quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7179: (In)citações (16): Os irmãos Turpin, José e Eliseu, "verdadeiros filhos da Guiné" (Luís Graça)

Há dias ouvi pela rádio RFI, uma entrevista de José Turpin (irmão de Elysée Turpin, co-fundador do PAIGC) que falava de Cabral dizendo:

- Quando ele chegou a Conacri, escondido sob o pseudónimo de Abel Djassi, e onde eu e mais outros camaradas já nos encontrávamos, rapidamente se impôs como líder, não pela força mas pela sua integridade moral e força de convicção. Foi ele que nos unificou sob uma única liderança política e estratégica, antes dele, os "verdadeiros" Guineenses pavoneavam-se por aí, perdendo seu tempo em discursos patrióticos e disputas pueris por mulheres (prostitutas, provavelmente).

Cherno Baldé (*)


Comentário de Luís Graça (foto à esquerda, em Bambadinca, 1969):

Meu caro Cherno, conheci o José (ou Joseph) Turpin em Bissau, no último dia do encerramento do Simpósio Internacional de Guileje (1-7 de Março de 2008) (**).

Fiz, inclusive, um pequeno vídeo com um depoimento dele, com uma mensagem de saudação destinada ao António Lobato, o hoje major piloto aviador reformado que foi prisioneiro do PAIGC durante 7 anos em Conacri... Nunca cheguei a saber se o António, que é minhoto de Melgaço (se não me engano),  teve conhecimento do vídeo, que de resto está disponível em You Tube > Nhabijoes.

Embora tivesse sido breve a nossa conversa, fiquei com uma boa impressão deste homem em cuja casa, a dos pais que eram comerciantes, se acolheu Amílcar Cabral (aliás, Abel Djassi), quando veio, da clandestinidade,  para Conacri, creio que  em 1960. Nessa altura o Joseph (hoje, José) nem sequer falava (ou falava muito mal o) português, segundo depreendi da nossa conversa no Hotel Palace, em Bissau... A sua admiração por Amílcar terá começado aí...

Como aqui, neste blogue, já o disse em tempos,  o José pediu-me para gravar e mandar uma curta mensagem para o António Lobato, o antigo sargento piloto aviador português, cujo caça-bombardeiro T6 fizera uma aterragem de emergência, na Ilha do Como, em 1963.

Feito prisioneiro por camponeses e entregue ao PAIGC, o Lobato foi levado para Conacri, onde permaneceu sete longos anos de cativeiro, até à sua libertação em 22 de Novembro de 1970, no decurso da Op Mar Verde, como todos sabem. (***)

Gostei da autenticidade, da simplicidade e da sinceridade deste homem:

- Ó Lobato, depois da tempestade, depois de tantos anos, não sei se te vais lembrar de mim... - são as primeiras palavras deste histórico do PAIGC, na altura, nos anos 60, a viver em Conacri, sendo então membro do Conselho Superior da Luta. (O irmão, o Elisée ou Eliseu, nascido a 23 de Maio de1930, viveu sempre em Bissau onde foi guarda-livros da Casa Gouveia, entre 1958 e 1964, e depois gerente da ANCAR, até 1973, nunca tendo particiapdo directamente na luta armada).

Nesse curto vídeo, o José Turpin recordava os momentos em que, por diversas vezes, visitara o nosso camarada António Lobato na prisão. Não esconde que foram momentos difíceis, para ambos, mas ao mesmo tempo emocionantes: dois inimigos que, afinal, revelavam o melhor da nossa humanidade...

- Eu compreendia, estavas desmoralizado...Havia animosidade...

José Turpin agradecia, por fim, ao Lobato as palavras de apreço com que ele se referira à sua pessoa, ao evocar há tempos, em entrevista à rádio, a sua dura experiência de cativeiro. Agradecia também o exemplar do livro que o Lobato lhe mandara e que ele leu, com muito interesse. Diz ainda, no vídeo, que ficara sensibilizado com as palavras e o gesto do Lobato.

- Mas tudo isso hoje faz parte da história...Seria bom que viesses a Bissau - são as últimas palavras, deste homem afável, e de grande estatura moral, dirigidas ao seu antigo prisioneiro português que ele trata por camarada.

Como eu gostava, Cherno Baldé, que este homem se juntasse a nós, aqui, na Tabanca Grande. Ele é seguramente um "verdadeiro filho da Guiné", independentemente das circunstâncias do nascimento (julgo que os dois irmãos nasceram na Guiné-Bissau, indepentemente de os pais, comerciantes,  viverem ou terem vivido em Conacri).

Que será feito do José Turpin, hoje ? E do seu irmão, Elisée Turpin (hoje com 80 anos) (**) ? E dessa mulher extraordinária, que é a Carmen Pereira, outra "verdadeira filha da Guiné", em 7 de Março de 2008, que também conheci na altura e que é visita, sempre que vem a Portugal, da casa da Júlia e do Nuno Rubim. (Aliás, as duas mulheres são primas).

Cherno, se souberes notícias do José o Eliseu não o conheço pessoalmente), dá-lhe um grande abraço meu e transmite-lhe o meu convite para ingressar na nossa Tabanca Grande.E, já agora, que estamos em maré de mantenhas, dá também um abraço ao Cadogo Pai, membro da nossa Tabanca Grande.

______________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 26 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7176: (In)citações (20): Os verdadeiros filhos da Guiné (Cherno Baldé / José Belo)

(**) Vd. entrevista dada por Elisée (ou Eliseu) Turpin ao portal Notícias Lusófonas  > 20 de Janeiro de 2003 > Pai de duas nacionalidades foi assassinado há 30 anos , de que se reproduzem, com a devida vénia,  alguns dos excertos mais significativos:

(...) Quando se assinala o 30º aniversário da "partida" do "pai" [, Amílcar Cabral,] das nacionalidades da Guiné-Bissau e Cabo Verde, as certezas da memória "esmagam" as dúvidas sobre a orquestração do assassínio do guerrilheiro. Apenas a especulação aponta possíveis cenários para o que se passou naquele dia [20] de Janeiro [de 1973], mas a memória de Elisé Turpin, um dos "camaradas" de Amílcar, permite seguir, com assinatura, os mais importantes momentos da "gestação" da independência da Guiné-Bissau.
 
Após a longa batalha de 11 anos travada pelos guerrilheiros liderados por Cabral e quase três décadas de independência, foram muitos os heróis que ficaram esquecidos num "canto da história" da Guiné-Bissau, permanecendo Amílcar como o regaço onde todos se recolhem.
 
Foi por "convicção" que, logo após a independência, EliséeTurpin se retirou para o seu "canto da história" e é para "ajudar a, finalmente, cumprir o ideal de Amílcar Cabral" que agora, com 72 anos de idade, regressa através de um passeio pela memória.
 
"Não há futuro possível - para a Guiné-Bissau - sem os ecos do passado a marcar o passo da história", considera Turpin, e é com essa convicção que, na sua casa, a 50 metros da sede do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde), situada na Praça dos Heróis da Liberdade da Pátria (ex-Praça do Império), em Bissau, activa a memória.
 
Elisée Turpin conta, enquanto fundador do PAIGC ao lado de "mais cinco camaradas: Amílcar e Luís Cabral, Aristides Pereira, Fernando Fortes e Júlio Almeida", o que foram os primeiros passos desta organização política que viria a ser o pilar central da "libertação da Guiné-Bissau".  Mas há ainda outro "pormenor" que enfatiza o papel de Turpin na criação do PAIGC: "Sim, posso ser considerado como o único indivíduo que esteve na fundação do partido e que era genuinamente cidadão guineense. Os outros eram todos filhos de pais cabo-verdianos".

O surgimento do PAI (Partido Africano para a Independência), depois transformado em PAIGC na Guiné-Conacri, acontece "por vontade e iniciativa de Amílcar Cabral", então jovem engenheiro agrónomo regressado dos estudos em Portugal, em 19 de Setembro de 1956.  Antes do surgimento do PAI, havia na então Guiné portuguesa muitas outras organizações ou movimentos de tendência nacionalista que aspiravam à libertação do país.  Tudo no seguimento dos ventos da libertação que sopravam nas outras províncias coloniais, sobretudo as províncias vizinhas do território da Guiné-Bissau: Senegal, Gana e Guiné-Conacri.

"Mas, verdade seja dita, o PAI foi de longe a organização melhor estruturada, conseguindo rapidamente granjear a simpatia dos rapazes da altura, que encontraram em Amílcar pensamento e personalidade, o estandarte que secretamente procuravam para poder seguir", diz Turpin com um leve, mas mal disfarçado, ar de orgulho por ter vivido estes momentos ao lado do mítico guerrilheiro.

Tudo começou com "um simples clube de futebol (não se recorda do nome) do qual faziam parte os fundadores do partido" e que rapidamente foi transformado num "espaço de consciencialização dos moços da altura para uma ideia de libertação do país".

"Lá partíamos nós, com as coisas do futebol à frente, mas com as coisas da libertação da Pátria atrás, dos lados, por cima, por baixo ... cada vez mais, cada vez mais conscientes do pontapé certeiro que estávamos a dar na História", diz Turpin.  Iniciativas deste tipo já aconteciam no Senegal, para onde muitos dos guineenses se deslocavam em visitas familiares, sobretudo Turpin, que, então, tinha familiares na administração pública em Dacar (capital).

Com tudo isso, cita de memória, Cabral dizia: "Olhem que os portugueses nos estão a enganar com alguns privilégios que dão a um grupo reduzido de indivíduos, enquanto a grande parte da população é explorada e maltratada".

"Devemos avançar para a independência", defendia Cabral, ainda citado por Turpin, mas acompanhava sempre esse desígnio com a exigência de uma "independência negociada". Ou seja: "Com diálogo. Sem violência".  Cabral era um "profundo cultivador do diálogo e da tolerância", frisa, admitindo algumas saudades desta forma de estar nos dias de hoje.

Chegado a este ponto do "escorrer" das memórias, Elisée Turpin fala também da polémica que é, na Guiné-Bissau, quase da idade do PAIGC: Quem foram, de facto, os fundadores do partido?

Sobre a história da dúvida de quem foram os fundadores do partido responde um dos eleitos: "Havia muitas pessoas com as quais Cabral vinha mantendo um relacionamento mais ou menos próximo mas, no acto da fundação do partido, Cabral fez uma selecção de pessoas da sua inteira confiança".

"Não se podia expor muito ao risco da PIDE (...) desconfiar da nossa actividade", recorda. "Todos nós éramos funcionários públicos na altura. Cabral era engenheiro agrónomo, Júlio Almeida, prático agrícola, Fernando Fortes, aspirante nas alfândegas, Aristides Pereira, chefe de administração e eu era guarda-livros", diz, aliviado, como que dando por sepultada a dúvida sobre este assunto.

"Lembro-me que, após a fundação do PAI, a PIDE quase que não saía do nosso encalço. Sabia que estávamos “contaminados” com o “vírus” dos movimentos de libertação, que se tinha já instalado noutras paragens de África. Mas, graças a Deus, sempre soubemos esconder os nossos propósitos", adianta.  No início, diz, "começámos (1956/57) logo os trabalhos de mobilização com os Balantas (a mais representativa etnia da população guineense) de Brá e Portegol, e ainda na região de Mansôa".

Fingiam que iam caçar coelhos e perdizes, mas a caçada era outra: "Aproveitávamos para falar com os rapazes sobre os propósitos do partido". Isto é, mobilizar a juventude para seguirem para os campos do partido na Guiné-Conacri". 

Nesse trabalho de mobilização a favor do PAI os "camaradas" contaram com a ajuda de portugueses que estavam contra a ditadura fascista de Oliveira Salazar, alguns liberais, outros revolucionários do PCP que estavam na Guiné, "como é o caso de José Tomás Pires, Fortes Teixeira, Filipe Pomba Guerra, o próprio chefe do posto da polícia, de nome Liberato (...) todos estavam do nosso lado, só que de forma bem disfarçada".

Houve mesmo um administrador português que, na altura, só não prendeu Amílcar Cabral porque não quis, pois sabia muito bem das suas actividades "subversivas" e um dia chamou Cabral à sua residência, conta Turpin, para lhe dizer: "Rapaz, sei tudo o que andas a fazer mas não te prendo porque gosto muito de ti. Vê lá no que te metes".  Esse administrador era Diogo José Pereira de Melo [e Alvim, e não Antunes, como por lapso consta no portal , governador da Guiné entre 1954 e 1956].

O objectivo primeiro e último do partido de Cabral foi sempre a independência da Guiné que, ainda segundo Turpin, dizia: "Se a independência tiver que passar por um partido marxista, então vamos tê-lo".  E foi o que foi. Mas Cabral fazia também a distinção entre ter "um partido de cariz marxista e ser marxista", o que "ele mesmo dizia - o próprio Turpin o ouviu afirmar -, no princípio, que não era".

O contacto de Elisée Turpin com Cabral esfriou muito quando ele decide transferir a base do partido para Conacri, onde decidiram mudar a denominação do partido de PAI  [, Partido Africano da Independência,] para PAIGC.  "Eu não participei na luta armada, ou seja, nos tiros. Não porque não quisesse, o facto foi que achei que podia ser útil ao partido estando cá para outras tarefas, tais como a mobilização de outros camaradas", frisa.  E acrescenta, arredando qualquer hipótese de ser encarada a afirmação como uma justificação: "Fui eu quem trouxe de Dacar aquele que foi o primeiro instrutor dos guerrilheiros guineenses em Conacri, o comandante Luciano Ndaw. Esse senhor já tinha feito a tropa colonial portuguesa e, portanto, sabia bem da poda".

"A minha ligação a Cabral resumiu-se à estadia dele em Bissau. Depois da sua partida para a Guiné-Conacri praticamente deixamos de nos corresponder. Passei a falar mais com o irmão dele - Luís Cabral (...) - e com Rafael Barbosa que na altura era responsável pela chamada «zona zero» de mobilização, hoje a capital do país", Bissau.

"Não posso falar muito do partido depois da independência porque, praticamente, desliguei-me, mas uma coisa sei: o partido que Cabral e nós fundámos queria mais de que isto que hoje temos. O nosso sonho era transformar a Guiné numa Suíça de África, pois julgávamos, e eu continuo a julgar, que o país tem potencialidades para tal", diz em tom de desafio às "novas gerações". (...).

[ Fixação / revisão de texto / destaque a cor: L.G.]

(***) Tenho um exemplar do livro escrito pelo António Lobato, Liberdade ou evasão: O mais longo cativeiro da guerra (Amadora, Erasmos, 1995), com a particularidade de ter duas dedicatórias, belíssimas. 

Uma, escrita pelo punho do Miguel Pessoa, que me ofereceu um exemplar que tinha a mais em casa, e que diz esta coisa singela, mas que me tocou, como camarada: 

"Ao Luís Graça, do Miguel Pessoa, alguém que, felizmente, não precisou de escrever um  livro assim. Jun 2009."... 

E, a propósito, vai daqui um grande Alfa Bravo para o Miguel e um beijinho ternurento para a Giselda, que ontem fizeram anos de casados e andaram pelas "minhas terras" da Lourinhã, antes de seguirem, hoje, para o almoço de convívio da Tabanca do Centro, em Monte Real... Que sejam (e)ternamente felizes o Miguel e a Giselda... e que levem para o régulo Joaquim Mexia Alves e demais convivas da Tabanca do Centro os nossos votos de amizade e camaradagem.

A outra dedicatória é do autor e reza assim: 

"A quantos me amam ou odeiam, sem que eu dê por isso; a todos os que amo, sem nunca lhes ter dito; àqueles de quem gosto e que acredito gostarem de mim, (...)".

Do livro do Lobato, tomo a liberdade de transcrever este excerto:

“(...) O comportamento deste homem [o chefe dos sentinelas, Koda, de etnia balanta,] não pode servir de exemplo para qualificar os outros guerrilheiros do PAIGC e muito menos uma parte dos seus responsáveis. 

De entre estes, merecem especial referência Fidelis Cabral, Aristides Pereira, Joseph Turpin e o Tio Lourenço, não só pela sua moderação, sensatez e sabedoria, mas sobretudo pela força do humanismo que deles emana e se repercute em quantos, por razões comuns ou mesmo contrárias, se encontram à mercê das suas decisões. São os homens bons do presente, mas sem dúvida também os do futuro,

"Uma vez por outra , um deles vem falar comigo e procura tranquilizar-me. Joseph Turpin, que passa a maior parte do seu tempo no Cairo, em representação do partido, diz-me que o Papa intercedeu por mim junto do Arcebispo de Conakry, Monsenhor Tchidimbo, o que certamente terá resultados práticos. Mas o tempo vai passando e nada acontece.

"Fidelis, um advogado formado em Portugal, procura convencer-me das razões da sua luta, do respeito e amizade pelo povo português. Afirma que, após a independência, não pretendem ligar-se a ninguém, mas que se isso tivesse de acontecer, só poderiam continuar com os portugueses” (…) (Lobato, 1995, p. 168)

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7178: Tabanca Grande (251): José Manuel Marques Pacífico dos Reis, Coronel Cav Reformado, CCAÇ 5 e CIM/Bolama (Guiné, 1968/70)

Mensagem José Marcelino Martins, (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), com data de 23 de Outubro de 2010:

Boa noite amigos e camaradas
É com muito prazer que, em anexo ao presente mail, envio a nota de apresentação do meu Comandante e Amigo José Manuel Marques Pacifico dos Reis, que já é colaborador assíduo no nosso blogue, no qual contei oito intervenções.

Anexo, também, o curriculum já publicado, mas com a introdução de imagens.
Espero que desta nova adesão nos traga novas histórias e novas vivências.


Um abraço
José Martins


1. CURRICULUM

José Manuel Marques Pacífico dos Reis
Coronel de Cavalaria (reformado)

No seu curriculum, e no que respeita às Campanhas de África 1961-1974, consta:


Comando Territorial Independente da Guiné


Companhia de Caçadores n.º 5 – Recrutamento local

Capitão de Cavalaria, NMEC 50991111, foi aumentado ao efectivo da Companhia em 8 de Julho de 1968, assumindo o comando da mesma.

Foi sob o seu comando que se processou a transferência do Comando e os Serviços da Unidade para o então Destacamento de Canjadude, em Agosto de 1968,

Em 12 de Setembro de 1969, foi ferido em combate num perseguição ao IN junto de Uelingará na estrada Nova Lamego – Canjadude.

Foi abatido ao efectivo da unidade em Setembro de 1969, por ter sido transferido para o Centro de Instrução Militar / CTIG.

* da História da Companhia de Caçadores nº 5 – os Gatos Pretos de Canjadude [compilação de José Martins]


Centro de Instrução Militar – Bolama

Comandante da Companhia de Instrução – 1.º Turno de 1970. A escola de recrutas foi realizada entre o dia 26 de Janeiro e 26 de Abril de 1970, data em que os recrutas Juraram Bandeira, em Bissau. A instrução da especialidade teve início em 27 de Abril de 1970, tendo terminado em 13 de Junho as Especialidades de Atiradores, Apontadores de Metralhadora e Transmissões e continuando os Corneteiros e Clarins até 27 de Junho e os Escriturários até 04 de Julho de 1970.

Foi desta escola de recrutas e instrução de Especialidades, que saíram os militares que, em conjunto com os Oficiais, Sargentos e Praças especialistas da Metrópole, constituíram as Companhias de Caçadores n.ºs 17, de etnia Balanta.


* do Relatório sobre a Instrução, elaborado pelo Capitão de Cavalaria Pacifico dos Reis, Comandante da Companhia de Instrução.


Região Militar de Angola

 


Comandante da Companhia de Policia Militar n.º 3524, mobilizada no Regimento de Lanceiros n.º 2, em Lisboa.

Embarcou em Lisboa em 4 de Março de 1972.
Permaneceu em Luanda até 1 de Maio de 1974, data em que efectuou a viagem de regresso.





* do volume 13 de “OS ANOS DA GUERRA”, edição do Correio da Manhã, 2009.


©Emblemas da Colecção de Carlos Coutinho, com a devida vénia.



2. APRESENTAÇÃO

Depois de quase ano e meio ter sido o seu Sargento de Transmissões e seu Adjunto do Centro Cripto na CCAÇ 5 na Guiné, tomei, já há alguns anos, o papel de “secretário pessoal para assuntos blogisticos”, na metrópole. Para mim foi uma honra.

Foi desta forma que em 2006, com a devida autorização, levei ao conhecimento da Tabanca Grande, na altura era ainda uma Tertúlia, o texto sobre o Sargento Enfermeiro Cipriano.

Depois desta colaboração outras se seguiram. Agora com uma colaboração de mais de seis postes, tomo a liberdade de apresentar, como membro, o meu “Capitão” e Comandante, o Coronel José Manuel Marques Pacífico dos Reis.

Desde sempre ligado aos meios Castrenses, foi Menino da Luz no Colégio Militar e Cadete na Academia Militar. A sua passagem pela Guerra do Ultramar está sumarizada no Poste 4028 de 13 de Março de 2009.
Falta, para a “integração efectiva nas nossas fileiras” o envio de uma foto actual, o que acontece hoje.


Postes publicados:

04/06/2006 – P0839 – O valente Sargento Enfermeiro Cipriano
13/03/2009 – P4028 – O meu amigo Tartaruga

Série Divagações de Reformado

01/11/2009 – P5189 – Ida para a Guiné
02/11/2009 – P5194 – Mofunado ou não na Guiné de 68
13/03/2010 – P5987 – É a vida …
15/05/2010 – P6395 – Politicamente incorrecto
23/06/2010 – P6779 – Só á pedrada …
30/08/2010 - P6911 – TAP ou TAPioca?

E pelo que ouvi hoje ao almoço, tem muitas histórias para “nos encantar”.

José Marcelino Martins
23 de Outubro de 2010
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 25 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7173: Tabanca Grande (250): Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS Op MSG (STM/QG/CTIG, 1968/70)

Guiné 63/74 - P7177: Agenda Cultural (88): Lançamento da 2.ª Edição do livro Estranha Noiva de Guerra, de Armor Pires Mota, dia 10 de Novembro de 2010 na Associação 25 de Abril

1. Convidam-se (principalmente) os tertulianos e leitores da Grande Lisboa a irem assistir à sessão de lançamento da 2.ª Edição do livro Estranha Noiva de Guerra, de autoria do nosso camarada Armor Pires Mota (ex-Alf Mil da CCAV 488, Mansabá, ilha do Como, Bissorã e Jumbembem, 1963/65), que terá lugar na Associação 25 de Abril, Rua da Misericórdia, 95 - Lisboa, no dia 10 de Novembro de 2010, pelas 18:30 horas.


O livro vai ser apresentado pelo nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) que também prefaciou a obra*.


CONVITE









Título: Estranha Noiva de Guerra
Autor: Armor Pires Mota
Editor: Âncora Editora
N.º Páginas: 152
Capa: José Maria Ribeirinho
Fotografia da capa: Pista de Cuntima - Evacuação de um ferido, imagem gentilmente cedida por A. Costa Paulo
Edição n.º 31002
2.ª Edição: Setembro de 2010
Dep. legal n.º 315831/10
ISBN: 978 972 780 285 2





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Notas de CV:

(*) Ver poste de 13 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6727: Bibliografia de uma guerra (57): Estranha Noiva de Guerra, de Armor Pires Mota, a publicar em Setembro de 2010 (Mário Beja Santos)

Vd. último poste da série de 23 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7162: Agenda Cultural (87): Passeio temático a "La Lys", organizado pela Liga dos Combatentes

Guiné 63/74 - P7176: (In)citações (15): Os verdadeiros filhos da Guiné (Cherno Baldé / José Belo)

1. Comentário do Cherno Baldé ao poste do António Rosinha (*)

Amigo Rosinha,


Sem concordar inteiramente com tudo o que diz neste texto, confesso que, de facto, as imagens retradas sobre o país (Guiné-Bissau) e, mais concretamente sobre Bissau naqueles fatídicos primeiros anos da nossa independência,  são a mais pura verdade e que ninguém poderá contestar ou desmentir sem correr o risco de se ridiculizar. Factos são factos.

Todavia há questões de fundo em que, a meu ver, o Rosinha não conseguiu fazer a devida e necessária separação, metendo tudo no mesmo saco (como se diz por aqui). Por exemplo o desejo de implantar o comunismo na Guiné, visto como primeiro objectivo do PAIGC, de Amílcar e de Luís Cabral. Não sei se isso corresponde à realidade dos factos. Lembro-me da resposta a que Amílcar deu a um jornalista, penso que em Itália, durante uma conferência internacional. Indagado se ele era comunista e lutava para a implantação do comunismo no seu país, ele respondeu, mais ou menos, nesses termos: Se pelo facto de lutar e de querer a liberdade, a dignidade e o bem estar para o meu país, é ser comunista, então digo que sim (as palavras são minhas).

" (...)Na Guiné, aparentemente, o povo aceita tudo que lhe é imposto sem se revoltar"...

É verdade, Rosinha, mas atenção é só aparentemente, porque de tanto sofrerem represálias cruéis (ver criminosas), e isto desde os tempos da ocupação colonial, os povos aprenderam a não enfrentar as injustiças e o poder instituído,  assim de caras, mas as consequências depois são por demais evidentes. Lembram-se do golpe de 14 de Novembro ou ainda da morte do Presidente Nino. Qual foi a reacção do povo? Nenhuma, no fundo todos (ou muitos) ficaram aliviados, e não houve uma única voz a contestar, excepção feita àfamília, claro.

Por fim, e para não me alongar, diz que "o que falhou no projecto do PAIGC e Luís Cabral foi a falta de colaboração do povo".

Bem, o povo aceitou tudo, aguentou enquanto pôde mas, como sempre, tudo tem seus limites, não é ?

Há uma frase muito interessante no livro apresentado no poste de Beja Santos em que se afirma: O que todos os movimentos nacionalistas (de libertação) que se acotevelavam nos corredores de Dakar e Conacri tinham em comum era quererem a Guiné para os Guineenses. Este nacionalismo exacerbado, na minha opinião (e aí estamos de acordo), levou o país a enveredar por um destino incerto, descontrolado, cheio de incertezas em relação ao futuro e nas mãos de pessoas que,  alguns anos antes, seriam das mais improváveis.

Eu acredito, ingenuamente, que apesar dos crimes cometidos (que bem podiam ser considerados de genocídio) e a fome engendrada, pelo menos nessa altura havia um projecto de construção nascido de um ideal positivo (com todos os defeitos imputáveis) que guiava a restrita cúpula dirigente, o que deixou de existir a partir do momento em que o país passou para as mãos dos verdadeiros filhos da terra.

Obrigado,  Rosinha,  e continua com as tuas excelentes notas de Colon (Colons há muitos, e lá como cá) que nos vão elucidando sobre os outros tempos.

Cherno Baldé

Segunda-feira, Outubro 25, 2010 12:36:00 PM

2. Comentário do José Belo ao comentário do Cherno Baldé:

Tenho duas perguntas para o Cherno Baldé, que me são provocadas pelas seguintes afirmações no comentário:

"Pelo menos nessa altura havia um projecto de construção nascido de um ideal positivo (com todos os defeitos imputáveis) que guiava a restrita cúpula dirigente, o que deixou de existir a partir do momento em que o país passou PARA AS MÃOS DOS FILHOS DA TERRA").

Quer-se com isto dizer que a Guiné estaria melhor governada por outros,que não os filhos da terra?

"O que todos os movimentos nacionalistas,de libertação,que se acotovelavam nos corredores de Dakar e Conacri tinham em comum era querer a Guiné para os Guineenses. ESTE NACIONALISMO EXACERBADO...").

Querer a Guiné para os Guineenses, precisamente como querer Portugal para os Portugueses, poderá considerar-se [uma forma] de ..."nacionalismo exacerbado?". E, apesar de tudo, não seriam os Cabo Verdianos um corpo tão estranho ao verdadeiro tecido social local, como, por exemplo os portugueses, que por lá estavam há mais de 400 anos? Não será boa prova disso ambas as  rejeições ?

Um abraço.
 
Segunda-feira, Outubro 25, 2010 3:05:00 PM
 
 
3. Resposto do Cherno Baldé ao J. Belo:
 
Amigo J. Belo,


A primeira afirmação deve ser vista com cuidado, pois ela retrata uma certa realidade local,  se quiser uma corrente de pensamento que nasceu nos centros urbanos (Bolama e Bissau) no auge da competição entre as diferentes componentes sociais que giravam à volta dos presídios e casas comerciais (princípios do séc.XX), mormente entre os assimilados, oriundos dos grupos étnicos locais e os outros vindos de fora (São-tomenses, caboverdianos e portugueses e mais tarde, também, os islamizados do sertão). Dentro desta lógica, os verdadeiros Guineenses seriam os chamados pretos nok ou sejam,  nativos locais, não mestiços.

Apesar das aparências de convivência pacífica, consubstanciadas na propaganda do partido único, esta corrente infiltrou-se no seio do PAIGC tendo ganhado força e adeptos ainda durante a luta. Depois dos Portugueses, seria a vez dos Burmedjos,  ou sejam,  os mestiços, que não eram outros senão os caboverdianos do PAIGC e que se manifestou no golpe de 14 de Novembro de 1980.

A partir dai foram os "verdadeiros filhos da terra" a comandar com os resultados que se conhecem. Quando se deu o golpe todos nós chorámos, juntamente com o Nino, junto ao Palácio do Governo, na rotunda do Império (agora Heróis Nacionais), pensando: "Agora é que é, agora somos nós a mandar"!... Tudo não passou de uma montanha de ilusões que depois se transformou num mar de frustrações que ainda hoje nos cobrem de vergonha aos olhos do mundo.

A minha visão,  hoje, é que a Guiné precisava e precisa ainda de todos os seus filhos e verdadeiros amigos. Os Guineenses,  descendentes de Caboverdianos como Amílcar ou Luís Cabral,  foram muito mais patriotas que todos os nossos "verdadeiros filhos da terra" juntos. Não se trata de competências, é muito mais que isso.

Há dias ouvi pela rádio RFI, uma entrevista de José Turpin (irmão de Elysé Turpin, co-fundador do PAIGC) que falava de Cabral dizendo:
- Quando ele chegou a Conacri, escondido sob o pseudonimo de Abel Djassi, e onde eu e mais outros camaradas já nos encontrávamos, rapidamente se impôs como líder, não pela força mas pela sua integridade moral e força de convicção. Foi ele que nos unificou sob uma única liderança política e estratégica, antes dele, os "verdadeiros" Guineenses pavoneavam-se por aí,  perdendo seu tempo em discursos patrióticos e disputas pueris por mulheres (prostitutas,  provavelmente).

Acho que a luz do que aconteceu nos nossos países e em África, não será de todo errado reconhecer que países como Angola e Moçambique, a Guiné também, poderiam ser muito mais prósperos e competitivos se não tivessem corrido com os seus compatriotas brancos. Estando de viagem para Moçambique, estive alguns dias em Johanesburg, no aeroporto, onde vi empregados pretos e brancos trabalhando lado a lado, falando em língua local (Zulu, ou outra), mesmo se os pretos, por enquanto, estão maioritariamente confinados a cuidar das cargas e latrinas.

Certamente é mais fácil falar assim agora, porque naqueles tempos nem nós nem vocês estávamos preparados para conviver de forma sã, de igual para igual. As barreiras eram artificiais mas convinham à parte dominante.

 Obrigadão,
Cherno

Segunda-feira, Outubro 25, 2010 5:17:00 PM
 
4. Comentário, final, do J. Belo:
 
Caro Cherno Baldé: Fico grato pelos esclarecimentos que vêm contribuir para um constante melhorar de perspectivas, e conhecimentos, sobre a Guiné, tão difíceis (actualmente) de se obter por aqui. O tempo para se resolver alguns dos sérios problemas locais, como da restante África, será certamente demorado.Só se espera que não seja tão demorado como o que tem levado aos (tão críticos) Europeus a resolver os seus problemas... ainda bem longe de resolvidos! Um abraço.
 
Segunda-feira, Outubro 25, 2010 6:16:00 PM (**)

[Revisão / fixação de texto / título: L.G.]
 
______________
 
Notas de L.G.:
 
(*) Vd. poste de 24 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7170: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (7): Da Casa Gouveia aos Armazéns do Povo
 
(**) Último poste desta série > 22 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7157: (In)citações (19): Neto de um gerente comercial francês, o Mr. Jean Marie Adolphe Herbert, e filho de um futebolista caboverdiano, Armando Búfalo Bill (Nelson Herbert)

Guiné 63/74 - P7175: Notícias dos Nossos Amigos da AD-Bissau (16): A imagem de Nossa Senhora dos Milagres de Guiledje e a reconstrução do oratório dos Gringos (Pepito)









Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Simpósio Internacional de Guileje > Visita ao sul > 2 de Março de 2008 > O ex-Cap Mil Abílio Delgado, que comandou a CCAÇ 3477 (sediada em Guileje de Novembro de 1971 / a Dezembro de  1972; também conhecida por Os Gringos de Guileje); foi,  aos 21 anos, o capitão miliciano, mais novo do CTIG.

O Abílio Delgado, membro da nossa Tabanca Grande, residente na Ericeira, foi  fotografado por mim, em Iemberém,  com a estatueta, em metal, da Nossa Senhora dos Milagres de Guileje, a  santa protectora dos Gringos de Guileje, encontrada nas escavações arqueológicas do antigo aquartelamento de Guileje... 

Fotos: © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados.




1. Mensagem, enviada em 8 do corrente, pelo nosso amigo Pepito, director executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento (neste momento, num congresso no Japão, a discutir a biodiversidade e o desenvolvimento...):

Assunto: Nossa Senhora dos Milagres de Guiledje

Luís: Acabei de ler a notícia sobre o paradeiro da imagem da Nossa Senhora dos Milagres (*) e era para assegurar que ela está "religiosamente" guardada pela AD. Em breve mando uma fotografia do Domingos Fonseca com ela nas mãos (já pedi que me mandassem uma foto actual). É que ele "nacionalizou-a" e não a larga por nada deste mundo.


Em 2011 vamos reabilitar mais uma infraestrutura do quartel de Guiledje e que servirá de alojamento para o Domingos que passará a lá residir permanentemente. Também será reconstruído o oratório financiado pelo Grupo dos Amigos da Capelinha de Guiledje. (**)

A ida do Domingos para lá é para valorizar o Museu Memória de Guiledje, prosseguir a recuperação do quartel e incrementar as nossas actividades de gestão ambiental-desenvolvimento rural ao longo de toda a zona fronteiriça, desde Balana a Gadamael (onde eu irei amanhã). Vamos começar a "atacar" o quartel de Gadamael Porto.

Bom fim de semana.

pepito




2. Já em 23 de Junho de 2010 tínhamos feito circular pela rede interna da Tabanca Grande a notícia de que o Pepito queria agora reconstruir o oratório dos Grinjos de Guileje:

Assunto: Reconstrução do "oratório" dos Gringos de Guileje

Amigos e camaradas, em especial Gringos e Piratas de Guileje: (i)  A AD - Acção para o Desenvolvimento quer reconstruir o "oratório" de Guileje, construído no tempo dos Gringos: alguém tem mais fotos ? tem ideia das medidas do monumento (cumprimento, largura, altura)  ? tem mais informações sobre esta iniciativa ? outros dados sobre os aspectos construtivos (materiais usados, cores...) ? (ii) O termo correcto é "oratório" ? Ou "oráculo" ? Ou... ?

Obrigado pela vossa preciosa ajuda. Luís



Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 3477 (1971/77) > Oráculo, com a imagem de Nossa Senhora de Fátima e do Santo Cristo dos Milagres... Na imagem, o Amaro Munhoz Samúdio, ex-1º cabo enfermeiro, está a pegar ao colo um bébé chimpazé que ele comprou a um caçador local por 500 pesos... Na segunda foto, julgo ver também o Samúdio, à civil, de óculos escuros. As fotos foram-nos disponibilizadas pelo Pepito, sem legenda.

Em ambas as fotos pode ler-se ainda a oração em verso, na base do monumento: "Santo Cristo dos Milagres / Nesta capelinha oramos / Para sempre sorte dares / Aos Gringos Açoreanos". A companhia era maioritariamente constituída por pessoal dos Açores.

Esta lápide assim como a estatueta e diversos outros objectos de uso corrente, foram encontrados por ocasião das escavações arqueológicas... Associado aos trabalhos de capela e ao núcleo museológico de Guileje, está incontornavelmente o nome do dedicado e incansável Domingos Fonseca, engenheiro técnico agrícola, quadro da AD, e o grande arqueólogo de Guileje. Peças como esta estatueta da Nossa Senhora forem encontradas por ele.

Segundo amável informação do Samúdio, que ele tive o prazer conhecer pessoalmente em Leixões, o monumento foi contruído pelos Gringos e inaugurado pelo então Ministro da Defesa Nacional, general Sá Rebelo e também pelo então governador, general Spínola, em 12 de Junho de 1972.

Fotos: © Amaro Samúdio (2006) / AD - Acção para o Desenvolvimento. Todos os direitos reservados.

3. Mensagem do Pepito, de 23 de Junho de 2010

Assunto: Reconstrução do "oratório"

Amigo Luís:

Venho fazer mais um desafio e pedido de apoio à Tabanca Grande, em especial aos que passaram por Guiledje, em particular aos Gringos.

Pretendemos reconstruir o oratório (não sei se é este o nome correcto) que os Gringos fizeram, mas temos dificuldade em fazer a respectiva planta e sobretudo dimensioná-la.
Tirámos as medidas do suporte: (i)  largura do corpo: 53 cm; (ii) espessura: 22 cm.

Talvez ajude a fazer a extrapolação para se determinar as medidas da parte superior (a capelinha propriamente dita), tanto mais que as fotos podem ajudar a estimar as dimensões.

abraço
pepito

__________


Notas de L.G.:


 (*) Vd. poste de 8 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7099: Patronos e Padroeiros (José Martins) (16): CCAÇ 3477 - Nossa Senhora dos Milagres



Ao montante de 590 € (quinhentos e noventa euros) recolhidos até Agosto de 2010, e já entregues à AD, na pessoa do Pepito, há que acrescentar mais dois donativos, que são bem vindos, embora já fora do prazo: um, de 20€, depositado pelo Silvério Lobo, nosso amigo e camarada de Matosinhos; e outro, de 30€, de um anónimo. Esta informação, sujeita a confirmação por escrito, foi-me dada oralmente pelo Manuel Reis, que é o tesoureiro do Grupo dos Amigos da Capela de Guileje... 


O dinheiro está depositado na conta nº: 0372008355700, da Caixa Geral de Depósitos de Ílhavo, em nome de Manuel Augusto Ferreira Reis, conta essa que continua "aberta à generosidade" dos nossos amigos e camaradas da Guiné que queiram agora contribuir, adicionalmente,  para a reconstrução do oratório  mandado erigir pelos Gringos de Guileje.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7174: Convívios (279): Encontro do Grupo do Cadaval no Couço-Coruche (José Manuel Matos Dinis)

1. Mensagem de José Manuel Matos Dinis, membro do Grupo do Cadaval, com data de 24 de Outubro de 2010:

Carlos, bom amigo,
Segue a pretensa reportagem de um encontro do Grupo do Cadaval.
Amanhã, provavelmente, o Henrique enviar-te-á as fotografias.

Um grande abraço
JD


O Grupo do Cadaval conviveu no passado fim de semana no Couço, Concelho de Coruche.
Segue a reportagem do acontecimento


Grupo do Cadaval
1.ª fila da esquerda para a direita: Pimentel, Rosales, Borrego e Fernando Marques.
2.ª fila pela mesma ordem: Belarmino Sardinha, José Brás, Lima, Joaquim Galvão, Hélder Valério, Dinis e Henrique Matos.


No último weekend ocorreu um festim muito badalado na pré-cidade do Couço, na extrema ribatejana, a calcar as canelas do Alentejo, na orla da maior cobertura chaparral da Europa, como nos relatou o feliz ex-presidente da Junta, o Joaquim Galvão, também ele ex-militar na modorrona Guiné, no final dos anos de paz, 1960/62. Foi uma iniciativa do segundo-comandante do Grupo do Cadaval, um homem sábio e generoso que, com ares de soba, gosta de reunir-se de mentes brilhantes e companheiros de fácil mastigação.

Possuidor de ampla propriedade, vasta de ares puros e frescos, ali organizou a concentração para demandarmos à mesa do cozido. O grupo apresentou dois reforços locais: o Joaquim Galvão, homem de linguajar fácil, tanto que referiu eu estar quase ao nível dele, que nos presenteou com lembranças da Junta a que esteve quase a eternizar-se na sabida presidência: saquinhos individuais, com material de escrita (entre outros mimos), pois sabia da presença de um dos nossos, escritor laureado, o Zé Brás, por sinal vizinho de concelho; e o Pimentel, também ex-combatente da época do Rosales, produtor de uma pomada sem aditivos, que se mostrou competente e de bom paladar, pinguinha que viria a acompanhar o lanche.

Mas ainda houve mais quatro reforços de grande mérito: O Lima e o Borrego, residentes na região, também eles companheiros do anfitrião em terras da Guiné, sendo que o Borrego já lhe era familiar do jogo da bola, pois se um capitaneava a equipe do Estoril, o outro exercia o mesmo mister nos Leões de Santarém. Para além deles, apresentou-se o sempre bem-disposto Fernando Marques que me conduziu com grande competência ao lugar do repasto, e o Henrique Matos, que fez a pequena distância de trezentos quilómetros para abancar connosco. É de se lhe tirar o chapéu!.

O grupo do Cadaval, porém, registou uma baixa de peso, o comandante Vasco da Gama impossibilitado por afazeres de ordem particular. Mas foi bastamente lembrado e ainda teve dedicatória posterior com o tal vinho puro de três castas.

Outras faltas a registar: o Graça de Abreu, empenhado num curso sínico que ministra em Lisboa, e o Jero, que tinha jurado pelas alminhas, lagarto, lagarto, lagarto, que se propusera a um sacrifício adicional só para partilhar da nossa camaradagem e, afinal, baldou-se sem razões, nem explicações, nem sacrifício, que isto de faltar à palavra perante os unidos do Grupo do Cadaval, também deixa marcas, e sobras alimentares.

Por dever de consciência recordo aqui aos eventuais leitores a restante composição do Grupo do Cadaval: o sub-comandante, é o já referido Jorge Rosales, homem sagaz, inteligente, comedido e de jurisdição simples, que revela amizade em cada momento e merece a admiração de todos. O Zé Brás, homem de mundos vários, com facilidade na escrita, através da qual expõe com mestria cenários, personalidades, emoções, sonhos e sofrimentos, com delicadeza e assertividade. Os restantes, a quem não dedico palavras especiais, porque são cidadãos simples, mas generosos e atentos ao mundo, são o Hélder Valério, o Belarmino Sardinha, e cá o escrevente que vos cumprimenta.

Concentrada a tropa à hora devida, que os horários são para cumprir, a coluna deslocou-se pela picada que liga o Couço à Courelinha, notando-se o corajoso Rosales a conduzir a viatura rebenta-minas, e os vultos da malta que o seguia a levar com a poeirada. Ali chegados, deparou-se-nos uma casa simples, sem recursos arquitectónicos, mas limpa e alva como só naquelas bandas encontramos. A mesa, para doze, já tinha as alfaias prontas. Tomámos posições, entre graças, fotografias e manifestações de apetite, face aos cheirinhos provenientes da cozinha aberta, no prolongamento da sala.

A abrir, uma sopa do cozido, com pão do forno e uma hortelã inspiradora.

Depois passámos ao conduto, numa sucessão de vegetais saborosos da tradicional cultura biológica, a que as carnes carregadas de paladar, mai-los enchidos caseiros, transportaram-nos para um céu de prazeres, estranhamente contraditórios com o pecado da gula. Pena tive eu de não possuir estômago tamanho que comportasse outro tanto, pois ainda salivo da belíssima lembrança.

À sobremesa foi servido um pudim que esteve à altura do acontecimento. O tintol era do Cartaxo e bebeu-se com agrado.

Passe a publicidade, o Café Barbeiro, com o telefone 243 650 180, não é propriamente um restaurante. No entanto, serve refeições por encomenda, sem lista, mas de qualidade e com fartura para que ninguém saia de mau humor. Esportulámos dez aéreos por bico, com a gratificação incluída.

Depois do café, incluído no almoço, e de mais umas achegas em discursos vários, despedimo-nos dos comparsas locais e do nosso escritor, que tinham outros afazeres, para demandarmos a casa do Rosales e mamarmos o lanche, antes que fosse tarde, e consistiu de dois peixes escalados, salgados na hora para assentarem praça na grelha, prateados e com a frescura necessária. Nos entretantos, petiscámos um queijinho de ovelha e um chouriço, tudo de boa confecção e temperos, coisas que se foram num ápice, dando a parecer que o almoço não teria sido farto e bom. Só que às coisas divinais não temos por hábito manifestar desprezo, e então continuámos a cumprir religiosamente.

Pronto, meus caros leitores, não vos prolongo o sofrimento, e declaro-vos superiormente autorizados a comer um pedaço de pão com manteiga para matar a fome que vos assola.
JD
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 13 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7122: Convívios (195): 40 anos depois... Pessoal do Comando de Agrupamento nº 2957, Bafatá, 1968/70 (António Rodrigues)

Guiné 63/74 - P7173: Tabanca Grande (250): Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS Op MSG (STM/QG/CTIG, 1968/70)

1. Mensagem de Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro, ex-1.º Cabo TRMS Op MSG, Centro de Mensagens do STM/QG/CTIG, 1968/70, com data de 23 de Outubro de 2010:

Camarada Luís Graça
Faz hoje 42 anos que embarquei para a Guiné.

Deu-me para recordar a data de embarque, relatando alguns pormenores desse mesmo dia.
Se entender por bem publicar o escrito que remeto em anexo, fico-lhe grato e se me quiser avisar da sua publicação, se assim o entender, ainda mais grato lhe fico.

As fotografias que vão anexas ao escrito são de Bissau daquele ano de 1968.

Nota - Chamo-me Carlos Manuel Rodrigues Pinheiro, sou natural de Alcanena e resido em Torres Novas. Assentei praça na EPC em Santarém em 10 de Outubro de 1967, chumbei no CSM, como muitos outros naquele Curso, tirei a Especialidade no RTM no Porto, vim para o BT em Lisboa, fui colocado no QG da 2.ª RM em Tomar e depois acabei por ser mobilizado pelo RI 15 de Tomar.

Embarquei em rendição individual destinado ao BCAÇ 1911 que afinal veio no mesmo barco em que fui. Passei a minha comissão no Centro de Mensagens do STM no Quartel General de Bissau.

Fui o 1.º Cabo Op. Msg. 03015366

Fui funcionário dos Serviços Médico Sociais em Torres Novas, Alcanena e Santarém onde estive desde 1964 a 1972, ano em que entrei para a Banca, Crédito Predial Português, tendo passado à reforma em 31.12.01.

Sobre mim acho que disse o essencial.

Já para aí tenho escrito, mas gostava mesmo de pertencer a essa Grande Família.
Diga-me por favor o que devo fazer.

Um abraço
Carlos Pinheiro


Já lá vão 42 anos

É verdade. Parece que foi ontem e já lá vão quarenta e dois anos desde o dia do embarque para a Guiné.

Depois de uma noite muito mal dormida nos Adidos, na Calçada da Ajuda, logo de manhã lá estava ataviado a preceito para embarcar para a guerra.

Carlos Pinheiro junto à estátua de Honório Barreto

Dois dias antes, ainda no RI 15 em Tomar, a minha Unidade mobilizadora para o BCaç 1911 que nunca vi que veio no barco onde fui, apanhei uma boleia com um senhor da minha terra que lá foi buscar o filho, para também embarcar para a guerra, salvo erro era para Angola. Lá fomos os três no Volkswagen 1300 do senhor, a caminho dos Adidos em Lisboa. Almoçámos, já não me lembro onde, e lá chegámos.
 
Entrámos os dois pela porta de armas, cada um foi para o seu sítio, mas no dia seguinte deixei de o ver. Afinal ficou cá. Não chegou a embarcar. Tinha as suas mazelas certamente. Eu também tinha as minhas, mas embarquei e ele ficou por cá.

No dia do embarque, no dia 23 de Outubro de 1968, como disse, logo de manhã lá estava fardado como deve ser, de saco às costas com os meus pertences. Foi só esperar que as camionetas começassem a chegar para levar toda aquela malta de rendição individual para o cais de Alcântara. Éramos cerca de sessenta.

Quando chegamos ao Cais, o grosso dos expedicionários já estava devidamente formado; era o Batalhão de Caçadores 2856 constituído por quatro Companhias, mais um Pelotão de Polícia Militar que ia para Cabo Verde e ainda outras Unidade mais pequenas, género Pelotões de Canhão Sem Recuo, Pelotões de Apoio Directo, etc.

Nós ficámos livres da formatura e, certamente por isso, fomos dos primeiros a embarcar. Ao cima das escadas lá estavam as senhoras do MNF – Movimento Nacional Feminino a darem um maço de cigarros "Porto", um isqueiro e uns aerogramas. Também por lá se viam uns senhores de chapéu e de sobretudo que alguns mais vividos diziam ser da Pide.

Carlos Pinheiro junto ao monumento do V Centenário da morte do Infante D. Henrique

O UÍGE atracado à espera, com a tropa formada, depois de um General ter passado revista às forças ao som de uma Banda Militar, depois dos discursos da ordem, lá começaram a embarcar, sempre com a Banda a tocar marchas militares.

Os nossos familiares estavam do outro lado das barreiras e muitos nas varandas da Gare.

Os lenços brancos a acenar eram mais do que muitos. Da minha parte lá estavam os meus pais e os meus tios que moravam em Lisboa. Sabia mais ou menos onde eles estavam posicionados porque tínhamos combinado antecipadamente. A amurada do barco do lado do Cais estava repleta de militares o que provocava um relativo adornar do navio.

Entretanto, cerca do meio-dia, as máquinas do navio começam a fazer mais barulho e a silvar. Vêem-se já os rebocadores que o hão-de ajudar a largar e a ganhar o rumo da Barra do Tejo. Foram momentos difíceis de descrever. Adivinhávamos facilmente que os familiares no Cais choravam. Alguns até gritavam. Ouvia-se.

A bordo também havia lágrimas em muitos olhos. O barco ganha rumo, a ponte "Salazar", era assim que se chamava a que hoje se chama "25 de Abril", começa a ficar cada vez mais perto até que passámos por baixo dela. Dali até à Barra e depois ao mar alto parece que foi um momento.

Mal ou bem lá fomos encaminhados para os nossos aposentos, para largarmos o nosso saco e para tomarmos conhecimento dos nossos beliches. A esmagadora maioria, onde eu estava incluído, viajámos nos porões que noutras viagens transportavam tudo e mais alguma coisa. O cheiro era horroroso. As camas eram mesmo tipo beliche, mas em madeira de pinho, com colchões de palha e uma manta da tropa em cima. A estrutura das mesmas, porque em madeira, estava já cheia de dedicatórias de toda a ordem que se possa imaginar, fruto de outras viagens de idas e de regressos.

Edifício do STM em Bissau

Já no mar alto fomos para a primeira refeição, o almoço, numa sala grande, a sala de jantar do barco, e a comida era aquela que nos quiseram dar, porque os orçamentos naquela altura já eram apertados.

Depois foram cinco dias a ver-se só mar e céu, tudo azul, e de vez em quando uns peixes voadores a acompanhar o UÍGE e por vezes até golfinhos como que a desejarem-nos boa viagem. Raras vezes avistámos outros barcos, mas sempre ao longe. Passámos relativamente perto das Canárias. Disseram-nos que, como aquilo era um Transporte de Tropas, estávamos a ser a ser acompanhados por um submarino. Já era a psico a funcionar.

No convés havia uma espécie de um bar onde se vendia cerveja e Coca-Cola, sendo esta uma novidade autêntica uma vez que na Metrópole a mesma ainda era proibida. A cerveja era holandesa. Eram garrafas de meio litro, verdes, que nós nunca tínhamos visto. Claro que com estes estimulantes a viagem parece que custava menos.

Nos porões, logo no primeiro dia, foram montadas bancas para a batota, neste caso a lerpa, e os profissionais dessa jogatina lá assentaram arraiais e foram depenando os mais desprevenidos, que eram muitos.

E assim chegámos a Bissau no dia 28, ao final do dia, tendo o barco ficado ao largo e o pessoal desembarcado para barcaças que de imediato tinham rodeado o navio.

A todos os que vão sobrevivendo e que há 42 anos a esta hora viajavam comigo no UÍGE, um grande abraço e votos de muita saúde.

Carlos Pinheiro
23 de Outubro de 2010


2. Comentário de CV:

Caro Carlos Pinheiro, bem-vindo à nossa Tabanca virtual, onde os camaradas mais ou menos operacionais, mais ou menos graduados e mais ou menos doutores na universidade ou na vida, têm lugar sem distinção.

Lá "fora" ficam as mordomices e tratamo-nos por tu, porque todos os ex-combatentes da Guiné são verdadeiros camaradas, pisaram o mesmo chão avermelhado, sentiram o mesmo calor húmido insuportável, passaram a mesma sede, e a maioria pensou muitas vezes se o dia seguinte seria ser o último da sua vida.

Descreves os momentos finais da tua partida, em Lisboa, comuns à esmagadora maioria de nós. Quanta dor e incerteza no porvir. Quantas mães, esposas, irmãs e namoradas se despediram dos seus entes queridos, pela última vez, sem o suspeitarem.

Tempos difíceis, Carlos, documentados no nosso Blogue, mas que nunca é demais relembrar para que nunca mais voltem a acontecer. Ressalvam-se os tempos actuais, mas isso são contas de outro rosário. Nós sim, fomos os verdadeiros expedicionários, o resto é tempo de antena nas TVs.

Carlos, a partir de hoje assumes a responsabilidade nos contares as tuas vivências, mesmo em Bissau aconteciam coisas, que nós homens do mato, gostamos de saber. Estás apresentado à tertúlia, portanto começa a trabalhar.

Pessoalmente, quero dar-te os parabéns por vires engrossar o já numeroso grupo dos Carlos, todos boas pessoas como tiveste ocasião de me escrever, mas convenhamos que temos na tertúlia um numeroso grupo de homens de excepção, independentemente de se chamarem Carlos ou não. Lembremos também as "nossas" senhoras, operacionais ou amigas, que dão ao nosso Blogue aquele toque de beleza, inteligência  e sensibilidade, tão próprias delas.

Ao terminar deixo-te o indispensável abraço em nome da tertúlia e dos editores que terão muito gosto em publicar as tuas memórias.

Saudações do novo camarada e amigo
Carlos Vinhal
__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7150: Tabanca Grande (249): Carlos Fernandes, ex-1º Cabo Pára (CCP 122, 1971/74) e ex-elemento do Grupo Os Vingadores, do Alf Grad Marcelino da Mata

domingo, 24 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7172: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (35): Teixeira Pinto - Enfiamento da morte

1. Mensagem de Luís Faria (ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72), com data de 23 de Outubro de 2010:

Amigo Carlos
Um abraço e tudo de bom.

Entre Deus, Destino e Sorte, sempre optei por Deus e Mãe Maria, como apoio e ajuda nos caminhos da vida, por mais difíceis que sejam.

Por achar que não devia entrar em alguns pormenores (?), esta passagem de “Viagem …” é um retrato condensado de um dos dias mais pesados da 2791 – FORÇA e por que passei, quer no plano físico com todo o esforço e tensão dispendidos, quer no psicológico por vezes numa luta de sentimentos contraditórios entre o Dever, Consciência, Responsabilidade, Dor, Instinto e Risco.

A quem ler, em especial aos que possam ter vivido estes momentos, o meu pedido de desculpa por poder ferir quaisquer sensibilidades ou fazer reviver esse dia.

Um abraço a todos
Luís Faria


Viagem à volta das minhas memórias (35)

Teixeira Pinto – Enfiamento da morte

Madrugada de Setembro e a rapaziada forma na parada, como habitualmente em boa disciplina, aprumo e com garbo.

Verificado o equipamento e transmitido o cuidado redobrado a ter, pela previsível dureza da operação em que não podia haver facilitismos, montamos nos Unimog que em bom andamento nos levam ao longo da estrada Teixeira Pinto - Cacheu.


Teixeira Pinto > Heliporto

Os quilómetros vão ficando para trás até que a coluna pára e o pessoal dos 1.º e 2.º GCOMB rapidamente se apeia, reúne e assume as suas posições, dando quase de imediato início ao andamento para entrada na mata, com azimute a um ponto mapeado como nosso objectivo nesse dia, algures na península do Balanguerês.

Ao que julgo lembrar, o tempo meio cinzento mas com abertas estava mais ou menos estável mas, as variações da vegetação nas matas por vezes dificultavam a progressão serpenteante, espaçada, atenta e silenciosa que procurávamos fazer, na esperança de não sermos detectados até ao objectivo, onde era suposto e quase certo, virmos a ter confronto.

Sob o comando do Alf Mil Barros (2.º GCOMB) - julgo que o Alf. Mil F. Pereira (1.º GCOMB) não participou – coadjuvado pelos Furriéis, o bi-grupo (?!) com cerca de trinta elementos com o armamento reforçado pelas MG e Lança-róquetes que usávamos, foi escoando as horas na marcha a corta-mato, intervalando com pequenos descansos para descompressão, escuta e perscrutação de pormenor, evitando o mais possível os trilhos, clareiras e matas de copas muito abertas, o que era normal fazermos por segurança.

A avioneta de PCV cedo nos começou a sobrevoar intervaladamente, fazendo-nos temer a detecção ou pior ainda, denunciar eventualmente o rumo do nosso andamento. Como consequência, a nossa vertical começou a ser viciada e os banana AVP-1 começaram a sofrer de interferências e perdas de sinal !?!!

Julgo que por o Mesquita ( Furriel do 1.º GCOMB) estar de férias, o Fur Mil Marques do mesmo GCOMB - há já uns meses afastado destas lides por ter ficado adstrito à secretaria – conhecedor da dificuldade da operação, oferece-se para fazer parte da força desfalcada de graduados. Como já não estava habituado àquelas andanças, o Castro e eu não concordamos em que ele assumisse esse risco, mas o Marques insistiu e insistiu, acabando valentemente por nos acompanhar.

Continuando a progressão, já próximos do objectivo começamos a entrar numa mata arbustiva que a cada passo ficava mais fechada. Paramos para análise da situação e descansar um pouco, fora de possíveis olhares indiscretos. Os que já lá estavam embrenhados deviam sair rapidamente dali, já que o tipo de mata quase só nos permitiria ripostar por tiro em caso de ataque e ficávamos muito permeáveis aos RPG e morteiro.

A dada altura começamos a ouvir vozes vindas ao que parecia, de um palmar a umas poucas dezenas de metros à nossa esquerda. É resolvido fazer por alguns de nós uma aproximação para observação e eventualmente desencadear uma espécie de golpe de mão, enquanto os restantes ficavam de cobertura e apoio à retirada, com instruções de só dispararem à vista e se fossem atacados, pois o grupo de observação poderia ficar entre fogos.

De novo o Marques se voluntaria para comandar, mas acaba por aceitar os argumentos da minha oposição incisiva e ficar.

Peço uma dúzia de voluntários com MG, HK, lança-róquete, dilagrama e restantes com G3 e avançamos agachados mas em passo rápido. A mata começa a rarear e o palmal está logo ali na frente, para lá de umas moitas. Várias vozes se ouvem agora distintamente, orientando-nos.

Em início de manobra de abertura, o fogachal rebenta com intensidade feroz, vindo de cima e de frente. Ouvem-se gritos e choros. O matraquear e os rebentamentos sucedem-se. Diante de mim depara-se me uma mulher e atiro-me para cima dela, só depois me apercebendo que traz um bebé às costas (vd. Post 3634 de 16 DEZ 2008 ).
…um impacto num carregador do cinturão e outro no guarda mão fazem-me em pensamento chamar pela Mãe em ajuda (curioso (?) mas verdadeiro). Na realidade foi um aperto do caraças.

O tempo abranda e parece parar em contraposição aos disparos… até que aquela escaramuça termina. São recuperadas quatro mulheres com dois miúdos bebés. Nenhum de nós foi ferido, felizmente não tendo o adversário tido a mesma sorte, pelos indícios.

O pessoal reagrupa e recomeça a progressão com moral em alta mas consciente da grande probabilidade de virmos a sofrer uma forte emboscada. O 1.º GCOMB vai agora na frente. Um dos miúdos volta e meia chora denunciando o nosso andamento e repara-se que é a mãe que o belisca nas pernas. Ameaça-se a mãe, mas os choros continuam com interrupções, denunciando-nos. A situação é gravosa e há quem lhe queira pôr fim. Intervenho e ameaço. A marcha continua.

Na frente segue o Fur Mil Rebocho (OE) e o 1.º Cabo Antunes (MG 42), ambos do 1.º GCOMB. A uma dezena de metros na orla de uma pequena clareira é avistado um elemento IN camuflado a apontar um RPG, que dispara de imediato no enfiamento da fila.

Há reacção mas o Antunes infelizmente não tem tempo de se esquivar e… cai. Estamos a 23SET71.

A emboscada desenvolve-se pela frente e pela direita. O tiroteio agiganta-se, uma das prisioneiras foge… o PCV volteia por cima de nós (Post 7067 - 01OUT10).

Os Enfermeiros Braga e Taia desdobram-se e fazem o que podem e sabem no apoio aos feridos. Valentes Homens.

Passado tempo que pareceu infinito, tudo fica calmo.

Nada bom de se ver… o malogrado Antunes tem uma granada de RPG que não explodiu (?) mas lhe causou a morte, enfiada no baixo ventre com a empenagem de fora. Digo que não explodiu porque penso que, se assim não fosse, pelo menos toda aquela zona do corpo teria desaparecido, o que não aconteceu .

Vem-me à cabeça a cena do miúdo e interrogo-me. Acabo por aceitar que procedi como devia, a consciência não me pesa e fico em paz.

Por momentos parece que vai haver algum descontrolo emocional perigoso e que é sustido com firmeza e segurança, com serenidade, ordens claras e incisivas .


Teixeira Pinto > Luís Faria junto a um helicanhão

Para além do Antunes, há seis feridos, alguns com gravidade. O voluntário Fur Mil Marques é um dos feridos, julgo que numa perna ou pé, felizmente com pouca gravidade, pelo que vai ser evacuado. Peço-lhe um carregador para substituir o que tinha ficado inoperacional e para trocar de G3 comigo, já que a minha passou a funcionar só tiro a tiro, talvez em resultado do impacto que apanhou, mas acabo por desfazer a troca.

Era a minha G3 que sempre me fora fiel, nunca me tinha deixado ficar mal, e até compartilhava com ela, amarrando-o junto do tapa chamas, um pequeno lenço vermelho que me tinham oferecido no Puto e que usávamos em operações e minas, entre outras ocasiões. Não iria ser por ela estar um tanto engasgada que a abandonaria. Superstições.

Efectuadas as evacuações e inspeccionada a zona ficamos a perceber que seriam uma vintena os convivas nefastos e que nem todos regressariam às suas lides normais!

O pessoal arranca em direcção à zona de recolha onde vai passar a noite, acabando por lá chegar sem mais contratempos. Teixeira Pinto e a nossa doce vivenda estão à espera, desta vez para carpir mágoas e procurar analisar o que se tinha passado.

Iria ser difícil esquecer esse dia.
Luís Faria
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 1 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7067: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (34): Em Teixeira Pinto, círculo quase fatal

Guiné 63/74 - P7171: (Ex)citações (102): Sensatez e rigor no Nosso Blogue (Manuel Marinho / José Belo)

1. Caros Tertulianos, fazendo uma revisão à correspondência que se vai acumulando, encontrei e achei por bem dar a conhecer, embora a destempo, estes dois comentários dos nossos camaradas Manuel Marinho e José Belo, ainda a propósito do P7117 de autoria do nosso camarada José Manuel Matos Dinis:


2. Diz Manuel Marinho no comentário que publicou no Poste 7130* em 16 de Outubro de 2010:

Caros camaradas
Este meu comentário engloba todos os textos dos camaradas sobre este assunto.

No mínimo o tema não acrescenta nada ao comum dos ex-combatentes, é a minha modesta e sincera opinião.

O caso concreto destas opiniões que começa por um grupo de camaradas intitulados “Grupo do Cadaval”, camaradas esses que muito respeito pelos excelentes textos com que enriquecem este blogue.

Mas uma coisa é eu respeitar e enaltecer as vossas qualidades intelectuais e outra bem diferente é não tecer comentário acerca do que me preocupa neles, que pretensamente são para analisar e comentar o referido texto, a pedido do camarada que o escreveu.

Dou um exemplo simples.

Se eu estiver organizado num grupo de 10 camaradas, escrevo um texto peço-lhes de seguida para apreciarem o referido texto, eles concedem-me esse pedido e a seguir são publicados os 10 textos de apreciação no blogue.

Tenho algumas reservas nesta questão de “grupos” porque quer se queira ou não, acabam por arredar da discussão do tema a esmagadora maioria dos camaradas, que são membros colaboradores do blogue, até pela simples formulação.

Este assunto é lá com eles “Grupo do Cadaval”!

O tema e a forma como está escrito é no mínimo arriscado fazer considerações porque são um exercício de teorias, que pretendem levar-nos a ter na devida conta e medida o que é o rigor dos nossos escritos e a sensatez nas apreciações que fazemos das escritas e leituras.

Mas da forma como é exposto, parece-me que se pretende dar aulas de comportamento e isso na minha modesta opinião não fica bem.

Faço desde já um apelo, escolham outro assunto mais abrangente e até mais polémico e vamos formar mais saber e conhecimento, com o maior rigor possível e já agora com muita sensatez.

Um grande abraço para todos vós
Manuel Marinho


3. José Belo dirigiu-nos esta mensagem em 16 de Outubro de 2010:

Caros Camaradas e Amigos.
Em corridas de um lado para o outro do Atlântico, provocadas por um pretensioso regressar ao "trabalho" por parte de um Reformado em idade já Bíblica, procurei ao chegar a Estocolmo, actualizar as leituras (sempre interessantes) de algumas das trocas de opiniões no nosso blog.

A propósito do Poste 7117 do Camarada José Manuel Matos Dinis "Sensatez e rigor no Nosso Blogue", que provocou alguns interessantes comentários, fiquei com a ideia, talvez errada, de ter havido por parte de alguns, uma pequena mistura involuntária, entre "conhecimentos pessoais" (e portanto totalmente subjectivos), com os chamados "conhecimentos académicos".

É que, quanto a mim, estes últimos apesar de organizados, orientados, programados, e sempre dirigidos por alguém... para algo, acabam também por ser mais pessoalizados do que, talvez, seria de desejar.

As variadas capacidades intelectuais, somadas aos diferentes temperamentos individuais, levam sempre a diferentes observações das realidades envolventes, isto, somando-se a zonas menos conscientes de cada um. O resultado é uma diversificação na aparente rigidez dos conhecimentos "académico-programáticos"... para não referir os individuais.

Será sempre complicado falar-se de "sensatez" quando as nossas capacidades individuais de absorver sinais, e reagir aos mesmos, são de tal modo condicionadas por factores internos. Procura-se uma universalidade onde esta não é passível de existir.

O meu simpático, e tão amigo, papagaio pode, e certamente conhece, em profundo e absoluto detalhe, a gaiola em que nasceu, cresceu, e (como muitos de nós) sempre viveu. Terá, portanto, em relação a esta, uma sensatez e rigor aparentemente universal. Mas, para outros milhões de papagaios na selva, os parâmetros da tal sensatez e rigor adquiridos, e a adquirir serão... diferentes.

É claro que, neste tipo de comentários como o que acabo de escrever, não se deve esquecer o clássico - Ne sutor ultra crepidam - (sapateiro, não passes do chinelo!).

Um grande abraço Amigo do
J.Belo
Estocolmo 16/10/10
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 14 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7130: (Ex)citações (101): Sensatez e rigor no Nosso Blogue (Vasco da Gama / José Brás)

Guiné 63/74 - P7170: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (8): Da Casa Gouveia aos Armazéns do Povo

1. Mais um texto do António Rosinha (, foto à esquerda), 




Data: 23 de Outubro de 2010 23:55
Assunto: A adaptação da Casa Gouveia (capitalismo)aos Armazens do Povo(comunismo)-Transformação muito imaginativa



A experiência socialista na Guiné com Luis Cabral, e a tentativa do mesmo socialismo com Vasco Gonçalves/Cunhal em Portugal, quase chegou a satisfazer a curiosidade daqueles que, como muitos de nós,  olhavam para as economias de leste, como fruto proibido pelo salazarismo.


A malta em África, sem televisão nem jornais, criou um hábito de fazer zapping no rádio transistor, que corria emissoras em português desde Argel, BBC, rádio Tirana, Praga, rádio Moscovo e Voz da América,  etc, mas dávamos muita preferência ao que vinha de leste.
De maneira que se adquiriu uma grande curiosidade e até alguma crendice no comunismo.
Um slogan que se ouvia muito dirigido contra Portugal nessas emissoras, em duplicado, uma emissão para Portugal e África e outra para Brasil e América, era chamarem "colonialistas, imperialistas e fantoches", que penso que seriam os brancos, os militares portugueses  e os africanos que estavam ao nosso lado.


Quando Norton de Matos em 1949 se candidatou a presidente da República, e desistiu in extremis, nas aldeias do interior a mesa de voto em geral era nas nossas escolas que hoje estão abandonadas. Os nossos velhotes, se não fossem comunistas ou do contra,  iam votar no Craveiro Lopes,  por aconselhamento do regedor, do presidente da junta, e do padre e talvez do professor.


Os que eram comunistas clandestinamente, que já tinham as melhores casas e as melhores propriedades classificadas e destinadas a ocupações por  eles próprios, votavam,  como se dizia naquele tempo, no contraPreviamente a PIDE encarregava-se de os engavetar e pô-los à sombra por uns dias se não acontecesse pior, como mais tarde vieram os relatos.
Em 1949, quem tivesse 10 ou 11 anos podia ficar com esta lembrança dos acontecimentos no mundo rural da metrópole.


Passados uns anos, em 1958, quem tivesse 20 anos, via os mais velhos votarem no Américo Tomás, aconselhados pela União Nacional, pelos chefes instalados, e pelos que tinham medo ao comunismo. Os que eram do contra, por exemplo,  uns colegas meus, votavam Humberto Delgado, porque aí o Salazar ia à viola e os funcionários que nunca eram aumentados, iam ganhar mais, diziam os menos politizados, e os mais politizados sonhavam que com o comunismo é que devia ser bom.


Falava-se que Humberto Delgado teve mais votos, mas houve falcatrua, e no caso de Angola onde se notava menos a presença da PIDE, havia euforia nítida a favor de Humberto Delgado. Mas uma ideia que ficou em toda a gente, em 1949 e em 1958, é que nem um general nem o outro eram anti-colonialistas declarados. Mas uma coisa hoje os livros confirmam o que se pensava nesse tempo, os socialistas/comunistas colaram-se a esses candidatos da oposição a Salazar. E já havia nos votantes do contra, muitos com ideias anti-colonialistas e pró-independência, no pessoal letrado das colónias.


Dizia-se que  essas eleições «abalaram os alicerces» do Estado Novo. Mas o grande abalo deu-se em 1968,  quando se partiu o pé da cadeira onde o Botas [, Salazar,] descansava , e passados poucos anos vimos, quem viu, a implantação do socialismo/comunismo na Guiné Bissau, com toda a naturalidade e sem a mínima oposição.


Em Angola e Moçambique não se pode dizer o mesmo, pois que o MPLA e FRELIMO tiveram os inconvenientes duma guerra bastante longa, e em Portugal deu-se o 25 de Novembro muito cedo, o que não deu a tranquilidade de que auferiu o PAIGC na Guiné e em Cabo Verde, onde o regime socialista se concretizou.








Guiné > s/d > Algures, em região sob controlo do PAIGC (ou "região libertada") > Um armazém do povo. Fonte: PAIGC. Segundo texto do Jorge Santos, membro da nossa Tabanca Grande, "O PAIGC promove a criação dos Armazéns do Povo por decisão tomada no 1º Congresso de 1964. O objectivo dos Armazéns do Povo, empresa geral de comércio de tipo estatal, era garantir o fornecimento de artigos de primeira necessidade à população das regiões libertadas e, por meio de troca, receber produtos agrícolas que deveriam em seguida escoar-se para o exterior, criando-se e desenvolvendo-se assim, progressivamente, a base de um comércio externo. O número de Depósitos dos Armazéns do Povo passou de 6, em 1964, para 16, em 1969". Fonte: PAIGC - História da Guiné e Ilhas de Cabo Verde. Porto: Edições Afrontamento. 1974

E aqui entram as teorias escritas de Amílcar Cabral, e a execução prática de Luis Cabral, implantando o regime socialista com o apoio dos países de leste e Cuba, mas também da anuição da cooperação portuguesa e de muitos países que não eram comunistas. E, quem tivesse vivido muitos anos à espera de ver o comunismo implantado em África, que fosse a Bissau, que ficava admirado como Luis Cabral adaptou o regime colonial-salazarista, ao regime que,  penso eu, era o regime marxista, ou soviético, ou resumindo, o regime que o Salazar combatia e Nossa Senhora de Fátima dizia que era mau.


Como Luis Cabral conhecia bem a Casa Gouveia e o semi-monopólio da mesma, apenas lhe passou a chamar Armazéns do Povo e passou a administração para o PAIGC. Todo o comércio que se praticasse, desde a mancarra exportada a tudo o que fosse importado, ou recebido por doações, passava pelos Armazéns do Povo.


Até parecia fácil como aquele regime (económico) funcionava, e Luis Cabral mostrava um àvontade na governação que parecia que tinha nascido para governar. No caso da produção agrícola interna e transportes fluviais, foi seguir simplesmente o procedimento do colon, que ele conhecia bem, e projectou um melhoramento dos acessos fluviais herdados do colonMandou reconstruir pontes cais de Caboxanque, Cadique, acostamento  de Impungueda, Binta, e várias rampas para canoas.


Fez acordos de cooperação com técnicos de meio mundo para melhorar a produção de arroz, cajú, etc, e uma fábrica de transformação de produtos agrícolas no Cumeré, e até já tinha uma estrada projectada de Antula para o Cumeré sobre o canal do Ipernal. Não havia produtos à venda nas lojas dos portugueses e libaneses, era só prateleiras vazias, e quando os Armazéns do Povo tinham produtos para venda, fornecia essas lojas de venda a retalho.
Mesmo a venda de porta a porta do produto das mulheres que apanhavam camarão, com uma pesca muito característica aproveitando as marés, essas mulheres estavam proibidas de vender esse camarão, porque era defraudar a economia guineense, pois só os Armazéns do Povo podiam pôr esse camarão no circuito comercial. Assim como também era proibida a venda na via pública de  cajú ou mancarra torrada  pelas mulheres e crianças,  pela mesma razão de ser um crime económico.


Pode haver alguem eventualmente que duvide desta minha afirmação, mas desde já aviso que assisti a polícias perseguir mulheres e garotas, que frente à UDIB vendiam pequenas medidas de mancarra e camarão,  que tinham que fugir para não perder o produto.
Tambem foram criados postos de controlo em pontos estratégicos de acesso às cidades, sendo que o mais célebre era junto a Safim, que controlavam a circulação de pessoas e bens.


Vendo  como o governo de Luis Cabral implantava o sistema comunista, num país em que o povo aceitava tudo o que lhe era imposto, inclusive as filas (formas) para adquirir o simples pão ou arroz, e até aceitava que os membros e famílias do PAIGC tivessem o privilégio de não ir para as filas do pão, era natural que houvesse algum tipo de revolta, mas tal não se manifestava. E até parecia não haver muita violência, pois que em cada fila, ou nas padarias, ou nas lojas, ou no mercado municipal, um único polícia  era o suficiente para manter a ordem.


O governo e o PAIGC, ao fazerem a adaptação do sistema colonialista/capitalista ao sistema comunista, de um momento para o outro, tinha que haver alguma capacidade quer de autoridade como de capacidade governativa. A autoridade, essa, facilmente se encontrava na força militar do PAIGC. Mas a capacidade governativa  donde vinha, se os guineenses eram na maioria sem escolaridade,  e os mais estudados como os antigos estudantes do império, eram em número muito reduzido? E uma grande parte de gente guineense com mais preparação, não se deixou engajar pelo projecto de Amilcar Cabral?


Sem dúvida, para mim evidentemente, que Luis Cabral baseou a equipa governativa em gente de Cabo Verde, que temos que reconhecer, pelo que acontece com a governação de Cabo Verde, estavam bem preparados. E com a saída dos caboverdeanos em 1980,  com o golpe de Nino vieira sobre Luis Cabral, foi o total descalabro. Porque com todos os problemas que houvesse com Luis Cabral e os caboverdeanos no governo, havia uma enorme credibilidade internacional que foi posta em causa, e a rotina governativa que já existia foi desfeita e não havia outra alternativa preparada.


Os caboverdeanos da maneira como vencem as dificuldades de governar uma terra como Cabo Verde, fariam coisas maravilhosas na Guiné, se não fossem as contradições que é evidente que existiam no interior do projecto do PAIGC. Vão morrendo alguns, Luis Cabral, Vasco Cabral, Nino Vieira, por exemplo, sem relatarem quais as virtudes e os defeitos daquele projecto, o que poderia explicar alguns acontecimentos antigos e modernos que se passam na Guiné, e poderia ajudar a resolver alguns problemas, se alguem publicasse a história dos bastidores de Conacri, Havana e Moscovo. Mas quem conhecesse o que pensavam os angolanos e caboverdeanos antes de a  luta armada de libertação começar, desde funcionários públicos, estudantes ou comerciantes, sabia que eles diziam e pensavam que se governavam muito bem se a Metrópole os deixassem governar. Isto no caso do PAIGC e MPLA, não me refiro à UNITA e UPA (FNLA).


Indepententemente de concordarmos ou não que os diversos países africanos deveriam ficar independentes das metrópoles naquelas circunstâncias da guerra fria dos anos 50/60 do outro século, penso hoje que Angola e Moçambique e a Guiné tinham gente capaz de fazer das suas terras uns países de fazer inveja e que sabiam governar. Claro que também se sabe que os que podiam fazer daqueles terras, países sem guerras e com harmonia e prosperidade poucos ficaram nessas terras, sendo que a maioria está na Europa, Brasil  e até na América e Canadá ou já morreram.


Menciono apenas Amílcar Cabral e Luis Cabral para dar o exemplo dos que podiam fazer coisas lindas. Mas em Angola e em Portugal conheci e conheço muitas figuras públicas que podia mencionar e que andam por aí no jornalismo e na política portuguesa.


Então quem há uns tempos atrás tenha trabalhado em empresas de construção civil em Portugal, via que era rara a empresa em que nas chefias não houvesse um engenheiro angolano ou moçambicano e técnicos de toda a ordem.


Mesmo na Guiné houve sempre muitos engenheiros e técnicos angolanos e moçambicanos nas empresas portuguesas que trabalhavam como portugueses porque fugiram da guerra e da política entre os movimentos vencedores(!) nas suas terras de origem. Poderia haver desentendimentos políticos e até algum tipo de ditadura como também houve em Cabo Verde, mas aqui entenderam-se sem haver guerra nem quente nem fria nem tiros nem assassinatos.


Mas sem dúvida que Luis Cabral quase conseguia realizar alguns dos sonhos de Amílcar: o socialismo e a unidade. Enquanto ele governou funcionava, pelo menos aparentemente, o socialismo/comunismo, penso que com todas as suas características, pelo menos no campo económico. Quanto à unidade que Amílcar falava, pelo menos etnicamente,  parecia alcançada, apenas a unidade com Cabo Verde se saberá o que se passou, quando a história dos bastidores for publicada por aqueles que viveram por dentro dos mesmos.


Como tive ocasião de ser cumprimentado em grupos de trabalho,  mais que uma vez pelo presidente da República da Guiné Bissau,  Luis Cabral, em que o ouvi falar e senti o entusiasmo com que estava dedicado à Guiné, acredito que por ele, todos os sonhos de Amílcar Cabral se concretizariam. 


Mas uma coisa que sem dúvida falhou no projecto do PAIGC, e de Luis Cabral, foi a falta de colaboração do povo, principalmente dos mais idosos que viviam de braços caídos durante todos aqueles primeiros anos de independência. Mas se com Luis Cabral o socialismo não entusiasmou, com Nino Vieira dilui-se bastante com gilas, industriais de madeira (madeireiros),  importadores de vinho, empreiteiros, etc., até que foi dado por findo mais ou menos em 1990, tranquilamente.


Este testemunho do que vi não é documentado nem quantificado, apenas fotografado de memória e que se não tivesse visto e estado nas filas de pão e de peixe, mais de meio ano sem comer batatas (das nossas), matar a fome milagrosamente na pensão da Dona Berta, e os guineenses da  Tecnil já não compareciam ao trabalho porque não tinham arroz (fome em familia), não é para condenar nem aplaudir o governo ou as ideias do PAIGC.

É mais uma tentativa para compreender que ideias e projectos se realizaram e/ou ficaram por realizar na luta tremenda do PAIGC, que fazendo juz a uma máxima  que se ouviu durante muitos anos "e a luta continua", e que parece que ainda hoje continua.
 
Até porque se a governação na Guiné é complicada, pessoalmente gostei de trabalhar e conviver com imensos guineenses, e apesar das dificuldades, a dividir por todos não custa nada, a Guiné é mais tranquila e viável que muitos países africanos e até se vive muito melhor (os guineenses são mais humildes) que em muitos países latino-americanos.
Eu, pessoalmente,  já trabalhei no Rio de Janeiro, junto à favela da Rocinha, em que,  chegando às cinco da tarde,  chegava junto a mim um segurança armado até aos dentes, e dizia: 
- Cara, si tu não larga tudo e vai, dentro de 5 minuto tu tá por tua conta!


Espero que um dia os guineenses oiçam a explicação porque tinha que ser como foi, e aí talvez aqueles que estão de braços caídos se entusiasmem.
Cumprimentos para todos,


Antº Rosinha


[ Fixação / revisão de texto / título: LG]

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Nota de L.G.: