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quinta-feira, 16 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20860: "Viagem de volta ao mundo: em plena pandemia de COVID 19, tentando regressar a casa (Constantino Ferreira & António Graça de Abreu) (9): Em navegação, no Mar Vermelho: "não acredites em nada antes de ver e, depois de ver, continua a não acreditar"... E um momento de grande emoção, na Sexta Feira Santa!...



MSC - Magnífica > Cruzeiro de Volta ao Mundo > Em navegação, a caminho do Mar Vermelho e do "Mare Nostrum", o Mediterrâneo. > Sexta Feira Santa, 10 de abril de 2020 > Fotos de um espetáculo a bordo, alusivo à Paixão de Cristo... "Há mais de um mês, sobre mil oceanos e mares, tocando terra ao de leve, temos a ameaça da morte à nossa volta."

Fotos (e legenda): © António Graça de Abreu (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Elsa e Comstantino Ferreira, Wellington, capital da Nova Zelândia, 15 de março de 2020.
Foto: Cortesia da página do faceboook de Constantino Ferreira. Foto reeditada pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

1. Constantino Ferreira d'Alva, eex-fur mil art da CART 2521 (Aldeia Formosa, Nhala Mampatá, 1969/71), membro da nossa Tabanca Grande desde 16 de fevereiro de 2016. Vai a bordo do MSC -Magnífica, que teve de apressar o seu regresso ao ponto de partida, devido à pandemia de COVID-19. 

Está a escrever o seu diário de bordo, desde 23 de janeiro de 2020, disponível na sua página do Facebook, agora a "quatro mãos", com o António Graça de Abreu, de quem hoje se publica duas pequenas crónicas.

2. AS duas últimas mensagens,   que nos chegaram, por email, do António Graça de Abreu [, ex-alf mil, CAOP 1 8Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), membro sénior da Tabanca Grande, com mais de 250 referências no nosso blogue]


(i) Em navegação, Oceano Ìndico, 7 de Abril de 2020

Tenho repetido a mim próprio, inúmeras vezes, que não devo acreditar em nada antes de ver, tal e qual como aprendi com o não muito sábio S. Tomé. Só que, normalmente me esqueco da continuação da frase que há muitos anos decorei na China, que diz que "depois de ver, devemos continuar a não acreditar."

Ontem vi, com estes olhos que a terra, ou o crematório, há de comer, vi, claramente visto, no imenso mar diante de Colombo, Sri Lanka, vi (ate tirei fotografias!) uma passageira do Magnífica ser retirada do nosso navio numa maca e levada para um rebocador cingalês, e assisti à saída de um tripulante nosso, tambem entrando para dentro do rebocador, no meio de um enorme aparato de pessoas com máscaras e fatos anti-coronavírus, quer no barco do Sri Lanka, quer no Magnifica.

No nosso, as medidas tomadas iam no sentido de o nosso pessoal se proteger contra qualquer contágio do pessoal cingalês que quase entrava no nosso navio. Como expliquei ontem, à noite o nosso capitão informou que se tratava de uma passageira que necessitou de mais tratamentos médicos. Hoje tivemos a continuação das informações. Dentro do nosso navio sabe-se que a senhora alemã, de 75 anos de idade, teve uma apendecite aguda e precisou de ser operada, com urgência.

Entretanto, o tripulante, o único de nacionalidade cingalesa a trabalhar no Magnifica, aproveitou a paragem no mar de Colombo para terminar o seu contrato com a MSC. Fez muito bem e regressou a casa.

Há pouco vieram mostrar-me num telemóvel as notícias publicadas no jornal Colombo News, a propósito deste acontecimento, que já estão na Net e que metem o Presidente da República do Sri Lanka, e tudo. Mais ou menos nos seguintes termos:

Historiaram, mal, a viagem de Volta ao Mundo do Magnifica, informaram que o nosso navio, por suspeitas de casos de coronavírus a bordo,  estava proibido de acostar a qualquer porto do mundo. Mas o povo do Sri Lanka era simpático e hospitaleiro, e Sua Excelência Gotabaya Rajapksao, o Presidente da Republica,  autorizou que a passageira do navio italiano, que tivera um ataque cardíaco e podia ter sintomas de outras doenças, desembarcasse e entrasse num hospital em Colombo. 

O tripulante, de nacionalidade cingalesa, agradecia, comovido, ao Presidente da República por ter podido sair do barco e regressar à pátria com saúde, agradecimento extensivo ao ministro da Marinha, Pyal De Silva (por certo, descendente de portugueses!), que, numa situação tão difícil, tão bem defendeu e zelou pelos interesses do povo do Sri Lanka, unido em volta do seu presidente Gotabaya Rajapksao.

Como diria o nosso Gil Vicente, há quase seis séculos atrás, "assim se fazem as cousas." E, como digo eu, caá por estas bandas do Oriente, "não acredite em nada antes de ver, depois de ver continue a não acreditar."

António Graça de Abreu

(ii) Em navegacao, Golfo de Aden, 10 de Abril de 2020

Hoje, Sexta-feira Santa, houve, às duas da tarde, um minuto de silêncio, simples homenagem a todos os que faleceram vítimas de coronavírus 19.

Depois, às três horas, com o teatro quase cheio, o coro improvisado dos velhinhos do navio, criado no decorrer da viagem, com o pomposo nome de Schola Cantorum Magnifica, interpretou, com vozes afinadas e claras, dois espirituais negros norte-americanos associados à Pascoa, dois gospels, o segundo dos quais Amazing Grace  recordando as situações de vida e de morte que temos vivido .  tinha as seguintes palavras, capazes de humedecer os olhos de qualquer um de nos, crente ou não crente.

Through many dangers, toils and snares
We have already come.
T'was grace that brought us safe thus far
And grace will lead us home,
And grace will lead us home. (#)



Três tripulantes do Magnifica procederam, em seguida, a leitura de excertos do Novo Testamento, do Evangelho Segundo Sao João, com os passos da crucificação e da morte de Jesus. Uns quinze passageiros, três deles portugueses, leram entao, em várias linguas, textos breves, quase orações de saudação a Deus, homenageando os que faleceram, agradecendo por o vírus não ter chegado ao nosso seio, expressando também o desejo de regressarmos todos com saúde e paz aos nossos lares.

Rezou-se um Pai Nosso e, por fim, os músicos e cantores italianos do Musica en Mascara, todos vestidos de preto, tocaram e interpretaram um excerto do Requiem, de Giuseppe Verdi.
Enorme dignidade na homenagem a Deus, nesta Sexta-feira Santa.

Antonio Graça de Abreu

PS - Meu caro Luís: Agradeço-te, por todos os deuses, que ponhas estas duas fotos junto ao texto que escrevi esta sexta-feira santa. Talvez porque me emocionei. Há mais de um mês, sobre mil oceanos e mares, tocando terra ao de leve, temos a ameaça da morte à nossa volta.


[Revisão / fixação de texto para efeitos de edição neste blogue: LG]

# Tradução livre:

Graça maravilhosa: 

(...) Por muitos perigos, duros trabalhos e armadilhas 
Nós já passámos. 
Foi a graça de Deus que nos trouxe sãos e salvos até agora. 
E a graça de Deus  nos levará para casa, 
E a graça de Deus nos levará para casa. (...)

segunda-feira, 13 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20852: Viagem de volta ao mundo: em plena pandemia de COVID 19, tentando regressar a casa (Constantino Ferreira & António Graça de Abreu) (8): 11 de abril de 2020, a caminho do Mar Vermelho e, a seguir, do "Mare Nostrum", o Mediterrâneo...


MSC - Magnífica > Cruzeiro de Volta ao Mundo > Em navegação,   a caminho do Mar Vermelho e do "Mare Nostrum", o Mediterrâneo. >  11 de abril de 2020 >

Cortesia da página do faceboook de Constantino Ferreira. Foto reeditada pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Constantino Ferreira d'Alva, ex-fur mil art da CART 2521 (Aldeia Formosa, Nhala e Mampatá, 1969/71), membro da nossa Tabanca Grande desde 16 de fevereiro de 2016. Vai a bordo do MSC -Magnífica, que teve de apressar o seu regresso ao ponto de partida, devido à pandemia de COVID-19. Está a escrever o seu diário de bordo, desde 23 de janeiro de 2020, disponível na sua página do Facebook. A ele junta-se o António Graça de Abreu, que também, está a escrever o seu diário de bordo...


Excertos do diário de bordo de Constantino Ferreira

Sábado, 11 de abril de 2020, 11h27

Ontem, Sexta-feira Santa, todo o navio, passageiros e tripulantes, cumpriram 1 Minuto de silêncio, em memória das vítimas no Mundo, da Covid-19.

Eram 14 Horas locais, ainda estávamos á mesa do almoço. O silêncio foi total, ninguém se mexia, apenas o navio
NAVEGAVA !

Depois, pelas 15 horas, no Royal Theatre, tempos de reflexão, com leituras e representação do Julgamento de Jesus da Nazaré, frente a Pilatos e Sacerdotes Judeus. De que resultou a sua morte cruel por crucificação, por equívoco do “povo” e, desleixo de Pilatos.

As intervenções foram feitas voluntariamente em todas as línguas. Terminou com um concerto dirigido pelo nosso Maestro Manfrini, que toda a assistência aplaudiu de pé, em silêncio!

Hoje, Sábado de Páscoa, navegamos no fim do Golfo de Áden, já com vista de terra a Bombordo e a Estibordo, que aqui coloco fotos respectivamente, as duas primeiras fotografias que acabei agora mesmo de tirar !

Mais à frente, a bombordo, iremos ver Djibuti, onde está a Base Naval Francesa, que se ofereceu para nos receber e, reabastecer, caso fosse necessário!

Depois, será navegar Mar Vermelho acima ,..... até à Cidade de Suez, onde entraremos no Canal, para chegarmos ao “Mare Nostrum”! ...Até lá !!!


Excertos do diário de bordo do António Graça de Abreu 


Excerto enviado pelo António Graça de Abreu, com data de 10/4/2020, 19h02
[ ex-alf mil, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), membro sénior da Tabanca Grande, com 250 referências no nosso blogue; temos recebido as suas mensagens por correio eletrónico]


Taiti, Polinésia Francesa, 27 de Fevereito de 2020

Ontem, no regresso da ilha de Morea, ainda tivemos tempo para um extenso passeio a pé por Papeete, a cidadezinha capital de Tahiti. De criação recente, só em 1817,  Papeete passou a sede do muito limitado poder britânico sobre uma ilha que entãoo os ingleses disputavam com a Françaa.

Foram os franceses, com tropas mais numerosas, quem conseguiu impor o seu protectorado a Taiti, de 1842 até hoje.A ilha tem 185 mil habitantes, a capital conta com 30 mil pessoas, predominantemente polinésios, gente simpática e educada, alguma dela diz com orgulho que frequentou universidades, em Françaa. 

Papeete é uma cidade limpa e organizada, com um mercado central onde rivalizam as cores das flores, da roupa e da comida. Em Taiti, as mulheres costumam colocar uma flor nos cabelos, presa, ou por cima da orelha esquerda ou da orelha direita. A flor na cabeça, a direita, significa que a mulher ja é casada ou comprometida, a flor, à esquerda, corresponde a uma donzela, ou senhora, livre de compromissos, aberta a qualquer tentativa de namoro. 

Quando me contaram esta história, não acreditei nas flores de esquerda e de direita, mas bastou vir para as ruas de Tahiti para comprovar que nesta formosa ilha, esquerda e direita, em flor, são duas opções indiscutíveis . Era bom que fosse assim em todo o mundo.

Em Pappete há jardins impecavelmente tratados suspensos sobre o porto de onde se parte em velozes catamarãs para outras ilhas, outras aventuras. Disseram-me que 9% da população é de etnia chinesa, detentora de grande poder económico. Os filhos do Império do Meio são resultado da emigração massiva, a partir de meados do século XIX, quando milhões e milhõees de chineses fugiram do centro e sul da China durante a tremenda rebelião do Reino Celestial dos Taiping que se prolongou de 1850 a 1864 e tera provocado cinquenta milhões de mortos. Deixando para trás a guerra, registou-se o maior êxodo de sempre de chineses que pocuraram trabalho e paz nas ilhas do sudeste asiático, Malasia, Singapura, Tailândia, nas ilhas mais distante do Pacífico e até no Peru e em Cuba. 

Em Havana, o consul de Portugal, um senhor chamado Eca de Queiros, haveria de defender e ajudar milhares de chineses que chegavam a Cuba com documentos de emigração passados em Macau e que sofriam as prepotências e impiedosa exploração dos fazendeiros e autoridades espanholas. Os culies chineses substituiam os escravos negros nas grandes plantações de cana-do-acúcar. Mas isso são outros continentes e outras histórias.

As praias de Taiti, em cenário natural de grande beleza, contam quase sempre com tapetes de areia negra. Estive em Point Venus, com um antigo farol e uma perfeita baía onde os primeiros europeus desembarcaram, em 1767, e só não fui ao banho na belíssima praia de areia preta, porque estava alinhado na excursão do navio, com tempo muito limitado. Foi nesta baía que a Bounty, com o capitão William Bligh, chegou em 1789 e os seus marinheiros. Logo depois, como ja vimos, ficaram fascinados com os encantos de Taiti.

A ilha tem uma superficie de 1.042 km 2, um pouco maior do que a nossa Madeira, e como não podia deixar de ser também a circundei, no autocarro público, com paragem em Taravao. Foi no segundo dia de estadia em Tahiti e, como o navio partia as 19 horas, tivemos de programar o dia quase ao minuto. 

A vila de Taravao, a mais importante do sul da ilha e a entrada para a península de Tahiti Iti, ou seja a "pequena Taiti", com mais baias, enseadas, lagunas e praias de areia branca que só visitarei numa proxima reencarnação quando aproveitar um fim de semana para descer do c+eu e nadar num mar esmeralda e me por a tostar ao sol deste paraíso na Terra.

Perto de Taravao, na aldeia de Mataiea, fica o Museu Paulo Gaugin, perto da última casa onde o pintor viveu em Taiti, ante do seu exilio definitivo e morte em Hiva Oa, nas ilhas Marquesas. Por aqui pintou Gaugin algumas das suas obras primas, como as lânguidas mulheres polinésias que soube, ou não soube amar. 

O museu está fechado desde 2013 "para obras". Paulo Gaugin, aos cinquenta e muitos anos, manteve relacionamentos sexuais e tomou por companheiras raparigas polinésias com quinze ou dezasseis anos de idade, e não deixou de as retratar em quadros plenos de sensualidade. Será por isso que o "politicamente correcto" mandou fechar o Museu Gaugin, em Taiti e procedeu a uma limpeza do seu nome em todos os folhetos turísticos que promovem a ilha. 

Eu entendo. Contudo, Paulo Gaugin deixa a todos nós um legado mágico, intemporal e louco, é um dos grandes mestres da pintura universal. Basta olhar os seus quadros sobre Taiti, esfuziantes de cor, alegria e tristeza, basta beber os seus verdes intensos das folhas das palmeiras, os azuis acariciando o ondular do mar, os amarelos aquecidos pelo grito do por-do-sol. O seu amigo Van Gogh, logo após uma zanga com Gaugin na casa de Arles, no sul de França, decidiu cortar uma orelha, embrulhá-la em papel de jornal e ir entrega-la num bordel que ambos tinham frequentado, na pequena cidade francesa. Os homens e mulheres de excepção não tem juizo, entenda-os cada um como muito bem achar.

Em Taravao fui a um grande supermercado impecavelmente abastecido. Dizem-me que o salário minimo em Taiti ronda os 1.250 dólares, que o ordenado medio é de 2.250 dolares, O nivel de vida eéelevado, superior ao de Portugal, creio, o que acontecerá também em algumas outras ilhas do Pacífico.
Os preços também me pareceram caros. Comprei sabonetes e óleos corporais fabricados com óleo de coco e com monoi , uma mistura de tiaras, flores raras existentes em Taiti. Numa loja do supermercado descobri uma t-shirt muito bonita,, preta, estampada com o pequeno desenho de uma beldade tahitiana, de corpo inteiro, sentada de lado, com uma flor no cabelo, ataviada com um pequeno vestido vermelho que lhe modelava o corpo. Tinha escrito Hinano e 1955. Hinano parecia-me ser o nome de uma das ilhas da Polinésia Francesa e 1955 deveria ser o ano em que essa ilha se autonomizou, em relação ao poder politico francês. Comprei-a por sete ou oito euros. 

De regresso ao navio, consultei a pequena brochura que trouxe de Papeete e lá encontrei a figura da elegante tahitiana da minha t-shirt, e a explicaça: " The brand of Hinano beer, sold since 1955 by the Brasserie of Tahiti, has become a real institution present everywhere in Polinesya. Recognized by its famous logo, a sitting vahine ( jovem mulher em polinesio) often brought as a souvenir by tourists."

Antonio Graca de Abreu



MSC - Magnífica > Cruzeiro de Volta ao Mundo > Em navegação, oceano Pacífico  >  Fevereiro de 2020 > Um "recuerdo" do Taiti

Foto (e legenda): © A ntónio Graça de Abreu (2020) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


sexta-feira, 10 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20837: Viagem de volta ao mundo: em plena pandemia de COVID 19, tentando regressar a casa (Constantino Ferreira & António Graça de Abreu) (7): a navegar agora no perigoso Mar Arábico, já no Golfo de Aden, com o Corno de África lá ao fundo à esquerda e o fantasma dos piratas da Somália a acrescentar às preocupações dos passageiros e tripulantes...


MSC - Magnífica > Cruzeiro de Volta ao Mundo >  Em navegação, oceano Índico > 10 de abril de 2020 ,sexta feira santa para os cristãos > Um rota perigosa...

Cortesia da página do faceboook de Constantino Ferreira. Foto reeditada pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


Oeiras >Algés > Restaurante Caravela de Ouro > Tabanca da Linha > 42º Convívio > 21 de março de 2019 > À mesa, o Constantino Ferreira d'Alva e o António Graça de Abreu.

Fotos (e legenda): © Luís Graça (2019). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Constantino Ferreira d'Alva, ex-fur mil art da CART 2521 (Aldeia Formosa, Nhala e Mampatá, 1969/71), membro da nossa Tabanca Grande desde 16 de fevereiro de 2016. Vai a bordo do MSC -Magnífica, que teve de apressar o seu regresso ao ponto de partida, devido à pandemia de COVID-19. Está a escrever o seu diário de bordo,  desde 23 de janeiro de 2020, disponível na sua página do Facebook. A ele junta-se o António Graça de Abreu, que também, está a escrever o seu diário de bordo...


Excertos do diário de bordo de Constantino Ferreira 

Sexta-feira, 10 de abril de 2020, 5h39


Estou a pensar, que a vida continua. Hoje, é Sexta-feira Santa e, vivemos a angústia do presente, pensando no passado.

Esse passado longínquo, que marcou estes últimos 2.020 anos. Um Homem-Bom, foi morto cruelmente em Jerusalém, por equívoco do povo e desleixo do “poder”!

Hoje, recordamos esse “equívoco”, com o pensamento contido na revolta. Mas, esse exemplo de compaixão e perdão, fica para sempre no pensamento da Humanidade.

Certamente que houve outro exemplos no Mundo, devemos olhar todos esses exemplos, com fé, nesta nossa Humanidade que hoje luta contra “esta” calamidade !

Hoje, a navegar aqui no Mar Arábico, já no Golfo de Aden, com o Corno de África lá ao fundo á esquerda, penso no futuro da Humanidade, na pessoa do meu neto Francisco, que nasceu ontem em Lisboa.

Um grande abraço, do tamanho do Mundo.


Quinta-feira, 9 de abril de 2020, 7h17

Alô!

Aqui Mar Arábico. Vamos praí a meio!

Mas, já vamos em alerta total contra os piratas da Somália, que com as suas boas lanchas rápidas, podem querer um bom resgate, destes 2.800 navegantes!

Mas também vamos a navegar uma rota sob vigilância das forças de Marinha Internacionais e, vigilância via Satélite!

Os desgraçados dos piratas, têm que ser muito “corajosos” ou muito parvos para nos atacarem !

Bom, o que eu estou em alerta é para assistir á entrada no Mar Vermelho e ver as duas margens !

Mas não vou deixar de olhar o Corno de África! Depois conto como foi !


Excertos do diário de bordo do  António Graça de Abreu 

[ ex-alf mil, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), membro sénior da Tabanca Grande, com 250 referências no nosso blogue; temos recebido as suas mensagens por correio eletrónico]

Oceano Índico, Golfo de Aden, 10 de Abril de 2020

Desde ontem e por mais dois dias, esquecemos o coronavírus, o problema serão os piratas. Estamos a navegar perto da ilha de Socotora, no Golfo de Aden, à entrada do Mar Vermelho. De um lado temos o Yemen, sempre em guerra, do outro a Somália, o corno de Africa, terras pobres habitadas por algumas gentes que utilizam todos os meios possiveis e quase mpossíveis para sobreviver. Um deles e o ataque a navios, pirataria pura e dura, com assaltos sobretudo a cargueiros, com a tomada de reféns e do próprio barco, e a exigência de avultados resgates.

Recebemos ontem um comunicado no camarote avisando-nos das medidas que o navio está a tomar para escapar aos piratas: luzes meio apagadas durante a noite, janelas dos camarotes com cortinados corridos, todo o conves do 7º andar que rodeia o Magnifica, e é excelente para caminhadas e passeios a pé,  estará fechado, com seguranças em lugares estratégicos, com binóculos perscrutando o mar que se mantem deslumbrantemente azul e prata, sereno e calmo. 

Talvez estas medidas sejam um exagero. Creio que nenhum navio foi atacado, nos últimos tempos. As grandes potências prepararam as respostas a estes actos de pirataria, franceses, norte-americaos, até chineses estão estacionados no Djibuti onde controlam, via satélite, o movimento das grandes e pequenas embarcacões que cruzam estas vastas regiões. 

Dizem-me que os norte-americanos tem drones militares que se deslocam a grande velocidade, carregados de potentes explosivos que podem, com toda a facilidade rebentar com os frágeis barcos utilizados pela pirataria. 

A vida tambem não está fácil para os piratas da Somalia e do mar Vermelho.

Colombo, Sri Lanka, 6 de Abril de 2020

Chegamos frente a Colombo, o navio parou, os arranha-ceus recentes, construidos com capitais chineses, alinhavam-se nsa tira do horizonte. Nós permanecemos no Magnifica, claro, de onde não saimos quase há um mes.

Estamos ancorados no mar, a uns quinze quilómetros da capital do Sri Lanka. Fui lá acima, ao 14. andar, tirar umas fotografias. Um rebocador aproximava-se. Calculei que trazia o piloto local. Não era verdade. Sete ou oito tripulantes do barco de apoio cingales vinham cobertos de largos fatos brancos, mascaras de plastico, luvas e botas estanques. Na plataforma lancada a estibordo pelo Magnifica, três ou quatro tripulantes do nosso navio vestiam tambem roupa de assustar, fatos completos em tons de azul, cobrindo totalmente o corpo, sobressaindo as máscaras e as luvas. Uma maca com uma senhora idosa deitada, ligada a uma botija de oxigénio entre as suas pernas, em cima do cobertor, era transportada com todo o cuidado desde o Magnifica para o rebocador. 

Um tripulante do nosso navio passou também para o barco cingalês e foi imediatamente desinfectado com um spray. Eles trouxeram uma equipe de televisão com um camaraman, todo equipado e artilhado como os restantes tripulantes, que filmou cuidadosamente o processo de evacuação. O rebocador acabou por acelerar os motores, deu meia volta e rumou em direcção ao porto de Colombo. 

Tera a velha senhora, nossa companheira de viagem, contraído coronavirus? Como vai ser tratada, o que lhe acontecera sozinha num hospital de Colombo?

Há pouco, já noite e com o navio a navegar para norte, o capitão Roberto Leotta informou, pela instalação sonora, que se procedera ao reabastecimento de gasóleo, que seguimos para o canal do Suez e que foi preciso evacuar uma passageira, a "necessitar de cuidados médicos urgentes." 

Não creio que a senhora tivesse coronavírus porque, se tal acontecesse teriamos o navio infectado, o que seria uma catástrofe para todos nós, mas o aparato da sua saída para um hospital na capital do Sri Lanka, foi um sufoco, um enorme susto.

terça-feira, 7 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20824: Viagem de volta ao mundo: em plena pandemia de COVID 19, tentando regressar a casa (Constantino Ferreira & António Graça de Abreu) (6). em Colombo, Sri Lanca, paragem para reabastecimento e partida para o Canal do Sul (percurso de c. 3500 milhas náuticas até ao dia 24 de abril)


MSC - Magnífica > Cruzeiro de Volta ao Mundo > Colombo, Sri Lanca [, antigo Ceilão] >  6 de abril de 2020 >  Paragem técnica para reabastecimento... Próxima etapa: Canal Suez, a 3456 milhas náuticas de distância. Data prevista de chegada: 24 de abril.

Cortesia da página do faceboook de Constantino Ferreira. Foto reeditada pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.


1. Constantino Ferreira d'Alva, ex-fur mil art da
Constantino Ferreira, Melbourne, 
Austrália, 19 de março de 2020.
 Vai a bordo com a esposa,
 Elsa Ferreira
 CART 2521 (Aldeia Formosa, Nhala e Mampatá, 1969/71), membro da nossa Tabanca Grande desde 16 de fevereiro de 2016... Trabalhou 30 anos na TAP, como tripulante de cabine; começou a escrever o seu diário de bordo, em 23 de janeiro de 2020, na sua página do Facebook, Viagens no Tempo. A ele junta-se, desde o poste anterior, o António Graça de Abreu; vão escrever, a quatro mãos, o diário de bordo...

Ora cá estamos ! Em Colombo,  no Sri Lanca

Foram sete dias de navegação contínua, desde Fremantle-Perth na Austrália até aqui, à Ilha de Taprobana, nos dizeres de Camões.

Chegámos de madrugada, na aproximação fui contando os navios cargueiros, petroleiros, graneleiros e os gigantes porta-contentores, que por aqui estavam fundeados, frente a Colombo! Contei primeiro dez, depois quinze, mas afinal eram mais de vinte, “plantados” por estas águas frente a Colombo.

Ao ver o perfil desta cidade, na contra luz do seu perfil moderno, de prédios futuristas, com uma das torres modernista, com um perfil que de torre esguia redonda, com uma grande “bola” lá nas alturas, seguida por uma antena gigante, que me fez lembrar o perfil da moderna Xangai na China, com idêntica torre, mas ainda maior!

Tivemos assistência, da emergência médica, eficiente e rápida que resolveu a assistência em poucos minutos.

Depois, foi a procura do local para fundear, nesta Baia frente À cidade e porto de Colombo, com o piloto que posicionou esta enorme “nave”, para ser reabastecida, por um pequeno petroleiro, que aqui se encostou, e se vai manter a fazer a trasfega do combustível, durante estas largas horas, que aqui passamos frente a uma cidade de perfil moderno, como me surpreendeu esta velha Colombo, onde os portugueses se lmantiveram mais de cento e cinquenta anos, nos Séculos XVI e XVII.

Aqui nesta ilha, a Sul da Índia, o clima é quente e húmido. Desde as 6 Horas da manhã, que tenho andado pelos convés a passear e a tirar umas fotografias, mas antes de almoço, fui fazer um tempinho na piscina exterior para refrescar.

Ao almoço resolvemos ir ao restaurante, em vez de irmos ao Buffet, como muitos dias fazemos ao almoço. Mas à noite, marcamos sempre presença num dos três enormes e requintados restaurantes de bordo.

É quase Sol posto, o petroleiro continua a dar continuidade ao reabastecimento, por uma mangueira, onde passam várias toneladas de combustível à hora. Mesmo agora fui á varanda do camarote e, a mangueira lá estava, a dar “mama” a este navio- “bébé” gigante !

O pôr do sol vai ser pelas 17h45, vou subir do 12º para 15º piso, que é o convés da piscina interior, para ver esse espectáculo diário, que é o pôr do Sol, por estas bandas tropicais, neste caso, mesmo Equatorial!

Depois será a largada, para uma nova etapa, desta vez de 3.456 milhas náuticas, distância entre Colombo e o Canal de Suez, onde chegaremos a 24 de Abril.

São mais 8 dias de prisão, neste cruzeiro de Volta ao Mundo, que se transformou “quase” num pesadelo, apenas com o receio,  de todos nós, de esse coronavírus também poder “entrar” aqui a bordo.

Mas com os cuidados de higiene praticados a bordo, desde a Tasmânia, que a vigilância é mantida, já lá vão umas largas semanas!

Assim continuamos, presos neste conforto de bordo, onde mantemos todas as actividades, desde a ginástica aos espectáculos diários, de grande qualidade, com uma plêiade de artistas que são do melhor que eu já vi, em espectáculos diários, de alta qualidade!

A Companhia, MSC,  e o nosso Comandante Roberto Leotta, têm feito tudo, o possível e o impossível, para que esta “Odisseia”, chegue ao fim sem incidentes de maior!

Somos cerca de 2.000 passageiros e 800 tripulantes, a fazer tudo “bem”, para que antes do fim de Abril, possamos ser bem recebidos, possivelmente em Marselha.

Dizem que; “a sorte protege os audazes”! Creio que aqui a bordo, todos temos sido “audazes”, a cumprir as regras de segurança sanitária e de bom convívio, acrescentando agora uma boae de “sorte”...  a nossa “Odisseia” terminará bem, para todos; passageiros, tripulantes, e MSC-Magnifica!

[Revisão e fixação de texto para efeitos de edição neste blogue: LG]


Chile > Oceano Pacífico > Ilha da Páscoa > 21 de fevereiro de 2020 > Os famosos "moais", as gigantescas estátuas de pedra

Foto (e legenda): © António Graça de Abreu (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. Mensagem de António Graça de Abreu, 
Hai Yuan e António Graça de Abreu
numa praia numa das  ilhas de Tonga,
Polinésia (2017)
que viajou até Sidney com a esposa, Hai Yuan:

[O nosso camarada e amigo António Graça de Abreu [ ex-alf mil SGE, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), membro sénior da Tabanca Grande, com 250 referências no nosso blogue], que também  vaia bordo, só começou a "dar sinais de vida" em 22 de março passado...

Até então sabíamos apenas que ele andava "embarcado"... Agora sabemos que também está "confinado", no MSC- Magnifica, não podendo ele e os demais passageiros e tripulantes sair a terra, nos portos onde o luxuoso paquete tem que aportar para se reabastecer...]

Data - 05/04/2020, 06:41
Assunto - Ilha da Pascoa, definitivíssimo


Ilha da Páscoa, Chile, Oceano Pacífico Sul, 21 de Fevereiro de 2020

Imagine-se uma praia deslumbrante, num mar de águas transparentes, cor de turqueza, cujas ondas terminam suavemente na areia branca e fina, rodeada por uma desafogada floresta de palmeiras e coroada por um ahu com sete moais. Falo da praia de Anakena, ilha da Páscoa.

Rolando Pires Teixeira (#)


Foram quatro dias de navegação e 3.920 quilómetros de mar, desde o Peru, para se chegar à ilha da Páscoa, Quase nada sabia sobre estas paragens envoltas em muitos mitos, mistérios e fantasias, perdidas no Oceano Pacífico, o pedaço de terra mais isolado do mundo, mais longe de qualquer outro lugar habitado. Para oeste, Tahiti fica a 4.213 quilómetros. 

A ilha da Páscoa tem apenas 16 por 24 quilómetros, o que dá uma superficie de 110 km2. Fernão de Magalhães, há 499 anos atrás, na sua impressionante cavalgada marítima atravessando o Pacifico em busca das ilhas das especiarias, as Molucas, não passou longe desta ilha. Infelizmente não deu pela sua existência, a descoberta só aconteceria duzentos anos depois quando o holandês Jacob Roggeveen aqui aportou, no ano de 1722, no domingo de Páscoa, daí o nome da ilha. 

Mas o lugar já era conhecido e habitado por polinésios que viajavam por enormes distâncias nas suas pirogas tipo catamarã, com dois cascos acoplados, o que garantia grande estabilidade e segurança à embarcações. 

Esses polinésios, provenientes das ilhas Marquesas, terão chegado a Rapa Nui  - a ilha da Pedra, o nome em polinésio da ilha da Páscoa -, no século XI. Existem várias teses divergentes sobre o que realmente aconteceu. Terão sido esses os primeiros colonizadores da ilha e os construtores dos moais, os grandes bonecos de pedra vulcânica de diferentes tamanhos, todas identificáveis pelos seus rostos aquilinos, boca saliente e olhos fundos. Moai significa, na língua polinésia, "rosto" ou "face" e a construção das estátuas parou no séc. XVII. 

Os bonecos levantavam-se apoiados em bases de pedra, tipo altares, denominados ahu e estarão associados a homenagens aos antepassados falecidos. Cada figura representa um ente querido que não era enterrado, mas cujo corpo permanecia envolto em panos, depositado em esteiras sobre os ahus até o cadáver se decompor e desfazer, atérestarem apenas ossos. Levantava-se então, em frente, uma grande estátua, em honra do defunto. 

Existem quase mil estátuas espalhadas pela ilha, a mais pequena tem apenas 2,5 metros de altura, as maiores chegam aos 10 metros e podem pesar 80 toneladas. Era tempo de as ir conhecer.

Acabo de ler no guia do visitante que me deram logo ao pôr o pé na ilha, ao procurar o Parque Nacional de Rapa Nui, tudo Património Mundial pela Unesco, que aqui a precipitação anual é baixa, concentrando-se a chuva sobretudo no mês de Maio. Dizem-me que os deuses andam um bocado desorientados, talvez por influência de um poderoso senhor norte-americano chamado Donald Trump e resolveram presentear-nos, desde as seis horas da manhã, até à noite, neste dia de meados de Fevereiro, com um glorioso tempo de chuva, água que não pára de cair, há cem mil torneirinhas abertas suspensas no céu. E a imtemperie estende-se ao mar.

A ilha da Páscoa não tem um cais onde um grande navio possa acostar, por isso o Magnifica ancorou no mar, a uns dois quilómetros de terra. Os passageiros fizeram filas compactas para entrar nos botes salva-vidas que nos levavam, na viagem de ida e volta até ao pequeno cais de desembarque, na ilha. 

O mar estava alteroso, ondas de três metros batiam fortes nas chalupas encostadas à plataforma de saída do navio que balançava, subiam e desciam ao sabor das ondas, transformando-se a entrada e saída de cada velhote, ou cidadão mais jovem, numa odisseia. Tivemos de esperar quase duas horas para podermos sair porque havia duas mil pessoas a avançar lentamente, uma a uma, muitos deles desciam agarrados, suspensos nos braços do pessoal do navio que os levantava no ar e depositava de sopetão ora nas chalupas, ora, no regresso, na plataforma de entrada no Magnifica.

Quando, ainda no navio, fui tentar comprar uma excursão na ilha da Pascoa, já não havia. As excursões eram realizadas em mini-bus, com limitação  no número de passageiros.Era coisa aí para 4 horas, com visita a alguns moais e a passagem por uma praia. Custava a módica quantia de 260 euros. O preço estava inflacionado pelos 80 dólares que cada turista era obrigado a pagar para entrar na ilha. 

Estava meio preocupado. Com tanta chuva, com ausência de transporte como me iria desenrascar e conhecer os moais? Afinal acabou tudo por ser tudo pontualmente fácil, abrangente, divertido e muito mais barato. A Hai Yuan e eu saímos do porto, a chuva não parava de cair, mas estávamos protegidos por guarda-chuvas e casacos de plástico. Caminhamos em direção ao centro da cidade de Huanga Roa, se cidade se pode chamar a capital de uma ilha que conta apenas com 7 mil habitantes. Baias pequenas, rochas batidas pelas ondas, praias recatadas, casas de madeira bonitas e bem construídas. 

Fui ao posto de turismo buscar um bom mapa e perguntei ao rapaz de serviço como era para dar a volta à ilha e ver muitos moais. "E simples, alugue um táxi, se quiser eu chamo pelo telefone e o carro vem aqui buscá-lo, demora cinco minutos, são 50 dólares por duas horas!"

Era cedo, tinha o dia por minha conta, o regresso ao navio só tinha de ser feito até às oito da noite. Mais voltas pelo centro da vila de Huana Roa, um primeiro moai a vista, de nome Tahai, reconstruído, creio, com chapéu e tudo, para turista ver e abrir o apetite para outros moai que, apesar da chuva, não arredavam pé, estavam rigorosamente há séculos à nossa espera. 

Na avenida central há umas tantas lojas de rent-a-car, eu trouxe a carta de condução prevendo a eventualidade de alugar algures um automóvel. Na outra Volta ao Mundo, a partir de Fermantle e Perth, deliciei-me pelas estradas do oeste da Austrália conduzindo durante três dias, e mais de mil quilómetros, um Toyota novinho em folha.

Agora fui ver carros e preços. Por 24 horas (não havia menos tempo de aluguer) teria de pagar 50 dólares, mais a gasolina. Os automóveis eram uns Seats pequeninos a fingir de jeep. A Hai Yuan assustou-se, o carro que me destinavam tinha pneus meio carecas, estava muito sujo, chovia copiosamente, as estradas deviam estar cheias de buracos, etc. Vamos esquecer o rent-a-car. 

Logo adiante, estava estacionada uma carrinha aberta com dez lugares e um cartaz onde se lia que levava pessoas para a praia de Anakena, a melhor da ilha, com um excepcional friso de moais, junto ao mar, pela módica quantia de 7 mil pesos chilenos, cerca de 9 dólares por pessoa, ida e volta. Pergunto se nos levam até Anakena, com passagem pelos quinze moais de Tongniki, num desvio, de mais uns quilómetros. Chove muito, eles não tem clientes, e meio dia, levam-nos a dar a volta por 25 dólares, os dois.

Ir-nos-ão buscar à praia de Anakena, às cinco da tarde. Negócio feito. Entramos na carrinha com os lugares abertos atrás todos vazios, sentando-nos nos  bancos da frente da carrinha, ao lado do condutor, um velho bonacheirão que também quer saber quem somos, de onde vimos, etc. Noto que tem traços de polinésio,  questiono-o também. Diz-me que hoje já não existem famílias rapanui, os autóctones, puras, os colonizadores chilenos chegaram no século XIX e cruzaram-se com os poucos polinésios que habitavam a ilha da Páscoa.

Vamos então entrar por dentro deste surpreendente lugar e tentar conhecê-lo.

Saimos de Huang Roa pela estrada do aeroporto que me pareceu bem desenhado, aproveitando dois quilómetros de terreno nivelado, e cortamos em direcção a Tongniki por caminhos de bom alcatrão alcandorados na falésia, debruçados sobre o mar. De repente, numa planície com um monte ao fundo, aparecem os moais, todos diferentes, todos parecidos, quinze enormes estátuas saudando o visitante. 

Paramos, tiramos fotografias e, encharcados, felizes, continuamos viagem, mais uns quinze quilómetros até à praia de Anakena, um lugar de assombro neste cu de Judas, suspenso nas lonjuras do mundo. A chuva abrandou, há gente tomando banho no mar, nas águas de uma baía abrigada, numa praia que apetece. Em baixo, temos sete moais de costas voltadas para o oceano, imponentes sobre a plataforma ahu prometendo proteger a gente do interior da ilha de todas as calamidade e desgraças.

Há mais um moai solto, mais acima, impávido há séculos, contemplando distraído a passagem dos turistas à chuva, turistas que o fotografam e se fotografam com ele. Na praia pergunto a um jovem casal chileno acabado de sair do mar, como está a temperatura da água. Dizem-me que está mais quente dentro de água do que cá fora. Não hesitamos. Mesmo com céu cinzentíssimo, com pingos de chuva humedecendo a areia e os nossos corpos, é tempo de entrar no mar. mergulhar no Oceano Pacífico, o que não acontecia há mais de três anos, quando dos banhos nas ilhas de Samoa e de Tonga. A água estava mesmo quente, que prazer! 

Depois nas cabanas de madeira que servem de banheiro, lojinhas e restaurantes, quase vazias porque hoje, em tempo de Verão, temos um perfeito dia de Inverno, secamo-nos, limpamo-nos, comemos umas sandes trazidas do barco. E então que sou confrontado com a chegada das galinhas, uma das especificidades da ilha da Páscoa. 

Além de cavalos selvagens, à solta pelas hortas e campos, abundam galinhas nesta ilha. Umas tantas, acompanhadas pela prole, os pintainhos de vários tamanhos e cores, vem conversar comigo, ou melhor, deve-lhes ter cheirado a trigo, do bom (as galinhas tem olfacto?) e estão a espera das migalhas do meu repasto. Por acaso, trouxemos muito pão e entretive-me, durante quase uma hora, a dar de comer, migalha a migalha, a famílias inteiras de animais de capoeira. Quando o pão acabou, tinha mais de 30 galinhas e pintos felizes a minha volta. 

Quem diria que tal haveria de acontecer, alimentar galináceos numa fabulosa praia da ilha da Páscoa, Pacifico Sul, em Fevereiro de 2020!

António Graça de Abreu

Nota do autor:

# Palavras do meu companheiro de viagem Rolando Pires Teixeira, que aqui esteve pela primeira vez em 2017 no seu livro "Uma Volta ao Mundo, apontamentos", Lisboa, Ex-Libris, 217, pag. 180.

[Revisão e fixação de texto para efeitos de edição neste blogue: LG]
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Notas do editor:

Último poste da série > 3 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20808: Viagem de volta ao mundo: em plena pandemia de COVID 19, tentando regressar a casa (Constantino Ferreira & António Graça de Abreu) (5): em navegação, no Oceano Índico, devendo atravessar o equador no dia 6, 2ª feira, de madrugada... mas sem a alegria da primeira vez

sábado, 20 de outubro de 2018

Guiné 61/74 - P19121: Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias (António Graça de Abreu) - XL (e última) Parte: Canal do Suez, Roma e regresso ... "A vida é o que fazemos dela, / As viagens são os viajantes. / O que vemos não é o que vemos / Senão o que somos" (Bernardo Soares / Fernando Pessoa)



Foto nº 4


Foto nº 3


Foto nº 5


Foto nº 1


Foto nº  2


Foto nº  6


Fotos (e legendas): © António Graça de Abreu (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1.  Úlltimas duas rrónicas da "viagem à volta ao mundo em 100 dias" [3 meses e oito dias], do nosso camarada António Graça de Abreu.

Escritor, poeta, sinólogo, ex-alf mil SGE, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), membro sénior da nossa Tabanca Grande, e ativo colaborador do nosso blogue com cerca de 220 referências, é casado com a médica chinesa Hai Yuan, natural de Xangai, e tem dois filhos, João e Pedro. Vive no concelho de Cascais.

[Foto à direita: Hai Yuan e António Graça de Abreu]



2. Sinopse da série "Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias" (*)

(i) neste cruzeiro à volta do mundo, o nosso camarada e a sua esposa partiram do porto de Barcelona em 1 de setembro de 2016; [não sabemos quanto despenderam, mas o "barco do amor" deve-lhes cobrado uma nota preta: c. 40 mil euros, no mínimo, estimamos nós];

(ii) três semanas depois de o navio italiano "Costa Luminosa", com quase três centenas de metros de comprimento, sair do Mediterrâneo e atravessar o Atlântico, estava no Pacífico, e mais concretamente no Oceano Pacífico, na Costa Rica (21/9/2016) e na Guatemala (24/9/2017), e depois no México (26/9/2017);

(iii) na II etapa da "viagem de volta ao mundo em 100 dias", com um mês de cruzeiro (a primeira parte terá sido "a menos interessante", diz-nos o escritor), o "Costa Luminosa" chega aos EUA, à costa da Califórnia: San Diego e San Pedro (30/9/2016), Long Beach (1/10/2016), Los Angeles (30/9/2016) e São Francisco (3/4/10/2017); no dia 9, está em Honolulu, Hawai, território norte-americano; navega agora em pleno Oceano Pacífico, a caminho da Polinésia, onde há algumas das mais belas ilhas do mundo;

(iv) um mês e meio do início do cruzeiro, em Barcelona, o "Costa Luminosa" atraca no porto de Pago Pago, capital da Samoa Americana, ilha de Tutuila, Polinésia, em 15/10/2016;

(v) seguem-se depois as ilhas Tonga; visita a Auckland, Nova Zelândia, em 20/10/2016; volta pela Austrália: Sidney, a capital, e as Montanhas Azuis (24-26 de outubro de 2016);

(vi) o navio "Costa Luminosa" chega, pela manhã de 29/10/2016, à cidade de Melbourne, Austrália; visita à Austrália Ocidental, enquanto o navio segue depois para Singapura; o Graça de Abreu e a esposa alugam um carro e percorrem grande parte da costa seguindo depois em 8 de novembro, de avião para Singapura, e voltando a "apanhar" o seu barco do amor...

(vii) de 8 a 10 de novembro. o casal está de visita a Singapura, seguindo depois o cruzeiro para Kuala Lumpur, Malásia (11 de novembro); Phuket, Tailândia (12-13 de novembro); Colombo, capital do Sri Lanka ou Ceilão ou Trapobana (segundo os "Lusíadas", de Luís de Camões. I, 1), em 15-16 de novembro. de 2016;

(viii) na III (e última) parte da viagem, Graça de Abreu e a esposa estão, a 17 de novembro de 2016, em Cochim, na Índia, e descobrem a cada passo vestígios da presença portuguesa; a 18, estão em Goa, seguindo depois para Bombaím (20 e 21 de novembro de 2016);

(ix) com 2 meses e 20 dias, depois da Índia, os nossos viajantes estão no Dubai, Emiratos Árabes Unidos, passando por Muscat, e Salah, dois sultanatos de Omã, em datas que já não podemos precisar (, as fotos deixam de ter data e hora...), de qualquer modo já estamos em finais de novembro/ princípios de em dezembro de 2016;

(x) tempo ainda para visitar Petra, na Jordânia, e atravessar os 170 km do canal do Suez (Egito), antes de o "Costa Luminosa" entrar no Mediterrâneo; a viagem irá terminar em Civitavecchia, porto de Roma, antes da chegada do novo ano, 2017.


3. Fim da Viagem de volta ao mundo em 100 dias > Canal do Suezs e Roma > s/d, c. final de dezembro de 2016] (pp. 25-29], da terceira e última Parte, que nos foi enviada em formato pdf]


Canal do Suez, Egipto

Desde Aqaba, o navio enviesou e caiu no mar Vermelho, na imparável subida para o Mediterrâneo e a Europa. Passamos ao lado de Sharm-el-Sheik, situada a estibordo, navegamos junto a Hurghada, escondida a bombordo, lugares de excepção no Egipto turístico agora afectados pelo terrorismo que lhes despovoa as centenas de hotéis onde se alojavam aos milhares as gentes vindas de múltiplas paragens da Europa, em busca do sol, das águas tépidas do mar, da história do Egipto, dos faraós e dos árabes. [Foto nº 1]

Chegado à noite à cidade de Suez para a travessia do Canal, o Costa estaciona atrás de um cruzador norte-americano que, creio, regressa aos States após missão no Golfo Pérsico. Assim que raiar a manhã, avançaremos num comboio de navios durante os 168 quilómetros de águas do Canal do Suez. [Foto nº 2]

O dia começa com nevoeiro, os horizontes estão curtos, envoltos na bruma. Aí vamos no início da travessia que durará até às três da tarde. A névoa levanta e temos este extraordinário Canal para ver e cruzar. Com muito trânsito de navios, em ambas as margens há filas e filas de camiões, e automóveis egípcios, que esperam que a navegação dos grandes barcos diminua para, em pequenos ferries, poderem passar de um lado para o outro do canal.

O Costa segue viagem lentamente como que tacteando as águas. Avançamos de sul para norte e, na margem direita, espraiam-se quase só terras desérticas, num perder de vista por pequenos montes e areais imensos. A margem esquerda foi mais bafejada pela sorte. As águas do rio Nilo, que corre quase paralelo ao Canal, a uns oitenta quilómetros de distância, a poente, foram domadas, encaminhadas e trazidas até estes lugares. Em vários troços são visíveis grandes extensões de terreno verde e fértil. Aqui o camponês, o felah, abre canais de irrigação, trabalha a terra, conta com as águas sagradas do Nilo. E há trigo e legumes, várzeas e pomares, e é necessário dar de comer a milhões e milhões de pessoas. O Egipto tem hoje 83 milhões de habitantes para alimentar, e um vasto território quase todo desértico.  [Foto nº 3]

Impressionante é a segurança montada em ambos os lados do Canal. Ao longo de todas as duas correntezas das margen -- quase 170 quilómetros vezes dois --, foi construído um muro aí com 5 metros de altura, que separa e delimita o curso das águas, com guaritas, soldados e pequenos destacamentos militares. Tudo activo e vigilante diante da quase permanente passagem de navios. Imaginem o que seria um enorme petroleiro ou um navio de cruzeiros como o nosso, ser atacado e incendiado por radicais islâmicos, a partir das margens do Canal do Suez!

Estamos a chegar a Port Said, a cidade junto à saída para o Mediterrâneo, burgo fundamental que nasceu e cresceu quando da construção do Canal. Quem por aqui andou, em Novembro de 1869, foi o nosso Eça de Queirós, então com apenas 24 anos, que escreveu para o Diário de Notícias quatro extensas crónicas publicadas em Janeiro de 1870 sobre as “festas” de inauguração do Canal do Suez. Considerou os seus textos “uma narração trivial, um relatório chato” e fala assim da cidade:

“Por uma bela manhã, entrámos em Port Said por entre os dois grandes molhes que se adiantam paralelamente pelo mar, feitos de poderosos blocos de pedra solta. Port Said é uma cidade de indústria e de operários: isto dá-lhe uma especialidade de fisionomia: estaleiros, forjas, serralharias, armazéns de materiais, aparelhos destilatórios. (…) nem edifícios, nem monumentos, nem construções sólidas e sérias: tudo é ligeiro, barato, provisório. A igreja católica é como uma grande barraca: vê-se o céu azul através do seu tecto feito de grandes traves mal unidas. Tudo isto dá a Port Said um aspecto triste.”

Não desembarcámos em Port Said, passámos ao lado do porto e da baía, mas deu para ver que, cento e cinquenta anos após a visita de Eça de Queirós, a cidade cresceu exponencialmente, hoje tem 600 mil habitantes contra os 12 mil existentes na altura da viagem do autor de A Relíquia. 

Em breve, depois de entrar na noite dos séculos, cá regressarei para tomar um chá de menta com o nosso Eça de Queirós, para falarmos do Egipto, dos atribulados tempos actuais e para conversarmos longamente sobre uma das nossas grandes paixões, a China e os Chineses. Não foi Eça quem escreveu no capítulo XVIII de Os Maias: “Os anos vão passando (…) E com os anos, a não ser a China, tudo na terra passa.”


Roma, Itália

Aí está a nossa Europa!

O estreito de Messina, com a ponta da bota da Itália calabresa a dar o pontapé na Sicília e nós a navegar entre.


Mais duas horas ao sabor da ondulação e passamos mesmo ao lado do vulcão Stromboli, um cone perfeitinho a sair do mar e, do lado norte, o fumo permanente das erupções. A ilha e o vulcão, em 1949, foram cenário de filme “Stromboli terra di Dio”, com a Ingrid Bergman, realizado por Roberto Rossellini, então marido da diva sueca. [Foto nº 4]

Chegada a Civitavecchia, porto de Roma. Viagem de uma hora até à “cidade eterna”, por uma auto-estrada a ondular pelos campos do velho Lácio. Chego, saúdo Rómulo e Remo, e não esqueço a mãe loba, estou no coração da Roma dos santos papas, de Júlio César e Constantino, de gentes como Sofia Loren e Federico Fellini. Revisitar Roma, a basílica de São Pedro, a excelência perfeita da Pietá do Miguel Ângelo, logo à entrada, à direita, o esplendor na imensa nave da maior igreja do globo. [Foto nº 5]

Como das outras visitas, não vi o Papa, mas deambular ao acaso por Roma após uma volta ao mundo, após tanto mar e infindáveis terras, tudo criado pelo engenho de Deus e alguma loucura dos homens, concede-nos a excelência de sermos criaturas inventadas pelos deuses, de sermos os homens que ergueram maravilhas como São Pedro, o Museu do Vaticano, com bem menor dimensão, a nossa igreja de Santo António dos Portugueses.[Foto nº 6]

Roma é uma cidade que levo, há muitos anos, suspensa nas pregas do coração, onde regressarei, de certeza, logo no início de uma próxima reencarnação.

Amanhã o Costa conclui a jornada de volta ao mundo, segue de Civitavecchia para Savona, pedaços de mar Mediterrâneo que conhece de cór. Depois, um avião para Lisboa e regressaremos a casa, ao dulcíssimo lar. Foram três meses e oito dias de viagem por oceanos infindos, terras de todos os assombros e magias. Começo a ter saudades da ditosa pátria, do conforto da minha casa, de respirar Portugal.

Recordo palavras de Bernardo Soares, aliás Fernando Pessoa:

A vida é o que fazemos dela,
As viagens são os viajantes.
O que vemos não é o que vemos
Senão o que somos.

António Graça de Abreu

FIM

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segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19042: Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias (António Graça de Abreu) - Parte XXXIX: Petra, Jordânia, com o Lawrence da Arábia como cicerone, e o Indiana Jones como guarda-costas...



Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3

Petra, Jordânia,  s/d, dezembro de 2016


Fotos (e legendas): © António Graça de Abreu (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação das crónicas da "viagem à volta ao mundo em 100 dias" [3 meses e oito dias], do nosso camarada António Graça de Abreu


Escritor, poeta, sinólogo, ex-alf mil SGE, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), membro sénior da nossa Tabanca Grande, e ativo colaborador do nosso blogue com cerca de 220 referências, é casado com a médica chinesa Hai Yuan, natural de Xangai, e tem dois filhos, João e Pedro. Vive no concelho de Cascais.

[Foto à esquerda: Hai Yuan e António Graça de Abreu]


2. Sinopse da série "Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias" (*)

(i) neste cruzeiro à volta do mundo, o nosso camarada e a sua esposa partiram do porto de Barcelona em 1 de setembro de 2016; [não sabemos quanto despenderam, mas o "barco do amor" deve-lhes cobrado uma nota preta: c. 40 mil euros, no mínimo, estimamos nós];

(ii) três semanas depois de o navio italiano "Costa Luminosa", com quase três centenas de metros de comprimento, sair do Mediterrâneo e atravessar o Atlântico, estava no Pacífico, e mais concretamente no Oceano Pacífico, na Costa Rica (21/9/2016) e na Guatemala (24/9/2017), e depois no México (26/9/2017);

(iii) na II etapa da "viagem de volta ao mundo em 100 dias", com um mês de cruzeiro (a primeira parte terá sido "a menos interessante", diz-nos o escritor), o "Costa Luminosa" chega aos EUA, à costa da Califórnia: San Diego e San Pedro (30/9/2016), Long Beach (1/10/2016), Los Angeles (30/9/2016) e São Francisco (3/4/10/2017); no dia 9, está em Honolulu, Hawai, território norte-americano; navega agora em pleno Oceano Pacífico, a caminho da Polinésia, onde há algumas das mais belas ilhas do mundo;

(iv) um mês e meio do início do cruzeiro, em Barcelona, o "Costa Luminosa" atraca no porto de Pago Pago, capital da Samoa Americana, ilha de Tutuila, Polinésia, em 15/10/2016;

(v) seguem-se depois as ilhas Tonga; visita a Auckland, Nova Zelândia, em 20/10/2016; volta pela Austrália: Sidney, a capital, e as Montanhas Azuis (24-26 de outubro de 2016);

(vi) o navio "Costa Luminosa" chega, pela manhã de 29/10/2016, à cidade de Melbourne, Austrália; visita à Austrália Ocidental, enquanto o navio segue depois para Singapura; o Graça de Abreu e a esposa alugam um carro e percorrem grande parte da costa seguindo depois em 8 de novembro, de avião para Singapura, e voltando a "apanhar" o seu barco do amor...

(vii) de 8 a 10 de novembro. o casal está de visita a Singapura, seguindo depois o cruzeiro para Kuala Lumpur, Malásia (11 de novembro); Phuket, Tailândia (12-13 de novembro); Colombo, capital do Sri Lanka ou Ceilão ou Trapobana (segundo os "Lusíadas", de Luís de Camões. I, 1), em 15-16 de novembro. de 2016;

(viii) na III (e última) parte da viagem, Graça de Abreu e a esposa estão, a 17 de novembro de 2016, em Cochim, na Índia, e descobrem a cada passo vestígios da presença portuguesa; a 18, estão em Goa, seguindo depois para Bombaím (20 e 21 de novembro de 2016);

(ix) com 2 meses e 20 dias, depois da Índia, os nossos viajantes estão no Dubai, Emiratos Árabes Unidos, passando por Muscat, e Salah, dois sultanatos de Omã, em datas que já não podemos precisar (, as fotos deixam de ter data e hora...), de qualquer modo já estamos em finais de novembro/ princípios de em dezembro de 2016;

(x) tempo ainda para visitar Petra, na Jordânia, e atravessar os 170 km do canal do Suez (Egito), antes de o "Costa Luminosa" entrar no Mediterrâneo; a viagem irá terminar em Civitavecchia, porto de Roma, antes da chegada do novo ano, 2017
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3. Viagem de volta ao mundo em 100 dias > Patra Jordânia, s/d, dezembro de 2016] (pp. 22-25], da terceira e última Parte, que nos foi enviada em formato pdf]


Petra, Jordânia

Segunda visita a estas paragens, agora com entrada triunfal pelo mar Vermelho e pelo golfo de Aqaba. Estranhas terras de majestosas paisagens e retorcida História.

Desta vez trago como cicerone, a viajar sozinho e quase incógnito numa suite no nono piso do nosso Costa Luminosa, o cidadão inglês Thomas Edward Lawrence, mais conhecido por Lawrence da Arábia. Desembarco em Aqaba, o lugar certo, com o cicerone certo num país incerto. A oeste, o Egipto, com as terras massacradas do Sinai, do outro lado, os desertos da Arábia Saudita cheios de petróleo. No fim do golfo, duas cidades encostadas ao rebordo das montanhas, olhando-se no espelho uma da outra. São Eilat, território de Israel e, em frente, o burgo jordano de Aqaba, conquistada aos otomanos em 1917 pelo meu cicerone, o loiríssimo inglês de olho azul, o tal Lawrence da Arábia disfarçado de Peter O’Toole.

 Atravessada Aqaba, é altura de rumar a Petra, para norte, escondida entre montanhas róseas. Desta vez avanço por uma estrada diferente. Em lugar do chamado “Caminho dos Reis”, percorrido em 2008, seguimos pela recém construída auto-estrada do Deserto, pelo meio de montanhas quase surreais, por povoados pobres em solos secos e inóspitos, ao lado do inacreditável deserto de Wadi Rum. Lawrence, o cicerone, pisca-me o olho. Foi nestes vales – que de Wadi Rum conduzem a Aqaba – , que ele organizou os 5 mil homens que aqui haveriam de derrotar os otomanos.

Hoje os tempos são outros, temos carros de polícia e soldados espalhados estrategicamente ao longo dos 110 quilómetros de estrada, até chegarmos a Petra. Por cima da Jordânia ficam o Iraque e a Síria, terras ensanguentadas pela insensatez dos homens onde impera a lei do canhão e da bala. Só o Costa, o navio, despachou 1.600 turistas em 45 autocarros para a visita a Petra. A necessária segurança – imaginem o que seria os radicais islâmicos metralharem um dos nossos autocarros –, parece funcionar.

Perto da cidade rosa, iremos encontrar dois helicópteros estacionados numa plataforma ao lado da estrada e soldados de espingarda, aí de trezentos em trezentos metros. Não será apenas por nossa causa. Estamos mais protegidos porque neste mesmo dia visita Petra o rei Carlos Gustavo, da Suécia.

Chegamos à cidade de Wadi Musa. Estacionado o autocarro, uma caminhada curta e iniciamos a descida suave para o desfiladeiro apertado entre rochas que se elevam até ao céu, em pedra cor-de-rosa, meia translúcida, mágicos rubores, e mil cores. De súbito, quilómetro e meio adiante, abre-se a garganta na montanha e aí está, numa apertada clareira, o Al-Khazneh, o Tesouro, mais a sequência das ruínas da que foi, há dois mil anos, e continua a ser hoje, uma das mais espantosas urbes construída pelo engenho dos homens. 

Avanço pelo espaço de uma cidade quase mais velha do que o tempo, ainda envolta em mil mistérios. Quem foram os nabateus, o povo que construiu Petra? Seriam provavelmente berberes, ou beduínos do deserto que por aqui se fixaram há dois mil e quinhentos anos, sendo então Petra um entreposto de caravanas nas rotas de norte para sul, de leste para oeste em terras do que viria a ser a Arábia. 

Verdade é que os nabateus se eclipsaram, desapareceram do mundo e vieram os romanos, mais tarde os bizantinos. Todos abandonaram Petra e a cidade, abalada por terramotos, pela falta de água, pela mudança do itinerário das caravanas, acabou quase em ruínas. O perpassar dos séculos cumpriu o seu dever, foi reduzindo os palácios a pedras caídas e a pó, os túmulos, a buracos suspensos nas falésias que unem céu e terra, as casas a montes informes de lajes pelo chão.

Redescoberta em 1812 por um explorador suíço, de nome Johannes Burkhart, Petra voltou a existir, mas ninguém estava preocupado em desvendar os seus segredos. Foi preciso um senhor norte-americano, de nome Steven Spielberg e sua equipa se lembrarem, em 1989, de Petra e do Al-Khazneh para aí esconderem o segredo do Graal, no terceiro filme da saga Indiana Jones e colocarem o Harrison Ford, no fim da película, a sair vitorioso a cavalo do espantoso Al-Khaznek. 

Petra começou então a ser conhecida em todo o mundo. Com vinte séculos de idade, o Al-Khaznek, miraculosamente conservado, seria, segundo os arqueólogos, o lugar onde se esconderia o valioso tesouro de um faraó, ou abrigaria talvez o túmulo de um rei nabateu, ou poderia ainda ser um templo dedicado a um deus desconhecido. Tem 43 metros de altura, seis colunas helenísticas encimadas por uma espécie de três grandes nichos decorados e resguardados por telhados, tudo recortado na rocha cor-de-rosa. O Al-Khaznek, revisitado, deixa-me outra vez suspenso nas asas coloridas do assombro.

Existe mais Petra continuando a caminhada. Há um teatro romano do século I, todo talhado no vermelho escuro da pedra, com capacidade para sete mil pessoas, há mais palácios e conjuntos de túmulos em fachadas monumentais rasgadas na falésia, há restos de um templo e de uma igreja bizantina, do século VI. 

Lá longe, depois da subida difícil de 800 degraus cortados quase ao acaso na pedra, chegamos a Ad-Deir, o Mosteiro construído no século II, outro gigantesco edifício com semelhanças com o Al-Khaznek, e que é a segunda maior atracção de Petra. Chamam-lhe o “Mosteiro” porque no interior foram encontradas não sei quantas cruzes bizantinas, provável evidência de que no século VI terá sido transformado em igreja ou mosteiro. Visitei-o na viagem de 2008, mas agora, com as pernas mais delapidadas pelo avançar dos anos, não valeria a pena o esforço de subir outra vez ao Ad-Deir.

 No regresso a Wadi Musa e ao autocarro, andei à procura do cicerone, o tal inglês loiro, o Lawrence da Arábia que desaparecera na chegada a Petra. Disseram-me que havia partido montado num camelo, a toda a brida, em direcção ao deserto de Wadi Rum onde tinha um encontro com o seu amigo Ali Abn el Karish, disfarçado de Omar Sharif, para porem a conversa em dia e beberem um chá no deserto.

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Nota do editor:

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Guiné 61/74 - P18961: Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias (António Graça de Abreu) - Parte XXXVIII: Salalah, sultanato de Omã, onde a electricidade, a água, o ensino e a saúde são gratuitos...


Foto nº 1 


Foto nº 2


Foto nº 3

Salalah, sultanato de Omã, dezembro de 2016


Fotos (e legendas): © António Graça de Abreu (2018). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Continuação da publicação das crónicas da "viagem à volta ao mundo em 100 dias" [3 meses e oito dias], do nosso camarada António Graça de Abreu.  

Escritor, poeta, sinólogo, ex-alf mil SGE, CAOP 1 (Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74), membro sénior da nossa Tabanca Grande, e ativo colaborador do nosso blogue com cerca de 220 referências, é casado com a médica chinesa Hai Yuan, natural de Xangai, e tem dois filhos, João e Pedro. Vive no concelho de Cascais.

[Foto à esquerda: Hai Yuan e António Graça de Abreu]



2. Sinopse da série "Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias" (*)


(i) neste cruzeiro à volta do mundo, o nosso camarada e a sua esposa partiram do porto de Barcelona em 1 de setembro de 2016; [não sabemos quanto despenderam, mas o "barco do amor" deve-lhes cobrado uma nota preta: c. 40 mil euros, no mínimo, estimamos nós];

(ii) três semanas depois de o navio italiano "Costa Luminosa", com quase três centenas de metros de comprimento, sair do Mediterrâneo e atravessar o Atlântico, estava no Pacífico, e mais concretamente no Oceano Pacífico, na Costa Rica (21/9/2016) e na Guatemala (24/9/2017), e depois no México (26/9/2017);

(iii) na II etapa da "viagem de volta ao mundo em 100 dias", com um mês de cruzeiro (a primeira parte terá sido "a menos interessante", diz-nos o escritor), o "Costa Luminosa" chega aos EUA, à costa da Califórnia: San Diego e San Pedro (30/9/2016), Long Beach (1/10/2016), Los Angeles (30/9/2016) e São Francisco (3/4/10/2017); no dia 9, está em Honolulu, Hawai, território norte-americano; navega agora em pleno Oceano Pacífico, a caminho da Polinésia, onde há algumas das mais belas ilhas do mundo;

(iv) um mês e meio do início do cruzeiro, em Barcelona, o "Costa Luminosa" atraca no porto de Pago Pago, capital da Samoa Americana, ilha de Tutuila, Polinésia, em 15/10/2016;

(v) seguem-se depois as ilhas Tonga; visita a Auckland, Nova Zelândia, em 20/10/2016; volta pela Austrália: Sidney, a capital, e as Montanhas Azuis (24-26 de outubro de 2016);

(vi) o navio "Costa Luminosa" chega, pela manhã de 29/10/2016, à cidade de Melbourne, Austrália; visita à Austrália Ocidental, enquanto o navio segue depois para Singapura; o Graça de Abreu e a esposa alugam um carro e percorrem grande parte da costa seguindo depois em 8 de novembro, de avião para Singapura, e voltando a "apanhar" o seu barco do amor...

(vii) de 8 a 10 de novembro. o casal está de visita a Singapura, seguindo depois o cruzeiro para Kuala Lumpur, Malásia (11 de novembro); Phuket, Tailândia (12-13 de novembro); Colombo, capital do Sri Lanka ou Ceilão ou Trapobana (segundo os "Lusíadas", de Luís de Camões. I, 1), em 15-16 de novembro. de 2016;

(viii) na III (e última) parte da viagem, Graça de Abreu e a esposa estão, a 17 de novembro de 2016, em Cochim, na Índia, e descobrem a cada passo vestígios da presença portuguesa; a 18, estão em Goa, seguindo depois para Bombaím (20 e 21 de novembro de 2016);

(ix) com 2 meses e 20 dias, depois da Índia, os nossos viajantes estão Dubai, Emiratos Árabes Unidos, passando por Muscat, e  Salah, dois sultanatos de Omã, em datas que já não podemos precisar (, as fotos deixam de ter data e hora...),  de qualquer modo já estamos em finais de novembro/ princípios de em dezembro de 2016; 

(x) tempo ainda para visitar Petra, na Jordânia, e atravessar os 170 km do canal do Suez (Egito), antes de o "Costa Luminosa" entrar no Mediterrâneo; a viagem irá terminar em Civitavecchia, porto de Roma.  



3. Viagem de volta ao mundo em 100 dias > Salalah, sultanato de Omã [s/d,  dezembro de 2016] (pp. 20-22], da terceira e última Parte]




Salalah, sultanato de Omã 




Viveu Job cento e quarenta anos e viu os seus filhos, e os filhos dos seus filhos até à quarta geração, e morreu velho e cheio de dias. 


Antigo Testamento, Livro de Job, cap. 42, vers. 16 


Mais mil quilómetros de estrada marítima e chegamos a Salalah, no sudeste do sultanato de Omã, a dez léguas do Yémen, hoje assolado pela guerra e pela fome. Há paz do lado de Omã, as velhas terras de Dhofar, habitadas outrora pela formosa e antiquíssima rainha de Sabá. Hoje, para lá das fronteiras de Omã, é só metralha, miséria e morte. 

Iniciamos a viagem de descoberta da região de Salalah, com o autocarro a avançar desde o porto, pejado de contentores e de tubagens, estas para a exportação do gás natural. Tudo fica para trás e começamos a subir por uma cadeia de montanhas secas e inóspitas, rodeadas, lá em baixo, por avassaladores desertos [Foto nº1]. Nos declives dos montes há alguns pinheiros verdes, raros nestes lugares semi-desérticos. Não entendo exactamente para onde nos levam, tanta curva, tanto monte, por isso pergunto ao simpático guia local: “Qual é o destino?” 

Simples, vamos visitar o túmulo do profeta Job, esse mesmo, o do Livro de Job, no Velho Testamento, o “da paciência de Job”, expressão que tantas vezes utilizamos ao longo das nossas vidas. Job é considerado profeta também por muçulmanos e judeus. Descendente de Noé, terá vivido há uns três mil anos atrás e, no Corão, Maomé faz quatro referências à sua pessoa. Job, tal como Abraão, Moisés e David, é uma das figuras bíblicas que também encaixam no islão primitivo, tradicional, muito anterior a Maomé.

No alto da montanha, num lugar com uma vista majestosa, uma capela branca, de cúpula redonda, guarda o que serão os ossos do velho Job, hoje -- se é mesmo verdade que a tumba é autêntica! --, apenas restos de poeira e pó. Descalço os sapatos para entrar e estou diante de um simples túmulo jazente coberto por um pano de cetim verde e amarelo. Uma leve reverência a este pobre Job e ali fico, a embeber-me nos traços da memória de um profeta do nosso Antigo Testamento. Cá fora, ao lado da capela, levanta-se uma pequena mesquita fechada ao culto, mas o que mais me impressiona é a nascente de água, uma fonte jorrando num estranho lugar, no alto de uma montanha circundada por desertos. Há um pequeno jardim com lírios vermelhos e buganvílias floridas. O túmulo de Job levita na magia dos espaços. [Foto nº 2]

Descemos para o mar. Cá em baixo, na aridez extrema de terras de areia e cascalho pedregoso, não há uma árvore, é quase só desolação, desdobrada na secura da paisagem, no delapidar impiedoso do calor caído do céu, violento, esmagador, estendendo-se pela passagem dos séculos.

A estrada acompanha a orla marítima, bordeja a extensa praia de Mughsail, algo semelhante à nossa na ilha de Porto Santo. Temos uns trinta graus de temperatura mas não há um simples mortal na areia ou a mergulhar na ondulação serena do Oceano Índico. As gentes de Omã não serão muito dadas aos prazeres da praia e, quanto a bronzear o corpinho, estamos entendidos. Haverá mulheres muçulmanas lindas de morrer, no entanto, por respeito com o rigor do Islão, ao sair de casa cobrem quase todo o corpo. 

Atravessamos uma pequena aldeia de pescadores, com casas modernas, na arquitectura árabe, bem traçadas e implantadas no terreno. Dizem-me que foram mandadas construir e oferecidas pelo sultão Qaboos, o poderoso e omnipresente senhor de Omã, há mais de quarenta anos. 

Nestas terras, o petróleo corre em abundância, a electricidade e a água – escassa, muita dela proveniente de complexos de dessalinização da água do mar  –, são gratuitas, assim como o ensino e a saúde. Os cidadãos do sultanato também não pagam impostos o que, de resto, creio acontecer em outros territórios árabes. O dinheiro do ouro negro vai chegando para quase tudo embora, nos últimos anos, muitos destes países tenham perdido milhões e milhões com a descida do preço do petróleo. 

O extremo poente da praia de Mughsail termina num promontório que se eleva abrupto no horizonte. Na plataforma rochosa, em baixo, uma espécie de curiosos géisers marinhos lançam água do mar, comprimida pelas rochas, a uns vinte metros de altura. Mas é a vastidão azul do oceano, da quase infindável praia, a leste, e, do outro lado, o imenso maciço de pedra avermelhada entrando pelas águas que impressiona este pobre turista lusitano que, até há poucos meses atrás, desconhecia por completo a existência de uma cidade chamada Salalah, e para quem o sultanato de Omã era uma miragem fantasiosa, perdido algures em desertos do fim do mundo. Continuo a ignorar quase tudo sobre o coração desta terra, mas o lugar já não me é estranho.

A pequena urbe de Salalah  – bem alinhada e cuidada, com rotundas verdejantes e floridas, dado beneficiarem de constantes regas  –, tem edifícios baixos ao modo tradicional árabe, algum comércio, uns tantos mercados, um estádio de futebol, as sempre presentes mesquitas. Junto ao mar, com outra enorme praia vazia, o destaque vai para o palácio Al Husn, onde nasceu o sultão Qaboos e hoje uma das suas residências de Verão. Paragem para caminhar pelas ruas ajardinadas em volta do palácio, tirar fotografias e depois, no mercado em frente, comprar um lote de especiarias, algumas tão estranhas que nem sei exactamente o que são, mas que irei experimentar nos meus apaladados cozinhados em Portugal, a minha terra distante que me começa a fazer falta.[Foto nº 3]

(Continua)
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Nota do editor: