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sexta-feira, 22 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P16001: Nota de leitura (832): “A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães”, por Jorge Sales Golias, Edições Colibri, 2016 (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Abril de 2016:

Queridos amigos,
Atenda-se ao que Carlos de Matos Gomes escreve no prefácio desta narrativa que possui os requisitos para fazer parte da investigação histórica indispensável:
"Os relatos das reuniões de militares na Guiné desmontam pela base as calúnias que por vezes surgem sob a forma de interpretações históricas, atribuindo à contestação dos militares que roubaram a ditadura a uma mera e mesquinha motivação corporativa. O livro de Jorge Golias expõe a desonestidade desses adeptos do antigo regime e do colonialismo".
Em boa hora Jorge Sales Golias passou a escrito e deu sequência a factos históricos que a generalidade do povo português, e mormente as novas gerações precisam de conhecer para clara certidão da verdade de um teatro de operações que se encaminhava para uma tragédia do tipo de Índia.

Um abraço do
Mário


A descolonização na Guiné-Bissau e o movimento dos capitães (1)

Beja Santos

Oportunidade única de conhecer pela boca de um dos seus protagonistas o que foi o processo de descolonização da Guiné encetado formalmente a 26 de Abril de 1974, com a tomada do poder pelo núcleo do MFA da Guiné. A narrativa é de um capitão de Operações de Transmissões que acompanhou a génese do MFA da Guiné e terá um papel preponderante nos acontecimentos que antecedem o reconhecimento da independência da República da Guiné-Bissau: “A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães”, por Jorge Sales Golias, Edições Colibri, 2016.

Jorge Sales Golias chega a Bissau em Junho de 1972, viaja na companhia do Capitão Miliciano José Manuel Barroso, jornalista do “República”, que irá desempenhar relações de funções públicas no Gabinete do General Spínola e do Capitão (Comando) Carlos de Matos Gomes que ia para a sua terceira comissão. Ficará colocado no Agrupamento de Transmissões, explica-nos as suas missões, a sua relação com o Comandante do Agrupamento Tenente-Coronel Mateus da Silva, outra figura preponderante no 26 de Abril de 1974 em Bissau e período seguinte. Em pinceladas grossas, descreve a situação militar na Guiné, ao tempo da sua comissão: a reocupação do Cantanhez, a perda da supremacia aérea, os acontecimentos de Guidage, Guileje e Gadamael e o estado de desmoralização das tropas, cada vez mais acantonadas aos seus destacamentos. Com detalhe, menciona a reunião dos Altos Comandos de 15 de Maio de 1973 e a perceção de tragédia que lhe está subjacente.

A narrativa inflete para a origem do Movimento dos Capitães, reuniões que passam a ter lugar a partir do final do ano de 1972 e que têm o seu pico alto em 12 de Agosto de 1973 quando se discute, no Clube de Oficiais de Bissau, o decreto-lei n.º 353/73, reunião que dá lugar a outra e pela primeira vez ouve-se a palavra revolução, a 28 de Agosto surge uma carta que irá recolher 52 assinaturas, aquela que, segundo o autor é a carta fundadora do Movimento dos Capitães. Os contactos extravasam para Lisboa, e depois para o país. Alguns dos subscritores da carta dos 52 passam a participar nas reuniões na metrópole. Começa a evoluir-se para um golpe de Estado que apeie Marcello Caetano e derrube o seu regime. O MFA da Guiné, por sua conta e risco, preparou o Plano B do MFA, no caso de falhar o golpe em Lisboa, seria a vez dos militares em Bissau.

Em 25 de Abril, os serviços de escuta das Transmissões trouxeram as primeiras notícias pelas 5 de manhã, começam então em Bissau reuniões no Batalhão de Caçadores Paraquedistas, estão presentes o seu Comandante e oficiais de outras Unidades, como Raúl Folques, Matos Gomes, Zacarias Saiegh, Sosua Pinto, Pessoa Brandão. À tarde delineiam-se os planos de operações para controlar todos os pontos sensíveis e chegar à fala com o Governador Bettencourt Rodrigues e outras figuras preponderantes das Forças Armadas. Sabe-se que Bettencourt Rodrigues não só não reconheceu a Junta de Salvação Nacional como deu instruções à PIDE para seguir os movimentos dos oficiais do MFA.

Na manhã de 26, estes militares do MFA Guiné dirigem-se à Amura e entram no gabinete do Governador e Comandante-Chefe. Ocorre uma altercação que envolveu o Brigadeiro Leitão Marques, mas tudo acaba corretamente, fazem-se detenções formais e o Tenente-Coronel Eduardo Mateus da Silva é convidado pelo MFA da Guiné para encarregado do Governo, o Comodoro Almeida Brandão só aceitou desempenhar as funções de Comandante-Chefe. Jorge Sales Golias é nomeado Chefe de Gabinete de Mateus da Silva. Entra-se em conversações com os representantes da sociedade civil, procede-se à libertação de presos políticos, tiveram lugar alguns desacatos tanto em Bissau como no interior, caso de assaltos a casas comerciais. Procede-se à primeira organização de estruturas de apoio ao Governo até que em 7 de Maio o Tenente-Coronel Carlos Fabião foi designado por Spínola para novo encarregado do governo. Traz instruções precisas de Spínola: negociar o cessar-fogo; tratar o PAIGC como um partido igual aos outros; promover um referendo com vista a uma solução federativa. Mas Carlos Fabião apercebe-se rapidamente que tudo mudara, no contexto internacional, na evolução da guerra, no próprio estado de espírito das Forças Armadas Portuguesas. A especificidade do MFA na Guiné garante a sua presença na estrutura executiva do Governo, Mateus da Silva vai a Lisboa com uma agenda que inclui em todos os pontos entrar em negociações com o PAIGC. Spínola revela-se dramático, vai criando a sua própria agenda, pensa mesmo ir a Bissau a um Congresso do Povo, seria aclamado e subverteria os propósitos de independência do PAIGC. Enquanto tudo isto ocorre, a diplomacia move-se em Dakar, Londres e Argel, as nossas tropas começam a conviver com as forças do PAIGC, logo em 19 de Maio o Capitão Silva Ramalho, da Companhia de Sare Bacar, convive com as forças de Quemo Mané, é patente uma grande desorientação entre os comissários políticos e os comandantes militares do PAIGC.

É um período de intensos boatos, de reagrupamento de forças políticas, conflitos de trabalho, de greves. É neste contexto que se institucionaliza o MFA na Guiné e Jorge Sales Golias pormenoriza a orgânica da Estruturação Democrática do MFA.

Encetam-se conversações com as forças do PAIGC, disciplinam-se os relacionamentos hierárquicos, travam-se exageros e radicalismos. As tensões políticas metropolitanas refletem-se na Guiné-Bissau entre moderação e extrema-esquerda. No centro político estava o Alferes Miliciano João Ferreira do Amaral, na extrema-esquerda o Alferes Miliciano Celso Cruzeiro, dinamizador do Movimento para a Paz que reivindica à cabeça o cessar-fogo imediato, sem condições. Sales Golias comenta: “Oportunistas que na altura eram mais revolucionários do que os capitães do MFA. Consequência de o MFA na metrópole não ter ainda definido as linhas principais de atuação e estar dependente da vontade de Spínola e do governo”.

E em 1 de Julho de 1974 realizou-se a primeira Assembleia-Geral do MFA na Guiné. O ponto alto da Assembleia foi a aprovação por aclamação de uma moção em que se apelava para o Governo português reconhecer a República da Guiné-Bissau, para que se reatassem as negociações com o PAIGC, após o impasse de Argel, e apelava-se para que os militares portugueses encarassem a sua presença atual e futura na Guiné como forma de prestar a sua cooperação desinteressada ao povo da Guiné.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 18 de abril de 2016 Guiné 63/74 - P15987: Nota de leitura (831): “As guerras coloniais portuguesas e a invenção da História”, por Luís Quintais, Imprensa de Ciências Sociais, 2000 (Mário Beja Santos)

sexta-feira, 15 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P15978: Nota de leitura (830): Jorge Sales Golias, um capitão eng trms, no TO da Guiné (1972/74), que teve um papel prepoderante no MFA, no 25 de abril e no processo de descolonização: escreve um livro de memórias 40 anos depois

Foi ontem feito  o lançamento oficial do livro de Jorge Sales Golias (*). Infelizmente, não nos foi possível comparecer por estarmos com aulas à hora em que se realizou a sessão. Mas aqui ficam  mais alguns elementos informativos sobre o livro, com destaque para o seu detalhado índice. 

Esperemos que alguns dos nossos leitores queira e possa fazer-nos chegar, para publicação, a sua "nota de leitura" deste livro, escrito por antigo capitão eng trms, no TO da Guiné, que teve um papel prepoderante no MFA da Guiné e no processo de descolonização. (**) LG

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Título: A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães

Editora: Colibri
Ano: 2016
Data de publicação: Abril de 2016
Temas: História ContemporâneaDescolonizaçãoRevolução
Colecção: Memórias de Guerra e Revolução
Capa: capa mole
Tipo: Livro
N. páginas: 376
Formato: 23x16
Peço de capa: 20,00 €
ISBN: 978-989-689-570-9

Sinopse:

No caso de A Descolonização da Guiné - Bissau, MFA 72-74, de Jorge Golias, a História é o trabalho sério e rigoroso, pessoal, de colocação no seu devido lugar do que aconteceu na Guiné – "província ultramarina" de Portugal desde o início do processo que conduziu ao 25 de Abril de 1974 até ao fim da guerra que ali decorreu durante onze anos, à transferência da soberania para o PAIGC e ao içar da bandeira da República da Guiné-Bissau. É uma história complexa, tão importante como desvalorizada e, tantas vezes, adulterada.

O livro de Jorge Golias é também um resgate da verdade, feito com uma invulgar abordagem da escrita, em que o tempo da narrativa é o tempo da história e a aventura individual do autor é o fio de Ariadne que permite seguir a série de acontecimentos que vamos encontrar até ao embarque do último representante da soberania portuguesa em Bissau. O resultado é uma crónica dos dois anos de 1972 a 1974, que o autor escreve como se estivesse a vivê-los hoje. [Carlos de Matos Gomes] 

 A Descolonização da Guiné-Bissau tinha tudo para correr mal: 
– Os nossos militares na Guiné, de todas as patentes, clamavam pelo "regresso imediato a Portugal"; – O povo português em Lisboa gritava “nem mais um soldado para o Ultramar; 
– O PAIGC, muitas vezes, não se entendia e dava ordens contraditórias e provocatórias. 
 – Spínola opunha-se ao reconhecimento e defendia um referendo de continuidade numa comunidade lusíada. 
A Descolonização surge assim como a síntese destes contrários, promovida pelo MFA na Guiné e pelo governador e comandante-chefe, com o apoio do MFA em Portugal [Jorge Sales Golias]



Índice:

PREFÁCIO [, de Carlos Matos Gomes]

1. A CHEGADA A BISSAU 
O choque térmico 
As primeiras impressões 

2. AS MINHAS MISSÕES 
A minha guerra 
A missão a Jemberém 
Outras missões 
Outras actividades 
À margem da guerra 
A minha outra guerra

3. “ZOE” – A REVISTA DO AGRUPAMENTO TM

4. A SITUAÇÃO MILITAR NO TO DA GUINÉ 
A reocupação do Sul-Cantanhês 
A perda da supremacia aérea 
O cerco e a libertação de Guidage 
A retirada de Guileje 
O inferno de Gadamael 
A guerra dos 3 G’s 

5. A SITUAÇÃO POLÍTICA NO TO DA GUINÉ 
A posição do governo português 
A marca Spínola 
Reunião de Altos Comandos de 15 de Maio de 1973 
A partida do centurião 
Um estudo do Estado-Maior 
O General Bettencourt Rodrigues e os sinais do fim próximo 

6. AS ORIGENS DO MOVIMENTO DOS CAPITÃES 
As primeiras reuniões 
O papel do Agrupamento de Transmissões 
A primeira Comissão do Movimento de Capitães 
Episódio tenente-coronel Luís Ataíde Banazol 

7. O 25 DE ABRIL NA GUINÉ-BISSAU 

8. GOLPE MILITAR EM BISSAU E DIAS SEGUINTES 
A tomada do poder em 26 de Abril 
1º Encarregado de governo – ten-cor Mateus da Silva 
Incidentes no interior 
Primeira organização de estruturas de apoio ao governo 
2º Encarregado de governo – ten-cor Carlos Fabião 
O MFA na Guiné-Bissau 
Agenda do tenente-coronel Mateus da Silva para Lisboa 
Encontros de Dakar, Londres.1, Londres.2, Argel.1 e Argel.2 
Legalização de partidos políticos 
Acontecimentos deste período – até 30 de Junho 
Contratempo com ordem de desmobilização do MFA 
Institucionalização do MFA na Guiné 
Organização da Área da Informação 

9. A DESCOLONIZAÇÃO DA GUINÉ-BISSAU 
Primeiras actividades 
O Movimento Para a Paz – MPP 
Visita de trabalho da Comissão Coordenadora do Programa 
Chamada a Lisboa de oficiais do MFA 
Assembleia do MFA na Guiné de 1 de Julho 
Reunião marginal de Fuzileiros 
O Congresso do Povo 
Ultimatos do PAIGC 
Retracção do dispositivo 
A Companhia 18 
O problema das Tropas Africanas 
Reunião Extraordinária dos órgãos do MFA 
Acontecimentos até 31 de Julho 
Encontros no Cantanhês em 15, 16 e 18 de Julho 
Assembleia Geral do MFA de 29 de Julho 
A caminho da independência de jure – de 1 a 31 de Agosto 
A Transferência de Poderes – de 1 de Set a 14 de Outubro 

10. IMPRESSÕES E EMOÇÕES À DISTÂNCIA DE 40 ANOS 

BIBLIOGRAFIA E FONTES 
LISTA DE SIGLAS 
LISTA DE ANEXOS 
ANEXOS E APÊNDICES 
CALENDÁRIO DO 25 DE ABRIL NA GUINÉ 
LISTA DE NOMES 

O autor > JORGE SALES GOLIAS:

(i) nasceu em 1941 em Mirandela:

(ii) cursou a Academia Militar (Exército-Arma de Transmissões) e licenciou-se em Engenharia Electrotécnica no IST;

(iii) participou na guerra colonial (Guiné 72-74) e no 25 de Abril de 1 9 74;

(iv) foi chefe de gabinete do Encarregado do Governo da Guiné, membro da Assembleia do MFA , assistente do Conselho de Administração dos CTT/TLP e adjunto do Chefe de Estado- -Maior do Exército;

(v) tem o posto de Coronel, reformando-se em 1992 e fazendo depois uma carreira de gestão de empresas nas áreas de investigação e desenvolvimento de electrónica.

 (vi) é sócio de: A25A, Liga dos Amigos do Arquivo Histórico Militar, Casa de TMAD e Academia de Letras de Trás-os-Montes;

(vii) integra a Comissão da História das Transmissões Militares e o Grupo de Amigos do Museu das Transmissões; 

(viii) é co-autor das seguintes obras: Vinte e Cinco de Abril – 10 anos Depois, As Transmissões Militares – da Guerra Peninsular ao 25 de Abril, Mirandelês” e “Bicentenário do Corpo Telegráfico 1810-2010. Coordena a Tertúlia Transmontana na Casa de Trás -os-Montes e Alto Douro;

(ix) elo seu papel no 25 de Abril é citado na História de Portugal, de José Mattoso,  e tem o seu nome inscrito no monumento aos Capitães de Abril, em Grândola: 

(x) é  cronista regular do Notícias de Mirandela, e tem colaborado com a "Revista Raízes", com o Notícias de TMAD e "O Referencial", da A25A.


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Notas do editor:

(*) vd. poste de 7 de abril de 2016 Guiné 63/74 - P15948: Notas de leitura (825): "A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães", de Jorge Sales Golias (a lançar na 5ª feira, dia 14, em Lisboa): pré-publicação de um excerto por cortesia do autor: A perda da supremacia aérea – Março de 1973
(**) Último poste da série > 15 de abril de  2016 > Guiné 63/74 - P15977: Nota de leitura (829): “A África começa mal”, de René Dumont, edição portuguesa de 1965 (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P15948: Notas de leitura (825): "A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães", de Jorge Sales Golias (a lançar na 5ª feira, dia 14, em Lisboa): pré-publicação de um excerto por cortesia do autor: A perda da supremacia aérea – Março de 1973


Guiné > Pós 25 de abril > Primeiro encontro entre as NT e o PAIGC > O Cap Silva Ramalho, companhia de Saré Bacar [, na fronteira com o Senegal, a 39 km a nordeste de Contubole], sentado à direita, de óculos escuros, a falar com um representante do PAIGC, através de um intérprete.

Foto (e legenda): © Jorge Sales Golias (2016). Todos os direitos reservados



Capa do livro de Jorge Sales Golias, "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016), a ser lançado no próximo dia 14 deste mês, 5ª feira, às 18h, na CPHM - Comissão Portuguesa de História Militar, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, 11, Lisboa. (*)


1.  Mensagem de Jorge Sales Golias, do dia 5 do corrente:

Boa noite, camarada Luís,

Agradeço-lhe as suas palavras e, bem assim, toda a explicação detalhada sobre a perfomance do blogue.

Não lhe vou prometer grande colaboração porque estou envolvido numa teia de compromissos que me esgotam os tempos livres. Mas quem corre por gosto não cansa.

E para prestar a minha homenagem a este site extraordinário que o camarada  coordena.  vou então mandar-lhe para pré-publicação um extracto do texto do  livro "A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães". 

Mando  também uma foto não publicada sobre o 1º Encontro NT-PAIGC.

Abraço do Jorge Golias,

Jorge Sales Golias,  transmontano de Mirandela, nascido em 1941, ex-cap eng trms, licenciado em engenharia electrónica pelo IST - Instituto Superior Técnico, membro do MFA, Bissau, adjunto do CEME, gen Carlos Fabião em 1974/75, cor trms ref, administrador de empresas].



2. Excerto do livro "A Descolonização da Guiné-Bissau e o Movimento dos Capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016).  Cortesia do autor (**)


(...) A perda da supremacia aérea – Março de 73

As comunicações mais críticas no TO eram, sem dúvida, as de pedido de apoio aéreo (APAR). A rede de APAR de VHF funcionava nas frequências exclusivas de 49,0 e 51,0 MHz. Em combate, as ligações faziam-se entre os E/R AVP-1 e os E/R ARC-44 do aéreo (59).

Esta ligação era dificultada pela não total compatibilidade dos rádios do Exército e da Força Aérea, mas sempre se fazia satisfatoriamente, o que era vital, pois em situações de combate, nomeadamente de emboscadas, o apoio aéreo era prestado em poucos minutos, dadas as curtas distâncias em jogo.

Tal status garantia às NT que as situações de confronto eram relativamente curtas, pois os guerrilheiros do PAIGC sabiam que rapidamente ficavam sob fogo aéreo dos aviões T-6 e Fiat G-91 e retiravam, dispersando antecipadamente.

Outro apoio vital era o das evacuações por helicóptero (Allouette) directamente do mato para o Hospital Militar de Bissau (HMB). Os pedidos de apoio aéreo feitos para a Base Aérea Militar eram em HF, com os AN/GRC-9 (60) e os RACAL TR-28.

No entanto, o status da supremacia aérea, determinante para as NT desde o início da guerra em 1963, viria a perder-se em 1973, dez anos depois, com a introdução no campo de batalha, pelo IN, dos mísseis terra-ar SAM-7 (STRELA), de fabrico soviético. Estes eram portáteis a dorso e actuavam orientados por raios infravermelhos e visando a fonte quente do aéreo.

Registo a este respeito os primeiros abates no TO de FIAT G-91, em Março de 1973, um com o tenente Miguel Pessoa em Guileje (61)  que se ejectou e foi recuperado pelas NT (através de uma operação especial no dia seguinte) e outro, dias depois, pilotado pelo tenente-coronel Almeida Brito, no Sul, que foi a primeira vítima desta nova arma.

Dos vários aviões alvejados, cito o do capitão piloto aviador Pinto Ferreira, do meu curso da AM [, Academia Militar], que viu sair o míssil e através de uma acrobacia o conseguiu despistar.

O comandante da Zona Aérea era o coronel piloto aviador Lemos Ferreira, que nesta altura, em face da recusa de alguns pilotos em voar, ele próprio desempenhou algumas missões. (...)

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Notas do autor:


(59) Também havia pedidos de APAR pelas redes de HF, High Frequency, Alta Frequência, de 3 a 30 Mhz, que permitia uma comunicação a maiores distâncias, mas cuja ligação na Guiné nem sempre era possível.

(60) Army Navy/Ground Radio Communications, de origem Americana.

(61) O PAIGC usou aqui pela 1ª vez o Strela. Para tal atacou de dia a guarnição para a obrigar a pedir apoio de fogos. Apoio pedido, foi o avião atacado logo que chegou e deu-se o 1º abate no território.




de que o Jorge Sales Golias é coborador


3. Nota do editor:

Agradecemos a gentileza do camarada Jorge Sales Golias, que não conhecemos pessoalmente, e a quem saudamos pelo lançamento do seu livro. Oportunamente, será feita a  devida "nota de leitura" ou recensão bibliográfica a cargo do nosso colaborador permanente Mário Beja Santos ou por iniciativa de qualquer outro dos leitores do livro que o queiram comentar publicamente, aqui no nosso blogue.

Apraz-nos registar que os camaradas da Guiné, independentemente da época em que lá estiveram, da sua condição militar (arma, especialidade, posto, etc.) têm vindo a escrever e a publicar livros sobre os acontecimentos em que participaram, nesta antiga província (ou colónia) portuguesa, entre 1961 e 1974. 

Nunca é demais recordar  que o nosso blogue não tem nenhum bandeira, a não ser a da camadaragem e da verdade. Somos um blogue de memórias e de afectos. E é importante que todos os camaradas da Guiné  se sintam aqui tão confortáveis, neste espaço plural, a Tabanca Grande,  onde todos cabemos com tudo aquilo que nos une e até com aquilo que nos pode separar.  

Jorge, parabéns, boa sessão de lançamento e boa sorte para o livro. LG

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Notas do editor:

(*) Vd. postes de 


3 de abril de 2016 > Guiné 63/74 - P15932: Agenda cultural (472): sessão de lançamento do livro de Jorge Sales Golias, "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016, 385 pp.), dia 14 de abril de 2016, 5ª feira, às 18h, na Comissão Portuguesa de História Militar, Palácio da Independência, largo de São Domingos, 11, Lisboa. Prefácio: cor Carlos Matos Gomes; apresentação: cor Aniceto Afonso

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P15935: (Ex)citações (307): A descolonização da Guiné-Bissau tinha tudo para correr mal (Jorge Sales Golias)


Capa do livro  de  Jorge Sales Golias, "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016)] (*). Reproduzida, com a devida vénia ...





Jorge Sales Golias [ nascido em Mirandela, em 1941, ex-cap eng trms, licenciado em engenhria electrónica pelo IST, membro do MFA, Bissau, adjunto do CEME, gen Carlos Fabião em 1974/75, cor trms ref, administrador de empresas; vai lançar, no próximo dia 14, o seu livro "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016)] (**)

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Notas do editor:

(*) Vd, poste de 3 de abril de 2016 > Guiné 63/74 - P15932: Agenda cultural (472): sessão de lançamento do livro de Jorge Sales Golias, "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016, 385 pp.), dia 14 de abril de 2016, 5ª feira, às 18h, na Comissão Portuguesa de História Militar, Palácio da Independência, largo de São Domingos, 11, Lisboa. Prefácio: cor Carlos Matos Gomes; apresentação: cor Aniceto Afonso

(**) Último poste da série > 29 de março de 2016 >  Guiné 63/74 - P15911: (Ex)citações (306): A propósito da última troca de prisioneiros, em Aldeia Formosa, no dia 14 de setembro de 1974....Prisioneiros, não, "retidos pelo IN"...

domingo, 3 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P15932: Agenda cultural (472): sessão de lançamento do livro de Jorge Sales Golias, "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Edições Colibri, 2016, 385 pp.), dia 14 de abril de 2016, 5ª feira, às 18h, na Comissão Portuguesa de História Militar, Palácio da Independência, largo de São Domingos, 11, Lisboa. Prefácio: cor Carlos Matos Gomes; apresentação: cor Aniceto Afonso




Convite para a sessão de lançamento do livro de Jorge Sales Golias, "A descolonização da Guiné-Bissau e o movimento dos capitães" (Lisboa, Ed Colibri, 2016, 385 pp.),, dia 14 de abril de 2016, 5ª feira, às 18h, na CPHM - Comissão Portuguesa de História Militar, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, 11, Lisboa.

Prefácio: cor Carlos Matos Gomes; apresentação: cor Aniceto Afonso; sessão presidida por gen Alexandre Sousa Pinto (presidente da CPHM)


1. Mensagem do nosso leitor (e camarada)  Jorge Sales Golias [ ex-cap, eng trms, membro do MFA, Bissau, adjunto do CEME, Gen Carlos Fabião - 1974/75, cor trms ref, administrador de empresas]

Data: sábado, 2 de Abril de 2016 19:29

 Assunto: A Descolonização da Guiné-Bissau


Exmo Senhor Dr. Luís da Graça,

Na qualidade de autor do melhor blogue sobre a guerra colonial, venho convidá-lo a assistir ao lançamento do livro "A Descolonização da Guiné-Bissau", da minha autoria e pedir-lhe que divulgue o evento e o livro no seu blogue.

O livro tem 385 páginas, das quais 100 de documentos, fotos e imagens (com desenhos do António Carmo, feitos para o efeito), cita cerca de 400 nomes (dos quais cerca de 70 da Guiné) e tem 275 notas de rodapé. O prefácio, de Carlos de Matos Gomes, é uma magnífica peça de contextualização histórica.

Na circunstância, apresento-lhe os meus melhores cumprimentos,

Jorge Sales Golias





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Nota do editor:

domingo, 4 de maio de 2014

Guiné 63/74 - P13097: (Ex)citações (230): Estudos Gerais da Arrábida > A descolonização portuguesa > Painel dedicado à Guiné (29 de Julho de 1997) > Depoimento do general Bethencourt Rodrigues (Excertos, com a devida vénia...)



Página de rosto do 

Arquivo de História Social > Instituto de Ciências Socias da Universidade de Lisboa (o link original foi descontinuado: ver aqui em Arquivo.pt)


"O Arquivo de História Social publica nesta página uma série de entrevistas sobre a descolonização portuguesa de 1974/1975, fruto de um projecto do Instituto de Ciências Sociais apoiado pela Fundação Oriente. Maria de Fátima Patriarca, Carlos Gaspar, Luís Salgado de Matos e Manuel de Lucena que coordenou, entrevistaram grandes protagonistas desse processo: por um lado, governantes, chefes militares, dirigentes do MFA e outros que então actuaram na Guiné-Bissau, em Cabo Verde, Angola e Moçambique; por outro lado, responsáveis metropolitanos ou íntimos colaboradores seus.

"Não procurando promover qualquer interpretação, chegar a juízos gerais ou encerrar os eventos abordados numa dada problemática, o grupo entrevistador foi seguindo os relatos e aceitando as visões dos seus interlocutores, embora não deixasse de lhes solicitar esclarecimentos por vezes incómodos." 



1. Estudos Gerais da Arrábida  > A descolonização portuguesa >  Painel dedicado à Guiné (29 de Julho de 1997)  > Depoimento do general Bethencourt Rodrigues

(disponívbel em Arquivo.pt: 


[ Excertos, com a devida vénia: corrigimos  o nome do general que é Bethencourt e não Bettencourt  (, foto à esquerda, na base naval do Alfeite, em 30/4/1974; foto do álbum da família do cor inf António Vaz Antunes, a quem a agradecemos a gentileza, na pessoa do seu filho Fernando Vaz Antunes).

[Como se vê, pelo depoimento, ele foi avaro (e por isso dececionante) em palavras e emoções no que respeita ao "assalto" ao seu gabinete, na Amura. ] (*)

(…) Luís Salgado de Matos:

Passando agora para a Guiné. O sr. general chegou a organizar algum Congresso do Povo?

General Bethencourt Rodrigues: 

Sim, o quinto. Foi até o acontecimento político-social mais marcante do meu mandato como Governador. Para sua informação, eu descrevo isso com algum detalhe no depoimento que o Paradela de Abreu me solicitou em tempos, Vitória Traída. Mas houve também os congressos regionais, de onde eram cooptados os delegados para o Congresso Provincial.

Tudo isso movimentou na altura milhares de pessoas, completamente à margem do PAIGC.

Manuel de Lucena: 

Mas essa não interferência do PAIGC era deliberada por parte deles…

General Bethencourt Rodrigues: 

Incapacidade militar, meu caro amigo!

Luís Salgado de Matos: 

Havia alguma reflexão no Estado Maior sobre a táctica que o general Spínola estava a desenvolver na Guiné?

General Bethencourt Rodrigues: 

Ele fazia a sua política, era lá com ele. Cada um tinha as suas características próprias. Volto a repetir: os comandantes militares gozaram sempre de uma larga autonomia.

Quando cheguei à Guiné em 1973, habituado como estava à largueza de Angola, o que mais me impressionou foi a pequenez daquilo tudo. A Guiné é um país cuja área varia em função da maré!

Manuel de Lucena: 

Na Guiné, o sr. general chegou a pensar numa concentração do dispositivo?

General Bethencourt Rodrigues: 

Sim, planeava converter as 225 guarnições em 80 e tal. A dispersão é inimiga da eficácia. Mas já não tive tempo,

Manuel de Lucena: 

Por outro lado, a quadrícula dispersa é sinal de presença efectiva, possibilita o contacto directo com as populações…

General Bethencourt Rodrigues: 

É uma outra forma de ver as coisas. Simplesmente, havia que fazer uma opção.

Luís Salgado de Matos: 

Manteve o acordo do general Spínola com os Felupes, em que estes recebiam 100 escudos por cada cabeça de guerrilheiro abatido?

General Bethencourt Rodrigues: 

Não estava ao corrente desse acordo, mas se ninguém o denunciou…

Manuel de Lucena: 

Quando chegou à Guiné encontrou uma tropa bem preparada, motivada, com bons quadros? Faço lhe esta pergunta porque a ideia que normalmente se tem acerca do estado de espírito da nossa tropa na Guiné é a de uma desmoralização generalizada.

General Bethencourt Rodrigues: 

Sobre isso direi o seguinte: só se morre uma vez, não há mortes provisórias. Quando se combate com convicção e tenacidade, quando se tem a certeza de um trabalho bem feito, a motivação é coisa que não falta.

Manuel de Lucena: 

Mas o MFA na Guiné, ao nível dos quadros, aparentava estar bem organizado, tinha um número muito significativo de adesões. Qual era a sua percepção?

General Bethencourt Rodrigues: 

Não tive conhecimento disso, Que as condições eram terríveis, não contesto. Agora dizer que a tropa estava desmoralizada, de maneira nenhuma! Em Angola podia cumprir-se uma comissão alternando sítios fáceis com difíceis. Na Guiné não; vivia-se num sobressalto permanente. Por isso é que na Guiné as comissões duravam 21 meses e em Angola 24. Só quando os strelas entraram em cena é que as comissões passaram a 24 meses. O general Spínola deixou ficar os que lá estavam e aumentou o contingente com tropas frescas.

Manuel de Lucena: 

O 25 de Abril foi então uma surpresa para si?

General Bethencourt Rodrigues: 

Tanto foi que me assaltaram o gabinete! Embora quase tivesse assistido ao golpe das Caldas, quando vim a Lisboa em Março de 1974, não dei por nada. Quando a Revolução estalou, estava perfeitamente inocente.

Luís Salgado de Matos: 

O sr. general tinha confiança na tropa das informações? Na Marinha, onde fiz o meu serviço militar, corria que o Exército, na Guiné, estava infiltrado pelo PAIGC de alto a baixo.

General Bethencourt Rodrigues: 

Em geral tinha. Nas Informações trabalhava-se em estreita colaboração com a DGS, reconhecidamente competente nesse campo. O PAIGC, de resto, não tinha técnica para entrar um jogo desses.

Diz-se que um dos efeitos da contra-subversão é a lassidão, Mas a lassidão também os afectava a eles. O PAIGC não estava menos exausto que nós.

Manuel de Lucena: 

De qualquer forma, de todos os MFA's, não restam dúvidas de que o MFA da Guiné era o melhor estruturado. Basta atentar nos nomes proeminentes do 25 de Abril que saíram da Guiné. Se eles fossem fracos, o sr. general, no dia 25, ter-se-ia rido na cara deles e dado voz de prisão. Depois, o evoluir dos acontecimentos logo após o 25 Abril veio a demonstrar que na Guiné a vontade de regresso à Metrópole se sobrepunha praticamente atudo.

General Bethencourt Rodrigues: 

Olhe, como dizem os brasileiros, quando um general passa à reserva vira historiador. Foi o que sucedeu comigo. Reformado aos 55 anos, dediquei-me ao estudo. Pesquisei, li, meditei, E sabe a que conclusão cheguei? Que o país nunca teve um problema de defesa nacional em África. A tropa podia estar farta, mas obedecia. Faz parte da nossa natureza. A esse respeito nunca tive dificuldade - fui sempre obedecido. Raramente tive de usar de expedientes punitivos; escolhi sempre a via do exemplo: quando era preciso suportar dificuldades, eu fazia questão em suportá-las.

Quando estive em Lisboa em Março de 1974 - vim cá buscar 150 contos -, achei isto uma coisa horrorosa. Tinha havido a remodelação ministerial, a última do professor Marcelo. Senti um mal-estar generalizado, uma atmosfera pesada. Felizmente, o episódio da «brigada do reumático» apanhou-me já a caminho da Guiné.

Manuel de Lucena: 

Como foi a reacção ao golpe das Caldas na Guiné?

General Bethencourt Rodrigues: 

Irrelevante. O Ultramar ficava muito longe.

Luís Salgado de Matos: 

O facto do general Spínola ter saído após Guileje foi entendido como uma derrota? Não afectou as pessoas que lá estavam?

General Bethencourt Rodrigues: 

Note: o general Spínola esteve lá oito anos, fora nomeado no tempo do do Salazar. Eu até dizia: o Spínola não deve sair da Guiné senão por limite de idade ou de caixão. E, caramba, oito anos na Guiné é de morrer! A partir de determinada altura, admito que as coisas terão deixado de lhe correr de feição, nomeadamente porque o Governo não lhe dava todo o dinheiro que pretendia para a sua política de aliciamento das  populações.

Apesar de cada um ter a sua maneira de comandar, eu não enjeitei a sua política de melhoria desenvolvimento das populações autóctones. Mas com uma diferença: eles não me metiam a mão no bolso! Quer dizer; não lhes satisfazia todos os pedidos. Recordo-me de um dia ter  ido a uma sanzala e de um grupo de mulheres me ter pedido rádios. Vejam bem: rádios para falar com os maridos quando estes iam a Bissau! Não fui para a Guiné para agradar a toda a gente. Fui lá para cumprir o que devia ser cumprido.

Manuel de Lucena: 

Na conversa que teve com o professor Marcelo, antes de ir para a Guiné, não ficou com a sensação que a saída do general Spínola lhe causava a ele, Marcelo, um problema bicudo?

Luís Salgado de Matos: 

E a isso eu acrescento: a implicava a admissão da derrota de Spínola na Guiné?

General Bettencourt Rodrigues: 

Leiam o Depoimento do professor Marcelo Caetano. Ele narra a nomeação a reunião com os altos comandos.

Manuel de Lucena: 

E quando é nomeado para a Guiné tem outra entrevista com o professor Marcelo ...

General Bethencourt Rodrigues: 

Naturalmente. No entanto, o pretexto dessa conversa até foi outro assunto, designadamente, a negociação de um contrato publicitário entre a RTP e a Movierecord - eu nessa altura em administrador delegado da RTP. Só depois é que o Presidente do Conselho me assediou para a Guiné, onde a situação se deteriorara nos últimos tempos.

Luís Salgado de Matos: 

Mas porque é que saltaram a escala hierárquica e o escolheram a si? Não foi pela aura vitoriosa que trazia do Leste de Angola?

General Bethencourt Rodrigues: 

Sim, pode aceitar-se essa leitura.

Manuel de Lucena:

 Mas o sr. general Bethencourt e o sr. general Spínola são comandantes de estilos e escolas diferentes, não é assim?

General Bethencourt Rodrigues: 

O mais possível.

Manuel de Lucena: 

De resto, a «terceiro-mundialização» que o Exército português conheceu durante o PREC - e que se traduzia em ordens por despacho, ultrapassagem das hierarquias, etc. – não procedeu da organização do general Spínola na Guiné?

General Bethencourt Rodrigues: 

Mas note que, ao contrário do que muita gente pensa, o general Spínola não era assim tão popular na Guiné.

Manuel de Lucena: 

Quando fui subordinado do major Salles Golias, que servira sob as ordens do general Spínola na Guiné, e depois se tornou seu inimigo figadal recordo-me de ele ter dito que era capaz de tudo para evitar que o general Spínola, já depois do 25 de Abril, voltasse a pôr os pés na Guiné. O major Golias estava ciente que o general Spínola deixara uma multidão de indefectíveis, tanto cá como na Guiné.

General Bethencourt Rodrigues: 

Mas esses fiéis - o Monge, o Bruno, o Fabião, etc. - já haviam todos regressado quando fui para a Guiné. O sr. general Spínola, lamento dizê-lo, era muito faccioso. Para ele, quem não tivesse andado no Colégio Militar ou não fosse de Cavalaria era menos que zero.

Texto fixado por Pedro Aires Oliveira, a partir de notas suas e de  Fátima Patriarca.

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Nota do editor:

(*) Vd. postes anteriores da série:

4 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13096: (Ex)citações (229): O MFA na Guiné-Bissau: comentário do ten cor ref Jorge Sales Golias sobre os acontecimentos de 26 de abril de 1974, em Bissau: o gen Bethencourt Rodrigues e os oficiais que com ele se solidarizaram foram tratados com deferência e cordialidade (Carlos Pinheiro / Bento Soares)

4 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13095: (Ex)citações (228): O golpe de 26 de abril de 1974, o MFA, o Com-Chefe, gen Bethencourt Rodrigues, e o comandante interino do COMBIS, cor inf António Vaz Antunes (Luís Gonçalves Vaz, que tinha 13 anos, e vivia em Bissau, sendo filho do cor cav CEM Henrique Gonçalves Vaz, último chefe do Estado Maior do CTIG)

Vd. também:

1 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13078: O golpe militar de 26 de abril de 1974 no TO da Guiné: memorando dos acontecimentos, pelo cor inf António Vaz Antunes (1923-1998) (Fernando Vaz Antunes / Luís Gonçalves Vaz): Parte I

Guiné 63/74 - P13096: (Ex)citações (229): O MFA na Guiné-Bissau: comentário do ten cor ref Jorge Sales Golias sobre os acontecimentos de 26 de abril de 1974, em Bissau: o gen Bethencourt Rodrigues e os oficiais que com ele se solidarizaram foram tratados com deferência e cordialidade (Carlos Pinheiro / Bento Soares)

1. Mensagem do nosso camarada Carlos Pinheiro [ex-1.º cabo trms op msg, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70, e nosso grã-tabanqueiro, foto à esquerda]

Data: 2 de Maio de 2014 às 23:35

Assunto: MFA na Guiné-Bissau


Camarigo Luis Graça, camarigo Carlos Vinhal


Perdoem-me,  os meus amigos,  mas sinto-me obrigado, mas também muito honrado, em transmitir-vos a mensagem abaixo do meu Comandante do STM em Bisssau, então Capitão Bento Soares, hoje Major General na Reforma sobre os dias 25 e 26ABR74.

Um abraço com amizade

Carlos Pinheiro


2. Mensagem de Bento Soares, maj gen  ref, e leitor do nosso blogue, e de quem não dispomo de nenhuma foto:

Caro amigo Carlos Pinheiro:

Como sabe,  tomei por seu intermédio conhecimento do Blog Luís Graça & Camaradas da Guiné, TO onde batalhamos no STM e por isso vejo sempre com agrado as historietas do Blog que regularmente fazem o favor de me enviar.

No último envio do blog deparei-me com o relato do Cor Vaz  Antunes sobre os dias 25 e 26 ABR74. Fiz então um reenvio para camaradas amigos meus que estiveram na Guiné.

Porque a todos interessa a verdade exacta sobre os documentos históricos (como é o caso daquele relato), envio-lhe um comentário do TCor Jorge Golias que viveu pessoalmente os acontecimentos narrados e, aliás, é citado no próprio relato.

Autorizou-me este oficial a fazer uso do seu comentário pelo que lhe pedia a fineza de o endereçar para os responsáveis do Blog, uma vez que o meu amigo é ali uma figura grada e conhecida.

Um abraço amigo
Bento Soares

3. Comentário ten cor ref Jorge Sales Golias Jorge Sales Golias, [ex-cap, eng trms, membro do MFA, Bissau,   adjunto do CEME, Gen Carlos Fabião - 1974/75, administrador de Empresas] [, foto à direita, cortesia da página Avenida da Liberdade, da associação 25 de Abril]

26 de Abril de 1974 em Bissau

O MFA resolveu actuar em face de uma escuta telefónica em que o senhor General Bethencourt Rodrigues deu ordem à PIDE para seguir os movimentos dos capitães do MFA em Bissau e pelo facto de não ter reconhecido a JSN [, Junta de Salvação Nacional], tal como já havia feito o Comodoro Almeida Brandão, comandante marítimo.

A entrada no gabinete do General comandante foi feita por oficiais desarmados que apenas lhe comunicaram que vinham depô-lo porque ele não reconheceu a JSN. Ele perguntou se se devia considerar preso e foi-lhe dito que não, que se considerasse detido em nome do MFA, e que preparasse a bagagem para embarcar para Portugal.

O Brigadeiro Leitão Marques dramatizou, dizendo que se solidarizava com o General e que queria que o fuzilassem. Foi esta a parte dramática e que teria sido bem escusada porque a intervenção do senhor Brigadeiro não tinha qualquer justificação. Tanto assim que o General comandante se levantou e, com toda a liberdade de movimentos, interpelou um a um os seus principais operacionais,  questionando-os por terem sido tão leais e agora estarem a colocá-lo naquela situação. Foi-lhe respondido que ele não soube assumir a posição que se esperava, naquela altura dos acontecimentos.

A carga dramática advém ainda do facto de todos nós considerarmos o General Bethencourt Rodrigues como um dos mais brilhantes do Exército, mas que na altura certa estava do lado errado da História.

Quanto ao senhor Coronel Vaz Antunes, soubemos no local que o mesmo tinha abandonado as instalações do Comando-Chefe na Amura sem autorização, dado que a PM [, Polícia Militar,] tinha ordens do Capitão Sousa Pinto, para não deixar sair nem entrar ninguém e receou-se que fosse ao COMBIS tentar obter meios para atacar os militares do MFA. Talvez por isso estava à sua espera um pelotão dos comandos africanos, mas esta parte eu só tomei conhecimento através do escrito no blogue Luís Graça [& Camaradas da Guiné].

En suma,  que fique claro que o senhor General Bethencourt e os oficiais que com ele se solidarizaram foram tratados com toda a deferência que lhes assistia e com a máxima cordialidade da nossa parte.

O capitão miliciano José Manuel Barroso (e não Alfredo Barroso) falou com o Comodoro Almeida Brandão, mandatado pelo MFA, porque era o único que o conhecia. A sua mulher, ao tempo, Dra. Emília Barroso, era professora em Bissau e foi depois distinta professora universitária em Lisboa.

O Tenente-Coronel Mateus da Silva foi indigitado pelo MFA para Encarregado do Governo, aceite provisoriamente pelo General Spínola, que ao tomar conhecimento dos factos sucedidos em Bissau o saudou e lhe disse que iria rapidamente nomear um substituto, que seria o Brigadeiro Carlos Fabião.

2 de Maio de 2014

Jorge Sales Golias

[Negritos do editor, L.G.]

[Vd. também Universidade de Coimbra > Centro de Documentação 25 de Abril > J. Sales Golias > A descolonização da Guiné .]

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Nota do editor:

Último poste da série > 4 de maio de 2014 > Guiné 63/74 - P13095: (Ex)citações (228): O golpe de 26 de abril de 1974, o MFA, o Com-Chefe, gen Bethencourt Rodrigues, e o comandante interino do COMBIS, cor inf António Vaz Antunes (Luís Gonçalves Vaz, que tinha 13 anos, e vivia em Bissau, sendo filho do cor cav CEM Henrique Gonçalves Vaz, último chefe do Estado Maior do CTIG)