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quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Guiné 61/74 - P18050: Manuscrito(s) (Luís Graça) (132): a nossa história trágico-marítima: mais um barco de pesca, de Ribamar, Lourinhã, que naufraga, roubando a vida a 4 pescadores... 13 barcos em meio século, 40 mortos.



1. Reproduzo aqui parte da mensagem comunitária, com data de 3 do corrente, que recebi do meu amigo Padre Joaquim Batalha, pároco de Ribamar, Lourinhã, e presidente da Fundação João XXI - Casa do Oeste, acompanhando o envio da do Farol - Folha Paroquuial,   ano XIII, nº 13, de 3 de dezembro de 2017:



Amigos

Paz e Bem com votos de uma boa semana também.

Na semana finda caiu mais uma vez o luto sobre Ribamar, esta nossa querida terra de pescadores. Mais um barco naufragou e tirou a vida a uma companha de quatro  marinheiros [, três deles de Ribamar, Lourinhã,  e um outro da vizinha Maceira, Torres Vedras].

Com este já são 13 barcos, nos últimos 50 anos. Neles morreram mais de 40 homens.

Já fizemos o funeral de três destes quatro  pescadores, mas ainda falta o corpo do mestre do barco “Veneza”. Hoje as notícias vinham a dizer que o navio hidrográfico já encontrou o “Veneza” a 80 metros de profundidade. Será que irão encontrar o Orlando,  preso na casa do leme?

Andamos todos ansiosos, sentidos e tristes com mais esta tragédia. Por isso na próxima 5ª feira vamos celebrar Missa de 7º dia por estes nossos irmãos: Orlando Fonseca, Leonel Candeias, José F. Henriques e o Paulo Jorge. Deus se compadeça deles e os acolham na Sua Misericórdia e às suas famílias tão doridas as conforte, confirme na Fé e na Esperança da Vida eterna.

(...) Solidários em poupar água…

Abraço-vos com amizade e gratidão. Paz e Bem e Feliz Advento também! Pe.Batalha

Joaquim Batalha
padrebatalha@gmail.com


2. Nota de Luís Graça, cuja bisavó materna era de Ribamar, Lourinhã, do "clã" Maçarico, Maria Augusta Maçarico (1864-1932):

Não resisto a comentar esta notícia, mesmo podendo ser acusado de  infringir uma das regras básicas do nosso blogue que nos "proibe" de  falar da "atualidade"... Mas onde, camaradas e amigos,  é que começa e acaba a guerra da Guiné que é o nosso "objeto de estudo e de escrita" ?

Já aqui em tempos escrevi que o concelho da Lourinhã, donde sou natural,  também tem a sua elevada quota-parte na história trágico-marítima deste país. Entre 1968 a 2000, por exemplo, estavam contabilizados seis naufrágios de barcos de pesca onde tinham morrido três dezenas de filhos da terra, com especial destaque para as gentes de Ribamar (fora outros acidentes de trabalho mortais, cujo número se desconhece).

Um desses naufrágios, ao largo do Cabo Carvoeiro, Peniche, foi o do barco Deus é Pai, em 26 de março de 1971,  tinha eu acabado de regressar da Guiné, Os restantes foram os do Certa (15 de maio de 1968), Altar de Deus (6 de novembro de 1982), Arca de Deus (17 de fevereiro de 1993), Amor de Filhos (25 de julho de 1994) e Orca II (antigo Porto Dinheiro) (19 de julho de 2000). [Fonte: Cipriano, Rui Marques (2001) – Vamos falar da Lourinhã. Lourinhã: Câmara Municipal da Lourinhã].

Entre estes homens há parentes meus, da grande família Maçarico, de Ribamar, Lourinhã.

Sobre o barco Deus é Pai, lembro-me de se dizer, na época, que fora cortado ao meio, à noite,  por um cargueiro russo, e que os náufragos teriam sido levados, vivos, para aquele país da "cortina de ferro", na altura a URSS... Estávamos em plena guerra fria e em África (Guiné, Angola, Moçambique) eram  armas russas e chineses que nos matavam e estropiavam... (Também nunca esqueço isso!).

Em vão esperaram por notícas deles, as "viúvas dos vivos", vestidas de preto... Os únicos destroços que deram à praia terão ao sido restos de redes e a tabuleta com os dizeres "Deus é Pai".

Depois de 2000, houve outros tantos naufrágios, a fazer fé na contabilidade do pastor das almas daquela terra que me diz muito, o padre Batalha. Ele fala em 13 naufrágios e mais de 4 dezenas de mortos... É um balanço trágico!

E vem a propósito evocar aqui  o filme do João Botelho, "Peregrinação", que se estreou recentemente, em 1 de novembro p.p., e que eu fui ver no cinema "Ideal", no Chiado... O filme inspira-se na obra do Fernão Mendes Pinto, "Peregrinação", o nosso primeiro "best-seller" de viagens... A música é do Fausto, ou grande parte dela, reconheci músicas e letras que tinha no ouvido... Ou melhor: a música de Luís Bragança Gil e Daniel Bernardes,   a partir do álbum “Por este rio acima”, de Fausto Bordalo Dias .

Os portugueses nunca leram a "Peregrinação"!... e alguns de nós, mais mesquinhos,  foram perpetuando o mito de que o Fernão Mendes Pinto era um desprezível impostor, denegrindo a "grandeza" da nossa "epopeia dos Descoberimentos... Brincávamos com o sue nome:
- Fernão,  mentes »
- Minto!

Ora a "Peregrinação é um livro maior da literatura portuguesa!... É produto nacional, muito mais do que o CR7 ou que a pera rocha do Oeste...

O filme, claro, é uma (impossível)  adaptação das aventuras e desventuras do "tuga" quinhentista!... Foi filmado na China, Japão, Índia, Malásia, Vietname e Portugal...

È um filme português que merece ser visto, . ... Som e imagem e direção de atores impecáveis... Quatro estrelas em cinco!...

O  "trailer" pode ser visto aqui. E a sinopse diz o seguinte: 

"...e assim partimos contra a razão,
sem nenhuma lembrança dos perigos do mar!"

“Em março de 1537, aos 26 ou 28 anos, Fernão Mendes Pinto, fugindo à miséria e estreiteza da sua vida, partiu para a Índia em busca de fama e fortuna”. Assim, no meio de uma terrível tempestade, começa este filme que relata os sucessos e as desventuras deste escritor aventureiro que, no decurso de 21 anos em que esteve no Oriente, foi “13 vezes cativo e 16 ou 17 vendido”. 

Mas, em vez da fortuna que pretendia, foram-lhe crescendo os trabalhos e os perigos. Aventureiro sim, mas também peregrino, penitente, embaixador, soldado, traficante e escravo, Fernão Mendes Pinto foi tudo e em toda a parte esteve. 

“Por extraordinária graça de Deus” regressou salvo para nos deixar um extraordinário livro de viagens, numa escrita hábil e fulgurante, carnal e violenta, terra-celeste. Esse livro de viagens editado três dezenas de anos após a sua morte transformou-se no primeiro best-seller da língua portuguesa, sendo traduzido e publicado em todos os reinos da Europa. 

A PEREGRINAÇÃO que agora vos apresentamos narra pedaços dessa observação aguda, exacerbada, exagerada que, na sua fascinante pressa de contar, aquele aventureiro dos sete mares nos deixou. Desventuras sim (“cada acção tem uma paga, cada pecado um castigo”) mas também sucessos: o cometimento e a grandeza das descobertas ou “achamentos” de outras terras e de outras gentes,no século de oiro da História de Portugal. 

Um filme de aventuras!"...

Fico com  vontade de voltar a ouvir o álbum do Fausto (editado em CD, pela CBS, em 1984, "Por
este rio acima"...Recordo-me de o ter oferecido, mais tarde, ao meu filho, que nasceu justamente nesse ano).

(...) Vou no espantoso trono das águas,
vou no tremendo assopro dos ventos,
vou por cima dos meus pensamentos,
arrepia,
arrepia,
e arrepia ,sim senhor,
que vida boa era a de Lisboa (...)




Naufrágio do "Galeão Grande S. João", uma ilustração da Historia Trágico-Marítima de 1735. Cortesia de Wikipédia.

Por Este Rio Acima baseou-se justamente-se nas aventuras de Fernão Mendes Pinto, relatadas na livro Peregrinação (1614). O álbum seguinte, o sétimo do Fausto,  Crónicas da Terra Ardente (1994), seria por sua vez  inspirado pela História Trágico-Marítima,  de Bernardo Gomes de Brito,  "colecção de relações e notícias de naufrágios, e sucessos infelizes, acontecidos aos navegadores portugueses",  publicada em dois tomos no tempo de D. João XV (1735 e 1736). (Os especialistas estimam que,  nos séculos XVI e XVII,  terá naufragado  um navio em cada cinco dos que partiram de Lisboa com destino à Índia.)

Por Este Rio Acima é considerado, pela crítica especializada, como um dos grandes álbuns da música popular portuguesa do pós-25 de Abril. Eu não tenho dúvida. Mas quando é que nós, portugueses,  aprendemos a dar valor ao que é nosso e aos nós próprios ?

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sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Guiné 61/74 - P17721: Agenda cultural (580): Lourinhã, Ribamar, sábado, dia 2, às 17h00, inauguração da exposição do nosso amigo e camarada Estêvão Alexandre Henriques, "Navegar no passado"... O nosso próximo grã-tabanqueiro foi fur mil radiomontador, CCS/BCAÇ 1858 (Catió, 1965/67)

Cartaz do eventábadoo



Convite

Exposição “Navegar no Passado”


Sábado, dia 2 de setembro, pelas 17 horas, no Espaço Museológico “Olhar o Mar e a Terra” (Antiga Escola Primária), em Ribamar, Lourinhã, é inaugurada da Exposição “Navegar no Passado”.

O autor é o ex-fur mil mecânico radiomontador Estevão Alexandre Henriques, da CCS/ BCAÇ 1858, Catió, 1965/67.  É membro da Tabanca de Porto Dinheiro e, dentro em breve, da Tabanca Grande, para a qual está há muito convidado.

Conheceu, entre outros, em Catió, o João Bacar Jaló, ainda conviveu com os seus conterrâneos ex-alf mil capelão Horácio Fernandes (CCS/BART 1813, Catió, 1967/69), natural de Ribamar, Lourinhã;  ex-sold Pel Mort 942 , José António Canoa Nogueira (1942.1966), morto em combate no subsetor de Catió, natural da Lourinhã; ex-sold at cav, José Henriques Mateus (1944-1966), que pertenceu á CCAV 1484 (Nhacra e Catió, 1965/67), e que desapareceu em combate na cambança do rio Tompar, 

O Estêvão A. Henriques é um dos maiores colecionadores de bússolas e outros equipamentos náuticos (rádios, sonares. etc.).




Almada > Seminário de Almada > 19 de junho de 2012 > O Estêvão A. Henriques, de costas para o estuário do Tejo e a cidade de Lisboa. Foto de cronologia da sua página no Facebook.



Alguns dados biográficos:


(i) nasce em 1942 em Fonte Lima,  freguesia de Santa Bárbara, Lourinhã;

(ii) estuda nos Seminários de Santarém e Almada, donde sai para cursar eletricidade e eletrónica;

(iii)  é chamado para o serviço militar em 1964, e faz em Tavira  o CSM - Curso de Sargentos Milicianos;

(iv) no mesmo ano vai frequentar para a Escola de Sargentos, localizada em Paço d'Arcos, aí fazendo o curso de Radiomontador;

(v) em 1965 é mobilizado para a Guiné como furriel miliciano radiomontador da CCS - Companhia de Comando e Serviços do Batalhão de Caçadores 1858 (Catió, região de Tombali, 1965/67);

(vi) no regressso a casa em 1967,  é convidado a ingressar como Radiotécnico na firma Electrónica Naval - com sede em Peniche;

(vii)  estabelece-se como empresário em 1970, constituindo firma na Rua 13 de Infantaria, em Peniche;

(viii)  em 1973, transfere a empresa para a Rua José Estêvão, n.º 102, aí permanecendo até aos dias de hoje, com oficina de reparação e stand de vendas de equipamentos eletrónicos e eletricidade para barcos;

(ix) durante mais de 40 anos impulsionou, a nível nacional, diversas marcas no setor das pescas: (a) Sistemas: Loran Morrow / Omega Sergel / Omege Diferencial; (b) Sondas: MJC /Kelvin & Hughes; (c) Sonares: Wesmar; (d) Radares: Anritsu; (e) Rádio goniómetro: Ben-Tem. 

(x) ao longo de mais de quarenta anos de atividade, para além das vendas de equipamentos eletrónicos, fez centenas de instalações elétricas em traineiras e barcos de pesca do alto, bem como em embarcações de pequeno porte e recreio;

(xi)  nos anos 70 equipa o primeiro barco de pesca do alto, o "Trio de Ribamar" , com toda a eletrónica e instalação elétrica a 24V DC e geradores a 380VAC, para alimentação do inovador sistema de frio, sendo este um dos primeiros barcos a pescar fora das águas do território nacional;

(xii) ainda no âmbito da sua atividade profissional, visita feiras internacionais de inovação marítima, quer na área da pesca, quer na dos equipamentos eletrónicos e negocia em diversos países: Espanha, Marrocos, Senegal, Mauritânia, Guiné- Bissau,Angola e Moçambique;

(xiiii) a paixão pelas bússolas vem do tempo em que presta serviço militar na Guiné, onde adquire uma bússola de bolso, aquela que viria a ser a primeira da sua, atual, vasta coleção!... 

(xiv) divide o seu tempo entre a paixão pelas bússolas e a construção de pequenas réplicas de embarcações de pesca e caravelas. 

(xv)  já realizou, em Peniche, 3 exposições temáticas com espécimes das suas coleções: 2007, 2009 e 2013;

(xvi) vive no Seixal, Lourinhã, e é casado com a Maria Rosário Henriques.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16249: Agenda cultural (493): Apresentação do livro do escritor e investigador da história do Barreiro, Armando Sousa Teixeira, "Antigamente da Bela Vista Viam-se os Barcos da Muleta", Casa do Alentejo, Lisboa, sexta feira, 1/7/2016, 16h00.





1. Convite enviado pelo nosso leitor, Armando Sousa Teixeira, escritor e investigador da história do Barreiro, autor ou coautor de obras como "A CUF no Barreiro, Realidades, Mitos e Contradições", "Guerra Colonial, a Memória Maior que o Pensamento”, “A Rua Direita e a Ganilha do Lado da Praia” e “Barreiro, Roteiro das Memórias da Resistência, do Trabalho e da Luta”:


Data: 26 de junho de 2016 às 03:26

Assunto: Apresentação do livro "Antigamente da Bela Vitsa viam-se os barcos da Muleta - Sexta feira, 1/7/16, 16h00, Casa do  Alentejo, Lisboa....


Caros amigos, companheiros, senhores

Por que razão depois de 300 anos de pesca épica no mar que começa onde o rio acaba, desapareceram os Barcos da Muleta com Redes da Tartaranha, sem serem substituídos no Barreiro (e no Seixal) por outros barcos oceânicos?

Porquê as tradições culturais ligadas ao meio piscatório (Queima do Judas, Cegadas, Fado Operário/Vadio), se foram perdendo até só restarem memórias indocumentadas de traços fundamentais de identidade barreirense?

O processo de implantação e de evolução do sistema capitalista nos inícios do século XX, os fenómenos migratórios associados, as movimentações sociais à volta da grande indústria, a socialização desequilibrada e reprimida nas grandes metrópoles da bacia do Tejo, estão no âmago do romance que agora se apresenta na margem direita do grande berço civilizacional, estrada de águas calmas que nos une mas por vezes também afasta.

Estaremos na Casa do Alentejo, a lindíssima e fresca casa solidária que mais uma vez nos apoia, na Sexta-Feira, dia 1/7/16, a partir das 16.00h, para apresentar o livro "ANTIGAMENTE DA BELA VISTA VIAM-SE OS BARCOS DA MULETA". [Editora Página a Página, 2016].


Haverá animação cultural com Teatro, Dança, Fado operário/vadio, Cegada e Cante Alentejano. 

Sobre o livro trocaremos algumas ideias ao entardecer com o escritor Modesto Navarro e com o militar de Abril e prefaciador, almirante Martins Guerreiro.

Serás bem recebido e não darás o tempo por mal empregado se apareceres. E traz outro amigo também! O convite-programa segue em anexo com um abraço do autor.

Armando Sousa Teixeira

__________________

Nota do editor:

Último poste da série > 22 de junho de 2016 > Guiné 63/74 - P16225: Agenda cultural (485): Inauguração da Biblioteca Central da UAC - Universidade Amílcar Cabral, Bissau, 5ª feira, 23 de junho, 10h00... Doação de livros do prof Russel Hamilton, especialista norte-americano em literatura africana de expressão portuguesa, falecido em 27/2/2016

domingo, 5 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14836: Manuscrito(s) (Luís Graça) (60): Se todos os pescadores do mundo...

Se todos os pescadores do mundo...

por Luís Graça


Se todos os pescadores do mundo,
Ao longo de todas as costas,
De todas as linhas do horizonte,
De todas as praias,
De todos os mares,
De todos os bancos de pesca,
De todos os icebergs,
De todas as fossas submarinas
E plataformas continentais,
De todas as ilhas,
De todas as pontes,
De todas as dunas,
De todas as falésias,
De todos os recifes de corais,
De todos os cabos e promontórios,
De todos os lagos e albufeiras,
De todos os rios 
De todas as rias,
De todos os cais…

Se todos os pescadores do mundo
Se dessem as mãos,
As canas de pesca,
Os fios, 
Os anzóis,
As redes, 
Os covos,
O mapa das marés,
Os arpões,
Os barcos, 
As barcas,
As canoas,
As pirogas,
As traineiras,
Os arrastões,
A bússola,
O radar,
O isco,
O GPS, 
O sextante, 
O sonar,
Os remos e as velas,
mais as artes antigas e modernas,
do cerco,  da xávega e da sombreira,
do arrasto e da ganchorra,
das redes de emalhar e de tresmalho,
da linha, dos alcatruzes e das gaiolas...

Se todos nós, no fundo, 
Partilhássemos o peixe pescado,
O peixe por haver,
Fresco, cru, seco,
Frito, cozido, guisado,
Assado, grelhado, fumado,
Salgado, congelado,
Sem esquecer as batatas e o pão...

Talvez pudéssemos reencontrar
Elos perdidos da cadeia da vida…
Talvez o mar fosse mais chão,
Talvez o mar fosse mais mulher,
Talvez o mundo fosse mais
Pequeno, 
Aconchegado,
Caloroso, 
Maneirinho,
Habitável…
Talvez o mundo fosse mais…
Amigável.

Luís Graça
Lourinhã, Praia de Porto Dinheiro | 11/8/2007 (versão original: "A friendly world")

Lourinhã, Porto das Barcas, revisto | v4, 27/6/2015
_________________

Nota do editor:

Último poste da série > 23 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14787: Manuscrito(s) (Luís Graça) (59): Lisboa, Mouraria, Rua do Benformoso

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14155: Os nossos seres, saberes e lazeres (76): O vício da pesca desportiva à linha (Juvenal Amado)



1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 9 de Janeiro de 2015:

Caros camaradas
Hoje vivo a uma distância considerável do mar e sem companhia, deixei há muito essa prática que chegou a ser um caso sério na ocupação de todos os tempos livres. Chegávamos a ir directos das pescarias para o trabalho, embora fosse mais aos fins de semana que praticávamos com mais afinco.
A vida é como é e, na altura dizíamos uns para os outros, que quando nos reformássemos é que seria apanhar peixe, pois ele não espera pelos fins de semana para aparecer, sendo nós a ter que esperar por ele.
Não vou à pesca há mais de vinte anos e agora não é por falta de tempo.
É a vida.
Juvenal Amado


Pesca Desportiva

Eu e o meu cunhado, também ex-combatente na Guiné, no caso dele em Fulacunda, depois de regressados apanhamos vício da pesca desportiva à linha.

Assim era ver-nos a ouvir as notícias para saber o estado do mar e de que lado soprava o vento e logo que pudessemos, lá íamos nós mais o Barrão(1), o Victor Amado(2), de canas de pesca, bornal com farnel, carretos, estralhos, destorcedores e amostras para a corricagem quando o mar estava encarneirado.

Consoante o sítio para onde íamos exercer o mister, os iscos eram também escolhidos com parcimónia, uma vez que os pesqueiros tinham o peixe engodado a diferentes tipos de isco. Também era importante saber a qual o peixe estava a morder melhor: no Salgado, no Areeiro, no Vau Furado, em água de Madeiros, no Sordão, na Foz de Arelho, etc.
Na Nazaré quase sempre era tripa de sardinha, uma vez que as peixeiras amanhavam os carapaus e sardinhas para secar e deitavam-nas ao mar.


Eram noites ou madrugadas passadas com o dedo na linha. A força das ondas faziam-na vibrar, rolando a chumbada dando a ideia de que era o peixe a picar. A maior parte das vezes não apanhávamos nada, só se salvava o lanche, uns golos de brandy que aqueciam a malta quando frio apertava e as conversas sobre o que tínhamos passado “lá longe onde o Sol castiga mais”.

Quando se pescava um robalote ou uma raia, era uma festa. Os mais felizardos apanhavam uma dourada ou sargo e então a felicidade era total. Falava-se durante algum tempo sobre como o tínhamos sentido, da luta que tinha dado e da alegria quando o víamos emergir entre a espuma da rebentação.

Em Alcobaça havia um grupo de pescadores mais velhos com os quais nós não nos misturávamos porque eles não queriam. É que eles faziam da sua forma de pescar um segredo e o mais engraçado é que passavam a vida a vigiar quando uns iam para a pesca para irem logo atrás. Alguns trabalhavam na mesma empresa que eu e quatro eram pintores na minha secção.

Um belo domingo, dois ou três foram até ao Salgado, onde o mar era sempre forte, passar um bocado, enquanto ouviam o relato dos jogos da 1.ª Divisão do Campeonato Nacional de Futebol.

As canas, de perto de 5 metros, num movimento onde se unia a força dos braços com vergar delas ao peso da chumbada cónica de 150 gramas, projectavam o estralho com o respectivo isco para dentro do mar, sendo necessário ultrapassar 80 metros, para que as ondas não devolvesse o anzol ao areal.

Às tantas, o senhor João preparou-se para fazer o seu lançamento e, quando vai com equipamento atrás, o anzol pegou, por azar, na alça do pequeno rádio, só se ouvindo associada à vergastada que a cana deu a voz do Romeu Correia a passar por cima das cabeças da malta, com se fosse zumbido mergulhando sem apelo nem agravo para lá da rebentação do Salgado, que era sempre bem forte .

Era uma chatice, já não se podia ouvir o relato da bola, mas o pior é que ia ser motivo de gozo de toda a malta. Combinaram logo ali que o assunto era para esquecer e que não se falava mais nisso.
Mas isto de segredos tem que se lhe diga, a coisa acabou por transpirar e foi motivo de muita risota entre a malta.

Um belo dia o senor João entrou na secção e, como de costume, ia logo para o pé do grupo onde eu me incluía, falar de como tinham corrido as pescarias, sobre a qualidade dos iscos, enfim conversa de pescadores. Já toda a malta estava a arreganhar os dentes quando Adriano diz com um ar muito sério:
-  Ouvi dizer que no Domingo, à tardinha, no Salgado, foi pescado um safio. Não quer saber que ficou toda a gente muito assustada pois o bicho falava e parecia um locutor a relatar um jogo de futebol?

Nessa altura a secção toda rebentou em fortes gargalhadas para desespero do desanimado pescador.
O homem ficou malino e deixou de falar com a malta. Compreende-se…

• O Adriano era levado para pregar partidas. Esteve em Angola e sobre ele há várias pequenas estórias onde ele foi o herói, outras vezes a vítima. Uma delas conta-se num instante. Os pais tiveram um filho antes dele a quem chamaram Adriano. Ora essa criança, para grande desgosto dos pais faleceu ainda bebé de colo. Quando o meu colega nasceu, talvez para minorar a falta do filho que tinha morrido, puseram-lhe o nome exactamente igual. Até ai tudo bem, mas quando o Adriano tinha 17 anos a Policia Militar foi a sua casa para o prender como refratário. Viu-se e desejou-se para explicar que não era ele e que procuravam, mas sim, o irmão morto, que tinha o mesmo nome e que se estivesse vivo estava na idade da incorporaração, já tendo faltado à sortes. Lá se safou pois era bem de ver que era demasiado novo. Coisas da tropa portuguesa.

• Na secção da pintura da Crisal também o Zé Marques, que foi pára-quedista, e o Félix estiveram na Guiné.

(1) - O meu amigo Barrão já falecido prestou serviço em Angola

(2) - O meu primo e colega de profissão Victor Amado foi marinheiro e prestou serviço em Moçambique

Um abraço e bom fim de semana
JA
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Nota do editor

Último poste da série de 28 de dezembro de 2014 > Guiné 63/74 - P14087: Os nossos seres, saberes e lazeres (75): O Porto (e)terno (Luis Graça)