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segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Guiné 61/74 - P21529: (D)o outro lado do combate (61): A chegada dos primeiros cubanos em abril de 1966, e o reforço da guerrilha no Boé, conforme carta de Amílcar Cabral para "Xido", o nome de guerra de Aristides Pereira

Guiné > Zona Leste > Região de Gabu >Setor de Boé > Madina do Boé > 1966 > Vista aérea do aquartelamento. Imagem reproduzida, sem menção da fonte, no Blogue do Fernando Gil > Moçambique para todas

Presume-se que a sua autoria seja de Jorge Monteiro (ex-capitão miliciano da CCAÇ 1416, Madina do Boé, 1965/67) ou de Manuel Domingues, membro da nossa Tabanca Grande, ex-alf mil da CCS/BCAÇ 1856, Nova Lamego, 1965/66 (autor do livro: "Uma campanha na Guiné, 1965/67").

 Foto (e legenda): Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2006).



Folha 1.1


Folha 1.2


Folha 2.1


Folha 2.2

Reprodução, com a devia vénia, de carta manuscrita, de Amilcar Cabral (, algures,) para Aristides Pereira ("Xido", em Conacri),  com data de 12/4/1966.

Fonte:

Portal: Casa Comum
Instituição: Fundação Mário Soares
Pasta: 07061.032.023
Assunto: Encontro com os camaradas do Gabu. Regresso ao Boé. Chegada dos cubanos. Instruções. Envio de bazucas chinesas para o Sul e Madina de Boé. Chegada de dois transístores aos Armazéns do Povo.
Remetente: Amílcar Cabral
Destinatário: Xido [Aristides Pereira]
Data: Terça, 12 de Abril de 1966
Observações: Doc. Incluído no dossier intitulado Manuscritos de Amílcar Cabral.
Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral


Citação:
(1966), Sem Título, Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_35061 (2020-11-9)


1. Carta manuscrita de Amílcar Cabral para o Aristides Pereira (nome de guerra, "Xido"), composta por duas folhas que, para efeitos de revisão. fixação de texto e edição no nosso blogue, reproduzimos em quatro partes (Folhas 1.1., 1.2, 2.1 e 2.2].

É um documento que tem interesse para o conhecimento não só do homem que dirigia o PAIGC ( e que por exemplo fumava cigarros americanos da marca L & M) como dos seus planos para desenvolver e reforçar a guerrilha no Leste, nomeadamente na região de Gabu e no setor do Boé, com o apoio dos "internacionalistas cubanos" que acabavam de chegar a Conacri, em abril de 1966.

Reproduz-se o teor da carta, separando os parágrafos por assuntos ou áreas temáticas, Há, no entanto,  palavras ilegíveis, ou que nos suscitam dúvidas, sendo por isso seguidos de um [?]; noutros casos, são complementadas por "pistas nossas", nomeadamente alguns nomes de militantes do PAIGC, que estavam no mato, nas bases sitas ao longo da fronteira (Boké, Koundara ou Kundara, Kandiafara...).

Recorremos,por isso, à preciosa ajuda do nosso coeditor Jorge Araújo, autor da série "D)o outro lado do combate", para colmatar algumas lacunas...Ele conhece melhor do que ninguém, aqui na Tabanca Grande, o Arquivo Amílcar Cabral, e está familiarizado com a letra e o estilo epistelográfico do eng. Amílcar Cabral... Aqui para nós: isto dá muito trabalho, ler, rever e fixar um texto manuscrito como este...Estou grato ao Jorge pelas correções e melhorias que fez à primeira versão da nossa transcrição... LG


(i) Encontro com os "camaradas do Gabu" [Folha 1.1]

" 12.4.66 [,Terça feira]. Caro camarada Xido [, Aristides Pereira, também conhecido como Chido]: 

"Aproveito o regresso dos camiões [?] para para te enviar pelo Tegma [?, nome ilegível]  estas breves linhas.

"Cheguei há umas horas do encontro com os camaradas do Gabu. Parecem bem dispostos, Têm feito alguma coisa, mas têm feito pouco, a meu ver muito pouco para as possibilidades reais.

 "Tinha chegado aqui [, a base de  Koundara ?, ] ante-ontem vindo diretamente do leste do  [Rio]. Féfiné.  Aí, com o Domingos [Ramos], procedemos ao estudo da operação em geral e começou-se a fase preparatória. Vamos ver". [O rio Féfiné corre a norte e a leste de Béli, e a sudeste de Cabuca, é um afluente do Corubal.]

(ii) Regresso ao Boé e encontros com o Domingos Ramos [Folha 1.2]

"Devo regressar do Boé (leste do Féfiné), depois de amanhã, pois devo reservar o dia de amanhã a verifiar uns materiais. 

"Ao receberes esta [carta] já devo estar de novo com o Domingos [Ramos]  e companhia. Daí partirei para o outro lado do Boé [, o Boé Oriental, onde se inclui a tabanca Lugajole, junto à fronteira, nas proximidades da qual, numa colina,. à cota de 200, se terá realizado a cerimónia da declaração da independência, a 24/9/1973; Lugajole fica a 40 km de Madina do Boé, para leste: informação do nosso camarada Patrício Ribeiro, o português que melhor conhece o Boé.] "


(iii) Chegada dos cubanos [em abril  de 1966, chega a Conacri o grupo avançado de três artilheiros e dois médicos, comandado pelo tenente António Lahera Fonseca] [Folha 1.2 e 2.1]:


"Recebi a tua mensagem pelo Pinto [Eduardo Pinto, que estaria nessa altura em Koundara, na Guiné-Conavri, junto à fronteira, no nordeste ?]. 

"Se chegarem os amigos cubanos apenas 2 poderão vir ter comigo onde estiver. Os outros devem esperar por mim em Conacri, incluisve os médicos. Quando eu chegar de novo ao Boké [, a sul,], onde devo voltar antes do meu regresso a Conacri, os médicos poderão ir ter comigo aí. Mas só entrarão em funções  definitvas quando chegar o Luíz [Delgado ?]

(iv) Alojamento e alimentação dos  cubanos [Folha .2.1]

"Quanto ao alojamento, a ideia do [Hotel]  "Maison Blanche" parece-me boa, mas estuda bem a questão  da alimentação. Pelo menos para os médicos, não me parece que o hotel sirva mau. Mas resolve da melhor maneira em colaboração  com o Luiz Delgado."

(v) Granadas de bazucas chinesas [RPG], para o sul e para o Boé [Folha 2.1]


"Espero que o Mirandela [, barco da Casa Gouveia aprisionado pelo PAIGC, no início da luta armada] tenha chegado a Boké mas que o M[anuel] Azevedo tenha ido para tratar da arrumaçãp do material. 

"Faz o possível por mandar obuzes [,granadas,]  de bazucas [, RPG, ], chinesas para o Sul e para Madina Boé. Mete o Nfamara [Cassama ?] na linha de Kandara [, ou Kandiafara ?]. e o Tegma. [?, nome ilegível] para Boké

"O Pinto adoeceu hoje, mas espero que se restabeleça breve, pois faz muita falta no meio disto, Vamos ver".

(vi)  Material apanhado aos gilas ... e pedido de maços de cigarros L&M [Folhas 2.1 e 2.2]

"Vão umas mercadorias 'saisies' [sic, em francês, com aspas,  apanhadas] aos gilas [, sublinhado,]  , incusive 2 transistores. Essas coisas devem ficar aí intactas até eu voltar, Recomenda isso ao nosso Armazenista do Povo.

"Não te esqueças de mandar cigarros LM, porque já estou nos útimos maços. Mais uma dificuldade."

(vii) Instruções  e saudações finais [Folha 2.2]

"Quanto ao resto, espero que continuemos a cumprir o programa traçado, para podermos evitar as dificuldades que as chuvas causam,  

"Manda para Kundara 1 ou 2 máquinas de costura.

"O Marcelino [Constantino Costa?] recebeu aqui duzentos mil francos, no Domingo [10.04.66].

"Bom, com a cabeça e o calor que tenho, para hoje é tudo.

"Melhoras para ti e que a Lucette [de Andrade] esteja boa.. Diz à Ana Maria [, segunda mulher de Amílcar Cabral,] que espero carta dela. Saudações à Carla e para todos os camaradas. Tenho grandes esperanças neste programa. Abraça-te o velho camarada, [assinado, Amílcar.]"

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Nota do editor:

Último poste da série > 20 de maio de 2020 > Guiné 61/74 - P20994: (D)o outro lado do combate (60): O ataque a Pirada em 15 de julho de 1963 (Jorge Araújo)

sábado, 21 de julho de 2018

Guiné 61/74 - P18863: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (8): Os meus passeios pelo Boé - Parte II: 1 de julho de 2018: Béli (e a Fundação Chimbo Daribó), Dandum, Madina do Boé, Canjadude...


Foto nº 5 > Guiné-Bissau > Região do Boé > 1de  julho de 2018 >  Béli > Bangalós da Fundação Chimbo Daribó


Foto nº 6 > Guiné-Bissau > Região do Boé > 1 de  julho de 2018 >   Picada para Dandum


Foto nº 7 > Guiné-Bissau > Região do Boé > 30 de junho de 2018 > Posto de fronteira de Dandum


Foto nº 8 > Guiné-Bissau > Região do Boé > 1 de julho de 2018 > A célebre Fonte da Colina de Madina, construída em 1945 (, data já pouco legível), no tempo do governador Sarmento Rodrigues (I)


Foto nº 8A > Guiné-Bissau > Região do Boé > 1 de julho de 2018 > A célebre Fonte da Colina de Madina, construída em 1945 (, data já pouco legível), no tempo do governador Sarmento Rodrigues (II)


Foto nº 9 > Guiné-Bissau > Região do Boé > 1 de julho de 2018 >  Madina do Boé: restos do antigo quartel abandonado pelas NT em 6 de fevereiro de 1969.


Foto nº 10 > Guiné-Bissau > Região do Boé > 1 de julho de 2018 >  Madina do Boé: tabanca.


Foto nº 11 > Guiné-Bissau > Região do Boé > 1 de julho de 2018 >  Madina do Boé: monumento ao herói do PAIGC, Domingos Ramos, morto em 1966.


Foto nº 12 > Guiné-Bissau > Região do Boé > 1 de julho de 2018 >  Caminhos do Boé, com colinas ao fundo.

Fotos (e legendas): © Patrício Ribeiro (2018) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (8) > Os meus passeios pelo Boé - Parte II: 1 de julho de 2018:  Béli, Madina do Boé, Dandum, Canjadude...

[ Patrício Ribeiro é um português, natural de Águeda, criado e casado em Angola, com família no Huambo, ex-fuzileiro em Angola durante a guerra colonial, a viver na Guiné-Bissau desde meados dos anos 80 do séc. passado, fundador, sócio-gerente e director técnico da firma Impar, Lda.]

(Continuação)

Ultrapassado o rio [Corubal] (`), lá seguimos por cima da estrada de pedra a caminho de Beli, mais ou menos  40 km, passando por algumas poucas tabancas, que outrora eram bem pequenas, com as casas todas cobertas a palha, mas agora são maiores e com mais casas, quase já não há casas cobertas a palha. Este caminho é muito bonito e difícil.

Ao chegar a Beli, iniciamos o nosso trabalho e procuramos alojamento nas instalações da Chimbo, que tem 9 bangalós para alugar.

São holandeses, da Fundação Chimbo Daribó. Andam a instalar máquinas fotográficas nas árvores, para fotografarem os Chimpanzés (muitos), Búfalos, alguns e alguns leões: www.chimbo.org (foto 5)

Não há Internet, mas na vila há telefone. No resto da região, não. A língua falada corrente é o Fula. Por vezes não é possível uma conversa em Crioulo e Português, língua oficial, só com professores e alguns funcionários. Os jovens entendem um pouco.

Ao outro dia [, 1 de julho de 2018} seguimos viagem para Dandum, voltamos para trás até tabanca de Cobolo e seguimos em direção a Sate; dali por um caminho a corta mato para Diquel, por onde as viaturas ainda passam. Passamos por algumas pequenas tabancas perdidas nas colinas do Bolé, mas todas têm escolas. Cruzamos alguns rios que começam rapidamente a aumentar o caudal, com a chuva que está a cair.

Lugares muito bonitos e completamente diferentes do resto da paisagem da Guiné (foto 6). Algumas destas tabancas já existiam. (Ver mapa de 1961 da Província da Guiné, e voltaram a ser implantadas na Carta Geológica da Guiné, do Dr. Paulo Alves, em 2011).

Por aqui começam a aparecer algumas hortas de caju nos vales, assim como algumas pequenas tabancas, porque os terrenos são mais férteis. O que obriga os animais selvagens existentes no Parque Natural do Boé a ter de "arranjar" outros locais … Agora são avistados para os lados de Lugajole.

Chegamos até perto de Madina do Boé, mas seguimos o caminho para Dandum, 3 km mais à frente.

Dandum, a tabanca é muito grande com muitas casas, tem posto de fronteira (foto 7):  alguns funcionários públicos, guardas de fronteira, professores;  tem um hospital, tudo e todos perdidos na distância para Bissau... O local é uma planície com terra muito fértil, com muitas árvores de fruto.

Verificamos o trabalho que tínhamos realizado no hospital há uns meses, está tudo ok!

No regresso pelos mesmos caminhos, mas paramos em Madina do Boé, para as fotos da praxe. A tabanca de Madina do Boé fica em uma planície fértil, com muitos árvores de fruto e tem alguns morros ao longe (Fotos 9,10).

Foto junto da fonte construída,  em 1945, que já tem diversas fotos no blog (foto 8).

Estivemos junto ao Memorial de Domingos Ramos, local onde foi ferido e provavelmente morto (foto 11). Está aproximadamente a uns 500 metros da fonte de 1945 e do antigo quartel, a poucos metros do caminho para Dandum, na planície.

Regresso a Beli, para assistir ao encontro de Portugal / Uruguai no club dos jovens, enquanto a trovoada deixou ver, até que o sinal da parabólica deixou passar.

Grande foi a festa, quando Portugal marcou o golo.

Depois regresso de Beli até Candjadude (foto 12) onde passamos o resto do dia a fazer trabalhos, antes da chegada da noite, a Gabú.

Abraço
Patrício Ribeiro

PS - Sobre, o Memorial ao Domingos Ramos: não, não havia nenhuma inscrição. O pessoal que me acompanhava do Parque Natural do Boé, sabia deste local, indicaram-me talvez porque passamos perto. Das outras vezes que fui a Madina não me indicaram este sitio. Do outro lado da picada, perto a 70 metros, já há algumas casas. Na texto que te enviei, descrevo o local.

A Net por estas paragem não é uma ciência exacta... é muito complicado.


Carta da Província da Guiné (1961) > Escala 1/500 mil > Detalhe: a região do Boé

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)
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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de julho de 2018 > Guiné 61/74 - P18861: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (7): Os meus passeios pelo Boé - Parte I: 30 de junho de 2018: a travessia do Rio Corubal, de jangada, em Ché Ché

sábado, 30 de dezembro de 2017

Guiné 61/74 - P18154: Memória dos lugares (367): "Guiné-Bissau e Cabo Verde", fotografia de Ulisses Rolim - Para lá do Tcheche, amor pelas gentes de Lugadjole (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Março de 2016:

Queridos amigos,

Há muito pouco a dizer para justificar estas imagens. Já numa fase adiantada da preparação do meu livro "História(s) da Guiné-Bissau" necessitei de ir consultar um livro na Biblioteca Gulbenkian. De pesquisa em pesquisa cheguei a este catálogo. Não me espanta o texto que Ulisses Rolim escreveu, é o feitiço guineense que decorreu, decorre e decorrerá deste encontro e partilha de afetos.
Interrogo-me sobre quem muda mais, nós ou os cidadãos daquela terra. Lembro-me das cartas que durante anos me chegavam da Guiné-Bissau: volta, vem visitar-nos, não te esquecemos, os nossos filhos e os filhos dos nossos filhos ouvem as histórias que lhes contamos. Por isso, não sem quem muda mais, certo é que mudámos depois de tudo o que vivemos e que fica nesta lembrança permanente.

Um abraço do
Mário




Amor pelas gentes de Lugadjole

Beja Santos

Imaginem o que é entrar na Biblioteca da Gulbenkian com o único propósito de passar um bom par de horas a ler “O Desafio do Escombro” de Moema Parente Augel, porventura o estudo mais consolidado sobre a literatura da Guiné-Bissau. A remexer nas fichas dou com a existência de alguém que fez uma exposição em Ponte de Sor, com fotografias da Guiné. Faz-se a requisição e vem o espanto, Ulisses Rolim gostou mesmo da experiência de Lugadjole, na região do Boé, onde presuntivamente se terá realizado a cerimónia da independência unilateral da Guiné-Bissau em 24 de Setembro de 1973. Para quê acrescentar mais texto? Para meu pesar, não sei a que se dedica Ulisses Rolim, se inclusivamente voltou à Guiné. Do seu amor pelo que experimentou e conheceu ficam estas duas imagens crianças, tão enternecedoras. E ponto final.


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Nota do editor

Último poste da série de 29 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17808: Memória dos lugares (366): em 1947, Canchungo ainda não se chamava Teixeira Pinto, nem a vila de Gabu era Nova Lamego... Xime e Xitole escreviam-se com "ch" e o Quebo (futura Aldeia Formosa) nem aparecia no mapa...

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Guiné 63/74 - P12073: Notícia dos nossos amigos da AD-Bissau (29): Efeméride: Há 40 anos era proclamada, unilateralmente, a independência da Guiné-Bissau... (Não em Cubucaré, no sul, como estava inicialmente previsto, mas no leste, na região do Boé... E aqui não foi em Madina do Boé, nem em Lugajole, mas sim em... Vendu Leidi, um lugarejo fronteiriço)






A independência da Guiné-Bissau foi proclamada, unilateralmente,  pelo PAIGC, em 23 de setembro de 1973, na região do Boé, não em Madina do Boé, como durante anos se fez crer, nem sequer em Lugajole, mas sim em Vendu  Leidi, localidade fronteiriça da zona leste... Esteve inclusive planeada para ser no sul, na península de Cubucaré  (setor de Bedanda)... Os planos do PAIGC foram sucessivamente açterados, à última da hora, pro razões de segurança. Havia sérios riscos de bombardeamentos pela Força Aérea Portuguesa.

Hoje o dia 24 de setembro é feriado nacional na Guiné-Bissau. Portugal, como é sabido, só reconheceu a independência da Guiné-Bissau, um ano depois, em 10 de setembro de 1974.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013).


 E a propósito desta iniciativa comemorativa, de um grupo de antigos combatentes do PAIGC do Cubucaré, na região de Tombali,  lê-se no sítio da AD-Bissau:

(...) Como jovem país, embora com conturbados desvios no seu caminho, [a Guiné-Bissau] procura recuperar a sua própria identidade e força para se afirmar como uma nação moderna e progressiva.

As sucessivas lideranças que fomos tendo, esqueceram-se claramente do pensamento de Amilcar Cabral e dos ensinamentos da Luta, embarcando em sucessivas aventuras militaristas e afastando-se dos ideais do Combate inicial.

Há quem chegue a pensar que a Luta foi uma operação militar e que por isso, todos os outros que a ela aderiram e que não pegaram em armas, não têm os mesmos direitos dos que vestem as fardas, grande parte delas apanhadas nos becos da História.

 (...) 
Todos contribuíram decisivamente para a vitória, incluindo mesmo aqueles que, durante estes 40 últimos anos, se esqueceram das tabancas onde vivem todos os seus antigos camaradas de Luta, para se sentarem a descansar em Bissau.(...)

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quarta-feira, 10 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11822: Álbum fotográfico do Xico Allen: região do Boé, 1998: trágicos vestígios 'arqueológicos' da guerra colonial, entretanto já destruídos ou desaparecidos...

Guiné-Bissau > Região do Boé > > Boé > 1998 >   Embora esta zona seja pouco habitada, o Xico Allen encontrou e fotografou população civil quando lá esteve em 1998, com o António Camilo, o algarvio, e outros camaradas. Na época o grupo de portugueses que se deslocou ao Boé, partiu de Quebo (Aldeia Formosa), tomando uma picada existente sempre junto à fronteira com a Guiné- Conacri até á povoção do Boé, nas proximidades da antiga Madina de Boé, nosso aquartelamento e tabanca. No regresso vieram por Cheche onde atravessaram o Rio Corubal (onde lembraram os camaradas mortos e desaparecidos no trágico acidente de 6/2/1969, Op Mabecos Bravios) e seguiram para o Gabu (ex-Nova Lamego).


Guiné-Bissau> Picada de Cheche - Gabu > 1998 > Restos de viaturas das NT abandonadas...  [Julgo que entretanto, nestes últimos anos, foram retirados ou destruídos  todos estes vestígios "arqueológicos" da guerra colonial. L.G.]


Guiné-Bissau> Picada de Cheche-Gabu > 1998 >. Trinta anos depois da retirada de Madina do Boé (em 6 de fevereiro de 1969) ainda continuavam vísiveis os sinais das emboscadas e das minas...

Guiné-Bissau> Região do Boé  > Rio Corubal > Cheche > 1998 > Praia fluvial com rampa de acesso. Foto tirada a meio do rio, na viagem de Quebo (Aldeia Formosa) - Boé - Cheche- Gabu (Nova Lamego).



Guiné-Bissau> Madina do Boé > 1998 > A famosa fonte da Colina do Boé, com ornamentação de azulejo português, pintado à mão, de 1945. Parece(ia) haver vestígios de impacto de balas de armas automáticas (?).

Guiné-Bissau> Madina do Boé > 1998 > A famosa fonte da Colina do Boé é um sítio onde se concentra(va) alguma população civil da escassa que há (havia)  nesta região semidesértica, e a única da Guiné que é acidentada (com cotas que sejam quase aos 300 metros).


Guiné-Bissau> Picada Madina do Boé- Cheche - Gabu > 1998 > Fantasmas da guerra colonial que, de tempos a tempos, perturba(va)m a paisagem e o viajante... Mais uma viatura dos tugas abandonada à beira da picada...



Guiné-Bissau> Picada Cheche-Gabu > 1998 > Mais trágicas memórias da guerra...

Fotos (e legendas): © Francisco Allen / Albano M. Costa (2006). Todos os direitos reservados [Edição e kegendagem complementar: L.G.,]


1. O Xico Allen [ex-1.º cabo at inf, CCAÇ 3566 - Os Metralhas, Empada, 1972/74, foto à direita], nosso tabanqueiro desde 2006, foi um dos primeiros camaradas a voltar á Guiné, depois da independência. E nos últimos anos chegou mesmo a lá viver. De acordo com as memórias da Zélia Allen, também nossa tabanqueira, o casal Allen visitou a Guiné do pós-guerra, em abril de 1992, eles os dois mais um outro casal, o Artur Ribeiro e a esposa. Voltaram em 1994 lá voltaram, desta vez foram 3 casais e conseguiram ir a Empada, onde o Xico tinha feito a sua comissão. Uma terceira viagem foi em 1996 e uma quarta em 1998.
"Em Maio de 98, só os dois lá fomos e como costume, super carregados de roupas, brinquedos, medicamentos e alguns comestíveis, tudo para por lá distribuir. Xico sempre se zangava comigo na hora da partida pois parecia que eu desconhecia que de avião cada passageiro só pode levar 30 kgs de bagagem a não ser que pague o excesso. Mas eu, confiando sempre na minha boa estrela, deixava-o resmungar pois logo se veria, já que pagar é que não fazia parte dos nossos planos. Chegados ao balcão do chek-in e pesadas as malas, o peso total atingia quase 130 kgs. Que fazer?


"Enquanto ele resmungava pois sentia-se envergonhado perante tal situação, eu fui conversando com o gentil assistente, dizendo o que levava e porque o fazia, pois ia ao encontro de tantas carências quando as podia amenizar um pouco com tudo que ali estava, levando assim um pouco de felicidade e muita alegria sobretudo às crianças que nunca tinham tido um brinquedo de verdade. A minha argumentação conseguiu que a sua sensibilidade ultrapassasse o cumprimento das regras impostas e, já que não havia risco de perigo, pois se uns levam peso a mais outros levam a menos, o facto é que conseguimos levar tudo sem pagar mais por isso.

"Lá chegados, passamos uns 2 dias em Bissau e num jipe alugado viajámos para o interior, tendo como destino Empada, onde estivemos 2 dias. Aí sim, a experiência foi única até hoje, pois dormimos, comemos e tomamos alguns banhos na tabanca, onde luz só a da lua, das estrelas e da nossa lanterna pois desde a saída da tropa portuguesa não mais houve energia assim como outros bens essenciais, desde material escolar, medicamentos e alimentação. Os banhos, se assim se podem chamar, eram feitos despejando cabaceiras cheias de água retirada de um poço que gentilmente algumas mulheres nos iam entregando, fazendo-os passar por cima de um cercado e que funcionava como banheiro e não só...

(...)"No sábado regressámos a Bissau, onde outra grande aventura nos aguardava mas é demasiado longa assim como tantas outras para as inserir aqui, regresso esse devido a que no domingo à noite, com a chegada do avião,iria juntar-se a nós um grupo de 10 pessoas, 7 deles ex-combatentes, na sua 1ª romagem de saudade, que como todos os outros era a concretização de um sonho, sendo um deles o Sr. Casimiro, aqui do Porto, que se fez acompanhar pelo seu jovem genro, o Carlos, e outros seus amigos e companheiros de guerra, tendo então eu a oportunidade de conhecer o Sr.Armindo, de Moreira de Cónegos, o Sr. Camilo, do Algarve, o Sr. Pauleri, de Vizela, o Sr.Amílcar, aqui de Gaia, único que levou a esposa sendo assim eu beneficiada pois tive companheira para o resto da estadia e dos restantes lamentavelmente não me recordo dos nomes.

"O que não esquecerei nunca, foi poder ver a alegria misturada com a emoção, quando chegámos a Jumbembem, local bem conhecido deles, pois mais não me pareciam do que crianças irrequietas em pleno Portugal dos Pequeninos, tentando ver todo o canto e recanto onde viveram outrora." (...)


Julgo que para a Zélia aquela, a de 1998,  foi a sua última viagem à Guiné, mas não para o Xico, que continuou a lá ir rgulamente. As fotos que hoje republicamos, em formato "extra large", são dessa viagem de 1998, em que o Xico, o Camilo e outros camaradas foram até à região do Boé, a partir de Quebo, no sul, seguindo a estrada junto à fronteira. Estiveram em Boé, não sei se chegaram a ir a Beli,  e seguiram depois pela antiga picada que, indo por Cheche e Canjadude, ia dar a Gabu (Nova Lamego)... Fizeram, por isso, o mesmo percurso das NT,  Fevereiro, no âmbito da Op Mabecos Bravios (1-7 de fevereiro de 1969), ou seja a picada Madina do Boé-Cheche-Canjadude-Gabu. Estas fotos do Xico Allen têm um enorme interesse documental (tal como as fotos do álbum do Manuel Coelho, ex-fur mil trms da CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894, Nova Lamego e Madina do Boé, 1966/68),  embora já tivessem sido publicadas, em formato reduzido, na I Série do nosso blogue, em 6/2/2006, no poste 500 (*).

Na altura, o Xico ainda não era nosso tertuliano (ou tabanqueiro), alegadamente por  não ter endereço de email...  Mas creio que já estava reformada da atividade bancária. Aliás, em conhecia-o, pessoalmente, a ele, ao Albano Costa , ao Hugo Costa e ao Zé Teixeira, em 31/12/2005, na Madalena... Foi o Albano Costa que, nesta transação,  serviu de intermediário: Teor da mensagem do Albano:

"Caro amigo Luís Graça: Envio sete fotos sobre Madina de Boé, a picada onde foram destruídas várias viaturas durante a guerra colonial, a fonte da Colina de Medina e a população civil de Madina. Luís, vou procurar nos meus arquivos para ofereceres essa imagem ao Mário Dias de uma placa que existe no Boé sobre o Domingos Ramos.

"Estas fotos são do arquivo do Francisco Allen: ainda hoje estive com ele, fica contente em saber que são úteis, as fotos. Um abraço, Albano Costa".






Guiné > Carta  da província > 1961 >  Escala 1/500 mil > Pormenor da região do Boé > .Pormenor do Gabu (Região de Gabu), passando pela antiga Madina do Boé, Cheche e Canjadude.  A independêmcia unilateral da Guiné-Bissau foi declarada em 24/9/1973, não em Madina do Boé (como se fez crer durante muitos anos), mas na região fronteiriça, a leste,  alegadamente em Orre Fello, perto de Lugajole, mas já em território da Guiné-Conacri. Por razões óbvias de segurança... Foi uma das maiores operações de propaganda, a nível interno e externo,  do PAIGC na época.

O antigo aquartelamento de Madina do Boé foi retirado em 6/2/1969 (Op Mabecos Bravios). O destacamento de Beli já sido retirado uns tempos antes, em 1968. Com retirada de Beli, Madina do Boé e Cheche, o aquartelamento mais a sul, de Gabu,  que nos restou foi o de Canjadude (guarnecido pela CCAÇ 5, onde esteve o nosso camarada e colaborador permanente José Martins, em 1968/70).

Foi também nesta região (desertificada) do Boé, "região libertada" (segundo a terminologia do PAIGC) que foram executados (por fuzilamento) uma boa parte das quase duas centenas de militantes e dirigentes do PAIGC acusados e condenados à morte pelo seu alegado envolvimento na conspiração e assassínio de Amílcar Cabral (em 22/1/1973). Todas as provas do seu julgamento, feito em Conacri,  desapareceram.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013).



Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Ingoré > 1998 > Uma  foto que correu mundo... ou que , pelo menos, já deu a volta à Tabanca Grande... A legenda é do Albano (Costa): “Esta foto vale pela imagem, e os brancos em África converteram-se? Não é que ficaram a ver a Zélia a puxar o burro, mulher de armas!"... O Albano fez questão de me mandar esta e outras fotos da viagem do Xico e da Zélia, em 1998, com o seguinte recado: "... para ilustrares o que entenderes, com a devida autorização da Zélia" (sic).

Foto: © Francisco Allen / Zélia Neno (2006). Todos os direitos reservados.

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Nota do leitor:

(*) Vd. I Série, poste de 6 de fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - D: Madina do Boé, 37 anos depois

domingo, 23 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8939: Memória dos lugares (159): Lugajole, 2004 - Memorial à declaração unilateral da Independência da Guiné-Bissau, localizado em Orre Fello (Rui Fernandes)

1. Mensagem de 21 de Outubro de 2011 do nosso tertuliano Rui Fernandes, dirigida ao nosso camarada Virgínio Briote:

Caro Virgílio Briote
Na sequência do Post-8928* de Tina Kramer, envio fotos de Lugadjole tiradas em Abril de 2004, com maior detalhe do Monumento em Orre Fello.

Nunca ouvi que Amílcar Cabral tenha lá vivido, mas sim que foi o local da declaração da Independência. Por outro lado naquela estrutura não se nota qualquer identificação de que tenha tido um telhado.

Tapei a face das pessoas porque não pedi autorização às mesmas para publicação das fotos.

Quanto às fotos da vista para Lugadjole era impossível em melhor condições, devido ao declive acentuado do terreno e à vegetação existente

Não sei se terá interesse publicá-las no blogue, pelo que ficará ao critério dos Administradores/Editores.

Com os meus cumprimentos
Rui Fernandes


Localização de Lugajole - Imagem Google

Localização do Monumento em Orre Fello - Imagem Google


Escola Primária Comunitária de Lugajole

Vista posterior do Monumento

Frente do Monumento

Placa não legível

Vista do Monumento para Lugajole

Vista do Monumento para Lugajole

Vista do Monumento para Lugajole
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 19 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8928: A nossa expedição à Guiné (Tina Kramer) (1): Gabu - Lugadjole (de 28 de Março a 7 de Abril de 2011)

Vd. último poste da série de 21 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8933: Memória dos lugares (158): Cufar e o porto do rio Manterunga, extensão do inferno na terra : 2 de Março de 1974 (António Graça de Abreu)

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8928: A nossa expedição à Guiné (Tina Kramer) (1): Gabu - Lugadjole (de 28 de Março a 7 de Abril de 2011)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Outubro de 2011:

Queridos Amigos,
A Tina envia este relatório para o blogue. Por mim, não mexeria no português, é tudo compreensível, afectuoso, um olhar compenetrado de uma antropóloga que descobriu um povo amável com gente da nossa idade ferida até ao tutano, os do PAIGC, que se sentem desprezados e ignorados pelas novas gerações, os que combaterem sob a nossa bandeira que aguardam uma reparação na velhice.
Enfim, sofrimento a rodos, um constrangimento para nós.

Um abraço do
Mário


2. Mensagem de Tina Kramer* para Mário Beja Santos:

Querido Mário,
Como está e como corre o trabalho?
Falei com o Abdu na semana passada e ele contou-me me que foi assaltado. Que horrível! Espero que ele esteja melhor agora.


Enfim escrevi um pequeno relatório sobre a nossa viagem à Guiné. Espero que não tenha muitos erros e que seja aceitável para o blog. Caso tenha dúvida, avisa.

Senão tenho mais uma pergunta: O Mário sabe onde eu podia encontrar informações quanto aos leis portugueses e guineenses sobre as reformas para os antigos combatentes?

Um abraço
Tina


A nossa expedição à Guiné
Escrito por Tina Kramer

Para a minha tese sobre as memórias da Guerra Colonial/Luta de libertação eu fui para a Guiné no mês de Fevereiro até Junho em 2011

Felizmente através do Doutor Mário Beja Santos eu conheci o Abduramame Serifo Sonco, um homem muito inteligente e bem educado, oriundo da Guiné e um neto do grande Régulo Infali Sonco de Missirá, perto de Bambadinca. O Abdu passou a ser o meu assistente na Guiné e acompanhou-me a maior parte do tempo lá. Graças à indispensável ajuda do Mário antes da minha partida e do Abdu durante a minha estada, a Guiné foi uma experiência extraordinária para mim e eu podia colecionar muitos dados interessantes para o meu trabalho. De seguida queria mostrar alguns aspectos da nossa viagem.

Logo depois da nossa chegada em Bissau o Abdu apresentou-me à família dele e como a família é grande também durante as viagens ao interior do país encontrámos outros membros da família. Todos foram muito hospitaleiros e assim muitas vezes tivemos um alojamento em família.

Durante a minha estada em Bissau fiquei na Pensão Central. Felizmente eu podia ainda conhecer o encanto da Pensão e sobretudo da avó Berta. Gostei muito dos almoços deliciosos, quando havia visitas e a avó fazia o seu sorriso cheio de alegria e humor. Também apreciei muito os momentos à noite com a avó e os empregados dela na varanda quando a avó começava a cantar e contar algumas anedotas da vida dela. Parece que com a partida da avó Berta de Bissau uma parte importante da história da Guiné do século vinte terminou.

Na totalidade fizemos mais ou menos três viagens prolongadas no interior do país. Como os transportes públicos não são muito seguros e não chegam a todas as localidades que nós queríamos visitar, comprámos uma motorizada pequena para começar a nossa aventura.

Avó Berta e eu em Bissau, 18 de Fevereiro de 2011
Foto ©: Tina Kramer

O Abdu com a nossa motorizada em Lugadjole, 2 de Abril de 2011
Foto ©: Tina Kramer

1. Gabu - Lugadjole (de 29 de Março a 7 de Abril 2011)

A nossa primeira viagem levou-nos ao nordeste do país (Bambadinca-Bafatá-Gabu-Beli-Lugadjole). Por causa dos buracos na estrada empanámos muitas vezes o que nos deu a possibilidade de ver tabancas (=aldeias) outras que planificadas e de falar com a gente lá. Ao contrário de Bissau com o seu barulho, o lixo, os abutres e a poeira, as tabancas da Guiné são calmas, lindas e limpas. Os habitantes são simpáticos, a peito descobertos, solícitos e hospitaleiros.

Durante todas as viagens que fizemos foi fácil encontrar antigos combatentes do PAIGC que estavam prontos para uma entrevista. Mesmo em tabancas pequeninas pelo menos um. Ao contrário foi difícil para nós encontrar antigos combatentes do exército português que queriam falar connosco. Muitos ainda têm medo de falar sobre a guerra e de mostrar que eles combateram do lado português. A perseguição e os fuzilamentos dos camaradas deles pelos combatentes do PAIGC logo depois da independência são ainda experiências traumáticas na memória destes guineenses.

Mas quando tínhamos chegado a Gabu, encontrámos dois combatentes da Associação dos Ex-Militares das Forças Armadas Portuguesas na Guiné. Iniciada pelos membros da Liga do Combatente e legalizada em 2002 esta associação e bem conhecida também noutras partes da Guiné, por exemplo em Bissau, em São Domingos e em Buba. Mas por causa dos grandes problemas financeiros não executam actividades há alguns anos. Muitos dos antigos combatentes do exército português com quem falámos desejam um apoio e sentem-se atraiçoados pelo governo português. Também muitos queriam entrar de novo em contacto com os antigos camaradas portugueses, mas não têm meios para isso.

Ao lado do mercado em Gabu, 31 de Março de 2011
Foto ©: Tina Kramer

Deixámos Gabu atrás de nós com os seus comerciantes Fulas, as mulheres bonitas, tantos burros e vacas, bicicletas e motorizadas. Continuámos para Lugadjole com a sua colina Orre Fello, onde no dia 24 de Setembro 1973 o PAIGC proclamou a independência da Guiné-Bissau. Com um trajecto de ca. 100 km pensámos que íamos chegar logo, mas o caminho foi muito mais difícil do que esperávamos. Com uma estrada de terra batida e cascalhos grandes e calores que podíamos sentir durante umas caídas com a mota. Sofremos sede e fome e queimámos no sol rigoroso. Assim eu podia imaginar um bocado como os antigos combatentes deviam sofrer durante as marchas extensas no mato.

Finalmente chegámos e encontrámos uma tabanca que não tinha luz nem captação, mas com habitantes hospitaleiros e generosos, que nos deram um telhado e comida. No dia seguinte de madrugada um antigo combatente do PAIGC e o filho dele que trabalha como professor mostraram-nos o sítio histórico no Orre Fello. Infelizmente só existem ruínas duma pequena casa, o que o Amílcar Cabral devia habitar. Mas o orgulho está ainda visível nos olhos do velho e a gente da aldeia esperam um apoio do governo guineense para recuperar este lugar importante para a história da Guiné.

Ruínas da proclamação da independência em Lugadjole (Madina de Boé), 2 de Abril de 2011
Foto ©: Tina Kramer

(Continua)
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Nota do Editor:

(*) Vd. postes de:

22 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6774: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (1): Pedido de colaboração da doutoranda alemã Tina Kramer

26 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6791: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (2): Tina Kramer, etnóloga, Universidade de Frankfurt, em trabalho de campo, em Lisboa

31 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6813: Tabanca Grande (234): Tina Kramer, 27 anos, etnóloga, da Universidade de Frankfurt, Alemanha