segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12705: Notas de leitura (561): A descolonização da Guiné: Depoimentos de protagonistas - Parte 2 de 4 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Setembro de 2013:

Queridos amigos,
Vale a pena passar os olhos pelo todo da iniciativa dos estudos gerais da Arrábida sobre a descolonização da Guiné.
Desta feita, intervêm António Ramos, Ajudante de Campo de Spínola na Guiné, Embaixador Nunes Barata e o General Hugo dos Santos.
A direção dos trabalhos foi um tanto solta daí a dispersão excessiva das exposições, os comentários a atalhar as exposições e a distorcer o sentido, etc., etc. Mas ficaram ali registados depoimentos de três intervenientes importantes que aqui e acolá perderam o sentido do encontro e ressuscitaram questiúnculas velhas, despropositadas.
O balanço geral é muito bom e vale a pena ler tudo.

Um abraço do
Mário


A descolonização da Guiné: Depoimentos de protagonistas (2)

Beja Santos

Dando continuação às jornadas de trabalho que os “Estudos Gerais da Arrábida” dedicaram à descolonização da Guiné, e uma vez mais alertando os confrades para o site (http://www.ahs-descolonizacao.ics.ul.pt/guine.htm), propriedade do Instituto de Ciências Sociais onde constam na íntegra todos estes documentos, procede-se à resenha do painel que se realizou em 27 de Agosto de 1996 e onde depuseram António Ramos, oficial paraquedista que foi Ajudante de Campo do General Spínola na Guiné, Embaixador João Nunes Barata, alferes miliciano na Guiné onde também foi Chefe de Gabinete do Governador Spínola e delegado do MNE na Junta de Salvação Nacional e o General Hugo dos Santos (falecido em 2010), responsável pela criação do MFA em Angola, tendo igualmente integrado a delegação portuguesa que negociou a independência da Guiné.

Volta-se a chamar a atenção dos confrades para o facto de toda esta documentação enfermar de várias lacunas, intervenções impercetíveis, alguns cortes, conversas inaudíveis, etc., seja como for é incontestável que o coordenador Manuel de Lucena ajuntou alguns depoimentos de incontestável valia, e de leitura obrigatória para quem se interesse ou investigue o período da descolonização.

Nunes Barata e António Ramos trocaram impressões sobre o significado de “Portugal e o Futuro”, como sensibilizou a opinião pública para a questão da guerra e o imperativo das soluções políticas. Ramos confessa que Spínola chegou a ser tentado a vir com Comandos Africanos e forças paraquedistas para, dito por si “acabar com a fantochada à metrópole” isto na altura do Congresso dos Combatentes que ele e o seu círculo consideraram tratar-se de uma provocação da extrema-direita do regime. Dissertaram sobre o “fantasma da Índia”, que se avolumou de 1972 para 1973. Nunes Barata procurou realçar a coerência de Spínola com a figura da autodeterminação. Essa coerência estava diretamente ligada à aquilo que Spínola entendia ser necessário dar voz à população da Guiné na gestão dos problemas fundamentais, e que levara a criar os Congressos do Povo. Ele repetia sem cessar que era preciso entregar “A Guiné aos Guinéus”. Barata disse mesmo que Spínola não aceitava que a Guiné fosse governada por cabo-verdianos, havia a consciência que estes desempenhavam a função de intermediários entre o branco e a população negra, exerciam autoridade, eram símbolos da administração, exerciam o poder com imensa autoridade e muita rispidez.

Barata acrescentou que quando Spínola descobriu que não havia solução militar à vista tentou estabelecer contactos com Dakar e por esta via com o PAIGC. Disse que os primeiros contactos tinham sido feitos pelo chefe da delegação da PIDE/DGS, inspetor Fragoso Balas e por um comerciante de Pirada, Mário Soares. Barata acompanhou duas vezes Spínola ao Senegal, a primeira para um encontro com o ministro senegalês dos Assuntos Parlamentares e a segunda com Senghor, em Maio de 1972, em Cap Skiring. Spínola falava de uma progressiva autonomia, indicou um prazo de 15 anos, Senghor achou que, na situação que as coisas se encontravam, o prazo era talvez excessivo, sugeriu um encontro com Amílcar Cabral. Como se sabe, Marcello Caetano recusou dar luz verde a este encontro. Mais adiante, Barata fala da sua deslocação com Carlos Fabião a Paris para se encontrar com Senghor, em 1 de Maio, de 1974. Senghor não escondeu a sua preocupação de que o PAIGC viesse a ser totalmente dominado pela Guiné Conacri. A Guiné-Bissau ia averbando apoios fundamentais na comunidade internacional, de Julho a Agosto, o Brasil, o Japão, os escandinavos, a Austrália e a Espanha reconhecem a independência do país. A tese da autodeterminação fica para trás, tornou-se um arcaísmo. Em 3 de Agosto, Kurt Waldheim, secretário-geral da ONU diz a Spínola que a tese da autodeterminação já não é realista, a independência da Guiné era inevitável.

Ramos e Barata dissertam livremente sobre o impacto do assassinato de Amílcar Cabral e Ramos recorda o briefing realizado logo que foi divulgada a notícia, Spínola mostrava-se acabrunhado, desalentado: “Estragaram-nos o trabalho dos últimos quatro anos”, terá dito. A conversa é por vezes saltitante, tanto se fala de Rafael Barbosa como agente duplo, sobre o grau de infiltração do PAIGC nas milícias africanas, críticas a Alpoim Calvão na operação Mar Verde onde se teria revelado um planeador com poucos conhecimentos das operações terrestres, depois discutem o conteúdo das reuniões de Dakar, Londres e Argel, as relações afetivas de Spínola com a Guiné e a inevitabilidade do PAIGC muito cedo, a seguir ao 25 de Abril se ter assenhoreado da situação, tendo sido, com escassas exceções, um cumpridor do estipulado na reunião de Mejo, onde se convencionou o recuo do dispositivo militar português e a gradual ocupação das povoações e aquartelamentos pelo PAIGC. Aqui e acolá estes dois intervenientes proferem juízos altamente discutíveis, Ramos chega a dizer que mais de 50% dos oficiais milicianos estavam ligados a grupos de esquerda na metrópole, uma consideração sem qualquer fundamento ou demonstração.

Na sua intervenção, o General Hugo dos Santos referiu o período final da descolonização da Guiné, recapitulou as teses de autodeterminação de Spínola e como estas foram ultrapassadas pelo bom entendimento entre as forças militares portuguesas e as do PAIGC. Referiu como as diretivas previstas no Acordo de Argel foram quase exemplarmente cumpridas graças à comissão mista, houve raras exceções como a entrada em Buruntuma e a tentativa de um comandante do PAIGC em bombardear com mísseis terra-terra as tropas portuguesas. Referiu por alto as reuniões do MFA, sobretudo a reunião de 1 de Julho que teve a participação de 800 militares e onde se instava o Governo Central a reconhecer a independência da Guiné, terá sido o MFA da Guiné a determinar não só o quadro geral da descolonização da colónia como tudo aquilo que viria a ser aplicado nas outras. Discutiu-se igualmente o que terá levado Spínola a ter querido visitar a Guiné, logo em Maio e como o MFA se opôs. Manuel de Lucena observou: “O que se julgava principalmente na ida do General Spínola à Guiné não era nenhuma modificação do estado de espírito das populações, mas uma modificação das relações de força políticas locais – da tropa portuguesa e do PAIGC que tinha aparecido”.

A seguir o embaixador Nunes Barata fez uma longa intervenção sobre a descolonização de Angola e só no termo da jornada de trabalho é que se voltou à Guiné para debater os encontros impulsionados por Marcelo Caetano antes do 25 de Abril com os movimentos de libertação. A despeito de amplas falhas que são notórias no documento, estes três protagonistas da descolonização da Guiné prestaram um importante serviço com os seus depoimentos, mesmo quando cederam às emoções e fizeram ressaltar velhas questiúnculas pessoais.
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Nota do editor

Primeiro poste da série de 7 de Fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12688: Notas de leitura (560): A descolonização da Guiné: Depoimentos de protagonistas - Parte 1 de 4 (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P12704: A guerra vista do outro lado... Explorando o Arquivo Amílcar Cabral / Casa Comum (10): O massacre do chão manjaco: acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry, de 11 a 13/5/1970: Transcrição, fixação de texto e notas de Jorge Picado

1. Mensagem,  enviada com data de 28 de janeiro último, pelo Jorge Picado [, foto à direita: ex-cap mil,  CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72 . . aos 32 anos, pai de 4 filhos, engenheiro agrónomo, ilhavense]:
Amigo Luís

[...] Olha, quanto às minhas pesquisas que vou fazendo,  sempre que posso,  no Arquivo Amílcar Cabral, descobri numa acta de um Conselho de Guerra as referências do PAIGC ao caso dos "3 Majores e do Alf Mil Mosca".

Não sei é retirar para publicação as referências.

Lê e vê se tem algum interesse. Entre parenteses rectos estão achegas pessoais que fiz. Jorge Picado


2. Reprodução, com a devida vénia, do documento Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry. 

 Transcrição, fixação de texto e notas pessoais [, dentro de parênteses retos, em itálicos] de Jorge Picado, que, como se sabe, também foi oficial do CAOP1, tal como os malogrados  Major Magalhães Osório, Major Passos Ramos, Major Pereira da Silva e Alferes Mosca


Para ver e ampliar o original, clicar aqui:

Conselho de Guerra: reuniões de 11-05-1970 a 1 13-05-1970: Acta das Sessões  (25 pp.)

Casa Comum

Instituição: Fundação Mário Soares

Pasta: 07073.129.004

Título: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry

Assunto: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra, de 11 a 13 de Maio de 1970, manuscrita por Vasco Cabral. Membros Presentes: Amílcar Cabral, Aristides Pereira, Luís Cabral, João Bernardo Vieira (Nino), Osvaldo Vieira, Francisco Mendes, Pedro Pires, Paulo Correia, Mamadu N'Djai, Osvaldo Silva, Suleimane N'Djai 

Secretário: Vasco Cabral

Data: Segunda, 11 de Maio de 1970 - Quarta, 13 de Maio de 1970

Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Relatórios 1960-1970.

Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral

Tipo Documental: ACTAS

Direitos: A publicação, total ou parcial, deste documento exige prévia autorização da entidade detentora.

Citação:
(1970-1970), "Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34125 (2014-2-9)


“S. G. [Secretário Geral, Amílcar Cabral]- … A situação mudou também por causa da acção levada a cabo no Norte contra alguns oficiais superiores, em conseq[uência] da acção combinada das n[ossas] forças armadas, da segurança e da Dir[ecção] do P[artido]. 

A liquidação dos 3 majores, 1 Alferes e alguns outros elementos (2.º alguns cam[aradas] - um capitão e um Chefe da PIDE) [Não havia outros Of, mas sim mais 3 guineenses. Se algum era da PIDE, desconheço.], mostrou que era falsa a propaganda dos tugas [termo depreciativo para designar os Portugueses] de que estavam à vontade na n[ossa] terra e Por outro lado, os tugas estavam convencidos de que conseguiam comprar a n[ossa] gente. 

Toda a política de Spínola [COMCHEFE e GG], em conseq[uência] destas n[ossas] acções, está posta em causa. E para toda a gente, tanto dentro como fora da n[ossa] terra, o n[osso] prestígio aumentou bastante e até para o n[osso] inimigo. Sobretudo esta liquidação dos oficiais superiores, contribuiu para isso. O tuga, o Português, pensava antes que nós todos éramos cachorros. O tuga agora já se convenceu do contrário… Os nossos cam[aradas] foram capazes de enganar, discutir com eles, convencê-los, apesar da sua imensa experiência e capacidade e liquidá-los... 

Através [de] certos cam[aradas] que estão em CANCHUNGO, os tugas tentaram ligações com eles, com vistas a desmobilizar a n[ossa] gente. Tentaram, servindo-se de elementos do Fling [Frente de Libertação para a Independência Nacional da Guiné, fundada em Dakar-Senegal em 1962, opositora do PAIGC], portanto a um nível mais baixo, desmobilizar a n[ossa] gente. Sem resultados. As conseq[uências] foram a prisão de 4 dirigentes do Fling. Tentaram contactar Albino, Braima Dakar [Era um dos 2 componente do Comando Geral da Zona BIAMBI-NAGA-BULA, fazendo também parte do Comando Conjunto da Frente BIAMBI-CANCHUNGO] e outros. E na região de Quínara. E tb [também] com gente na periferia da n[ossa] luta: Laí, Pinto e João Cabral. 

Tentaram a ligação com André Gomes e Quintino [O 1.º era um dos 3 responsáveis pela Zona de NHACRA, um dos 3 componentes do Comando Conjunto da Frente NHACRA-MORÉS, um dos 23 componentes do Comité Executivo da Luta (CEL) e por inerência também um dos componentes do Conselho Superior da Luta (CSL). O 2.º, Quintino (Vieira), era o responsável pela Segurança e Controle (SC) do Sector Autónomo de CANCHUNGO, no Comité Regional da Região Libertada a Norte do Geba (CRRLNG) e por inerência igualmente membro do Comité Nacional da Região libertada a Norte do Geba (CNRLNG)].

 Eles avisaram a Dir[ecção] do P[artido], para a interrogar. André Gomes deu mais uma prova de confiança ao P[artido]. Ele mesmo supunha que os tugas queriam desertar. Só depois é que se viu que o [que] queriam [era] desmobilizar a n[ossa] gente. O S.G. [ Secretárioi Geral, Amílcar Cabral] deu o seu acordo à proposta, mas pediu que agíssemos depressa.

 Luís Correia [Responsável pela SC do Sector do OIO no CRRLNG e igualmente do CNRLNG, além de membro do CSL e creio também do CEL], pôs-se, por sua própria iniciativa, em contacto com os cam. [camaradas] da zona. Lúcio Tombô [Ou Tombon, um dos comandos da Zona de BULA] tb [também] foi envolvido na combinação. Ele pôs-se em contacto com os tugas, mas quem devia falar era Braima Dakar que jogou um papel de defesa do P[artido]. 

Os tugas escreveram cartas amáveis e respeitosas aos cam[aradas], num grande namoro. Deram-lhes grandes presentes. Propunham que os guineenses deviam ir substituir os cabo-verdianos, de quem já tinham feito uma lista negra de 30 e que deviam ceder os seus lugares a guineenses. Deram presentes vários: conhaque, whisky, rádios, relógios, panos para as mulheres, cigarros bons, etc. Encontraram-se 5 vezes. Na 4.º vez esteve presente o Governador, que apertou a mão, tirando a luva, do n[osso] cam[arada] André Gomes. (Amílcar lê uma das cartas de um major, Pereira da Silva, a André Gomes). 

No dia do encontro deviam vir os n[ossos] cam[aradas] chefes e estava prevista a vinda do próprio Governador. Os cam[aradas] vieram de facto acompanhados das suas armas. Apareceu mesmo o Luís Correia e eles já sabiam da sua presença. Para não desconfiarem, disseram-lhes que o Luís Correia estava presente e era um alto dirig[ente] do P[artido]. Durante as conversações com os tugas, foi decidido pararem os bombardeamentos aéreos, e os combates. Isso aconteceu de facto: os nossos camar[adas] pararam também certas acções. (Amílcar lê uma outra carta do Major Mosca). [Mosca não era Maj, mas sim Alf Mil]. 

Durante as conversas, Braima Dakar, aproveitou para fazer certas exigências. Pediu a libertação de seu pai, a libertação de 2 cam[aradas] (Claude e José Sanhá) [Este 2.º elemento, antes de 1964 já comandava guerrilheiros numa Zona do Norte e depois de libertado foi novamente integrado pelos responsáveis da Frente BIAMBI-CANCHUNGO, sem que tivessem consultado a Direcção do Partido, acto entretanto criticado pelo S.G. na reunião alargada da Direcção Superior que teve lugar em Conakry de 12 a 15ABR70 e onde foi apresentada e aprovada uma nova Estrutura do Partido e onde este elemento em causa foi confirmado como um dos comandantes da Zona de BIAMBI, da Frente BIAMBI-CANCHUNGO] e foram mesmo soltos (já cá estão). 

Durante as tréguas, os cam [aradas] levantaram minas na estrada de Bula-Binar. Mesmo assim, houve uma emboscada em Biambi, aos tugas, na qual, 2.º uma carta apanhada, de um dos majores, afirmam que morreram 4 tugas. Também dão notícia dos ferimentos graves que sofreu um capitão que estivera com eles numa reunião, ao tentar detectar minas: perdeu um braço e uma das vistas. Salienta ainda o facto de ter havido nas nossas bases, vários camaradas que começavam a protestar contra as ligações que estavam a ver com os tugas. Alguns disseram que se isso continuasse se iam embora. Isto é tb [também] uma coisa muito importante, porque mostra a fidelidade desses cam[aradas ao P[artido] (eles não estavam ao corrente das coisas).

Nino – Saliente a import[ância] de os n[ossos] cam[aradas] terem levado à certa grandes homens dos tugas. Isso foi porque os tugas nos consideram como cachorros. Os tugas sentem hoje qual é a n[ossa] força, tanto moral como política.

Amílcar – Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos n[ossos] cam[aradas] do Norte. É a 1.ª vez que numa luta de libertação nacional se mata assim 3 majores, 3 oficiais superiores que, nas condições da n[ossa]  luta, equivale de facto à morte de generais…“.


3. Esclarecimento posterior do Jorge Picado [12 fev 2014, 23:18]


Amigo Luís:

Sobre o conteúdo transcrito nas actas desse Conselho de Guerra, apenas encontrei motivo de interesse nessa parte que transcrevi sobre o caso dos "3 Majores e do Alf Mil do CAOP 1" e que se resumiu a esse pedaço.

Quanto ao resto são questões variadas internas do PAIGC sem qualquer interesse para a nossa temática da Guerra.

Abraço, Jorge.
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Nota do editor:

Último poste da série > 27 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12349: A guerra vista do outro lado... Explorando o Arquivo Amílcar Cabral / Casa Comum (9): Em setembro de 1964, a situação estava feia na antiga Zona 7 do PAIGC, segundo carta do 'Nino' Vieira [Marga]: (i) falta de homens, material, medicamentos e alimentos; (ii) 1 guerrilheiro deserta e apresenta-se em Bambadinca; (iii) as NT desembarcam no Rio Corubal, na Ponta Luís Dias, e avançam até ao Poindom e à Ponta do Inglês, provocando baixas entre a população e a guerrilha; (iv) 300 fulas da zona leste recebem instrução militar em Bissau, mas... (v) o moral da guerrilha parece ser... alto, estando disposta a ocupar militarmente o Saltinho e o Xitole (o que, como sabemos, nunca virá a acontecer até ao fim da guerra)

Guiné 63/74 - P12703: CISMI - Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria, Tavira, 1968: Guia do Instruendo (documento, de 21 pp., inumeradas, recolhido por Fernando Hipólito e digitalizado por César Dias) (1) : Parte I (1-6 pp.)



Tavira > CISMI (Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria) > 1969  > Encostas do Rio Gilão (ou melhor Rio Séqua, pois que o Gilão só começa depois da ponte romana...)  > 1º Pelotão da 2ª Companhia > O Carlos Silva, natural de Gondomar, foi um dos muitos camaradas que, tendo feito a recruta no RI 5, Caldas da Raínha, foi frequentar o  2º ciclo do CSM, no no CISMI em Tavira, neste caso para tirar a especialidade de armas pesadas de infantaria (canhão sem recuo, morteiro 81, metradalhadoras pesadas Browning e Breda...). Esteve lá, de 10/4/1969 até 27/6/1969. Passou ainda pelo RI 10 (Aveiro) onde foi promovido (e "praxado") como 1º cabo miliciano até ser mobilizado para a Guiné. Embarcou no "Ana Mafalda" a 17/9/1969, com os seus camaradas do BCAÇ 2879. Esteve na região do Oio, Setor de Farim.

Foto do Carlos Silva, inserida na sua página e aqui reproduzida com a devida vénia.












As seis primeiras páginas, não numeradas, do "Guia do Instruendo", usado no CISMI - Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria, em Tavira, na altura em que o César Dias lá fez a recruta e a especialidade (sapador) (2º semestre de 1968). O documento, de 21 páginas, era policopiado a "stencil". O César Dias mandou-nos  o documento em "power point", com 21 "slides". As páginas foram convertidas em formato jpg. O original foi-lhe dado pelo seu camarada de recruta,o Fernando Hipólito, que foi depois mobilizado para Angola, enquanto o César foi parar à Guiné.

Imagens (digitalizadas): © César Dias (2014). Todos os direitos reservados.[Edição: L.G.]


César Dias, Mansoa, 1970

1. O César Dias [,ex-fur mil sapador, CCS/BCAÇ 2885, Mansoa, 1969/71, foto à esquerda, ]  mandou-me ontem a seguinte mensagem:


Boa noite, Luis

Como tens falado de Tavira, aqui nos meus papéis e fotos encontro coisas que serão inéditas, penso eu. Esta é uma delas, um documento histórico, apanhado na altura num cesto de papéis. Um abraço, César


2. Resposta de L.G.`

Camarada César, é uma preciosidade roubada à "cesta secção"... Dou-te os parabéns por a teres salvo... Ou melhor: dou os parabéns ao teu (e nosso) camarada Fernando Hipólito que te fez chjegar o documento...  Tenho uma vaga ideia de também ter recebido (ou lido), no CISMI,  um exemplar do "Guia do Instruendo", quando lá fiz  a minha especialidade de armas pesadas, na mesma altura que tu (set/dez 1969). Vou publicar o documento em partes numa série com o teu nome...  Outra questão: tens mais fotos da instrução, do nosso tempo ?  São fotos raras... Se sim, digitaliza e manda, por favor!... Um alfbravo miliciano. Luis



Tavira > CISMI > Almoço do dia do Juramento de Bandeira > Meados de 1968 > Tony Levezinho de lado (elipse encarnada), César Dias,  de frente (a azul) e, em segundo plano, o Fernando Hipólito (a amarelo). O Hipólito, que descobriu o César Dias através do nosso blogue, foi mobilizado para Angola. O António Levezinho, por sua vez, vou conhecê-lo, mais tarde, no Campo Militar de Santa Margarida, nos princípios de março de 1969,  aquando da formação da nossa companhia (independente), a CCAÇ 2590/CCAÇ 12. Foi um dos grandes amigos que eu fiz na Guiné.

Curiosamente, não sei onde é que ele tirou a especialidade (atirador de infantaria). O Cèsar ficou no CISMI, para o 2º ciclo do CMS. Foi nessa altura que estivemos juntos. E, depois, na Guiné, estivemos perto, mas nunca nos encontrámos: ele, em Mansoa; eu (e o Tony) em Bambadinca. Ele partiu para a Guiné em 7/5/1969 e nós,  duas semanas depois... No mesmo navio, o Niassa. (LG)


Foto: © César Dias  (2010). Todos os direitos reservados

3. Comentário ao poste P12673, assinado pelo César Dias [, foto atual à direita] : 

Luís, também eu estive 6 meses em Tavira, na recruta (3ª Companhia) e na especialidade de Sapador ( 2ª Companhia), e pelos vistos estivemos no mesmo turno, com o tal tenente Esteves do qual me recordo como se divertia ao anunciar à sexta feira os cortes nos fins de semana:  "O militar é a parte válida do povo e como tal não há fim de semana para ninguém".

Eu penso que ficámos retidos algumas vezes porque foi nessa altura que Salazar caiu da cadeira.  Sobre esse Alferes [de que falas], lembro-me que era algarvio e também dava instrução de provas fisicas ao meu pelotão, Deves-te lembrar do meu pelotão, pois andavam todos com um estropo de corda ao ombro, fazia parte da farda.

Tudo o que referes avivou-me a memória já muito fraca, mas foi a parte de Tavira que conheci.



Tavira > Quartel da Atalaia > Antigo CISMI, hoje RI 1 > 1 de fevereiro de 2014 >  Belo exemplar da nossa arquitetura militar, fica situado na Rua Isidoro Pais. Imóvel em vias de classificação,segundo o excelente síio da Câmara Municipald e Tavira, de onde  se extrai, com a devida vénia, o texto abaixo reproduzido.

Foto: © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados


(..) "Quartel da Atalaia (...): Por volta de 1780, devido à transferência do Regimento de Infantaria de Faro para esta cidade, aumenta o número de efetivos militares em Tavira. O facto leva o Governador e Capitão-general do Algarve, Nuno José Fulgêncio de Mendonça Moura Barreto, a exercer a sua influência junto da corte no sentido de se construir um quartel em Tavira, capaz de alojar condignamente o regimento da cidade.

O Quartel da Atalaia, um dos mais antigos do país, é iniciado em 1795 com o beneplácito de D. Maria I, de acordo com a inscrição lapidar que encima o arco da entrada principal. A construção foi interrompida pouco tempo após o seu início, sendo apenas retomada em 1856, depois de atenuados os efeitos de uma conjuntura politica e economicamente desfavorável, de invasões francesas, de permanência da corte no Brasil e de convulsões politicas que conduziram à implantação do Liberalismo e à Guerra Civil. 

Durante este interregno os militares acolhiam-se em casas particulares até que, em 1835, na sequência da extinção das Ordens Religiosas, é entregue ao exército o antigo Convento de Nossa Senhora da Graça. Aí, rapidamente adaptaram os militares as antigas estruturas religiosas a aquartelamento militar.

Por sua vez, o Quartel da Atalaia, ainda por concluir, servia de hospital de coléricos civis por ocasião da peste que se abateu sobre a cidade em 1833. O edifício ficará concluído somente nos primeiros anos do século XX, só então para lá se transfere a guarnição de Tavira.

Trata-se de um rico exemplar de arquitetura militar. Apresenta planta retangular composta por corpos ligados em torno de um amplo pátio central interior. O maior interesse reside na fachada principal, constituída por um solene corpo central que forma a porta de armas, dois pavilhões de telhado simples de quatro águas com mansardas, terraços cercados por balaustrada e, nas extremidades, torreões com duplo telhado. 

Embora o recorte dos vãos, de inspiração barroca, revele o gosto cortesão próprio da época de D. Maria I, poderá estar aqui presente a lição da arquitetura pombalina da recém-fundada Vila Real de Santo António, em cuja implantação colaborou o engenheiro militar José Sande de Vasconcelos (1730 - 1808), destacado para o Algarve cerca de 1772 e possível autor do projeto deste quartel.

No decurso do século XX, o edifício sofre algumas alterações funcionais. Assim, em 1950 é construído um novo refeitório, em 1954 é calcetado o pátio da parada e em 1970 é adicionado um segundo piso nas alas laterais, para servir de novas casernas." (...)

Guiné 63/74 - P12702: Parabéns a você (690): José Brás, ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 1622 (Guiné, 1969/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 8 de Fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12693: Parabéns a você (689): Constantino Neves, 1.º Cabo Esciturário do BCAÇ 2893 (Guiné, 1969/71)

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12701: Crónicas higiénicas (Veríssimo Ferreira) (1): A raiva que vai cá por dentro

1. Em mensagem do dia 5 de Fevereiro de 2014, o nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3 e Bissau, 1965/67) enviou-nos a sua primeira Crónica Higiénica.


CRÓNICAS HIGIÉNICAS

1 - A RAIVA QUE VAI CÁ POR DENTRO

Já vai sendo hábito ficar piurso e contra tudo o que aparece escrito, dando loas aos IN's que fui obrigado a combater na Guiné. Daí que e a propósito da "A minha homenagem a alguns dirigentes do PAIGC", dum nosso distinto escritor num post que foi há dias publicado no nosso blogue, manifeste aqui e mais uma vez meu desacordo quanto ao facto de se elogiarem tipos que ajudaram a matar tantos dos nossos.

O camarada fala assim porque e também como diz, só conheceu Bissau, não esteve ao lado de vivos agora, mortos daí a segundos, não apanhou pedaços de corpos dos nossos. Mas entendo que a história tem de ser contada, só que e à semelhança do que agora acontece quando me aparecem notícias (onde falam, falam falam ...de política ...de futebol) quer nos jornais, quer nas TV's e até no face, mudo de canal e não vejo não senhor.
É que não sou 100% de rancores nem de vinganças... sou apenas 98%, mas enervar-me, não vou nessa. Podem não me tratar bem (mas gosto) só que quando me tratam mal... afino com'ó caraças.

Nesta provecta idade dos 71 anos (faço 72 a 21 de Fevereiro - tomem nota, colectem-se e mandem a prenda), não estou disposto a aturar madurezas, NÃO SENHOR.

Continuando: a bestialidade terrorista de que falei na crónica anterior, foi uma das formas que tivemos de combater pois que "semeavam" minas por tudo o que era sítio, onde pensavam que os militares Portugueses, viessem a passar e nem se preocupavam se matavam soldados, sargentos ou oficiais. Dizia o IN, que não estava a combater o Povo. E então se não éramos Povo, éramos o quê?
Se tinham tantos apoios doutros países, porque não avançar por aí politicamente? Esta de "terroristas bons" nunca me passaria pela cabeça, mas tal como o ditado abaixo, direi: deixa andar porque:
"MUCHOS PERROS MATAN A UNA LIEBRE. PERO LA FECUNDIDAD DE LAS LIEBRES ES SUPERIOR A TODOS LOS ESFUERZOS DE LOS PERROS" - (sic, Hans Hellmut Kirst, no livro OS LOBOS)

Pois é... também sei castelhano, olaré!
Este é o inicio duma fantástica história, que continua a fazer-me gostar de ler. Está roto, está sublinhado, quando o comprei passei oito horas seguidas e avidamente desejoso de conhecer o final... para além das mais trinta ou mais vezes que o tenho vindo a visitar e sempre ali encontro novos motivos para o considerar o melhor dos melhores.
No fundo trata-se duma história passada numa pequena aldeia alemã e nos palhaços que apoiaram a ascensão, auge e queda do nazismo.

E por falar em nazis: "DESPACHÁMOS MILHARES".

Pôssaras, pôssaras !!! Mais uma informação apensa no nosso blogue. Foi em 1968, diz com foto e tudo.

Está provado que não foi verdade, mas sendo-o fiquei tão triste que tropas assim destemidas, não tenham lá estado de Agosto de 1965 a Abril de 1967, pois que estes sim e não eu como tenho afirmado, teriam pacificado tudo e mais alguma coisa.

A este propósito deixem-me que recorde com muita saudade, um locutor da Emissora Nacional, cujo nome se me passou, dado o meu alzheimeirado estado, que ouvia todas as manhãs às oito e que começava assim: "Alô gaivotas do Tollan" e que tinha também um programa à noite onde partia discos mas antes dizia: "Este disco não é intocável mas também não é inquebrável" ...Logo a seguir ouvíamos o ruído do escaqueirar do dito.

O que quero dizer é: Que pena não podermos "partir" este ... Cá para mim começo e desconfiar que e perante tantos mortos e só com um pelotão, o gajo que escreveu esta coisa mal cheirosa, deve ser um dos carniceiros de Treblinka (ter-se-á enganado e trocou os nomes das terras) e que escapou às malhas dos caçadores israelitas.

Mas lá, que me fartei de rir... fartei.

Veríssimo Ferreira,
3 de Fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12700: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (46): Ocupação dos tempos livres

1. Em mensagem do dia 23 de Dezembro de 2013, o nosso camarada Belmiro Tavares (ex-Alf Mil, CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), fala-nos da ocupação dos "tempos mortos" e da actividade da sua Unidade para combater o stress do pessoal.


HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DE BELMIRO TAVARES

46 - Ocupação dos “Tempos Livres”

Uma das primeiras regras ordenadas pelo nosso capitão versava o tema dos “tempos mortos”; os oficiais foram “aconselhados” a acompanhar os seus soldados o mais possível e de sol a sol para que eles não se isolassem cada um em seu canto pensando em coisas tristes.
Podiam jogar a tudo e a nada; podiam escrever à namorada, à família, aos amigos e às madrinhas de guerra; era permitido contar anedotas, cantar e até assobiar; enfim: deviam estar sempre ocupados com qualquer tarefa.

Uma coisa era absolutamente proibida: passear em Bissau enquanto por lá estivemos, para não serem negativamente influenciados pelos boatos e aldrabices que circulavam vivamente entre a tropa da capital para que não partissem para o mato já “vencidos”.

Chegámos ao mato a 29 de Junho, dia de S. Pedro, à tarde; ao cair da noite, um pelotão fez uma caminhada de 3/4 km para incendiar umas “moranças”, já abandonadas (fogueiras de S. Pedro) avisando os independentistas da nossa chegada e das nossas boas intenções.

Iniciou-se logo, com grande azáfama a limpeza e a defesa do aquartelamento e o alojamento de todo o pessoal. Estas tarefas, porém, não se sobrepunham à actividade operacional.
Ao quarto dia, fizemos a primeira visita à “casa” do inimigo: fomos recebidos a tiro; houve mortos e feridos (do lado deles) e uma aldeia foi riscada do mapa.
O quinto dia foi célebre! Um imponente “baptismo de fogo” (ponham imponência nisso!) que nos marcou positivamente para o resto da comissão. O chamado pelotão de acompanhamento foi “desmantelado”; o pessoal (e respectivas armas) foi distribuído pelos outros pelotões que passaram a chamar-se “grupos de combate” (GComb).

A partir do baptismo de fogo, em dias alternados, dois GComb actuavam em qualquer recanto da zona. Ao fim de duas semanas (aproximadamente) alterávamos o ritmo actuando em dois dias consecutivos… para “enganar” o in., quebrando rotinas.

- Domingos e feriados eram diferentes… apenas porque se hasteava a bandeira.
- Nos dias livres (saída para o mato) continuávamos a preparar a defesa e a beneficiar as instalações.
- A Gulbenkian ofereceu-nos uma pequena biblioteca.
- De vez em quando, líamos jornais de há três ou quatro meses… mas líamos!
- Sempre que possível também líamos uns livros. Eu levei apenas os dicionários de alemão (correspondia-me com uma qualquer Merkel) e Os Lusíadas, o meu livro de cabeceira.
- Em Bissau só havia livros de guerra: J. Larteguy e L. Uris; comprei do que havia.
- Também dávamos lugar à música; a rádio Bissau emitia durante algumas horas em dois períodos; podíamos ouvir dezenas de vezes por dia o “Tango dos Barbudos” o disco que todos pediam – incrível!
- Também pescávamos, caçávamos e petiscávamos com os amigos; Mais tarde tivemos nativos (as) que regressaram no exílio forçado no Senegal; elas vieram embelezar as imediações do quartel
- Dedicámo-nos a construção civil:
- Reconstruímos pontes – beneficiámos estradas e picadas (uma picada com doze quilómetros passou a estrada)
- Construímos, partindo do nada, duas pistas de aterragem (uma era o aeroporto internacional de Binta)
- Ajudámos a reconstruir duas tabancas;
- Construímos o nosso estádio e a nossa igreja;
- Demos nomes às ruas (avenida Marginal, Avenida Capitão de Binta, Avenida do aeroporto, Rua Pathé Baldé, Largo “tomada da pastilha”, Rua 4 de Julho, etc.)
- Construímos uma escola para os miúdos “retornados”
- “Contratámos um professor (que não fazia greve) para leccionar a primária

NOTA: Para grande surpresa nossa, os alunos daquela escola, descalços e semi-nus, alinhados por alturas, assistiram ao hastear da bandeira e cantaram, orgulhosamente, o Hino Nacional (ainda com canhões).
Nesse dia, a nossa verde/rubra (ainda tinha o vermelho) “tremeu”, heroicamente, por ter mais aqueles dedicados filhos.


Reprodução das páginas 4 e 5 do trabalho do nosso camarada José Eduardo Oliveira (JERO), ex-Fur Mil Enf da CCAÇ 675, intitulado "O Sabre - 47 anos depois do regresso - Ontem e Hoje"

- Durante cerca 6/7 meses funcionaram eficientemente as aulas regimentais (prova que a nossa CCAÇ 675 se comportava como um grande Regimento) e trinta e duas praças, com apenas a 3ª classe de adultos, fizeram lá a 4ª classe.
- Quando nos acontecia um trágico acidente, no dia seguinte a companhia saía toda para o mato, ficando o quartel entregue ao 1º sargento (por vezes ao médico), aos “não operacionais” e doentes.
Dávamos assim cumprimento a duas teorias:
Primeira: se caíres de um cavalo monta logo outro cavalo;
Segunda: se formos todos para o mato os turras não têm a preocupação de vir procurar-nos ao quartel, pois estamos lá, perto deles.
- A nossa actividade operacional começou a diminuir - lentamente - a partir dos quinze meses porque já tínhamos a zona completamente limpa, e também porque seria humanamente impossível manter aquele ritmo durante os dois anos.
- Quando um alferes entrava de férias, os furriéis faziam o mesmo e o GComb só fazia serviço de escala; os soldados tinham assim as suas férias.
- Todos escreviam cartas e bate-estradas; alguns abusavam; eu escrevia e recebia 15 a 20 cartas por semana.
Como podem depreender, ali havia tempo para tudo e os “tempos mortos” eram quase, quase, quase nulos, graças ao nosso heróico e admirável capitão, o maior sábio da tropa àquela época que pretendia que o seu pessoal estivesse sempre ocupado. Penso que por isso mesmo nenhum dos nossos elos veio a sofrer do dito stress de guerra.

Valeu a pena!
Lisboa, 23 de Dezembro 2013
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Nota do editor

Último poste da série de 26 DE JANEIRO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12637: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (45): Carta de condução

Guiiné 63/74 - P12699: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (16): Não gostaria de regressar ao passado e muito menos em Tavira (Manuel Luís Lomba, ex-fur mil, CCAV 703 / BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66)


Foto nº 1252

Foto nº 1246

Foto nº 1293


Foto nº 1267



Foto nº 1284



Foto nº 1280

Tavira, 1 de fevereiro de 2014 > Tavira: o rio Gilão, a ponte romana, o CAT - Centro Auditivo de Tavaira (fotos nºs 1280 e 1284; à esquerda, o edifício da Câmara Municipal de Tavaira

Fotos (e legendas) : © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados


1. Mensagem de 7 do corrente, do nosso camarada  Manuel Luís Lomba (ex-fur mil, CCAV 703 / BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66; auitor do livro "Guerra da Guiné_ A batalha de Cufar Nalu". Faria, Barcelos, Terras de Faria, Lda: 2012, 314 pp.) [Capa, imagem à esquerda]


Olá, Carlos Vinhal e um grande abraço, extensivo a toda a comunidade tabanqueira!

Manuel Luís Lomba


2. Memórias do quartel de Tavira

por Manuel Lu+is Lomba [, foto atual à direita]


Vou aproveitar a boleia da narrativa ilustrada do nosso patriarca Luís Graça para revisitar o quartel da Atalaia de Tavira, que o marquês de Pombal mandara construir, que nos serviu de CISMI e nos servirá de antecâmara à nossa Guerra da Guiné.

Entrei como recruta para essa ”escola do crime” de Tavira, parafraseando o Manuel Alegre, não como poeta mas como radialista da propaganda antiportuguesa em Argel, em Agosto de 1963, e saí cabo-miliciano atirador pouco antes do Natal, sem nunca haver abraçado uma G3 (abraçá-la-ei pela primeira vez a treinar desembarques, no ilhéu do Rei, defronte a Bissau) e após termos aguentado uma semana de campo, em exercícios de patrulhamentos, escoltas, vanguardas, guardas de flanco, cercos e assaltos, por montes lá para as bandas de S. Brás de Alportel, sob chuva torrencial dia e noite, estoicamente, durante a qual os corpos não gozaram de linha enxuta, nunca nos deitamos a dormir, sem rações de combate, as cozinhas rodadas sem funcionar e o estado de fome agravado pela deserção dos vendedores ambulantes.

A sua última jornada constava da passagem pela carreira de tiro, na estrada Tavira-Olhão, para exercícios de fogo de bazuca e morteiro de 60. O rancho era cozinhado durante as deslocações, o grão-de-bico começara a ser servido cru pela enésima vez, não obstante a proximidade do quartel e da disponibilidade da sua cozinha e foi então que alguns corajosos - que pena não me lembrar dos nomes - despejavam as marmitas nos caldeirões logo que servidos e nem foi obedecida a tão sacramental ordem de “sentido!” vociferada pelo oficial de dia - o truculento alferes Matos, que verá o braço preso e rodeado de indignados, dispostos a tudo, por ele ousar levantar o punho para o que lhe estava mais próximo. Os seus alferes usaram de argumentos apaziguadores e a tensão distendeu-se. Uma das maiores cenas de virilidade e valentia, das ocorridas na minha vida militar...

Mas a indignação, não. Ao lado da carreira de tiro havia uma cerâmica tijoleira, a miséria da vida patente nas suas jornaleiras, a trabalhar descalças, vestidas de trapos de chita cobertos de lama vermelha, que coexistia com a bonita moradia do seu dono, a campear sobre um extenso laranjal. Encharcados até à medula dos ossos, cheios de fome e a tremelicar de frio, algum apontador terá tremelicado mais que de frio e um ou dois disparos pareceram ter a chaminé da fábrica como alvo (falhado), enquanto a malta que podia se “desenfiava” a “desalaranjar” as árvores tão cuidadas e de tão preciosos frutos, pela comiseração tácita daquelas pobres que o patrão destacara para nos vigiar... Os pobres sem pobres são pobrezinhos - sentença de um Guerra Junqueiro. O capitão Salgadinho São Brás era o diretor da instrução, entendeu dar por terminadas essas marchas finais e mandou vir camiões Morris, do quartel, para carregar os mais debilitados. Aquela saga acabou no refeitório, com uma cadeirada de lulas, bem quente e bem apurada, meio casqueiro e um caneco de vinho per capita.

As participações foram retiradas e sem lugar a “porradas”, por recomendação do comandante major Cardeira da Silva.

Em Janeiro de 64 apresentei-me no RI 13, em Vila Real, começamos a andar pelo Marão a afrontar e o gelo, no entanto reconfortados pela aguardente que aquela gente fazia questão que aceitássemos e, em Maio, apresentei-me em Cavalaria 7, onde a fome se apresentou mais refinada e onde formamos o BCav 705 com destino à Guiné, para onde embarcamos em Agosto e donde regressamos, em Maio de 1966.

Fui um dos 1200 soldados-instruendos que foram encurralados no CISMI de Tavira e muitos viremos a ser estivados no cargueiro Benguela, tal e qual o gado, com destino à Guiné. Os tetos falsos das suas casernas (o 1º andar será acrescentado mais tarde) eram formatados pelo colmo das canas próprias para foguetes, bons como refúgio dos percevejos, que nos aterravam nas fuças, por gravidade. A abundância de pasto era tal que até esses hemípteros algarvios não se davam ao esforço de abrir as asas.

A ausência de instalações sanitárias seria a mais grave deficiência do CISMI: a previsão de nos esticar à fome talvez valesse de razão suficiente para haver apenas 6 sanitas “turcas” de grés, ao lado do “parque-auto” - com o rácio de uma para cada 200! Durante a noite, a parada era continuamente povoada de fantasmas em trajos menores, em demanda das sanitas. E entre a malta circulava a palavra de ordem “cagar para a tropa”, como forma de luta contra aquela indecência. Havia ativistas a sacrificar o seu tempo de rua para a cumprir. O amontoado daquela “matéria” só não chegava a passar da sua porta de acesso geral, porque os faxinas tinham a preocupação de não a deixar transbordar para a parada.

Após toque de alvorada do dia em que o tenente-coronel comandante (indígena tavirense) era rendido pelo major Cardeira da Silva, um ex-prisioneiro da Índia, foi dado o alerta de “cagalhões” a nadar nos lavatórios coletivos à entrada do refeitório e no da caserna contígua, creio que era da 2ª Companhia. O que boiava no lavatório desta apresentava tais dimensões que se gerara um movimento de turismo interno para a sua contemplação. Era um dia de festa castrense, a malta sem fazer a higiene pessoal, sem aceder ao refeitório e a unidade em alvoroço, próximo da prevenção. A primeira inspeção feita por quele pequeno major, que se revelará grande homem e grande militar foi a esses locais, mandando logo desonerar os soldados-instruendos do evento. A partir daquele dia a vida do quartel entrou em melhorias. A creolina recendia por todo o lado e as obras da requalificação e ampliação sanitária arrancaram. Relatório de baixas: o sargento do rancho, o sargento da limpeza - e os percevejos!

Aquela companhia era a melhor em futebol, em cujas pelejas pontificavam, entre outros, o Crispim, da Académica e o Lourenço, um terrível forcado. Começamos a gozá-los como a “companhia do cagalhão”. A sua malta assumiu o epíteto, apurara-se para a final, que decorreu no campo da Atalaia, com outra unidade daquela da Região militar, no galhardete entregue ao capitão da equipa adversária figurava um grande “cagalhão”, o qual não reparou e mandou entregar de lembrança ao brigadeiro segundo-comandante...

Naquele meu tempo, a generalidade dos oficiais e dos furriéis do CISMI revelavam-se gente decente, militares exigentes mas dignos. Lembro-me dos tenentes Dias Pinto, Branco, Cerro e Bernardo, comandantes das companhias; lembro-me do alentejano alferes [José Jerónimo da Silva] Cravidão, que virá a morrer em combate na Guiné [, com o posto de capitão,] e dos alferes Mota Freitas, Portugal e sobretudo do Simões, comandante do meu pelotão, uma alma excecional como homem e como militar. Lembro-me do moçambicano Jorge Tembe, um furriel “charrua”, que será o ministro da Agricultura do primeiro governo da Frelimo.

E não poderia esquecer o alferes Cadete, o Patilhas, o mais militarista e o mais fundamentalista, com a sua sádica tendência em dar a ginástica de aplicação militar nas salinas. Casado de fresco com uma beldade tavirense, quando o casal se cruzava connosco, ele reagia alto e bom som aos nossos olhares cobiçadores a proferir expressões, impróprias de serem reproduzidas neste blogue de gente grisalha...Aqueles oficiais terão visibilidade no contexto do 25 de Abril, com patentes mais elevadas.

Estive uma semana hospedado no convento da Graça, que não era hotel, mas anexo e enfermaria do CISMI, por ter desconchavado uma mão, num salto ao plinto. A pista de obstáculos funcionava no seu logradouro. Na prova final para a classificação física tinta de saltar a paliçada com um saco de areia que pesaria quase tanto eu. O Guima, camarada da Foz do Douro, agachou-se junto a ela e alavancou-me de tal maneira que, em vez de saltar com o saco de inertes a cavalear-me, voei sobre a paliçada e espalhei-me a cavalear o saco. Salvé, meu inesquecível Guimarães!

Não vou omitir a referência ao 500, cão-mascote de quartel, invocado em todas as conversas de caserna, pela sua orientação sexual da preferência pelo mesmo sexo e tão sorna, que ladrava deitado!

Da cidade de Tavira não guardei boas recordações, ressalvando da praia da ilha e das grandes travessas de conquilhas, que custavam 2$50, não obstante um dinheirinho para os nossos rendimentos. No final do primeiro mês no CISMI, a mourejar que nem condenado, o Exército patrão nem um centavo nos abonou e ainda nos obrigou a pagar-lhe 2$50 e ao segundo mês 1$00. O nosso pré de 30$00/mês ia parar todinho ao bolso de alguém, acrescido desse reforço. O major Cardeira da Silva salvou-nos dessa ladroeira e salvou a honra da unidade.

Fui particularmente sensível ao facto de sermos descriminados nos cafés, que se pagavam por um copo de água da torneira. E as queixas chegadas ao quartel quando nas esforçadas patrulhas de instrução recorríamos a algum poço para matar a sede ou encher os cantis, magoavam ainda mais.

Não gostaria de regressar ao passado e muito menos em Tavira.

Guiné 63/74 - P12698: Manuscrito(s) (Luís Graça) (20): Gostei de voltar a Tavira (Parte III): E de ter tempo para a ver do alto do seu castelo...


Foto nº 1173


Foto nº 1174

Foto nº 1175

Foto nº 1162

Foto nº 1165


Foto nº 1181

Foto nº 1182

Foto nº 1183


Foto nº 1166


Tavira, 1 de fevereiro de 2014 >  Tavira vista do seu castelo...


Fotos: © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados



1. Eu tive (e penso que muitos de nós tivemos ou ainda temos...) uma relação de amor-ódio pelas terras (cidades vilas, tabancas…) que nos calharam na lotaria da vida militar, cá e lá (na Guiné)…

No meu caso, e referindo-me apenas ao meu percurso militar na então chamada metrópole, essa relação de amor-ódio diz só respeito a 3 terras: Caldas da Raínha (RI 5), Tavira (CISMI) e BC 6 (Castelo Branco). As terras e as suas gentes só aqui são chamadas por albergarem unidades miliatares que fizeram parte das minhas/nossas  estações do calvário… De Santa Margarida não falo, porque não era terra de gente, era um imenso campo militar, medonho, desolador...

A de 4 de março de 1969, passei a pertencer, seguindo a minha caderneta militar, ao RI 2 (Abrantes), por ter sido mobilizado para o CTIG… Só que não me lembro sequer de me ter apresentado em Abrantes. Fui direitinho, tal como meia centena de quadros e especialistas da CCAÇ 2590 (futura CCAÇ 12), ao Campo Militar de Santa Margarida (CMSM) onde fizemos a Escola Preparatória de Quadros e a Instrução de Aperfeiçoamento Operacional (IAO). A partir de 11 de abril de 1969, passámos a aguardar embarque. E na noite de 23 para 24 de maio lá fomos a caminho de Lisboa, do Cais da Rocha Conde Óbidos, de comboio. Aguardava-nos o Niassa, a nós e a mais uma série de companhias independentes…

Da Tavira desse tempo, das suas gentes,  ruas, monumentos e paisagem circundante, eu guardava algumas reminiscências, avivadas por passagens ocasionais em viagens de turismo a seguir ao 25 de abril (fiz umas férias, no início de 1980, num "turismo rural" a uns escassos quilómetros da cidade, mas nunca me deu para revisitar o quartel da Atalaia) ...

No tempo em que eu estive em Tavira (de 29 de setembro a 14 de dezembro de 1969), a fazer o 2º ciclo do CSM (especialidade de armas pesadas de infantaria) não tive tempo (nem  muito menos dinheiro) para fazer “turismo”: lembro-me  do centro de Tavira e de uns passeiso à volta, Santa Luzia, ilha de Tavira, Luz de Tavira, talvez Cacela A velha (não posso garantir)… Mas não sei se alguma vez, ali mesmo perto do quartel da Atalaia, na colina de Santa Maria, eu tinha entrado no castelo (de origem moura) e contemplado, com olhos de ver, a Tavira branca e cor de tijolo de que desfrutei há dias…

Na época não me interessava tanto por história e património como hoje. Confesso que não tinha, na véspera de fazer 22 anos, grande “tranquilidade e abertura de espírito” para tirar o melhor partido possível das circunstâncias… Hoje, tenho um outro olhar, mais distanciado e crítico,  sobre as coisas (e o meu passado). E agradeço à Alice a prenda de anos que foi este fim de semana, em Tavira, alojado no Convento das Bernardas… LG


Mapa das cidade de Tavira (pormenor). Edição do Turismo do Algarve. Redproduzido aqui com a devida vénia...

Legendas (de 1 a 8, a vermelho) (LG):

1 - Rio Séqua e, depois, da ponte romana,  Rio Gilão
2 - Ponte Romana
3 - Convento das Berrnardas
4 - Salinas
5 - Terminal ferroviário
6 - Quartel da Atalaia (antigo CISMI)
7 - Castelo e Igreja de Santa Maria do Castelo
8 - Estrada das 4 Águas (e acesso, por barco, à ilha de Tavira)

PS - Sobre o património de Tavira, vd. o excelente sítio da Câmara Municipal de Tavira
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sábado, 8 de fevereiro de 2014

Guiné 63/74 - P12697: Recordações de um "Zorba" (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68) (10): Monitor na instrução de recrutas no RI 14, em Viseu



Viseu > RI 14 >  1966 > Instrutores, Monitores e Soldados duma Recruta  na semana de campo  > Eu estou no centro à frente, com a mão direita no queixo.



Viseu > RI 14 > 1966 > Preparar Homens para a Guerra:  Pelotão de Recrutas no Dia do Juramento de Bandeira. Eram cerca de 8 dezenas!... o Mário Gaspar éo "12.º de cima, a contar da esquerda"...


Fotos (e legendas): © Mário Gaspar (2014). Todos os direitos reservados.


1. Mensagem do Mário Gaspar [foo à direita], enviado 
em 26 de janeiro último:


Camaradas e Amigos: Encontrei estas fotos muito velhas, e escrevi algo que tem a ver com as mesmas. O assunto apresentado não é novo, mas como podem existir dúvidas sobre o número exagerado de elementos que compunham um Pelotão, podem contá-los. Como é o Dia do Juramento de Bandeira, estão também elementos da fanfarra. Mas devem rondar os 77/78 jovens militares. E qualquer Pelotão tinha mais ou menos o mesmo número.

Um abraço, Mário Vitorino Gaspar


2. Monitor na instrução de recrutas no RI 14,  em Viseu

Eu Mário Vitorino Gaspar, ex Furriel Miliciano de Artilharia n.º 03163264 com o Curso de Explosivos de Minas e Armadilhas.

Em 3 de Janeiro de 1966, fui chamado a frequentar o 2.º Ciclo do CSM,  na Escola Prática de Artilharia (EOA), em Vendas Novas, e terminei o Curso de Atiradores de Artilharia, em 2 de Abril, do mesmo ano. Promovido ao posto de 1.º Cabo Miliciano em 3 de Abril de 1966.

Após 10 dias de licença – no dia 13 de Abril de 1966 – mandaram-me apresentar no Regimento de Infantaria n.º 14 (RI 14), em Viseu, ficando como Monitor na Instrução de Recrutas.


Coronel Carlos Faustino da Silva Duarte
Comandante do RI 14, Viseu (1965/68)

O  Comandante do RI 14 em Viseu (1965/68) era  o Coronel Carlos Faustino da Silva Duarte [, foto à esquerda], que fazia parte da equipa da Académica de Coimbra que ganhou a Taça de Portugal em Futebol em 1939.

O Comandante da Companhia era – se a memória não me falha – o Capitão Amaral.

O Comandante de Pelotão era o Alferes Miliciano Antunes (que ficara deficiente em Moçambique, e que aguardava ser operado na Alemanha) – que julgo ter ido para a Brigada de Trânsito da GNR – depois eu, um outro Cabo Miliciano, e um 1.º Cabo Readmitido (PCAB/RD). Formámos os quatro a equipa.

Como já afirmei, dei algumas recrutas, desde Abril a Agosto (a restante equipa ainda ficou em Viseu depois sair), e os Pelotões de Instrução eram constituídos por 77/78 jovens, oriundos de diversas terras, alguns e muitos, nunca tinham visto sequer o mar. E não foi em Viseu que tiveram essa oportunidade. Não era de modo algum possível preparar homens para a guerra – com Pelotões tão numerosos e em condições.

A higiene não fazia parte das suas vidas. Assisti a casos caricatos de pouca ou nula higiene, principalmente quando era destacado para receber os mancebos, 50 cada vez em formatura – mas ainda à civil - para irem ao Médico e à vacina; fazerem os Testes Psicotécnicos; irem ao barbeiro; receberem o fardamento e tomarem  banho.

Pois o curioso era mesmo o banho. Moços existiam que nunca tinham tomado banho, alguns deles, até com crostas na cabeça, tornavam-se os mais interessados numa higiene normal. Outros com enormes cabeleiras. Por fim, alguns deles, vinham-me contar, e orgulhosos,  que já haviam tomado mais de um duche.

Mas toda esta conversa porquê ? Tudo tem a ver com o número exagerado de futuros militares do Exército Português, nos Pelotões, com tão pouco tempo de instrução pela frente. E tratava-se de preparar homens para a guerra.

E como é difícil acreditar que o Exército Português, preparava homens para uma guerra nestas circunstâncias, envio uma foto no Dia do Juramento de Bandeira – de uma das algumas recrutas que dei como Monitor de um Pelotão – no RI 14, em Viseu, no ano de 1966. Sou o 12.º de cima, a contar da esquerda.

No dia 6 de Agosto marchei para a Escola Prática de Engenharia (EOE) em Tancos para frequentar e completar o XX Curso de Minas e Armadilhas, iniciado a 8 de Agosto de 1966 e terminado a 17 de Setembro de 1966.

Estava encontrado o meu destino: - Guiné!
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Nota do editor:

Último poste da série > 6 de fevereiro de  2014 > Guiné 63/74 - P12682: Recordações de um "Zorba" (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68) (9): SOS, procuro os meus camaradas 'Zorbas', José Paulo Oliveira de Sousa Teles (alf mil), Luís Alberto Alves de Gouveia (alf mil), José Fernandes Durães (fur mil enf), José Norberto Rodrigues Vieira (fur mil), Carlos Alberto Monteiro Leite (fur mil), Rui Filipe Alves Ribeiro (fur mil)