terça-feira, 13 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17462: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (44): O Zé Manel dos Cabritos e a mula transexual




1. Em mensagem do dia 10 de Junho de 2017, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), autor do Livro "Memórias Boas da Minha Guerra", enviou-nos uma história, no mínimo, estranha. Não é que nós até conhecemos os intervenientes?

Caros amigos
Tal como na anterior história sobre o Zé Manel dos Cabritos, existem várias coincidências que podem induzir em interpretações precipitadas. Quero-vos garantir que esta é mais uma história de ficção que quase nada tem a ver com os amigos, acontecimentos e lugares que nos rodeiam.

Grande abraço do
JFSilva da Cart 1689


Memórias boas da minha guerra

44 - O Zé Manel dos Cabritos e a mula transexual

O Zé Manel dos Cabritos é sobejamente conhecido entre os ex-combatentes em geral e muito em particular com os que lutaram na guerra da Guiné. Entre estes, acentuou a fama de açambarcador de cabritos, ao ponto de ser acusado da sua exterminação numa importante zona dessa região africana.
Por outro lado, o facto de ter sido um emigrante de sucesso, parece ter despertado algum sentimento de inveja, por parte desses “amigos mais chegados”.

Ultimamente tenho tido um relacionamento mais próximo do amigo Zé Manel. Ele, que é sistematicamente acusado de “açambarcador mafioso” no controlo e no proveito dos cabritos no leste da Guiné, esconde, naquele fundo de guloso e de espertalhão, muita bondade e muita ânsia de sã camaradagem. Por isso, ele tem desabafado comigo sobre essas acusações infames e de outras coisas que ele não quer que se saiba. Porém, há uma a que não posso resistir.

Perguntei-lhe se tinha emigrado logo que veio da Guiné e ele respondeu:
- Não. Voltei ao Antero, para me dedicar aos trabalhos na pedra. Já andava lá há uns meses, mas como eu era muito desenvolvido no trabalho de série e rápido noutros serviços, o patrão não me dava oportunidades para me desenvolver na arte de esculpir figuras. E foi num dia de verão que decidi que aquele seria o meu último serviço em Portugal.
O patrão pediu-me para eu ir perto de Bragança levar a escultura de um macho, para ser colocada sobre uma fonte que iria ser inaugurada no Domingo seguinte. Carregaram a escultura numa carrinha Datsun, de caixa aberta, bem amarrada e bem protegida. Levei a carrinha para casa, a fim de seguir, directamente, no Sábado, para Trás-os-Montes. Ainda em casa, pus-me a mirar a obra em toda a volta do carro e cheguei à conclusão de que o “badalo” do burro estava demasiado grande e torto. Peguei no cinzel e fui dar-lhe uns retoques. Só que, não sei porquê, o “badalo” caiu e partiu-se em vários bocados. Fiquei aflito e não sabia como havia de o recolocar no macho. Pensei, pensei e, quando já estava mais calmo, voltei a retocar a zona sexual do animal, destruindo-lhe os tomates e o resto que ficara do badalo. Perdi um tempão naquelas operações delicadas mas, no final, convenci-me de que conseguira travesti-lo numa bela mula.
Faltava, agora, convencer o cliente, que estava a aguardar o macho há várias horas. Ribeira da Raia ficava para lá de Bragança, perto da fronteira, por onde passavam os emigrantes clandestinos. Passei por uma placa que dizia FRANÇA, onde, vim a saber depois, era onde os passadores mais vigaristas, largavam alguns clientes como etapa final desse “salto” clandestino. Fui andando e acabei por parar junto a um rio, onde me apercebi de algum barulho em redor de uma fogueira.

Passava das duas e meia da madrugada. Ouvi alguém dizer:
- Deve ser o gajo que vem trazer o matcho.
- Ó diatcho, agora não vem nada a calhar. Ali o Tono já está a dormir co’ a borratcheira, tuJaquim, estás meio fodido e eu, sozinho não aguento.
- Deixa-te estar Alfredo, que tu estás melhor.

Aproximei-me, passaram-me a caneca colectiva e indicaram-me o local exposto do presunto, salpicão, alheiras, queijo, chouriço, pão etc. etc.
- Olhe, o que o safou é que o Regedor trouxe para aqui material, para esperarmos por si até de manhã. Foi-se deitar e disse que você pode ficar cá, mas que convinha, antes, colocar o matcho, para lhe cimentarmos as patas. Mas estou a ver que isto vai ser difícil.

Pensei logo em desenrascar-me o mais depressa possível. Acompanhei-os nos comes e bebes e ajudei-os a alegrar-se. Acordámos o Tono e fomos descarregar o macho.

Logo que desamarramos a escultura, ali junto à fonte e sob um poste de luz eléctrica, o Tono exclamou:
- Olhem, o matcho não tem margalho!
- É porque vem capado – disse o Jaquim.
- Ó amigo, isto parece mais uma mula. Não me parece que seja o que o Regedor encomendou. – disse o Alfredo.

Olhei para ele, abeirei-me e, lamuriento, exclamei:
- Vocês têm razão. Estou aqui desesperado porque me aconteceu isto, assim, assim… e assim.

Perante o silêncio prolongado, o Tono arrebitou e ordenou:
- Vamos descarregar a puta da mula e colocá-la no sítio do matcho. Afinal sempre gostamos mais de fêmeas e o rapaz, coitado, tem de ir à sua vida. E querem saber uma coisa? A mula vai chamar-se Lola, em homenagem ao nosso amigo Betinho da Rosita, que era unha com carne com o Regedor, e que num dia de Benfica-Porto foi para Lisboa com o Tininho de Bragança e nunca mais voltaram. Parece que o jogo foi em 1963 ou 1964 e empataram a 2-2.

O Alfredo, que não se mostrou muito de acordo, foi avisando:
- Vocês sabem que o Regedor não vai gostar dessa brincadeira, até porque dizem que ele ficou solteiro, à espera desse Betinho.

O Jaquim acrescentou:
- Não sei se sabem que o Betinho fez uma operação, cortou a piroca, abriram-lhe um buraco e que agora se chama Lola e que é um bom pedaço de mulher. O Tono já a viu, não é verdade?
- Sim, é verdade. – disse o Tono, que continuou:
- Um dia em que fomos a Lisboa procurá-la numa boite, perguntámos-lhe pelo Betinho mas ela não nos passou cartão. O Regedor ficou pior que estragado. Até lhe chamou paneleiro. Ela respondeu-nos que não se lembrava desse nome, que era transexual e que se chamava Lola. Quando vínhamos embora, o Regedor confirmou-me que, quando comprara à D. Rosinha, o campo das hortas, fora para pagar a tal operação.

O Jaquim ainda lembrou os tempos de infância do Betinho, dizendo que ele “tinha a mania de tocar ao bicho dos colegas”.

De repente colocaram a mula lá em cima, foram buscar a caneca e brindaram:
- À nossa Lola, a primeira mula transexual de Portugal! 

Nota:
Acredito nesta história do Zé Manel dos Cabritos porque, por volta de finais dos anos 70, eu costumava ir pescar nessa zona raiana e lembro-me de ver o carinho e a admiração que essa gente local prestava às mulas. Também vi a estátua sobre uma fonte. E, enquanto bebíamos uma cerveja no Bar de uma Associação Recreativa e Cultural, contaram-nos que por altura do 25 de Abril, tinham retirado a Lola, “porque era ofensiva à honra das nossas mulas e, ao mesmo tempo, se identificava com o único panasca transmontano”.
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Nota do editor

Último poste da série de 6 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17438: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (43): O Zé Manel dos Cabritos e os amigos invejosos

Guiné 61/74 - P17461: Efemérides (258): No dia de Portugal, 10 de Junho, em que o Presidente da República homenageou os ex-combatentes portugueses, parece-me justo que também os ex-combatentes guineenses não sejam esquecidos (Armando Tavares da Silva, historiador)

1. Mensagem, de 10 do corrente,  do nosso amigo Armando Tavares da Silva, autor de “A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar (1878-1926)” (Porto: Caminhos Romanos, 2016, 972 pp.)


Caro Luís,

Segue em anexo para o blogue um texto sobre os ex-combatentes guinenses que serviram nas forças armadas portuguesas, bem como um excerto de uma notícia do Expresso de Setembro de 2007 digitalizada e dividida em 2 partes.
Abraço,
Armando


2.  Os ex-combatentes guineenses

Caro Luís Graça,

Tenho já há algum tempo entre mãos uma notícia que foi publicada no Expresso,  de 1 de Setembro de 2007.  sobre os antigos combatentes guineenses que lutaram ao lado dos portugueses e que reclamavam as devidas compensações, o pagamento das pensões de reforma e a restituição da nacionalidade portuguesa, notícia esta que anexo e que aguardava ocasião para ser enviada para o blogue. 

Segundo a notícia, a Associação Guineense dos Ex-Militares das Forças Armadas Portuguesas estimava que seriam cerca de 15-20 mil esses antigos combatentes, acrescentando que os mesmo não aparentavam vergonha pelas funções que desempenharam.

A notícia recente de que um apreciável grupo de portugueses que combateram em África tinha enviado para a Assembleia da República uma petição relativa ao tratamento inadequado que lhes tem sido prestado, solicitando o “reconhecimento cabal dos seus serviços e sacrifícios”(Post P17410 de 30 de Maio), fez-me pensar na situação daqueles combatentes guineenses os quais parece não terem idêntica possibilidade de se dirigir à Assembleia da República. 

A notícia do Expresso relata que foi o chefe do governo da Guiné-Bissau que em visita a Lisboa trouxe o caso junto do nosso governo. E é lícito perguntar, depois de já terem passado 10 anos, qual o resultado dessa diligência?

Por outro lado, a mesma petição lembrou-me uma outra dirigida ao rei D. Carlos pelos papeis e grumetes de Bissau em Agosto de 1891, na sequência de graves confrontos que em Fevereiro desse ano tinham ocorrido naquela praça, em resultado de circunstâncias várias difíceis de relatar em curto espaço. 

Referirei apenas que elas tiveram origem no antagonismo entre os papeis de Antula e os de Intim, que se havia manifestado já no ano anterior, que o governador estava convicto que essas hostilidades se deviam “às intrigas dos habitantes da praça [de Bissau] que alimentavam a guerra”, formando dois partidos entre os beligerantes, e que o governador havia incumbido o comandante militar de Bissau de “descobrir” quem eram esses partidários, “iludindo-lhes a vigilância” e fazendo “abortar-lhes” os planos que tivessem em mente.

Pelo seu interesse histórico transcrevo na íntegra a referida petição:

«Senhor!

«Os povos papeis e grumetes de Bissau, que em Fevereiro do ano corrente foram considerados rebeldes, com suspensão de garantias, por haverem ousado pegar em armas contra a Mãe-Pátria, compenetrados hoje da sua impotência, conhecendo o poder das mãos de Vossa Majestade, e reconhecendo o erro em que haviam caído, vêm com o devido respeito, implorar a Vossa Majestade o perdão de suas culpas.

«Real senhor! Os suplicantes, confiados no amor paternal que a clemência, abraçada com a justiça de Vossa Majestade, sempre prodigalizou aos povos da Guiné portuguesa, principalmente aos papeis e grumetes de Bissau, vêm hoje depor aos pés do mui digno delegado de Vossa Majestade nesta província, as duas peças Krupp, que ficaram no campo, no último ataque, pedindo ao mesmo Excelentíssimo Senhor se digne recebê-las como garantia da obediência e submissão dos suplicantes às leis de Portugal, a fim de ele conseguir que Vossa Majestade, usando da faculdade que a Vossa Majestade confere a Carta Constitucional da Monarquia, conceda aos suplicantes a amnistia de que carecem, para o seu sossego, para honra e glória de Portugal, e para o completo restabelecimento da ordem em Bissau: pelo que os suplicantes

P. a Vossa Majestade a

Graça de deferir, e

E. R. M.cê»


Esta petição foi entregue no comando militar de Bissau por uma vasta delegação de papeis e grumetes de Bissau, juntamente com o pároco P.e Henrique Lopes Cardoso, que terá sido porventura quem redigiu a petição.

O governador Vasconcellos e Sá ao enviar para Lisboa esta petição escreve: “Como cidadãos portugueses os grumetes e papeis tinham o direito de petição livre”, reconhecendo que “para o governo, como depositário da honra e dignidade nacional, era melindroso o assunto sobre que tinha de resolver”. O governador entendia que, dada a situação que se vivia em Bissau, com as comunicações entre a praça e os rebeldes completamente interrompidas e com a deterioração da situação alimentar e comercial, a amnistia devia ser concedida.

Sem que a difícil situação que se vivia em Bissau tivesse tido resolução, a 16 de Outubro os habitantes da praça telegrafam à Rainha Senhora D. Maria Pia, para que intercedesse junto de El-rei com aquele fim. A concessão da amnistia só irá ter lugar no dia 27 de Fevereiro de 1892 quando o governador recebe do ministro um telegrama dizendo “Concedido por S. M. perdão papeis nos termos do auto de 6 de Fevereiro”. Tinha entretanto sido eleito em Intim um novo régulo que afirmara estar disposto a obedecer às ordens do governador e de acatar em tudo as leis de Portugal, pedindo ao mesmo tempo que o governador solicitasse de Sua Majestade o “perdão para todos eles como súbditos da coroa portuguesa”, manifestando-se prontos para entregar às autoridades qualquer indivíduo que praticasse qualquer crime dentro ou fora da praça. O auto de perdão é finalmente assinado no dia 6 de Março de 1892 na presença do governador.

A petição dos papeis e grumetes de Bissau levou cerca de meio ano a ser atendida. E os pedidos dos ex-combatentes guineenses já terão sido atendidos? Seria bom que algum grã-tabanqueiro lançasse alguma luz sobre o estado actual desta questão. E algum se recorda dos nomes mencionados na notícia do Expresso?

No dia de Portugal em que o Presidente da República homenageou ex-combatentes portugueses, parece-me justo que também aqueles guineenses não sejam esquecidos.


3. Expresso, de 1 de setembro de 2007 > Ex-combatentes guinee nses exigem pensões  [Recortes reproduzidos com a devida vénia]



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Nota do editor:

Último poste da série > 12 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17458: Efemérides (257): A propósito do 10 de Junho, ainda os estranhos e excelentes portugueses no mundo... "Goa, um adeus no entardecer dos dias / e uma lágrima para sempre" (Poema e fotos de António Graça de Abreu)

Guiné 61/74 - P17460: Recortes de imprensa (88): O nosso amigo capitão Valdemar Aveiro, em Vigo, Galiza, defendendo os pergaminhos da história da pesca do bacalhau ("Faro de Vigo", 10.06.2017)



Espanha > Galiza > Vigo > Club Faro de Vigo >Auditório Municipal e Areak > 9 de junho de 2017 > O capitão Valdemar Aveiro, à direita, com José Manuel Muñiz. presidente da Asociación de Titulados Náutico-Pesqueros (AETINAPE).


 Foto: Marta G. Brea. Fonte: Faro de Vigo, 10.06.2017 ( Com a devida vénia,,,)

Valdemar Aveiro > 
"Los políticos están destruyendo las flotas pesqueras"

Faro de Vigo | Ágatha De Santos Vigo 10.06.2017 | 03:03

(...) "Los caladeros están llenos de pescado y sin embargo, hay quienes continúan diciéndonos que tenemos que tener cuidado con lo que pescamos porque vamos a quedarnos sin recursos pesqueros". Así de contundente se mostró el invitado de ayer del Club FARO, Valdemar Aveiro, capitán portugués especialista en la pesca del bacalao, que repasó la historia de esta pesquería y habló de su presente y también de su futuro, uno futuro que no augura nada bueno.


"Los políticos y la Unión Europea están destruyendo las flotas (pesqueras) y aún dicen que tenemos que tener mucho cuidado con las cuotas si no queremos quedarnos sin pescado. Y no puedo entender que digan esto cuando hay tanta gente en paro", afirmó durante su intervención en el Auditorio Municipal do Areal, que fue presentada por José Manuel Muñiz, presidente de la Asociación de Titulados Náutico-Pesqueros (AETINAPE)."

El invitado del Club FARO aseguró que esta advertencia sobre la escasez de recursos marinos es falsa. Es más, según Aveiro los caladeros de pescado están llenos. "Hay tal cantidad de pescado que se están comiendo a sus crías", advirtió el capitán de pesca portugués, de 83 años, que añadió que esto supone un serio problema para el medio marino. "Quienes siguen empeñados en que creamos que no hay suficiente pescado, nos dicen también que hay un problema con el pescado pequeño, que no hay. Y no hay porque los peces grandes se están comiendo a los pequeñitos", insistió.

Tampoco es cierto, añadió, que el problema de la escasez aludida se deba a los ciclos de reproducción de los peces. No al menos en el caso del bacalao. "Es falso que el bacalao solo se reproduzca una vez al año. Además, la hembra del bacalao pone entre siete y ocho millones de huevos, aunque no sobreviven todos, por supuesto", explicó.

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O jornalista lembra que o conferencista se matriclou co mo moço aos 15 anos, num barco de pesca de bacalhau tradicional, o duro sistema de pesca tradiconal português, baseado na pesca à ,linha com os "dóris", e que aos 21 anos se diplomou como capitão da marinha mercante. 

Dedicou toda uma vida à pesca do bacalhau na Terra Nova e na Groenlândia, tendo-se reformado como capitão do navio "Coimbra" [, foto à esquerda, de Valdemar Aveiro], o campeão da frota de pesca bacalhoeira portuguesa. 

Mantendo.-se ainda no ativo como gestor, é também um reputado e vigoroso cronista da história da pesca do bacalhau na segunda metade do século passado. É já autor de cinco livros sobre este setor piscatório que, durante anos e anos, foi fundamental para a economia não só portuguesa como também para a economia das regiões galega e basca.

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(...) Durante los años que pasó embarcado, siempre dedicado a la pesca de arrastre, también ha sido testigo de naufragios, como el del "Santa Mónica". Aún así, continúo embarcado. Tampoco la dureza del oficio le disuadió para quedarse en tierra. "Hablar de la pesca del bacalao es hablar de una saga heroica", dijo refiriéndose a los cientos de marineros que hicieron de esta pesca su modo de vida.

A esto, se sumaría después las reducciones en el número de capturas de la Unión Europa. "Las cuotas miserables nos han perjudicado a todos", aseguró. Y por último, las plataformas petrolíferas, que limitan también la zona pesquera.

La política pesquera no ha beneficiado precisamente a las flotas pesqueras, ni a la gallega ni a la portuguesa. "No sé cuántos barcos tenía la flota española. Sé que era una de las más importantes del mundo. La portuguesa es mucho más pequeña, pero llegó a tener 77 barcos de pesca. Hoy no tenemos más de once, y no todos son portugueses, sino holandeses", dijo el ponente, que añadió que hoy en día nada de sorprende.

El conferenciante estuvo hace tres días en el Parlamento portugués precisamente para hablar sobre la situación de la flota pesquera portuguesa como experto en la materia. (...)

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17459: Consultório militar do José Martins (23): Sacavém na Grande Guerra - Os mobilizados e os tombados



1. Mensagem do nosso camarada José Marcelino Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70),  com data de 4 de Abril de 2017:

Boa tarde amigos
Não tenho a certeza de já ter enviado este texto - divulgação de monumentos existentes (ou não) - sobre monumentos de Sacavém e a Grande Guerra.
Na dúvida, aqui vai.

Abraço
Zé Martins

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Nota do editor

Último poste da série de 3 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17201: Consultório militar do José Martins (22): Em busca de informações sobre o local de sepultura do Fur Mil Raul da Conceição Severino da CART 527, falecido em campanha na Guiné em Junho de 1963 (José Martins)

Guiné 61/74 - P17458: Efemérides (257): A propósito do 10 de Junho, ainda os estranhos e excelentes portugueses no mundo... "Goa, um adeus no entardecer dos dias / e uma lágrima para sempre" (Poema e fotos de António Graça de Abreu)







India > Goa > Volta ao Mundo em 100 dias a bordo do mavio de cruzeiros "Costa  Luminosa" > 19 de novembro de 2016 > Lembrando o 10 de junho, "dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas... Lembrando ainda os portugueses e seus descendentes que ficaram nos antigos territórios portugueses de Goa, Damão e Diu. Nas duas últimas fotos, o autor e a esposa.

Foto: © António Graça de Abreu  (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

De: Antonio Graca de Abreu
Data: 12 de junho de 2017 às 17:02
Assunto: A propósito do 10 de Junho, ainda os estranhos e excelentes portugueses no mundo

Meu caro Luís

Ainda a propósito do 10 de Junho, lembrei-me de te enviar este poema meu,  escrito em Goa, Novembro 2016. Se achas que é de publicar, avança.  Fotos seguem noutro mail.

Abraço,
António Graça de Abreu
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Goa

por António Graça de Abreu




Goa, um pé em Mormugão,
todo o olhar em Vasco da Gama.

Goa, do velho Afonso de Albuquerque,
espadeirando pelas costas do Malabar,
na aventura insana de conquistar o Oriente.

Goa, dos grandes vice-reis e senhores de outrora,
hoje em lápides enegrecidas pelo tempo.

Goa, de Bardez a Salsete, o pó resplandecente da fé,
e sinuosos silêncios.

Goa, de cem mil cruzes diante de cem mil lares,
braços de Cristo abertos para o mundo,
cemitérios de cristãos unindo céu e terra.

Goa, uma Roma Oriental cintilando na basílica do Bom Jesus,
cinco séculos a acastanhar a pedra,
e São Francisco Xavier, benfazejo e amigo,
num túmulo de prata, pedrarias e cristal.

Goa, da velhíssima Sé Catedral,
maior igreja da Ásia, imaculadamente branca,
no altar-mor, dois jovens, mais uns tantos amigos,
todos humildemente descalços,
um casamento em língua portuguesa.

Goa, da igreja de S. Caetano,
semelhante à basílica de S. Pedro,
para enlevar corações, levá-los a Roma
ou talvez ao paraíso.

Goa, da orgulhosa Pangim,
do bairro colonial das Fontaínhas,
onde se baila o corridinho,
e um cônsul português sorri e dança.

Goa, de especiarias e perfumes,
na carregação das naus,
para inebriar os dias e as noites.

Goa, da doce e formosa Manteigui,
nas palavras de Bocage "puta rafada",
cujos "meigos olhos, que a foder ensinam
até nos dedos dos pés tesões acendem".

Goa, dos breves companheiros de jornada,
o André, o Edgar, a Maria, o Reis,
dos Gomes Market, do Faria Heaven, do Santosh Garage,
tantos ramos florescendo da cepa lusitana
entretecidos pelo perpassar dos séculos.

Goa, das últimas famílias indo-portuguesas
entrecruzando sangue e afectos,
laboriosas gentes nas confusões do presente,
com as pedras e o coração do passado, construindo o futuro.

Goa, dos fortes de Tiracol ou da Aguada,
velhos canhões, há séculos disparando pedaços de nada,
para a águas do Mandovi, para o vazio,
e um velho farol, o primeiro iluminando os mares da Ásia.

Goa indiana, pois claro,
com templos hindus para venerar os deuses,
Shiva, Brama, Vishnu, Krishna,
e pequenas divindades descansando no fundo do vale,
no recato sombreado dos palmares.

Goa, das praias de infindáveis areias,
Calangute, Dona Paula, ou Benaulim,
para humedecer o corpo e respirar o sol.

Goa, um adeus no entardecer dos dias,
e uma lágrima, para sempre.

António Graça de Abreu



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Nota do editor:
Último poste da série >  7 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17440: Efemérides (256): Faz agora 75 anos que foi afundado a oeste da Gronelândia o lugre bacalhoeiro ilhavense "Maria da Glória" por um submarino alemão... Dada o forte simbolismo da data, foi já proposta a Assembleia da República a instituição do dia 5 de junho como "O Dia Nacional do Bacalhau"...

Guiné 61/74 - P17457: Notas de leitura (967): Honório Pereira Barreto (Notas para uma biografia), por Joaquim Duarte Silva (Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Fevereiro de 2016:

Queridos amigos,
É bem verdade que quem muito procura sempre alcança. De há muito que andava a vasculhar em prateleiras e caixotes a ver se encontrava este documento, singelo mas de uma enternecida admiração pelo pai fundador do território da Guiné. Nele vem a imagem do seu túmulo em Bissau, desconheço como ele é tratado e sentido pelos guineenses, por acasos interpretativos do anticolonialismo, enviesadamente Honório Pereira Barreto foi tratado e exprobado como agente de colonialismo, coisa mais tola não pode ser dita por quem olha para a História como um retrato do momento, ignorando as mentalidades e o sentido do amor pátrio. Tenho para mim que a República da Guiné-Bissau teria tudo a ganhar no preito a este político admirável que comprou do seu bolso território e foi um político desinteressado, sempre a fustigar os mandriões e corruptos.
Para que conste.

Um abraço do
Mário


Honório Pereira Barreto, por Joaquim Duarte Silva

Beja Santos

Creio tratar-se da primeira biografia do notável político guineense. Surgiu na Coleção pelo Império em 1939, editada pela Agência Geral das Colónias. Não vale a pena aqui repetir-se o que tem sido amplamente difundido sobre o retrato do ilustre político guineense, usando o texto de Joaquim Duarte Silva retomemos a argumentação brilhante deste esforçado que quis defender intransigentemente a Senegâmbia com que ele sonhou. Primeiro, a exortação a favor de Ziguinchor, logo na sua primeira passagem pelo governo da Guiné. Por política enviesada de Lisboa, a Convenção de 12 de Maio de 1886 ofereceu de mão beijada o antifo presídio e toda a margem esquerda do Rio Casamansa e toda uma larga faixa de terreno situado a um Norte do paralelo do Cabo Roxo aos franceses. Vejamos o que ele escreveu:
“Os franceses, em Abril de 1837, não atendendo ao protesto que, segundo minhas instruções, fez o comandante de Ziguinchor, passaram este presídio e foram comprar terrenos aos Mandingas de Sejo, para fundar uma feitoria. Eu, que era governador destas possessões, oficiei ao governador de Gorêa, queixando-me de tal procedimento, e declarando muito positivamente que jamais reconheceria aquele estabelecimento, que fora feito por meio da força; e dirigi-me ao governador da Gâmbia, confiando no Tratado de 1661, um navio de guerra para a ir a Casamansa fazer valer os direitos de Portugal. O governador de Senegal, respondendo ao ofício que eu enviei ao governador de Gorêa, me disse que aquela feitoria fora colocada por ordem do governo francês e baseada nos tratados celebrados entre Portugal, França e Inglaterra; e o governador da Gâmbia me escreveu asseverando-me que não podia anuir ao meu pedido, sem ordem expressa do seu governo. Vendo eu que nada podia fazer, porque só tinha à minha disposição um mal lanchão de governo, remeti ao governador-geral toda a correspondência que houve a este respeito, e ele a transmitiu à Corte; e até agora nenhum resultado tem havido, e creio que nunca o haverá.

. . . . . . . . . . .

Tenho passado pelo desgosto de ver invalidar (ainda que indiretamente, mas com bastante clareza), o protesto que eu então fiz em nome da Rainha e da Nação; pois aos meus sucessores tem ordenado aos comandantes de Cacheu e de Ziguinchor que oficiem ao oficial francês, que está no Sejo, dando-lhe o título de comandante do Estabelecimento francês em Sejo; este título importa virtualmente, a meu ver, o reconhecimento da legalidade daquela usurpada feitoria.
Desde o dia em que li o discurso de um senhor deputado, cujo nome me não lembra “por que não merece ser lembrado pelos habitantes destas possessões”, em que dizia que as câmaras não se deviam ocupar do negócio de Casamansa, por ser um nome bárbaro, e que não vi os ministros levantarem-se como uma só pessoa para combater tais expressões, desde esse dia fiquei persuadido que os estrangeiros podiam, quando quisessem, roubar as nossas possessões; e que os habitantes de Ziguinchor, sendo-lhes impossível sustentar a concorrência nos mercados gentios, ver-se-iam obrigados a abandonar o presídio que têm defendido com o seu sangue e dinheiro. Eis o prémio daqueles que prestam serviços relevantes nestas possessões!”.

E escreve Joaquim Duarte Silva:
“Esta questão de Casamansa perdemo-la por não terem sido fornecidos ás autoridades da Guiné os meios indispensáveis para a execução das patrióticas determinações de Sá da Bandeira. Perdemo-la por indiferença da Metrópole, por não terem sido estudados convenientemente os nossos direitos e por não termos tomado em face da França a mesma atitude decidida e enérgica que, poucos anos depois tomámos em face da Inglaterra e nos evitou a perda da Ilha de Bolama”.

Ratifica a nossa soberania em Bolama. A 25 de Dezembro de 1837 assinou com o régulo Ondontô, de Bissau, um acordo que equivale a um auto de vassalagem e em Novembro do ano seguinte comprou ao referido régulo o Ilhéu do Rei e parte do Rio de Bissau. Escreve então ao Governador-Geral de Cabo-Verde, Brigadeiro Marinho, uma carta memorável:
“Tenho a glória de incluir juntos dois autos da compra do Ilhéu denominado do Rei, fronteira a esta praça, e de parte do rio pertencente ao Rei. Eu excedi as ordens de V. Ex.ª, porém com vantagem para a Nação; incluía também na compra a parte do rio pertencente ao Rei de Bissau, para estorvar a entrada dos franceses por ele dentro. Tendo dado conta da minha melindrosa comissão, está acabada a condição com que continuei neste governo, e, portanto, está a chegar o tempo de V. Ex.ª cumprir a sua palavra de honra, dando-me minha demissão”.
Honório Pereira Barreto desembolsara 440 mil réis fortes nas aquisições e ofereceu-as ao Estado. Tempos depois, Barreto voltou a instar pela sua exoneração, assim escrevendo:
“V. Ex.ª muito bem sabe que eu aceitei o posto de Tenente-Coronel, Comandante do Batalhão de Voluntários Caçadores Africanos e o cargo do Governador Civil e Militar de Bissau com a expressa condição de servir enquanto V. Ex.ª governasse esta província: no exercício do meu cargo fiz todos os serviços que podia só em atenção a V. Ex.ª, porque quando uma província é governada por um homem como V. Ex.ª todos os cidadãos devem ajudá-lo; cedi metade do meu ordenado além dos oferecimentos pecuniários de que tenho dado participações a V. Ex.ª; ao menos despertei o zelo e atividade dos governadores daquelas possessões até agora dormentes, e os meus sucessores devem decerto acabar a obra que me glorio ter começado”.

Barreto vai ainda confrontar-se seriamente com o Tenente da Marinha de Guerra inglesa Arthur Kellet, Comandante do Brigue Brisk, e deixa nova prosa memorável:
“O comandante do Brigue Brisk, desembarcado nesta ilha (Bolama) foi, junto com 19 marinheiros pelo mato dentro e aí tomou uma porção de escravos que se ocupavam na lavoura, e depois à força de pancadas fizeram embarcar outros que estavam dentro da casa do Major Nosolini, querendo levar até gente livre, e dirigindo-se ao ponto onde estava o destacamento militar desta ilha cortaram com machados o mastro da bandeira, e chegaram ao ponto de tirarem a bandeira portuguesa das mãos de um soldado nosso, cuspindo nela e metendo-a depois dentro de uma caixa de vinho, a levaram para bordo, ação esta nunca vista entre nações civilizadas. Exijo de V. Ex.ª uma satisfação completa, sem a qual ficará a dúvida a equidade da vossa nação" (Ele dirige-se ao comandante da colónia inglesa da Serra Leoa).

Seguir-se-á a peça fundamental de Honório Pereira Barreto, o opúsculo publicado em 1843 intitulado "Memória sobre o estado atual da Senegâmbia Portuguesa, causas da sua decadência e meios de a fazer prosperar” que noutro texto aqui nos mereceu largo desenvolvimento(*). Um dado secundário: nunca quis fotografar-se, dizendo: “Sou muito feio e não quero que mais tarde as senhoras da minha família metam medo aos filhinhos, apontando-lhes o meu retrato”.


Os anos passam e continuo sem entender como é que em 2016 a Guiné-Bissau ainda não recuperou aquele que, de acordo com a regras do patriotismo do seu tempo ofereceu à República independente as suas fronteiras.
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Notas do editor

(*) - Vd. poste de 5 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14118: Notas de leitura (665): “Memória sobre o estado atual da Senegâmbia portuguesa, causas da sua decadência e meios de a fazer prosperar”, por Honório Pereira Barreto (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 9 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17449: Notas de leitura (966): Anuário da Província da Guiné, ano de 1925 - Um documento histórico incontornável (2) (Beja Santos)

Guiné 61/74 - P17456 (De) Caras (72): em outubro de 1972, vim de férias e uma vizinha meteu uma cunha à minha mãe para eu levar uma encomenda para o namorado da filha que era furriel e que eu não conhecia de lado nenhumm... Quando a encomenda chegou ao destino, já o namoro se tinha desfeito, como vim a saber 17 meses depois... (Juvenal Amado, autor de "A tropa vai fazer de ti um homem!"... Lisboa, Chiado Editora, 2016)

1. Texto enviado anteontem pelo Juvenal Amado (ex-1.º cabo condutor autorrodas, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74, e autor de "A tropa vai fazer de ti um homem!... Guiné 1972/74" (Lisboa, Chiado Editora, 2016):

Não lembro de ter recebido alguma encomenda mas lembro-me de ter levado. (*)

Em Outubro de 1972 vim de férias a casa e,  mal cheguei, a minha mãe passou a ser assediada por uma vizinha com um pedido para,  quando eu regressasse, levar uma encomenda para o namorado da filha que era furriel lá num sítio qualquer. 

Escusado será dizer que este tipo de "correio", retirava do saco da TAP, já si pequeno para nós próprios, coisas que nós queríamos levar para nosso consumo e dos amigos chegados . Era pois um favor prestado a quem não conhecíamos e com quem não tínhamos relação nenhuma, dadas as diferenças sociais em que navegávamos na altura. 

Mas, pronto, o que se havia de fazer? Na data próxima ao meu regresso à Guiné, lá veio o embrulho que eu meti custo no meu saco. Chegado a Bissau, enviei-o para onde me tinham dito que devia mandar e assim foi.

Mas não querendo correr o risco de que me acusassem de ter ficado com a encomenda, lá ia perguntado à minha mãe se o tal namorado da fulana tinha recebido o embrulho. A minha mãe pareceu-me, a mim, que rodeava a pergunta e nada de concreto me dizia. 

Entretanto ainda lá passei mais 17 meses e o caso perdeu o meu interesse. Quando regresso,  eis que, ao passar no café Portugal,  vejo a jovem que me tinha feito acarretar o embrulho e de quem nunca recebi o pequeno agradecimento, em alegre cavaqueira com várias amigas. Resolvi perguntar-lhe,  directamente e a cores, se o namorado tinha recebido ou não a encomenda. Ficaram todas com cara de caso a olhar para aquele desterrado a quem a cor de terra não sairia nos próximos meses, a quem nunca se tinham dignado a dirigir palavra. Ela,  um bocado atabalhoadamente como quem é apanhado em falso, que sim, que tinha recebido e muitos obrigados finalmente.

Entretanto fui para casa, contei à minha mãe o sucedido, ela fez um sorriso meio maroto e lá me contou finalmente o que se tinha passado. "Olha,  filho,  ainda tu não tinhas lá chegado, descobriu-se que ela andava metida com outro e o namoro escangalhou-se".

Finalmente percebi o estranho silêncio de 17 meses, a atrapalhação da dita cuja e das amigas, quando eu me dirigi a ela em pleno café Portugal.

2. Comentário do nosso editor:

A propósito das nossas redes de  "contrabando de ternura"... e desfazendo dúvidas: o SPM - Serviço Postal Militar também efetuava a entrega de encomendas  (livros, roupas, mantimentos...) remetidas pelas nossas famílias, e não apenas cartas e aerogramas... Recorde-se aqui um poste do Paulo Santiago, já com dez anos (**), e de que se reproduz a seguir um excerto:

(...) "A minha avó Clementina, avó materna, resolveu enviar-me, por encomenda postal, um bolo-rei, dirigido para o SPM de Bambadinca. Como chegou após o dia 24, reenviaram-no para o SPM 3948 (era do Pel Caç Nat 53). Chegou ao Saltinho, já tinha vindo eu para Bissau. Reenviaram a encomenda para Bambadinca, acabando por receber o bolo-rei em meados de Janeiro. Estava duríssimo, mas...foi o melhor bolo-rei que comi até hoje." (...)

Também temos notícia de entrega de salpições (e outros produtos do fumeiro), via SPM, iguaria de resto muito apreciada entre a malta do Norte. Veja-se aqui, a este propósito, um saboroso poste do nosso José Manuel Matos Dinis (***).  Mas também já apareceram camaradas nossos a queixarem-se do "extravio" de encomendas enviadas pelas famílias... Não sabemos como se fazia a articulação entre os CTT e o SPM, nem temos noção das tarifas que se praticavam na época.

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Notas do editor:

(*) Vd. último poste da série > 11 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17454: (De) Caras (78): Também eu fiz parte dessa rede de "contrabando de ternura" que permitia, aos nossos familiares, fazer-nos chegar a Bissau e ao 'mato' as suas "encomendinhas"... (Hélder Sousa, ex-fur mil trms TSF, Piche e Bissau, 1970/72; criado em Vila Franca de Xira e a residir hoje Setúbal)

(**) Vd. poste de 24 de dezembro de  2007 > Guiné 63/74 - P2378: O meu Natal no mato (11): Saltinho, 1972: O melhor bolo rei que comi até hoje, o da avó Clementina (Paulo Santiago)~

(***) Vd. poste de  25 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11002: História da CCAÇ 2679 (61): A vingança serve-se fria (José Manuel Matos Dinis)

domingo, 11 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17455: Blogpoesia (514): "Ponte do silêncio"; "Sarilhado de fios" e "Leitura das almas", poemas de J.L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728



1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Leitura das almas

Perscruto nos olhos das gentes
suas almas ocultas.
Nuvens de angústia toldam seus rostos.

O peso dos anos é muito
e escassa a esperança de vida.
É brando o fogo que lhes arde lá dentro.

Aquele apelo de luta que o dia-a-dia exigia
extinguiu-se com a última saída dos filhos.

Agora, navegam sozinhos, ao longe,
no mar das distâncias.

Implacável é a lei que assim ordenou,
sem prévia consulta,
a ver se as almas queriam...

Bar do Reichelt em Berlim, 7 de Junho de 2017
8h47m
Jlmg

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Ponte do silêncio

Feriado nacional, depois do Sábado e Domingo.
Uma ponte com sabor a mel.

Seis da manhã.
Seria a hora do fervilhar da vida laboral.
Estradas e passeios cheios.
A caminho da escola e do trabalho.

Em vez disso, um deserto de silêncio.
Até os canitos são sacrificados
Sem passeio matinal.

Apenas os melros e os passaritos
Cirandam nas suas lidas.

E eu que não sou alemão
Me passeio só,
Com minhas canadianas,
Testemunhando a paz e a harmonia verde
Que por aqui reina.

Num placar ao alto,
Demarcando uns cem metros,
Há um aviso aos carros estacionados:
- "Proibido estacionar aqui,
de sete a dez de Junho,
para se cuidar das árvores"

Cada uma delas ostenta no tronco,
uma ficha com seu número de identidade!...

Berlim, Bar dos motocas, 5 de Junho de 2017
9h33m
Jlmg

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Sarilhada de fios

Para pôr o computador a carburar,
Há uma sarilhada de fios a desenlaçar.
É o da corrente que se esconde na mala enrodilhado.
É o rato ladino que se esgueira ao trabalho como um rato.

É o da net que se emaranha numa teia sem aranha.
E o dos fones para calar os megafones.

Só depois eu páro e acendo a combustão.

Depois, é o clarão do mundo que se abre e aproxima.
Vêm as boas e muitas más.

Uma a uma, se acende verde o facebook.
Vem a troca. Cada um com seu farnel.
Cada um o seu sabor.

Aqui se chora, ali se ri.
Há os sérios e meditabundos.
E os cegos que só a si se vêem.
Mas também os generosos.

Os que pintam e os que escrevem lindamente.
Cada um na sua língua.

Depois, é a debandada.

Valeu a pena a trabalheira...

Berlim, no bar do Reicheld, 6 de Junho de 2017
8h55m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 4 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17430: Blogpoesia (513): No Dia dos Amigos (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas do BCAÇ 3872)

Guiné 61/74 - P17454: (De) Caras (71): Também eu fiz parte dessa rede de "contrabando de ternura" que permitia, aos nossos familiares, fazer-nos chegar a Bissau e ao 'mato' as suas "encomendinhas"... (Hélder Sousa, ex-fur mil trms TSF, Piche e Bissau, 1970/72; criado em Vila Franca de Xira e a residir hoje Setúbal)

1. Comentário deixado no poste P17453 (*), pelo nosso colaborador permanente Hélder Valério de Sousa (ex-fur mil trms TSF, Piche e Bissau, 1970/72, ribatejano a viver em Setúbal, com página pessoal no Facebook)


Uma história deliciosa (não só por causa do bacalhau...) que demonstra bem a capacidade inventiva do 'português típico' que é capaz de descortinar uma saída qualquer para os 'milhentos' problemas com que muitas vezes se depara.

Essa cadeia de solidariedade, de boas vontades, funcionou. E funcionou bem.

Em Vila Franca de Xira, onde vivi até ir para a Guiné e ainda algum (pouco) tempo depois, havia (e ainda há) um rapaz do meu tempo (1 ou 2 anos mais velho),  o Orlando Levezinho, que julgo ser primo do Tony. Tocava num daqueles conjuntos que proliferavam na década de sessenta e acho que ainda hoje está ligado a actividades musicais.

Mas o que me levou a fazer este comentário foi o apelo do Luís para que aparecessem mais histórias de remessas de produtos que chegavam por diversas formas e meios.

É claro que para quem estava em Bissau as coisas eram muito mais facilitadas, mas no interior também chegavam coisas. Acontece é que para o Levezinho a cadeia de solidariedade era mais complexa mas, mesmo assim, não teve quebras...

Uma das formas como as coisas chegavam era pelo 'portador'.

Quando se regressava de férias lá havia umas 'lembranças', fosse em bacalhau, chouriços, queijos, etc.

Quando fui para a Guiné (já contei aquando da minha apresentação aqui) fui portador de um garrafão de água-pé, castanhas e outras coisas, pois calculava-se que chegaria lá a tempo para o S. Martinho e de facto assim aconteceu pois cheguei no dia 9 de Novembro.

Essa 'encomenda' foi para o meu conterrâneo José Augusto Gonçalves, colega de turma na EICVFXira [, Escola Industrial e Comercial de Vila Franca de Xira] que era Fur Mil no Pelotão de Transmissões (tratava da montagem dos rádios e assistência à aparelhagem),  cujo quarto (que ele partilhava com outros dois Fur Mil,  o Vítor Ferreira, também de Vila Franca e meu parceiro/competidor de bilhar na "Brasileira", e o já aqui várias vezes referido Pechincha, da CART 11) fui usufruir.

Mais tarde, também foi a minha vez de receber alguma coisa, desta vez por intermédio de um tripulante do T/T "Niassa". Era avisado por carta (ou aerograma) de que isso ia acontecer, estava atento à chegada dos navios, entrávamos em contacto e lá recebia a encomenda.

Também tinha a sorte de ter um primo (aí já em terceiro grau...) na Base Aérea [,BA 12, em Bissalanca], o Sargento Salgado Valério (acho que era Valério Salgado, não sei bem) e que também de vez em quando recebia coisas por via aérea e que me facultava parte quando calhava.

Mas a maior parte e mais interessante, eram as encomendas que o meu camarada das Transmissões e da Escuta, o Fur Mil Nelson Batalha,  recebia.

O seu pai era funcionário de um Despachante aqui de Setúbal, o Fernando Pedrosa, que foi dirigente do Vitória de Setúbal e também com responsabilidades federativas.

Algumas vezes foi possível enviar, já quando estávamos em Bissau, na Escuta, umas caixas isotérmicas em barcos que passavam por Setúbal, por exemplo o "Ana Mafalda". Nessas caixas iam imensas coisas variadas que o Nelson partilhava connosco. Fruta da época (lembro-me bem dos melões, que o pessoal nativo dizia ser "papaia da metrópole"), compotas, bolachas, enchidos, etc..

Havia também patês variados de coisas que não estava habituado, como veado, javali e outros (isso agora é corriqueiro mas na época o que havia eram os de sardinha e atum e de presunto) e também várias espécies de salsichas, da Baviera, suecas, etc, que provinham das amostras que os fornecedores deixavam na Alfândega e que,  pronto!,  lá seguiam até à Guiné.... para se fazer o teste e aprova de qualidade.

Quando estive no interior, no 'mato', em Piche, lembro-me que de vez em quando havia quem recebesse coisas da 'Metrópole' mas não me lembro qual o meio utilizado.

Abraços
Hélder Sousa

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Nota do editor:

Vd. poste de  10 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17453: (De) Caras (77): O "contrabando" da... ternura ou como o "fiel amigo", o bacalhau, chegava à Bambadinca, ao Tony Levezinho, utilizando uma vasta rede de intermediários, do navio-tanque da Sacor à Casa Fialho - Parte II

sábado, 10 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17453: (De) Caras (70): O "contrabando" da... ternura ou como o "fiel amigo", o bacalhau, chegava à Bambadinca, ao Tony Levezinho, utilizando uma vasta rede de intermediários, do navio-tanque da Sacor à Casa Fialho - Parte II




"António Eugénio da Silva Levezinho nasce a 24 de Novembro de 1947, em Lisboa. Do pai, António Levezinho, herda o nome e a vontade de "vestir a camisola" pela Sacor. Seu pai era o funcionário número 27 da Sacor, onde entrou como electricista em 1954. É com orgulho que refere: "Já não fui o primeiro Levezinho a entrar para a Sacor, porque o meu pai é contemporâneo ao primeiro dia de existência da Sacor e contribuiu com as suas capacidades e competências para a construção da Refinaria de Lisboa." Com 5 anos apenas, ia já à refinaria onde o porteiro, impecavelmente bem vestido, perguntava: "Vem ver o paizinho?" Desde essa altura que entende esta empresa como uma segunda casa. É aqui que, em 1968, é abraçado pelo petróleo como escriturário aspirante. Na Sacor faz todo o seu percurso profissional, em Aprovisionamento e Exportação, até chegar a director-adjunto, em 1990." 

(Fonte: Vidas Galp Museu Virtual > Família > {1967] Anrtónio Levezinho, com a devida vénia. Segundo o Tony Levezinho, o pai começou por trabalhar, em 1940, numa das empresas que estava a construir a refinaria da Sacor. E entrou a seguir para a Sacor. Quando se reformou já era o funcionário nº 1 e não o 27).


1. Mensagem do Tony Levezinho, ex-fur mil at inf, CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71):

 Olá,  Luis

Tal como o prometido, aqui segue um pequeno texto, o qual, tanto quanto a memória me permite, tenta corresponder ao teu desafio (*)

Sabes que,  em "open space",  não me é particularmente grato falar na 1ª pessoa. Contudo, acho que neste caso, tinha que ser mesmo assim.

Agradecimentos, entre amigos são dispensáveis. No entanto, quero que saibas do meu reconhecimento pela tua referência ao meu pai, a qual, sei que é genuína.

Um grande Abraço e um Beijinho para a Alice.

Tony

P.S. - Na Net encontras um site,  Galp Vidas -Museu Virtual. Já na primeira década de 2000 (talvez 2005/6) fui convidado pela Galp para participar, no contexto da minha área (Aprovisionamento e Exportação). Se tiveres algum interesse...


2. A OPERAÇÃO “BACALHAU COM TODOS” 

por Tony Levezinho


O Bacalhau, mais do que um produto gastronómico comum à mesa portuguesa é, sem dúvida, uma herança cultural de gerações.

Fazendo honras, como nunca, ao seu título de “Fiel Amigo”,  foi companheiro de muitos de nós com a frequência possível, mas sempre com a virtude de confortar o estômago e de mitigar quer as saudades que sentíamos das nossas famílias, quer as vicissitudes e incertezas do nosso dia-a-dia.

Concretamente, acerca do Contrabando de Ternura, tal como o meu querido amigo Luis Graça lhe chama, aqui vão os contornos principais do esquema que fazia funcionar esta “rede de contrabando”, a operar a partir do Continente, sempre com o objetivo de nos fazer sentir um pouco mais próximos dos nossos locais de origem, de onde (ainda hoje não percebo bem porquê) nos tiraram.

Na empresa onde trabalhei, a Sacor (depois de abril,  integrou a Petrogal, que hoje pertence ao grupo Gal),  tive a sorte de ter um colega que por acaso também se chamava António Levezinho, pessoa muito estimada naquela organização, na altura, um dos poucos ainda no ativo, desde a sua fundação [. Chegaria a ser o nº 1, na altura em que se reformou.]

Acresce que este colega era o meu pai. Assim se justifica (ainda mais) a sua iniciativa de usar as boas relações que tinha com todos os setores da companhia para, junto da Sacor Marítima, empresa armadora do grupo (existe ainda hoje com a mesma designação) assegurar que os pacotes com o “precioso miminho” chegavam ao Parque de Armazenagem de Combustíveis de Bandim, em Bissau.
Para o efeito, os navios envolvidos neste tráfego eram o  “SACOR”, o “ROCAS”, o “CIDLA” ou o “BANDIM”, aqui apresentados, pela mesma ordem:







Chegada a mercadoria à Guiné, era então a vez de entrar em ação o chefe do parque da Sacor, o senhor Daniel Brazão, com quem ainda viria a trabalhar em Lisboa, após o meu regresso. Este cúmplice providenciava no sentido de que as encomendas com o "fiel amigo" fossem entregues na Casa Fialho, casa comercial à boa maneira colonial e com grande implantação no território, a qual, a partir da sua casa-mãe em Bissau, se encarregava de as fazer seguir até à sucursal de Bafatá, onde eu próprio ou alguém a meu pedido as recolhia, logo que possível.


O porquê do envolvimento da Casa Fialho nesta “liga de boas vontades”? [Não tenho a certeza se a foto à esquerda à da Casa Fialho ou da Casa Pintozinho em Bissau... Foi o TOny que ma mandou, sem legenda. LG]

Simplesmente porque o seu dono, o senhor Sérgio Fialho, era o líder de uma família abastada de uma aldeia chamada Sobrena, no concelho do Cadaval, onde uma tia minha (irmã do meu pai) vivia, por se ter casado com um natural daquela localidade.

Depois desta confidência sobre os detalhes de como funcionava, no terreno, a operação “Bacalhau Com Todos”, dou comigo a pensar se não será excessiva a fidelidade que atribuímos ao Bacalhau, a ponto de o tratarmos como o “Fiel Amigo”.

Da minha parte, garanto, a fidelidade é absoluta para com o Bacalhau, qualquer que seja a maneira como ele se apresente no prato.

Um Abraço Amigo

Tony Levezinho
(CCaç.12 - Bambadinca, 1969/71)

08/jun./2017

[Imagens enviadas pelo Tony Levezinho]



Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Estrada Bambadinca-Xime > Ponte do Rio Udunduma >  Destacamento da CCAÇ 12 > 1970 > 2º Grupo de Combate >  Era um ponto estratégico esta ponte. Dormíamos em buracos. De dia, davam-se ums mergilhos, apanhava-se peixe à linha ou à granada, fazíamos uns petiscos...mesmo sem cozinha. O almoço e a janta vinham de Bambadinca. O Tony Levezinho deve ter comido aqui, com o seu pessoal, uns postinhas de bacalhau assado na brasa.

Na foto, o Tony e o Humberto estão sentados na manjedoura... Era ali, protegidos da canícula, que tomavámos em conjunto as nossas refeições, escrevíamos as nossas cartas e aerogramas, jogávamos à lerpa, bebíamos um copo, matávamos o tédio...O dia acabava cedo, mal o sol de punha. O Tony, à esquerda, segura  uma granada de LGFog, calibre 3.7. Também à esquerda, de pé, em segundo plano o saudoso 1º cabo José Marques Alves (1947-2013).


Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



3. Comentário do editor LG:

Tony, obrigado!... Tenho mesmo que te agradecer em nome da Tabanca Grande. Seria uma pena que esta história ficasse só no baú da memória... e acabasse por se perder!

Por outro lado, ninguém vai ter lata de pôr em causa ou contestar o esquema que o pai Levezinho arranjou para te fazer chegar o "fiel amigo"... Na realidade, este esquema é centenário e tipicamente português...Um amigo faz sempre um jeitinho a um amigo, e para mais quando a causa era "nobre".. 

Bolas, estávamos em guerra, e longe de casa, e o teu velho devia ter uma coração de manteiga... Daí me ter ocorrido a expressão "contrabando de ternura"... O que ele organizou foi apenas uma rede de suporte social informal que funcionou às mil maravilhas, com 5 mil quilómetros de comprimento, Bafatá, Bambadinca)... E repara: nem tu nem o teu pai lesaram ninguém, muito menos a companhia... A "encomendinha" chegava sempre a bom porto, graças a um série de boas vontades... Um esquema bonito, perfeito, bem português... (E que eu saiba, nunca  houve reclamações: o teu/nosso "fiel amigo" não se perdia nas águas do Geba, como o da Intendência...).

Agora diz-me outra coisa: sempre tiveste jeito para a cozinha e acho que davas um grande "chef" se te metesses por aí... Em Bambadinca chegaste a meter o bedelho na cozinha das  messes ? [A cozinha era comum à messe de oficiais e à messe de sargentos]. Quem fazia os petiscos ?

Continuo a gostar de bacalhau de todas as maneiras e feitios... Ontem a Alice fez um belo bacalhau, receita meio nortenha, metade dela,   para uns alemãos de Münster... e eu contei-lhes a história do "Maria da Glória", miseravelmente afundado pelo U-94...do 1º tenente Otto Ites, em 5/6/1942... Adoraram o bacalhau... E sobre o nazismo têm um discurso inatacável: os alemães eram todos nazis, filhos, pais, avós, até ao Hitler... Um sistema totalitário a que a judia alemã Hanna Arendt  (1906-1975) chamou o "mal absoluto"... Em conversa, entre brancos, tinta  e uma aguardente velha para acabar em beleza, concluímos que o filho da mãe do Salazar até foi um ditador "ligh"... Terá sido ?

Eu discordo: afinal, cada povo tem afinal o ditador que merece... O nosso, por exemplo, não queria que os portugueses soubessem que os "nossos amigos alemães" eram capazes de fazer tiro ao alvo contra os nossos valentes pescadores e marinheiros que, no meio da maior batalha marítima de todos os tempos, se esgueiravam até à Terra Nova e à Gronelândia para pescar o "fiel amigo".

Um xicoração, Luís


4. Resposta do Tony Levezinho, com data de 8 do corrente:

Luis
Confirmo o gosto pela cozinha que ainda hoje exercito com prazer, mas em Bambadinca não me lembro de ter entrado na cozinha de qualquer das messes.
Curiosamente, lembro-me de preparar alguns petiscos, mas não recordo em que circunstâncias.

Guiné 61/74 - P17452: Parabéns a você (1270): Alcides Silva, ex-1.º Cabo Estofador do BART 2913 (Guiné, 1967/69)

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Nota do editor

Último poste da série de 9 de Junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17448: Parabéns a você (1269): Ernesto Duarte, Fur Mil Inf da CCAÇ 1421 (Guiné, 1965/67)

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17451: (De) Caras (69): O "contrabando" da... ternura ou como o "fiel amigo", o bacalhau, chegava à Bambadinca, ao Tony Levezinho, utilizando uma vasta rede de intermediários, do navio-tanque da Sacor à Casa Fialho - Parte I


Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71)  > 1970 > Furriéis milicianos Tony  Levezinho e [Luís Graça] Henriques, à civil... Dois amigos para a vida...


Foto: © António Levezinho (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Já aqui recordámos, neste blogue de antigos combatentes, a importância que tinha, no TO da Guiné, durante a guerra colonial, a presença do "fiel amigo" (*)... 

Para suprir as falhas da Intendência, eram as nossas próprias famílias que nos faziam chegar, aos aquartelamentos no mato, remessas do tão desejado bacalhau... sobretudo nas datas mais festivas e simbólicas, como o Natal ou o nosso dia de anos.

O "fiel amigo" vinha às postas, devidamente embalado, seco, salgado, e de preferência era do "especial", com a altura de 4 dedos... E ainda o João Alves, que é de Torrres Vedras,  não tinha inventado o "bacalhau demolhado, ultracongelado,  pronto a cozinhar",,, (A Riberalves aparecereá só em 1985, muito depois de ele vir da Guiné, onde estava quando aconteceu o 25 de abril) (*).

Estou-me a lembrar, isso sim, de um dos amigos que fiz, para a vida, o Tony Levezinho, meu camarada da CCAÇ 12, e um dos membros seniores da nossa Tabanca Grande, tal como o Humberto Reis (**).

É um gentleman, o Tony Levezinho,  tal como o pai, que eu ainda tive o privilégio de conhecer pessoalmente na sua casa da Amadora, nos primeiros anos da década de 1970, depois do regresso do inferno...  Pai e filho trabalharam na Sacor (mais tarde Petrogal, hoje Galp)... Quando o pai Levezinho se reformou era simplesmente o empregado nº 1 (!).

O Tony chegou mesmo a chefe de divisão (o que não era fácil a um self-made man como ele, numa empresa de engenheiros). Reformado, vive hoje com a sua querida Isabel na Tabanca,,,  da Ponta de Sagres - Martinhal...

Apesar da sua modéstia, o Tony foi (e continou a ser, mesmo depois de reformado da Galp) um perito na arte do import-export do petróleo e seus derivados... Mas, se eu evoquei aqui o seu nome, foi para contar o seguinte, a título de (in)confidência: graças às suas ligações à Sacor, nunca nos faltava o "fiel amigo" à mesa, em Bambadinca...

O bacalhau e outras iguarias chegavam-nos à Guiné, a Bisssau e depois a Bafatá e a Bambadinca, regularmente, transportado no navio-tanque da Sacor até Bissau e depois,  "à boa maneira portuguesa", encaminhado até ao seu destino final... A verdade é que o pai Levezinho nunca se esquecia do filho Levezinho e dos seus amigos e camaradas de Bambadinca...

Eu tenho que ter aqui um pensamento de grande ternura e gratidão para com esse homem, o pai Levezinho, que foi um dos nossos bons irãs poisados nos poilões de Bambadinca: o bacalhau que chegava ao Tony Levezinho, periodicamente, através do navio-tanque da Sacor ( ... e da Casa Fialho, no percurso final, de Bissau a Bafatá), não era comido às escondidas, sozinho, mas sim generosa e festivamente partilhado pelos amigos e camaradas mais próximos...

 E devo acrescentar que, se não nos matava a malvada (que era muita, aos 22 anos, e para quem palmilhava léguas e léguas pelos matos e bolanhas da Guiné), foi um suplemento de alma, e seguramente ajudou-nos a sobreviver e a regressar a casa, ainda com mais ganas de continuar a viver e a amar as coisas boas da vida, de que o "fiel amigo" fazia (e continua a fazer) parte,,,

2. Ao  escrever o poste P17440 (**) sobre uma efeméride ligada à história da pesca do bacalhau, de repente lembrei-me desta história do Tony Levezinho e do seu pai, e as remessas do "fiel amigo" que nos chegavam a Bambadinca através do navio-tanque da Sacor e, depois, da Casa Fialho...

Mas faltavan-me detalhes importantes, pelo que desafiei-o, no passado dia 7, nestes termos: "Tony, tens que me contar, agora por escrito, como é que se processava esse 'contrabando'... de ternura!"...

Embora ele não goste de falar de si, na primeira pessoa do singular, e nomeadaemente em público, logo na volta do correio, ele deu-me uma resposta afirmativa: "Viva Luis: apesar de já teres dito quase tudo, vou preparar um pequeno texto para corresponder ao teu desafio. Até já. Um Abraço .Tony".

É esse texto que vai ser publicado na II Parte, em poste a seguir. (***)

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Notas de leitura;

(*) Vd. Riberalves > Quem somos

(...) "A Riberalves produz 30 mil toneladas de bacalhau por ano, o equivalente a cerca de 8% a 10% de todo o bacalhau pescado no mundo. A capacidade produtiva da empresa conheceu um forte impulso a partir do ano 2000, após o investimento na unidade industrial da Moita, transformada naquela que é hoje a maior unidade mundial a operar exclusivamente no sector do bacalhau. Nesta unidade a Riberalves tem implementada tecnologia própria, desenvolvida para assegurar a produção do Bacalhau Demolhado Ultracongelado – Pronto a Cozinhar, uma categoria de produto que pela sua qualidade e carácter prático, tem vindo a permitir reinventar o consumo do “fiel amigo” e apontar a novos mercados".(,,,)

Vd, também Riberalves > Vídeos > Vídeo institucional 30 anos

(**) Vd. poste de 7 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17440: Efemérides (256): Faz agora 75 anos que foi afundado a oeste da Gronelândia o lugre bacalhoeiro ilhavense "Maria da Glória" por um submarino alemão... Dada o forte simbolismo da data, foi já proposta a Assembleia da República a instituição do dia 5 de junho como "O Dia Nacional do Bacalhau"...


(***) Último poste da série > 8 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17447: (De) Caras (75): Fausto Teixeira ou Fausto da Silva Teixeira, um dos primeiros militantes comunistas a ser deportado para a Guiné, em 1925, dono de modernas serrações mecânicas (Fá Mandinga, Banjara...) a partir de 1928, exportador de madeiras tropicais, colono próspero e respeitável em 1947, um dos primeiros a ter telefone em Bafatá, amigo de Amílcar Cabral, tendo inclusive ajudado o Luís Cabral a fugir para o Senegal, em 1960..."Quem foi, afinal, o meu avô?", pergunta o neto Fausto Luís Teixeira (nascido em Ponte Nova, Bafatá, onde viveu até aos três anos)...

Guiné 61/74 - P17450: Convívios (809): Encontro do pessoal da CCAV 2748/BCAV 2922, levado a efeito no passado dia 3 de Junho de 2017, em Almeirim (Francisco Palma)


COMPANHIA DE CAVALARIA 2748

COMBATENTES DA GUINÉ 70-72 

47 Anos da Partida de Lisboa e 45 do regresso de Bissau 

Levou a efeito mais um encontro, este ano no dia 03 de Junho em Almeirim, registando 75 presenças, onde foi um sem fim expressões de alegria e revivência do passado com alegrias, tristezas e até emoções, mas principalmente de alegria pelo reencontro e convívio.











Reportagem enviada pelo nosso camarada Francisco Palma (ex-Soldado Condutor Auto Rodas da CCAV 2748 / BCAV 2922, Canquelifá, 1970/72), nesta foto em primeiro plano,
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Nota do editor

Último poste da série de 7 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17444: Convívios (808): Encontro de RANGERS, alguns antigos combatentes na Guiné. Homens que cruzaram as suas vidas com a guerra colonial. (José Saúde)