Angola > c. 1972 > Eu, junto à barragem no Dundo, um lugar aprazível
Foto (e legenda): © José Manuel Matos Dinis (2016). Todos os direitos reservados.
Parte II:
Um "estado dentro do estado"
[ O José Manuel Matos Dinis, ex-fur mil at inf, CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, nosso grã-tabanqueiro e adjunto do régulo da Magnífica Tabanca da Linha, Jorge Rosales, depois do seu regresso a casa, a Cascais, em janeiro de 1972, vindo a Guiné, rumou até Angola, em maio de 1972, para ir viver e trabalhar na Lunda, na melhor empresa angolana na época, a famosa Diamang - Companhia de Diamantes de Angola, com sede no Lundo,. Aqui aqui casou (por procuração), aqui viveu e trabalhou, aqui nasceu o seu primeiro filho... Desafiámo-lo justamente a falar da sua experiência angolana em meia dúzia de crónicas memorialísticas. Ele aceitou galhardamente o desafio.]
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Tenho quase a certeza de que a descrição sobre a actividade mineira (*) deve ter sido improfícua, pois, para além de não ter correspondido à melhor descrição sobre uma lavaria clássica de "pans", e sobre as acções de remoção de terras e de cascalho que antecediam a limpeza da rocha-base em cada corte, e ainda sobre as necessárias protecções às copiosas chuvas que caíam no decurso de cada ano, pelo que o interessa de mais pormenores técnicos, que os há em muito mais vertentes, podem ter constituído uma forte motivação desmotivadora de futuras leituras nesta série. Nesse caso, façam o favor de apresentar reclamações ao nosso Comandante-mor Luís Graça, que eu agradeço o favor para entrar antecipadamente de férias.
Mas afinal, que negócio é esse dos diamantes? É um "fétiche", direi eu. De facto, os diamantes servem para muito pouca coisa, e os que servem, são os industriais, precisamente os de menor valor. Os outros, os que cintilam de brilhos e são usados como adornos, não prestam para nada. Mas valem muito dinheiro, são atributos de riqueza e de poder. Destas razões é que resulta o grande fascínio ou interesse pelos diamantes.
Mas afinal, que negócio é esse dos diamantes? É um "fétiche", direi eu. De facto, os diamantes servem para muito pouca coisa, e os que servem, são os industriais, precisamente os de menor valor. Os outros, os que cintilam de brilhos e são usados como adornos, não prestam para nada. Mas valem muito dinheiro, são atributos de riqueza e de poder. Destas razões é que resulta o grande fascínio ou interesse pelos diamantes.
Em Angola, a exploração terá começado na sequência das explorações congolesas, pois boa parte dos leitos dos rios correm na direcção daquela colónia portuguesa, e os mineiros da época devem ter admitido que facilmente haveria mais diamantes do lado ocidental.
Em 1912 Johnston e Mac Vey aumentaram as certezas sobra a existência de diamantes em Angola, após a descoberta de 7 gemas num riacho afluente do rio Tchiumbe. Foi fundada a PEMA, empresa de pesquisas que começou a laborar nesse ano sob impulso da empresa belga Forminière.
Em 1912 Johnston e Mac Vey aumentaram as certezas sobra a existência de diamantes em Angola, após a descoberta de 7 gemas num riacho afluente do rio Tchiumbe. Foi fundada a PEMA, empresa de pesquisas que começou a laborar nesse ano sob impulso da empresa belga Forminière.
Em 16 de Outubro de 1917, com recurso a capitais mistos de Portugal, Belgica, Estados Unidos da América, Grã-Bretanha e África do Sul nasceu a Diamang - Companhia dos Diamantes de Angola, que veio a tornar-se na empresa mais emblemática e contestada daquela colónia, que para além da actividade prosseguida na prospecção e exploração de diamantes, desenvolveu muitas outras ligadas à diferentes áreas de investigação, e a trabalhos tão diferentes quanto a agricultura e pecuária, assistência social médica e medicamentosa, e ainda veio a revelar-se de grande importância na concessão de empréstimos financeiros, quer ao Governo central, quer ao governo colonial ou provincial.
Mas não ficou por aí, a Companhia construíu importantes infra-estruturas, de que se pode salientar duas barragens para consumo energético interno e para fornecimento da rede pública até vastas extensões para além da área de concessão; uma vasta rede de estradas em asfalto ou terra-batida; a construção de escolas, ou promoção de manifestações artísticas; e o financiamento, e por vezes com apoio técnico exclusivo ou em cooperação, de muitas outras iniciativas. A Companhia, por norma, também garantia a manutenção daquelas obras de carácter público e privado.
Esta a parte simpática da questão, porque também havia uma parte antipática sobre a influência da Diamang noutros sectores da vida pública e social da comunidade provincial. Refiro-me à repetida contestação sobre a isenção da generalidade dos impostos com que deixava de contribuir para o erário público.
Esta a parte simpática da questão, porque também havia uma parte antipática sobre a influência da Diamang noutros sectores da vida pública e social da comunidade provincial. Refiro-me à repetida contestação sobre a isenção da generalidade dos impostos com que deixava de contribuir para o erário público.
Além disso, por congeminações que fiz na época após a leitura de diversos relatórios do Banco de Angola, fiquei com a sensação de que os diamantes angolanos (os melhores da produção mundial) eram vendidos à Central Selling pelo preço médio praticado, o que a confirmar-se, terá redundado em grosso prejuízo para a nação, e em vantagem suplementar para o "trust" internacional que controlava o negócio. Nesta matéria, as diferenças qualitativas, de dimensão e cristalização eram muito importantes no estabelecimento de diferenças de preço sobre a unidade - o quilate.
Outro aspecto muito antipático residia na existência de uma polícia privada, e da permanência de companhias de "Voluntários", bem como pelo acolhimento de alguns militares catangueses, que para além de funções de segurança e do controle sobre o movimento das populações, dissuadia à penetração de outras pessoas que não estivessem relacionadas com a Empresa. Daí, dizer-se com desdém e crítica implícita, que a Diamang era um estado dentro do Estado.
O que era inegável, era a grande importância das receitas geradas na província com os negócios implicados em torno da Companhia, quer em fornecimentos directos, quer em fornecimentos indirectos, pois havia já mais de dois mil empregados europeus com níveis de vida e de poupanças invejáveis, bem como um considerável número de empregados autóctones com funções especializadas e o conjunto representava níveis de despesa familiar de certo modo importantes na economia da província.
O que era inegável, era a grande importância das receitas geradas na província com os negócios implicados em torno da Companhia, quer em fornecimentos directos, quer em fornecimentos indirectos, pois havia já mais de dois mil empregados europeus com níveis de vida e de poupanças invejáveis, bem como um considerável número de empregados autóctones com funções especializadas e o conjunto representava níveis de despesa familiar de certo modo importantes na economia da província.
O valor patrimonial da Companhia era incomensurável e garantia importantes receitas para muitas empresas de representações comerciais (de origens nacionais e estrangeiras) em Angola. Portanto, não me parece razoável destacar uma ou outra faceta, quer para apoiar os privilégios de que a Empresa gozava, quer os níveis de exigência ou de denegrimento dos mesmos.
O ano de 1973 terá sido o primeiro em que a produção alcançou e ultrapassou os dois milhões de quilates, objectivo que exigiu muita aplicação e dedicação do conjunto dos empregados da área de produção, para que se potenciassem os meios com vista ao alcance daquele fim.
O ano de 1973 terá sido o primeiro em que a produção alcançou e ultrapassou os dois milhões de quilates, objectivo que exigiu muita aplicação e dedicação do conjunto dos empregados da área de produção, para que se potenciassem os meios com vista ao alcance daquele fim.
Em 1974, segundo informação obtida na Net, a produção bateu o record de dois milhões e quatrocentos mil quilates, que resultaram da contratação de mais técnicos e abertura de turnos em algumas das explorações de maior nível absoluto de produção.
O rendimento geral da actividade, se me for permitido fazer uma crítica, poderia ir ainda mais além, se tivesse havido bons níveis de formação de pessoal ao nível dos chefes de minas (e de lavarias, no caso das independentes), pois vieram a constatar-se perdas relevantes nas lavarias de meio-denso cujos encarregados estariam menos bem preparados ou sensibilizados. E havia empregados de excelente nível e dedicação para fazerem escola.
Mas o negócio era tão rico, que a preocupação sobre a rentabilidade não podia ser assacada à incompetência e laxismo dos responsáveis, antes era apontada aos limites dos equipamentos de produção. A este propósito sobre a excelência dos modelos de produção, a contrário senso, sugiro que procurem na Net as imagens de Olivier Polet - "dans une mine de diamants en Angola". Parece corr
esponder à liberdade do absurdo, e os donos do negócio comprazerem-se com os lucros sem atenderem às inumanas condições de trabalho, nem à melhor rentabilidade dos meios, que não se comparam, nem de longe, ao que se praticava na Diamang.
(Continua)
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Nota do editor:
Último poste da série > 6 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16055: As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte I: de Cascais até à Portugália / Dundo...
(...) Em Janeiro de 1972 tinha saído da tropa, dava passeios e namorava pelo litoral de Cascais, onde outros casais nos faziam concorrência. Os meus amigos estavam na vida militar, acabavam os cursos, ou já tinham iniciado actividades profissionais. Já não era como antes, quando a malta se reunia como seita para a paródia, ou para entusiásticas futeboladas. Namorava com envolvimentos familiares, e tinha a obrigação de procurar definição de vida. Não queria trabalhar debaixo de um tecto, e por isso, ficava excluída uma preparação profissional que tinha iniciado antes da tropa.(...)
esponder à liberdade do absurdo, e os donos do negócio comprazerem-se com os lucros sem atenderem às inumanas condições de trabalho, nem à melhor rentabilidade dos meios, que não se comparam, nem de longe, ao que se praticava na Diamang.
(Continua)
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Nota do editor:
Último poste da série > 6 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16055: As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte I: de Cascais até à Portugália / Dundo...
(...) Em Janeiro de 1972 tinha saído da tropa, dava passeios e namorava pelo litoral de Cascais, onde outros casais nos faziam concorrência. Os meus amigos estavam na vida militar, acabavam os cursos, ou já tinham iniciado actividades profissionais. Já não era como antes, quando a malta se reunia como seita para a paródia, ou para entusiásticas futeboladas. Namorava com envolvimentos familiares, e tinha a obrigação de procurar definição de vida. Não queria trabalhar debaixo de um tecto, e por isso, ficava excluída uma preparação profissional que tinha iniciado antes da tropa.(...)