Mostrar mensagens com a etiqueta Kalash. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Kalash. Mostrar todas as mensagens

sábado, 26 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18679: (De) Caras (109): A história da Kalash apanhada pelos Kimbas a um "Don Juan" do PAIGC, contada pelo António Ramalho, o "pira" da CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71), que andou sempre com "gente aprumada e de alto gabarito"...



Guiné > Região Cacheu > Bula > Capunga > CCAV 2639 (1969/71) > 2/5/1970: o Victor Garcia, do 3º Gr Comb, "Os Kimbas", posando para a fotografia com a Kalash apanhada a um elemento IN.  É membro da nossa Tabanca Grande.

Foto (e legenda): © Victor Garcia (2009) . Todos os direitos reservados (Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)



António Ramalho

1. Mensagem enviada pelo nosso editor LG ao António Ramalho e ao Victor Garcia:

Data: 24 de maio de 2018
Assunto: A Kalash apanhada pelos Kimbas (*)


António, Victor:

Expliquem lá melhor como é que... os pilha-galinhas dos Kimbas apanharam a Kalash e deixaram o "Dom Juan" fugir...


O Victor era Kimba,e tu, António ?... Ab para os dois. Luís

 2. Resposta do António Ramalho,  a 24 mai 2018, às  20:11


Caro Luís, vou satisfazer a tua curiosidade e podes acreditar, até porque o Victor Garcia já tinha enviado a foto.

Eu fui o mais "periquito" da minha companhia, fui substituir um camarada que se rebolou pela parada do RC7 quando soube que não iria ser mobilizado!...

Foi tão rápida a minha mobilização que tive que levar do Casão Militar as calças de um Coronel!...

Se a PM [, Polícia Militar,] me pedisse a identificação era só baixar as calças e mostrar a etiqueta com o nome do Coronel...

A minha Companhia [, a CCAV 2639,] em termos de formação era muito, muito heterogénea.

A minha origem foi o 3º Pelotão, Os Kimbas.

Mais tarde fiz parte dum Pelotão de "elite", constituído por rapaziada mal comportada, que foi "enviado" para Bissum para acompanhar uma companhia açoriana,  também muito "esquisita", cujo capitão não conheci por razões de saúde.

Fui com o alf mil Queiroz ("Caguei"),  casado com uma inglesa,  que vivia em Bula, estás a ver a permanência dele em Bissum!  E com o Zé Viriato,  que infelizmente já partiu, promotor das famosas maçãs de Blequisse (Pete)!

Como vês, tudo gente aprumada e de alto gabarito!

De regresso fui chutado para Ponta Consolação para junto do alf mil Miguel Ângelo Guimarães] Leal, co-piloto do avião da TAP que caiu no Funchal em 19 de novembro de 1977, ironias do destino!

Os sete Kimbas que apanharam a Kalash. O fur mil Adriano 
Serra é o do meio, sentado na frente do "burrinho", o Unimog 411,
empunhando a Kalash. Local e data: Bula, Capunga, 2/5/1970.  
Foto (e legenda) de Victor Garcia (2009)
Uma tarde o Adriano Serra (, fur mil, para nós era o 1º Serra, ) foi com esse grupo da foto a uma tabanca na picada Capunga/Pete, à esquerda, não me recordo o nome,  comprar qualquer espécie comestível; de mãos a abanar, já no regresso,  eis que se depararam com o IN (desenfiado). Tinha ido matar saudades com a namorada... ainda com a farda cubana, desabotoada,  não hesitou em entregar a arma e fugir!... Ainda o perseguiram,  mas sem êxito, estavam pertíssimo do Choquemone, recearam alguma reacção de qualquer elemento por ali escondido.

Imagino o que terá acontecido ao mancebo, comentámos na altura que talvez não tenha regressado [à base] e se tivesse refugiado ou deslocado para outras paragens, certamente que o castigo seria severo!

Irei tratar das fotos este fim de semana.

Um forte abraço para todos.

António Fernando Rouqueiro Ramalho (**)

_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de  24 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18672: Álbum fotográfico de António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71) - Parte II: As armas não se comem... mas, mesmo assim, apanhámos uma Kalash quando íamos à procura de galinha ou de porco... 

(**) Último poste da série > 14 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18632: (De)Caras (107): O "pilotaço" Mário Leitão, ex-fur mil farmácia (Luanda, 1971/73): tirou o brevê de piloto privado de avião (PPA) em 1977, tem 300 horas de voo e 800 aterragens... Além disso, é "cavaleiro do mar", mergulhador e instrutor de mergulho...

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18672: Álbum fotográfico de António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71) - Parte II: As armas não se comem... mas, mesmo assim, apanhámos uma Kalash quando íamos à procura de galinha ou de porco...





Guiné > Região Cacheu > Bula > Capunga  > CCAV 2639 (1969/71) > A insólita história da captura de uma Kalash...

Fotos (e legendas): © António Ramalho (2018) . Todos os direitos reservados (Edição e legendagem omplementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)

1. Continuação da publicação do álbum fotográfico de António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71), membro da Tabanca Grande, nº 757, natural de Vila Fernando, Elvas (*).

Uma história com algo de burlesco, que merece maior desenvolvimento por parte do autor... Se não for anedota, é uma
história de se lhe tirar o chapéu!

Os tipos do PAIGC eram tão "humanos" como nós, capazes de perder a cabeça por um rabo de saia... Neste caso, o "camarada" que foi a Capunga dar uma queca, ficou sem as calças e a arma que lhe estava distribuída, mas salvou a cabeça... Presume-se que tenha fugido em pelota, e sem arma, ao ser surpreendido pelos pilha-galinhas... (Sabemos, pelo Victor Garcia, que eram 7, e que pertenciam ao 3º Gr Comb, "Os Kimbas").

Pergunta de editor curioso: o que lhe tirá acontecido ao chegar à "barraca" em Choquemone, em pelota e sem a sua bela Kalash  ? (LG)

2. O Victor Garcia, nosso grã-tabanqueiro de longa data, também publica na sua página a foto da famosa Kalash apanhada por 7 elementos (menos de uma secção) do 3º Gr Com da CCAV 2639, a que ele pertencia.



Guiné > Região Cacheu > Bula > Capunga  > CCAV 2639 (1969/71) > A insólita história da captura de uma Kalash



Guiné > Região Cacheu > Bula > Capunga  > CCAV 2639 (1969/71) >  Os 7 elementos do 3º Gr Comb, "Os Kimbas",  que capturaram a Kalash: Pereira, Ferreira, Serra, Moura, Nogueira, Marco Paulo e Torcato



Guiné > Região Cacheu > Bula > CCAV 2639 (1969/71) > Emblema de "Os Kimbas", o 3º Gr Comb

Fotos (e legendas): © Victor Garcia  (2009) . Todos os direitos reservados (Edição e legendagem omplementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)

______________

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Guiné 63/74 - P16319: Álbum fotográfico de Francisco Gamelas, ex-alf mil cav cmdt do Pel Rec Daimler 3089, ao tempo do BCAÇ 3863 (Teixeira Pinto, 1971/73) - Parte VI: Em louvor dos camaradas da 35ª CCmds e das nossas velhas e gloriosas Daimlers


Foto nº 56 A >  Março de 1972 > Estrada Teixeira Pinto. Cacheu > Eu, à direita, com o Alferes Comando Alfredo Campos  


Foto nº 56


Foto nº 57A  .


Foto nº 57 > Foto nº 57 > Março de 1972 > Estrada Teixeira Pinto - Cacheu > Eu com o então Alferes Comando ui Andrade [que empunha uma Kalash,]


Foto nº 58A 


Foto nº 58 > Março de 1972, durante a protecção aos trabalhos de desmatagem das margens, ou da pavimentação, da estrada entre Teixeira Pinto e o Cacheu.  Eu, nas costas de uma Daimler, tendo do meu lado esquerdo o então Furriel Comando  Paquete  e à minha direita o então Alferes Comando Alfredo Campos, comandante do Pelotão da 35ª a que ambos pertenciam.


Foto nº 58B >  Alferes Comando Alfredo Campos, a quem convidamos para integrar a nossa Tabanca Grande.


Foto nº 58C > Furriel  Mil Comando Paquete, da 35ª CCCmds, que infelizmente já não está entre nós. Segundo informação do Ramiro de Jesus, também ele ex-fur mil comando da 35ª CCmds, natural de Aveiro (e, portanto, meu conterrâneo), o Paquete,  depois do regresso à metrópole, morreu atropelado por um comboio em Vila Franca de Xira.


Foto nº 57B > Outro camarada da 35ª CCmds, Alferes Comando Rui Andrade  (mais tarde, após a evacuação do Capitão comandante da 35ª CCmds, ferido em combate, graduado em Capitão para assumir o Comando daquela companhia)

Guiné > Região do Cacheu > Teixeira Pinto > 35ª CCmds e Pel Rec Daimler 3089 (Teixeira Pinto, 1971/73)

Fotos (e legendas): © Francisco Gamelas (2016). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Francisco Gamelas, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 3089 (Teixeira Pinto, 1971/73), adido ao BCAÇ 3863 (1971/73)  (*).


Francisco Gamelas, que é engenheiro eletrotécnico de formação, quadro superior da PT Inovação reformado, vive em Aveiro, e publicou recentemente "Outro olhar - Guiné 1971-1973" (Aveiro, 2016, ed. de autor, 127 pp. + ilust; preço de capa 12,50€). Os interessados podem encomendá-lo ao autor através do seu email pessoal franciscogamelas@sapo.pt.
O design é da arquiteta Beatriz Ribau Pimenta, a partir da foto. nº 29. Tiragem: 150 exemplares. Impressão e acabamento: Grafigamelas, Lda, Esgueira, Aveiro.


2. Mensagem do Francisco Gamelas, com data de 5 do corrente:

Bom dia,  Luís.

Sobre a questão da 35ª  CComandos, naturalmente, confirmo o que o então furriel Ramiro de Jesus (também residente em Aveiro, portanto meu conterrâneo) escreveu sobre a sua companhia. [O Ramiro Jesus, fur mil comando da 35.ª CComandos (Teixeira Pinto, Bula e Bissau, 1971/73),  é membro da nossa Tabanca Grande desde 9/12/2012][, foto à esquerda]. (**) 

Sobre a 38ª, se o António Graça de Abreu a menciona [, no seu "Diário da Guiné"], provavelmente terá sido esta que substituiu a 35ª às ordens do CAOP 1, após este se ter retirado de Teixeira Pinto, tanto quanto me recordo, na mesma altura em que a 35ª foi fazer a segurança do General em Bissau. 

Com a saída do CAOP1 e da 35ª de Teixeira Pinto, deixaram de existir ali tropas especiais. Tempos houve - antes da minha chegada - que em Teixeira Pinto estavam sediados Fuzileiros, Paras e , segundo creio, também Comandos. 

Por curiosidade, junto envio uma foto [nº 58]  onde estou no centro, nas costas de uma Daimler, tendo do meu lado esquerdo o então Furriel Comando Paquete e à minha direita o então Alferes Comando Alfredo Campos, comandante do Pelotão da 35ª a que ambos pertenciam. 

A foto foi tirada em Março de 1972, durante a protecção aos trabalhos de desmatagem das margens, ou da pavimentação, da estrada entre Teixeira Pinto e o Cacheu. 

A 35ª e o meu Pelotão Daimler eram os responsáveis pela protecção a estes trabalhos. 

Na foto nº 57 figuro eu com o então Alferes Comando  Rui Andrade, mais tarde, após a evacuação do Capitão comandante da 35ª, ferido em combate [, cap QEO comando Ribeiro da Fonseca, hoje cor ref], foi graduado em Capitão para assumir o Comando daquela companhia [57]. 

Na foto 56 figuro eu com o então Alferes Comando Alfredo Campos. Ambos, o Campos e o Rui, eram meus especiais amigos do peito daqueles tempos. [O Ramiro de Jesus era também do pelotão do alf Campos].

Um abraço.
FG


Guiné > Zona leste > Estrada Bambadinca - Bafatá > 1969 > Coluna da CCAÇ 12, a caminho de Bafatá, vendo-se ao fundo uma AM (autometralhadora) Daimlerdo Pel Rec Daimler 2046, instalado em Bambadinca, e que era comandado nesse tempo pelo alf mil cav Jaime Machado, nosso grã-tabanqueiro. Em primeiro plano,  malta  do 2º Gr Comb da CCAÇ 12.  A viatura, de matrícula ME-31-37, de pneus completamente carecas, fazia habitualmente escolta ao nosso tranquilo "passeio" até  Bafatá... O PAIGC nunca ousou atacar-nos neste troço (alcatroado, o primeiro do CTIG),pelo menos no tempo da CCAÇ 12 (1969/71).

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Giiné]


3. Comentário de LG:

Obrigado, Francisco... A confusão foi minha... O António Graça de Abreu esteve no CAOP1, em Teixeira Pinto, de 26/6/1972 a 1/2/1973... Nesse período apanhou a 35ª CCmds e a 38ª CCmds. 

Quando o CAOP1 muda para Mansoa (em 3/2/1973), ele vai com a malta da 38ª CCmds (onde se incluía o nosso grã-tabanqueiro, o 1º cabo comando Amílcar Mendes, herói de Guidaje...). Portanto, deves ter ainda apanhado a 38ª CCmds, em Canchuingo, o alf Paiva, e outro malta...

Peço desculpa a todos pela confusão. E obrigado pelas novas fotos com as tuas Daimlers e os teus/nossos camaradas da 35ª CCmds, vão dar outro poste ...

Confesso que tenho uma grande "ternura" pelas Daimlers e o seu pessoal... Em Bambadinca apanhei "cavaleiros" excionais como o Jaime Machado (Pel RecDaimler 2046 (1968/70) e o Zé Luís Vacas de Carvalho (Pel Rec Daimler, 2206, 1970/72). E vou confessar um "pecado moratl": um dia, completamente "apanhado do clima", e já mais para o fim da comissão, conseguiu convencer um dos homens do J. L. Vacas de Carvalho a ir ao Xime... beber uma bejeca...

A estrada estava em construção, e nós montávamos segurança à empresa TECNIL, mas havia sempre risco de minas e emboscadas. Eram 12/14 km para lá e outros tantos para cá... E ainda levei o Tchombé, que era a nossa mascote, um puto de 4/5 anos, adotado por nós... Eu, o Tchombé e o condutor... Loucuras, quem não as fez, com 23 anos, no teatro de operações da Guiné?

Julgo que nunca contei esta ao Zé Luís... E espero que ele me perdoe... Ou será que o condutor era ele mesmo? Não juro, nem acredito, mas era menino para "alinhar"... Tem alma e voz de fadista... Mas, não, não era ele... o condutor... O apontador da metralhadora foi dispensado; não cabíamos todos na "lata de sardinhas"... Estou a imaginar a "porrada" que levaria se as coisas tivessem dado para o torto... Mas nessa altura o troço em construção, Bambadinca-Xime (mais tarde alcatroado) era todo nosso, e os "gajos" do PAIGC, donos da margem direita do Rio Corubal,  pensavam duas vezes antes se meteram com os "nharros" (brancos e pretos) da  CCAÇ 12...

 As "vossas" Daimlers podiam ser um "bocado de lata", mas davam-nos sempre um grande "conforto" nas nossas colunas logísticas... Ou até na simples e rotineira viagem a Bafatá, por estrada alcatroada (30 km), que era o nosso dia de glória ("comer o ovo a cavalo com batatas fritas" na Transmontana, "dar dois dedos de conversas com as libanesas", "mudar o óleo no Bataclã!, "rezar na catedral", "fazer umas compritas na Casa Gouveia!", "dar um mergulho na piscina municipal", enfim, "respirar a civilização cristã e ocidental da Princesa do Geba"...).

E como eram "bailarinas" as vossas Daimlers, nunca as vi atascadas, nem nunca nos deixaram mal, mesmo com os pneus carecas... Glória às nossas velhas Daimlers!...

Ab. Luis


4. Comentário do Jaime Machado (Pel RecDaimler 2046, Bambadinca, 1968/70)

Caro Luis

As tuas doces palavras fazem-me recuar no tempo. Tudo o que escreves me volta à memória.
Será estranho dizer que quase tenho saudades desse tempo? Pudera, quem não gostaria de voltar aos 23 anos?

Faria tudo na mesma,  tenho pena do que deixei por fazer.
Ai as minhas Daimlers, que vaidade, que orgulho, que saudade.

Um abraço do Jaime.
____________

Notas do editor:

(*) Ultimo poset da série > 5 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16272: Álbum fotográfico de Francisco Gamelas, ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 3089, ao tempo do BCAÇ 3863 (Teixeira Pinto, 1971/73) - Parte V: (Des)encontros... E em louvor das velhas Daimlers, que a sorte protege... quem tem olhinhos!

(**)  Vd. poste de 9 de setembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10356: Tabanca Grande (358): Ramiro Jesus, ex-Fur Mil Comando da 35.ª CComandos (Teixeira Pinto, Bula e Bissau, 1971/73)

quinta-feira, 5 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14323: Manuscrito(s) (Luís Graça) (48): Foi você que pediu uma Kalash ?



Lisboa > Beira Tejo > Pôr do sol no Atlântico, visto do estuário do Tejo, em Belém, junto ao Museu do Combatente (Forte do Bom Sucesso). 5/11/2011

Foto: © Luís Graça (2011). Todos os direitos reservados




Foi você que pediu uma Kalash ?

Luís Graça



Há uma luz difusa,
mistura de ternura e de saudade,
quando o sol se põe
em Lisboa,
e tudo à volta é a humanidade
que arde.

Impensável o fado da idiossincrasia lusa
sob o céu de chumbo 
de Atenas.
Impensável 
ou improvável,  apenas ?
Porque de pias intenções,
maus pensamentos 
e piores ações está o inferno cheio,
as praças, do Comércio ao Rossio,
e os marcos do correio.

Ah!, o bravo Ulisses, o grego,
o que ele andou p’ra aqui chegar, 
depois de transpostas as colunas de Hércules, 
e fundar 
a mítica cidade atlântica de Olissipo. 
Ah!, a Lisboa,
que os poetas amaram 
e onde nunca foram amados,
do Cesário Verde ao Álvaro de Campos.
Ah!, Lisboa
com as suas casas de muitas cores,
caiadas de branco.

Chora, e não é de medo,
o judeu sefardita, 
a sua desdita,
cristão novo, marrano,
a caminho do degredo:

─  Ai!, a doce luz de Lisboa,
filtrada pelo espelho de água do Tejo,
mais o pôr do sol sobre o Atlântico Norte
que começa no Bugio.
Não sei se estarei cá, p’ró ano,
que a vida e a morte
são jogos de azar e sorte.
Só sei que o que sinto,
é já saudade, 
porque… é arrepio!



No tempo em que a terra era plana,
antes das viagens de circum-navegação,
não podias imaginar o novo mundo
e, lá ao fundo, 
Copacabana,
mais as cataratas de Iguassu,
Darwin e a teoria da evolução,
e o tu-cá-tu-lá de deus com a ciência.
Muito menos a crioula e o seu cretcheu,
o tango,
o flamengo, o fado,
o dundum, a coladera
o samba, a morna, 
o lançado, o tangomau,
o escravo do Cacheu,
e a santa paciência
com que a gente vive, morre e não retorna.

Chama-lhe o que quiseres,
mas tens uma dívida de gratidão,
à Grécia antiga,
ao Homero,
ao Platão,
à bela e pérfida Helena de Troia,
ao ateniense e ao espartano,
aos deuses e deusas do Olimpo…
Que serias tu, sem o Ícaro,
mas também sem boia
nem colete de salvação ?
Que importa, afinal, a nobreza de um povo,
grego, judeu ou lusitano,
se a espada do sacro imperador romano
está suspensa por um fio
sobre a tua cabeça ?!

Em Lisboa, a norte, 
no caminho do São Tiago,
o santo decapitado,
guiando os feros exércitos da Reconquista,
no seu constante vaivém do ir e vir,
à volta da Europa e dos seus picos
de civilização.
E a sul, a autoestrada da globalização
onde cada turista 
tem direito ao seu recuerdo,
um postal ilustrado do futuro 
que seguirá dentro de momentos…
Allah Akbar!, ainda ecoa o último grito 
da batalha de Alcácer Quibir.

Mais a sul, 
as febres palúdicas do Geba e do Corubal,
grau 35 do frio polar,
esmagando os teus ossos;
grau 42 do fogo infernal,
implodindo a tua cabeça.
Viras na curva do rio,
para desceres ao fundo da terra,
verde e vermelha, 
dos pesadelos.


Dos miradouros dos grandes cruzeiros
que demandam o Tejo
não se vê a solidão dos velhos,
à beira rio,
tentando em vão
reacender o pavio
do desejo.
Muito menos os mariscadores
do mar da Palha
onde apodrece a última nau
do caminho marítimo para a Índia.
Ou ainda os moços que partem na frota branca
para os bancos de pesca do bacalhau, 
na Terra Nova,
sete vidas, sete safras,
servindo a velha pátria
em alternativa à guerra de África.

Lisboa, forrada a dourada talha,
estremece,
sob o peso da carruagem
do senhor dom João Quinto.
Dizes adeus a Fernão Mendes Pinto
que parte em viagem 
para o império do sol nascente,
levando consigo os botões, 
as armas de fogo 
e as emoções
dos bárbaros do sul.

 Canta-lhe, Mísia,  aquele fado,
que diz: “Arrefece
a última lava do vulcão
do teu corpo, amor,
mas ainda estremece,
ou não foras tu, velha Lisboa, 
sempre (e)terna,
menina e moça, bajuda, mulher”.

Entardece,
ensandece a cidade,
todas as sextas-feiras treze
do novo milénio.
Valha-nos as cruzes, canhoto,
contra o mau olhado.
E vade retro, Cronos, 
que, depois de devorares os teus filhos,
hás de devorar-te a ti próprio!
E quem tem bula come
carne,
não precisa de engenho e arte,
diz o cristão, velho e relho.
Mas é amarga a ostra,
e mortal a ameijoa
com que os pobres matam a sua fome.

Afogas-te em absinto,
bebida antiga de poeta,
depois de teres mandado cortar
as copas dos pinheiros bravos
por te taparem
a linha perdida do horizonte.
Mas já não há horizonte,
querida,
nem rosas nem cravos,
quebrada que foi a linha da vida.

Sem ajuda do Google Earth, 
à vista desarmada,
encontras aqui o teu lugar,
definitivamente provisório,
provisoriamente definitivo,
porque sabes que é tão irrisório
partir como absurdo ficar,
para quem da vida é fugitivo. 
Sentas-te numa esplanada
na doca de Belém,
com vista de mar:

─ Foi você que pediu uma Kalash ? ─ 
pergunta-te um dos sem-abrigo,
antigos estivadores e fragateiros,
pescadores e marinheiros,
agora tristes desempregados de mesa,
predadores à espera de presa.
Estão ali simplesmente à coca do turista.

 Não, obrigado, amigo,
mas não me faltava a vontade…











 Temos as melhores Kalash da cidade, 
das originais e das contrafeitas…
É só puxar a culatra

e meter uma bala na câmara,
e ficar à escuta...

Não insista!...
Para que haveria eu de querer uma arma,
essa é boa!,
se não tenho licença… para matar?!


Mal por mal, 
protestas contra o autocrata,
metes uma baixa psiquiátrica,
e pedes uma azeitona ou uma tâmara
e um copo… de cicuta,
enquanto o sol se põe em Lisboa!...


Lisboa, beira Tejo, fev 2015




Guiné > Região do Boé > Madina do Boé > CCAÇ 1589/BCAÇ 1894 (Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68). >  Uma Kalash, capturada ao PAIGC...

Foto do álbum fotográfico do nosso camarada Manuel Caldeira Coelho, ex-fur mil trms, CCAÇ 1589 (Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68).

Foto: © Manuel Coelho (2011). Todos os direitos reservados [Edição: LG]

________________________

Nota do editor:

Último poste da série > 28 de fevereiro de  2015 > Guiné 63/74 - P14308: Manuscrito(s) (Luís Graça) (47): Quem em caça, política, guerra e amores se meter, não sairá quando quiser...

Sobre a Kalash e a Kalashnikovmania, vd. entre outros os postes de:

25 de novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7335: Kalashnikovmania (5): Passados tantos anos sobre a guerra, continuo fã incondicional da G3 (Mário Dias)

17 de janeiro de  2008 > Guiné 63/74 - P2445: Em louvor da G3, no duelo com a AK47 (Mário Dias)

17 de maio de 2005 > Guiné 63/74 - P20: Foi você que pediu uma kalash ? (David Guimarães)

domingo, 9 de novembro de 2014

Guiné 63/74 - P13864: Armamento que equipava um bigrupo do PAIGC em novembro de 1970 (Luís Dias, ex-alf mil, CCAÇ 3491 / BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74)



Guiné-Bissau > PAIGC > Novembro de 1970 > Um bigrupo (em geral, constituído por 30/40 elementos). Repare-se que na sua generalidade os guerrilheiros usam sandálias de plástico e há uma grande indisciplina no vestuário. Imagem do fotógrafo norueguês Knut Andreasson (com a devida autorização do Nordic Africa Institute, Upsala, Suécia). A fotografia não traz legenda. São alegadamente tiradas em "regiões libertadas", aquando de uma visita, ao PAIGC; de uma delegação  sueca..

Pedi ao nosso especialista em armamente, Luís Dias, que está reformado a Polícia Judiciária, e que foi alf mil  para identiciar este armamento. Ampliei e decompus a foto em quatro partes, para melhor visualização dos pormenores.

Fonte: Nordic Africa Institute (NAI) / Foto: Knut Andreasson (com a devida vénia... e a autorização do NAI) [Edição: LG]



O Luís Dias, ex-alf mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872 (Dulombi e Galomaro, 1971/74), empunhando uma pistola-metralhadora, a PPSH, a famosa "costureirinha". Foto de Luís Dias.


1. Resposta do Luís Dias, em 7 do corrente, ao meu pedido de identificação doa armamento (foto de cima)

Caríssimo Luís

Está tudo bem contigo? Continuo a ser um leitor do blogue, da nossa Tabanca Grande, embora, de facto, não tenha sido tão participativo quanto desejaria. Vou tendo uma vida atarefada, mas também tenho escrito sobre armamento para publicação no Facebook, em "Armamento Militar do Exército Português".

Tenho estado a actualizar o que escrevi sobre o armamento que utilizámos na Guiné (*), bem como o do PAIGC, com mais fotos, aliás, também tenho algumas destas fotos. Quando estiver pronto posso remetê-lo para tua apreciação e se achares que é de publicar, estarás à vontade.

Em relação ao que me pedes, embora nalguns casos haja dificuldade em identificar as armas, devido à posição das mesmas e qualidade da fotografia, julgo que no essencial são estas [que passo a descrever a seguir]:.



Foto nº 5 


Na 1ª foto, onde está um grupo de 8 elementos, só consigo certificar que o 2º indivíduo, da esquerda para a direita tem nas mãos uma metralhadora ligeira Dectyarev (ou também como é conhecida Dectyaryov) RPD, de origem,  normalmente, ex-URSS, no calibre 7,62 x 39 mm M43, de 1953, operando com uma fita de 150 munições inseridas num tambor. Só produzia fogo contínuo (automático).

Nos outros elementos não se percebe quais as armas que têm na sua posse.


Metralhadora ligeira Dectyarev RDP, calibre 7,62 x 39 mm, m/13, 153 (Origem: ex-URSS).




Foto nº 2

Na 2ª foto, onde estão 5 elementos e da esquerda para a direita verifico que: (i)  o primeiro tem uma metralhadora ligeira Dectyarev RPD, igual à acima descrita; (ii) o  segundo elemento terá uma espingarda semi-automática Simonov SKS-45, no calibre 7,62 x 39mm  M43, da ex-URSS (ou países satélites e da China), surgida em 1945, levando 10 munições dentro de uma caixa, com inserção superior (tipo pente como a mauser) e tendo uma baioneta acoplada. 

Os outros elementos na frente transportam Lança granadas foguete RPG 2, da ex-URSS e países satélites e também da China,surgido em 1949, pesando 4,67 Kg, quando carregada com a granada de 80mm, com capacidade para atingir alvos a um máximo de 200 m (práticos entre 100-150 m).



Espingarda semi-automática Simonov SKS-45, calibre 7,62 x 39mm  M43, 1945 (Origem: ex-URSS). 


LGFog (Lança granadas foguete)  RPG 2, com  4,67 kg de peso (quando carregada com a granada de 80 mm), 1949. (Origem: ex-URSS)



Foto nº 3

Na foto 3, estão 7 elementos, sendo possível identificar no 1º elemento  na frente (da esquerda para a direita), uma espingarda automática Kalashnikov, no calibre 7,62 x 39mm, M43, de origem ex-URSS, mas podendo ser fornecida também pelos países satélites  e pela China, surgida  a partir de 1949, carregador com capacidade para 30 cartuchos, uma cadência de tiro de 600 tpm, peso de 4,78 kg (com as munições), com uma energia de 715 m/s e com alcance prático até 400m.





Espingarda automática Kalashnikov,  calibre 7,62 x 39mm, M43, 1949, com carregador curbo de 30 cartuchos  (Origem: ex-URSS)



Por trás deste elemento está outro com o que parece ser uma espingarda semi-automática Simonov SKS, já identificada anteriormente. Ao lado do 1º e na frente está um guerrilheiro também com uma metralhadora ligeira Dectyarev RPD, também referida anteriormente.

Ainda na frente, do lado direito da foto e de lado está um elemento que parece ter nas mãos uma espingarda Simonov, que também já foi referida.




Foto nº 4

Na foto 4, onde se vêem 5 elementos, nota-se que o 1º do lado esquerdo tem uma espingarda automática ou de assalto Kalashnikov AK-47, o 2º 3º e 5º elementos não se consegue ver qualquer arma, parecendo que o 4º elemento é também possuidor de uma espingarda de assalto kalashnikov AK-47.



Foto nº 5


A foto 5 é a foto de todo o grupo e não acrescenta nenhuma outra arma diferente das que mencionei. O armamento apresentado aqui pelos guerrilheiros [que no total somam 28]  é um pouco inferior ao normal de um  bigrupo do meu tempo, em que surgiam também os RPG7 e mais AK-47 ou mesmo AKM do que as Simonov. Não se vê pistolas metralhadoras [, "costureirinhas",], que ainda usavam, mas também faltam elementos para completar o bigrupo, vê-se mais indivíduos lá atrás e esses poderão ter outras armas.

Junto fotos para comparação destas armas.

Um grande abraço para ti e para todos os editores.
Luís Dias

[Texto e fotos (do armamento): Luís Dias](*)

___________

Nota do editor:

(*) Vd. postes anteriores Luís Dias sobre Armamento;

21 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5682: Armamento (1): Morteiros, Lança-Granadas, Granadas e Dilagrama (Luís Dias)

23 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5690: Armamento (2): Pistolas, Pistolas-Metralhadoras, Espingardas, Espingardas Automáticas e Metralhadoras Ligeiras (Luís Dias)


sexta-feira, 27 de junho de 2014

Guiné 63/74 - P13337: Fotos à procura... de uma legenda (29): O menino... soldado de Madina do Boé, a G3 e a Kalash... (Manuel Coelho, ex-fur mil trms, CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894, Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68)


Foto nº 1


Foto nº 2

Guiné > Região do Boé > Madina do Boé >  CCAÇ 1589/BCAÇ 1894 (Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68). > Foto nº 1 > O menino a fingir de soldado, empunhando a custo  uma G3; foto nº 2 > Uma Kalash, capturada ao PAIGC...  Duas fotos do álbum Fotográfico do nosso camarada Manuel Caldeira Coelho,  ex-fur mil trms,  CCAÇ 1589 (Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68).(*)... Duas fotos à procura de um boa legenda (**)...e da generosa  e espontânea colaboração dos nossos leitores que continuam a ser fiéis ao nosso blogue (a avaliar pelas 6 a 7 mil visualizações de página por dia).

Fotos: © Manuel Coelho (2011). Todos os direitos reservados [Edição: LG]
______________

Notas do editor:

sábado, 10 de dezembro de 2011

Guiné 63/74 - P9177: Blogpoesia (172): Uma a uma, tomei nas mãos as Kalashs... (António Graça de Abreu)

1. Sobre a construção da estrada Jugudul-Bambadinca, de que temos aqui falado, ultimamente, a propósito da localização de Polibaque, encontrei um apontamento poético do António Graça de Abreu (AGA), no seu Diário da Guiné, que merece ser divulgado no nosso blogue, na série Blogpoesia... 


Quem passa por lá hoje, vindo de Bissau, a caminho do leste ou do sul, não imagina quanto suor, sangue lágrimas custou, tanto ao PAIGC como às NT e aos civis guineenses que lá trabalharam,  aquele troço de estrada... 


No final de Julho de 1974, quando o BCAÇ 4612/72, deixou a responsabilidade do Setor 04 (Mansoa),  a estrada Jugudul-Bambadinca tinha uma extensão de 25 km asfaltados (a asfaltagem começara em Fevereiro de 1973, mês em que se concluíram os 7 primeiros quilómetros; em Junho de 1973, os trabalhos estavam no quilómetro 14; um ano depois no 25).




2. No seu Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura (Lisboa: Guerra e Paz, 2007, p. 109), escreveu AGA o seguinte (que reproduzimos com a devida vénia):




Mansoa, 11 de Junho de 1973


Dois pelotões da 38ª de Comandos , afectos ao CAOP1,] foram dar uma ajuda à tropa do batalhão [, BCAÇ 4612/72,] que fazia a segurança nos  trabalhos da estrada Jugudul- Bambadinca e foi flagelada. Houve contacto com o IN e os Comandos que não sofreram feridos, fizeram quatro mortos. Para o CAOP [, Mansoa,] trouxeram as armas dos guerrilheiros, três Kalashikovs e uma Simonov de fabrico russo e chinês. Eu escrevi:


Quatro armas frias,
puras do húmus da terra,
de sangue ainda fresco,
num pano de lona verde.


Uma a uma,
tomei nas mãos as Kalashs,
culatra atrás, bala na câmara,
patilha de segurança.


As armas dos homens que tombaram,
outra vez caídas,
silenciosas, mortas.
O canto doloroso da razão.


3. Comentário de L.G.:


Esta acção não vem referida na actividade operacional do mês de Junho de 1973, constante da História da Unidade do BCAÇ 4612 (Mansoa, 1972/74), talvez por que a 38ª CCmds dependesse do CAOP1 e não do comando do batalhão, sediado em Mansoa.


 ________________


Nota do editor:


Último poste da série > 7 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9152: Blogpoesia (171): Guineíades - Memórias de uma Comissão (António Tavares)

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7335: Kalashnikovmania (5): Passados tantos anos sobre a guerra, continuo fã incondicional da G3 (Mário Dias)



Lisboa, Belém, Forte do Bom Sucesso > 10 de Junho de 2009 > Mini-encontro do pessoal da Tabanca Grande > Da esquerda para a direita, João Parreira (comando da Guiné), Piedade (nfermeira pára), Miguel (pilav), Giselda (enfermeira pára), Mário Fitas (lassa) e Mário Dias (o comando e instrutor dos comandos da Guiné de 1964/66, que hoje nos dá... música, celestial!... Há 35 anos atrás, em 25 de Novembro de 1975, estava de sargento de dia, no Regimento de Comandos da Amadora... E a música era outra!).

 
Foto: © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados




Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCS/BART 2917 (1970/72) > O Fur Mil Op Esp Benjamim Durães, do Pel Rec Inf, numa tabanca do regulado de Badora, com um milícia, junto  a uma  metralhadora ligeira Degtyarev


Foto: © Benjamim Durães (2010). Todos os  direitos reservados




Segundo o nosso especialista em balística e armamento, Luís Dias, trata-se de um Degtyarev DPM que teve origem no modelo DP (Degtyarev Pechotny/Degtyarev de Infantaria), desenhada na URSS depois de 1917 e que veio a ser adoptada como metralhadora ligeira  do Exército Vermelho, em 1927. Em 1943/44 veio a ser modernizada, passando a ser o modelo DPM (modernizirovannyj). Após o fim da IIª Guerra Mundial irá ser substituída, primeiro pela PK-46 e depois pela RPD. 

Estas armas (nomeadamente metralhadoras ligeiras e LGFog que eram apanhadas ao PAIGC) eram, muitas vezes, distribuídas às companhias de milícias... Já a Kalash, por ser considerada uma arma de elite, era muito disputada pela tropa especial, comandos africanos e oficiais de unidades de quadrícula...

Seria interessante pesquisar as razões desta... kalashnikov-mania que, de resto, chegou ao cinema: veja-se o filme  Lord of War / O Senhor da Guerra (2005)...


Kalashikovmania pode ser definido como uma forte atracção pelo armamento do... IN. No TO da Guiné, inclui kalash e outras armas.Trata-se de um neologismo, inventado pela Tabanca Grande, que paga direitos de autor; um dia irá figurar nos novos Dicionários da Língua Portuguesa, como muitos outros termos que usávamos na guerra: por exemplo, dila=dilagrama, LGFog=lança-granada foguete, ameixa=granada...

Curiosamente só hoje (!) dei conta que a bandeira de Moçambique [, imagem acima], na actual versão (que vem de 1983), contem uma estrela (que "representa a solidariedade entre os povos"), mas também a... AK-47 (símbolo da luta armada e da defesa do país), a par de outros símbolos sugerindo desenvolvimento (livro=educação; enxada= agricultura). É, ao que parece, a única bandeira no mundo  a ostentar uma espingarda moderna... Singularidades da lusofonia... Dessa, ao menos, livraram-se os nossos amigos guineenses. 


Lord of War, com Nicolas Cage, filme norte-americano de 2005, passou em Portugal com o título O Senhor da Guerra (no Brasil, O Senhor das Armas). Cage interpreta a personagem de Yuri Orlov, traficante de armas perseguido pela Interpol,  que no filme faz o elogio da AK 47 (confesso que não o vi):

"Of all the weapons in the vast soviet arsenal, nothing was more profitable than Avtomat Kalashnikova model of 1947. More commonly known as the AK-47, or Kalashnikov. It's the world's most popular assault rifle. A weapon all fighters love. An elegantly simple 9 pound amalgamation of forged steel and plywood. It doesn't break, jam, or overheat. It'll shoot whether it's covered in mud or filled with sand. It's so easy, even a child can use it; and they do. The Soviets put the gun on a coin. Mozambique put it on their flag. Since the end of the Cold War, the Kalashnikov has become the Russian people's greatest export. After that comes vodka, caviar, and suicidal novelists. One thing is for sure, no one was lining up to buy their cars"...

Traduzindo: "De todas as armas do vasto arsenal soviético, nada foi mais lucrativo do que o modelo Avtomat Kalashnikova de 1947, mais conhecido como AK-47 ou Kalashnikov. É a espingarda de assalto mais popular do mundo, uma arma que todos os combatentes amam. Um amálgama elegante de quatro quilos de aço e madeira prensada, que não quebra, emperra ou sobreaquece. Dispara sempre mesmo que esteja coberto de lama ou de areia. É tão fácil de usar que até uma criança é capaz de o fazer (e com frequência há crianças que o fazem). Os soviéticos cunharam uma moeda com a sua efígie; Moçambique colocou-a na sua bandeira. Desde o fim da Guerra Fria, a Kalashnikov tornou-se o maior produto de exportação dos russos. Só depois dela vem o vodka, o caviar e os romancistas suicidas. Uma coisa é certa: ninguém fazia bicha fila para comprar os carros soviéticos"...
 (LG).




1. Texto de Mário Dias, enviado em 15 de Janeiro de 2008, publicado dois a seguir sob o título Em louvor da G3. Face duelo AK 47 / G3 (e à onda de... kalashnikovmania que atingiou as NT), justifica-se a repescagem e republicação deste poste.  

O Mário Dias ou M. Roseira Dias é um Sargento Comando Reformado, membro do nosso blogue (desde a 1ª hora), e também um conceituado arranjador e compositor musical, a par de maestro de coros. No TO da Guiné, foi comando e instrutor dos primeiros comandos da Guiné (1964/66), entre os quais alguns dos nossos camaradas da Tabanca Grande, como o Virgínio Briote, o João Parreira, o Luís Raínha, o Júlio Abreu, etc.



2. Passados tantos anos sobre a guerra, continuo fã incondicional da G3

por Mário Dias [, foto à esquerda, com o Domingos Ramos, hoje herói nacional da Guiné-Bissau; foram camaradas e amigos, tendo frequentado o 1º Curso de Sargentos Milicianos, Bissau, 1959]

Foto © Mário Dias(2006). Todos os direitos reservados.


É muito vulgar e frequente tecerem-se comentários depreciativos à espingarda G3, quando comparada à AK47. Em minha opinião, nada mais errado. Analisemos, à luz das características de cada uma e da sua utilização prática, os prós e contras verificados durante a guerra em que estivemos empenhados em África:

(i) Comprimento: G3 - 1020mm; AK47 - 870mm
(ii) Peso com o carregador municiado: G3 - 5,010Kg; AK 47 – 4,8Kg
(iii) Capacidade dos carregadores: G3 – 20 cartuchos; AK47 – 30 cartuchos
(iv) Alcance máximo: G3 – 4.000m; AK47 – 1.000m
(v) Alcance eficaz (distância em que pode pôr um homem fora de combate se for atingido): G3 – 1.700m; AK47 – 600m
(vi) Alcance prático: G3 – 400m; AK 47 – 400m

Passemos então a comparar.(A) No comprimento e peso:
 A AK47 leva alguma vantagem. A capacidade dos carregadores, mais 10 cartuchos na AK47 que na G3, será realmente uma vantagem?

Se, por um lado, temos mais tiros para dar sem mudar o carregador, por outro lado esse mesmo facto leva-nos facilmente, por uma questão psicológica, a desperdiçar munições. E todos sabemos como o desperdício de munições era vulgar da nossa parte apesar de os carregadores da G3 serem de 20 cartuchos.

O usual era, infelizmente, “despejar à balda” sem saber para onde nem contra que alvo. 
Sem pretender criticar a maneira de actuar de cada um perante situações concretas, eu, durante todas as acções de combate em que participei ao longo de 4 comissões, o máximo que gastei foi um carregador e meio (cerca de 30 cartuchos). 
Por tal facto, em minha opinião, a dotação e capacidade dos carregadores da G3 é mais que suficiente, além de que os próprios carregadores são mais maneirinhos e fáceis de transportar que os compridos e curvos carregadores da AK47.(B) Quanto ao poder balístico:
Também aqui a G3 leva vantagem pois, embora na guerra em matas e florestas seja difícil visar alvos para além dos 100/200 metros, tem maior potência de impacto e perfuração sendo a propagação da onda sonora da explosão do cartucho muito mais potente na G3, o que traz uma maior confiança a quem dispara e muito mais medo a quem é visado. 
A G3 a disparar impõe muito mais respeito.


Porém, os principais motivos que me levam a preferir a G3 à AK47 (creio que a fama desta última é mais uma questão de moda) são as que a seguir vou referir ilustradas, dentro das possibilidades, com gravuras:


(C) A importância do silêncio e da rapidez de reacção

Deixem-me, então, começar a vender o meu peixe em louvor da G3. Todos sabemos a importância do silêncio e da rapidez de reacção numa guerra de guerrilha e de como o primeiro a disparar leva vantagem.

Normalmente o combatente numa situação de contacto possível em qualquer lado e a qualquer momento leva geralmente a arma com um cartucho introduzido na câmara e em posição de segurança. Eu e o meu grupo tínhamos bala na câmara e arma em posição de fogo desde a saída à porta de armas do aquartelamento até ao regresso e nunca houve um único disparo acidental. Mas, partindo do princípio que nem todos teriam o treino necessário para assim procederem, a arma iria então com bala na câmara e na posição de segurança.

Quando dois combatentes se confrontam, o mais rápido e silencioso tem mais possibilidades de êxito e, nesse aspecto, a G3 tem uma enorme vantagem sobre a AK47. Talvez poucos se tivessem dado conta dos pequenos pormenores que muitas vezes são a diferença entre a vida e a morte.



Um caso concreto:

Vou por um trilho no meio do mato e surge-me de repente um guerrilheiro. Levo a arma em segurança e tenho rapidamente de a colocar em posição de fogo. Do outro lado o guerrilheiro terá de fazer o mesmo. Em qual das armas esta operação é mais rápida e fácil? Sem dúvida alguma na G3.

Se olharmos para as gravuras observamos que na G3, levando a arma em posição de combate, à altura da anca com a mão direita segurando o punho dedo no guarda mato pronto a deslizar para o gatilho, utilizando o polegar sem tirar a mão do punho com toda a facilidade e de forma silenciosa passo a patilha de segurança para a posição de fogo e disparo.

E o portador de AK47? Sendo a alavanca de comutação de tiro do lado direito da arma e longe do alcance da mão terá que, das duas uma: ou larga a mão do punho para assim alcançar a alavanca de segurança ou então tem que ir com a mão esquerda efectuar essa manobra. Em qualquer das soluções, quando a tiver concluído já o operador da G3 terá disparado sobre ele.

Suponhamos agora que o homem da G3 vê um guerrilheiro e não é por este detectado. A passagem da posição de segurança à posição de fogo, além de rápida, é silenciosa pois a patilha de segurança é leve a não faz qualquer ruído ao ser manobrada. O guerrilheiro não se apercebe de qualquer ruído suspeito e mais facilmente será surpreendido. Ao contrário, um guerrilheiro que me veja sem que eu o veja a ele e tenha que colocar a sua AK47 em posição de fogo para me atingir, de imediato me alerta para a sua presença pois a alavanca de segurança dá muitos estalidos ao ser accionada. Assim, não é tão fácil a um portador de AK47 surpreender alguém a curta distância.



Outro caso concreto:

Todos certamente estaremos recordados de quantos vezes era necessário combinar o fogo com o movimento nas manobras de reacção a emboscadas ou na passagem de pontos sensíveis. Nessas ocasiões, em que fazíamos pequenos lanços em corrida para rapidamente atingirmos um abrigo para o qual nos teríamos de lançar de forma a ficarmos automaticamente em posição de podermos fazer fogo (a chamada queda na máscara), a G3, devido à sua configuração era de grande ajuda,  pois, não tendo partes muito salientes em relação ao punho por onde a segurávamos, (o carregador está ao mesmo nível) permitia que de imediato disparássemos com relativa eficácia.

E a AK47? Reparem bem naquele carregador tão comprido e saliente do corpo da arma. Como fazer manobra idêntica? Impossível. Mesmo colocando a arma com o carregador paralelo ao solo para facilitar a “aterragem”, isso faz com que tenhamos que perder tempo a corrigir a posição de forma a estarmos aptos a disparar. E em combate cada segundo é a diferença entre a vida e a morte.





(D) Defeitos

Um defeito geralmente apontado à G3 é que encravava facilmente com areias e em condições adversas.

Quero aqui referir que ao longo dos muitos anos da minha vida militar, tanto em combate como em instrução ou nas carreiras de tiro, tive diversas armas G3 distribuídas e nunca nenhuma se encravou. A G3 possui de facto um ponto sensível que poderá impedir o seu funcionamento se não for tomado em conta. Trata-se da câmara de explosão, onde fica introduzido o cartucho para o disparo, que tem uns sulcos longitudinais (6 salvo erro)* destinados a facilitar a extracção do invólucro.

 Acontece que se esses sulcos não estiverem limpos e livres de terra ou resíduos de pólvora não se dá a extracção porque o invólucro fica como que colado às paredes da câmara. Se houver o cuidado em manter esses sulcos sempre livres de corpos estranhos nunca a G3 encravará. Outra coisa que poderá levar a um mau funcionamento é as munições estarem sujas ou com incrustações de calcário ou verdete.

Nós tínhamos por hábito, como forma de prevenir este inconveniente, untarmos as mãos com óleo de limpeza de armamento, para esfregarmos as munições na altura de as introduzirmos nos carregadores. E resultou sempre bem.

São pequenos pormenores que deveriam ter sido ensinados na recruta mas, pelos vistos, nem sempre havia essa preocupação bem como muitas outras que foram, a meu ver, causa de algumas (muitas) mortes desnecessárias.



CONCLUSÃO

Depois de passados tantos anos sobre a guerra, continuo fã incondicional da G3. Se voltasse ao passado e as situações se repetissem, novamente preferia a G3 à AK47.


Mário Dias


[ Revisão / fixação de texto / título: L.G.]
____________

Nota de L.G.: