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terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P17006: Postais ilustrados (20): Postais antigos da Guiné Portuguesa (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Janeiro de 2017: 

Queridos amigos,
É uma oportunidade ímpar visitar a Guiné do princípio do século XX, as grandes transformações virão a partir de Sarmento Rodrigues. Repare-se as preocupações francesas, a sua presença na Guiné Portuguesa é enorme, tanto a partir do Senegal como da sua colónia da Guiné, vinham buscar matérias-primas, e eram grandes fornecedores, a par de alemães e até belgas.
Os historiadores elogiam esta prodigiosa e única coleção que João Loureiro fez em tempo recorde, assegurando um património cultural incontornável, fê-lo com enorme discrição, sem prebendas nem condecorações.

Um abraço do
Mário


Uma espantosíssima coleção de 10 mil postais ilustrados

Beja Santos

O Dr. João Loureiro goza de uma situação particularíssima no nosso país: dispõe, por iniciativa própria, do maior acervo de bilhetes-postais das antigas províncias ultramarinas. Em 2015, numa edição do Arquivo Histórico de Macau, ficou-se com uma ideia do valor histórico desta coleção iconográfica de postais fotográficos. O autor explica as suas motivações na introdução deste precioso álbum: “Se excluir algumas dezenas de postais ilustrados que adquiri em diversas viagens aos antigos territórios ultramarinos, e sobretudo nas minhas colocações profissionais em Malange e no Uíge nos primórdios dos anos 70 do século XX, posso considerar como ponto de partida de uma recolha sistemática o Verão de 1992, imediatamente após o regresso de uma visita a Macau. Apercebi-me – e rapidamente o confirmei com pessoas altamente credenciadas nestas matérias – que eram muito escassas as fontes iconográficas sobre os territórios de África e do Oriente marcados pelo presença humana e cultural portuguesa, designadamente em bibliotecas, arquivo históricos e instituições similares”. Pesquisou e apurou que as coleções de bilhetes-postais das antigas províncias africanas eram modestíssimas tanto no Arquivo Histórico Ultramarino como na Biblioteca Nacional de Lisboa. Mais adiante recorda-nos que o período de lançamento e expansão do bilhete-postal ilustrado – finais do século XIX a primeiros três ou quatro decénios do século XX – coincide precisamente com a fase da ocupação e colonização efetiva de África e de uma maior atenção e interesse dedicados pelos governos da monarquia liberal e das duas primeiras repúblicas às causas ultramarinas.

Distintas personalidades do mundo científico aplaudem o acervo organizado pelo Dr. João Loureiro. Francisco Bettencourt, do King’s College de Londres e então diretor do Centro Cultural da Fundação Gulbenkian em Paris, considera que se trata de “… uma coleção única cuja consulta João Loureiro tem tido a generosidade de facultar aos investigadores. Na nossa opinião é impossível trabalhar sobre as antigas colónias portuguesas dos séculos XIX e XX sem utilizar este acervo de imagens”. René Pélissier, um dos maiores especialistas sobre a história da África de expressão portuguesa, declarou esta coleção como “monumento único”. António Barreto escreveu: “… ao tornar pública e acessível a sua coleção, João Loureiro presta um serviço ao seu país e aos novos Estados africanos, assim como contribui para o conhecimento da sua história”.

Esta edição contempla pois uma síntese da sua preciosa coleção. Falando agora da Guiné, João Loureiro diz que os mais antigos postais fotográficos foram publicados por casas francesas em 1903, 1912 e 1915. Até os numerosos clichés da União Postal Universal, que se reportam a 1908, ano em que ainda decorriam as chamadas campanhas de pacificação, revelam nos indicativos impressos aquela proveniência. Um outro editor francês, cerca de 1920, emite uma notável série de 90 postais numerados que permite revisitar os primórdios de Bissau, Bolama, Farim e Bafatá, e ainda reter interessantes imagens da vida rural, das festividades religiosas e do folclore tradicional. A situação irá mudar substancialmente com as coleções organizadas para as Exposições Coloniais, ou no âmbito das celebrações do V Centenário da Descoberta da Guiné, vão aparecendo diversos editores locais com destaque para Foto Serra, Casa Mendes, Confeitaria Império, Galerias JM e a Foto Íris, todas sediadas em Bissau. Para além destas firmas comerciais, surgem nos inícios dos anos 60 edições da responsabilidade de entidades oficiais – a Agência-Geral do Ultramar e o Centro de Informação e Turismo da Guiné. Na sua recolha, João Loureiro faz uma síntese dos editores e o respetivo inventário, trabalho de extraordinária importância. Vejamos agora alguns desses bilhetes-postais que se constituem documentos históricos:







O Dr. João Loureiro teve a gentileza, em 2009, de me oferecer um álbum esgotadíssimo sobre postais da Guiné, insisto que merecia reedição, tenho o palpite que se esgotaria rapidamente. Foi publicado no blogue a respetiva recensão e que consta do poste seguinte: https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2009/12/guine-6374-p5390-postais-ilustrados-15.html
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10916: Postais ilustrados (19): O menino que fumava cigarros White Horse (Beja Santos)

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Guiné 61/74 - P17002: Meu pai, meu velho, meu camarada (51): Feliciano Delfim dos Santos (1922-1989), ex-1º cabo, 1º Comp /1º Bat Exp do RI 11, Cabo Verde (Ilhas de Santiago, Santo Antão e Sal, 1941/43) (Augusto Silva Santos) - Parte II: "Colá San Jon", na Ribeira de Julião, ilha de São Vicente, 1943



Cabo Verde > Ilha de S. Vicente> Ribeira de Julião  > 1943 >  Tambores, colá San Jon  [Foto nº 30A]


Cabo Verde > Ilha de S. Vicente> Ribeira de Julião  > 1943 >  Tambores, colá San Jon  [Foto nº 30B]


Cabo Verde > Ilha de S. Vicente> Ribeira de Julião  > 1943 >  Tambores, colá San Jon  [Foto nº 30]


Cabo Verde > Ilha de S. Vicente> Ribeira de Julião  > 1943 >  Colá San Jon  [Foto nº 32A]


Cabo Verde > Ilha de S. Vicente> Ribeira de Julião  > 1943 >  Colá San Jon  [Foto nº 32]


Cabo Verde > Ilha de S. Vicente> Ribeira de Julião  > 1943 >  Colá San Jon  [Foto nº 31A]


Cabo Verde > Ilha de S. Vicente> Ribeira de Julião  > 1943 >  Colá San Jon  [Foto nº 31]

Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Ribeira de Julião > 1943 >  Festa de São João. Fotos do álbum, do então 1º cabo Feliciano Delfim Santos, da 1ª companhia do 1º batalhão expedicionário do RI 11 (Ilha do Sal, 1941-1943)


Fotos (e legendas): © Augusto Silva Santos (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Feliciano Delfim Santos (1922-1989)
1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do pai do nosso camarada e grã-tabanqueiro  Augusto Silva dos Santos (que reside em Almada  e foi fur mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73). 

 O Augusto disponibilizou-nos 33 fotos, digitalizadas, do seu pai, Feliciano Delfim Santos, e dos seus camaradas da 1ª companhia do 1º batalhão expedicionário do RI 11, que esteve na ilha do Sal, entre junho de 1941 e dezembro de 1943 (*) [, foto à direita].

Os "expedicionários do Onze" partiram do Cais da Rocha Conde de Óbidos, em Lisboa, no vapor "João Belo", a 16 de junho de 1941, com desembarque na Praia, ilha de Santiago, a 23 do mesmo mês. Estiberam prartocamente todo o tempo na então inóspita e pouca habitada ilha do sal, em missão de soberania. No final, ainda passram pelas ilhas de Santo Antõe de São Vicentem ressando a casa em dezembro de 1943. Duas dezenas de camaradas do batalhão morreram na ilha por doença e lá ficaram sepultados.

As fotos que  publicamos hoje trazem as seguintes (lacónicas) legendas:

(i) Foto 30 – Ilha de S. Vicente / 1943. Tambores, festa de S. João.

(ii) Foto 31 – Ilha de S. Vicente / 1943. Dança, festa de S. João.

(iii) Foto 32 – Ilha de S. Vicente / 1943. Dança, festa de S. João.

Podia pensar-se que eram do Mindelo, mas não. A festa de S. João celebra-se no interior da ilha, ma povoação da Ribeira de Julião. E são "postais ilustrados" comprados pelos expedicionários, como "recuerdo" de Cabo Verde...

No ábum de Cabo Verde, do meu pai, Luís Henriques (1920-2012) há uma foto extamente igual à da foto 31 do álbum do pai do Augusto, já qui publicada, e que tem a seguinte legenda:


Cabo Verde > S. Vicente > 1943 > Postal da época, "Coladeira do S. João" [ou cola San Jon] > Legenda no verso da foto (a tinta verde, já quase ilegível): "Dançando o batuque (sic) na Ribeira de Julião, no dia de São João , no interior ilha de São Vicente. Luís Henriques. 24/6/1943".

Foto: © Luís Graça (2013). Todos os direitos reservados [Legendas de Luís Henriques e de L.G.]

A qualidade  das imagens que o Augusto me mandou é superior.  Um delas já tinha sido publicada em tempos, mas erradamente foi legendada como sendo da festa da "Cola San Jon" da ilha de Santo Antão (**). O Augusto pediu-nos para fazer a correção, aqui fica feita.

Estas fotos, dos nossos pais, que foram expedicionários em Cabo Verde na II Guerra Mundial, infelizmente  já são muito raras e merecem ser salvas do "caixote do lixo", publicadas, divulgadas e estudadas. Por todas as razões, pelo seu interesse documental,  e sobretudo pelos laços históricos, culturais, linguísticos e afetivos que nos unem, portugueses e cabo-verdianos.

Tudo indica que as fotos (, na realidade, "postais ilustrados"), que aqui publicados, sejam da célebre casa "Foto Melo":

(...) "Foi a única casa fotográfica no Mindelo desde a sua fundação no séc. XIX e durante grande parte do século XX e retratou sistematicamente as chegadas de governadores, a elite intelectual local, almoços e jantares de gente ilustre, grupos de ingleses, eventos oficiais, sociais e religiosos, bailes carnavalescos, costumes populares, os navios no Porto Grande, vistas de cidades e paisagens de todas as ilhas de Cabo Verde. " (,,,)



2. Segundo Manuel Brito-Semedo, autor do blogue "Esquinha do Tempo"  (... "magazine cultural a divulgar Cabo Verde desde 2010"), a festa de S. João Baptista, ou do "colá San Jon" celebra-se em 24 de junho, em Cabo Verde [mas também na diáspora cabo-verdianaa como no bairro da Cova da Moura, na Amadora] no dia 24 de junho: (...) "integrada nas Festas Juninas,  é uma das principais festas populares nas ilhas de Barlavento – Santo Antão, S. Vicente, S. Nicolau e Boa Vista – e na Brava. Nas ilhas de Barlavento, a festa tem as mesmas características. Na Brava, a festa já possui características distintas e originais" (...).

Brito-Semedo, que é autor do estudo "A Construção da Identidade Nacional – Análise da Imprensa Entre 1877 e 1975" ( Praia, 2006),  resume aqui o que e esta festa na ilha de S. Vicente, onde no tempo da II Guerra Mundial estiver5am os pais de alguns de nós:

(...) "Em S. Vicente a festa decorre na Ribeira de Julião, localidade que dista poucos quilómetros da cidade do Mindelo. Mesquitela Lima (1992) descreve-a como uma espécie de romaria onde há de tudo: missa, comeres, beberes e dança, acompanhada de tambores e de apitos. A dança é a umbigada (movimento ritmado em que os pares chocam os umbigos), denominada colá San Jon, sobretudo praticada entre mulheres mas também entre homem e mulher. Os tambores, cuja forma são de origem portuguesa, são tocados com baguetes, produzindo um ritmo sincopado nitidamente africano. Tambores e apitos dirigem as dançarinas, que aceleram as umbigadas consoante o toque."

Mas há elementos de natureza socioantropológica que importa conhecer e divulgar. Seguimos a descrição do antropólogo Mesquitela Lima, citado  por Brito-Semedo:

(..) "Um navio à vela é outro elemento castiço da festa. Construído numa escala reduzida, com uma grande abertura no centro, permite a um homem entrar nele e segurar o navio com as duas mãos por intermédio de correias estrategicamente colocadas para que fique à altura da cintura. Este homem, chamado capitão e usando um boné, por vezes a farda completa, de oficial da marinha, maneja o navio em consonância com os apitos e tambores, praticando bolina, bordejando, vento em popa, tal como se estivesse no mar.

"É igualmente sacramental toda a gente usar colares de pipocas ("milho aliado") que se vende no local, sinal de que esteve presente na festa, ou seja, que era romeiro"  (Mesquitela Lima, op. cit.). (...)

E ao voltando ao amável autor do blogue "Esquina do Tempo", ficamos a saber que "a anteceder o dia de S. João Baptista, coincidindo com a festa pagã do solstício de Junho, há o tradicional saltar da fogueira (as “lumenaras”), eventualmente recordando o imemorial culto do fogo, e os fogos de artifício, prática também em Portugal associada à celebração do dia do Santo, na noite de véspera". (In; blogue "Esquina do Tempo" > 24 de junho de 2015 > Colá san Jon – Festa tradicional ).

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Guiné 63/74 - P16294: Tabanca Grande (490): Adelaide Barata Carrêlo, filha do ten SGE Barata, CCS/BCAÇ 2893 (Nova Lamego, 1969/71)... Com sete anos apenas, sofreu a brutal flagelação do IN ao quartel e vila do Gabu, em 15/11/1970, que causou 3 mortos e 4 feridos graves entre as NT e 8 mortos e 80 feridos (graves e ligeiros) entre a população... Passou a ser a nossa grã-tabanqueira nº 721

1. Mensagem de Adelaide Barata Carrêlo, enviada hoje às 14h43:


Boa tarde,

Agradeço de coração todas as palavras que me foram dirigidas (*).

Em relação ao que escrevi, na parte " (...) Também me lembro de quem lá ficou para sempre, não éramos muitos" e " Lugar onde tive medo, fui feliz e vivi (...), referíamos à trágica noite de 15 de Novembro de 1970. 

Ficou também por contar; e, que se me permite, o farei brevemente.

Obrigada mais uma vez, pelo convite para me sentar convosco à sombra do poilão da vossa querida Tabanca Grande.

Um abraço apertado

Adelaide

2. Alguns comentários:

(i) Cherno Baldé:

Amiga Adelaide,

Obrigado pelas bonitas palavras dirigidas à nossa sofrida Guiné, que Deus te proteja e guarde por muitos anos para poderes voltar a pisar esta terra vermelha da tua infância feliz e motivo de todas as saudades que engrandecem o teu grande coração de mulher.

O sentimento que tenho agora, como homem maduro e que acompanhou as vicissitudes e peripécias desta terra desde a infância, é que o gen Spínola queria fazer na Guiné o mesmo que, mais tarde, o Nelson Mandela fez na África de Sul, isto é,  uma nação arco-íris, onde o mais importante não seria a origem das pessoas nem a cor da pele. Por diversas, que agora não interessa invocar, não resultou, paciência. 

Um fraterno abraço para ti e a todos os amigos da Guiné, Cherno AB.

(ii) Valdemar Queiroz:

(...) "meninos que se ensaboavam no meio da rua e com um chuveiro gigante que deitava tanta água de pingos grossos e doces" (...). 

Que maravilhosa descrição, amiga Adelaide.

Abraço fraterno, Valdemar Queiroz

(iii) Jorge Rosales:

Amiga Adelaide:

O seu testemunho é LINDO... A minha filha Luísa faz hoje 45 anos... Que prenda tão forte para o pai... Obrigado.

Jorge Rosales (farda amarela)


(iv) Abílio Duarte:

Quem pode descrever bem esse dia/noite [, 15/11/1970,] é o meu camarada fur mil Aurélio Duarte [da CART 2479/CART 11 (Nova Lamego e Paunca, 1969/70)], que esteve no meio dessa total confusão, e ainda teve um processo disciplinar em cima... Felizmente safou-se militarmente e disciplinarmente, mas o cagaço  não foi pequeno: em maio passado,  no nosso almoço anual,  ele relembrou aquelas horas, pois estava emboscado na estrada de Nova Lamego para Piche e, segundo ele,  turra era mato.


(v)  Luís Graça:

Adelaide, foi das coisas mais lindas que temos editado nos últimos tempos. Essa capacidade de maravilhamento só pode ser de quem guarda, numa caixinha especial da memória, todas as cores, sabores e cheiros da Guiné, do tempo da infância. 

Fica deste já convidada para se sentar à sombra do poilão da nossa Tabanca Grande. Trataremos depois dos pormenores!... Um abraço fraterno.Luis Graça




Guiné > Nova Lamego (ou Gabu) > "Nova Lamego, Guiné Portugesa". Colecção "Guiné Portuguesa, nº (?)". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte, SARL). Exemplar  da colecção do nosso camarada Agostinho Gaspar (ex-1.º cabo mec auto rodas, 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74), natural do concelho de Leiria. 

 Digitalização e edição de imagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010).



3. Novo membro da Tabanca Grande, nº 721

A Adelaide, filha do tenente SGE Barata, da CCS/BCAÇ 2893 (Nova Lamego, 1969/71), confirma que estava,  com a família (pais e irmãos). em 15/11/1970, quando o quartel e a vila de Nova Lamego foram violentamente flageladas pelo PAIGC. Com sete anos, deve ter apanhado o maior susto da sua vida,

Recorde-se que,  em 15/11/1970, um numeroso grupo IN, estimado em 150 elementos flagelou Nova Lamego com armas ligeiras e 4 morteiros 82, tendo disparado cerca de 122 granadas, durante 35 minutos .

As NT tiveram 3 mortos (incluindo o srgt mil enf da CCAÇ 5, Cipriano Mendes Pereira),  4 feridos graves (incluindo 1 milícia), enquanto a população teve 8 mortos (incluindo a esposa do nosso camarada Cipriano), 50 feridos graves e 30 ligeiros.  As NT reagiram com fogo de morteiro 81 e canhão s/r, manobra de envolvimento e perseguição, apoiadas  pela FAP. A artilharia de Cabuca e Piche bateram com fogo de obus os prováveis itinerários de retirada do IN.

Nem por isso a Adelaide quis esquecer as melhores lembranças dos dias maravilhosos que passou no Gabu.

Acaba também por aceitar o nosso convite para integrar a nossa Tabanca Grande, honrando dessa maneira o seu pai e o seus camaradas, e nomeadamente daqueles que já morreram,

Se possível, gostaríamos de ter as duas fotos da praxe, de tipo passe, uma atual e outra do tempo que a Adelaide passou na Guiné, com os pais e irmãos. Para já fica com direito a sentar-se. no lugar nº 721 (**), à sombra do nosso mágico, frondoso  e fraterno poilão.

Que sejas bem vinda, Adelaide, que os/as filhos/as dos nossos camaradas nossos/as filhos/as são. 

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 9 de julho de 2016 >  Guiné 63/74 - P16288: (In)citações (95): "Terra vermelha quente e de paz, / lugar onde tive medo, fui feliz e vivi, / amar-te-ei sempre, / minha Guiné menina velha encantada"... (Adelaide Barata Carrêlo, filha do tenente Barata, que viveu em Nova Lamego, no início dos anos 70, durante a comissão do pai, e aonde regressou, maravilhada, quarenta e tal anos depois)

sábado, 12 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13392: Manuscritos(s) (Luís Graça) (36): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial (Parte VII): O melhor edifício da cidade, a Associação Comercial, hoje sede do PAIGC, projeto do arquiteto Jorge Chaves, de 1949-1952

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Guiné > Bissau > s/d > Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Bissau. Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 144". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal).

Foto: © Agostinho Gaspar / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine (2010). Todos os direitios reservados [Edução: LG]




Foto: © Virgínio Briote (2005). Todos os direitos reservados



1. Manuscrito(s) (Luís Graça)

Nota de leitura > Ana Vaz Milheiro – Guiné-Bissau: 2011. Lisboa, Circo de ideias, 2012, 52 pp. (Viagens, 5)

Parte VII (*)

Continuação das nossas notas de leitura desta brochura da investigadora e professora do ISCTE -IUL, Ana Vaz Milheiro (que é também crítica do jornal "Público" e que, sabemo-lo,  utilliza
igualmente o nosso blogue como fonte de informação e conhecimento, graças ao seu valioso espólio documental sobre a ex-Guiné portuguesa).

Como temos referido em postes anteriores desta série, este livrinho, profusamente ilustrado com fotografias da autora, a cores, resulta de uma singular viagem à Guiné-Bissau, durante 10 dias, de 2 a 10 de outubro de 2011, .feita por ela e por outro colega arquiteto, bem como pelo antropólogo Eduardo Costa Dias, nosso grã-tabanqueiro.

Ironia da história (ou talvez não, os “vencedores”, em todas as guerras, ficam sempre com os melhores despojos…): “o melhor edifício” de Bissau, na opinião qualificada da nossa cicerone e especialista em arquitetura colonial estadonovista,. Ana Vaz Milheiro, é(era) a sede da nossa conhecida Associação Comercial. Industrial e Agrícola da Guiné, junto ao palácio do governador...

O propjeto é de um jovem arquitecto de Lisboa, Jorge Chaves, e a remonta a 1959-1953. Depois da saída dos portugueses em setembro de 1974,a sede da Associação Comercial  passará a ser, muito naturalmente, a sede do PAIGC, ou sejas. dos novos senhores do território, com Luís Cabral, irmão de Amílcar Cabral (1923-1973), como primeiro presidente da jovem república da Guiné-Bissau.

Mas quem era Jorge Chaves ? Um jovem (e ainda relativamente pouco conhecido) arquiteto de Lisboa que não pertencia ao Gabinete de Urbanização Colonial. Nasceu em 1920 e morreu em 1981. Seu nome completo: Jorge Ribeiro Ferreira Chaves

 (…) “Activo profissionalmente entre 1941 e 1981, é considerado um dos mais perfeccionistas arquitectos portugueses.

Realiza, em atelier próprio, desde 1946, várias dezenas de projectos, para Portugal continental, Madeira, Guiné e Angola, dos quais se destacam a Pastelaria Mexicana, a loja Palissi Galvani, os Laboratórios Cannobio, um edifício de habitação na Rua Ilha do Príncipe e o Hotel Florida, em Lisboa, o Hotel Garbe, o Hotel da Baleeira e o Hotel Globo, no Algarve, a Câmara de Comércio de Bissau e a Caixa Geral de Depósitos de S. Pedro do Sul.” (..)
(Fonte: Jorge Ferreira Chaves, Wikipédia)

Nascido em Cabo Verde, Jorge Chaves fixou-se definitivamente em Lisboa a partir de 1931.  Mas deixemos à Ana Vaz Milheiro a apresentação do edício:

(…) “O projeto é escolhido em concurso lançado em Lisboa, no Porto e em Bissau, em 1949. O representante do Sindicato Nacional dos Arquitectos no júri é então João Simões, arquitecto experimentado em projetos para os Trópicos. De estrutura pavilhonar, em L, o edifício do PAIGC introduz uma qualidade de desenho que será difícil igualar em outros momentos da cultura arquitectónica luso-guineense. No interior o programa de decoração deve ter contado com a colaboração de Luís Possolo, arquitecto do Gabinete, ainda que treinado na Architectural Association, em Londres, No início dos anos cinquenta, a resposta portuguesa a uma arquitectura tropical encontra aqui, portanto, a sua melhor expressão” (p. 26).

Na opinião de outros arquitectos de renome que trabalharam para África, o edifício desenhado por Jorge Chaves (com murais de José Escada), pelo arrojo das suas linhas, conforto, mordernidade e até riqueza, não ficava atrás da arquitectura de Brasília, por exemplo, e era unanimemente considerado como o melhor edifício que nós deixámos em Bissau, do ponto de vista arquitectónico.

Jorge Chaves não pertencia ao Gabinete de Urbanização Colonial (ou do Ultramar, como passou a ser chamado, a partir de 1951), e daí talvez a razão do projeto ter uma modernidade que não seria possível dentro do paradigma da arquitectura colonial de então, marcado pelos constrangimentos da funcionalidade, adaptação ao clima, resistência e uso de materiais de baixo custo de manutenção.

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sábado, 29 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12911: Manuscrito(s) (Luís Graça (24): Revisitar Bissau, cidade da I República, pela mão de Ana Vaz Milheiro, especialista em arquitetura e urbanismo da época colonial

Nota de leitura >

Ana Vaz Milheiro – 2011: Guiné-Bissau. Lisboa, Circo de ideias, 2012, 52 pp.  (Viagens, 5)




1. Foi pena que tenha passado despercebida, a muitos de nós, ex-combatentes da Guiné, ou que se interessam pela historiografia da presença portuguesa em África, a xposição "África - Visões do Gabinete de Urbanização Colonial", que esteve patente ao pú8blico, no CCB, em Lisboa, de 7 de dezembro de 2013 a 2 de março de 2014.

Passei por lá em 26 de janeiro, com um amigo meu, arquiteto, o José António Paradela, de Ílhavo  (que fez, aos 16 anos, a "guerra colonial" na pesca do bacalhau,  na Terra Nova...) e tinha a intenção de fazer uma poste no âmbito da série "Agenda Cultural"...

Paciência.. Não se pode "ir a todas"... De qualquer modo, tomei  a liberdade de recolher algumas imagens e tomar algumas notas... que apresentarei mum próximo poste.




Cartaz promocional > CCB - Centro Cultural de Belém > Garagem Sul > Exposições de  Arquitectura >  "ÁFRICA – VISÕES DO GABINETE DE URBANIZAÇÃO COLONIAL"

Foto de Luís Graça (2014).


A curadoria foi da Ana Vaz Milheiro (com Ana Canas e João Vieira). A exposição esteve aberta ao público de 7 de dezembro de 2013 a 28 de fevereiro de 2014  [com prolongamento até 2 Março].

Segundo o programa, "África – Visões do Gabinete de Urbanização Colonial propõe um percurso por uma paisagem africana desenhada (e inventada) a partir do coração da metrópole, em Lisboa, no período final da colonização portuguesa (1944-1974).

O texto é da investigadora e docente do ISCTE-IUL, curadora desta exposição, Ana Vaz Milheiro. A exposição resulta de um projeto de investigação, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), e que decorreu entre 2010 e 2013: "Gabinetes Coloniais de Urbanização: Cultura e Práctica Arquitectónica"

(...) "Inicia-se com imagens de edifícios públicos fortemente marcados pela tradição portuguesa do sul, fixa-se numa arquitectura oficial do Estado Novo, e abre a possibilidade de ensaiar uma primeira expressão de 'nativismo africano', através do conhecimento progressivo que os arquitectos portugueses vão adquirindo das diferentes culturas locais, antecipando visões de autonomia e de independência."

Pela primeira vez mostrados em público, a exposição, que se realizou na Garagem Sul do CCB,  era enriquecida por  "um conjunto de desenhos, relatórios, fotografias, actualmente à guarda do Instituto de Investigação Científica Tropical".

Mas hoje do que vos quero falar é de livrinho que comprei lá, por 10 euros, e que é uma espécia de guia de bolso, um roteiro de visita guiada à Guiné-Bissau e ao património arquitetónico que os portugueses lá deixaram.  E que merece ser melhor conhecido, estudado, divulgado e protegido. O livro tem a assinatura da incontornável  e voluntariosa Ana Vaz Milheiro.

2. Ana Vaz Milheiro (n. 1968, Lisboa) é licenciada e mestre em arquitetura pela Universidade Técnica de Lisboa, e doutora pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (2004). Docente do ISCTE-IUL, prepara o seu pós-doutoramento em arquitetura lusoafricana da época do Estado Novo.

Este livrinho, profusamente ilustrado com fotografias da autora,  a cores, resulta de uma singular viagem,  à Guiné-Bissau,  de 2 arquitetos e de 1 sociólogo,  durante 10 dias, de 2 a 10 de outubro de 2011.

O sociólogo, ou melhor, antropólogo social é nem mais nem menos do que o Eduardo Costa Dias, do meu tempo do ISCTE, e nosso grã-tabanqueiro, que serve de “cicerone”, nesta viagem, a dois colegas, também do ISCTE-IUL, a autora da brochura, e o Paulo Tormenta Pinto.

O Eduardo, que vai à Guiné-Bissau, quase todos os anos, desde 1980,  foi desta vez, como especialista da cultura e história guineenses, integrado no projeto de investigação “Os Gabinetes Coloniais da Guiné-Bissau – Cultura e Prática Arquitectónica”, de que a Ana Vaz Milheiro é a responsável principal.

Como ele nos conta no curto texto que escreveu à laia de prefácio (p.7), rapidamente passou de “cicerone” para “ciceroneado”, de tal maneira foram as descobertas feitas, no terreno, a partir das “novas leituras” que lhe proporcionaram, em matéria de arquitetura e urbanismo coloniais, os seus dois  colegas, arquitetos… Para mais, “num terreno que eu pensava que puco de novo ainda tinha para me dizer” (p. 7).

Como leitor, entusiasta, do livrinho, também partilho do mesmo sentimento que o nosso amigo Eduardo. Basta, de resto, ler-se  o guião da viagem (e agora índice da publicação, enter parênteses a página):

Guiné-Bissau (7), Missão arquitetónica (9), Bissau, cidade da I República (11), A cidade jardim dos trópicos (13), O futuro de África é a China (15), Ruínas pós-colonais (17),  Arquiteturas maneiristas (19), Estação metereológica de Bissau (21), O bairro de Santa Luzia (23),  o bairro da Ajuda (25), O melhor edifício da cidade (27),  Geometrias (29), Migrações africanas (31), Mais mundo houvera (33), Bafatá (35), Um hospital com vista sobre a cidade (37), Contuboel (39), Mercados (41), A escola primária do Cacheu (43), Cine-Canchungo (45),  A estação dos CTT do Gabú (47), Ponte sobre o rio Mansoa (49), Bibliografia (50), Biografias (51).

“Last bu not the least”, neste conjunto de 2 dezenas de fontes de documentação consultadas e citadas pela autora, sabem qual é a última que vem na lista, na página 50 ? O nosso blogue, o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné que cumpre, assim,  um dos seus  propósitso, que é o de também ser uma fonte de informação e conhecimento relevante no que diz respeito à documentação da presença portuguesa na Guiné-Bissau (*)… De resto, como eu gosto de dizer, os ex-combatentes da Guiné "não querem morrer sem deixar rasto"... E o rasto são as "as nossas memórias e afetos"...

Para além de ser especialista num domínio como este o das arquiteturas lusotropicais, e mais exatamente coloniais, a Ana Vaz Milheiro  tem a vantagem, nesta viagem, de ser uma “estreante”, embora  de modo algum “virgem” no que diz respeito à arquitetura e urbanismo  da Guiné-Bissau da época colonial.  O seu olhar não era, pois, o do “leigo”, muito menos o do “turista à força” que fomos nós, os ex-combatentes, que foram  desembarcando  em Bissau, aos milhares, entre 1961 a 1974…

Ela não deixou nada ao acaso ou ao improviso: tinha feito o seu trabalho de casa, e compulsado vasta documentação:

(i) livros e opúsculos  (a maior parte da Agência Geral do Ultramar);

(ii) desenhos, projetos e documentos (do Arquivo Histórico Ultramarino  e do Centro de Documentação do IPAD);

 (iii) fotografias registadas pelo arquiteto Luís Possolo, nos anos 60, ao serviço do Ministério do Ultramar;

 (iv) fotos do Eduardo Costa Dias,  tiradas em  2009, de acordo com uma lista de edifícios públicos construídos em Bissau depois da II Guerra Mundial, amostragem de obras estado-novistas;e , por fim,

(v) cruzamento das imagens com os projetos arquivados em Lisboa…

De acordo com o roteiro da viagem, os primeiros dias foram passados em Bissau e arredores, seguindo-se:

(i) no dia 6/10/2011 Safim, Empada, Nhabijões [mas imediações de Bambadinca], Bafatá, Gabú, Sonaco, Contuboel;

 (ii) no dia 8, Bula, Canchungo, Cacheu;

e  (iii) no dias 9/10, Mansoa.





Guiné-Bissau > Bissau, capital do país. Planta da cidade, pós-independência.  C. 1975. Escala 1/20 mil  Pormenor

Imagem © A. Marques Lopes (2005). Todos os direitos reservados [Edição: L.G.]



Guiné > Bissau > s/d > Vista aérea parcial e Ilhéu do Rei. Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 142". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte - Publicações e Artes Gráficas, SARL).




Guiné > Bissau > s/d > Vista aérea de Bissau. Ao centro, o Palácio do Governo e a a Praça do Império. Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 118". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte - Publicações e Artes Gráficas, SARL).


Guiné > Bissau > s/d > Sem legenda: A antiga Av 31 de Janeiro, hoje, Av Amílcar Cabral > Ao fundo, o Palácio do Governador, e a Praça do Império; do lado direito, a Catedral de Bissau (Edição Comer, Trav do Alecrim, 1 -Telef. 329775, Lisboa).

Colecção de postais ilustrados: Agostinho Gaspar / Digitalizações: Luís Graça & Camaradas da Guiné

Imagens: © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010). Todos os direitos reservados.


3. Bissau, uma cidade da I República

É o Estado Novo [, e nomeadamente  com Sarmento Rodrigues como governador, 1945-1949] que vai ter, para a cidade, uma intervenção pensada e estruturada. Até então o “making of” do espaço urbano resultara de um “processos de adição” (p. 10):

(i) a construção da fortaleza de São José da Amura, na margem direita do estuário do Geba;

(ii) a Bissau Velha, que nasce fora de muros, e que é o primeiro assentamento urbano;

(iii)  o esforço para estabilizar a presença portuguesa na então ilha de Bissau, na sequência da “guerra de pacificação”,  levada a cabo sob o comando de Teixeira Pinto (1913-1915);

 (iv) a chegada, em 1919, do engenheiro de minas José Guedes Quinhones, da Repartição de Fomento, Direção de Agrimensura,  e com ele o propósito republicano de “embelezar a cidade”.

Cito a autora:

“O plano de 1919 (…) não só dá início ao processo de minumentalização  do espaço urbano,cmo corresponde à expansão para lá do primitivo perímetro. Cruza a baixa densidade da Garden City [Cidade Jardim, movimento de planeamento urbano iniciado em 1898] com as ideias culturalistas do City Beautiful movement [Movimento  da Cidade Bonita, dos anos 1890-1900], propondo uma praça radial, implantada na cota mais elevada, ligando-se, através de um boulevard, à zona baixa e portuária [imagem da Av 3 de Agosto].”

Recorda a Ana Vaz Milheiro que a atual Av Àmílcar Cabral era a Av 31 de Janeiro [, uma data grata aos republicanos, por recordar a  primeira tentativa de derrube da monarquia, a revolta do Porto, em 1891]. “Os limites da cidade são assegurados por uma ‘Avenida de Cintura’, que faz a fronteira com os ‘Subúrbios’, onde a população africana se irá fixar. Identificam-se os lotes das instalações  de energia elétrica e de abastecimento de água, do Pal´«acio do Governo, do Novo Hospital e do Banco Nacional Ultramarino”…

Trata-se, enfim, de um programa mínimo, de equipamentos, acrescidos em 1922 com a escola primária, e  que o Estado Novo  vai reforça depois de 1945. “A estratégia estado-novista passa por diminuir os vestígios deste urbanismo de perfil republicano, apropriando-se dos seus símbolos” (p,. 10), conclui a autora. (**)

(Continua)

_______________

Notas do editor

(*) Sobre a cdiade de Bissau, temos inúmeros postes, vd. por ex.:

10 de novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1264: Postais Ilustrados (10): Bissau, melhor do que diz o fotógrafo (Beja Santos / Mário Dias)


sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Guiné 63/74 - P11898: Álbum fotográfico de Carlos Fraga (ex-alf mil, 3ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1973) (11): Imagens de postais ilustrados (Parte II)


Postal nº 11A


Postal nº 11B

Postal nº 12A


Postal nº 12B


Postal nº 12A


Postal nº 13B


Postal nº 14B

Fotos: © Carlos Fraga (2013). Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]

1. Continuação da publicação do álbum de Carlos Fraga, que foi alf mil, na 3ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, na segunda metade do ano de 1973, indo depois comandar, como capitão, uma companhia em Moçambique, a seguir ao 25 de abril de 1974).

Enquanto fez o seu estágio operacional no CTIG, o alf mil Carlos Fraga tirou fotos (e nomeadamente "slides") mas também comprou fotos, incluindo imagens de postais ilustrados. (*)

Publicam-se a seguir mais 7 fotos da sua coleção de postais ilustrados. Não trazem legendas. Pedimos a colaboração dos nossos leitores para  legendar as imagens.  Na nossa Tabanca Grande há seguramente amigos e camaradas que são capazes de identificar os grupos da população da Guiné do nosso tempo, aqui representados. É um desafio mas também um passatempo... de verão.

Como já aqui o dissemos,  havia da nossa parte pouca informação e conhecimento sobre a composição étnico-linguística da Guiné, da história e da cultura dos seus povos, das suas semelhanças e diferenças, etc.  A "instrução" que o exército nos deu, à pressa, era baseada no estereótipo etnocêntrico dos europeus...  A mim,  por exemplo, calhou-me uma companhia independente (a futura CCAÇ 12), composta por uma centena de militares do recrutamnente local, fulas e futa-fulas, que não falavam correntemente o português... Fomo-nos conhecendo mutuamente ao longo de 22 meses (incluindo o tempo da instrução de especialidade e de IAO, passado em Contuboel)...

Em 1950, os principais grupos étnicos (ou "tribos", como se dizia na época...) eram os seguintes: 

balantas (160 mil), 
fulas (108 mil), 
manjacos (72 mil), 
mandingas (64 mil), 
papéis (36 mil), 
brâmes (16 mil), 
beafadas (11 mil), 
bijagós (10 mil), 
felupes (8 mil), 
baiotes (4 mil) 
e nalus (3 mil) 

Os números são arredondados por excesso ou por defeito... Balantas, fulas, manjacos e mandingas representavam, só,  por sí, 60% do total. A população da Guiné era então de cerca de 510 mil, constituída em 98% por negros.  Os mestiços eram pouco mais de 4500 e os brancos não chegavam aos 2300...

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11786: Álbum fotográfico de Carlos Fraga (ex-alf mil, 3ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1973) (10): Imagens de postais ilustrados (Parte I)


Foto nº 1 [, Um guerreiro... felupe ?]


Foto nº 2  [Uma mulher... papel ou manjaca ?]


Foto nº 3 [. Uma máscara, de etnia não identificada...Nalu, diz o nosso camarada António J. Pereira da Costa, que é colecionador de arte guineense]


Foto nº 4 [, Uma máscara bandá nalú,  diz o nosso Tó Zé; comfirmei num livro do etnógrafo Fernando Rogado Quintino (*)]


Foto nº 5 [Um bela mulher guineense..., possivelmente mandinga, pelos adornos]


Foto nº 6 [, Um  jovem mãe, com filho às costas... Fula ?]


Foto nº 7 [, Máscara de vaca bruta,  bijagó, segundo Fernando Rogado Quintino ]


Foto nº 8  [Imagem de postal ilustrado, muito provavelmente, da coleção de postais ilustrados, edição Foto Serra, Bissau. Campune tatuada, bijagó].


1. Continuação da publicação do álbum de Carlos Fraga, que foi alf mil, na 3ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, na segunda metade do ano de 1973, indo depois comandar, como capitão, uma companhia em Moçambique, a seguir ao 25 de abril de 1974).(**)

Enquanto fez o seu estágio operacional no CTIG,  o alf mil Carlos Fraga  tirou fotos (e nomeadamente "slides") mas também comprou fotos, incluindo imagens de postais ilustrados.

Publicam-se a seguir 8 fotos da sua coleção de postais ilustrados. Não trazem legendas. Pedimos a colaboração dos nossos leitores para completar ou corrigir as legendas da autoria do editor.

Poucos de nós tinha um conhecimento mininamente sério e aprofundado da composição étnico-linguística da  Guiné e dos seus povos. QA"instrução" que o exército nos deu, era baseada no estereótipo etnocêntrico dos europeus...

Em 1950, os principais grupos étnicos (ou "tribos", como se dizia na época...) eram os seguintes: balantas (160 mil), fulas (108 mil), manjacos (72 mil),  mandingas (64 mil), papéis (36 mil), brâmes (16 mil), beafadas (11 mil), bijagós (10 mil), felupes (8 mil), baiotes (4 mil) e nalus (3 mil) (os números são arredondados por excesso ou por defeito)... Balantas, fulas, manjacos e mandingas representavam, só por sí, 60% do total. A população da Guiné era então de cerca de 510 mil, constituída em 98% por negros. Os mestiços eram pouco mais de 4500 e os brancos não chegavam aos 2300...

Pessoalmente, eu só lidei,  na zona leste (Contuboel e Bambadinca, 1969/71), com fulas, balantas e mandingas (LG)

  ______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 24 de dezenbro de 2012 > Guiné 63/74 - P10857: Notas de leitura (442): Três estudos sobre a Guiné Portuguesa: A população de Cacine, a cestaria e o totemismo (Mário Beja Santos)

(...) António Carreira e Rogado Quintino foram dois estudiosos incontornáveis da historiografia, etnografia e antropologia da Guiné Portuguesa. Deixaram uma enorme bibliografia, basta que o leitor navegue no Google, encontrará estudos surpreendentes, alguns deles há mesmo a possibilidade de serem descarregados. 

Encontrei três pequenos estudos cuja utilidade pretendo partilhar com os confrades. O primeiro intitula-se “Guiné – A população do posto de Cacine no decénio 1950-1960”, por António Carreira. Ele vai seguramente ao encontro da curiosidade de quem, por qualquer razão, viveu ou combateu nos regulados de Gadamael, Quitafine ou Cacine. 

Carreira lembra-nos que este território entrou na posse de Portugal depois de 1886, houve retificação de fronteiras até 1929. Deplora a troca do Casamansa pela região de Cacine, dizendo que o primeiro servia de via de escoamento enquanto os cursos de água de Cacine, sinuosos e pouco profundos, não permitem a afluência do comércio do interior. Para que o leitor entenda como o território até ao início da luta armada tinha predominantemente Balantas, Nalus e Fulas, é importante compreender que a prolongada guerra de 1863-1888, travada entre Fulas e Beafadas e Mandingas, fez aproximar da região de Cacine grupos étnicos que até então viviam em outras áreas. Deu-se uma migração de Fulas que passaram a influenciar os Nalus. 

De acordo com o estudo do recenseamento, encontravam-se presentes quase todas as etnias, com raras exceções importantes, como os Bijagós. Depois o autor debruça-se sobre a estrutura familiar dos Nalus, eram profundamente animistas e, tal como os Bagas e os Landumás foram sujeitos à islamização. Possuíram, até à islamização, uma arte excecional, marcada por máscaras e tambores. De acordo com o trabalho de Carreira, dos anos 50 para os anos 60 do século passado deu-se uma evolução demográfica impressionante, ultrapassou os 50 %, os animistas foram predominantes neste crescimento (Balantas, Nalus, Beafadas e Sossos).

Quanto aos dados demográficos, no regulado de Cacine, a povoação de Cacine tinha uma população inferior a 500 habitantes, seguia-se Cassacá, depois Cacoca, Cabaz e Cabochanquezinho no regulado de Gadamael, havia mais população em Sanconhá (Sangonhá), Ganturé, Bricama, Jabicunda. Quanto ao regulado de Quitafine, o maior núcleo populacional era Cassebeche, seguindo-se Canefaque e Calaque. 

O autor discreteia ainda sobre a estrutura familiar, as ocupações por etnias e deplora que o recenseamento não contemple o grau de instrução das populações autóctones e apela a que se venha a conhecer em novos censos dados relevantes sobre as confrarias islâmicas. Este estudo apareceu publicado na revista do Centro de Estudos Demográficos, em 1972. (...)


Vd. também postes de;:




terça-feira, 30 de abril de 2013

Guiné 63/74 - P11507: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (11): Teresa, amores e desamores em tempo de guerra (Parte II) (Virgínio Briote, ex-alf mil, comando, Brá, 1965/67)

Continuação da (re)publicação do texto Teresa,  amores e desamores, da autoria do nosso coeditor, jubilado,  Virgínio Briote,  ex-alf mil em Cuntima, CCAV 489, e comando em Brá, do 2º curso de Comandos do CTIG, tendo sido comandante do Grupo Diabólicos  (1965/67) (*)


(Continuação)

4. QUE ESTOU AQUI A FAZER?

“Temos que ser nós a pô-los daqui para fora, esta terra é nossa, não nos faltam apoios, é todo o mundo a dar-nos razão! Desde meados deste século, os colonialistas têm sido corridos de todo o lado, ficaram os portugueses e porquê, camaradas? Porque de todos os impérios, o deles é o mais atrasado, não só economicamente como também em termos culturais. Uma taxa de alfabetização baixíssima, um país inculto, atrasado, governado por um grupo de lacaios em nome dos interesses de meia dúzia de famílias. Por isso dizemos e insistimos, somos aliados do povo português na mesma luta contra o colonialismo e contra o fascismo. Mas esta situação, camaradas não duvidem, está a mudar e ainda vai ser no nosso tempo e vamos ser nós que vamos acabar com o colonialismo na nossa terra. Temos amigos em todo o mundo, URSS, Suécia, China, Noruega, Cuba, toda a África, toda a Ásia, todo o mundo, amigos que nos ajudam com armas, comida, medicamentos, técnicos. Mas temos que ser nós, camaradas, nós é que temos que fazer o trabalho aqui na Guiné e em Cabo Verde, pô-los daqui para fora!”

O partido precisa de todos nós, caboverdianos e guineenses, não posso deixar de contribuir com a minha parte, Benilde, há muito que conheces o meu modo de pensar, esta terra é pobre mas é nossa.

Não sei não, Vasco. Estamos tão bem agora, a nossa vida não teve um começo fácil, demos uma volta
tão grande na nossa vida, abandonámos a nossa terra, os nossos pais, e agora que a Teresa está tão bem nos estudos, todos os anos no quadro de honra, não sei que te diga, Vasco, temos levado uma vida tão sossegada, damo-nos bem com toda a gente, a nossa vida vai mudar tanto. Tenho medo, muito medo, Vasco!

Mas o partido necessita de todos, não viste o Aristides, com uma posição tão boa aqui, também abandonou tudo para ir com os camaradas. E tantos outros. Até agora tenho sido só simpatizante, uma vez ou outra colaboro quando me pedem, mas agora é a minha vez de participar mais activamente, não compreendes, Benilde?

Aqueles tempos calmos, com tempo para tudo, o sossego das tardes de Bissau estavam cada vez mais longe. Depois dos incidentes do Pidjiguiti (3), a vida nunca mais foi a mesma. Pide e mais pide, tropa todos os dias a chegar, incidentes em todo o lado, prisões durante a noite, a vida cada vez mais difícil. Benilde pensava muitas vezes em como era boa a vida na Praia, difícil a subsistência, mas o ambiente era outro, como era bom se o Vasco conseguisse ser colocado em Cabo Verde, na Praia ou no Mindelo. Chegou até a falar-lhe, mas ele não recebeu bem a ideia. Casaste comigo, as nossas vidas estão juntas para o melhor e para o pior.

Não te esqueças da Tesa, Vasco, lembra-te da nossa menina!

Benilde, a menina continua a estudar, se algo correr mal, voltas com ela para a Praia, para junto dos teus pais.

Teresa estava com 19 anos, vivia intensamente com a ansiedade própria da idade o que ouvia contar em casa e entre os amigos, as gloriosas lutas que se travavam nas matas contra a tropa colonialista, as tentativas de alfabetização das populações, nas escolas dispersas pelo mato, os progressos pela emancipação, o caminho irreversível para independência.

O relacionamento dela com aquele militar era motivo de reprovação dos amigos e do próprio pai. Coisas separadas, pai, não têm nada que ver, já não sou menina!

A mãe Benilde contou ao papá da tua visita, sabes? A princípio, ficou muito calado, continuou a comer, mas não ficou de muito boa cara, não. No fim de jantar, então falou, que ainda sou muito nova, que tenho muito tempo à frente. É mesmo a sério, virado para mim, que tudo indica que sim, não é? Quer conhecer-te, falar contigo quando te apetecer, claro, jantarmos todos, quando pode ser? Um dia quando, não pode ser amanhã?

A Teresa a querer saber novidades, a mandar recados pelo Alegre, chegara até a ir a casa do Sany. Paludismo forte, mas só, mais nada. Entrar em Brá não podia, não a deixaram, deixou recado, 2 abacaxis pequenos, um cartão, dois corações, uma seta neles, pingas da cor do sangue de saudades, um beijo imenso, maior que o embrulho, nem parecia dela.

Encontraram-se depois das febres. O jantar fica então para amanhã, 6ª feira, posso dizer à mamã? Mas espera, Teresa, jantar? Então, não ficou combinado, apresentar-te ao meu pai? Apresentar-me ao teu pai? Gil, as febres deitaram-te abaixo, precisas de te alimentar bem, recuperas num rápido! Mas, Teresa, apresentar-me ao teu pai, para quê?

Teresa no varandim, com aqueles olhos. A mãe como se fosse para a festa, música de morna, o salão grande, sente-se Gil, esteja à vontade, a Tesa faz-lhe companhia, vou ver as coisas, dá-lhe um sumo de ananás com pouco gelo, quer?

Sentia-se fraco, não lhe estava a apetecer nada estar ali, era bem melhor não ter vindo. Os dois sentados, ele a passar a vista pelo salão, a mesa ao canto, fotos antigas de outras terras, rostos desconhecidos, pau preto, a cadeira de palhinha, a luz suave filtrada pelos cortinados, o que estou eu aqui a fazer e os pais a entrar.

Ora viva, então, como, ah, senhor Gil, Gil quê, Gil Duarte, muito prazer, então? Sorriso sem palavras, cumprimentos, quer beber alguma coisa fresca, ah já está servido, então? Então nada, desta vez apeteceu-lhe mesmo responder.

Calor, hem, esta humidade não deixa a gente respirar, então? Então, como? Que vocês lá na metrópole tem um clima bem mais ameno, mais temperado, mas muito frio no Inverno. Acho que vocês nunca prepararam as vossas casas para o frio, se calhar porque estão lá só de passagem, não é, no regresso de todos os Brasis por onde andam, só param em Lisboa para descarregar o ouro, a prata, as madeiras, o sisal, café, cacau, tudo às toneladas, não é, gargalhada trocista. Assim! O pai da Teresa além de trabalhar nos escritórios da maior empresa colonialista, era também um humorista!

Talvez, nunca pensei nesse assunto, ainda não tive tempo. Na sua idade também não, pensava noutras coisas, não é, a Mabilde e um ajudante de travessas na mão, cadeiras a afastarem-se, então é melhor sentarmo-nos.

Galinha à cafreal, saladas, fruta por todo o lado, ananás, bananas, e para beber, cerveja, Casal Garcia, tinto do Dão, o que lhe apetece?

Então? De onde é o senhor Gil Duarte, o que faz na vida civil, os seus estudos, como vai a metrópole, o que dizem de lá, como vêem esta guerra, o Salazar está para durar? Não vai durar a vida toda não é, vem outro a seguir, já deve estar escolhido, claro, quem lhe parece que seja?

Que não estava a par, não fazia ideia. Mas esse assunto não é do seu interesse? Quando lá estive no mês passado, a estudantada andava toda alvoroçada, a guarda a cavalo em Coimbra, na rua da Sofia as lojas todas trancadas. Isto está um problema, senhor Duarte, não pode continuar assim, na vossa metrópole e aqui, a tendência é para agravar, a URSS, a China do Mao (4) , a própria América veja lá, a Suécia, a Noruega, o mundo todo, menos a Espanha do Franco, o vosso governo de portas fechadas em quase todos os países, agora até o Brasil, sabia? Servem-se da vossa juventude, quando regressam deixaram o melhor das vossas vidas, muitos deixam bocados deles aqui, outros nem regressam, não é?

O cafreal da galinha não passava, atravessado na garganta, não havia maneira de ir para baixo, sumo na mão, a da Teresa, a acalmá-lo, a brincar-lhe no joelho por baixo da mesa.

Que estava a par da agitação estudantil, que deveriam ter alguns motivos, mais outros da idade, adiante se veria.

E então, senhor Duarte, a Tesa o que é para si? A Tesa é muito boa menina, já reparou? Um bocado senhora do seu nariz, às vezes teimosa demais, muito boa estudante, até agora…

Como é que a conheceu? O senhor gosta mesmo dela?

5. MAIS DO QUE ESTAVA À ESPERA

Um interrogatório, perguntas atrás de perguntas. Depois, ofegante, braços cruzados, calada, a exigir respostas. O que é feito de ti, porque não tens aparecido, estás cansado de mim, já não tenho novidades para ti, vocês são todos iguais, espera, onde vais, toma nota do que te vou dizer, mas porque viras os olhos, já não me queres ver?

Olhos, uns olhos grandes, agora cinzentos de zangada, brilhantes, húmidos, ele quase esquecido de respirar, momentos de silêncio, tréguas.

Arrependimento a seguir. Coisas que mal a gente diz se arrepende logo, sabes bem como sou, tu também és assim, às vezes dizes coisas que não gostarias de dizer, não é? Mas diz-me, o que vês em mim, Gil?

Um feitio complicado numa figura agradável, Teresa. E o que conheces de mim que eu nem imagino? Não é possível continuarmos assim, Teresa, com esses modos não…

A força das mãos nos braços dele, os olhos molhados, a exigir-lhe silêncio agora, não digas nada de que te arrependas a seguir, pára um minuto só, pára! Pessoas a chegarem, a olharem para eles, os dois a olharem para o lado, como se não fosse nada com eles, os dedos dela a tapar-lhe a boca, a situação a alterar-se. Não posso, Teresa, já não tenho mais disposição para estar aqui contigo, boa noite!

Não se conseguia ver livre dela, só se desse escândalo, mãos dela no pescoço dele, não me deixes agora, sou tão tua amiga, deixa-me estar assim, só este bocadinho, as coisas que se dizem nestas alturas.

Como me podes fazer uma coisa destas, Gil, ele vencido, outra vez a história a andar para trás, tudo a correr tão bem para o fim, afinal nem tinha sido ele a desencadear as hostilidades e agora outra vez, tentativas para se descolar com meiguice, pior ainda, ela a arrastá-lo para o jardim, a empurrá-lo para a rede, em cima dele, vencido.

Isto está a ir longe demais, tens que parar já, é tempo para começares a pensar nos passos que vais dar para te saíres bem, magoá-la o menos possível, nada de choros, o que vai ser difícil, falar-lhe com calma, nem pensar em meiguices, alegar outros compromissos, cada um para o seu lado.

Passou pelo Bento, arranjou transporte para Brá, copo de água no bar da messe, desceu para o quarto, um bom banho e meteu-se na cama com os documentos que lhe deram na 2ª repartição.

“Cassaprica é o maior acampamento IN existente na área deste posto administrativo. Há um caminho bastante perigoso, porém muito importante, uma vez iludida a vigilância dos sentinelas, pois corta a retirada do IN para a república da Guiné-Conackry em caso de operação em Camissorã. Ainda o mesmo disse que em Bagadai perto de Cane Faque, estão a construir uma jangada de paus para transportar a Cane Faque e daí para Caule uma arma bastante pesada. Também informou que mais de metade dos elementos da guerrilha passou para Caule onde existe um acampamento e um pequeno estabelecimento. Que no entroncamento da estrada velha de Cacafal com a estrada de Cambeque, do lado esquerdo de quem vai para Cabo Nepo, junto a uma árvore grande, existe um abrigo onde o IN aguarda oportunidade de montar emboscada à tropa”.

Três folhas com os depoimentos de guerrilheiros apanhados. Tinham dito tudo o que sabiam e, nada de admirações, também coisas que só se lembraram quando lhe apertaram as unhas, a polícia dizia e assinava por baixo, localização dos acampamentos, disposição, nº de guerrilheiros em cada, armas, os nomes dos comissários políticos em alguns casos. Dentro de uma pasta, uma etiqueta na capa a classificá-los. Estivera a lê-los, o sono a chegar, enfiara-os na pasta e fechou o mosquiteiro.

No outro dia, no QG, quis dar andamento às informações que lhe tinham fornecido. Os documentos vistos outra vez um por um, notas ao lado, localização de guias, onde falar com eles, transportes, esboçar os planos de operações. Da 3ª rep ficaram de lhe dizer as melhores datas, meios, as horas das marés, as coisas do costume.

No VW preto de aluguer que lhe tinham entregue logo pela manhã em Brá, meteu a pequena pasta dentro do porta-documentos. Começou a descer para Bissau, um fim de tarde agradável, sentia-se bem sem saber porquê, nada que fazer agora, e se passasse pela casa da Teresa, para arrumar o assunto, era capaz de ser boa ideia, não?


Guiné > Bissau > s/d > "Av Carvalho Viegas"... Bilhete postal, nº 129, Edição "Foto Serra" (Colecção "Guiné Portuguesa")

Colecção de postais ilustrados: Agostinho Gaspar / Digitalizações: Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010).

A rua sem movimento àquela hora, viram-se logo, ela deitada na espreguiçadeira com os cadernos espalhados pela relva.

Era ele, nem parecia naquele carro, onde o arranjaste, apetece-me sair, levas-me a dar uma volta? É só um instante, arranjo-me depressa, não vou mudar de roupa, só pentear-me, um minuto, ele dentro do carro, à espera.

O pai dela a subir a rua, olhos a cruzarem-se, teve que sair do carro, senhor Duarte, então? Muito trabalho, senhor Vasco? O costume, vocês dão-nos muito que fazer, que bom não é senhor Vasco, é…é… de facto. Então o que diz àquela história da orelha, senhor Duarte? Que orelha? Então, olhos fixos nele, o caso do hotel Portugal! Não sabe? Toda a cidade sabe, um horror!

Um grupo de fuzos (5) ao passar na esplanada do hotel, um deles destacou-se, directo a uma mesa cheia de pessoas de cor, puxou pela orelha de um, facalhão na mão, zás, cortou-a, a correr pela rua abaixo, a rir-se, o ferido cheio de sangue atrás, dá-ma, dá a minha orelha! Não é para rir, senhor Duarte! Um horror! É verdade! Não acredita? Testemunhas é o que não falta!

Não sabias ainda? Sempre metido em Brá, como podes saber, a Teresa parecia que tinha acabado de tomar banho, toda fresca a chegar, a dar um beijo no papá. Isto está cada vez pior, senhor Duarte, cada vez pior! Para onde vão? Tenham cuidado, isto está a ficar de cortar à faca!

Como da primeira vez em que saíram sós, pouco movimento a esta hora, o carro devagar, mal se ouvia o motor, pelas ruas a descer para o porto, o quartel dos fuzileiros, a caminho da Sacor. Encostaram o carro, o Geba orgulhoso lá em baixo, a Teresa a chegar-se, ele a abrir a porta, a pé pela estrada uns metros até lá à frente, a olhar para o rio, deu a volta por dar, olhou para o carro, a Teresa com uns papeis na mão, quê?

Deu-lhes a pressa aos dois, ele a voar sem correr, ela atrapalhada a meter tudo de qualquer maneira no porta-documentos. A cara dela, ah, que cabeça, já me esquecia, tenho uma lembrança para ti, lembra-me depois quando chegarmos a casa, a propósito, quando voltamos a jantar todos juntos? Mal respirava, palavras atrás de palavras.

Mas para onde vamos? Porquê, Gil? Ainda agora chegámos, que pressa é essa, que te deu, não falas? Não estou a perceber nada, Gil, andas tão estranho ultimamente, o que se passa contigo?



Guiné > Bissau > s/d > "Aspecto parcial e Câmara Municipal"... Bilhete postal, nº 133, Edição "Foto Serra" (Colecção Guiné Portuguesa")

Colecção de postais ilustrados: Agostinho Gaspar / Digitalizações: Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010).


6. PONTO FINAL?

Estás mesmo tramado, todo enrodilhado, e agora, como é que te vais livrar deste sarilho? Não tem outro nome, sarilho só, com letras grandes. Se tivesses procedido com ela como tens feito com outros conhecimentos, não estavas agora aqui a matutar, a cabeça ainda por cima a doer-te. Tens pouca corda na mão, é o que é, deste-lhe demais e a ti também. Problema chamado Teresa, não? Como te vais sair dele, quando te resolves?

A Teresa fora um simples conhecimento, no início só para passar o tempo. Engraçou com dela, os olhos primeiro que tudo, atraíram-no, meteram-lhe medo e como os meninos curiosos quis espreitar, ela mostrou-lhe outras coisas que tinha com ela. Uma mulher diferente das que tinha conhecido aqui, estas sim só para passar as mãos pelas redondezas todas e depois parágrafo.

Nem conseguiu viver debaixo do mesmo tecto com a Matilde! Adiantou-lhe um mês de renda para a ter numa casa, equipada com tudo, apenas para os intervalos das guerras, tomar uma chuveirada com ela, levá-la ainda molhada nos braços para o quarto, um banho outra vez, vou dar uma volta, hoje não posso ficar, tardes e noites seguidas, sempre assim.

Nem conseguiu dormir com ela uma noite inteira que fosse, no início ainda disse que tinha compromissos no quartel, um serviço qualquer para fazer, ela a desconfiar que fosse outro motivo, mas não. Estou habituado à minha almofada, trá-la então, à minha cama, trá-la também, traz tudo contigo, mas não me deixes só que não posso. E deixou-a sempre. Teve pena muitas vezes de a deixar, custava-lhe suportar os olhos dela. Chatices que arranjou e arrumou sempre, melhor ou pior. Porquê?

Matilde, é simples, gosto de ti, o teu rosto, o cabelo negro que te fica tão bem assim, o teu peito pequeno e tão bem feito, a tua barriga lisa, as tuas coxas redondas, as pernas como acho que nunca vi. A tua figura toda, mas acho que tu e eu queremos outras coisas que os dois não temos. Só isso, mais nada, Matilde! De modo que é melhor seguirmos cada um o seu destino, amigos para sempre, quando te apetecer outra coisa comigo, se verá, estás de acordo?

Sacana, porquê? Matilde, não posso ficar mais tempo, tenho que me ir embora! Fica aqui um mês de renda para te arranjares.

Não queres, deita-o pela janela fora, faz o que quiseres dele, não me interessa, esse dinheiro é teu, um beijo, Matilde, não dás? Os outros casos foram entretimento para dois, sem dinheiros nem nada!

A Teresa já não é só Teresa como se apresentou da primeira vez, agora tem um nome mais comprido, Teresa Problema, proporções com que nunca sonhaste.

Os olhos, o sorriso, a figura, o andar dela, só isso? Ou terão a ver mais com outras coisas de que não estavas à espera e muito menos aqui? O gosto pela leitura, de assuntos em que nem tu próprio estavas sensibilizado, nem ainda estás, a solidariedade, o interesse pela sociedade guineense. A cultura geral, invulgar para a idade dela.

E a disposição para te afrontar, para lutar contra ti, contigo, puxar por ti, lutar pelos ideais dela, do povo dela! Para te dizer na cara, com aqueles olhos magníficos, aquilo que ela achava no seu direito de dizer. Os teus olhos a fugirem, os ouvidos que não queriam ouvir, tu a disfarçares, com a mão nela, como quem diz, vamos mas é ao que interessa! Um merdas, um Rasas, nem sempre com cheiro a uísque azedo, mas um Rasas na mesma! A aproveitares-te da sensibilidade dela, a fazeres-te caro, de um momento para o outro, a invadi-la com as tuas mãos, ela a acreditar em ti! Miserável, Rasas de merda!

Nem tanto assim! Mas que chatice! O que fizeste com ela este tempo todo, o que fizeram os dois juntos, afinal? Nada do outro mundo, brincadeiras, uma vez ou outra mais ousadas, mas nada mais do que isso, sempre travaste as tuas incursões e as dela também, e bem te custou às vezes, ninguém imagina! De resto, das tuas mãos está inteira, ou quase, não te lembras de lhe deixar marcas irreparáveis, fisicamente falando, claro.

Então porquê esta atrapalhação toda, porque não vais falar com ela, directa nos olhos, assim, Teresa, temos que alterar a relação que temos vindo a manter, não temos razões suficientes para prolongá-la, devemos dar por terminado o nosso conhecimento, não, não te amo nem um pouco, apenas comecei contigo porque te achei graça, tu também, pelos vistos, este tempo passado diz-me que é melhor não continuarmos, e pronto! Já agora, Gil, continua Rasas até ao fim!

Os olhos dela não acreditavam, continuavam insistentes a furá-lo todo, para onde fores vou atrás, senão sei lá o que faço! Inscrevo-me nas forças combatentes do partido, hei-de encontrar-te, nem que seja de arma na mão! Quero ver como te defendes! O que se diz nestas ocasiões, as mãos amarradas aos braços dele, depois largou-os de uma vez, um metro para trás a tomar balanço.

Como quiseres, tu é que sabes, não tenho que me impor a ninguém, não preciso! Tenho amigos, não me vou perder a chorar por aí! Fui ingénua pela primeira vez, vou ser outra e outra vez ingénua, infelizmente para mim.

Enganei-me, pensei que os teus sentimentos eram verdadeiros, que podíamos fazer vida juntos, afinal…mas não tenhas remorsos, a culpa foi também minha. No fundo, pensando bem, é melhor assim.

Já te vais embora? Espera aí, ouve! Há tempos, quando estava a ler um livro, algo me fez pensar em ti, de uma forma diferente do costume. Pensei que fosse impressão minha, mas não, agora já sei porque me lembrei de ti naquele momento.

Afinal, és exactamente o que pareces, dentro de ti não há calor nenhum. Como o gelo, quando se quebra é só água fria por baixo. Só tens água fria por baixo, Gil. Queres ir-te embora, não queres? Vai então, vai!


7. NOTÍCIAS OUTRA VEZ

“Não estranhes esta carta, não te vou pedir nada! Estive a fazer exercícios de Trigonometria até ficar cansada, já estive na cama mas não consegui adormecer.

Há dias que ando a tentar escrever-te, a certa altura paro para reler e rasgo. Tem sido assim, folha atrás de folha, acho-as sem jeito. Nem sei se deveria escrever-te. Estou a fazê-lo para mim, como se estivesse a falar comigo. De resto o que temos para dizer que já não saibamos, não é? E, fico-me a pensar, será também que a gente quer mesmo saber um do outro?

Tenho sabido notícias tuas, de alguém que te vê todos os dias, até já te viu a tomar banho à noite na piscina do QG. Só mesmo tu! Por acaso, falou nos colegas dele e tu és um deles. Como isto é tão pequeno! E uma noite destas quando saía da explicação, quase que me encontravas, mais um minuto e ficávamos frente a frente. Também foi melhor assim, não é? Olha, acho que desta vez vou mesmo conseguir escrever-te. Mas não quero que te sintas obrigado a responder, fá-lo só se tiveres vontade, sem obrigação. Mas quero dizer-te Gil, que gostava muito das nossas conversas, às vezes lembro-me e fico não sei como…

A mamã Benilde está melhor agora, mas o papá acha que é melhor ela ir a Lisboa fazer exames, ela não quer, mas o papá insiste, até já escreveu para as tias em Benfica, elas dizem que tratam de tudo, para a gente ir, a mamã não quer, que não pode deixar a casa, diz que não deve ser nada, a humidade é muita, o tempo também não ajuda, não é? Diz que só vai se eu for com ela, eu só posso nas férias e este ano é muito complicado para mim.

Estou a ter explicações de álgebra e trigonometria, numa sala em frente ao Pintosinho, é uma turma pequena, só raparigas, somos 4. O professor é um militar que chegou, parece que há dois meses, um jovem com muito bom aspecto, muito inteligente, elas andam perdidas por ele, tu nem imaginas, ficam a passear na rua, para trás e para a frente, à espera que ele saia, ele não lhes liga nenhuma, nem as vê, boa noite, até depois de amanhã. Eu por acaso, não simpatizo muito com ele, isto é, acho-o giro, mas ele só fala em senos, co-senos e tangentes, sabes como são os matemáticos, além disso, não te rias, não gosto muito da colónia ou aftershave ou lá o que é que (desculpa isto ir tudo riscado, ia escrever o nome dele mas ele não quer que se saiba) ele usa. É às 2ªs, 4ªs e 6ªs, das 9 às 11 da noite, às vezes um pouco mais tarde, depende. Estou a gostar muito das aulas, acho que ele explica muito bem, tem muita lógica a ensinar, também quem é que vai para Matemática, não é, só quem tem feitio para os números, para a trigonometria, só de ver os exercícios do Palma Fernandes, é de desanimar! Mas estou a gostar muito e acho que vou conseguir fazer a cadeira logo à primeira.

E tu, tens trabalhado muito no bar da cantina? É lá que estás agora, não é? Tem-te corrido bem a vida? Quando vais embora? A semana passada encontrei a Dora na Ultramarina. Disse que deixaste de lá ir, eu também já não vou lá há muito tempo.
E pronto, desta vez foi mesmo a sério, amanhã vou ver se te mando esta carta. É tardíssimo, sabes que horas são, quase duas e não tenho sono nenhum! Um beijo da tua amiga e, podes acreditar, para sempre tua amiga,

Teresa Correia
Rua dos Rouxinóis, Vivenda Correia, nº 14, Bissau.

P.S. Gil, quero pedir-te desculpa da minha reacção, a conversa apanhou-me desprevenida, eu já desconfiava mas mesmo assim não contava que fosses tão bruto, desculpa se magoei a tua cara, mas também me magoaste muito, na cara não, mas cá dentro. Mesmo assim não te sintas obrigado a responder. Escreve-me só se te apetecer.
Bom, agora é mesmo, tchau!”

8. PONTO FINAL

Encontramo-nos então logo à noite, agora temos que ir a um funeral. Quem morreu? Uma aluna do Ramos, morreu de repente, o funeral é agora às 3, o Manaças contrariado. É pá, se não vens depressa já não vale a pena, o Ramos no jeep!

Chegou-se a um grupo, o Daniel no meio a contar a vida no Xitole. E se fosse até à cidade? E foi, por ali abaixo, o calor a apertar àquela hora, sem trânsito nenhum, uma viatura militar ou outra, o rádio a tocar Capri, c’est fini, o chato do locutor não se cansava de interromper.

Deu a volta à praça do Império, meteu-se a descer a avenida, em direcção ao cais, uma mancha de pessoas lá ao fundo, muitos carros, jeeps e outras viaturas militares à frente dele, a afrouxarem junto à Sé, deve ser o tal enterro.

Pessoas a saírem da igreja, muitos jovens, a Teresa também deve ir ali, as roupas dos padres, a carreta a andar com o caixão em cima, quatro pretos de camisa branca e calça preta ao lado, muitas pessoas atrás, senhoras de véu, rostos mais escuros, deve ser o choro, não quero ver mais, que ideia que tive, vir cá abaixo a esta hora! O cortejo a andar, a virar para a esquerda, para a rua da Teresa, em direcção ao cemitério para os lados da Amura. Não quero ver mais nada.

Meningite, um ataque fulminante, pá! Uma miúda de 20 anos, vê lá tu! Ninguém pode estar descansado, porra! Uma chatice, pá, a mãe desmaiou no cemitério, a comunidade cabo-verdiana toda em peso, até pides lá estavam, pessoal dos correios, muita gente mesmo, o pai é muito conhecido…

“Como foi? Só uma dor. Mamã, não sei o que tenho na cabeça, uma dor muito forte, um saridon que a Benilde costuma tomar para as dores dela, não passava, disse que tinha frio, devia ser paludismo, que é que havia de ser, começou a chorar, não aguentava as dores, quando o pai pegou nela ao colo, que não podia com a cabeça, ele mandou logo a Mabilde chamar o doutor que a conhecia desde menina, ele nem demorou muito.

Quando o médico entrou no quarto e a viu, disse que não devia ser paludismo, que o pescoço estava muito rígido, depois olha, quando deram por ela, estava já desmaiada. Ainda foram a correr para o hospital. Foi assim que o pai contou”. A Dora, a Mabilde e a Cesária inconsoláveis.

A missa foi num final de dia. Os pais da Teresa, a Mabilde, muita gente do Liceu, estudantes e professores, a Dora, a Matilde, a Cesária e alguns amigos cabo-verdianos mais chegados. À saída, cumprimentou os pais, a Mabilde, os amigos. Foi a última vez que os viu.

© Virgínio Briote (2006)
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Notas do autor:

(4) Mao Tse Tung, na altura Presidente da China
(5) Fuzileiros

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Nota de L.G.

Último poste da série > 29 de abril de 2013 >  Guiné 63/74 - P11500: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (10): Teresa, amores e desamores em tempo de guerra (Parte I) (Virgínio Briote, ex-alf mil, comando, Brá, 1965/67)