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quarta-feira, 1 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25465: 20.º aniversário do nosso blogue (13): Alguns dos melhores postes de sempre (IX): Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé): Spínola, o Desejado - II (e última) Parte


Guiné > Região de Bafatá > Fajonquito > 1972 > A equipa juvenil da "Ferrugem", futebol de cinco, orientada pelo 1º cabo Sérgio Rodrigues ("Gasolinas"). De pé: Adama Suntu e Saido ("Barbosa"); ajoelhados: Amadi, Cherno Balde ("Francisco") e um colega que não consigo identificar ainda. 

Legenda do Cherno Baldé. Foto (adaptada) na página do Facebook de Sérgio Rodrigues, publicada na sua página do Facebook, em 28/10/2019, 21:28 (com a devida vénia...) 

Acrescenta o Cherno: "na altura era o Chico que fazia a faxina no quarto do Dias, Augusto Teixeira, Silva e o Elsa enquanto esteve em Fajonquito. Um abraço. A foto deve ser de 1972, pois ainda o teu João não estava connosco."... O ex-1º cabo mecânico Sérgio Rodrigues pertencia à CCAÇ 3549, "Deixós Poisar" (Fajonquito, 1972/74).

Guiné > Região de Bafatá > Fajonquito > Junho de 1972 > CCAÇ 3549 / BCAÇ 3884, "Deicós Poisar" ( Fajonquito, 1972/74) > Equipa dos Condutores e Faxinas: da esquerda para a direita: José Maria, Vasconcelos, Carvalho e Fernando Mandinga. Na primeira fila: Jorge Suleimane, Barbosa (Mama Saido), Braima Banassé e o Francisco (Cherno Dabo).

Foto (e legenda): © Cherno Baldé (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Fajonquito > Antigo quartel das NT > 2010 > Trinta e seis anos depois da "troca de bandeiras" , em 10 de setembro de 1974... Visita do Cherno Baldé e família: Local onde estava situado o pau da bandeira; à esquerda as ruínas do forno de cozer o pão que fazia as delícias do "Chico, menino e moço".

Foto (e legenda): © Cherno Baldé (2010).
Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. No 25 de Abril de 1974, o Cherno Baldé estava em Fajonquito, com os seus 14 ou 15 anos (?) (nem ele sabe o ano exato em que nasceu, c. 1959/60/61) .  Ficou, perplexo, como todos os "djubis", "cães rafeiros do quartel", sem poder (nem querer) acreditar nas vozes que repetiam "A guerra acabou!... A guerra acabou!"... Para logo se interrogar, com angústia: "E agora ?!... O que será de nós?!" (*)...

O sonho daqueles miúdos, fulas de Sancorlã,  era virem a integrar os "Comandos Africanos", o Batalhão de Comandos da Guiné, "manga de ronco"... 

Mas, para ele, Cherno. ainda djubi,  o verdadeiro 25 de Abril já tinha acontecido há pelo menos quatro anos antes, com a aparição fulminante e justiceira, em Fajonquito, numa manhã de nevoeiro, do "Caco Baldé", Spínola, o Desejado.

Ele conta como foi, no poste P11008, de 26 de janeiro de 2013 (**), da sua excecional série, "Memórias do Chico, menino e moço" (uma série que, já o dissemos mais do queuma vez, merecia ser publica em livro)... 

Republicamos, com revisão e fixação de texto, do nosso editor, a segunda (e última) parte (**)

Cherno Baldé, nosso amigo e colaborador permanente do nosso blogue, formado na antiga União Soviética em Planificação e Gestão Económica (Universidade de Kiev, 1990), com uma pós-gradução no ISCTE-IUL (Lisboa, 1992/94), é uma testemunha privilegiada dos acontecimentos do seu tempo, desde miúdo ("djubi"),  quando foi apanhado pela "guerra de libertação" ou guerra colonial ou guerra do ultramra (ao gosto do freguês...), logo em 1964, na sua terra natal, no regulado de Sancorlã.  

De 1964 a 1974 viveu em Fajonquito, tendo-se tornado um "cão rafeiro" do quartel local, fqzendo pequenos serviços, sobretudo ao pessoal da "ferrugem", em troca dos cais, ia partilhndo as sobras do rancho.  Afeiçoou-se aos militares portugueses que passaram por aquele arquartelamento da região de Bafatá, sector de Contuboel, perto da fronteira com o Senegal, e que lhe puseram a alcunha de "Chico"... 

É autor de um notável série, "Memórias do Chico, menino e moço" (de que já publicámos, a partir de 2011, mais de meia centena de postes).  Integra a nossa Tabanca Grande desde 18 de junho de 2009 )**). Tem  lá cerca de 300 (!) referências no nosso blogue, é um dos autores e comentadores mais ativos e regulares. Note-se: nunca foi "combatente", nem chegou a fazer o serviço militar na sua terra, "finalmente liberta do jugo colonialista", como diria a "Maria Turra".

Depois da independência, foi estudar para Bafatá, em 1975 (ciclo preparatório e parte do ensino secundário). Em 1979 vai frequentar o liceu de Bissau, que acaba em 1982. Em 1986 parte como estudante bolseiro para a URSS (Moldávia e Ucrânia). Teria já os seus 26/27 anos (nasceu por volta de 1959/60). Ganhar uma bolsa nesse tempo era a sorte grande de um jovem guineense!

Regressa, com uma licenciatura, ao seu país em 1990, já depois da queda do "muro de Berlim" e a "implosão" da União Soviética. Casa-se em 1992 e faz uma pós-graduação no CEA - Centro de Estudos Africanos /ISCTE, em Lisboa (1992/94).

Em 1998, está em Bissau, a trabalhar como quadro superior na administração pública, mais exatamente no Ministério das Infraestruturas, Transportes e Comunicações onde exerce as funções de director do gabinete de estudos e planeamento. Vive em Brá, no chamado Bairro Militar, com algumas regalias.

No dia 7 de junho de 1998 é apanhado pelo golpe de Estado e a subsequente guerra civil de 1998/99. É obrigado a deixar a sua casa, no Bairro Militar, e sair de Bissau com a família (ele, a esposa, o filho de 3 anos e uma sobrinha de cinco ), mais a família da irmã da sua esposa, de nome Djenaba, num total de 10 pessoas (3 adultos e 7 crianças), refugiando-se na sua terra natal, Fajonquito, regulado de Sancorla, junto à fronteira com o Senegal.

Deixam a casa, em Bissau, no dia 11, chegam a Safim, procurando desesperadamente por um transporte que os leve para longe da guerra, para Fajonquito. Consegue, através dos seus conhecimentos, uma boleia para Mansoa, a 13 de junho, até apanhar um camião, que o leva ao seu "refúgio", em Fajonquito, aonde chega no dia seguinte, passando por Bambadinca e Bafatá. Nesta viagem faz também uma "retrospetiva" do seu passado recente (os anos passados em Bafatá, em 1975/79, e depois na URSS, 1986/90).

Em 2001/02, o Cherno viu-se na contingência de ter de emigrar para Portugal, onde trabalhou na construção civil, como simples "trolha" na construção do complexo Alvalade XXI. É sportinguista de coração.

A sua vida tem sido, afinal, uma dura  pr"ova de obstáculos" que ele vai superando com fé , esperança, coragem, inteligência emocional, amor à família, lucidez e sentido de solidariedade.



Dr. Cherno Baldé, Bissau, foto atual

MEMÓRIAS DO CHICO, MENINO E MOÇO (43) - O GENERAL SPÍNOLA E A POLITICA “POR UMA GUINÉ MELHOR” - II ( E ÚLTIMA) PARTE  (*)

por Cherno Baldé

O CAPITÃO CARVALHO

Este acaso aconteceu em finais de 69 
ou princípios de 70, não posso precisar, 
e teria eu na altura cerca de 10/11 anos de idade 
e havia poucos meses que tinha mudado 
com os meus pais de Cambajú para Fajonquito. 

Aqui, não nos deixavam entrar no interior do quartel, mas a atracção que causava em nós era tal que não conseguíamos ficar longe dos arames farpados. Para facilitar as coisas o meu pai trabalhava no mesmo edifício comercial que albergava, também, nas suas traseiras, a residência do Capitão e comandante da companhia, assim como a messe dos oficiais e sargentos.

Depois de algumas horas de aulas de manhã, e com o pretexto de ficar a ajudar o meu pai, conseguia esquivar-me dos trabalhos de campo e passar grande parte do tempo a espreitar o movimento da tropa dentro do quartel, usando o espaço da loja e a presença do meu pai como refúgio sempre que um ou outro elemento mais zeloso quisesse importunar-me. Gostava, sobretudo, de acompanhar o vaivém do Capitão no seu pequeno jipe de campanha donde sempre descia saltitando ao lado antes de este se imobilizar por completo. Eram imagens que me fascinavam.

Em Cambajú, onde estava estacionado um pelotão da mesma companhia (a CCAÇ 2435), não existia este fosso de separação entre brancos e pretos, militares e civis,  e por isso, convivíamos de perto com a tropa portuguesa e com as milícias, inclusive já tivera a oportunidade de esfregar as minhas mãos na pele branca e gorda ou agarrar nos cabelos hirsutos das mãos e braços do nosso amigo, o furriel Libural (Liberal?), que frequentava assiduamente a nossa casa, não sabendo ao certo o que o atraía mais, se as simpáticas palavras do meu pai sempre cordial e respeitoso para com as autoridades, fossem elas civis ou militares (que o obrigava a tirar o chapéu da cabeça quando as cumprimentava e num excelente português nos apresentava dizendo “minha filho” quando queria dizer “meu filho”),  ou se eram as minhas primas-irmãs com os seus sorrisos de dentes de marfim, nádegas bamboleantes e seios redondos brilhando em céu aberto.

Em nossa casa toda a gente gostava do furriel Liberal com seu ar bonacheirão que, muitas vezes, trazia consigo uma terrina cheia de comida do quartel para a meninada. Bem, para ser sincero, nem toda a gente apreciava as suas investidas dentro da nossa morança, arvorando os seus “bumdias e buatardes”, mesmo trazendo comida. 

E a primeira pessoa a manifestá-lo fora a minha avó paterna, Eguê, que se insurgia contra a intrusão do branco e, quando isso acontecia, amaldiçoando o destino que não quisera que tivesse morrido mais cedo, dizia sempre num tom de profunda e incontida amargura: 

- Áh Allâ..., e tinha que viver para presenciar isto...!?

Nunca soubemos, ao certo, o que ela queria dizer com “isto”, se era o atrevimento do olhar direto e fulminante com que despia os seus interlocutores, em particular as bajudas, se era a maneira diferente como ele falava, lembrando o som gutural de um pombo apaixonado ou a aparente depravação dos gestos e abraços, as vezes, desmesurados do furriel e dos seus companheiros da tropa. 

O que valia mesmo é que ninguém se preocupava com as palavras da avó Eguê que vivia agarrada ao passado, passando a maior parte do tempo a falar sozinha com pessoas imaginárias, insistindo em trazer de volta os ecos de uma vida que já não existia. 

−  Uoúh…, a velhice é mesmo uma merda!  − arrematava ela, encolhendo os ombros, diante dos risos e da indiferença geral, antes de se refugiar dentro da sua casa escura e com um estranho cheiro a merda.

Em Fajonquito era diferente e, pela primeira vez, via um capitão assim de perto, o comandante dos brancos em pessoa. Muitas vezes, quando ele descia do seu jipe aproximava-me, discretamente, esperando dele um olhar, um sorriso ou um gesto de amizade que nunca aconteciam. Por isso, não me lembro da cor dos seus olhos, escondidos debaixo de umas sobrancelhas fartas, que fugiam do meu olhar, mas lembro-me, mesmo que vagamente, do seu rosto sempre hermético e impenetrável como que querendo dizer-me que não tinha tempo para crianças intrometidas.

O seu nome era capitão Carvalho, estatura baixa, andar pausado, pés firmes no chão, sentidos obscuros e como que carregados de uma missão impossível. Foi a sua companhia (CCAC 2435) que, de facto, construiu o aquartelamento de Fajonquito em 1969, com o reordenamento da aldeia e construção de um dispositivo de defesa que dizia aos inoportunos visitantes nocturnos:

 
− Olha, estamos aqui deste lado, para vos receber com metralha!.

Estes dispersaram-se indo para os lados de Oio e Joladu e nunca mais voltaram.

Ainda na metrópole, antes do embarque, que se esperava fosse tudo menos a Guiné, a divisa que tinham arranjado para a companhia, assim do jeito “pessoal manga-di-ronco”, era qualquer coisa que dizia assim: “Os tigres, juntos venceremos” e por cima destas palavras via-se a cabeça de um tigre ameaçador, mostrando seus dentes aguçados. 

Outra companhia que se lhe seguiu as pegadas usava outro lema do tipo: “Deixós poisar”. Não percebíamos nada desta linguagem de caçadores, no entanto, o nosso avô materno, caçador profissional que participara na guerra contra os Canhabaques em 1935 e que conhecia todos os animais da floresta, nos dissera com ar muito sério: 

− Com os tigres não se brinca”. 

Mas, em Fajonquito e lá para o fim da comissão, estando mais velhos e realistas tinham alterado a mesma divisa para: “Os tigres, juntos resistiremos” e a outra companhia que lhes seguirá nas peugadas dirá mais tarde a todos os que a queriam ouvir: “Deixós-estar”.


O CAPITÃO, SPÍNOLA E O DJINNE DJUNCORE

Devo esclarecer que, de todos os membros da família, o nosso avô materno era o mais bem informado sobre os aspetos bons da presença portuguesa e com ele mantinha um relacionamento íntimo e confidencial, tanto assim que seria dele a ideia magistral de infiltrar-se dentro do quartel com a missão bem definida de coletar uns pequenos pacotinhos de cor verde escura que eram distribuídos à tropa como ração de combate e que mais não eram senão o popular e vulgarmente conhecido caldo de galinha.

A tropa não usava aqueles pacotinhos os quais, invariavelmente, deitava no caixote do lixo juntamente com os comprimidos a que se juntavam, também, e que, por minha conta, passei a colecionar para tratar da saúde contra o vírus da fome.

A missão foi bem sucedida porque juntava o útil ao agradável. O útil era os pacotinhos de caldo de carne que o velho caçador, especialista na arte de conserva e consumo de carnes secas, cego e sentado na sua varanda, tinha descoberto dentro do quartel e com o qual passou a melhorar, substancialmente, os ingredientes e o gosto do seu intragável prato de farinha de milho preto. 

O agradável para mim era a possibilidade de poder ludibriar as sentinelas, deambular impunemente dentro do quartel, enfrentando o perigo das botas da tropa, sempre prontas para enfiar pontapés certeiros no cu dos pobres djubis e, quando calhava, um pedaço de pão com um saboroso chouriço de carnes vermelhas vindo de uma alma caridosa. Para sobremesa serviam as cartelas de comprimidos das rações de combate, doces por fora, amargos por dentro, como o coração dos nossos políticos.

Mas, vamos deixar de lado o meu avô para lembrar que um dos ctos mais temerários, para além das suas frequentes saídas para as matas do Oio e Cola/Caresse por que ficou conhecido o capitão Carvalho, era o rebentamento de granadas. Sim, granadas lançadas a poucos metros de distância. 

Levantava-se numa bela manhã e de repente, como quem cumpria um ritual funesto, ouvia-se um ”buuuum” enorme dentro do quartel e a seguir, no mesmo instante em que o cheiro irritante de pólvora invadia o espaço do refeitório e da messe dos oficiais, viam o capitão a sair do interior de uma gigantesca bola de fumo e poeira, no seu passo pausado e firme de militar, vestido com o seu rigoroso e invariável camuflado. Nunca conseguimos saber que tipo de granadas usava nem descobrir o prazer que este oficial sentia nesses exercícios macabros de lembrar a todos que estávamos em tempo de guerra e de morte.

No meio dos nativos, muitos acreditavam que ele era invulnerável aos estilhaços das granadas. Na opinião de muitos, ele era detentor de um baki-tcham ou seja mesinha contra balas, para outros seria um protegido do próprio Djuncoré, o rei dos Djinnés que habitava o poilão luminoso da bolanha de Sunkudjumá, no prolongamento do rio Canjambari. 

Como sempre acontece em situações de guerra, era difícil separar o trigo do joio, o mito da realidade. O certo, porém, é que,  com conivência ou sem ela, o capitão impunha, a seu belo prazer, a sua lei e as suas ordens na quadrícula a seu mando, excetuando, claro, o território a oeste que o inimigo ia conquistando pouco a pouco alargando o corredor de Sitatô. E, quem se alia ao poder dos Djinnés, mais cedo ou mais tarde terá que pagar as contas, diziam os mais velhos e entendidos na matéria. Seria este o caso do Capitão?

Naquele dia, estava no perímetro habitual, entretido a apanhar pequenas pedrinhas na estrada para as brincadeiras habituais,  quando, de repente, começa um movimento de vaivém da tropa que ocupa o local para uma improvisada parada militar. Da pista de aviação, onde aterrou um ou dois helicópteros, chega um veículo que se imobiliza junto a parada, de onde descem algumas pessoas, dentre as quais um velho oficial em farda de camuflado, corpo ligeiramente dobrado à frente, qual imbondeiro fustigado pelos ventos tropicais, uma bengala na mão direita. Disseram-nos depois que era o general Spínola.

O que aconteceu a seguir foi rápido e indescritível, não me lembro de ter ouvido o som da corneta, não houve discursos para a ocasião e os militares da parada, provavelmente, teriam executado os habituais gestos teatrais que culminavam no “apresentar aaaaaaarma!”, prática marcial que o General não vira ou não tivera tempo de corresponder e, dirigindo-se ao capitão perfilado à sua frente, ter-lhe-ia assestado uma violenta bofetada para depois puxar dos seus ombros as patentes que este orgulhosamente ostentava. 

E, naquele mesmo instante e no mesmo veículo, voltaram para a pista, levando consigo o capitão Carvalho que, talvez pela primeira vez, na sua vida de oficial, viajava nas traseiras de um Unimog e, pior ainda, sem os seus lustrosos galões de comando. 

Mais tarde juntar-se-iam outros elementos do poder local para um desterro de muitos anos. Quando os helicópteros levantaram voo, ouviu-se um convulsivo choro da tropa metropolitana que assim demonstrava, aos olhos da população, os seus sentimentos de grande estima e de apego ao seu comandante de companhia.

Nunca antes, na minha vida, tinha assistido a uma cena tão comovente protagonizada por homens brancos e, como estavam de luto e não tinham nenhuma vontade de comer o guisado de carne de vaca que os esforçados cozinheiros nativos tinham preparado, um grupo de rafeiros famintos foi lá dar uma mãozinha, enchendo cada um a sua marmita bem àmedida.

"Por uma Guiné Melhor", ninguém podia fazer mais e melhor que este show-off público, em nome da justiça e da dignidade dos Guinéus, indiferentemente da cor da pele, da classe social ou do nível da patente militar. Os indígenas tinham ficado confusos e boquiabertos, pois desde os tempos de Mussa Molo que ninguém tinha visto um capitão do exército,  português e branco,  a sofrer uma tão humilhante afronta ao seu estatuto de oficial superior por causa de alegados atropelos aos direitos humanos do gentio rebelde e num território em guerra.

Os discursos vieram depois com a entrada em cena de Issufo Sandem, dos nossos vizinhos mandingas e ferreiro bem conhecido por sua eloquência verbal. Saindo do nada, gesticulando freneticamente as mãos e fazendo jus à sua cidadania, num bem aprimorado português, explicava para a curiosa multidão que entretanto se tinha juntado no local, sobre as atividades e os métodos usados pelo capitão nas sessões de tortura dos presos e que, por conseguinte, ficaria mui célebre:

O capiton pega num gaijo, mete dentro de um bidon d´iagu, cabeças pra baixu e cús pra cima, dipois, com barriga grandi como prenhadas, tira i deita na tchon, piza barrigas com botas de tropa e iagu sair na bocas i na cus (4).

Tá percebido?

De seguida, o grupo dos prisioneiros, que durante a visita do General tinha sido escondido no interior da tabanca, encabeçados por Tchamá ou Intchamá que, pela primeira vez, eram alvo de alguma atenção e envergando roupas mais ou menos decentes e sem o cheiro nauseabundo que lhes era característico, foram apresentados um a um como se fosse a primeira vez que eram vistos, quando na realidade, todos os dias e durante toda a fase da construção do aquartelamento, tinham sido utilizados como mão-de-obra nos trabalhos de escavação dos abrigos, valas, valetas e ainda na limpeza de toda a área que circundava o quartel e para onde estavam apontadas as metralhadoras que defendiam a aldeia.

Claro que aos olhos da população local, estrategicamente guiada e manipulada, tratava-se de turras, catalogados como IN e gente do mato que aterrorizava, matava e pilhava as nossas aldeias e, por isso, simplesmente, não podiam ter qualquer direito de existir e merecer a menor consideração e como tal eram simplesmente invisíveis. Era isto a realidade crua de uma guerra onde cada um tinha que escolher um dos lados, estivesse certo ou errado.

Voltando ao episódio de 69/70 com o capitão, é claro que não vamos aqui afirmar, sem cairmos no risco de um grande equivoco, que aquilo que aconteceu teria sido o mau desfecho de um sinistro contrato satânico, como pensava o Aliu Samba e os restantes indígenas da aldeia no delírio das suas mentes animistas, mas não deixa de provocar certa perplexidade o facto de que, depois deste fatídico acontecimento de mau agouro, não houve nenhum outro capitão que tivesse cumprido a sua missão até ao fim sem problemas, nesse subsector.

O primeiro a chegar, o cap Carlos Borges de Figueiredo (CART 2742, 1970/72), teve um fim trágico a escassos meses do fim da sua comissão, quando estava a trabalhar no gabinete que o próprio tinha construído no local, onde dois anos antes o cap  Carvalho tinha perdido os seus galões. 

O segundo, o cap QEO José Eduardo Marques Patrocínio (CCAÇ 3549 / BCAÇ 3884, 1972/74), com seis meses apenas, seria convocado junto a sede do Batalhão, em Bafatá, para receber uma “porrada” que o arredaria, definitivamente, da sua companhia, obrigando-nos a assistir a mais uma cena de choros e ranger de dentes dos seus desamparados rapazes.

O último, bem, o último tinha sido o cap Pedreiro Martins (2ª C / BCÇ 4514/72, Junho de 1974), a guerra já tinha chegado ao fim e de mais a mais, para uma companhia que tinha participado no trabalho titanesco de furar o cerco de Guidage e tinha depois passado algum tempo no inferno de Gadamael, os irãs, provavelmente, teriam concordado em poupá-los um pouco, deixando-os cumprir com pompa e circunstância a (des)honra que representou, para Portugal e os seus aliados fulas de Sancorlâ, a entrega final do aquartelamento de Fajonquito aos maquisards do PAIGC para que assim se cumprisse a profecia de Cabral e pudéssemos, finalmente, passar de “uma Guiné melhor” com roupagem e estilo neocolonial para “uma Guiné bem pior” revolucionária, conforme estava superiormente predestinado.

Mas, na opinião de Aliu Samba e dos seus conterrâneos, a situação era bem mais complexa que isso e, estavam convencidos que a extinção da luz do poilão luminoso do lago Djuncoré, significava o desaparecimento do rei dos Djinnés, no preciso momento em que o PAIGC teria penetrado no coração sagrado do recinto dos poilões de Canhámina, capital de Sancorlã, marcando assim o fim do regulado e de uma dinastia.

− Viva PAIGC!... 

− Viva!!!

− Viva Titina Silá!... 

− Viva!!!

− Abaixo a FLING!... 

− Abaixo!!!
 
− Abaixo o imperialismo!... 

− Abaixo!!!

−  Viva PAIGC!... ~

− Viva!!!

− Viva Osvaldo Vieira!... 

− Viva!!!

− Abaixo os oportunistas!... 

− Abaixo!!!

−  Abaixo o Colonialismo!... 

− Abaixo!!!

 Viva Amílcar Cabral!... 

− Viva!!!
 
− Vivam os Heróis da luta!... 

− Viva!!!

 −  Abaixo barrigas de meia!... 

− Abaixo!!!

− Abaixo Neocolonialismo!... 

− Abaixo!!!

Aplausos, camaradas , aplausos, enquanto o pano deslisa, pouco a pouco, para cobrir o triste cenário do palco quotidiano da alegria das nossas vidas.

Bissau, 21 de Janeiro de 2013.
Cherno Baldé (Chico de Fajonquito)
__________

Nota do autor
 
(4) - “O Capitão pega num gajo, mete dentro de um bidão cheio d’agua, cabeça para baixo e cu pra cima. Depois, com a barriga cheia e grande como uma mulher grávida, retira-o e deita-o no chão pisando a barriga com as botas de tropa, fazendo sair água na boca e no ânus”.
____________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 30 de abril de 2024 > Guiné 61/74 -. P25463: 20º aniversário do nosso blogue (13): Alguns dos melhores postes de sempre (VIII): Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé): Spínola, o Desejado - Parte I

(**) Vd. poste de 18 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4550: Tabanca Grande (153): Cherno Baldé (n. 1960), rafeiro de Fajonquito, hoje engenheiro em Bissau...

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21452: (Ex)citações (374): Colunas militares e populações civis como escudo contra minas e emboscadas, na zona leste, no "chão fula" (Cherno Baldé / Manuel Oliveira Pereira / Carlos Vinhal)



Ponte de Lima > 2019 > 50º aniversário da missa nova de José António Correia Pereira, aqui sentado, na primeira fila [nº 4], ex-alf mil capelão, BCAÇ 3884 (Bafatá,  1972/74): é o terceiro a contar da esquerda para a direita.

O primeiro da ponta é o nosso camarada Manuel Oliveira Pereira [nº 3]. Os restantes são amigos, ex-colegas e ex-camaradas do homenageado. 

O Cherno Baldé, que é um arguto observação e tem uma memória de elefante,  identificou o Manuel Mendes Sampedro [, nº 1], ex-capitão, e o Deus [nº 2], ex-furriel mil, ambos da CCAÇ 3547 , "Os Repteis de Contuboel, tal como o ex-fur mil Manuel Oliveira Pereira [nº 3]. E mais: em comentário da este poste, já acrescentou mais um elemento, do BCAÇ 3884, o Altamiro Claro, ex-alf mil. CCAÇ 3548, que estava em Geba. (Era um craque da bola; foi presidente da CM de Chaves e é o atual provedor da Misericórdia de Valpaços).

Foto (e legenda): © Manuel Oliveira Pereira (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentários ao poste P21433 (*)

(i) Cherno Baldé

Caros amigos,

O Capelão do BCAÇ 3884 [, José António Correia Pereira,]ia com frequência ao aquartelamento de Fajonquito, depois de Contuboel, e a nossa curiosidade de crianças não deixava nada escapar no quartel e arredores. A pequena Capela situava-se fora do arame farpado, pelo que as missas decorriam sob os nossos olhares atentos de crianças.

Um facto curioso que nos saltava à vista, era o número muito reduzido de participantes nessas missas dominicais, comparado com o numero de soldados presentes no quartel e/ou ao reboliço que provocavam as festas de Natal e do Ano Novo.

Na imagem vé-se o [Manuel Mendes Sampedro, que vivia em Fajonquito com a esposa e um filho pequeno] (Capitão da companhia 3549 que substituiu o Patrocinio],  na segunda fila ao meio [, nº 1] e o ex-Furriel Deus (o mais alto da segunda fila de óculos) [nº 2], que entre a população nativa era uma espécie de desmancha-prazeres quando chefiava as colunas para Bafatá, pois não raras vezes, talvez por razões de segurança, era obrigado a reduzir a lotação dos carros e os visados (sempre civis) viam-se assim privados de viajar até Contuboel ou Bafatá. 

Note-se que, na altura, a coluna era um dos poucos, senão o único meio, de as pessoas se deslocarem a uma distância de mais de 30 km nas zonas de guerra.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

9 de outubro de 2020 às 13:07  (**)



Emblema da CCAÇ 3549 / BCAÇ 3884, "DExós Poisar" (Fajonquito, 1972/74)

(ii) Carlos Vinhal

Caro Cherno, de Mansabá para Mansoa, o único transporte que havia para os civis eram as colunas, não me lembro se de Mansoa para Bissau havia alternativa, mas pelo menos havia coluna diária.

Algumas vezes, principalmente quando vínhamos de Mansoa para Mansabá, o pessoal civil, vindo talvez já de Bissau, aproveitava o trajecto para comer alguma coisa. Eles descontraídos a merendar e nós, tensos, principalmente na zona do corredor da morte, que, vindo de leste, atravessava Mamboncó em direcçção ao Morés. Ali perdemos o Manuel Vieira e o José Espírito Santo Barbosa.

Passa bem
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira

(iii) Manuel Oliveira Pereira

Meu caro Cherno Baldé, meu amigo, mais uma vez, estou a contradizer as tuas "verdadeiras" observações,e porquê? Porque eu, quando possível, e enquanto comandante de Destacamento ou de "coluna", "apostava" nas viagens acompanhado pelo maior número de "civis", fazendo-os, por razões tácticas e operacionais, "inscrever-se de véspera".

Assim, excluia (uma certeza?) a probalidade de uma emboscada ou mina na picada. Usei esta metodologia, em Galomaro, Dulombi, Sonaco para Gabú, Bafatá ou Massajá. Nesta última, recordo uma "reunião de Homens Grandes" para, presumo, escolher aqueles que iriam em peregrinação a Meca. 




Guiné > Região de Bafatá > Mapa de Sonaco (1957) > Escala de 1/50 mil > Posição relativa de Sonaco e Mansajã, na estrada para Pirada (fronteira com o Senegal). Distância entre Sonaco e Mansajã: cerca de 10 km. Pirada ficava a nordeste (c. 50 km) e Nova Lamego a sudeste, mais ou menos à mesma distância.

Infogravura: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2020)


Em Sonaco fui contactado pelo Farim (capitão de milicia) no sentido de transportar estas figuras importantes a Mansajã [vd. mapa de Sonaco]. Disse ao Farim serem muitos e eu não dispor de uma segunda viatura para fazer a escolta. Respondeu-me que não seria necessário, bastava o "condutor". Perante o desafio, disse-lhe "então serei o condutor!" . Estupefacto, abre ao máximo os olhos e diz-me: "seria uma honra".

"Pois então eu levo-os", disse eu! Acrescentei: "Se me acontecer coisa, ficam instruções para arrasar as vossas tabancas".

Com um sorriso, diz-me: "Muito obrigado, Alá será a sua proteccão!..". 

Fui e regressei sozinho. Não consigo, ainda hoje, por palavras, dizer o que senti naquela " longa" viagem de retorno a Sonaco.

Abraço.





(iv) Cherno Baldé

Caro amigo Manuel Pereira:

Ao tempo da CCAC 3549 ["Deixós Poisar"], eu teria 13/14 anos e estava permanentemente no quartel [de Fajonquito]. Do que disse sobre as colunas a Bafatá não inventei nada, os acontecimentos aparecem na minha memória como fotografias guardadas num arquivo. O Furriel Deus, na altura, era um jovem de uma enorme cabeleira que ele gostava de exibir e que raramente cortava.

Não posso contradizer aquilo que tu dizes, todavia a observação que posso fazer é para dizer o quanto vocês estavam mal informados sobre a população fula de Leste.

A realidade da guerra no Sul, onde os guerrilheiros eram familiares da população civil e existiam laços fortes de entreajuda entre os dois lados não era a mesma na zona Leste onde, sem excluir a possibilidade de informadores secretos, não existiam laços de parentesco com os homens do mato, quase todos pertencentes a outros grupos étnicos e quase sempre as aldeias fulas eram o alvo privilégiado dos guerrilheiros e sempre com muitas vítimas.

Não havendo ligações e cumplicidades entre os dois lados (população e guerrilha), não vejo qual seria a vantagem de levar civis para se protegerem de eventuais ataques e/ou colocação de minas. No contexto da guerra as populações do Leste, maioritariamente de etnia fula, eram consideradas como colaboradores dos "Tugas" porque eram contra a guerra movida pelo PAIGC.

Abraços,

Cherno AB.11 de outubro de 2020 às 19:51

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Notas do editor:


(**)  Último poste da série > 5 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 – P21417: (Ex)citações (373): Pássaros que esvoaçavam os céus da Guiné. Abutres.(José Saúde)

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Guiné 61/74 - P18170: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (53): três balas de kalash para uma missão suicida: o trágico fim do ex-soldado 'comando', Cissé Candé, em abril de 1978


Guiné > Região de Bafatá > Fajonquito > Junho de 1972 > CCAÇ 3549 / BCAÇ 3884, Fajonquito, 1972/74> Equipa dos Condutores e Faxinas: da esquerda para a direita: José Maria, Vasconcelos, Carvalho e Fernando Mandinga. Na primeira fila: Jorge Suleimane, Barbosa (Mamassaido), Braima Banassé e o Francisco (Cherno-Dabo).

Foto (e legenda): © Cherno Baldé (2017). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Cherno Baldé, foto atual. Gentileza
da sua página no Facebook.
I. Mensagem do nosso amigo e grã-tabanqueiro Cherno Baldé, com data de ontem:

Caros amigos Luis e Carlos Vinhal,

Antes de tudo, espero que tenham entrado com o pé direito neste ano novo, com votos de saúde e felicidades junto dos seus entes queridos. Também aproveito o ensejo para desejar, a todos os meus amigos reais e/ou virtuais do Blogue da Tabanca grande, votos de festas felizes e prosperidade no ano novo que agora inicia.

Juntamente envio um texto para vossa apreciação e posterior publicação, caso assim o decidam.

Eu passei as festas de Natal na minha aldeia de Fajonquito e a passagem do ano em Bissau com a família.


Um grande abraço de estímulo e de encorajamento para mais um ano de luta e de trabalho para uma vida melhor.

Cherno A. Balde



Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > Fá Mandinga > 1970  > Grupo da 1.ª CCmds Africanos, em formação. Vê-se na segunda fila, sentado, o cap 'cmd' graduado João Bacar Jaló. Não temos nenhuma foto do Cissé Candé, natural de Fajonquito,  que pertencia à 2.ª CCmds Africanos, tal como o nosso saudoso Amadu Djaló.

Foto: © Virgínio Briote / Amadu Djaló (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagen: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


II. Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (53): 

Três balas para uma missão suicida (*)

por Cherno Baldé

Fajonquito, Abril de 1978

Os dias sucediam-se normalmente nessa época seca. As mulheres continuavam a levantar-se cedo para pilar o milho que seria utilizado para matar a fome das crianças que passavam os dias em casa durante o dia e no período da noite quando os homens voltassem dos trabalhos da preparação dos terrenos no campo para a época das chuvas que se aproximava e das pastagens longínquas situadas para lá das bolanhas de Berecolóm e Sunkudjumá.

A vida na aldeia decorria calmamente, entrecortada aqui e ali por questões mundanas, de querelas por mulheres e roubos de gado num contexto em que, cada vez mais, a autoridade de Estado deixava de se fazer sentir nas zonas mais periféricas do pais.

A contrastar com o sentimento de alguma insegurança e de incerteza politica, eram os festejos ligados à independência recente do país com danças frenéticas, acompanhadas de tambores e cânticos das mulheres nos seus trajes multicolores, embora o entusiasmo fosse cada vez menor, assim como a adesão das multidões. “Bhê-Tchebhiríma-ey!” (estamos fartos desta gente) diziam em surdina os mais ousados. Manifestações de apoio seguidos de reuniões intermináveis, todos os dias, era demais para os pobres camponeses que não podiam desperdiçar seu precioso tempo em futilidades.

Para o jovem Cissé (1), todavia, a preocupação era outra. Desmobilizado dos Comandos Africanos, tinha regressado à aldeia havia pouco tempo e, sem problemas de maior, tentava reintegrar-se na vida e nos trabalhos da aldeia na companhia do seu grupo de idade e dos irmãos mais novos, esperando poder mostrar aos mais velhos da aldeia que a vida militar não mudara em nada a sua aptidão e afinco no trabalho que aprendera desde os primórdios da sua juventude.

Ao mesmo tempo, as informações que circulavam não o deixavam sossegado. Os rumores davam o tenente Djamanca, o Carlos Bubacar Djau (2), o Sedjali Embaló (3) e outros, antigos oficiais e colegas do Batalhão dos Comandos, como presos algures em lugar incerto, talvez mortos, e havia que encontrar uma solução o mais rápido possível.

Uma noite decidiu falar com a mulher sobre o assunto. Deviam emigrar para o Senegal, afastar-se por algum tempo, deixar a poeira assentar. Que não, respondera a mulher, emigrar agora e deixar a família com um bebé nos braços, não podia ser, que esperassem ainda um pouco, talvez depois da próxima campanha agrícola.

Os olhos de Cissé emudeceram de lágrimas contidas, pois a mulher não compreendia o desespero da situação e ele sabia que não podia mostrar sinais de fraqueza. Precisamente, ele planeava passar as chuvas já no outro lado da fronteira. Nos dias que se seguiram falou com os seus pais, em especial com o tio paterno sobre o assunto, pedindo-lhes que intercedessem para convencer a mulher no maior sigilo possível, pois o assunto não podia ser do conhecimento público.

Entre outras coisas, chamou-lhes atenção sobre a presença assídua do homem da segurança do Estado que aos olhos de todos não passava de um idiota qualquer, animador da vida social na aldeia em promiscuidade constante com as mulheres, mas que, na realidade, trabalhava para a sua perda. Era ele que controlava a situação na aldeia e arredores, transmitindo as informações ao mais alto nível do Partido e da região. Passava todos os dias nas moranças como se viesse simplesmente cumprimentar os homens grandes, mas o objectivo era outro e Cissé sabia-o, sentindo-se vigiado por olhos e forças invisíveis cujo cerco se apertava de dia para dia.

Sentindo-se incompreendido e encurralado, não podendo aguentar mais, o jovem ex-comando começou a ser violento nas suas atitudes e numa tarde quente do mês de Abril [de 1978], por da cá aquela palha, passou mesmo a vias de facto com a mulher, tendo-a agredido e provocado alguns ferimentos na cabeça. Chegados ao posto sanitário para tratamento e, pela sua gravidade, o caso foi levado junto das autoridades que lhe deram ordem de prisão, sendo encarcerado dentro da residência do responsável pela segurança. Na solidão do cárcere, concluiu que aquilo que ele temia há muito, tinha finalmente chegado e agora estava nas malhas dos agentes da segurança, donde nunca poderia sair.

Por volta das 20 horas, já a noite se tinha abatido sobre a aldeia e, no desespero da causa, forçou a
janela do pequeno quarto que lhe servia de cela, saiu para a varanda da casa e reentrou, pelas traseiras, no quarto do homem da segurança e, como previa, estava ali a Aka (HK-47)  [foto à direita], pendurada na parede da casa. Inspeccionou e viu que a arma continha somente três balas. Abanou a cabeça de tristeza. O que poderia fazer com três balas num momento tão decisivo!?... Teria pensado. Saiu, contornando a área e dirigindo-se ao posto sanitário situado na zona central da aldeia, onde, nesse preciso momento e com a ajuda de um candeeiro petromax, estavam a suturar os ferimentos que ele tinha causado à sua esposa durante a briga da tarde. 

Apontou a arma para o circulo iluminado, não se sabendo bem se para matar a esposa desobediente, se o responsável da segurança que o tinha preso ou alguém do grupo dos curiosos que, entretanto, se tinham amontoado. O tiro da Kalash ecoou no ar e o candeeiro foi projectado pelos ares, aterrando-se a uma dezena de metros de distância. Entre gritos e gemidos de aflição, a multidão dispersou-se na noite escura, espalhando a noticia de um ataque a aldeia…, de mortos e de feridos…

Tudo leva a pensar que o Cissé ficou convencido ter cometido um acto tão irreversível quanto imperdoável e que poderia determinar o seu destino final, destino esse que, durante muito tempo na sua vida de soldado comando e em inúmeras ocasiões, durante as arriscadas missões em que participara, teria pensado, sem conseguir descortinar as suas reais formas. Quantas vezes perguntara a si mesmo quando e como seria a sua morte. Por bala ou por acidente? A única certeza que tinha era que não seria por doença.

Saiu da sua trincheira improvisada, contornou de novo a aldeia, seguindo por um trilho de cabras que atravessava a barreira dos arames farpados, entre o bairro mandinga de Morcunda e as ruínas do antigo quartel, embrenhando-se na escuridão dos arbustos à volta da pista de aviação, onde teria passado parte da noite, mergulhado na convulsão dos seus pensamentos confusos e de lembranças antigas da sua curta mas agitada carreira militar que agora subiam à tona.

Enquanto os guerrilheiros vindos em reforço andavam à sua procura no mato adjacente, durante a madrugada, qual animal ferido, ele teria voltado, sorrateiramente, junto a sua casa e, não tendo encontrado a esposa, ficara emboscado nas suas traseiras à espera dos primeiros raios do sol para finalizar a sua operação.

De manhã cedo, estavam os pais (o pai propriamente dito e seu tio, irmão do pai), sentados no “bentem” dos homens grandes, no centro da morança, a falar sobre os acontecimentos do dia anterior e, certamente, a reflectir sobre as possíveis consequências e medidas de precaução a tomar já que o problema se transformara, perigosamente, num caso de segurança de Estado com toda a região militar Leste em prevenção e de alerta máxima e, eis que surge, de repente, o vulto longilíneo de Cissé à porta da sua cubata, a poucos metros, com uma arma nas mãos e que os intimida nos seguintes termos:
- Olhem para o sol, seus velhacos, porque esta é a vossa última oportunidade em vida!!!

Todas as opiniões convergem no sentido de que ele dirigia estas palavras especialmente ao seu tio, com o qual nunca se dera bem, e que, na sua opinião, tinha contribuído negativamente para as difíceis relações com a sua mulher. Caçador profissional experiente, foi o primeiro a reagir, atirando-se ao chão num instinto de defesa. O mais velho, não sabendo ou não podendo reagir a tempo, ainda ficou petrificado e incapaz de reagir até sentir o assobio do projéctil perto das suas orelhas, para a seguir, também, imitar o irmão mais novo e estender o seu corpo esquelético e comprido no chão vermelho de poeira da sua morança como se estivesse morto, pensando na ousadia e atrevimento daquele garoto que ele criara com todo o amor de pai, antes de crescer e se transformar naquela máquina de Guerra insensível que os brancos apelidavam de Comandos africanos.

O Cissé tinha feito bem as contas, e pensando ter morto a esposa e os pais e, na certeza de que agora só lhe restava uma única bala, virou a Aka e meteu-a dentro da sua boca, premindo o gatilho. Era o fim…

Era o fim de um homem, de um jovem que tinha escolhido ser militar, um soldado da elite, que tinha participado e saído ileso nos assaltos as barracas de Oio e Morés em 1971; da invasão de Conakry em 71; que tinha visto com os seus olhos o cenário dantesco de morte e destruição na bolanha de Cufeu, em Maio de 73, durante o cerco a Guidage; da missão suicida e fratricida de Kumbamory em Junho do mesmo ano, dos raides e emboscadas sofridas naquele regresso lento e doloroso até à fronteira… E que tinha concluído que a vida sem honra e sem a dignidade, por que sempre lutara, não valia a pena ser vivida.

Foi assim o fim de um Comando africano, filho da aldeia de Fajonquito no Regulado de Sancorla, que no momento decisivo da sua vida, sentindo-se encurralado pelas estranhas circunstâncias da vida e incompreendido pela própria família, não querendo ser humilhado pelos Comissários do PAIGC pelos quais não nutria nenhuma simpatia e cuja legitimidade não reconhecia, só tinha três balas para cumprir a sua derradeira e última missão. Estava assim escrito que morreria de uma bala do inimigo, atirada pelas suas próprias mãos. Que a sua alma possa repousar em paz.

Nesse mesmo dia, quando chegaram os guerrilheiros, o Comandante da segurança, olhando para o corpo inerte de Cissé e o rio já escurecido de sangue que esvaíra da sua garganta esventrada, disse seca e asperamente aos homens e mulheres ali presentes:

- Este corpo que estão a ver é o de um cão nojento dos colonialistas que nos poupou o trabalho do seu fuzilamento.

Agora pergunta-se: Quantas vidas, quantos jovens ex-soldados, Comandos e não só, enganados e abandonados a sua sorte após a independência, terão sido obrigados a viver dramas semelhantes ou, dito por outras palavras, quantos terão sido imolados no altar dos quiméricos acordos e tácitos entendimentos entre o exército Português e os guerrilheiros do PAIGC, durante o processo da descolonização?

Feito em Fajonquito, aos 25 dias de Dezembro de 2017.

Com os testemunhos de Suleimane Pendo Baldé (o Camões); e de Mamadu Saido Candé (o Barbosa); com a autorização de publicação de Sambaro Candé (o João Henriques), irmão mais novo de Cissé Candé; tradução e texto de Cherno Abdulai Baldé (o Chico de Fajonquito).
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Notas do autor:

(1) Cissé ou Sissé Candé (as duas formas são utilizadas tanto para grafar nomes ou apelidos; no caso dos Mandingas é um apelido e para os Fulas de Gabu é um nome próprio mas de origem Mandinga). Desconheço como era escrito o nome do ex-comando que, pelas informações recolhidas, pertencia a 2.ª  Companhia dos Comandos Africanos.

(2) Carlos Bubacar Jau era natural de Fajonquito, foi alferes cmd da 2.ª Companhia e teria sido ele a patrocinar a entrada do Cissé nos Comandos.

(3) José Manuel Sedjali Embaló, natural de Fajonquito, era 2.º Sargento e pertencia à 1.ª  Companhia de Comandos.

Informação complementar  do editor:

Elementos recolhidos  a partir da pesquisa do cor inf ref Manuel Bernardo:

Abdulai Queta Jamanca: tenente“Cmd”, Cmdt CCaç 21 > Fuzilado em março de 1975, em Bambadinca. Incoprado em 12-1-1956, nasceu em 5/1/1937, em Farim; pertenceu originalmente à 1.ª CCmds Africanos. Era de descendência nobre ("príncipe fula").

Carlos Bubacar Jau: Alferes “Cmd” 2.ª CCmds Africanos; fuzilado no Cumeré; incorporado em 7-11-1971; nasceu em 13-3-1946, no concelho de Bafatá.

Sijali Embaló; furriel “Cmd” 1.ª CCmds Africanos. Fuzilado em 1974 no Cumeré: foi incorporado em  24/10/1966; nasceu em  7/5/1946, em Bafatá (concelho).
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 3 de janeiro de  2017 >  Guiné 61/74 - P16913: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (52): à semelhança da França (em relação aos seus "tirailleurs sénégalais"), quando é que Portugal reconhece aos seus antigos soldados guineenses a nacionalidade portuguesa?

Vd. primeiro poste da série > 19 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4553: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (1): A primeira visão, aterradora, de um helicanhão

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17899: In Memoriam (307): Ivo da Silva Correia (Fajonquito, c. 1974 - Bissau, 21/10/2017)... Era filho de um camarada nosso, da CCAÇ 3549 (Fajonquito, 1972/74). Morreu sem conhecer o pai português... É tarde, mas ainda vamos a tempo de lançar uma petição pública para que estes pobres "filhos do vento" vejam reconhecido o seu direito a serem também portugueses, além de guineenses... O "Ibu" passa a ser, a título póstumo, o membro nº 758 da nossa Tabanca Grande!





Guiné > Região de Bafatá > Setor de Contuboel > Fajonquito > Ivo da Silva Correia (Fajonquito, c. 1974 - Bissau, 2017)

Fotos: © Cherno Baldé (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Vítima de doença prolongada, faleceu  no passado dia 21 do corrente,  "o meu irmão Ibu (vulgo Ibulel)",  escreveu Aliu Baldé, na sua página do Facebook.

O Ivo da Silva Correia era natural de Fajonquito, nascido por volta de  1974 [ou já 1975],  segundo informação do nosso amigo Cherno Baldé,  que acrescenta mais o seguinte na sua página do Facebook:

(i) era filho de um soldado português da Companhia dos Deixós Poisar (CCAC 3549) que nunca o reconheceu; 

(ii) sem o devido enquadramento e a ajuda necessária, não conseguiu avançar por aí além na escola e, apesar dos apoios e solidariedade dispensada pela comunidade e colegas da sua Tabanca, sempre que era necessário, levou uma vida errática e bastante difícil, que acabou por o vitimar;

(iii) era um jovem afável e de bom trato;

(iv) foi sepultado no cemitério de Bissau. 

E termina o nosso amigo e irmãozinho, o "menino e moço" de Fajonquito que tem mais de 150 (!) referências no nosso blogue: "Fajonquito e os Deixós-Poisar perderam um dos seus filhos. Que a terra lhe seja leve e que, finalmente, encontre a paz de espírito que não teve em vida.  Amén".


2. Comentários de camaradas nossos na página do Cherno Baldé [foto à direita]:


(i) Hélder Valério de Sousa 

Lamentável que o desfecho tenha sido esse. Sabe-se que a Lei da Vida é assim mesmo,  mas, pelo relato do Aliu [Baldé] que o Cherno nos faculta, foi uma vida bem difícil e que, felizmente, contou com alguma solidariedade. Que possa descansar em paz.



Na minha aldeia [, Brunhoso, concelho de Mogadouro,] conheci alguns filhos de pai incógnito mais velhos do que eu, que embora conhecendo o seu pai, toda a aldeia sabia quem era, aceitavam esse facto como uma fatalidade natural.

Tal como nas aldeias também nas cidades ainda havia nesse tempo muitos filhos sem pai reconhecido. Por toda essa predisposição social, a acrescentar aos preconceitos raciais que existiam em todas as classes sociais e económicas, acho que não devo culpar esse soldado que abandonou o filho embora seja um acto condenável. Lamento a sorte do Ibu [Ivo]  que,  sem o apoio do pai branco, não conseguiu o equilíbrio que merecia. Que descanse em paz.


3. Comentário de LG:

O Ivo era um jovem conhecido do nosso Cherno Baldé, um "filho do vento" (, não gosto da expressão, porque é eufemística,  uma figura de estilo que usamos, de maneira cínica, que nada tem de romântcio ou poético, para escamotear ou disfarçar uma realidade cruel...), tal como a Cadija Seidi, e a Kumba Seidi, também nascidas por volta de 1973/74, em Fajonquito, filhas de soldados portugueses.

Já em 2013, o Cherno Baldé (*) tinha-nos dado notícias da existência do Ivo;

(...) "Filho de Sona Baldé, conhecida entre os soldados por Sonia, filha de Sadjo Baldé, antigo cozinheiro da tropa, nasceu em Fajonquito em 1975. O pai, de nome C..., não chegou a conhecer o filho, com o fim da comissão a Companhia de Caçadores n.º 3549, 'Deixs Poisar', comandada pelo Capitão Quadro Especial de Oficiais José Eduardo Marques Patrocínio e, posteriormente, pelo Capitão Miliciano Graduado de Infantaria Manuel Mendes São Pedro, deixou Fajonquito em junho de 1974, o pai nunca mais deu sinais de vida. 

"[ O Ivo] não está desesperado da vida, simplesmente gostaria de conhecer a cara do pai, pois dizem que são muito parecidos. A única referência que tinha do pai era uma fotografia que entretanto se deteriorou com o tempo." (...)


Todos estes homens e mulheres carregam histórias de amargura, discriminação racial, exclusão social, pobreza... São, brutalmente falando,  "restos"... do nosso império! (**).

Camaradas e amigos, este é assunto de que temos falado aqui no blogue, com alguma frequência...  Aliás, temos falado muito e feito pouco... Há um mês atrás, em 14 de setembro último, chegou-nos um pedido de publicação. Ou melhor: uma sugestão de texto para uma eventual petição à Assembleia da República...

Precisamos de alguém, com formação jurídica, de preferência, que agarre esta causa e que trabalhe melhor o texto... que podia ter o seguinte teor:

(...) "Durante o período em que durou a guerra colonial ou guerra do Ultramar, para uns, guerras da libertação nacional (1961-1975), para outros, estiveram ao serviço do Estado português, em Angola, Moçambique e Guiné, quase um milhão de homens portugueses (, sem esquecer os oriundos dos territórios ultramarinos, Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Macau e até Timor). Muitos destes militares mantiveram, durante o conflito, relações com mulheres locais, que resultaram em filhos.

Os filhos que os militares portugueses deixaram para trás,  vêm por este meio solicitar que o Estado Português lhes reconheça o seu legítimo direito à nacionalidade portuguesa, uma vez que são filhos de pais portugueses que, na maior parte dos casos, nunca irão ter a oportunidade de vir a conhecer.

Souberam das suas origens através das suas mães e familiares. E têm em comum toda uma vida de ostracismo e estigmatização nos seus países de origem, sobretudo a seguir à independência, onde foram cruelmente chamados de “restos de tuga” ou “sobras do colono”, e sofrem até hoje com o desconhecimento de metade da sua história. 

Conceder-lhes a nacionalidade que é dos seus pais desconhecidos,  seria uma forma de fechar um ciclo da História de Portugal." (...)

O texto pode ser melhorado, este é apenas um rascunho.

O sítio Petição Pública é o mais usado para estes fins e torna o processo de criação e divulgação da "causa" muito mais fácil. Depois de angariada alguma massa crítica é que se poderia formalizar o processo no sítio  da Assembleia República. Ver aqui o endereço na Net: Petição Pública - Serviço gratuito de petições online.

Para já, temos o dever (moral) de homenagear o Ivo e, na sua pessoa, todos os  demais filhos e filhas de militares  portugueses, que continuam a lutar, através da sua Associação, pelo direito à nacionalidade portuguesa.

O Ivo da Silva Correia (c. 1974-2017) (***)  passa a  ser, a título póstumo e simbólico,  membro da nossa Tabanca Grande. O seu lugar será o nº 758. Fica connosco, à sombra do nosso sagrado poilão, que nos une a todos, amigos e camaradas Guiné, vivos e mortos.  (****).

Obrigado, Cherno Baldé, por nos teres dado a esta notícia, embora triste. Sem ti, nunca ficaríam a saber que, afinal, estamos todos mais pobres, Fajonquito e a família da CCAÇ 3549.
_____________

Notas do editor:


(**) Vd. poste de 14 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11838: Os filhos do vento (13): Em busca do pai tuga: um reportagem, 3 vídeos, 19 histórias, 19 rostos, 19 nomes à procura do apelido paterno... Hoje no "Público", domingo, dia 14. A não perder.

(***) Último poste da série >  19 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17883: In Memoriam (306): Cadi Candé (c.1927-2017), arquétipo da mãe africana, exemplo de humildade, abnegação e coragem... Homenagem à mãe do nosso amigo e irmãozinho Cherno Baldé (Bissau)

(****) Vd. poste de 20 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17888: Tabanca Grande (450): António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71), natural da Vila de Fernando, Elvas, e novo membro da Tabanca Grande, com o nº 757... Faz parte da Associação de Alunos da Universidade Sénior de Vila Franca de Xira.

terça-feira, 18 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12852: Convívios (570): CCAÇ 3549 (Fajonquito, 1972/74): 29 de março, Sezures, Penalva do Castelo... Notícias, boas, por outro lado, do Cherno Baldé, o "Chico de Fajonquito", que está a trabalhar, em Bissau, num projeto do PNUD - Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento




1. Através de mensagem deixada na página do Facebook da Tabanca Grande, soubemos do anúncio do 15º convívio da CCAÇ 3549 / BCAÇ 3884 (Fajonquito, 1972/74), que se vai realizar no próximo dia 29, em Sezures, Penalva do Castelo, distrito de Viseu (Vd. localização aqui no mapa do Google).

Aqui fica o lembrete. Não temos mais informações: programa, preços, local de encontro, comissão organizadora...

Nos últmos  anos, um dos organizadores dos convívios anuais da malta da CCAÇ 3549 costumava ser o nosso grã-tabanqueiro José Cortes, autor da série Fajonquito do meu tempo

[, José Cortes, de Coimbra, foto atual à esquerda]. 

De qualquer modo, desejamos desde já aos nossos camaradas da CCAÇ 3549, seus amigos e familiares, uma bela e saudável jronada de convívio no próximo dia 29.

2. Temos, em contrapartida,  boas, reconfortantes, notícias do Cherno Baldé, o "menino e moço" de Fajonquito, o Chico de Fajonquito... [, foto à direita, com os 4 filhos, machos, na "festa do carneiro"]

Há dias perguntei por ele, já que o seu silêncio me estava a preocupar:

(...) "O que é feito de ti, querido amigo e irmão Cherno Baldé ? Estou preocupado com o teu "silêncio"... Ou és tu que não estás bem ou, mais provavelmente, somos nós que estamos mal"... (...)

Resposta, trranquilizadora, com data de hoje, de manhã:

Bom dia, irmão Luís Graça:

Eu estou bem e vocês continuam os mesmos de sempre, irreverentes e amigos da Guine e dos Guineenses.



Acontece que desde 2011 já nao estou no meu pacato mas pobre e desorganizado Ministério das Obras Públicas, primeiro passei pela célula de apoio da UE (Coordenação e gestão dos projetos financiados pelo FED) em Bissau,  e muito recentemente passei para um projeto do PNUD  [, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvinmento] e o tempo escasseia.

Um grande abraço,

Cherno Baldé

segunda-feira, 11 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11236: In Memoriam (145): Domingos de Sousa Torres, sold cond Berliet, CCAÇ 3549 (Fajonquito, 1972/74)...Funeral, hoje, às 10h30, Capela do Senhor dos Aflitos, Canelas, Vila Nova de Gaia... Até sempre, camarada! (José Cortes)


1. Mensagem de ontem, do nosso camarada José Cortes, ex-Fur Mil At Inf da CCAÇ 3549/BCAÇ 3884,Fajonquito, 1972/74 [, foto atual, à esquerda]:


Companheiros: 

É com bastante pesar que informamos da morte do nosso companheiro, Domingos de Sousa TORRES, que era o condutor da Berliet, na nossa companhia.

O funeral realiza-se 2ª feira, dia 11 de Março de 2013.

Amigo Luis, envio duas fotos do nosso amigo Torres, uma da Guiné e outra mais recente,

O corpo encontra-se em câmara ardente, na Capela do senhor dos Aflitos em Canelas, Vila Nova de Gaia, e o funeral é no dia 11/03/13, às 10.30 .









Mais um dia triste. Mais um companheiro da família da CCAÇ 3549,  "Doixós Poisar", que nos deixa. Saibamos honrar a sua memória e a memória dos demais camaradas que da lei da morte já se libertaram. Até sempre, camarada Torres!




Convívio CCAÇ 3549/BCAÇ 3884 (Fajonquito, 1972/74) > Canelas, Vila de Gaia >  O Torres é o que está em primeiro plano, ao centro,  de pé, junto da bandeira.


Guiné > Zona leste > Fajonquito > CCAÇ 3549/BCAÇ 3884 (Fajonquito, 1972/74) >  Da esquerda para a direita: Torres, Sérgio e Moreira... E quem serão aqueles dois "djubis", ao canto superior direito ? Um deles poderá ser o Cherno Baldé...


Guiné > Zona leste > Bafatá > CCAÇ 3549/BCAÇ 3884 (Fajonquito, 1972/74) >Almoço em Bafatá.  Da direita para a esquerda:  (1) Fur Mil Cortes, (2) Fur Mil Trms Farraia (já falecido) , (3) Torres, (4) (?), (5) Fur Mil Coelho, (6) Lobinho (Padeiro), (7) Magalhães, (8) Brás e (9) Paulo Matos.




Guiné > Zona leste > Fajonquito > CCAÇ 3549/BCAÇ 3884 (Fajonquito, 1972/74) > > Mecânicos e Condutores: da direita para a esquerda: Pinto (Mecânico), Sérgio (Combustíveis), Torres e Araújo (falecido)...

Fotos (e legendas):  © José Cortes (2011/13). Todos os direitos reservados

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11035: Memória dos lugares (209): Fajonquito 2011 - Vestígios da tropa portuguesa (Cherno Baldé)

1. Mensagem do nosso amigo tertuliano Cherno Baldé, com data de 27 de Janeiro de 2013:

Caro Luís e Carlos Vinhal,
Junto envio algumas imagens no intuito de proceder a eventual decoração do ultimo texto enviado para publicação.

Um abraço amigo
Cherno Baldé

PS: - Tenho recebido, ultimamente, uma avalanche de pedidos de amizade via facebook, de antigos combatentes da Guiné, que muito me comoveram e aproveito para agradecer a toda a equipa de Editores e Colaboradores da Tabanca Grande, em especial ao Carlos Vinhal que, desconfio, deve estar a impulsionar esta euforia de manifestação de amizade que muito me honra.


Vestígios da caserna - abrigo do segundo pelotão no lado norte do quartel de Fajonquito. Na imagem, por baixo, ainda é visível o emblema da companhia.
CCAC 3549 - DEIXÓS-POISAR - 1972-74 (Foto de 2011)

Fajonquito > Aqui era um posto de vigilância, equipado com uma metralhadora no ângulo sudoeste do quartel, entre a pista dos aviões e o paiol de munições. As mangueiras são vestígios de antigas habitações da população mandinga que fugiu da aldeia no início da guerra. 
Na foto: Cherno, filhos e uma sobrinha (filha de Algassimo, um amigo de infância).

Fajonquito > Antiga casa do gerador, onde trabalhava o Morais,  situada no centro do aquartelamento. 
Na foto: Domingos, Cadijatu e Yussuf.

Fajonquito > Aqui era o campo de futebol cinco, ao fundo vê-se a antiga casa comercial Ultramarina onde residia o Capitão da companhia e funcionava a messe dos oficiais. 
Na foto: Cadijatu (sobrinha), Domingos, Yussuf e Abduramane (meus filhos).

Fajonquito > Em 1969, a CCAC 2435 de Capitão Carvalho reorganizou e construiu o sistema defensivo do aquartelamento de Fajonquito. Nessa altura, deslocaram a parte da população que vivia no lado Oeste para o lado Este, libertando espaço de tiro e de manobra táctica as tropas estacionadas no quartel.

Fajonquito > Antigo paiol de munições, situado no ângulo oeste do aquartelamento, construído pela CCAC 2435 em 1969 (as mangueiras testemunham vestígios de antigas habitações da população deslocada (fulas) ou fugida para o mato (mandingas).

Fajonquito > Poilão que, entretanto, cresceu majestoso no centro do antigo quartel entre a antiga casa do gerador (onde se vêem as barracas) e o campo de futebol de onze.

Bissau, Janeiro de 2012 > Domingos (Mohamed Ali) e Luís (Bubacar) no jardim da Praça dos Heróis Nacionais/ Império. Ao fundo estão os escritórios da CAON-FED, meu local de serviço, actualmente.

Bissau > A caminho do Carnaval 2012. A minha esposa, seus dois filhos mais novos (Ali e Buba) e Fatinha (sobrinha).

Bissau, 2011 > Cherno Baldé repousando em casa.
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Notas do editor:

- Estas fotos faziam parte de um trabalho que o nosso amigo Chico nos mandou em formato Power Point. Conforme acordado com ele, depois de transformadas em JPEG,  aproveitaram-se para ilustrar a série Memória dos Lugares.

Vd. último poste da série de 27 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11013: Memória dos lugares (208): Buruntuma, memorial da CART 1742 (1968/69) (Eduardo Campos)