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quarta-feira, 5 de junho de 2019

Guiné 61/74 - P19859: Tabanca Grande (481): Abel Rei, ex-1º cabo, CART 1661 (Fá, Enxalé, Bissá, Porto Gole, 1967/68)... Autor do livro "Entre o paraíso e o inferno: de Fá a Bissá, memórias da Guiné., 1967/68"... Passa finalmente a sentar-se à sombra do nosso poilão, no lugar nº 792


Foto nº 1 > Guiné > Região do Oio > Bissá  > CART 1661 (1967/68) > Imagem, desolada,  do destacamento de Bissá, no tempo em que lá esteve o Abel Rei, com o 3º Gr Comb...


Foto nº 2 > Guiné > Região do Oio > Bissá >  > CART 1661 (1967/68) > Imagem do destacamento de Bissá, no tempo em que lá esteve o Abel Rei, com o o 3º Gr Comb...


Foto nº 3

Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CART 1661 (1967/68)  >  Foto tirada em Porto Gole, com o Abel Rei a escrever algumas linhas do seu diário, mais tarde (em 2003) transformado em livro.


Foto nº 4

Guiné > Bissau > Fevereiro de 1968  > O 1º Cabo Abel Rei, da CART 1661 (Fá, Enxalé, BissáPorto Gole, 1967/68), de férias, na capital da província. “Vim juntamente com o ‘Conjunto João Paulo’, que fez nesse mesmo dia uma actuação musical em Porto Gole, partindo de seguida numa lancha, pelo Rio Geba, para cá”… Ficou hospedado na Pensão Chantre.


Foto nº 5

Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CART 1661 (1967/68) > Monumento ,onde se pode ler: "Para ti, soldado, o testemunho do teu esforço"... No final do ano de 1967, o comando da CART 1661 mudou-se para Porto Gole, passando o Enxalé a ser apenas um simples destacamento, depois na primeira daquelas localidades se terem construído as necessárias instalações para o pessoal, bem como o depósito de material. Foi também construído uma pista de aterragem para aeronaves tipo DO 27.

Fotos (e legendas): © Abel Rei (2002). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Quinta do Paul, Ortigosa, Monte Real, Leiria > IV Encontro Nacional  da Tabanca Grande > 20 de Junho de 2009 > O Abel Rei e a esposa, Maria Elisete, residentes no concelho da Marinha Grande...  O Abel terá conseguido vender, no nosso convívio, mais de três dezenas do seu livro (preço: 10 balas, menos de 100 pp.).

O Abel pertencia, no ano de 2007, à Direcção do Núcleo da Marinha Grande da Liga dos Combatentes (telefone: 244 551 140), exercendo o cargo de Tesoureiro, que teve de abandonar por motivos de saúde.

O livro, na altura,  podia ser encomendado directamente ao Abel Rei, que morava no Beco da R. dos Poços, 1, Lameira da Embra, 2430-126 Marinha Grande / Telem 938 195 700/ Email: abel_rei@hotmail.com (, este endereço já não está atualizado).

Fotos« (e legenda): © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


São Pedro de Moel > 2010 > Convívio da CART 1661 e Pel Caç Nat 54 > O ex-cap mil, o arquiteto e urbanista  Luís Vassalo Rosa  (1935-2018), ao centro; à esquerda o Abel Rei; e à direita, um alferes da CART 1661, não identificado.

Foto (e legenda): © José António Viegas (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Almeirim > 10 de maio de 2014 >  XXIII Encontro  do pessoal da CCAÇ 1439,  Pel Caç Nat 52, Pel Caç Nat 54, e Pel Mort 1028, que passaram pelo Enxalé (1965/67).  O Abel Rei é o primero da primeira fila, do lado direito. Alguns camaradas nossos conhecidos (e membros ds Tabanca Grande): Henrique Matos (Pel Caç Nat 52), José António Viegas (Pel Caç Nat 54), Júlio Pereira (CÇAÇ 1439). O "Mafra" é a alcunha do Manuel Calhanda Leitão, também já convidado para integrar a Tabanca Grande: foi o organizador do último encontro do pessoal, este ano, em 18 de maio de 2019, na Ericeira... Em 2010, houve um encontro histórico, deste pessoal, o 19º Encontro, onde estiveram presentes, entre outros, o Henrique Matos, o Mário Beja Santos, o Jorge Rosales,o João Crisóstomo, o madeirense António Freitas (um dos quatro alferes da CCAÇ 1439),  o João Neto Vaz, o Luís Cunha, e outros.

Foto (e legenda): © Henrique Matos  (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Abel de Jesus Carreira Rei,  ex-1º cabo, CART 1661 (1967/68), ou simplesmente Abel Rei, tem 15 referências no blogue, é amigo da página do Facebook da Tabanca Grande, é autor de um livro de memórias sobre a sua passagem na Guiné, já participou num dos nossos encontros nacionais,  o IV, em Ortigosa, Monte Real, Leiria, em 2009... mas, por lapso, ainda não consta da lista alfabética dos membros da Tabanca Grande.

Na altura, em 2009, foi apresentado, na Ortigosa, como "um dos nossos últimos piras (...), membro da Tabanca Grande". (*)

É mais do que justo reparar, agora,  esse imperdoável lapso. Ele passa a sentar-se, à sombra do nosso poilão, no lugar nº 792.(**)

Ainda recentemente o nosso colaborador permanente, Mário Beja Santos,  volta a fazer a recensão do livro do Abel de Jesus Carreira Rei, "Entre o Paraíso e o Inferno: De Fá a Bissá: Memórias da Guiné, 1967/1968".( Prefácio do Ten Gen Júlio Faria de Oliveira): Edição de autor. 2002. 171 pp. (Execução gráfica: Tipografia Lousanense, Lousã. 2002). (***)


(...) "É mais do que merecido o reconhecimento a este diário de Abel Rei, escrito com tanta sinceridade, envolto em tanta ternura, um registo também da vida de uma unidade que palmilhou o Xime, Amedalai, Denbataco, foi ao Buruntoni e ao Poidom, espalhou-se pelo Enxalé, Missirá e Porto Gole. (...) Temos que ter orgulho neste diário, é o espelho de um homem de fé que vai regressar sereno à sua vida civil, sem traumas nem azedumes. Recomendo vivamente a sua leitura. (...).

Do lamentável lapso temos que pedir desculpas ao nosso camarada Abel Rei e aos  restantes membros da Tabanca Grande.

Já em tempos aqui o dissemos: o Abel Rei  teve, entre outros,  o mérito de pôr no mapa da guerra da Guiné o nome de Bissá, sobre o qual poucos de nós sabiam alguma coisa.   Foi em Bissá que o valente Abna Na Onça, capitão de 2ª linha, balanta, enocntrou a morte...

Um camarada nosso que conheceu bem a região de Porto Gole, Bissá e Enxalé, o Henrique Matos, 1º comandante do Pel Caç Nat 52 (1966/68), também já aqui veio reconhecer que a manutenção de Bissá fora um erro, possivelmente pelo elevado custo, em vidas humanas, que terá acarretado, e pelas dificuldades de reabastecimento da sua guarnição.

2.  Algumas notas biográficas sobre o Abel Rei (que é o único representante da CART 1661, na nossa Tabanca Grande):

O Abel Rei nasceu em 30 de março de 1945, na freguesia de Maceira, concelho de Leiria. O pai era operário vidreiro. A família mudou-se para o concelho da Marinha Grande. O Abel começou a trabalhar bem cedo numa mercearia local, mal acabada a escola primária, aos dez anos. Aos quinze era serralheiro civil.

Mobilizado para a Guiné, serviu na CART 1661, que passou por Fá Mandinga, Enxalé, Bissá e Porto Gole. Partiu em 1 de Fevereiro de 1967 e regressou em 19 de Novembro de 1968.

A companhia teve três comandantes: Cap Mil Art Luís Vassalo [Namorado]  Rosa [1935-2018), Alf Mil Art Fernando António de Sá e Cap Art Manuel Jorge Dias de Sousa Figueiredo.

Depois da tropa, o Abel voltou a estudar, tendo completado o Curso Geral de Mecânica da Escola Industrial.

Citando o prefácio ao seu livro, "Entre o Paraíso e o Inferno: De Fá a Bissá: Memórias da Guiné, 1967/1968,  da autoria .do ten gen ref Júlio Faria de Oliveira, presidente da Direcção Central da Liga dos Combatentes, “ainda bem que o antigo combatente Abel Rei escreveu esta história verdadeira, a qual, em minha opinião, é extremamente interessante e duvido que aquela, que ele gostaria de ter escrito, fosse ainda melhor” (p. 17).

Em geral, são notas diárias, de um, dois ou três parágrafos, que o Abel Rei foi redigindo num caderninho que sempre o acompanhava. A primeira tem a data de 1/2/67 (partida do T/T Uíge, do cais da Rocha Conde de Óbidos) e a última data de 19/11/68 (regresso à Metrópole, também no mesmo navio).

Ao todo, são 178 registos diários, em pouco mais de 21 meses de comissão, mais de metade das quais (53,4%) correspondem aos quatro primeiros meses (de fevereiro a maio de 1967). De junho até ao final do ano, escreveu apenas, em média, 4 vezes por mês… No segundo ano (jan-nov 1968), o ritmo da escrita, certamente por cansaço, saturação ou quebra de disciplina, baixou ainda mais: um pouco mais de 3 registos por mês, embora mais extensos, ocupando 4 dezenas de páginas (de 126 a 166).

O Abel Rei tem página no Facebook.
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 7 de julho de  2009 > Guiné 63/74 - P4648: IV Encontro Nacional do Nosso Blogue (19): Os nossos escritores (Luís Graça)

12 de agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4815: Notas de leitura (14): As memórias do inferno de Abel Rei (Parte I) (Luís Graça)

14 de agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4820: Notas de leitura (15): As memórias do inferno de Abel Rei (Parte II) (Luís Graça)

24 de agosto de 2009 > Guiné 1963/74 - P4858: Notas de leitura (16): Memórias do inferno de Abel Rei (Parte III) (Luís Graça)


12 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5983: O mundo é pequeno e o nosso blogue... é grande (22): As voltas que o mundo dá, graças a um blogue que congrega uma diáspora de combatentes (Beja Santos)

30 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14547: Convívios (671): CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá e Portogole, 1965/67) + Pel Caç Nat 52 e 54... Caldas da Raínha, dia 9 de maio de 2015... Inscrições até este fim de semana... (Maria Helena Carvalho, filha do Pereira do Enxalé / Henrique Matos, ex-alf mil, cmdt, Pel Caç Nat 52, 1966/68)

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Guiné 61/74 - P18851: Recordações de Porto Gole, Enxalé e Missirá: fotos de Abna Na Onça e outros camaradas (João Crisóstomo, Nova Iorque; ex-alf mil, CCAÇ 1439,1965/67)


Foto nº 1 > Da esquerda para a direita, João Crisóstomo e o régulo Abna Na Onça


Foto nº 1A > Da esquerda para a direita, João Crisóstomo e o régulo Abna Na Onça


Foto nº 2 > A equipa de futebol:  de pé, da esquerda para a direita: eu, João Crisóstomo; o fur mil Bonifácio, da Lourinhã (mais conhecido por "O Passarinho"...); O Manuel, o "açoriano", a nossa primeira vítima de mina anticarro; não me lembro dos nomes dos restantes... na fila da frente, da esquerda para a direita,  o João, do Bombarral, que era o padeiro;  dos restantes, lembro-me ca cara, mas já não dos nomes... Ao fundo, à direita, fazendo exercício,  está o furriel Eduardo, que havia feito parte da equipe de futebol do Porto e que por qualquer motivo não quis jogar neste dia…


Foto nº 2A > A equipa de futebol... O João é o primeiro da esquerda, na fila de pé...


Foto nº 3 > A "preparação" da  CCAÇ  1439 está oficialmente acabada. O capitão Pires reúne os seus alferes, Crisóstomo, Freitas, Sousa e [Luís] Zagallo e anuncia que vai partir mais cedo de avião,  e estará à nossa espera quando a companhia chegar à Guiné. Ainda hoje me pergunto  quem trouxe os charutos e qual a razão… Ao alto do lado direito, na parede, uma divisa: "Se souberes obedecer, saberás comandar"...


Foto nº 3A > Os oficiais da CCAª 1439: o capitão Pires, ao centro, ladeado à sua direita pelos alfres Crisóstomo e Sousa; e à esquerda, pelos alferes Zagallo e Freitas... [LG]


Foto nº 4 > Perdidos no mato...  Em primeiro plano é o Capitão Pires ao lado direito e do lado esquerdo o Orlando, cabo, madeirense; ao fundo os “guias".


Foto nº 5 > Enxalé, c. 1966 > Visita do gen Arnaldo Schulz


Foto nº 5A > Enxalé, c. 1966 > CCAÇ 1439 (1965/67> Visita do gen Arnaldo Schulz, à esquerda, com o cap Pires e o alf Crisóstomo (de óculos).

Fotos (e legendas): © João Crisóstomo (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de João Crisóstomo (ex-alf mil, CCAÇ 1439, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67, que vive hoje em Nova Iorque, e que tem dado a cara por causa nobres, sociais e culturais,  que muito nos honram a todos nós, portugueses: Gravuras de Foz Côa, Timor-Leste, Aristides Sousa Mendes, etc.; tem cerca de 7 dezenas de referências no nosso blogue).

Data: 15 de julho de 2018 às 18:09
Assunto: foto  deAbna na Onça e outras

Caríssimo Luís Graça;

Hoje, 14 de Julho, foi tempo para "não fazer nada"  excepto seguir o jogo da Bélgica-Inglaterra. Fiquei satisfeito, pois nunca perdoei aos ingleses o que nos fizeram em 1966, ano em que Portugal devia ter ganho o campeonato mundial de futebol, não fossem as manhas e manobras/trapaças   dos ingleses…  E deu para deixar vadiar a minha memória e imaginação, o que fiz calcorreando pelas terras da Guiné por onde passei, nas páginas do nosso blogue.
   
Apareceu uma  foto do Jorge Rosales e  lembrei-me  que,   no   ano  passado,  alguém sugeriu/pediu  se alguém tinha fotos e   informações sobre Abna Na Onça,  o "Homem Grande" de Porto Gole, conforme muito apropriadamente lhe chamou o  Jorge Rosales (Poste P5122, d e 17 de outubro de 2009) (*).

João Crisóstomo, grande amigo
de Timor-Leste
Na altura enviei uma foto  que tinha comigo (poste P17693, de 23 de Agosto de 2017) (**). E  fiquei de enviar uma outra que sabia ter comigo, mas nunca mais a encontrei. Até há meia-hora atrás.  Como o pai do filho pródigo, passeando pelo  blogue  "Luís Graça & Camaradas   da Guiné",  de repente deparei  com  o poste do Jorge Rosales  onde ele aparece com o Abna Na Onça.  "Puxa vida, pensei eu, nunca mais encontrei essa foto que prometi enviar. E eu tenho a certeza que a tenho em qualquer parte"...

E tinha.  Estava no meio das muitas fotografias que,  como tapete   contínuo,  cobrem as paredes do meu apartamento; eu tenho a mania de, quanto possível,  não pôr em gavetas as fotos de que gosto mais. Por isso o meu apartamento é uma "colagem" enorme … mas por vezes, como sucedeu com  neste caso, tem os seus inconvenientes: quando procuro uma determinada foto não  a encontro.

Como o pai do filho pródigo, contente por ter encontrado a "foto desgarrada",  pus-me a ver outras sobre a Guiné (estas outras estavam numa caixa pois não dá para pôr tudo nas paredes) e encontrei estas que te envio. São fotos velhas, e infelizmente em muito mau estado:  têm   sofrido os manuseamentos,   escolhas,  arrumações, muitas  viagens e respectivas  mudanças de endereço  que,  como se fosse cigano, tenho experimentado na minha vida pós-militar.  Enfim...

Se virem que têm interesse, usem-nas  ou não, como bem entenderem .  Algumas delas foram "digitalizadas" pelo Henrique Matos… se  acharem  que alguma tem interesse para ser publicada no blogue, talvez o Henrique Matos possa ajudar (creio que ele tem uma cópia de todas as fotos  que  ele fez o favor de digitalizar para mim.)

Segue uma breve explicação de cada uma delas:

Foto nº 1 (que deu aso a este email) >  Eu e o "Homem Grande" Abna  Na Onça. Não precisa de mais explicações; todos sabemos já quem era este extraordinário régulo de Porto Gole. Com respeito  e saudades: Paz à sua alma!

 Foto nº 2 > A "equipe de futebol do dia"… não me lembro de alguns  nomes, mas posso identificar: na fila de trás: eu, seguido do falecido furriel  Bonifácio da Lourinhã (a quem chamávamos  muito amigavelmente   "o passarinho"  pelas suas minúsculas  refeições; era sobrinho do grande Padre Franciscano Frei António Ribeiro, das Matas da Lourinhã, se me não engano).

No meio está o desafortunado Manuel,  "o  Açoriano" [, Manuel Pacheco Pereira Júnior, de seu nome completo],  assim chamado por ser o único elemento da CCAÇ 1439 que era dos Açores. Foi a primeira vítima duma mina anticarro. Faleceu  em   Mato Cão. Estava  em cima do Unimog quando a poderosa mina rebentou. A explosão foi de tal modo violenta  que ele ficou quase " pulverizado"  e, na altura, nem se deu pela falta dele. Só no dia seguinte ao ser feita  a chamada, quando o seu nome não teve resposta e ninguém sabia onde ele estava , houve alguém que se lembrou então  de tê- lo visto  em cima do Unimog momentos antes da explosão. Feita uma saída imediata ao Mato Cão depois de muito procurar   deparamo-nos com os seus minúsculos restos mortais  que foram religiosamente apanhados e a quem foram prestados os respeitos que as circunstancias permitiam.

Na fila da frente o  primeiro colado esquerdo é o João, do Bombarral, que era o padeiro. Várias vezes tenho perguntado se alguém sabe onde se encontra ( parece que emigrou, dizem) Dos outros, lembro-me bem dos rostos, mas, com imensa pena minha,  a minha memória não é capaz de vir com mais nenhum nome.    No canto direito da foto pode-se descortinar ao fundo , fazendo exercício,  o furriel Eduardo, que havia feito parte da equipe de futebol do Porto e que por qualquer motivo não quis jogar neste dia…

Foto nº 3 > A "preparação" da  CCAÇ  1439 está oficialmente acabada. O capitão Pires reune os seus alferes   Crisóstomo, Freitas, Sousa e Zagallo e anuncia que vai partir mais cedo de avião,  e estará à nossa espera quando a companhia chegar à Guiné. Ainda hoje me pergunto  quem trouxe os charutos e qual a razão… Ao alto do lado direito, na parede, uma divisa: "Se souberes obedecer, saberás comandar"...

Foto nº 4 > Esta fotografia foi tirada no mesmo dia e local de uma outra que eu enviei sobre o falecido Furriel Mano,  vítima duma mina na estrada de Missirá- Enxalé (Poste P15998,  de 21 de Abril de 2016) (***):  num momento difícil,  literalmente perdidos no mato; os próprios guias confessavam estar perdidos sem saberem onde estavam nem como prosseguir. As expressões de todos nestas duas fotos  é evidencia da muita preocupação, incluindo a do capitão Pires que deu  instruções ao furriel de transmissões para contactar os "bombardeiros" para nos ajudarem e orientarem como prosseguir.

Foto nº 5A > Enxalé, c. 1966:Visita do gen Schulz

PS - Luís: Espero que faças - fá-lo por favor - a devida escolha do que pode ou não ser de interesse para publicação no blogue. 


O que menciono a seguir já saiu no blogue. Não quero estar a abusar.

E pronto por hoje. Vamos para a Eslovénia no dia 22 [de julho] e no dia 24 [de agosto] vamos para Portugal, onde espero poder  estar com vocês; e,  senão fôr antes,  pelo menos  no domingo,   dia 16 de Setembro. Sinto-me frustrado por não poder fazer melhor; quando vou a Portugal gostaria bem de poder visitar todos os meus amigos , um por um, mas …não dá.

Vilma e João Crisóstomo
Um encontro como este é o melhor que posso fazer ; mas   muitas vezes  volto aos EUA sem ver gente muito querida com quem gostaria de poder ter  estado. Para quem puder dar-me essa grande satisfação,  se achares pertinente podes anunciar  outra vez:

O encontro é às 03.00 da tarde, de domingo, 16 de setembro de 2018, em em Paradas, A-dos-Cunhados, Torres Vedras, na "Associação das Paradas", Rua José Ferreira, 5 ( na estrada de Santa Cruz para A-dos-Cunhados). (****)

Mas a gente ainda se fala  antes  disso com certeza.   

Até lá um grande abraço 
João e Vilma
_____________

Notas de leituras

(*)  Vd. poste de 17 de outubro de 2009 > Guiné 63/74 – P5122: Estórias avulsas (15): Homens Grandes, Jorge Rosales (ex-Alf Mil da 1.ª CCAÇ - Porto Gole -, 1964/66)

Vd. também postes de:




(****) Vd. poste de 20 de maio de 2018 > Guiné 61/74 - P18655: E as nossas palmas vão para... (16): João Crisóstomo, nosso camarada da diáspora lusitana, por 3 razões: (i) foi homenageado pelos correios de Israel; (ii) continua solidário com Timor Leste; e (iii) convida-nos a todos para a sua festa do próximo dia 16 de setembro, em Paradas, A-dos-Cunhados, Torres Vedras


(...) Associação de Desenvolvimento de Paradas, Paradas, A dos Cunhados, Torres Vedras. 15out2013. Tarde de convívios dos parentes das famílias Crisóstomo e Crispim e dos amigos e camaradas do João Crisóstomo, recém casado com a eslovena Vilma Kracun. O casal vive em Nova Iorque, e passou pela terra natal do João, a caminho da Eslovénia onde vai passar as festas do Natal e Ano Novo.. Intervenção de Luís Graça, quwe disse uns versos (8 quadras populares), de homenagem ao casal... em nome dos "amigos do Oeste".

Letra: Luís Graça

1
João Crisóstomo, eh pá!,
E Vilma Kracun, oh priga!...
Uma de lá, outro de cá,
Um rapaz e uma rapariga.

2
Formam os dois um belo par,
Esloveno-português,
Acabaram de casar,
Ela, doce, ele, cortês.

3
Dois mundos a separá-los,
Ela no velho [Europa], ele no no novo [América],
Vem agora abençoá-los,
Com amor, o nosso povo.

4
É o João um senhor,
Que faz o culto da amizade,
E amanhã comendador
Da Ordem da Liberdade.

5
Mordomo de profissão,
Portugal nunca esquece,
No verde e rubro coração
Onde a Pátria não esmorece.

6
Fez a guerra, coisa má
Lá nas terras da Guiné,
Finete e Missirá,
Porto Gole e Enxalé,

7
Animador libertário,
Foi de causas defensor,
Do Cônsul Humanitário [Aristides Sousa Mendes]
A Foz Côa e a Timor.

8
P’ra um casal, lindo como este,
P’rá Vilma e p’ró João,
Dos amigos do Oeste
Vai um grande… xicoração!


Paradas, A-dos-Cunhados,
15/12/2013

Os amigos do Oeste…Luís Graça & Alice, Eduardo Jorge Ferreira & São, Jaime Silva & Dina, Joaquim Pinto Carvalho & Céu… a que se associaram o Júlio Martins Pereira & esposa (Recarei, Paredes) e demais presentes, amigos e parentes das famílias Crisóstomo & Crispim. (...)

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Guiné 61/74 - P17707: (De) Caras (92): O cap 2.ª linha Abna Na Onça, balanta, e o 1º srgt Arlindo Verdugo Alface, alentejano do Cano, concelho de Sousel, dois "irmãos de sangue", e dois "homens grandes" com quem tive o privilégio de conviver (Jorge Rosales, ex-al mil, 1ª Companhia Indígena, Porto Gole, 1964/66)


Guiné > Região do Óio > Porto Gole > 1º Companhia de Caçadores Indígenas (1964/66) >  O Abna Na Onça e o Jorge Rosales 


Guiné > Região do Óio > Porto Gole > 1º Companhia de Caçadores Indígenas (1964/66) > Jorge Rosales e o 1º srgt Arlindo Verdugo Alface, junto ao monumento comemorativo da chegada do explorador português Diogo Gomes em 1456.


Fotos (e legendas): © Jorge Rosales  (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Dois "homens grandes" que conheci em Porto Gole

por Jorge Rosales (*)

[Ilha das Cabras, Bijagós, julho de 1966... O "comandante" Jorge Rosales, régulo da Magnífica Tabanca da Linha, já no final da sua comissão, depois de ter passado 18 meses em Porto Gole, 1964/66...  Alferes  miliciano,   pertenceu à 1ª Companhia de Caçadores Indígena, com sede em Farim. (Havia mais duas, uma Bedanda, a 4ª, CCAÇ, e outra em Nova Lamego, a 3ª CCAÇ). 

Ficou lá pouco tempo, em Farim, talvez uma semana. A companhia estava dispersa. Foi destacado para Porto Gole, com duas secções (da CCAÇ 556, do Enxalé) e outra secção, sua, de africanos. Tinha um guarda-costas bijagó. Ficou lá 18 meses. Passou os últimos tempos, em Bolama, no CIM - Centro de Instrução Militar, a dar recruta a soldados africanos. É membro da nossa Tabanca Grande desde 9/6/2009 (*)]


Depois de dez dias entre Bissau e Farim, vejo-me a caminho de Porto Gole, Geba acima, a favor da maré; ia num barco da casa “Gouveia”, que levava géneros para Porto Gole e, talvez, Xime e Enxalé  (**) …

No barco, sentia-me ansioso, apreensivo: Mafra, Cica 2, viagem no “Alfredo da Silva”, com passagem pelo Mindelo e Praia, pertenciam ao passado.

Tentava adivinhar qual a reacção do pelotão veterano de Porto Gole, à chegada do Alferes “maçarico”. Era, para mim, um salto no escuro...

À minha espera, como maior graduado, estava o 1º Sargento [Arlindo Verdugo] Alface. Foi ele que me orientou, com os seus conselhos e “palpites”.

Tinha a sabedoria de transmitir, com subtileza, a sua experiência, coisa que não vem nos livros… adquire-se. (***)

Para o Abna Na Onça, capitão de segunda linha, o Alface era o confidente, o amigo leal; fez questão de tornar o Alface seu irmão de sangue. 

Assisti à cerimónia de troca de sangue destes dois homens, com os braços unidos. 

Num fim de tarde, na sua tabanca, o Abna chamou-me para me mostrar, com orgulho, a sua assinatura: “ Abna na Onça Alface”. 

Foi, para mim, um privilégio conviver com estes dois “Homens Grandes“: um, balanta de Porto Gole, o outro, alentejano do Cano [,  concelho de Sousel, distrito de Portalegre].

O Abna morreu em combate, em Bissá, em [14 de[ Abril de 1967, como relata o Abel Rei no seu livro, “Entre o Paraíso e o Inferno“.  O Alface, também já não está entre nós, vítima de atropelamento na zona de Lisboa. 

A “Tabanca Grande“ fez-me voltar à Guiné, às suas recordações… e a mais forte, de todas elas, deu motivo a este relato. 

Jorge Rosales  (***)


2. Comentário de Cherno Baldé:

(...) O apelido do cap Abna "Na Onça" sugere-me uma grafia errada por simpatia, como diriam os entendidos na matéria. Existe o apelido balanta muito próximo,  "Na Onta",  que, provavelmente, alguém transformou em "Onça", para não variar.

De uma forma geral, o português metropolitano,  na altura, não era bom em captar e grafar os nomes indígenas, existem variadíssimos exemplos disso, como o caso de um familiar meu cujo apelido "Baldé" foi transformado em "Valdez" para não complicar. Se ele, de facto, tivesse o tal apelido, "Na Onça", hoje apareceriam muitos com o mesmo apelido,  o que não me parece ser o caso" (...).
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de  9 junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4488: Tabanca Grande (151): Jorge Rosales, ex-Alf Mil, Porto Gole, 1964/66, grande amigo do Cap 2ª linha Abna Na Onça

(...) Era muito amigo do mítico Capitão de 2ª linha, o Abna Na Onça, chefe espiritual, poderoso, da comunidade balanta da região, a quem o PAIGC havia cometido o erro fatal de “matar duas mulheres e roubar centenas de cabeças de gado”. O seu prestígio, a sua influência e e o seu carisma eram tão grandes que ele sabia tudo o que se passava numa vasta região que ia de Mansoa a Bambadinca (nomeadamente, importantes informações militares, como a passagem de homens e armas do PAIGC).

Jovem (teria hoje 72/73 anos se fosse vivo), era um homem imponente, nos seus 120 kg. Schultz tinha-lhe oferecido um relógio de ouro e uma G3 como reconhecimento pelos seus brilhantes serviços … Mais tarde, será morto, em Bissá, em 14/4/67, com seis dos seus polícias administrativos, todos eles residentes em Porto Gole… Nesse dia o destacamento é abandonado pelas NT: “ um dia trágico para quem estava no inferno de Bissá", como escreveu o Abel Rei no seu diário ("Entre o paraíso e o inferno: de Fá a Bissá. Memórias da Guiné, 1967/68, editado em 2002, pp. 68/70) (...)

 (...) Enquanto [o Jorge Rosales] lá esteve, em Porto Gole, havia um certo respeito mútuo, de parte a parte. A influência de Cabral era evidente, fazendo a distinção entre o povo (português) e o regime (colonialista). Podiam deslocar-se num raio de 10 km…. Mas a ligação com Mansoa já se perdera. O troço já não era seguro. Em Mansoa estavam os respeitados Águias Negras (BART 645, que dominavam o triângulo do Óio: Olossato, Bissorâ e Mansabá) .

Do lado do Geba, eram os fuzileiros que impunham a lei e o respeito. Lançavam uma bóia e fundeavam a LDG em frente a Porto Gole. Vinha quase tudo por rio: os frescos, a bianda, os cunhetes de munições… (excepto o correio, que era lançado do ar, de DO 27, e às vezes ir cair no tarrafo; em contrapartida, o correio expedido ia de LDG... Singuralidades de Porto Gole que não tinha uma simples pista de terra batida, para as aeronaves). Tem vários amigos fuzos, desse tempo, incluindo o comandante Castanho Pais.

Do outro lado, a nascente estava a CCAÇ 556, no Enxalé… Também conhece dois furrieís do Enxalé, de quem se tornou amigo. Também passou por Fá. E no final da comissão, esteve em Bolama, por onde passavam os periquitos… Conviveu com algumas companhias que, de Bolama, partiam para operações no continente (...).


(**) Vd. poste original: 17 de outubro de 2009 > Guiné 63/74 – P5122: Estórias avulsas (15): Homens Grandes, Jorge Rosales (ex-Alf Mil da 1.ª CCAÇ - Porto Gole -, 1964/66)

domingo, 27 de agosto de 2017

Guiné 61/74 - P17704: (De)Caras (91): Abna Na Onça, cap 2ª linha, comandante de uma companhia de polícia administrativa, regedor do posto do Enxalé, prémio "Governador da Guiné" (1966), morto em combate em Bissá, em 14/4/1967, agraciado a título póstumo com a Cruz de Guerra de 1ª Classe (José António Viegas, ex-fur mil, Pel Caç Nat 54, Enxalé e Ilha das Galinhas, 1966/68)


Foto nº 1 A


Foto nº 1


Foto nº 2

Guiné > Região do Oio > Porto Gole ou Enxalé > c. abril de 1967 > Abna Na Onça dias antes de ser morto em Bissá (em 14/4/1967) (foto nº 1) mais uma das suas esposas e filho (foto nº 2).

Fotos (e legendas): © José António Viegas (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem de 23 do corrente, enviada pelo José António Viegas, ex-fur mil, Pel Caç Nat 54 (Enxalé e Ilha das Galinhas, 1966/68), em resposta ao pedido formulado no poste P17693 (*):

 Caro João Crisóstomo

Ai vai uma foto do capitão de 2ª linha Abna na Onça, tirada poucos dias antes de ele morrer em Bissá, esse homem valente com quem o meu Pel Caç Nat 54 saiu várias vezes,  com ele e a sua polícia administrativa .

Na primeira  levada para se implantar o aquartelamento em Bissá, foi o Capitão Abna na Onça com os seus homens mais um pelotão da Cart 1661, ao 2º. ou 3º. dia,  já não me recordo,  foram atacados em força com canhão sem recuo e morteiro 82 , tendo o cap Abna na Onça sido atingido com estilhaço de granada de canhão sem recuo no peito, enquanto teve forças comandou os seus homens até ao fim. Houve dificuldade de comunicações e só quando chegaram mensageiros de Bissá se soube da tragédia.

Foram depois retirados os mortos e os feridos para Porto Gole a aguardar por ordem,  o que foram 2 dias terriveis com o cheiro, tendo eu gasto pacotes de detergente para tentar amainar o cheiro. Ao segundo dia vieram ordens para enterrar os policias administrativos, o que o fiz junto ao monumento e o cap Abna na Onça viria uma LDP buscá-lo.

Vim a saber depois pelo cabo manobra dessa lancha que a viagem de Porto Gole a Bissau,  foi horrível com o cheiro, tendo os marinheiros vomitado todo o caminho.

A segunda foto é uma das mulheres dele com o filho.

Foi substituído no comando da Policia Administrativa pelo seu irmão Sagna Na Onça.

Um abraço

Zé Viegas

PS - O malogrado cap Abna Na Onça, morto em combate, em Bissá (e não Biná...), em 14 de abril de  1967, capitão de 2.ª linha, comandante de uma Companhia de Polícia Administrativa e regedor do posto de Enxalé, foi agraciado a título póstumo com a Cruz de Guerra de 1ª Classe, conforme .publicado na OE24/IIIª/67. Tinha sido "Prémio Governador da Guiné", e visitado a metrópole em 1966. (**)

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quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Guiné 61/74 - P17693: (De) Caras (89): Abna Na Onça, balanta, capitão de 2ª linha, morto em Bissá, em 15/4/1967... Fotos precisam-se... Foi conhecido do Jorge Rosales, João Crisóstimo, Abel Rei e Henrique Matos


Guiné > Região do Oio > Porto Gole > c. 1965/66 > O alf mil da CCAÇ 1439, João Crsóstomo, ao fundo, na ponta da mesa; em primeiro, de costas, o Abna Na Onça, capitão de 2ª linha.

Foto (e legenda): © João Crisóstomo (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Mensagem, com data de ontem, do João Crisostomo (ex-alf mil, CCAÇ 1439, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67, que vive hoje em Nova Iorque) , em complemento do poste P17686 (*)

Caro Luis Graca,

Admiro-me que ninguém tenha ainda enviado fotos do Abna Na Onça. Quando voltar a Nova Iorque vou procurar, pois -- se não as perdi -- sei que tenho alguma coisa: tenho mesmo uma foto com ele (só nós os dois) em que eu pareço quase um anão ao lado dele. 

Entretanto envio-te uma que encontrei aqui no meu “arquivo” do meu computador em que ele aparece. Se a memória me não engana esta foto foi tirada quando eu fui a Porto Gole pela 1ª vez mas ainda não era para ficar . Só sei que o chefe de posto resolveu convidar-me para almoçar . acredito que estava apenas de visita (talvez para reabastecer quem lá estava),  pois vejo dois sargentos que,  se me não engano,  não pertenciam à nossa CCAÇ 1439. 

Na foto,  vê-se na cabeça da mesa Abna Na Onça de costas, mas ainda dá para o identificar sem qualquer dúvida; depois, pela direita, o chefe de posto (cabo-verdiano) e a esposa dele; a seguir um sargento cujo nome não lembro mais; eu estou na cabeça da mesa oposta ao Abna na Onca; a seguir um outro sargento cujo nome me não lembro ( oxalá isto não seja princípio de Alzeimar, mas a verdade é que estou a esquecer tudo e só me lembro de metade dos nomes…); a seguir está um furriel que me lembro de chamar “Tony” e sei havia algo de especial a respeito dele ( conhecimentos dele com pessoas célebres, penso eu); e a seguir ao lado dele o filho do chefe do posto. 

Quanto a outras memórias de Porto Gole… quem não tem memórias dos lugares por onde passou???… No meu caso, embora começam a ficar já “enevoadas”: além de Porto Gole, não me faltam memórias de Enxalé, Xime, Bambadinca, Missirá…. e outros . 

 Acredito que qualquer um de nós tem material para escrever um livro de recordações se se puser com vontade de as partilhar . E creio que muitos outros, cingindo-se apenas a factos sem qualquer precisão de "florear" , têm até muito mais a contar do que eu. É neste espírito de confiança que eu leio o que outros escrevem, quando escrevem no teu/nosso blogue. Se há alguém que quer escrever para “fazer literatura”, então eu espero bem que escrevam um romance ou o que quiserem, mas não o façam no teu/nosso blogue. Esse é para mim como um arquivo de memórias que merece todo o respeito (embora compreenda que há muita gente que como eu já se lembre só metade das coisas e, sem querer, comece mesmo a baralhar coisas). 

As brancas são  "próprias da idade" e há que respeitar, mesmo que haja incongruências e confusões. Por minha parte de coração agradeço que quando virem que estou dizer coisas “erradas" me corrijam imediatamente ; que isso só vai ajudar (a mim e a todos os que leem) a história como se passou .
Um abraço a toda a malta que ler isto.

João Crisóstomo


2. Comentário do editor:

Obrigado, João, é uma foto preciosa. De facto, como te disse, não tenho nenhuma foto do lendário Abna Na Onça. Pelo menos que me lembre... em todos estes 13 anos e meio de blogue...

Sobre o Abna Na Onça, temos uma versão do Jorge Rosales, que é de 1964/66 (**):

(...) Diz-me que era muito amigo do mítico Capitão de 2ª linha, o Abna Na Onça, chefe espiritual, poderoso, da comunidade balanta da região, a quem o PAIGC havia cometido o erro fatal de “matar duas mulheres e roubar centenas de cabeças de gado”. O seu prestígio, a sua influência e e o seu carisma eram tão grandes que ele sabia tudo o que se passava numa vasta região que ia de Mansoa a Bambadinca (nomeadamente, importantes informações militares, como a passagem de homens e armas do PAIGC).

Jovem (teria hoje 72/73 anos se fosse vivo), era um homem imponente, nos seus 120 kg. Schultz tinha-lhe oferecido um relógio de ouro e uma G3 como reconhecimento pelos seus brilhantes serviços … Mais tarde, será morto, em Bissá, em 15/4/67, com seis dos seus polícias administrativos, todos eles residentes em Porto Gole… Nesse dia o destacamento é abandonado pelas NT: “ um dia trágico para quem estava no inferno de Bissá, como escreveu o Abel Rei no seu diário( Entre o paraíso e o inferno: de Fá a Bissá. Memórias da Guiné, 1967/68, editado em 2002, pp. 68/70) (**)…


O Henrique Matos também o conheceu:

(...) Capitão de 2ª linha Abna Na Onça (...) era régulo de Porto Gole (não do Enxalé) e comandava a Polícia Administrativa, um grupo de pouco mais de 20 elementos que tinha uma farda esverdeada e estava armada com Mauser. Era um homem muito respeitado, não me esqueço que os soldados do [Pel Caç Nat ] 52 o tratavam por pai. Morreu em Bissá (ele e muitos outros), um chão balanta dominado pelo IN, onde alguém se lembrou de montar um destacamento sem o mínimo de condições (...).

Esperemos que apareçam mais fotos de (e depoimento sobre) o  Abna Na Onça (****).

PS - Pesquisando melhor, com tempo e vagar (que é coisa que não se tem quando se está de férias...), econtrei mais referências do Jorge Rosales  ao "homem grande" Abna Na Onça, incluindo uma foto de dele (!)n (*****). É  talvezx o poste mais completo sobre este guineense, que esteve do lado das NT e morreu em circunstâncias trágicas, em Bissá, ao tempo da CART 1661, conforme nos relatou aqui o Abel Rei (******).

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Notas do editor:


(**) Vd. poste de 9 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4488: Tabanca Grande (151): Jorge Rosales, ex-Alf Mil, Porto Gole, 1964/66, grande amigo do Cap 2ª linha Abna Na Onça


domingo, 20 de agosto de 2017

Guiné 61/74 - P17686: O segredo de... (29): João Crisóstomo (ex-alf mil, CCAÇ 1439, Enxalé, Porto Gole, Missirá, 1965/67): Porto-Gole 1966: uma aventura no Rio Geba, para nunca mais esquecer... uma daquelas que nos poderia ter custado a vida!


Guiné > Região do Óio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) > c. 1966 > A nossa “jangada” feita supostamente para pescar, mas que acabou por servir apenas de brinquedo recreativo… Na foto, aos remos eu e o João (???)  ( natural da zona do oeste, não me lembro exactamente, mas creio ser do  Ramalhal, Bombarral) que era o “padeiro” do destacamento. Alguém sabe do paradeiro dele? E o outro tripulante… há alguém que o possa reconhecer? Eu definitivamente "estou a ficar mesmo velho” … que já a muitos dos meus colegas não consigo reconhecer e lembrar...


Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ  1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67) > c. 1966 > O  “cais” de Porto Gole funcionava assim: o "barco de abastecimentos” (e outros) tinham de chegar quando a maré estava cheia. E depois de devidamente seguro (a uma árvore ou a um poste ) esperava-se pela maré vazia quando o barco ficava em seco para fazer o descarregamento, como se pode verificar na foto…. Como havemos de esquecer coisas destas?

Fotos (e legendas): © João Crisóstomo (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Mensagem de João Crisóstomo (ex-alf mil, CCAÇ 1439, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67)

Data: 17 de agosto de 2017 às 21:58

Assunto: Porto-Gole 1966: uma lembrança / história para não esquecer...

Caro Luís Graça,

Ainda estou na Eslovénia; tenho aproveitado para dar umas voltas para conhecer as "redondezas": Croácia, Montenegro e até dei  um salto (5 dias) a Roma para matar saudades; tanto a Vilma como eu tínhamos estado lá em tempos passados  (quando ainda não sabíamos um do outro) e de repente apresentou-se uma oportunidade que não quisemos perder.

Ontem  no decorrer duma pequena "excursão  guiada" a várias ilhas (de um dia apenas), às ilhas Elifati, ao longo da costa  da Croácia, encontrei-me num barco pequeno (daqueles com o  motor no meio como algumas das traineiras de pesca que eu conhecia quando ainda jovem, na nossa terra) e  a curiosidade levou-me a meter o nariz na portinhola do motor: isso  fez-me lembrar um barco semelhante (mas bem mais pequeno), "palco" duma  experiência extraordinária que tive quando estive em Porto Gole.

Como tu no teu/nosso blogue falas e incentivas os camaradas da Guiné a que partilhem as suas memórias, não só porque isso nos faz reviver esses tempos, mas também para que fiquem "registadas" para a posteridade, lembrei-me de pôr em papel o que ainda me lembro dessa experiência. Como dizes e bem, não sendo assim essas experiências de cada um  ficam só mesmo para cada um de nós e "quando formos para o outro lado", para quem cá fica  é como se nunca tivessem acontecido.

Devo avisar/esclarecer que a memória me falha já em muitos detalhes; tenho pena de o não ter feito antes. O que se segue não terá mais o interesse que teria se eu me lembrasse  melhor  dos pormenores. Vou descrever o que ainda me lembro sem qualquer intenção de aumentar ou florear; é mesmo possível que já comece a  confundir e trocar coisas e circunstancias e a ordem/sequência do acontecido. Se tal sucede não é com essa intenção; se alguém  do grupo que estava comigo em Porto Gole onde isto aconteceu ler o que se segue e com melhor memória  me quiser corrigir e emendar, só fico agradecido.

Não lembro em que altura do ano foi, mas sei que foi em 1966. A nossa companhia, CCAÇ 1439, sediada em Enxalé tinha os destacamentos de Missirá e Porto Gole sob a sua  alçada. Revezávamo-nos em temporadas (em princípio devia ser de um mês cada pelotão mas isso nunca sucedia certo… houve casos de um pelotão ter ficado destacado no mesmo sítio mais de três meses!).

O destacamento de Porto Gole não era dos piores sítios: de alguma maneira a sua situação junto ao rio Geba proporcionava "vantagens" que faziam a estadia aí mais amena e diversificada: barcos de abastecimentos e outros passavam e muitas vezes atracavam no "cais"; havia algum negócio, especialmente de arroz, o que trazia ao local muita gente das redondezas, especialmente " bajudas" cuja simples presença era suficiente para tornar a vida menos aborrecida a muitos dos aí destacados (ou desterrados, como dizíamos só pelo prazer de nos queixarmos do que quer que fosse…).

Havia até  um representante da Casa Gouveia que fazia do local a sua estadia quase permanente. Havia um posto de administração e era a sede do poderoso e famoso (e saudoso também)  régulo Abna Na Onça (com as suas 10 mulheres, sobrinhas e não sei que mais que davam vida ao local e seus "habitantes'); lembro-me bem dele: um indivíduo enorme para quem autoridade e mandar era coisa natural e que, se não controlava  completamente os balantas da região - como te deves lembrar os balantas eram na maioria favoráveis ao "partido oposto" - mantinha pelo menos muito respeito e controle nas muitas tabancas das redondezas.

Entre os "habitantes temporários" que apareciam de vez em quando vindos de Bissau houve um indivíduo já bem entrado na idade - o clima por vezes ocasiona a que nos enganemos, mas eu creio que estava nos seus setentas, já bem "queimados" pelo sol e outras razões que desconheço mas de efeitos evidentes - que apareceu e ficou por lá uns tempos. Disse-me ter sido, quando mais jovem,   capitão dum barco, não me lembro de mais detalhes; que estava reformado há muitos anos e que as saudades do mar o tinham levado a comprar um barco que era agora toda a sua vida ...

Não sei onde estava  hospedado, mas aparecia de vez em quando. Um dia, quando eu lhe disse que tínhamos feito uma espécie de "jangada" (em forma de  quadrado com 4 bidões vazios, um em cada canto, ligados entre si, e com dois  remos enormes para locomoção), convidou-me para dar um passeio no barco dele no Geba, ocasião que eu podia aproveitar para pescar se quisesse.

Não tinha visto o barco, mas como ele disse ter vindo nele de Bissau com alguns tripulantes "indígenas locais", e também que estava armado e  tinha meios de se defender, eu pensava que era um barco de tamanho razoável e teria com certeza alguém como  ajudante, empregado permanente. E aceitei logo o o convite, não sei mesmo se para o dia seguinte. Sei que para não ir só (isto foi antes de encontrar e conhecer o alferes  Henrique Matos, que esteve em Porto Gole mais tarde) disse a um dos soldados nativos para me acompanhar e que trouxesse com ele os dois "pescadores" da tabanca.

Estes tinham uma canoa (daquelas feitas dum tronco de árvore) e  vendiam-nos pescado quando havia. Por vezes porém não traziam nada - que "não havia peixe nenhum nesse dia" - antes de descobrimos mais tarde que a razão de em certos dias não haver peixe era porque propositadamente e de livre vontade ou porque a isso eram forçados o peixe desse dia tinha ficado nas mãos dos "turras" como eram na altura chamados os nossos oponentes no conflito.

No dia seguinte com o soldado nativo falado e os dois pescadores (que avisados pelo soldado nativo já tinham deixado a "rede de pesca"no cais - uma rede bem pequena, mas era o que tinham, disseram - , lá fui para o cais. Fiquei surpreso que o barco fosse tão pequeno e não houvesse mais ninguém com o velhote, nem sequer um nativo como  seu ajudante. Mas não quis dar parte de fraco: sempre era maior do que uma canoa e tinha um motor… a ideia de quebrar a monotonia com umas voltas pelo Geba era mesmo aliciante. E quem sabe, talvez voltasse com meia dúzia de peixes para o jantar.

E lá zarpamos Geba abaixo, aceitando como válidas as afirmações do "capitão" do barco que conhecia bem o Geba e ia a lugar onde havia sempre peixe. Quando a viagem me pareceu ficar mais longa do que eu antecipava (já navegávamos há uma hora e não via sinal de ele chegar ao tal lugar bom para pesca), disse-lhe que queria estar de volta em Porto Gole antes do cair da noite. Ao que ele acedeu imediatamente: que já estávamos perto, que o tal lugar era um pouco mais abaixo, mas que  ali mesmo já havia muito peixe; e parou o motor dando instruções aos pescadores para começarem a pescar…

Eles lá lançaram a tal rede e passados cerca de dez minutos disseram que não havia ali peixe nenhum. E eu disse ao capitão que o melhor era voltar e tentar lançar as redes um pouco mais acima, já no caminho de volta. Ele ligou o motor mas o motor parou  logo.

Tornou a ligar, uma e muitas vezes e nada: a rede tinha-se embrulhado na hélice, assim me explicou, e por mais que ele quisesse nada havia a fazer antes que a hélice estivesse livre; era preciso cortar a rede para a libertar. Disse a um dos pescadores para o fazer, mas este negou-se a saltar para a água. "que sabia nadar muito mal", e o outro disse-me a mesma coisa. O soldado nativo esse que não sabia nadar mesmo nada… Embora eu não fosse grande nadador (ainda hoje, apesar de mais tarde ter pago umas lições para aprender melhor a nadar, mal consigo nadar o comprimento duma piscina e quando o consigo fazer  chego sempre exausto e aflito), vi que não tinha outra solução senão deitar-me à água para cortar a rede.

Quando eu disse da minha intenção ficaram todos apavorados: "Alfero" não pode fazer isso!; que tínhamos que  que esperar que passasse barco dos fuzileiros e então eles nos rebocariam  até Porto Gole. Nem pensar nisso, pensei eu. Deus sabe quando é que um barco dos fuzileiros ia passar por ali… podiam ser dias antes que passasse um barco, de fuzileiros ou não; nós não tínhamos  água nem provisões.. e eu tinha dito ao pessoal em Porto Gole que estaria de volta antes de escurecer!…

E comecei a despir as calças para em cuecas me atirar à água.  Mas os pescadores começaram aos berros: "não, não altero, não pode mesmo alfero".  O capitão, esse não dizia nada, e eu ignorando as "teimosas súplicas" que eu não compreendia, atirei-me à água e comecei a cortar a rede da hélice, enquanto os dois pescadores com uma expressão de ansiedade, senão mesmo de terror, olhavam  à volta do barco, de trás para a  frente; eu atribuía essa ansiedade a que estavam a ver se a rede não saía muito danificada...

Finalmente  consegui cortar as cordas e libertar a hélice. Para surpresa minha os pescadores não se importaram nada com o reaver a rede; que não valia a pena e que arranjariam outra; mas pareceram  ter ficado  mais calmos quando me viram de novo dento do barco. Foi-me explicado mais tarde que naquele sítio havia " manga de jacarés"… mas a sorte esteve comigo nesse dia; talvez porque a maré estava a esvaziar rapidamente eles não andavam nas redondezas...;  aliás eu não estaria agora a lembrar agora essa tarde de pesca…

Depois de liberta a rede, o "capitão" pôs o motor em marcha e começávamos o regresso a Porto Gole; não demorou muito que o barco parasse outra vez: a maré tinha baixado e o fundo do barquito  bateu no lodo e não havia mesmo nada a fazer, senão esperar que a maré subisse outra vez. Fiquei apavorado, preso no meio do rio; depois de ter ouvido tantas histórias sobre o macaréu do Geba …Pois se os próprios barcos dos fuzileiros - assim  contavam - tinham por vezes de fazer manobras para se defenderem do macaréu, o que nos ia suceder a nós numa casquinha de noz?

E ali ficamos esperando, coração nas mãos… não me lembro se pedia ajuda aos santos ou não, mas acredito que o devo ter feito pois que me lembro de ter requerido o favor dos céus em outras ocasiões apertadas…

Quando esperávamos pelo tal macaréu que, esperançadamente sem nos virar o barco, trouxesse com ele água suficiente para prosseguir a volta, vi ao longe bem alto dois "bombardeiros" [T-6]  que regressavam a Bissau, depois de terem feito a "entrega do correio", como nós costumávamos dizer. Passaram por cima de nós e daí a pouco voltaram para trás, desta vez voando mais baixo na nossa direcção. Passaram  perto e depois voltaram outra vez, um atrás do outro…

"Mas que que é que estes malvados querem?" - pensei eu - …"Querem lá ver que pensam que somos terroristas?!... E como eles começassem a passar bem perto do barco, a uns escassos metros que me aterrorizavam - eu podia ver a cabeça deles como se estivessem a tentar ver o que estava dentro do barco - eu tentava fazê-los compreender quem éramos, eu pondo-me ao lado do  pobre velho capitão que tremia, mostrando-lhes a minha jaqueta e a minha G3 e com os dedos a fazer sinal sobre os meus ombros para que compreendessem que eu era um "oficial"…

Mas eles viam também os três outros, não brancos, e deviam estar pensar talvez que "éramos ou tínhamos passado para o lado deles" e não nos deixavam… revezavam-se, um atrás do outro… no momento em que um passava por nós o outro já estava a vir na nossa  direcção, pronto  a desfazerem-nos em bocados se o quisessem fazer a qualquer momento; e de repente apercebi-me  que "pescadores" se queriam  deitar à água  para fugir (pelos vistos sempre sabiam nadar!…), eu vi o caso perdido: se eles se deitassem à água então os pilotos concluíam imediatamente que éramos todos "terroristas"… e tive de lhes dizer que nem pensassem em se deitar à agua, pois se o fizessem eu espetava imediatamente um tiro em cada um… Foi a única vez que eu me lembro de ter  ameaçado alguém; e  se eles o tivessem feito …eu estava mesmo decidido a fazê-lo, que  a gente em tais situações nem sabe o que fazer nem pensar…

Depois lembrei-me de tentar fazer aos pilotos sinais de comunicações, fazendo com os dedos sinais de argolas e com gestos a apontarem a direcção de Porto Gole… eles devem ter compreendido:  um deles subiu bem alto e ficou a fazer círculos lá no alto por cima de nós, e o outro desapareceu na direcção de Porto Gole como eu tinha indicado. Passado um bom bocado voltou e junto com o outro foram-se embora os dois e nós continuamos no meio do rio.

Entretanto fez-se noite e nós esperando o macaréu… e, já escuro como breu, comecei a ouvir o ruído roncoso, mas não muito forte (era quase um sussurro) do macaréu que pouco a pouco se aproximava. Felizmente, talvez porque a maré não era uma maré viva, o macaréu era bem pequeno e passou por nós sem grande sobressalto, como sucede com os barcos nas praias  ao entrarem no mar.  E passados uns minutos, já com as águas calmas e suficiente calado recomeçamos a nossa volta.

Estava escuro, não se via um palmo à nossa volta e lá íamos andando, eu confiado na experiência do velho capitão para nos  fazer chegar a Porto Gole sãos e salvos. Mas as aventuras desse dia ainda não haviam acabado: eu sentei-me no chão, tentando refazer-me do susto dos aviões, quando de repente um dos pescadores sacudiu-me dizendo: "alfero, é bandido ... , manga de bandido"… Eu não via nem ouvia nada mas disse ao capitão para parar o motor imediatamente. E comecei depois a ouvir ao longe um ruído mas não fazia a mínima ideia do  que quer que fosse. O pescador então disse-me ao ouvido no seu crioulo/português mal falado, que aquela zona era um lugar onde os "turras" faziam cambança, passando armas, mantimentos etc. duma margem para a outra do rio e que eles estavam a "fazer cambaça".

Fiquei outra vez sem saber como me desenrascar; não fazia ideia se eram muitos ou poucos se estavam armados ou não… "O que é que eles vão fazer connosco se nos descobrem?" - pensei eu. Entanto lembrei-me que os fuzileiros de vez em quando faziam emboscadas  na aquelas redondezas e lhes caíam em cima durante estas "cambanças"… Se eu pudesse fazê-los suspeitar que tinham sido detectados, eles com certeza fugiam e nós  estávamos salvos… e se o pensei logo o pus em prática: cochichei que não fizessem um pio, e que quando eles estivessem perto a gente os pudesse começar a ver, eu gritaria "FOGO"!.. O capitão devia pôr o motor a trabalhar e bem alto e todos deviam berrar ao mesmo tempo, enquanto eu, depois de ter tirado o tapa-chamas da minha G3 faria tiro cadenciado, tentando imitar uma das metralhadoras pesadas dos fuzileiros.

E assim fizemos. Quando o barulho já estava perto e comecei a discernir um vulto duma jangada que deslizava na nossa direção, berrei e todos fizeram o que eu tinha dito: uma grande barafunda no nosso barquito com o motor a todo o vapor e o capitão disparando a sua pistola de bolso, - que era o que ele chamava "estar armado" - e o soldado nativo disparando a sua Mauser. A minha G3 fazia o seu trabalho e como era noite cerrada quem quer que fosse deve ter mesmo pensado que era emboscada de fuzileiros.

O que eu sei é que não se ouviu  nem mais um pio e passados uns minutos passou mesmo em frente ao nosso barquito uma jangada vazia levada ao sabor da  corrente. O factor surpresa tinha mesmo funcionado como eu tinha desejado.

Passada uma semana foi à nossa" enfermaria" para tratamento uma mulher balanta com uma ferida/rasgão numa coxa (como maneira de criar boa vontade entre a população nós dávamos alguma assistência em casos simples ao nosso alcance"). Foi-me depois contado que isso tinha sido resultado duma "emboscada de fuzileiro" no rio Geba: a história dela foi que estavam a fazer cambança de arroz; que fuzileiro pensou que era bandido e atacou; e eles para se safarem da emboscada de fuzileiro deitaram  tudo e todos ao rio; com a pressa a canoa voltou-se, quando ela já estava na água e apanhou-lhe a perna…

Quando cheguei finalmente ao destacamento estava tudo em pé de guerra, guardas duplas e toda a gente preparada para o que desse e viesse, esperando um ataque… e "ainda por cima eu ainda não tinha voltado e não sabiam nada de mim"...que um bombardeiro  os tinha contactado; que havia movimentos suspeitos no rio, e que eles tinham dito ao bombardeiro que o alferes tinha ido pescar mas ainda não tinha voltado…

Depois de umas duas horas achei que "o perigo" tinha passado; que não havia mais razão para alarme; que eu ficaria ainda mais uns tempos de pé, mas que as sentinelas passassem a ser simples (não dobradas) e que toda a gente devia voltar ao normal.

Isto é o que me lembro: se alguém do meu pelotão que estava lá e se lembrar disto, por favor contactem-me por e-mail - jcrisostomo@earthlink.net - para combinarmos falar pelo telefone ou mesmo pessoalmente se puder ser. Gostaria imenso de poder relembrar mais e falar desta tarde de aventuras (e de muita estupidez minha que poderia ter tido consequências graves) com alguém que porventura ainda se lembre disto.

Não tenho a certeza mas parece-me que quem estava lá comigo como furriéis eram o António Lopes, o Bonifácio (o "passarinho") e/ou o Farinha ou o Neiva, não me recordo qual, (que por uma razão ou outra por vezes havia mudanças temporárias)…

João Crisóstomo




Guiné > Mapa geral da província > 1961 > Escala 1/500 mil > Pormenor: localidades da margem direita do Rio Geba por onde andou a CCAÇ 1439, e aqui assinaladas a zul: Porto Gole (destacamento), Enxalé (sede), Missirá (destacamento)... Mas também por onde passou, na margem esquerda (aquartelamentos assinalados a verde: Xime e Bambadinca). Finete, em frente a Bambadinca, na margem direita do rio Geba, era um destacamento de milícias, no regulado do Cuor.  

Até ao início de 1969, o PAICG controlava largamente as duas margens do Rio Corubal, entre a mata do Fiofioli e a foz do rio Corubal. Os pontos de cambança nos rios Corubal e Geba  eram absolutamente fundamentais para o abastecimento das regiões do Óio, Norte e Leste, a partir do sul (Quínara e Tombali). As colunas, apeadas, do PAIGC, para reabastecimento do norte, centro e leste da Guiné, a partir do "corredor de Guileje",  foram verdadeiras epopeias a que temos de render homenagem. A homenagem é a um povo extraordinária, capaz de enormes sacrifícios, como os guineenses. Do corredor de Guileje até à margem esquerda do rio Geba, as colunas podiam ser feitas em dois dias, com escolta!... LG

 Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2017).
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Nota do editor

Último poste da série > 23 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16123: O segredo de... (28): Domingos Ramos e Mário Dias, dois camaradas e amigos da recruta e do 1º CSM (Bissau, 1959), que irão combater em lados opostos... No último trimestre de 1960, Domingos Ramos terá sido vítima do militarismo e racismo de um oficial português quando foi colocado no CIM de Bolama, como 1º cabo miliciano