil
  • Jamba Seidi – 1.º cabo
  • Malam Dabó – Sold
  • Serifo Djaló – Sold (viria a falecer 4 dias depois – 17-10-1970)
  • Jorge Cantibar – Sold
  • Samba Canté – Sold

XII. Notas e esclarecimentos adicionais:

(i) Justificação do espaço de 5 minutos entre a saída da coluna de Braia e o momento da emboscada:
  • Saída do fortim, chegada às viaturas e pô-las em movimento: 2 minutos;
  • Percurso de 2,26 Km (à velocidade provável de 50 km/h): 2,71 minutos (total: +/- 5 minutos).
Tem este cálculo o objectivo de comprovar (e confirmar testemunhos) de que neste espaço de 2,26 km a coluna não fez qualquer paragem e que o molho de palha encontrado na estrada, pelos militares de Braia, terá, eventual e estrategicamente, ali sido colocado por algum dos guerrilheiros do PAIGC, logo após a passagem da coluna, talvez com o objectivo de confundir ou surpreender os homens de Braia ou moderar a passagem das suas viaturas.

(ii) O José da Cruz Mamede (n.º 17762169), desembarcou em Bissau em 21/11/69. Veio, em rendição individual, para substituir o 1.º cabo Joaquim da Silva Magalhães (n.º 01779368), falecido em combate (Pel Caç Nat  58) em 30/8/69. O Manuel João Mimoso Belo (Sacavém) foi posteriormente para Infandre, para substituir o José da Cruz Mamede.

(iii) O Pel Caç Nat 58 chegou a Infandre a 16/11/69, para substituir o Pel Caç Nat 62, que foi extinto.

Durante a permanência em Infandre, o Pel Caç Nat 58 sofreu 16 confrontos, entre flagelações e emboscadas.

Era comandante do Pel Caç Nat 58 o alferes Eduardo Ribeiro Manuel Cardoso Guerra que não esteve envolvido neste acontecimento, visto não ter feito parte da coluna de reabastecimento. Consta-se que, posteriormente, foi evacuado para a Metrópole, não se sabe se por doença ou por ferimentos em combate.

(iv) À data da emboscada, era esta a distribuição dos efectivos militares, nestes 2 destacamentos:
  • Infandre: 2 Sec do Pel Caç Nat 58 + 1 Sec de um 1 Gr Comb da CCAÇ 2589 + Grupo de Milícia;
  • Braia: 2 Sec de um Pel da CCAÇ 2589 + 1 Sec do Pel Caç Nat 58.
(v) O Henrique Martins de Brito, furriel, mais tarde (20/11/70), viria a ser evacuado para a Metrópole, não se sabe se em consequência de ferimentos, nesta emboscada.

(vi) Em Mansoa estava sediado o BCAÇ 2885 (RI 15 – Tomar – Maio de 1969 a Fevereiro de 1971). Rendição do BCAÇ 2885 pelo BCAÇ 3832 (RI 2 – Abrantes - Janeiro de 1971 a Janeiro de 1973.
 
(vii) Testemunho que  obtive, em 2007,  de um dos feridos na emboscada :

O Augusto Ali Jaló,  então 2.º sargento, era o comandante desta coluna de reabastecimento. Localizei-o na zona de Lisboa. Tive com ele uma agradável conversação, no sentido de tentar obter a clarificação de algumas destas questões. Nesta coluna, o Augusto seguia na viatura da frente, a mesma onde também seguia o José Mamede. Ao eclodir da emboscada, saltou da viatura. Não foi atingido mas sofreu um severo trautamatismo craneano e uma grave contusão no joelho esquerdo. O helicóptero que se apresentou no local, 20 minutos depois da emboscada, levou o Jaló para Bissau, juntamente com outros 3 dos feridos mais graves. Esteve 3 meses, com gesso, no Hospital de Bissau.

Quanto à sua condecoração, confirma-se. Na cerimónia do 10 de junho de 1970, em Bissau, foi condecorado com a medalha de cobre de Serviços Distintos com Palma. Em Agosto, seguinte, foi promovido a 2.º Sargento.

Outras clarificações:

O furriel Henrique Martins de Brito, evacuado para a Metrópole 8 dias depois da emboscada, não participou nesta coluna de reabastecimento. A sua evacuação terá derivado de doença.

O molho de palha (molho de "fundo", segundo o Jaló) que estava na estrada, após a curva, foi deixado por algum elemento da população, logo após ouvir a 1.ª detonação da emboscada. Não se tratou, por isso, de qualquer estratagema do PAIGC. Quando a coluna passou não estava lá.

Confirma o Augusto Jaló que não pararam para dar qualquer boleia o que, de todo, dissipa algumas dúvidas que ainda existiam sobre esta questão.

E revela ainda: na zona da emboscada, os guerrilheiros haviam colocado uma mina antcarro mas, à vista da coluna e à sua aproximação ao sítio da mina, os guerrilheiros anteciparam-se com uma roquetada. O condutor da 1.ª viatura (onde ia o Jaló), desviou-se ligeiramente para a direita e, por felicidade, contornou a mina, não a accionando. De contrário a tragédia teria sido ainda maior. 

O José Mamede ia do lado direito dessa 1.ª viatura (lado da emboscada e lado do Morés). Foi atingido e ainda encetou um movimento de refúgio para o lado esquerdo. Morreu a cerca de 15 metros da estrada. Foi aí que o seu conterrâneo e amigo António Oliveira (1.º cabo enf do HM241 de Bissau) o encontrou, após a descida do helicóptero que veio proceder à evacuação dos feridos de maior gravidade, entre eles o Jaló.

Confirma também o Augusto que uma secção do Pel Caç Nat  58 fez a picagem entre Infandre e Mansoa e que alguns dos elementos da coluna estiveram a comer na Casa do Simões e na Tasca da Emília de Sá. (Em 2007, o Simões era o gerente e proprietário de “O Painel – Restaurante Simões, Lda”, próximo da Curia.)

O Jaló, como responsável da coluna, não pôde deslocar-se a estes estabelecimentos, de visita costumada, por estar envolvido na orientação do reabastecimento.

Sobre os 5 militares que se protegeram atrás de um bagabaga, não sabe dizer quem eram, dado que estava muito ferido e foi, de seguida, evacuado para Bissau. O mesmo e pelas mesmas circunstâncias, quanto ao condutor que, à noite, apareceu em Mansoa, apenas acompanhado da sua G3.

Os militares mortos foram levados para Mansoa, onde estiveram na igreja local, para as habituais formalidades.

Outros testemunhos poderão, ainda, vir a ser obtidos, no sentido de chegar a um registo factual, tão exaustivo quanto possível, sobre este trágico acontecimento.


XIII. Agradecimentos

A todos os que, de alguma forma, contribuíram com as suas informações ou testemunhos, para que se pudesse encontrar a clarificação possível sobre esta trágica ocorrência.

Entre esses, permito-me destacar:
  • César Dias (fur mil sapador, CCS BCAÇ 2885, Mansoa, 1969/71):procedeu a um armadilhamento na zona Braia-Infandre (por estas alturas);
  • António Silva Gomes (fur mil, Pel Caç Nat 58,  Braia, 1970);
  • “Kimbas do Olossato” (onde coloquei esta 1.ª mensagem, em setembro de 2005, questionando se alguém poderia informar onde estaria sediado o Pel Caç Nat 58, em Outubro de 1970); página descontimuada: capturada pelo Arquivo.pt:  https://arquivo.pt/wayback/20140926210228/http://kimbas.no.sapo.pt/ ;
  • Benjamim Durães (fur mil, CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72); foi crucial para o seguimento da pesquisa; foi ele que, após ter visto a minha mensagem (de 2005) no sítio Kimbas do Olossato, se me dirigiu, em 18/3/2007, para me fornecer o guião do Pel Caç Nat 58;
  • Manuel João Mimoso Belo (1.º Cabo, Pel Caç Nat 58, Infandre, 1970);
  • Dinis Pinto Silva (1.º cabo, Pel Caç Nat 58, Infandre, 1970; depois da comissão: professor em Infandre);
  • Manuel Simões (Restaurante Simões dos Leitões – Tamengos (junto à Curia, Anadia), telefone 231202031);
  • Carlos Fortunato (Fur mil, CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71); criador do sítio  da CCAÇ 13: https://arquivo.pt/wayback/20140926233410/http://leoesnegros.com.sapo.pt/ ). Na página da CCAÇ 13, Leões Negros, existe uma subpágina dedicada a este tema, com o título Pel Caç Nat 58;
  •  Luís Graça (editor do maior Blog sobre a Guerra na Guiné: Luís Graça & Camaradas da Guiné;
  • Paulo Raposo (alf mil, CCAÇ 2405/BCAÇ 2852, Mansoa e Dulombi, 1968/70);
  • Joaquim Mexia Alves (alf mil, CART 3492,  Pel Caç Nat 52 e  CCAÇ 15, 1971/73);
  • Jorge Cabral;
  • Augusto Ali Jaló;
  • Eduardo Ribeiro (fur mil op esp / ranger, CCS/BCAÇ 4612; mais conhecido por Pira de Mansoa);
  • Artur Conceição;
  • Paulo Reis (Inglaterra) pcv_reis@yahoo.co.uk – jornalista em missão de pesquisa nos arquivos do CTIG);
  • Aniceto Henrique Afonso (na altura, ten cor, Director do Arquivo Histórico Militar (Exército), ahm@exercito.pt ;
  • António Oliveira (1.º Cabo Enfermeiro,  HM241 de Bissau); fez parte da equipa heli-transportada que procedeu à evacuação de alguns dos feridos, a partir do local da emboscada;
  • Lucília da Cruz Mamede (irmã do falecido José da Cruz Mamede), Mealhada.
Nenhuma pesquisa deste género poderá dar-se por finalizada enquanto subsistirem dúvidas, omissões, imprecisões ou desencontro de informações.

Pese embora toda a boa vontade, interesse e persuasão, como esforço investigativo, a exactidão, pela exaustão e cruzamento dos relatos, o fundamento dos conceitos ou a isenção, são factores determinantes que conduzem à autêntica realidade. Enquanto não se atingir esse patamar, teremos sempre e apenas relatos próximos ou tendentes a essa certeza, por onde, eventualmente, perpassam ainda algumas interrogações.

Vem a propósito referir que o Carlos Fortunato contava voltar a Infandre (provavelmente ainda no ano de 2007) e propunha-se encontrar alguém que tivesse estado envolvido nesta sinistra emboscada, que vitimou, praticamente, um pelotão. Não sabemos se o conseguiu fazer  esse papel de repórter, quase quarenta anos depois de haver calcado aquelas paragens, envergando a farda do exército português. Era sua intenção ir à procura de outros eventuais pormenores, testemunhos e justificações e trazer mais algumas imagens da realidade presente destas terras de Mansoa.

Fotos cedidas por gentileza de:
  • António Silva Gomes (Lisboa), ex-fur mil Pel Caç Nat 58;
  • Joaquim Carlos Fortunato (Lisboa), ex-fur mil, CCAÇ 13;
  • César V. Dias (Santiago do Cacém), ex-fur mil, CSS/BCAÇ 2885 (Mansoa);
  • Lucília Cruz Mamede  (Casal Comba – Mealhada), irmã do falecido José da Cruz Mamede
Com o meu especial agradecimento.

Fotos (e legendas) : © António S. Gomes, J.Carlos Fortunato, César Dias e Lucília Cruz Mamede, Afonso Sousa (2007). 
Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] 

(Revisão / fxação de texto, reedição das fotos: CV/LG)
______________

Notas de CV / LG:

(*) Vd. postes de 3 de Abril de 2007:


(**) Vd. poste de 7 de outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2162: O fatídico dia 12 de Outubro de 1970 - Emboscada no itinerário Braia/Infandre (Afonso M. F. Sousa)

Vd. também poste de 3 de maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2807: Estórias de Jorge Picado (1): A emboscada do Infandre vivida pelo CMDT da CCAÇ 2589 (Jorge Picado)

sábado, 14 de janeiro de 2023

Guiné 61/74 - P23982: Blogues da nossa blogosfera (171): Cerca de metade dos nossos "favoritos" de há uns anos atrás já não existem ou mudaram de URL



Guiné >Região do Oio > Morés > Op Jaguar Vermelho > 9/6/1970 >  Criança encontrada pelos "páras" no mato, os quais tomaram conta dela, dando-lhe pão, e uma "kalash" (para a foto). Pela foto devia ter uma idade semelhante ao que a CCAÇ 13 também encontrou noutra ocasião.


Guiné >Região do Oio > Morés > Operação Jaguar Vermelho > 9/6/1970 > Uma escola

Fotos de César Dias ex-furriel do BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71), as quais lhe foram dadas por um furriel dos paraquedistas sediados em Mansabá. Disponíveis em:


Fotos (e legendas): © Carlos Fortunato (2003). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Tínhamos uma lista de cento e poucos blogues e outras páginas na Net  (c. 110) que faziam parte da nossa blogosfera... e constavam / constam da coluna estática do nosso blogue, no lado esquerdo. Há anos que não era atualizada.   

Fomos hoje fazer uma verificação, dos nomes,  de A a C (n=54) , e metade dessas páginas já não existem, foram descontinuadas, mudaram de URL.  É o preço que se paga por uma existência virtual, que é sempre precária, dependente da boa vontade ou dos caprichos dos servidores... 

Os blogues e outras páginas que deixaram de estar "on line" vêm assinalados, em baixo, com um asterico (*). Nalguns casos têm novos endereços. Alguns destes "sítios" poderão ser recuperados através do Arquivo.pt , caso por exemplo da página da CCAÇ 13, Os Leões Negros, que estava alojada no Sapo... (O Serviço de Alojamento Gratuito de Páginas Pessoais do SAPO foi descontinuado em dezembro de 2012.)

Endereço antigo: 
 
http://leoesnegros.com.sapo.pt/index.html

URL recuperada (em 1 de julho de 2011): 

https://arquivo.pt/wayback/20110701044300/http://leoesnegros.com.sapo.pt/index.html


Blogues, páginas do Facebook e outros sítios da nossa Blogosfera (camaradas e amigos da Guiné) 

Variações da Perda (poesia, Companhia das Ilhas, 2020).
Há rios que não desaguam a jusante (romance, Companhia das Ilhas, 2018).
Na luz inclinada (poesia, Companhia das Ilhas, 2014).
Uma paisagem na Web (poesia, & etc, 2013).
Elegias de Cronos (poesia, Artefacto Edições, 2012).
O papel de prata, o reflexo e outros contos pelo meio (Companhia das Ilhas, 2012).
Pedro e Inês. Dolce Stil Nuovo (poesia, Edições Sempre-em-Pé, 2011).
K3 (poema, & etc, 2011).
Uma flor de chuva (poesia, Escola Portuguesa de Moçambique, Maputo, 2011).
Londres (poema, & etc, 2010).
Dispersão – Poesia reunida (Edições Sempre-em-Pé, 2008).

(Era um dos nossos interlocutores privilegiados na Guiné-Bissau ao tempo do Pepito, cofundador e diretor executivo desta ONG; nascido em Bissau, em 1949, morreu em Lisboa, por doença, em 2012: Carlos Schwarz da Silva era engenheiro agrónomo, formado pelo ISA - Instituto Superior de Agronomia, Lisboa; tem 245 referências no nosso blogue).

(Jornalista e viajante, o Jorge Rosmaninho esteve muito  ativo entre 2006 e 2009; perdemos-lhe o rasto)


(Novo endereço: http://www.ajudaamiga.com/)


(Novo endereço: https://fmsoaresbarroso.pt/)


(Tem um novo endereço: https://apoiar-stressdeguerra.com/pt/)

(Tem um novo endereço:  https://ahm-exercito.defesa.gov.pt/)

(Tem um novo endereço: https://ahu.dglab.gov.pt/)


(Novo endereço: 

https://a25abril.pt/



(Ativo desde meados de  2009)


(Ativo desde o início de 2008)

(Ativo desde 2009 a 2016)


(Ativo de 2003 a 2013)

(Tem agora uma página no Facebook: https://www.facebook.com/BoinasVerdesEParaQuedistas/ )

(Um dos blogues mais antigos, e dos mais belos, literariamente falando: ativo de 2003 a 2020; o Manuel Bastos esteve em Moçambique)

(Um dos nossos blogues mais antigos, centrado numa só subunidade)
(Uma unidade madeirense; blogue ativo desde 2009; um dos coeditores é o nosso Carlos Vinhal)

(Ativo desde 2008, continua a ser animado pelo nosso camarada Sousa de Castro)

(Deixou de estar disponível, com pena nossa; um dos "sites" mais antigos, datando de 2003 )

(Lá vai resistindo desde 2009, sob o comando do coimbrão Fernando Barata)

(Ativo desde 2008)

(Ativo desde 2008, sob o comando do Luís Dias)

(Novo endereço: https://www.cd25a.uc.pt/pt )


(Ativo de 2010 a 2012)

(Desde 2008, com o nosso MR, sempre!)

(Tem agora página no Facebook:

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Nota do editor:

Último poste da série> 18 de deembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23890: Blogues da nossa blogosfera (170): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (75): Palavras e poesia

quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23855: Recordando o Amadu Bailo Djaló (Bafatá, 1940 - Lisboa, 2015), um luso-guineense com duas pátrias amadas, um valoroso combatente, um homem sábio, um bom muçulmano - Parte XII: Emboscada no Oio, em dezembro de 1964, com o grupo "Fantasmas" reduzido a 12 comandos...

 

Guiné > Região do Oio > Mansoa > Cutia > Destacamento de Cutia > c. 1970 > Foto enviada  pelo César Dias, ex-fur mil sapador, CCS / BCAÇ 2885, um batalhão que esteve em Mansoa e Mansabá desde maio de 1969 a março de 1971, e a que pertencia a CCAÇ 2589, de que o Jorge Picado foi um dos comandantes, de  24/2/1970 a 15/2/1971. Estranhamente, Cutia não vem nas cartas nem de Mansoa nem de Farim. Ficava a nordeste de Mansoa, na estrada Mansoa-Mansabá.

Foto (e legenda): © César Dias (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Bogue Luís Graça & Camaradas da Guiné



1. Mais um excerto das memórias do nosso camarada Amadu Djaló (Bafatá, 1940- Lisboa, 2015), membro da nossa Tabanca Grande desde 2010, autor do livro "Guineense, Comando, Português" (Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp.).  

O Virgínio Briote, nosso coeditor jubilado (ex-alf mil, CCAV 489 / BCAV 490, Cuntima, jan-mai 1965,  e cmdt do Grupo de Comandos Diabólicos, set 1965 / set 1966) disponibilizou-nos o manuscrito,  em formato digital. 

Recorde-se que, durante cerca de um ano,  com infinita paciência,  generosidade, rigor e saber, ele exerceu as funções de "copydesk" (editor literário) do livro do Amadu Djaló, ajudando-o a reescrever o livro,  a partir dos seus rascunhos e da sua prodigiosa memória.


Quinta do Paul, Ortigosa, Monte Real, Leiria >
IV Encontro Nacional do nosso blogue >
20 de Junho de 2009... O VB e o Amadu.
Foto: LG (2010)
A edição de 2010, da Associação de Comandos, com o apoio da Comissão Portuguesa de História Militar, está infelizmente há muito esgotada. E não é previsível  que haja, em breve, uma segunda edição, revista e melhorada. Entretanto, muitos dos novos leitores do nosso blogue nunca tiveram a oportunidade de ler o livro, nem muito menos o privilégio de conhecer o autor, em vida. 

Recorde-se, aqui,  o último poste 
desta série (*):  O  Grupo de  Comandos "Fantasmas", da Companhia de Comandos do CTIG,  comandado pelo alf mil 'comando' Maurício Saraiva, nascido em Angola, sofre o seu primeiro grande revés,  a sudoeste  de Madina do Boé, na estrada para Contabane, junto a um pontão sobre o rio Gobige, quando uma coluna auto aciona uma mina anticarro, em 28 novembro de 1964. Irá perder 8 dos seus homens, ficando reduzida a 12 operacionais,


Capa do livro de Bailo Djaló (Bafatá, 1940- Lisboa, 2015), "Guineense, Comando, Português: I Volume: Comandos Africanos, 1964 - 1974", Lisboa, Associação de Comandos, 2010, 229 pp, + fotos, edição esgotada.





  Emboscada no Oio, em dezembro de 1964,  com o grupo "Fantasmas" reduzido a 12 comandos...

(pp. 105/108)

por Amadu Djaló (*)




Guiné > Região do Oio > Carta de Mansoa (1954)  / Escala 1/50 mil > Posição relativa de Cutia (a nordeste de Mansoa, já na carta de Farim), Morés, Iaron, Talicó e Santambato.

Infografia: Blogue Luís Grça & Camaradas da Guiné (2022)



Depois do descanso, no quartel, em Brá, fizemos uma reunião entre nós, como fazíamos habitualmente. No dia seguinte pegámos nas armas e fomos para a mata de Nhacra. Muitos tiros, depois regressámos a Brá e no dia seguinte, formámos o grupo com doze comandos. Tinha regressado de férias o Furriel Morais [1], agora o 2º comandante do grupo ["Os Fantasmas"].

Depois da mina de Gobige, em que tínhamos sofrido aquelas baixas todas, nós não estávamos muito animados. Mas o alferes  [mil 'comando'  Maurício] Saraiva não parou. Com 12 homens e um guia, de nome Mamasaliu Djaló, natural do Oio, preparámo-nos para sair.

De Brá arrancámos em viaturas com destino a Mansoa.

O batalhão [2] de Mansoa tinha preparado uma coluna que nos transportou até Cutia, de onde partimos a pé, Oio dentro, até Tambato.

Quando aqui chegámos, por volta do meio-dia [3]   [,  quarta-feira,  9 de Dezembro de 1964] , emboscámo-nos na tabanca abandonada, junto ao cruzamento do carreiro que vem de Talicó e de outro que vem de Santambato. Mantivemo-nos ali até ao pôr-do-sol, levantámos a emboscada e prosseguimos para Santambato, sempre no máximo silêncio. Chegados aqui, emboscámo-nos de novo, junto ao caminho que vem de Iaron, com o acampamento de Talicó à nossa direita e o de Sinre à nossa esquerda.

A missão devia durar três noites, progredindo em emboscadas sucessivas. A primeira em Santambato, perto de Cutia, a segunda em Iaron, e a terceira e última à entrada de Bissorã.

Durante a primeira noite não aconteceu nada. De manhã  [, quinta-feira,  9 de Dezembro de 1964], o alferes mandou levantar a emboscada. No caminho vimos umas bananeiras, mesmo junto à tabanca abandonada e espalhámo-nos por ali. Como o caminho passava mesmo encostado às bananeiras, passados para aí cinco minutos, ouvimos vozes de uma mulher a aproximar-se. Vinha acompanhada por um homem. A mulher trazia roupa lavada e o homem uma sangra [4] com galinhas.

O alferes disse-nos para ninguém disparar, que eram civis. Assim que chegaram junto de nós, o alferes disparou uma rajada curta para o ar, a mulher deixou cair a roupa e o homem largou a sangra com as galinhas. Eu disse que era melhor sairmos dali, o alferes queria avançar mas concordou comigo.

Regressámos para o local onde nos tínhamos emboscado durante a noite. Dispersou-nos dois a dois e eu, ele e o guia ficámos juntos. Neste local onde estávamos fazia muito frio. Pousei a minha arma no chão, para puxar para baixo as mangas da camisola e o alferes fez o mesmo. Quando me estava a arranjar, vi um homem com uma Mauser, muito perto de nós, a olhar para longe. Ninguém pensaria que, junto a estes pequenos arbustos estivesse alguém, mesmo ali à beira dele. Ele olhava para uma mata mais densa, junto ao rio.

Quando o vi, não deu tempo para falar. Peguei na arma, que era a do alferes, que estava em cima da minha, apontei, o alferes pegou na minha e também apontou. A três metros, à direita do homem estavam companheiros nossos deitados. Um deles, que estava tão perto que nem podia respirar, disparou um tiro. O homem nem mexeu um dedo. Saí do esconderijo e corri para lhe tirar a arma. Largámos a correr, até ao rio.

O alferes queria atravessá-lo através de uma árvore que servia de ponte, e eu achava que não se devia atravessar porque o PAIGC devia lá estar, era uma passagem quase obrigatória. Que era melhor seguirmos pela margem, ao longo do rio. Descemos todos para a água e passámos até à outra margem, com a água muito fria até à cintura. Depois de a atingirmos, encontrámos o caminho para Tambato e ouvimos tiros vindos do lado da ponte. Estavam ali à nossa espera, como eu pensara.

Agora daqui para Cutia, só com apoio aéreo, disse o alferes. Estabeleceu contacto rádio e a resposta foi que só podíamos ter apoio dos aviões à tarde, porque os T-6 estavam todos no sul. Na conversa com a Dornier, foi-nos perguntado se nós tínhamos alguns dos nossos para trás, porque do ar viam fumo de troca de tiros.

Nós não estávamos dispostos a ficar até à tarde, neste local. Pouco tempo depois, ouvi um berro de uma perdiz a levantar voo. O alferes perguntou o que era e eu respondi que podia ser alguém que andava por ali. Quando uma choca levanta voo a berrar é porque alguém está a passar perto. 

Saímos cautelosamente dali, sempre no caminho até Cutia, onde finalmente chegámos sem mais incidentes. Recolhidos em viaturas, fomos transportados para Bissau, com passagem por Mansoa, onde nem parámos.

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Notas do autor e/ou do editor literário (VB):

[1] Furriel Mil. Joaquim Carlos Ferreira Morais.

[2] Nota do editor: Batalhão de Artilharia 645

[3] Nota do editor: 9 de Dezembro de 1964

[4] Cesto com galinhas

[Seleção / Revisão e fixação de texto / Negritos / Parênteses retos com notas / Subtítulos: LG]

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