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segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22760: A nossa guerra em números (7): a carga da CCAÇ 1420 (Fulacunda e Bissorá, 1965/67), a transferir para a CART 1525 (Bissorã, 1966/67), era composta por 17 viaturas (2 camiões Mercedes, 4 Jipes e 11 Unimog), dos quais só estavam a funcionar um jipe e um Unimog.



José Gregório Gouveia, ex-fur mil enf, CART 1525, "Os Falcões", 
Bissorã, 1966/67. Madeirense, hoje advogado. Um testemunho 
precioso (e raro) sobre a carga de viaturas automóveis 
que se transferiam de companhia para companhia...



1. Em complemento do poste anterior da série (*), sobre a penúria de viaturas de transporte do pessoal militar, durante a guerra de África, e em particular na Guiné, publicamos um excerto do livro, de 202 páginas,  em pré-publicação "Guiné-Bissau: de colónia a independente", de José Gouveia, com a devida vénia ao autor e ao editor do sítio da CART 1525, "Os Falcões" (Bissorã, 1966/67), o nosso grã-tabanqueiro,o ex-alf mil Rogério Freire. 

O José Gregório Gouveia era, na altura, fur mil enf.  Natural da Calheta, Madeira, foi depois advogado, dirigente do PS -Madeira, deputado à Assembleia Legislativa Regional da Madeira, colaborador da imprensa regional. Autor do livro "Madeira - Tradições Autonomistas e Revolução dos Cravos" (2002).


De 17 viaturas, só duas estavam operacionais: 1 jipe e 1 Unimog 
(e este, mesmo assim, com o motor de arranque avariado!)



[Chegada à Guiné em 26 de janeiro de 1966, foi em Bissau que a CART 1525, "Os Falcões, , Bissorã, 1966/67,]
 recebeu a dotação de armamento: “E verificamos logo do seu grau de inoperacionalidade. Gastas, maltratadas. Cerca de 40% (!) estavam necessitadas de urgentes medidas de recuperação, que decorreram a nosso cargo, embora com o indispensável apoio dos Depósitos locais de Material de Guerra, em Bissau” [Coronel Piçarra Mourão - "Guiné Sempre! - Testemunho de uma Guerra. Coimbra, Quarteto Editira, 2001, pág.  ] 

Apesar daquelas condições, sempre era melhor ficar em Bissau! Só que foi calma de pouca dura porque, no dia 4 de Fevereiro, a Companhia marchou para Mansoa rendendo a CART 644 e integrando-se na história do BCAÇ 1857 que, no dia 1 de Fevereiro, tinha deixado Santa Luzia, fixando-se naquela localidade.

A colocação em Mansoa - parecia ser para durar, pois tivemos de receber todo o equipamento que fazia parte da carga da CART 644. Como furriel enfermeiro,  tive de contar e registar o material sanitário, peça por peça, medicamento a medicamento, que fazia parte da carga do «carro sanitário» (um atrelado) ou que estava avulso na enfermaria daquela Companhia. Foi um inventário moroso, feito com cuidado, não fosse faltar alguma peça da Carga que dava, seguramente, para montar um hospital de campanha. Recordo que o «carro sanitário» tinha um medicamento especial: conhaque em dois frascos de secção quadrada, sem vestígio de uso tal como teria sido atribuído à Carga. Do que a medicamentos dizia respeito, foram inventariados 262, todos diferentes.

Em Mansoa, para além do ritual burocrático na recepção da carga da companhia que
partia, a CART 1525 iniciava os treinos operacionais estabelecidos e dirigidos pelo Comando de Batalhão. Estávamos ainda na fase da inexperiência da realidade militar local, mas também reinavam as ordens superiores que determinavam um regime nómada e desmembramento à Companhia, pois no dia 6 daquele mês de Fevereiro, o 1º Grupo de Combate seguiu para Bissorã ficando adido, para todos os efeitos, à CCAÇ 1419. A restante parte da Companhia manteve-se em Mansoa, reforçando acções de outra Companhia também ali instalada, nomeadamente na segurança aos trabalhos de asfaltamento da estrada Mansoa-Mansabá, segurança ao «Abrigo de Braia», escoltas de colunas automóvel para Cutia e Encheia.

Mas, afinal, o destino da Companhia foi determinado por ordens superiores no sentido de substituir a CCAÇ 1420 
[ Fulacunda,  Bissorã, Mansoa, 1965/67,] que estava aquartelada em Bissorã. Sensivelmente um mês após a chegada a Bissau, a CART 1525, no dia 25 de Fevereiro, seguiu para Bissorã, onde se instalou e se manteve até ao fim da sua actividade operacional efectiva. Em Mansoa ficou uma equipa para entregar o material que, pouco tempo antes, tinha recebido.

Colocação em Bissorã - Terminada a fase nómada, a Companhia iria iniciar a sua actividade operacional e social no sector de Bissorã que abrangia uma grande extensão da região do OIO, onde o PAIGC tinha instalado a fortificada Base Central de Morés, na Zona Norte.

Quando refiro actividade operacional e social é porque, à parte das Operações de âmbito estritamente militar, a Companhia desenvolveu algumas acções de cariz social, em benefício da população da Vila de Bissorã, como adiante veremos.

As instalações que encontramos na nova residência não podiam ser melhores. Uma casa, coberta de telha, para os oficiais com messe própria. Duas casas, cobertas de zinco, para os furriéis e sargentos. Com um frigorífico que funcionava a petróleo – a Central termoeléctrica não funcionava vinte e quatro horas por dia, apenas à noite e pouco mais. O local das refeições funcionava na casa da D. Maria (um casal cabo-verdiano que, na vila de Bissorã, prestava o serviço a todas as Companhias aí aquarteladas quanto ao fornecimento de refeições à classe de sargentos - e que muito bem sabia assar leitão, servido com batatas fritas).

Dois armazéns, tipo colonial, cobertos de telha, serviam da caserna aos soldados. Para
servir o «rancho geral» foi necessário a Companhia construir instalações com toros de
madeira e cobertas de capim, pois não havia alternativa.

Novo inventário em Mansoa, outro em Bissorâ para que nada faltasse, sob pena de responder por qualquer falta quando houvesse nova passagem de testemunho a outra Companhia, o que poderia acontecer a qualquer momento. Mais um «carro sanitário» para inventariar e muitos medicamentos para contar.

Se no plano da saúde a Carga estava completa e devidamente ordenada, menos sorte teve o Furriel Adrião Mateus que encontrou a Carga respeitante aos automóveis num caos. Ainda hoje é difícil de esquecer que a Carga da CCAÇ 1420, a transferir para a CART 1525, era composta por 17 viaturas: 2 camiões Mercedes, 4 Jipes e 11 Unimogues.

O panorama do parque de viaturas mais parecia uma oficina sem mecânicos. Daquele conjunto de 17 automóveis apenas estavam a funcionar: 1 Jipe e 1 Unimogue (este
com o motor de arranque avariado). Os restantes automóveis estavam desmontados e
havia um bidão cheio de parafusos que pertenciam às viaturas desmontadas. O motor
de um camião Mercedes estava em Bissau, no Serviço de Material, para ser reparado.

Também havia um Jipe, a servir de galinheiro, que não fazia parte da carga e já não
tinha matrícula.



Guiné > Região do Oio > Bissorã > CART 1525 (1966/67) > O "milagre" do fur mil mec auto que ao fim de sete meses pòs a funcionar 15 viaturas inoperacionais...Na foto As viaturas já operacionais e os respetivos condutores auto...  Foto de José Gouveia (sem fata). Cortesia da página da CART 1525.



Refira-se que não houve milagre mas houve um grande trabalho da eficaz e competente equipa de mecânicos para ultrapassar tão grave estado das quinze viaturas inoperacionais. Uma após outra, ao fim de sete meses de árduo trabalho, estavam todas a funcionar em pleno. 

Em todas as deslocações a Bissau, o Adrião Mateus não deu descanso aos colegas que estavam colocados no Serviço de Material, no sentido de desbloquearem as peças necessárias à reparação de tanta viatura. Ou pela via da requisição normal, ou quando o Sargento de Dia estava a olhar para o lado contrário à Porta de Armas, o material saía daquele Serviço e, passadas algumas horas, chegava a Bissorã. O Adrião Mateus disse muitas vezes, e ainda hoje repete, que o material auto saía sempre legal. Porque saía do Estado (em Bissau) e entrava no Estado (em Bissorã). A não ser a sua persistência, como poderíamos fazer a guerra sem os meios adequados às necessidades logísticas do teatro de operações que não era fácil.

 (...) Com as viaturas operacionais, restava dar outra utilidade ao Jipe que servira de galinheiro. Também este foi reparado. Mas como não fazia parte da carga, nem tinha matrícula, ficou ao serviço da oficina da Companhia. Foi precisamente este Jipe que serviu para eu e outros colegas darmos os primeiros passos na condução, a fim de tiramos a Carta de Lista Branca, o que aconteceu no exame em Bissau. (...)

José Gouveia

 ________________

Nota do editor:

Último poste da série > 25 de novembro de  2021 > Guiné 61/74 - P22751: A nossa guerra em números (6): o bico-de-obra das viaturas de transporte...

sexta-feira, 2 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22336: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte VII


Foto 1 – Região de Badapal > Norte de Bula > 18Out1969, sábado. Assistência a feridos da CCAV 2487 (Bula; 1969/70), no decurso da «Operação Ostra Amarga». Fotograma seleccionado do vídeo, em francês "Guerre en Guinée" ("Guerra na Guiné", ORTF, Paris, 1969), disponível no portal do INA – Institut national de l'audiovisuel (13' 58") ou P18335, com a devida vénia.


Foto 2 – Sector L1 (Bambadinca) > O ex-alf mil med Joaquim António Pinheiro Vidal Saraiva (1936-2015), da CCS/BCAÇ 2852 (1968/70), prestando assistência médica à população do reordenamento de Nhabijões, maioritariamente de etnia balanta [e com "parentes no mato", tanto a norte do Cuor como ao longo da margem direita do rio Corubal, nos subsectores do Xime e do Xitole]. Foto do álbum de Arlindo T. Roda – P16251, com a devida vénia.


Foto 3 – Sector L1 (Bambadinca) > 08Fev1970, domingo. Assistência a ferido da CCAÇ 12, com helievacuação em Madina Colhido (Xime), no decurso da «Operação Boga Destemida». Foto do álbum de Arlindo T. Roda – P10726, com a devida vénia.






O nosso coeditor Jorge [Alves] Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior, ainda no ativo. Tem 290 referências no nosso blogue.

 

MEMÓRIAS CRUZADAS

NAS "MATAS" DA GUINÉ (1963-1974):

RELEMBRANDO OS QUE, POR MISSÃO, TINHAM DE CUIDAR DAS FERIDAS CORPOREAS PROVOCADAS PELA METRALHA DA GUERRA COLONIAL: «OS ENFERMEIROS»

OS CONTEXTOS DOS "FACTOS E FEITOS" EM CAMPANHA DOS VINTE E QUATRO CONDECORADOS DO EXÉRCITO COM "CRUZ DE GUERRA", DA ESPECIALIDADE "ENFERMAGEM"

PARTE VII

 


► Continuação do P22072 (VI) (06.04.21)

1. - INTRODUÇÃO

Visando contribuir para a reconstrução do puzzle da memória colectiva da «Guerra Colonial ou do Ultramar», em particular a da Guiné [CTIG], continuamos a partilhar no Fórum os resultados obtidos na investigação acima titulada. Procura-se valorizar, também, através deste estudo, o importante papel desempenhado pelos nossos camaradas da "saúde militar" (e igualmente no apoio a civis e população local) – médicos e enfermeiros/as – na nobre missão de socorrer todos os que deles necessitassem, quer em situação de combate, quer noutras ocasiões de menor risco de vida, mas sempre a merecerem atenção e cuidados especiais.

Considerando a dimensão global da presente investigação, esta teve de ser dividida em partes, onde procuramos descrever cada um dos contextos da "missão", analisando "factos e feitos" (os encontrados na literatura) dos seus actores directos "especialistas de enfermagem", que viram ser-lhes atribuída uma condecoração com «Cruz de Guerra», maioritariamente de 3.ª e 4.ª Classe. Para esse efeito, a principal fonte de informação/ consulta utilizada foi a documentação oficial do Estado-Maior do Exército, elaborada pela Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974).

2. - OS "CASOS" DO ESTUDO

De acordo com a coleta de dados da pesquisa, os "casos do estudo" totalizam vinte e quatro militares condecorados, no CTIG (1963/1974), com a «Cruz de Guerra» pertencentes aos «Serviços de Saúde Militar», três dos quais a «Título Póstumo», distinção justificada por "actos em combate", conforme consta no quadro nominal elaborado por ordem cronológica divulgado no primeiro fragmento – P21404.

Nesta sétima parte analisaremos mais dois "casos", ambos registados no ano de 1966, onde se recuperam mais algumas memórias dos seus respectivos contextos.
No quadro nominal abaixo, referem-se os "casos" que faltam contextualizar (n-10).



3. - OS CONTEXTOS DOS "FEITOS" EM CAMPANHA DOS MILITARES DO EXÉRCITO CONDECORADOS COM "CRUZ DE GUERRA", NO CTIG (1963-1974), DA ESPECIALIDADE DE "ENFERMAGEM" - (n=24)

3.13 - JOÃO DE JESUS SILVA, FURRIEL MILICIANO DO SERVIÇO DE SAÚDE, DA CCAÇ 1549, CONDECORADO COM A CRUZ DE GUERRA DE 3.ª CLASSE

A décima terceira ocorrência a merecer a atribuição de uma condecoração a um elemento dos «Serviços de Saúde» do Exército, esta com medalha de «Cruz de Guerra» de 3.ª Classe - a sexta das distinções contabilizadas no decurso do ano de 1966 - teve origem no desempenho tido pelo militar em título ao longo da sua comissão. Merecem, todavia, destaques, os comportamentos tidos na «Operação Queima», em 08 de Novembro de 1966, 3.ª feira, na região de Gã João / Gansene, onde foi ferido pelo IN, e na «Operação Nora», realizada na península da Pobreza, região de Tombali, entre 05 e 11 de Março de 1967 (infografia abaixo).

Histórico



◙ Fundamentos relevantes para a atribuição da Condecoração

▬ O.S. n.º 23, de 18 de Maio de 1967, do QG/CTIG:

"Manda o Governo da Republica Portuguesa, pelo Ministro do Exército, condecorar com a Cruz de Guerra de 3.ª Classe, ao abrigo dos artigos 9.º e 10.º do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, por serviços prestados em acções de combate na Província da Guiné Portuguesa, o Furriel Miliciano, do Serviço de Saúde, João de Deus Silva, da Companhia de Caçadores 1549 [CCAÇ 1549] - Batalhão de Caçadores 1888, Regimento de Infantaria n.º 1."

● Transcrição do louvor que originou a condecoração:


"Louvo o Furriel Miliciano do Serviço de Saúde (0145964), João de Jesus Silva, da CCAÇ 1549/BCAÇ 1888 – RI 1 e adida ao BART 1914, pela forma eficiente e dedicada como tem vindo a desempenhar as funções de enfermeiro. Tendo tomado parte em quase todas as operações realizadas pela Companhia, revelou ser dotado de grande coragem, sangue-frio, decisão e serena energia debaixo de fogo.

Em 08 de Novembro de 1966, 3.ª feira, durante a realização da «Operação Queima», tendo sido ferido pelo IN, juntamente com outros camaradas, manteve-se serenamente no seu posto, só promovendo a sua evacuação depois de ter prestado os primeiros socorros aos restantes feridos e dos fazer evacuar. Quando da realização da «Operação Nora» [06Mar67 (2.ª feira)], mais uma vez o Furriel Silva deu mostras de elevado espírito de sacrifício e vontade de bem servir de que é dotado, acompanhando as NT nas duas fases da operação, quando é certo que entre as duas, e enquanto o pessoal descansava e recuperava do esforço despendido, passou uma noite inteira de pé, ajudando o clínico presente a examinar o pessoal das Companhias empenhadas na operação.

De grande correcção e aprumo, muito disciplinado e cumpridor escrupuloso dos seus deveres militares, são estas qualidades que tornam o Furriel Silva merecedor desta pública forma de apreço e de a todos ser apontado como exemplo." (CECA; 5.º Vol.; Tomo IV, p 452).


◙► CONTEXTUALIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA

Para contextualização da última ocorrência, a «Operação Nora», socorremo-nos da narrativa do camarada Santos Oliveira (Como, Cufar e Tite; 1964/66), onde, no P2504 (04.02.2008), refere que (sic) "as acções do BCAÇ 1860 tiveram o seu clímax na «Operação Nora», realizada na Península de Pobreza, subsector de Empada, em que a par de importantíssima quantidade de material capturado – porventura a maior que se capturou [à data] na Província desde o início – se desarticulou completamente o dispositivo IN naquela área (infografia acima).

Por outro lado, e no que concerne à informação obtida na fonte Oficial (CECA), a explicação dada sobre a «Operação Nora» é muito reduzida, constando apenas que ela foi dividida por diferentes missões, nos dias 5, 6, 9 e 11Mar67, envolvendo forças da CCAÇ 1549, CCAÇ 1587, reforçada com 1 GC CªMIL 6, e CART 1614. No dia 06Mar67, 2.ª feira, foi efectuada uma batida à península de Pobreza, S1. Em Ingué, as NT capturaram diversos documentos e material, tendo o IN reagido pelo fogo. No decurso da acção este sofreu seis mortos, feridos em número não estimado e a captura de documentos e munições, além de volumoso material e do seguinte armamento: 1 canhão s/r 82 mm, 1 mort 82, 3 metr AA c/rodas, 4 mp 2 mi, 9 PM "PPSH", 7 PM "Uzi", 1 Lgfog "RPG-2", 3 carabinas "Mosin-Nagant", 2 esp "Mauser", 1 pist "Walter" e 1 pist de sinais.

■ A CART 1614 registou uma baixa – o fur mil Francisco Filipe dos Santos Encarnação, natural de Salvador, Concelho de Beja (CECA; 8.º Vol.; p 247).

3.13.1 - SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE CAÇADORES 1549

= TITE - FULACUNDA - ENXUDÉ - QUINHAMEL - ILONDÉ - BISSAU

Mobilizada pelo Regimento de Infantaria 1 [RI 1], da Amadora, para cumprir a sua missão ultramarina no CTIG, a Companhia de Caçadores 1549 [CCAÇ 1549], a primeira Unidade de Quadrícula do Batalhão de Caçadores 1888 [BCAÇ 1888; do TCor Inf Adriano Carlos de Aguiar], embarcou no Cais da Rocha, em Lisboa, em 20 de Abril de 1966, 4.ª feira, a bordo do N/M «UÍGE», sob o comando do Cap Mil Inf José Luís Adrião de Castro Brito, tendo chegado a Bissau a 26 do mesmo mês.

3.13.2 - SÍNTESE DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA CCAÇ 1549


Após a sua chegada a Bissau, seguiu directamente para Tite, a fim de substituir a CCAV 677 [13Mai64-26Abr66; do Cap Cav António Luís Monteiro da Graça (1925-2014)], como subunidade de intervenção e reserva do sector, com um Gr Comb destacado em Fulacunda, até 28Jun66, e outro em Enxudé, a partir de 30Mai66, ficando integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 1860 [23Ago65-15Abr67; do TCor Inf Francisco Manuel da Costa Almeida] e depois do BART 1914 [13Abr67-03Mar69; do TCor Art Artur Relva de Lima], tendo actuado em diversas operações efectuadas nas regiões de Fulacunda, Iusse, Nova Sintra e Flaque Cibe, entre outras.

Em 04Ago67, foi rendida pela CART 1743 [30Jul67-07Jun69; do Cap Mil Inf José de Jesus Costa] e seguiu para o sector de Bissau, onde assumiu a responsabilidade do subsector de Quinhamel, com um Gr Comb destacado em Ilondé, onde substituiu a CART 1647 [18Jan67-31Out68; do Cap Art Fernando Manuel Jacob Galriça], tendo ficado integrada no dispositivo do BART 1904 [18Jan67-31Out68; do TCor Art Fernando da Silva Branco], com vista à segurança e protecção das instalações e das populações da área.

Em 02Nov67, foi rendida no subsector de Quinhamel pela CCAÇ 1585 [04Ago66-09Mai68; do Cap Inf José Jerónimo da Silva Cravidão (1942-1967) (1.º) e Cap Mil Inf Vítor Brandão Pereira da Gama (2.º)] e foi colocada em Bissau, em substituição da CCAÇ 1498 [26Jan66-04Nov67; do Ten Inf Manuel Joaquim Fernandes Vaz], mantendo a mesma missão anterior. Em 16Jan68, foi substituída pela CCAÇ 2313 [15Jan68-23Nov69; do Cap Inf Carlos Alberto Oliveira Penin], a fim de efectuar o embarque de regresso, que teve lugar no dia seguinte a bordo do N/M «UÍGE» (CECA; 7.º Vol.; p 86).

3.14 - DOMINGOS PEREIRA BARBOSA, 1.º CABO AUXILIAR DE ENFERMEIRO, DA CART 1525, CONDECORADO COM A CRUZ DE GUERRA DE 4.ª CLASSE

A décima quarta ocorrência a merecer a atribuição de uma condecoração a um elemento dos «Serviços de Saúde» do Exército, esta com medalha de «Cruz de Guerra» de 4.ª Classe - a sétima das distinções contabilizadas no decurso do ano de 1966 - teve origem no desempenho tido pelo militar em título, ao socorrer os camaradas da sua unidade feridos durante o forte contacto havido com o IN, no decurso da «Operação Bissilão» realizada em 05 de Dezembro de 1966, 2.ª feira, na região de Biambe (infografia abaixo).

► Histórico




◙ Fundamentos relevantes para a atribuição da Condecoração

▬ O.S. n.º 08, de 16 Fevereiro de 1967, do QG/CTIG:

"Agraciado com a Cruz de Guerra de 4.ª Classe, nos termos do artigo 12.º do Regulamento da Medalha Militar, promulgado pelo Decreto n.º 35667, de 28 de Maio de 1946, por despacho do Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, de 01 de Março de 1967: O 1.º Cabo n.º 5493065, Domingos Pereira Barbosa, da Companhia de Artilharia 1525 [CART 1525] – Batalhão de Cavalaria 790, Regimento de Artilharia da Costa.

● Transcrição do louvor que originou a condecoração:

"Louvado o 1.º Cabo auxiliar de enfermeiro, n.º 5493065, Domingos Pereira Barbosa, da CART 1525, por ter desenvolvido no exercício das suas funções, quer internamente, quer em operações, uma actividade notável, e na qual colocou sempre a sua melhor boa vontade, carinho e esforço pessoal, nunca olhando a sacrifícios e sempre pronto a cumprir da melhor forma a missão de que está incumbido.

No decorrer da «Operação Bissilão», na qual, em face do forte contacto havido com o IN, as NT sofreram em pouco tempo várias baixas, o 1.º Cabo Barbosa, sendo o único elemento do Serviço de Saúde presente no local, quando o contacto inimigo se fazia sentir com violência, começou imediatamente a tratar dos seus camaradas feridos. Fazendo alarde de uma coragem e serenidade fora do vulgar, não o impressionou, nem o fogo IN, nem o grande número de feridos a tratar, e numa entrega total e admirável à sua tarefa, alheou-se do perigo que o cercava, e dando provas de uma abnegação, coragem, calma e desprezo pelo perigo invulgares, acorria para junto dos mais necessitados, não se importando com a sua segurança pessoal, ao deslocar-se debaixo de fogo In, a descoberto, e com o único intuito de chegar o mais breve possível junto dos camaradas que dele necessitavam.

Quer pelo seu procedimento anterior, com o qual granjeou as simpatias gerais, pelo modo correcto e sempre pronto como desempenhou as suas funções, quer agora, por esta sua acção de combate, na qual deu bastas provas de coragem, valentia e desprezo pelo perigo, merece o 1.º Cabo Barbosa, ser apontado a todos os seus camaradas como exemplo valoroso e dedicação ao serviço." (CECA; 5.º Vol.; Tomo IV, pp 234-235).

◙► CONTEXTUALIZAÇÃO DA OCORRÊNCIA


Para a elaboração deste ponto, procedemos à respectiva investigação utilizando, como habitualmente, a fonte Oficial (CECA), mas desta vez sem sucesso. De facto, nada foi encontrado. Mas, na busca de outras fontes, tivemos a "sorte" de ter acesso ao livro da Unidade do agraciado – CART 1525 - "HISTORIAL" – da qual retirámos os factos relacionados com o desenrolar da «Operação Bissilão», realizada em 05 de Dezembro de 1966, 2.ª feira, na Região de Biambe.

O principal objectivo da «Operação Bissilão» era realizar um golpe de mão a uma tabanca (base) IN, situada na região de Chumbume, a norte de Biambe, onde existia um morteiro 82, uma arrecadação de material e respectiva farmácia.

Foram escaladas para esta missão as seguintes forças: CART 1525; Gr Comandos "Os Falcões", 1 Pel Milícia 157 e 2 secções de Pol Adm., com apoio aéreo.


▬ DESENROLAR DA ACÇÃO:

● Eram 23h00 do dia 04Dez66 quando as NT saíram de Bissorã, tendo seguido pela estrada de Naga até à tabanca de Nhaé, onde deixaram a estrada e tomaram o caminho do mato. Depois de cambar a bolanha de Chumbume, cerca das 02h00 de 05Dez66, iniciou-se a aproximação do objectivo com o máximo cuidado.

Às 05h00 foi resolvido pôr em prática o plano: os elementos da polícia iriam flagelar a base com esp e granadas de mão, obrigando o IN a revelar-se da tabanca com o Mort 82. As outras forças cercariam a tabanca e, logo que o mesmo se revelasse, fariam o golpe-de-mão. Quando as forças assim divididas seguiam ao seu objectivo, próximo da referida tabanca a sentinela deu várias rajadas de PM e lançou uma granada de mão. Eram 05h30. Sendo então detectados, o êxito ficou comprometido. Mesmo assim, aguardou-se o ataque à base. Na tabanca o IN não se revelou. Nesta situação lançou-se o assalto à mesma, ao qual houve inicialmente fraca resistência acabando por cessar. Quando se atingiram as primeiras moranças, começou uma flagelação de Mort 82, proveniente de SE e regulada sobre a mesma tabanca. Destruída a mesma ainda sob a flagelação, as NT seguiram na direcção do Mort. Entretanto, de Sul começou outra flagelação de PM, a curta distância. 

Foi então que uma das granadas veio a cair no meio das NT, ocasionando inúmeros feridos e inutilizando o nosso apontador de LGFog e a sua arma. Imediatamente a seguir e quando o pessoal ainda se encontrava desorientado pelo rebentamento e consequências da mesma granada, foi disparado de W e a uma distância aproximada de 100 metros um rocket que causou imediatamente dois mortos e bastantes feridos, na maioria graves. A reacção não se fez esperar e, embora com o LGFog inutilizado, conseguiram as NT pôr o IN em debandada, criando condições de segurança no local onde se encontravam as nossas baixas. Uma rápida análise da situação constatou-se a morte de dois elementos, ferimentos graves num comandante de secção, que veio a falecer, e no comandante da milícia, além de outro pessoal gravemente ferido e outros de menor gravidade, entre os quais o comandante da Companhia (Cap Art Jorge Manuel Piçarra Mourão).

Feito um esforço tendente a melhorar a situação e a moralizar os mais abatidos, montou-se uma segurança ao local e aguardou-se a chegada do PCV, ao qual foi imediatamente pedido evacuações, remuniciamento e apoio dos bombardeiros. Os helicópteros fizeram cinco viagens e, embora o IN tivesse o seu Mort 82 regulado para a zona, não se manifestou. Presume-se que os mesmos estivessem instalados em Bula 8 H5/92 O movimento de regresso, com o apoio dos bombardeiros, processou-se para E, atingindo a estrada de Biambe sem mais incidentes, Recolhidas em viaturas, as NT chegaram ao aquartelamento cerca das 10h30 (Op cit.; pp 52-53).

A CART 1525 registou as seguintes três baixas: (CECA; 8.º Vol.; p 220)

■ Furriel Mil Alim Armindo Vieira Veloso, natural de Requião (Vila Nova de Famalicão)

■ 1.º Cabo Acácio Pestana Rafael, natural de Aljustrel (Aljustrel)

■ 1.º Cabo José António Silva Craveiro, natural de Freiria dos Chapéus (Torres Vedras)


3.14.1 - SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE ARTILHARIA 1525

= MANSOA - BISSORÃ - PONTE MAQUÉ

Mobilizada pelo Regimento de Artilharia de Costa [RAC], de Oeiras, para cumprir a sua missão ultramarina no CTIG, a Companhia de Artilharia 1525 [CART 1525], embarcou no Cais da Rocha do Conde de Óbidos, em Lisboa, em 20 de Janeiro de 1966, 5.ª feira, a bordo do N/M «UÍGE», sob o comando do Cap Art Jorge Manuel Piçarra Mourão (1942-2004), tendo chegado a Bissau a 26 do mesmo mês.

3.14.2 - SÍNTESE DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA CART 1525

Dez dias após a sua chegada a Bissau, a CART 1525 seguiu para Mansoa, a fim de efectuar um curto período de adaptação operacional e substituir a CART 644 [10Mar64-09Fev66; do Cap Art Vítor Manuel da Ponte da Silva Marques (-2004) (1.º), Cap Art Nuno José Varela Rubim (2.º), na função de reserva e intervenção do sector do BCAÇ 1857 [06Ago65-03Mai67; do TCor Inf José Manuel Ferreira de Lemos]. Em 21Fev66, por rotação com a CCAÇ 1420 [06Ago65-03Mai67; do Cap Inf Manuel dos Santos Caria], foi transferida para o subsector de Bissorã, em reforço da guarnição local até 31Out66, tendo ainda actuado em diversas operações realizadas nas regiões do Tiligi, Biambe, Morés e Queré e sendo também deslocada para operações na região de Jugudul, de 23Jul66 a 17Ago66; de 18Jun66 a 06Jul66, destacou, ainda, um pelotão para Ponte Maqué. Em 31Out66, assumiu a responsabilidade do subsector de Bissorã, após saída da CCAÇ 1419 [06Ago65-03Mai67; do Cap Mil Inf António dos Santos Alexandre], tendo passado a integrar o dispositivo e manobra do BCAV 790 [28Abr65-08Fev67; do TCor Cav Henrique Alves Calado (1920-2001)], após reformulação dos limites da zona de acção dos sectores daquela área em 01Nov66, e depois do BCAÇ 1876 [26Jan66-04Nov67; do TCor Inf Jacinto António Frade Júnior]. Pelos vultuosos resultados obtidos em baixas causadas ao inimigo e armamento apreendido, destacam-se as operações: «Embuste» [01Out66] e «Bambúrrio» [03Abr67], nas regiões de Iarom e Faja. Em 10Out67, foi rendida no subsector de Bissorã pela CCAV 1650 [06Fev67-19Nov68; do Cap Cav José Cândido de Bonnefon de Paula Santos], recolhendo seguidamente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso, o qual ocorreu em 04 de Novembro de 1967, sábado, a bordo do N/M «UÍGE». (CECA; 7.º Vol.; p 446).
Continua…

► Fontes consultadas:

Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 5.º Volume; Condecorações Militares Atribuídas; Tomo II; Cruz de Guerra, 1962-1965; Lisboa (1991).

Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª Edição; Lisboa (2014)

Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 7.º Volume; Fichas das Unidades; Tomo II; Guiné; 1.ª edição; Lisboa (2002).

Ø Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II; Guiné; Livro 1; 1.ª edição, Lisboa (2001).

Ø Outras: as referidas em cada caso.

Termino agradecendo a atenção dispensada.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

07MAI2021
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Nota do editor:

Último poste da série > 6 de abril de  2021 > Guiné 61/74 - P22072: Memórias cruzadas: relembrando os 24 enfermeiros do exército condecorados com Cruz de Guerra no CTIG (Jorge Araújo) - Parte VI

quarta-feira, 3 de março de 2021

Guiné 61/74 - P21964: Mi querido blog, por qué no te callas?! (5): O que irá acontecer aos nossos blogues e demais sítios na Net quando, pela ordem natural das coisas, formos transferidos para o Batalhão Celestial? Considerações sobre o futuro (Rogério Freire, fundador e editor do sítio CART 1525 - Os Falcões)


Um dos sítios sobre a  mais antigos na Net, sobre as nossas "guerras",  a página da CART 1525, "Os Falcões", Bissorã, 1966/67. O seu fundador e editor principal, Rogério Freire, é também um dos membros da primeira hora da nossa Tabanca Grande (*)


1. Mensagem de nosso camarada Rogério Freire  [ex-Alf Mil da CART 1525, Bissorã, 1966/67; fundador e editor principal do sítio sobre a CART 1525, "Os Falcões"]

Data - 09/02/2021, 20:02
Assunto - Considerações sobre o futuro

Caros Camarigos da Tabanca Grande:

Vou regularmente lendo as notícias da Tabanca Grande através do Facebook e quando o assunto me desperta uma maior atenção visito o vosso/nosso blogue.

Aproveito, uma vez mais, para vos felicitar pelo continuado e importante trabalho desenvolvido pela Tabanca Grande, em prol da nossa história que, temo venha a ser naturalmente esquecida e arquivada no passado assim que formos sendo mobilizados e transferidos para o Batalhão Celestial.

E esta é a razão principal do meu contacto de hoje ... que futuro se pode prever para toda a informação sobre a campanha da Guiné (e outras) atualmente disponíveis na Internet? 

 O que vai acontecer assim que não houver quem atualize os sites e os blogues, quem pague os domínios e os alojamentos dos sites?

Com toda a vontade que possa existir naqueles que, como vós, têm mantido e se se dispõem a manter viva a história da nossa epopeia é, com um prognóstico extremamente otimista, de prever que, dentro de 20 a 25 anos nenhum destes site e blogues continuem disponíveis na Internet. 

E ... o que podemos fazer para proteger esta informação?

Segue a minha ideia e sugestão:

1) Conseguir através das Forças Armadas e/ou do Ministério da Defesa a disponibilidade de um espaço num nos seus servidores dedicado ao alojamento de todos sites e blogues congéneres atualmente existentes que demonstrem interesse e se candidatem ao referido alojamento;

2) Conseguir (se necessário) através da entidade nacional responsável pela aprovação e registo dos domínios a criação de uma classe de "domínios perpétuos" que só poderiam ficar alojados nos servidores do Estado.

Claro que a sugestão engloba todas as frentes de combate, todas as armas, e em todas as épocas.

Creio que a Tabanca Grande já tem força suficiente para poder pensar neste assunto bem como deverá ter (penso eu) contactos a vários níveis com poder, interesse e capacidade de envolvimento nesta operação. Assim haja interesse.

Aqui fica a reflexão.

Caros camaradas e amigos, recebam um forte e sincero abraço do

Rogério Freire
 

2. Comentário do editor LG: 

Meu caro Rogério:

Já te devia ter respondido, a agradecer o teu empenho e preocupação. Mas só agora publico o teu valiosíssimo contributo sobre um tema que nos preocupa, e já não é só de agora.  Espero que surjam outros contributos,  para este inadiável debate. Um dia o nosso blogue vai mesmo... "calar-se"! 

Os nossos sítios (e são muitos)  têm o mesmo problema... de sobrevivência, como tu bem enfatisas. Os coeditores do Blogue Luís Graça & Canaradas da Guiné são um pouco mais novos do que o fundador e editor, mas tudo já está na casa dos setenta... 

Pela minha parte, posso contar com o apoio do meu filho para pagar a avença anual ao Blogger, se um dia destes bater as botas... ou ficar incapacitado. Mas vamos ser um pouco mais otimistas...  Como eu gosto de dizer, e é válido para mim e para ti, para nós, que merecermos ficar por cá mais uns aninhos: até aos 100, é sempre em frente, só é preciso é ter cuidado com as minas e armadilhas na picada... E começam, infelizmente,  a ser muitas!...

Mas concordo inteiramente contigo e com a tua ideia: temos que encontrar um sugestão "institucional", duradora, que pode passar pelo Ministério da Defesa ou pela Universidade, de modo a garantir que as nossas memórias da guerra do ultramar / guerra colonial (mas também das outras guerras, do tempo dos nossos pais e avós: II e I Guerra Mundiais) possam continuar a ser lidas e divulgadas  pelos nossos filhos, netos e bisnetos... O mesmo é dizer, continuem a ser fonte de informação e conhecimento para as gerações vindouras, e não só de Portugal, como dos demais países e comunidades da lusofonia.

Obrigado também pela tua autorização em relação ao meu pedido para poder reeditar aqui alguns  materiais da tua/vossa página que tanto acarinhas. Há "periquitos" que não a conhecem... Era uma boa altura também para chamar a atenção para um grande "site",  pioneiro, como o teu/vosso...  

Um abraço fraterno, 
Luís Graça (**)
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Notas do editor:

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17856: (De) Caras (96): os três antigos bravos comandantes de pelotão da Companhia de Milícias nº 17, de apelido Camará, o Quebá, o Sitafá e o Bacai, recordados no memorial aos mortos da CART 1525, Bissorã, 1966/67 (Rogério Freire / Adrião Mateus)


Foto nº 1 B


Foto nº 1 A



Foto nº 1 

Guiné > Região do Óio > Bissorã > CART 1525 > Galeria de Fotos >   "Os três Comandantes dos Pelotões de Milícia de Bissorã: Bacai Camará,  alferes de 2ª Linha Quebá Camará e Sitafá Camará  [, junto a armamento capturado ao inimigo em 3 de fevereiro de 1967 em Conjogude]


Foto (e legenda) : © Adrião Mateus  (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].(Cortesia do sítio da CART 1525 > Galeria de Fotos, de que é administrador o nosso grã-tabanqueiro Rogério Freire)



1. Comentário do nosso camarada Rogério Freire (ex-alf mil, MA, CART 1525, "Os Falcõe", Bissorã, 1966/67) ao poste P17853 (*):

(...) O Quebá e o Citafá Camará eram comandantes de pelotão da milícia. Eram irmãos e ambos foram promovidos a alferes [de 2ª linha] durante a nossa Comissão. O Quebá veio com um prémio a Portugal.

O Quebá foi ferido com gravidade em combate por duas vezes durante a nossa comissão: a primeira em 5 de dezembro de 1966 na Operação Bissilão, ao Biambi; e e na segunda vez em 9 de junho de 1967 na Operação Bizarma, ao Tiligi.

Foram dois heróis a quem entregávamos as nossas vidas quando íamos para o mato ...e foram muitos milhares de portugueses que, ao longo do tempo em que eles estiveram ao serviço das NT, a eles se entregavam durante a noite pelas bolanhas fora a caminho do objetivo.

Triste ... Triste mesmo é que eu li no Diário de Notícias uns meses depois da saída das NT da Guiné (1974 ou 1975) que, tanto o Quebá como o Citafá, tinham sido fuzilados pelo PAIGC ... abandonados à sua sorte pela forma infeliz com que a descolonização foi efectuada.

Caro amigo ... sugiro uma visita ao nosso Historial (não sei se haverá outros documentos tão completos disponíveis na Internet) publicado no nosso site em www.cart1525.com. Lá encontrarás muita informação. Páginas 109/110 nº 4 - Valorização das Forças Nativas.

Quanto ao [José] Ramos ...

Pág. 35/36 do Historial: 7. Operação FURÃO II, QUERÉ, 21MAI66

RESULTADOS 
Memorial da CART 1525,
em Bissorã (*)

- Foram feitos 10 mortos confirmados ao IN, entre os quais se conta um natural de São Tomé, José Ramos, responsável pela base de BANCOLENE, o qual foi trazido para Bissorã. (...) (**)

2. Informação adicional que encontramos na legenda da foto nº 0015, do Adrião Mateus (ex-fur mil mec auto), publicada em CART 1525 > Galeria de Fotos:


(...) "Os 3 Comandantes dos Pelotões de Milícia de Bissorã: Bacai Camará,  alferes de 2ª Linha Quebá Camará e Sitafá Camará.

"Os dois últimos foram premiados com o prémio 'Governador da Guiné' por terem prestado serviços de extraordinária valia às nossas tropas, com exceptional valor e coragem com brilhantes actuações em combate, reveladores da sua alta determinação e patriotismo. Foram condecorados e vieram a Portugal em inícios de 1968 conhecer a capital da que consideravam a sua Pátria.

"Depois do 25 de Abril estes valorosos militares portugueses que consideravam Portugal a sua Pátria foram abandonados pelo governo português e foram assassinados pelas tropas do PAIGC, durante a governação do Presidente da Guiné Bissau Luís Cabral, sem qualquer julgamento ou meio de defesa, perante um pelotão de fuzilamento Cremos que os seus restos mortais foram depositados numa vala comum em Mansoa". (..)


3. Excerto do Historial da CART 1525, pág. 109/110 (com a devia vénia):

(...) VALORIZAÇÃO DAS FORÇAS  NATIVAS

(...) Aquando da nossa chegada a esta vila, viemos encontrar dois pelotões da Companhia de Milícia nº 17 e uma Companhia de Polícia Administrativa, constituída a 4 pelotões. A actividade destas forças era bem diversa e, assim, enquanto que a Milícia era empenhada em operações, encabeçando as colunas, à Polícia Administrativa era atribuído um papel secundário, saindo para o mato apenas integrada em colunas-auto, para colaborar nas picagens de estrada.

Dependia a Milícia da CCAÇ 1419, para todos os efeitos, ao passo que a Polícia Administrativa, como o nome indica, disciplinar e administrativamente estava subordinada à Administração, podendo contudo dispor-se dela operacionalmente, sempre que as circunstâncias o exigissem. Assim, desde a chegada da nossa CART até cerca do 10º mês de comissão, altura em que a CCAÇ  1419 foi para Mansabá, apenas podia haver um conhecimento relativo da verdadeira situação dessas forças nativas e das dificuldades ou problemas que poderiam ter.

Passou então o comando militar de Bissorã para a CART 1525 e, consequentemente, a dependência das referidas forças. A constituição das mesmas não foi alterada, não só por que vinha do antecedente, mas também porque, salvo algumas e poucas excepções, se provou que estava correcta. A Milícia continuou assim com Quebá Camará, no comando do pelotão nº 157 e Bacai Camará comandando o nº 158, estando a cargo de Citafá Camará e Landim Camará as funções de guias e informadores da NT.

(...) Mas, à medida que o tempo foi decorrendo, começaram a surgir outros problemas, da mais variada ordem. Estes, uma vez apresentados ao Comandante da CART 1525, mereceram sempre a melhor atenção e respeito, tentando dar-lhe a devida solução, dentro das suas possibilidades.

Os guias Citafá Camará e Landim Camará acusavam o peso dos anos e não podiam manter o mesmo ritmo em que até aí tinham sido utilizados e a Milícia, a começar nos seus comandantes, não tinha ainda visto premiado o seu valor, quer individual, quer colectivamente.

As numerosas operações que se seguiram reforçaram mais profundamente, no Comandante da CART [1525], o real mérito que as forças nativas possuíam e do qual já se tinha algum conhecimento. Com base nos relatórios dessas operaçõe surgiram as primeiras citações e o primeiro objectivo foi conseguido,  a promoção a alferes de 2ª linha de Quebá Camará e de Citafá Camará, na realidade, dentre todos, os mais merecedores, por tantos e tão relevantes serviços prestados. 

Estas duas promoções, que há muito haviam sido prometidas, mas sem que efectivamente se concretizassem, causaram natural júbilo, não só aos galardoados, mas também aos seus subordinados e à maioria da população nativa que muito os estima. 

Posteriormente foi ainda proposto, também para ser promovido a alferes de 2ª linha, o outro comandante de pelotão de Milícia, Bacai Camará. Seguiram-se propostas de Cruzes de Guerra para dois comandantes de secção de Milícia, Bacar Camará e Bajeba Jana e para o comandante de pelotão de Polícia Administrativa, Pedro Sambajuma. A culminar foram ainda propostas para o Prémio do Governador da Guiné,  deslocação à Metrópole os já referidos Quebá Camará e Citafá Camará.

 (...) Não foram, contudo, descurados outros problemas que se nos apresentavam, pelo que surgiram bastantes oportunidades de se ajudarem os elementos das forças nativas, conseguindo-se coberturas de zinco para as casas de alguns deles, emprestando-lhes dinheiro e arranjando-lhes alguns géneros alimentícios, nas alturas mais difíceis. Os processos para a concessão de subsídios aos feridos e incapacitados seguiram o seu curso normal, aguardando apenas o deferimento superior e aos mortos a nossa homenagem foi prestada com a inscrição do seu nome no monumento de reconhecimento a Bissorã, por nós erigido.

Quando se abandonou Bissorã e para mostrar o nosso incontestável reconhecimento e apreço pelas forças da Milícia local, foi por nós elaborada [uma] proposta de louvor que, mais tarde, veio a ser considerada pelos Comandos Superiores" (...)
____________



(**)  Último poste da série > 15 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17770: (De) Caras (97): O AVC na primeira pessoa e o processo de recuperação e reintegração (José Saúde)

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17853: Fotos à procura de... uma legenda (93): O monumento aos mortos em combate, erigido em Bissorã pela CART 1525, "Os Falcões"... Metamorfoses: 1966, 2011 e 2017




Foto nº 1 > Guiné > Região do Óio > Bissorã > CART 1525 (1966/68) > "Monumento erigido em  homenagem aos mortos em combate. Inaugurado no dia 26 de fevereiro de 1967, data do 1º aniversário da chegada da CART 1525 a Bissorã. Trabalho de autoria e execução, da parte de escultura, do 1º cabo radiotelegrafista José Hilário da Silva Portela, com a colaboração de outros militares da Companhia. Foto de Adrião Mateus, ex-fur mil da CART 1525."

Foto (e legenda):  página da  CART 1525 > Galeria de Fotos [com a devida vénia...] [editada pelo Blogue Luís Graça &  Camaradas da Guiné]



Foto nº 2  >  Guiné-Bissau > Região do Óio > Bissorã > "Monumento erigido em  homenagem aos mortos em combate, pela CART  1525 (Bissorã, 1966/68)



Foto nº 3  > Guiné-Bissau > Região do Óio > Bissorã > "Monumento erigido em  homenagem aos mortos em combate, pela CART 1525 (Bissorã, 1966/68)


Foto nº 3A

Guiné-Bissau > Região do Óio > Bissorã > 2011 >  O mesmo monumento, 44 anos depois... Foto tirada pelo José Gomes, da ONG Ajuda Amiga, na sua visita à Guiné-Bissau em fevereiro de 2011.

Legenda: "Homenagem aos que tombaram: Furriel [Armindo Vieira] Veloso;  1º Cabo [Acácio P. ] Rafael; 1º Cabo [José A. da S. ] Craveiro;  Pol Adm [Polícia Administrativa]  Paulo Gomes; Milícia Aia Mané; Milícia "Chico" [Mamadu] Seidi ; Mílicia Braima Duca [?]; Milícia Seni Camará."

Foto (e legenda):  página da  CART 1525 > Galeria de Fotos [com a devida vénia...][com a devida vénia...] [editada pelo Blogue Luís Graça &  Camaradas da Guiné]


Foto nº 4 


Foto nº 4A


Foto nº 4B


Foto nº 4C

Guiné-Bissau > Região do Óio > Bissorã > 2017 > 3 de abril de 2017 > "O colega Vitorino e um elemento da Administração local, junto a memorial que recorda a presença por aquelas paragens da Companhia de Artilharia 1525 (CART 1525)" (*)

Na lápide, parcialmente tapada, pode ler-se: "Homenagen aos guineenses Queba Camará, Citafá [ou Santifá ?] Camará, Bacai [?] Camará, que combateram do lado exército português por uma Guiné portuguesa; ao cabo-verdiano do PAIGC [?] Ramos, morto em combate pela [...]"

Foto (e legenda): © A. Acílio Azevedo (20017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1.  É apropriado falar de "metamorfoses" a propósito deste monumento que, passados estes anos todos, ainda lá está, "de pedra e cal", embora quase engolido pelas moranças que cresceram como cogumelos... 

Foi erigido em 26/2/1966 pela malta da CART 1525, em reconhecimento à vila de Bissorã e em homenagem aos mortos da companhia e subunidades adidas (Foto nº 1) Tinha a forma de uma pirâmide, encimada pelo brasão dos "Falcões" e da sua divisão "Mais Forte, Mais Alto"...
Tinha uma bela envolvente exterior, situando-se, como se presume, dentro do perímetro do quartel. Em 2011, com a expansão da povoação, o monumento ficou "emparedado"... E a sua cor original desapareceu...

Em 2017, aparece com um outro aspeto exterior: alguém o pintou com as cores (vermelho, verde e amarelo) da bandeira da Guiné-Bissau e acrescentou-lhe uma "lápide", que nos parece ser de mármore  (Foto nº 4).

2. Pode-se falar de "canibalização" ou de simples reaproveitamento do monumento ? Terá sido uma iniciativa da adminstração local, homenageando (i) 3 antigos combatentes, muito provavelmene naturais do concelho de Bissorã, que morreram sob a bandeira do exército português;  e, ao mesmo tempo, o que não é normal, (ii) um combatente cabo-verdiano do PAIGC, de apelido Ramos, igualmente morto em combate ?...

Quem seria este Ramos, e qual a sua ligação a Bissorã ?  E quem foram exatamente estes combatentes do exército português, guineenses, de apelido Camará ? No caso do combatente do PAIGC, não nos ocorre à memória nenhum dirigente ou militante conhecido, de apelido Ramos, para além dos irmãos Domingos e Pedro Ramos, mas esses não eram cabo-verdianos, tanto quanto sei...

Talvez algum dos nossos leitores nos possa ajudar a completar a legenda... (**)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 10 de outubro de 2017 >  Guiné 61/74 - P17844: As memórias revividas com a visita à Guiné-Bissau, que efectuei entre os dias 30 de Março e 7 de Abril de 2017 (7): 5.º Dia: Bissau, Safim, Bula, Binar e Bissorã (continuação) (António Acílio Azevedo, ex-Cap Mil)

sexta-feira, 4 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15821: Notas de leitura (813): “A revolução portuguesa e a sua influência na transição espanhola”, tese de doutoramento de Josep Sánchez Cervelló, Assírio e Alvim, 1993; e Revista Africana, publicada pela Universidade Portucalense, número de Março de 1992 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 5 de Maio de 2015:

Queridos amigos,
Arnaldo Schulz não teve biógrafo. É gritante o caudal de informação da sua presença na Guiné em contraste com Spínola. A documentação correspondente a 1964-1968 não aparece numa obra, tem referências avulsas, por vezes chocando umas com as outras. No entanto, é um período crucial, por definição. Neste tempo se adensou a guerra, proliferaram aquartelamentos, as tropas especiais tiveram desempenho revelante, desde o Cantanhez a Sambuiá; tomaram-se decisões de manter a quadrícula extensa, em Sangonhá, em Gandembel, o que se veio a revelar impraticável. Mas não há uma leitura que permita um pano de fundo, uma leitura que dê linearidade histórica. A quem me está a ler e possua elementos que comprovem que estou errado, eu peço ajuda, indicações bibliográficas esclarecedoras.

Um abraço do
Mário


Os claro-escuros da governação de Arnaldo Schulz

Beja Santos

Depois de manusear um número apreciável de papéis atinentes à guerra da Guiné, em forma de livros, monografias, artigos, relatórios, documentos esparsos, etc, confirmei que há bastante documentação sobre os alvores do nacionalismo guineense, relatos dispersos mas consistentes sobre os primórdios da guerra, até à Operação Tridente os testemunhos encaixam, há linearidade histórica. Depois, tudo aparece aos farrapos, a despeito de testemunhos de indiscutível valor como a história da CART 1525, um registo de indiscutível interesse para aquele tempo e para uma região mais que sensível, à volta do Morés, recomendo a leitura do documento que está no link (http://www.cart1525.com/gouveia/resposta.pdf).

Vejamos agora a documentação esparsa. Em “A revolução portuguesa e a sua influência na transição espanhola”, tese de doutoramento de Josep Sánchez Cervelló, Assírio e Alvim, 1993, o autor aborda este período de uma forma concisa e pouco elucidativa:
“A guerra propriamente dita iniciou-se em 23 de Janeiro de 1963 com o ataque do PAIGC ao quartel de Tite, o que delimitou a primeira zona de combate, estabelecendo-a entre o rio Geba e a fronteira com a República da Guiné. Sete meses mais tarde, abriram uma segunda frente entre o rio Geba e Cacheu. No ano seguinte, os combates alastraram a outras duas zonas: uma em Gabu e outra a Sul do Boé; e em 1965, abriram outra em frente em Cacheu, na fronteira com o Senegal. A partir daí a guerra generalizou-se em todo o território”. Em rigor, não aconteceu assim, como é do conhecimento de todos. Mais adiante, Cervelló alude à resposta das Forças Armadas portuguesas:
“As dificuldades portuguesas nos primeiros 17 meses do conflito ficam suficientemente demonstradas pelo facto de ter sido necessário substituir quatro vezes o máximo representante militar, até à chegada do General Schulz, em Maio de 1964. Os problemas militares em breve convenceram certos setores reformistas do regime de que seria mais cómodo abandonar a Guiné, devido ao elevado custo moral e humano exigido e pela falta de recursos do território. Em contrapartida, os mais ortodoxos entenderam que se abandonassem a Guiné não haveria justificação para continuarem nos outros territórios. Perante a degradação da situação militar, o governo de Lisboa mandou para Bissau Schulz. Quando ali chegou o exército tinha muitas dificuldades porque 'durante muitíssimos anos, o objetivo de uma guerra tinha sido sempre o de conquistar uma área do terreno, destruir o inimigo, ou tirar-lhe a força de combater. Mas na guerra subversiva não há nenhum destes objetivos. O que há a fazer é ganhar simpatias, mas a instituição militar desse tempo ainda era a outra, a dos objetivos, em lugar da de conquistar vontades. De forma que a nossa atuação não se ajustava ao que pretendíamos’. A estratégia que pôs em prática consistiu em ‘manter e controlar áreas determinadas, pelo que era necessário que umas forças conquistassem um terreno e ali ficassem para ocupá-lo e outras forças, na mesma área, se dedicassem a procurar o inimigo’.
Schulz tentou controlar o Sul e o Centro Oeste da colónia, perdidos desde o início da guerra, com ações de envergadura, que foram um fracasso. A situação militar foi-se degradando progressivamente, sendo a situação dramática nos primeiros meses de 1968”.
Mesmo admitindo que estas informações correspondam à verdade dos factos, não é inteligível a ação do Governador e muito pouco a do Comandante-Chefe.

Passando agora para a Revista Africana, publicada pela Universidade Portucalense, número de Março de 1992, vejamos o que escreve o investigador Lomba Martins no seu artigo “Guiné-Bissau, da década de 1960 à atualidade”, no tocante ao período da governação de Schulz.

Diz-nos que as milícias começaram a ser organizadas em Dezembro de 1964. Que os portugueses tiveram sempre controlo sobre a Ilha de Bissau, Mansoa e Teixeira Pinto, sobre Bolama e o arquipélago dos Bijagós, sobre o Gabu e Bafatá, chãos dos Papéis, Manjacos, Bijagós, Mandingas e Fulas. Em nenhuma circunstância fica claro qual o grau de desenvolvimento económico e social imprimido pela governação de Schulz, o que se passou na agricultura e pescas, na geologia e minas, nas prospeções petrolíferas, apesar de termos estatísticas no arroz, amendoim, coconote. Muitos destes estudos provocam confusão no leitor. Não é crível que ao tempo de Spínola o governo tenha elaborado 36 programas preconizando a construção de novas estradas e pontes, o melhoramento de portos, a ampliação das redes telefónicas e ainda a construção de uma ligação ferroviária Buba-Madina do Boé-Beli para a concretização do projeto das bauxites.

O leitor interessado encontrará na história da CART 1525 referências alargadas a uma reportagem propagandística do escritor e jornalista Amândio César intitulada Guiné 1965, estaríamos no melhor dos mundos possíveis, desmascarava-se a propaganda do PAIGC com a ida do jornalista à ilha do Como, mais propriamente a Cachil, percorreu estradas, falou com muita gente, a guerrilha estava mais controlada. O documento não é fiável. Hélio Felgas(*) escreveu em 1965 “Guerra na Guiné”, ensaio publicado pela Secção de Publicações do Estado Maior do Exército (SPEME). É um documento que deve ser lido com atenção. O então Tenente-Coronel fora Comandante de Batalhão em Bula e estava ávido por deixar um registo para o seu currículo e para a história. Refere que se tinha obtido o concurso da quase totalidade da população, que no final de 1964 tinha sido eliminada a infiltração do inimigo no setor dos Manjacos. Descreve a guerrilha do Sul, no início de 1963, como se disseminou no Oio, no quadrilátero Mansoa/Bissorã/Olossato/Mansabá e se manifestou noutros diferentes pontos como Xime/Bambadinca, entre Binar e Bula, como passou a usar engenhos explosivos, etc. É sem dúvida uma obra apologética, a era Arnaldo Schulz passa a ser sinónimo de retração do inimigo, mas não deixa de se contraditar, mais à frente chama à atenção para Madina do Boé e Beli, o inimigo parecia dar mostras de recuo, no entanto Felgas apresentam-no em dinâmica e moral elevado: novos campos de treino na República da Guiné, frequentes visitas de Amílcar Cabral a esses campos, o aparecimento de enfermarias, até um grupo IN tentou afundar a jangada de João Landim. E o que escreve sobre a criação de companhias de milícias é um verdadeiro assombro, assim:
“A manutenção dos soldados nativos nas fileiras e o recrutamento das milícias conduziram a uma situação curiosa e pouco conhecida. É que na Guiné há hoje mais militares nativos que metropolitanos. A imensa maioria dos nativos não nutre qualquer idealismo político que nos seja favorável. O que eles pretendem é um emprego. E foi a falta de emprego, aliada a promessas sedutoras ou ameaças terríveis que obrigou muitos nativos a deixarem-se aliciar”.

Em síntese, a governação de Schulz apresenta-se-nos como um período muito mal referenciado em gritante contraste com o mediatismo a que está associada a governação de Spínola. O que não é nada bom para o conhecimento profundo da evolução deste teatro de operações.
____________

Notas do editor

(*) Vd. postes de:

24 de Outubro de 2010 Guiné 63/74 - P7168: Notas de leitura (161): Guerra na Guiné, por Hélio Felgas (1) (Mário Beja Santos)

27 de Outubro de 2010 Guiné 63/74 - P7183: Notas de leitura (162): Guerra na Guiné, por Hélio Felgas (2) (Mário Beja Santos)
e
30 de outubro de 2010 Guiné 63/74 - P7194: Notas de leitura (163): Guerra na Guiné, por Hélio Felgas (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 29 de fevereiro de 2016 Guiné 63/74 - P15808: Notas de leitura (812): “Os Caminhos de Gadamael-Porto”, de Manuel da Silva Fernandes, edição de autor, Ponte de Lima, 2014 (Mário Beja Santos)

domingo, 25 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14184: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (8): Reencontrei o Michel Ajouz, de Bissorã, perto de Monte Real, cinco a seis anos depois, por volta de 1971/72... Ele andava a fazer termas, e eu na minha vida de delegado de propaganda médica... (Rogério Freire, ex-alf mil art, CART 1525, Bissorã, 1966/67)

1. Comentário de Rogério Freire (ex-alf mil art, minas e armadilhas, CART 1525, Bissorã, 1966/67) (*)

Caro Luís:

Vi a referência ao Michel Ajouz e ao meu nome e não posso deixar de contar uma história do "arco da velha".

Depois de regressar da Guiné, Bissorã, em finais de 1967, iniciei a minha atividade profissional como Delegado de Informação Médica (Propaganda Médica,  à moda antiga).

Uma das minhas zonas de trabalho era a região de Leiria. Num belo dia, creio que de 1971 ou 72, ao sair de Monte Real através do pinhal de Leiria a caminho da Marinha Grande, viajando a 80/90 km à hora, passo por um homem só,  que caminhava em direção a Monte Real e veio-me à memória o Sr. Michel Ajouz.

Fiquei de tal maneira incomodado com a visão que, passados uns bons 5 a 6 Km,  decidi voltar atrás e,  surpresa das surpresas, era mesmo... o Michel Ajouz!... Em pleno Pinhal de Leiria,  a fazer o seu passeio matinal.
Anúncio da casa comercial de Michel Ajouz, 1956 (*)

Foi uma grande alegria, ele lembrava-se perfeitamente de mim e da CART 1525 bem como dos outros alferes, o Rui, o Oliveira e o Silva bem como do Capitão Mourão [ Jorge Manuel Piçarra Mourão,]  que era ocasionalmente seu parceiro de bridge.

Fiquei a saber na altura que vinha às Termas de Monte Real à procura de alívio para as suas maleitas e depois de um grande abraço nos separámos.

Foi um dqueles acasos ... em pleno Pinhal de Leiria quem me diiria vir-me a encontrar com o Michel Ajouz, de Bissorã,  5 a 6 anos depois? (**)

E como dizia o nosso Pessa ..." E esta,  hem???!!!". 

(**)  22 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13639: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (7): Vermeer teria gostado de pintar as libanesas de olhos verdes... (Valdemar Queiroz, ex fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13387: Blogoterapia (254): Nos encontros da malta, no meu tempo, no CTIG, ouvi milhentas histórias, onde tudo era possível, não havia limites para a imaginação (Ernesto Duarte, ex-fur mil, CCAÇ 1421, Mansabá, 1965/67)

1. Mensagem de Ernesto Duarte, ex-fur mil, CCAÇ 1421/BCAÇ 1857, Mansabá, 1965/67, poeta, algarvio]

Data: 3 de Julho de 2014 às 23:59

Assunto: Execuções

Boa noite, Luís:


Execuções sumárias!,,, Não me fez dar um salto, mas fez-me mexer !

Até 1967 a comunicação entre militares na Guiné era feita de duas maneiras:

(i) o bate estradas, atrasados na própria unidade quando eram enviados para SPM da Guiné;

(ii) encontro de militares

Esses encontros davam-se:

(i) quando faziam operações em conjunto;

(ii) quando faziam limpezas a estradas até se encontrarem;

(iii) e os que iam a Bissau.

Nestes encontros ouvi milhentas histórias, onde tudo era possível, não havia limites para a imaginação.

Eu sempre fui um tipo de tabanca! Sempre falei muito com gentes da tabanca, gentes antes da guerra. Incluindo o Mamadu Seidi.

Eles falavam, mas falavam com medo, notava-se, o medo imperava, era muito difícil conseguir a plena confiança de alguém, até por uma razão, muitos eram refugiados naquela tabanca, a tabanca deles era outra. E diziam que, quando as tabancas se revoltaram, e apareceu a tropa e policias, que se derramou muito sangue !

Mais tarde oiço aos Águias Negras [, CART 1525, Bissorã, 1965/67] que tinham feito o caminho que eu voltei a fazer mais do que uma vez, que tinha havido muito sangue.

Saíamos em operação a uma determinada área que estava, estavam todas cheias de população, havia uns tiros, a metralha disparava, quantos inocentes ficavam naquelas tabancas ? Execuções sumárias ? Não, não, eram execuções sumárias, no sentido exato da palavra, mas...

Eu ter pleno conhecimento de alguém, pura e simplesmente, abater uma pessoa, com convicção,,, não, não tenho, nem sei bem como foi. Mas sei que foram abatidos guias prisioneiros, por comandos que foram heróis nacionais, antes e depois, e que já morreram o que para mim ainda é mais penoso falar.

Havia aqui na minha região uns fulanos de 61, 62 e 63, mas não os encontrei, melhor encontrei uns fuzileiros de 62, mas sabem muito pouco ou não querem falar.

Claro que eu não lhe falei nas execuções, mas tentei que eles me falassem da época deles, época antes da minha !
Luís, não respondi, como pedias, mas eu não podia deixar de dizer duas palavras sobre o assunto, sem falar nos milhares e milhares de tiros que foram dados naquele OIO, com tanta população no meio.

E aqui ponho em duvida se o próprio IN estava organizado para não apanhar os seus, eu penso que não !

Só quem entrou numa dessas tabancas com tiros de todos os lados e morteiradas caindo, caindo, gente fugindo em todas as direções com animais à mistura!...

São cenas loucas de uma tragédia sem limites, só comparada a outra igual e que infelizmente continuam a realizarem-se por esse mundo fora, nos dias de hoje, com a mesma tragédia dantesca, imaginável !

Um grande abraço

Ernesto Duarte
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Nota do editor:

´Último poste da série > 1 de julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13353: Blogoterapia (253): Não é pessimismo, muito menos um lamento, quando muito um recado... (Ernesto Duarte, ex-fur mil, CCAÇ 1421/BCAÇ 1857, Mansabá, 1965/67, poeta, algarvio)

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12764: Convívios (564): Comemoração dos 50 anos de incorporação militar nos COM e CSM, CISMI, Tavira, setembro de 1964: Quartel da Atalaia, 20/9/2014, às 11h (Rogério Freire, ex-Alf Mil, CART 1525, Bissorã, 1966/67)


Página da comissão organizadora, para efeitos de informação e inscrição




1. Mensagem, de 19 do corrente, do nosso camarada Rogério Freire [ex-Alf Mil da CART 1525,Bissorã, 1966/67; fundador e editor principal do sítio sobre a CART 1525 - Os Falcões]



Assunto: Vamos comemorar os 50 anos do assentar praça no CISMI !!!


Caro amigo Luís Graça,

Está a decorrer uma iniciativa para tentar reunir em Tavira, nas instalações do CISMI, no próximo dia 20 de Setembro, os mancebos que assentaram praça nos cursos de COM e CSM naquela unidade há 50 anos.

Há já um site preparado para dar informações e aceitar inscrições:

http://www.cismi-setembro-1964.pt

e um e-mail
geral@cismi-setembro-1964.pt

Porque tenho a certeza que muitos dos Tabanqueiros passaram pelo CISMI entre Setembro e Dezembro de 1964, lembrei-me de pedir a tua cooperação em ajudar-nos a divulgar este evento no nosso blogue.

Agradeço-te desde já a disponibilidade para o efeito bem como uma visita ao site.

Um abraço cordial do

Rogério Freire
(CART 1525 – Os Falcões)


Tavira >  CISMI > 1964 > "Garboso desfile pelas ruas de Tavira" [, neste caso, pela ponte romana; ao fundo, ao centro, o edifício da Câmara Municipal e Tavira]... Foto do sítio da comissão organizadora do evento. Reproduzida aqui com a devida vénia... (LG)


2. Comissão organizadora e contactos:


Com a devida vénia reproduz-se do sítio, o seguinte:


A ideia de realizar uma confraternização para comemorar os 50 anos do nosso "assentar praça" partiu do Adrião Mateus

O Adrião transmitiu-a ao Tenente António Carlos Fernandes Gomes, Comandante da 3ª Companhia de CSM, hoje Ten Cor aposentado e a alguns dos seus camaradas da CART 1525 (Guiné, Bissorã, 1966/67) e que passaram pelo CISMI, a saber:

Armando Benfeito da Costa;
António Jesus Picado Magalhães:
Joaquim Fernandes Pombo:
Rogério Marques Freire.

A ideia foi acolhida com carinho e está agora a ser posta em prática.

A confraternização só se poderá realizar e vir a ser um êxito se, ao tomares conhecimento desta iniciativa, te comunicares connosco, te inscreveres, mandares fotos e outros contibutos e ... muito importante passares a palavra a outros camaradas.

O e-mail para te comunicares connosco é o geral@cismi-setembro-1964.pt

Se preferires o contacto telefónico liga para o Adrião Mateus
telem  919755073  / telef 239717698

AGUARDAMOS O TEU CONTACTO



Tavira, 1 de fevereiro de 2014 > Foto nº 100 >  Interior do quartel da Atalaia (, hoje RI 1) (1)


Tavira, 1 de fevereiro de 2014 > Foto nº 091 > Interior do quartel da Atalaia (, hoje RI 1) (2)



Tavira, 1 de fevereiro de 2014 > Foto nº 108 > Igreja de São Francisco, ao lado do quartel da Atalaia, onde os instruendos podiam assistir à missa celebrada pelo capelão militar, aos domingos e dias santos... (Releio no "guia do instruendo", de 1968).



Tavira, 1 de fevereiro de 2014 > Foto nº 063 > A velha ponte romana sobre o Rio Girão, numa manhã de sábado, e maré vazia...


Tavira, 1 de fevereiro de 2014 > Foto nº 254 > O encanto dos recantos da cidade... Dizia-se, no nosso tempo, que tinha 29 igrejas, capelas e ermidas...



Tavira, 1 de fevereiro de 2014 >  Foto nº 074 > O velho coreto, ainda lá está, no Jiardim Público de Tavira, tendo à esquerda  o velho mercado (que hoje é zona de lojas de artesanato e restauração).



Tavira, 1 de fevereiro de 2014 > Foto nº  298 > Um aspeto do Jardim Público de Tavira, entre a Praça de República e o antigo mercado... por onde se passeavam as "morenas" e os senhores instruendos, no nosso tempo... Onde se vê o meu carro, é a Rua do Cais, segundo leio no mapa do Google...  E á esquerda, o rio Girão


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados


3. Comentário de L.G.:


Rogério, são gloriosos sobreviventes, essa malta de 1964!... Meio século, é obra! Parabéns aos bravos "falcões" que estão a organizar este evento.

Tens o nosso (que também é teu) blogue à tua inteira disposição para divulgar esta e outras iniciativas... Para mais, Tavira é um sítio que me é caro, também passei por lá, 4 anos depois de ti, no último trimestre de 1968, antes de ser mobilizado para a Guiné...

Acabei de visitar o sítio que me indicas e, como prometido, fiz-te um poste à maneira, no seguimento e em complemento do teu pedido... Acrescentei inclusive mais algumas fotos de Tavira, que eu tirei por ocasião de um fim de semana que lá passei, há três semanas atrás.

Estás também à vontade para (re)publicar, no nosso, coisas do blogue dos "falcões"... Devíamos falar mais da tua CART 1525 e da valente rapazida de Bissorã do teu tempo...

Um alfabravo. Luis

PS - Rogério, temos vindo a publicar uma série sobre o "Guia do Instruendo", documento, de 21 pp., que era distribuído no meu tempo (1968). Vê aqui. Provavelmente ainda não existia em 1964, no vosso tempo.