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sábado, 1 de julho de 2017

Guiné 61/74 - P17532: O nosso livro de visitas (191): Américo Santos, ex-Fur Mil TRMS, retratado, enquanto recruta do CSM, em foto publicada no nosso Blogue (Américo Santos, Fur Mil TRMS / César Dias, Fur Mil Sap Inf)

Tavira > CISMI > Almoço do dia do Juramento de Bandeira > Meados de 1968 > Tony Levezinho de lado (elipse encarnada), César Dias, de frente (a azul) e, em segundo plano, o Fernando Hipólito (a amarelo). O Hipólito, que descobriu o César Dias através do nosso blogue, foi mobilizado para Angola. O António Levezinho, por sua vez, vou conhecê-lo, mais tarde, no Campo Militar de Santa Margarida, nos princípios de março de 1969, aquando da formação da nossa companhia (independente), a CCAÇ 2590/CCAÇ 12. Foi um dos grandes amigos que eu fiz na Guiné.

Foto: © César Dias (2010). Todos os direitos reservados
Legenda: Luís Graça

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1. Mensagem do nosso camarada e leitor Américo Santos, com data de 28 de Junho de 2017, a propósito da foto que acima se reproduz referente ao Juramento de Bandeira do 3.º Turno de 1968, da Recruta do CSM, no CISMI, em Tavira, publicada pelo nosso camarada César Dias no Poste 12703[1]

Boa tarde,   Camarada Luís Graça,

Sou o Américo Branco dos Santos, moro no Montijo, trabalhei na TAP e estou reformado.

Assentei praça no dia 16 de julho de 1968 no 3.º turno no CISMI em Tavira, na 3.ª Companhia, se não me engano. Lembro-me que era a primeira caserna do lado direito quando se entra na parada. Se não estou enganado, tinha o n.º 435/68.

Agora passo a explicar como cheguei aqui. Andava na Net e lembrei-me de ver se existia ainda o CISMI, pensava eu que já tinha sido vendido para construção. Pois fiquei a saber que ainda não através do teu blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné.

Ao percorrer o blogue vejo uma foto em que apareço eu e restantes camaradas no jantar do dia do juramento de bandeira, nem queria acreditar no que estava a ver, quase me vieram as lágrimas aos olhos, pois passados tantos anos e de tantas vezes me ter interrogado do que seria feito dos camaradas do meu pelotão.

A última vez que vi alguns foi em 1969, em Santa Margarida na messe de sargentos, quando lá fui fazer uns trabalhos no posto de transmissões daquela unidade, estavam a tirar o IAO para depois embarcarem para o ultramar.

Pela foto dá para depreender que fizeste parte do mesmo pelotão e da mesma companhia, tivemos destinos diferentes, eu sai de Tavira e vim para o Batalhão de Telegrafistas em Lisboa, estive quase a ser mobilizado para a Guiné, escapei por um triz porque entretanto chegou pessoal novo e fiquei aliviado até passar a peluda.

Posto isto,  vão ai umas fotos que tenho cá em casa e onde identifico alguns camaradas, já não me lembro de todos porque os anos passam e a cabeça já não funciona bem.


Foto n.º 1 - Com o n.º 1 está o comandante de pelotão, que não me lembro o nome (encontrei-o em 1980 ou 81 na Olivetti em Lisboa trabalhava com as ATM); com o n.º 2 sou eu; com o n.º 3 o Filipe de Lisboa (Alfama?) tinha pavor a saltar para o galho; com o n.º 4 o Cavaco do Algarve (Quarteira?); com o n.º 5 conheço mas não sei o nome; com o n.º 6 penso que era o Luís que acompanhava muito comigo e com o Filipe, eram ambos de Lisboa; com o n.º 7 o camarada que marchava no meu lado direito, não me lembro o nome.




Fotos: © Américo Santos (2017). Todos os direitos reservados

Para terminar, gostava que o camarada se identificasse na foto e identificasse os que se lembrar e, qual a situação de todos ou alguns.

Adeus, um abraço
Obrigado
Américo Santos

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2. Comentário do editor

Caro camarada Américo Santos_

O lema no nosso Blogue é: O Mundo é pequeno... e a nossa Tabanca é Grande, logo não admira que encontrasses aqui uma fotografia onde estás entre camaradas de recruta, no CISMI de Tavira, no almoço do Dia de Juramento de Bandeira.

Vamos recorrer ao César Dias, com quem ainda contemporizei na Guiné, para ver se ele reconhece mais malta do vosso tempo, e se sabe dos seus paradeiros.

Queremos agradecer o teu contacto e as fotos que nos enviaste, aqui publicadas.

Esperamos que nos continues a ler,  apesar de teres sido um dos sortudos a quem não foi oferecida viagem e estadia em África durante 2 anos. Nem sabes o que perdeste.

Em nome da tertúlia e dos editores, deixo-te um abraço.
Carlos Vinhal
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Notas do editor

[1] Vd. poste de 10 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12703: CISMI - Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria, Tavira, 1968: Guia do Instruendo (documento, de 21 pp., inumeradas, recolhido por Fernando Hipólito e digitalizado por César Dias) (1) : Parte I (1-6 pp.)

Último poste da série de 12 de janeiro de 2017 > Guiné 61/74 - P16950: O nosso livro de visitas (190): Evaristo Pereira dos Reis, 66 anos de idade, residente em Setúbal... Ex-1º cabo condutor auto, de rendição individual, esteve no QG (1971/73), mas na maior parte da comissão foi mestre de obras da Câmara Municipal de Bissau, ao tempo do maj cav Eduardo Matos Guerra, como presidente

quinta-feira, 27 de abril de 2017

Guiné 63/74 - P17290: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (30): Tavira, CISMI, onde há 48 anos frequentei o 1.º Ciclo do Curso de Sargentos Milicianos (António Tavares)

Quartel da Atalaia
Foto: © Beja Santos. Todos os direitos reservados


1. Mensagem do nosso camarada António Tavares (ex-Fur Mil SAM da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72), datada de 22 de Abril de 2017:

Camarigos,
Passados 48 anos da minha entrada no CISMI – Tavira para frequentar o 1.º Ciclo do Curso de Sargentos Milicianos – 2.º Turno de 1969, recordo:

Parti do Porto, com outro recruta, em automóvel, pelas 07H00 do dia 20 de Abril de 1969 com chegada a Tavira, às 19H30, depois de paragens em Leiria, Lisboa e Setúbal.

Entrei pela porta de armas do CISMI no dia 21 de Abril de 1969. Era uma Segunda-feira que ficou gravada em cada um dos jovens recrutas, quer pelos bons ou maus motivos, estes talvez a pesar mais nos pratos da balança.

Em 23 de Abril fizemos os testes psicotécnicos. Escolhi as especialidades de Contabilidade e Pagadoria; Amanuense e Intendência.

Em 25 de Abril assumiu as funções de Director do CISMI o Exmo. Tenente Coronel de Infantaria, António Mendes Baptista em substituição do Exmo. Senhor Tenente Coronel de Infantaria José Alves Pereira que foi transferido para a Repartição de Recrutamento do Ministério do Exército.
O Major de Infantaria José Bernardo Cruz de Aragão Teixeira era o Segundo Comandante do CISMI.
Nesse dia festejamos os anos do MACB, um camarada de Queluz, ferrenho sportinguista, que era estimado por todos. Na sua companhia muitas vezes viajei de comboio pelo Algarve. Ele foi mobilizado para Moçambique. Infelizmente faleceu em 2015.

Em 6 e 7 de Maio, Sua Excelência o General Emílio Mendes Moura dos Santos, ilustre Director da Arma de Infantaria, visitou o CISMI acompanhado do Exmo. Senhor Coronel Marafusta Marreiros.

Em 9 de Maio visitou o CISMI Sua Excelência o General Fernando Louro de Sousa, ilustre Comandante da 3.ª Região Militar. Sua Excelência viajou acompanhado do Exmo. Tenente Coronel do CEM Amândio Travassos de Almeida Nogueira, Chefe Interino da Região Militar com sede em Évora.
É de notar o tratamento dado aos Oficiais Superiores e Generais. O instruendo era um número. O meu era o 58.

Na preparação de uma destas visitas, fui um dos faxinas à caserna da 1.ª Companhia, cujo trabalho era limpar os mictórios. Com palha-de-aço e a água a correr entre as minhas mãos tentava eliminar o verdete existente na porcelana do urinol. Quanto mais limpava mais riscos ficavam a ver-se.
Era fiscalizado por um Cabo Miliciano, natural da Guiné. Homem muito educado porém naquele dia estava muito exigente por causa da visita do Senhor General às instalações.

Em 25 de Maio (Domingo), fui com outros camaradas até Portimão; Praia da Rocha; Torralta e Alvor. Na praia da Rocha destacavam-se os hotéis: Algarve; Aquazul e Jupiter. Na Torralta existiam cinco prédios, cada um com onze andares e o Hotel Alvor Praia, em Alvor. Aqui os esgotos corriam a céu aberto em direcção ao mar.

Estávamos em 1969 e tudo era novidade para um jovem que anteriormente tinha viajado somente até Évora.

De 2 a 4 de Junho fomos para a carreira de tiro que ficava a 5 ou 6 quilómetros de Tavira, na margem esquerda do Rio Gilão. Fizemos fogo com a G3; Manelica; FBP e Walther. Lançámos granadas.

Em 15 de Junho, Tavira recebeu o III Grande Prémio Casal em ciclismo. As equipas do FC Porto; SL Benfica; Sporting CP; Ginásio de Tavira; Coelima e Ambar disputaram o troféu.

Em 16 de Junho (2.ª feira) houve a feira de gado e diversos na Atalaia.
A Atalaia era um vasto campo, em terra batida, fora do quartel, onde era ministrada a instrução militar teórica e física. Depois das feiras tínhamos de limpar as caganitas do gado caprino e ovino para fazer a respectiva instrução militar de preferência à sombra da cadeia e das igrejas existentes no local.

Na noite desse dia fizemos emboscadas, patrulhas e fogo com a Mauser, utilizando bala simulada, na margem direita do Rio Gilão, até às 23H00.

 Tavira - Rio Gilão
 Foto: © Mário Beja Santos. Todos os direitos reservados

Em 17 de Junho realizou-se um jogo de voleibol entre o CISMI e o CICA 5, de Lagos. O CICA 5 venceu o jogo por 2 a 0.

Em 23 de Junho tomamos a vacina conhecida como “dose de cavalo”.
Na parada do quartel fizemos o último teste escrito.

De 25 a 28 de Junho fomos para o campo - Exercício Rosa Silvestre - sob o comando do Capitão Frederico Pires; Tenente Fonseca; Alferes Jacinto; José Diogo e Mateus e o Aspirante Mendonça.

Em 1 de Julho oferecemos um jantar, na Casa dos Frangos, Tavira, ao comandante do nosso pelotão Alferes José Diogo e seus adjuntos.

Em 2 de Julho recebi o pré de 1$50 (não é erro!) referente ao período de 21 de Abril a 6 de Julho de 1969.

Em 4 de Julho houve festa no CISMI. Dia de Juramento de Bandeira do 1.º Ciclo do CSM do 2.º Turno de 1969.
Nesse dia terminava a passagem de centenas de jovens militares por Tavira.
Tavira, cidade que é bom recordar!

Abraço
António Tavares
Foz do Douro, Sexta-feira 21 de Abril de 2017
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Nota do editor

Último poste da série de 3 de julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13361: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (30); Mafra, a EPI, 1967: "Aquele Convento de Mafra era sem dúvida uma fábrica de oficiais"...(Paulo Raposo, ex-alf mil inf, CCAÇ 2405 / BCAÇ 2852, Mansoa e Dulombi, 1968/70)

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17260: Os nossos seres, saberes e lazeres (208): Tavira fenícia, árabe, portuguesa; a cidade e a água (2) (Mário Beja Santos)

Tavira - Quartel da Atalaia


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 12 de Janeiro de 2017:

Queridos amigos,
Desta feita o passeio é por monumentos portugueses, já se registou o que foi fenício e almóada, o viandante não foi a Balsa, e bem gostaria de ter ido, fica par a próxima, o que aqui se mostra são traços do renascimento tavirense e a presença militar, uma constante, Tavira foi frequentada por muitos sargentos milicianos que aqui se prepararam para marchar para a guerra. A memória é por vezes labiríntica e enquanto o viandante percorria o exterior do quartel da Atalaia lembrou-se de uma conversa havida em Missirá, na noite de 4 de Agosto de 1968, com o furriel Zacarias Saiegh, que lhe disse que tinha passado por Tavira, inolvidável era a sua lembrança daquela cidade diretamente a beijar a ria e o oceano, lembrava-se dos passeios pela serra inóspita, maior contraste não podia haver. Certo e seguro, Saiegh não voltou a Tavira, partiu para os Comandos Africanos e foi fuzilado em Porto Gole, em Dezembro de 1977, ao que parece nunca se saberá porquê, no mundo dos ajustes de contas haverá vácuos na História, para o viandante este vácuo é dor pelas perdas humanos que sofreu.

Um abraço do
Mário


Tavira, a cidade e o quartel (2)

Beja Santos 

Tavira é uma cidade de muitas igrejas, conventos, ermidas e capelas, espaços ajardinados, pontes, muralhas, um espaço público de enlevo que é a Biblioteca Álvaro de Campos, uma reconversão da antiga cadeia civil, projeto do arquiteto Carilho da Graça, é bom cirandar pela cidade, ver as suas portas com caráter, resquícios do manuelino, visitar o Palácio da Galeria, que será o futuro museu da cidade e passar pelo imponente quartel, um expoente da arquitetura pombalina, aqui foram formados muitos sargentos milicianos que deram com os costados nos teatros da guerra.





Subindo a colina de Santa Maria, observa-se a interseção de diferentes estilos desde o gótico ao renascentista e barroco. Convém recordar que Tavira, logo no primeiro quartel do século XVI, era o mais próspero centro urbano do Algarve, beneficiava da situação estratégica no contexto da expansão portuguesa, funcionava como a retaguarda das praças do Norte de África. Não há viandante que não se impressione com os vestígios arquitetónicos góticos, as portas de arco quebrado até chegar ao sóbrio portal da Igreja de Santa Maria do Castelo que, segundo a tradição, foi construída sobre a antiga Mesquita Maior. Na igreja restam algumas capelas góticas. O viandante embevece-se com a porta principal, com quatro arquivoltas com arco quebrado, capitéis com temas vegetalistas, que beleza dentro dos cânones da sobriedade.




 O período renascentista, é esta a modesta opinião do viandante, tem duas jóias preciosas em Tavira: a Igreja de Misericórdia e a Loggia do Palácio da Galeria, o tal onde se podem observar poços rituais fenícios. Neste tempo distinguiu-se um arquiteto local, André Pilarte, que já trazia pergaminhos do seu trabalho no Mosteiro dos Jerónimos. É ele que projeta e dirige a construção da Igreja da Misericórdia, em meados do século XVI. A igreja é de uma enorme riqueza, tem azulejaria preciosa, um esplendoroso altar-mor, um belo órgão, aqui assistiu a um concerto com o soprano finlandês Olga Heikkilä, cantou Puccini, Strauss, o das valsas, Franz Lehár, Sibelius, Grieg e muito mais.


As recordações militares são muito intensas em Tavira. Logo a evocação dos combatentes, em ponto central da cidade. No exterior, impressiona o que resta do forte de Santo António de Tavira, também conhecido por forte do Rato ou forte da ilha das Lebres, na foz do rio Gilão, junto à barra da cidade de Tavira. Destinava-se a proteger a entrada da barra, isto no reinado de D. Sebastião. Acontece que houve alterações profundas na linha de costa, perdeu utilidade. Na Guerra da Restauração foi sujeito a remodelação. Perdeu função militar em 1840. Consta que vai ser concessionado, bom seria que não se perdesse este belo património.



Muito estranhou o viandante quando viu a referência ao Regimento de Infantaria n.º 1, assentou praça como aspirante em Queluz, em 1968, assim se designava. À cautela, depois de andar ali às voltas, e sabendo que daquelas instalações partiram inúmeros sargentos milicianos para a guerra, consultou a Wikipédia. Quanto ao Regimento de Infantaria n.º 1 a sua origem remonta a 1648, foi conhecido como Regimento de Infantaria de Lippe, homenagem ao organizador do exército português. Conheceu muitas danças e contradanças, o Regimento foi transferido em 2015 para a cidade de Beja. Aqui é o quartel da Atalaia, é imponente, durante a guerra colonial deu outra vivacidade ao burgo, o militar foi homenageado num ponto certo, tem estátua junto da estação ferroviária, agradece-se o que fez pela Pátria, o seu zelo e dedicação continuados, para todo o sempre.




(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17239: Os nossos seres, saberes e lazeres (207): Tavira fenícia, árabe, portuguesa; a cidade e a água (1) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 4 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16559: Inquérito 'on line' (70): Ricos e pobres, a tropa e a guerra... O caso de um camarada meu do 4º turno de 1971, no CISMI, Tavira , que era alegadamente filho de um grande acionista da Tabaqueira (Henrique Cerqueira , ex-fur mil, 3.ª CCAÇ / BCAÇ 4610/72, e CCAÇ 13, Biambe e Bissorã, 1972/74)



Tavira, 1 de fevereiro de 2014 > Quartel da Atalaia > Antigo CISMI, hoje Regimento de Infantaria nº 1 (desde 2008)


Foto: © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados


1. Comentário de Henrique Cerqueira [,  ex-fur mil,  3.ª CCAÇ/BCAÇ 4610/72, e CCAÇ 13, BiambeBissorã, 1972/74; vive no Porto]:

De princípio não achei lá muito interesse neste tema. No entanto e por força das visualizações do poste acabei por me lembrar de um caso relacionado que se passou no ano de 1971 em Tavira.

Então era o seguinte: quando estávamos no curso de sargentos em Tavira no 4º turno de 1971 e como quem lá passou se lembrará que era mais que frequente os instruendos serem praxados com várias idas às salinas para fazerem exercícios de ordem unida e outros, para belo prazer dos instrutores. Sim, porque de instrução não se tratava.

Mas o maior prazer dos instrutores era gozarem com o pessoal nas formaturas de almoço pois que eram tantas as idas às salinas que não havia fardamento que chegasse para estarmos em ordem nessas formaturas e daí era constante os castigos por falta de atavio.

É então que determinado dia um dos nossos camaradas de instrução, que por sinal se dizia ser filho de gente rica e que o seu pai era o dono da Tabaqueira, resolveu ir para a formatura de almoço completamente cheio de lama mal cheirosa ao ponto de mais parecer uma estátua de barro.

Não sei se era por ser rico ou não, o que é certo é que nesse dia a malta teve direito a mais um tempinho para se limpar.

Lembro-me perfeitamente que esse camarada, do qual não me lembro do seu nome, era muito irreverente já para a época, inclusivamente vivia em Tavira com sua mulher e filho e esta era de igual modo irreverente ao ponto de tanto o nosso camarada (filho de rico) como a mulher raparem o cabelo e assim ele já evitava as carecadas e ela por sua vez se solidarizava com o marido,  criando ao mesmo tempo um certo estilo de revoltosos com o sistema, o que para a época era já preciso ter muita coragem.

Na altura eu admirei este casal e em especial o nosso camarada que devia ser mesmo filho de pai rico, mas isso só nos trouxe vantagem.

Espero que este camarada esteja bem e que se ainda for rico tanto melhor para ele e que saiba que foi bom estar com ele na tropa em Tavira.

Esta estória vale o que vale assim como o tema em questão.

Um abraço a todos.
Henrique Cerqueira


2.  Comentário do editor:

Henrique, obrigado pelo teu contributo!... Afinal são histórias como esta que acabas de contar, que justificam o aparecimento deste tema, objeto do inquérito que está a decorrer até 4ª feira... Não há estudos sérios, académicos, sobre esta matéria, de modo a podermos responder à pergunta (legítima): os mancebos portugueses da nossa geração eram todos iguais face à obrigação de cumprir o serviço militar e, em caso de guerra, de defender a Pátria?

Tens boa memória em relação à tua passagem pelo CISMI,  em Tavira. Tu és do 4º turno de 1971, eu passei por lá no 4º trimestre de 1968... Mas as praxes eram as mesmas e havia alguns instrutores que usavam e abusavam do seu poder... Era natural que houvesse irreverência, resistência e até contestação (, dentro dos limites do RDM...) em relação a algumas práticas mais violentas, ou de violência gratuita...

Simplesmente não é irreverente, contestatário e resistente (ativo) só quem quer, mas também quem quer e pode... A liberdade tem um preço e os portugueses sabem disso, ao longo dos séculos e dos diversos regimes políticos. Alguns pagaram um preço bem alto pelo exercício da liberdade: prisão, tortura, morte, exílio, etc. Não vale a pena exemplificar....

Há vezes os exemplos (de irreverência, contestação, resistência...) vêm de dentro, da própria elite dirigente, dos seus filhos ou enteados...

Enfim, era interessante saber o resto da tua história: o alegado filho do dono da Tabaqueira cumpriu o resto da tropa, foi ou não mobilizado para o Ultramar, e, se sim, para onde, para que serviço, etc. ?

Permito-me, no entanto, fazer uma chamada de atenção: quem era o dono da Tabaqueira em 1971? A CUF... E a CUF,  de quem era ? Dos ricos e poderosos Mello... Não sei se tinham filhos e sobrinhos em idade militar na época (1961/74)...Mas não estou a ver um dos filhos (ou sobrinhos) dos Mello no CISMI, em Tavira, em 1971... 

A CUF era só... o maior grupo económico português!... Além disso, o mundo era vasto e largo, para as nossas elites. Con certeza que entre os 200 mil refractários da época havia ricos e pobres... É um número impressionante, num milhão de mancebos em idade militar, 20% foram refractários... 800 mil foram parar a Angola, Guiné e Moçambique.

Tens aqui o "historial da Tabaqueira", de acordo com os seus donos atuais, a poderosíssima multinacional Philip Morris International (, passe a publicidade).

A Tabaqueira, criada em 1927 por Alfredo da Silva, era a empresa líder do mercado nacional, produzia e vendia marcas de cigarros, nossas conhecidas, como Provisórios, Definitivos, Águia, Kentucky, 20 20 20, High-life, Porto, Ritz, Sintra, Monserrate ou Kayak. A sua concorrentes era a INTAR (sucessora da Companhia Portuguesa de Tabacos), responsável por marcas como Estoril, Kart ou Marialvas. 

Em 13 de maio de 1975, a Tabaqueira e a INTAR foram nacionalizadas. A empresa pública Tabaqueira - Empresa Industrial de Tabacos, E.P., criada a 30 de Junho de 1976, resultou da fusão,   numa única empresa,  de  A Tabaqueira, SARL e da INTAR - Empresa Industrial de Tabacos, SARL. (Estas duas empresas tabaqueiras detinham praticamente a totalidade do mercado nacional de cigarros).

Henrique, será que o teu camarada de 1971, no CISMI, Tavira, estaria ligado, por laços familiares, a esta INTAR?

3. Resposta do Henrique Cerqueira:

Bom quanto ao facto do meu camarada ser ou não ser filho do dono da Tabaqueira, eu não sei confirmar. O que na verdade era o que corria no meio da malta.  É um facto que esse meu camarada "ostentava" meios e comportamentos de pessoa abastada, embora isso não impedia que ele fosse um camarada de tropa e que provavelmente nem tivesse necessidade de se impor perante os camaradas menos "abonados" em dinheiro,  entenda-se...

Eu não fazia parte dos seus amigos que privavam com ele, mas a impressão que tinha dele era de admiração pelo seu comportamento, visto que ele tinha a "chancela" de menino rico e filho do tal empresário.

Havia por lá uns "pardais",  armados em ricos,  e alguns futebolistas mais ao menos (re)conhecidos e que, esses, sim,  davam o seu ar de importantes e,  como diz o António Rosinha,  uma de novos ricos. Lá se iam safando,  isso sim.

Um abraço antes que me espalhe ao comprido,  que este espaço é de fraternidade e não de más línguas. 
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quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Guiné 63/74 - P16491: Manuscrito(s) (Luís Graça) (96): Em Bambadinca, à noite, íamos ao nimas e sonhávamos com gajas boas...



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > BCAÇ 2852 (1968/70) / CCAÇ 12 (1969/71) > O autor, no bar e messe de sargentos.


Foto : © Luís Graca (2005). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Em Bambadinca,
à noite, 
íamos ao nimas 
e sonhávamos com gajas boas 



por Luís Graça



Quantas vezes, à noite, em Bambadinca,
fumando um cigarro,
depois de um duche com água que sabia a ferro,
e depois do jantar, 

com toalha, garfo, faca e tudo,
descontraídos,
à civil,
de copo de uísque na mão,
duas pedras de gelo
e água de Perrier,
nas traseiras do aquartelamento,
no conforto relativo do bar e messe de sargentos,
sobranceiro à grande bolanha, 
gozando o merecido repouso dos guerreiros, 
o mesmo é dizer, as delícias do sistema,
não assistimos ao "fogo de artifício",
ao longe,
ao mesmo tempo que tentávamos adivinhar,
em voz alta,
quase em disputa acalorada uns com os outros,
quem eram os "desgraçados",
qual era tabanca em autodefesa,
ou qual o destacamento ou aquartelamento,
dentro ou fora do setor L1,
que estavam a "embrulhar",
a levar "porrada",
o tipo de granadas que explodiam,
as armas pesadas, 

os calibres,
os bigrupos, 
os quilómetros que distavam da nossa posição, 
enfim, cronometrando o ataque ou a flagelação,
estimando prováveis baixas...
e esperando ansiosamente
que os nossos obuses respondessem,

e nos ajudassem a desfazer o nó na garganta...



Por vezes, os gajos do PAIGC 
usavam inclusive balas tracejantes,   
e as nossas tropas, "very lights", 
tornando ainda mais real, 
cinematográfico
e, ao mesmo tempo, fantasmagórico, 
o "espetáculo"  
que se desenrolava à nossa frente 
no écrã gigante da noite africana... 
E tudo isto, à distância, 
sem a gente nada fazer 
ou sem nada poder fazer... 



Nessas noites, em Bambadinca,
tínhamos pelo menos a certeza
de poder dormir numa cama com lençóis lavados,
na nossa cama,
de molas e colchão de espuma,
mesmo destilando por todos os poros...
Era dia (ou noite) de folgar as costas,
de poupar o "coirão",
e, se possível, sonhar com gajas boas...



Pois é, o nimas é ficção, 
é arte, 
é estética
e a guerra é a guerra...
e é pornográfica!
No final da fita, os atores "mortos" levantam-se, 
tomam um banho, 
perfumam-se 
e voltam para o "glamour" dos seus dias, 
os que são estrelas de cinema, 
que não os pobres diabos dos figurantes!... 
Na guerra, os mortos ficam lá, 
definitivamente, 
e não se levantam mais, 
e a nudez da morte 
é o mais insuportável dos espectáculos 
para os safados dos vivos... 




Não há "charme",
não há "glamour" na guerra,
caros cinéfilos...
É por isso que tu não gostas de ver filmes de guerra,
nem de ler romances de guerra...
Tinha razão o comandante do CISMI, de Tavira, 
a fábrica da guerra, em 1968,
quando te proibiu, a ti
e a mais camaradas instruendos,
que continuassem a montar uma exposição
(pretensa ou ingenuamente didática)
sobre a II Guerra Mundial...
Argumentava ele,
a bem da Nação
e do moral das nossas tropas,
para justificar a sua prepotência de censor:
- Senhores instruendos,
para guerra, já basta... a nossa!

 
Ele tinha razão,
ou pelo menos tu achaste
que o senhor comandante do CISMI tinha toda a razão:
afinal, para guerra já bastava a nossa,
o sangue, o suor e as lágrimas
que estávamos a destilar nas salinas de Tavira,
nas bolanhas da Guiné,
nas chanas do leste de Angola
ou nas picadas do norte de Moçambique. (**)


__________________

Notas do editor:

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Guiné 63/74 - P16205: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (103): O Paul McCartney do Grupo Coral do CISMI... Afinal, o Luís Jales de Oliveira, poeta, músico, ex-fur mil trms, Agr Trms Bissau e CCAÇ 20 (Bissau e Gadamael, 1972/74)



Tavira > CISMI > Igreja de São Francisco > Grupo coral do CISMI > c. 1972 > "Não foi assim tão mau [, o CISMI,] e na verdade até se tornou agradável pertencer ao dito coro. Só lamento de não me lembrar dos nomes da malta, talvez com exceção de um guitarrista de farto bigode, que acho se chamava Jales. Poderá ser que apareça algum nosso Tertuliano que se lembre desta foto" .(*)

O guitarrista Jales [, à direita], com aquela guedelha e bigode (!), de repente pareceu-nos mesmo um sósia do Paul McCartney, um dos famosos Beatles que incendiaram o imaginário da nossa geração e ajudaram o mundo a pular e a avançar... (LG)

Foto © Henrique Cerqueira (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1.  Comentário. de  9 de outubro de 2014 , do Luís Jales de Oliveira ao poste  P12784, do Henrique Cerqueira, publicado em 1/3/2014 (*):


[Foto à esquerda: o Luís Manuel Jales de Oliveira, mais conhecido por "Ginho", em Mondim de Basto, sua terra natal, por onde corre o Tâmega, o seu "rio sagrado" e a sua "fonte de inspiração",  a par do Monte da Senhora da Graça, um antigo vulcão  foi  fur mil trms inf, Agrup Trms de Bissau e CCAÇ 20 (Bissau e Gadamael Porto, 1972/74), companhia africana onde serviu  às ordens do tenente comando graduadoTomás Camará,  que foi ferido em combate e, depois, às ordens do capitão comando graduado Sisseco (ambos oriundos da 1ª companhia  do batalhão de comandos africanos); poeta e escritor, tem já obra vasta, e é membro da Academia Luso-Brasileira de Letras]

 
Meu caro Henrique Cerqueira:

Só hoje descobri esta tua publicação [, com data de 1/3/2014] e confesso que fiquei emocionado. Por várias razões: porque revivi, recordei e evoquei momentos adormecidos nas catacumbas da memória, porque confirmei que já tive uma profusa e escurecida cabeleira (hoje completamente esbranquiçada para mal dos meus pecados) e, também, um pujante bigode, coisa rara e provocatória, à época, aqui no teatro militar metropolitano; e, por fim e principalmente, porque passados 42 anos ainda conseguiste, no meio daquela angelical composição de "querubin"  fardados, identificar-me e arriscar que eu me chamaria "Jales". 

Pois foi na mouche, sim senhor. Notável, meu caro Henrique, a tua pontaria evocatória!

Direi, respondendo também à pergunta do nosso caro "comandante" Luís Graça, que comentou, com muita graça, que eu, de repente, até parecia ser o sósia de um dos Beatles, que sou o Luís Jales de Oliveira, mais conhecido, na tropa, como Luís Jales e que publiquei o P2467 na “Tabanca Grande (54)”, em 21 de Janeiro de 2008.  (*)

Como deves calcular arranjei uma caterva de “imbróglios" por ostentar aquela trunfa exuberante durante todo o meu serviço militar. Em Tavira aconteceu uma coisa muito engraçada: Era forçoso que quando eu estivesse na formatura de revista para sair, e por mais que tentasse esconder, com a boina, o raio daquele excesso capilar, o oficial de dia parava, irremediavelmente, nas minhas costas, batia-me no ombro e mandava-me, em passo de corrida, para a caserna. Mas, naquele dia, depois de me mandar às malvas, voltou para trás e perguntou, pelo sim, pelo não 
–Por acaso o menino não toca no conjunto do senhor abade, pois não?

Eu respondi:
– Toco, toco, meu alferes – e ele imediatamente: 
– Pois então faça o favor de regressar à formatura. A porta d’armas, para si, está escancarada.

Isto serve bem para demonstrar o poder que tinha o nosso capelão de Tavira. Coitado daquele oficial que retivesse um de nós, nos dias marcados para os ensaios da Missa Dominical…

Resta-me dizer que não sou Açoriano, mas genuíno Transmontano de Mondim de Basto, a cerca de 100 km do Porto e que faço questão de te abraçar um dia destes.

Ao nosso caro Luís Graça prometo, agora que sempre consegui a reforma, que começarei a enviar montes de textos com lembranças e evocações:

(i) sobre a revista “ZOE”,  do Agrupamento  de Transmissões  de Bissau onde fui “correspondente de guerra”;

(ii)  sobre “Os Reactores” e “Os gloriosos malucos da aparelhagem electrónica”, onde tocava e que, para além doutras actuações, animavam os fins de semana do Clube de Sargentos de Santa Luzia; 
e, com muito mais interesse julgo eu,

(iii) sobre a “realidade” de Gadamael Porto que sorvi, bomba a bomba, durante 365 intermináveis dias.

Obrigado pelas emoções que me provocaste. O meu contacto é luis.jales.oliveira@gmail.com.
Grande e reconhecido abraço.


2. Comentário do editor LG:

Ao Jales (, afinal "meu vizinho", já que também tenho casa por ali perto, Marco de Canaveses, que integra a bela e nobre região do Vale do Tâmega,  berço da Nação,com o Vale deo Sousa ...), já pedi desculpa, por mail,  por na altura não me ter apercebido do seu comentário (de 9/10/2014) ao poste do Cerqueira (de 1/3/2014)... Não me apercebi ou já não me lembro...

De facto, ninguém tem a pedalada dos 20 anos para acompanhar tudo, fazer tudo, alinhar em tudo... É até por falta de tempo. Houve um desfasamento de vários meses, entre o poste e o comentário,  não conseguindo os editores ir com a devida regularidade à nossa caixa de comentários (que já vai em cerca de 64 mil comentários, alguns extensos e, muitos, interessantes).

Tínhamos prometido recuperar este, integrando-o num poste autónomo e justamente para provar, mais uma vez, a propriedade e a justeza da nossa máxima: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!" (***)...

Os pedidos desculpa são extensivos ao Henrique Cerqueira, sempre leal e generoso greã-tabanqueiro... Ao Jales desejo boa continuação da merecida reforma e das pescarias no rio Tâmega e no mar das letras!.. Quanto às prometidas colaborações, elas serão sempre bem vindas, em prosa ou em verso...

Um abraço do tamanho do Tâmega e do Cacine... 

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 1 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12784: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (18): Tavira, o CISMI e o meu "santo sacrifício da missa dominical"... Fazia parte do coro [da Igreja de São Francisco] para ter direito a uns "desenfianços" (Henrique Cerqueira, ex-fur mil, 3.ª CCAÇ / BCAÇ 4610/72, Biambe e Bissorã, 1972/74)

(**) Vd. poste de 21 de janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2467: Tabanca Grande (54): Luís Jales, ex-Fur Mil Trms (Agr Trms Bissau e CCAÇ 20, Gadamael Porto, 1973/74)

(***) Último poste da série >  8 de junho de 2016 >  Guiné 63/74 - P16175: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (101): no convívio deste ano, do pessoal do BCAÇ 3872, quem é que eu vou reencontrar? O meu antecessor, o hoje ilustre prof Pereira Coelho, bem como o Ussumane Baldé que estagiou comigo quando eu era subdelegado de saúde da zona de Galomaro-Cossé (Rui Vieira Coelho, ex-alf mil médico, BCAÇ 3872 e BCAÇ 4518, Galomaro, 1973/74)

domingo, 15 de maio de 2016

Guiné 63/74 - P16091: Tabanca Grande (486): José Salvado, ex-Fur Mil Armas Pesadas de Infantaria da CART 1744 (S. Domingos, 1967/69); foi também Administrador de Posto em Angola, é hoje advogado, vive nas Caldas da Rainha, e passa a ser o nosso grã-tabanqueiro n.º 715


Foto n-º 1 > O José Salvado em S. Domingues, na região do Caacheu


Foto nº 2 > A LDM 311 no rio Cacheu


Foto nº 3 > 2.º grupo de combate da CART 1744


Foto nº 4 >  Pela picada for

Fotos: © José Salvado (2016). Todos os direitos reservados


1. Mensagem de José Salvado, com data de ontem:

Caro amigo Luís Graça,

Respondendo ao convite, envio o pequeno texto, contendo os meus elementos militares e actuais:

Camaradas ex-combatentes,

Assentei praça no RI 5, nas Caldas da Rainha, no dia 16/05/1966, como soldado miliciano.

Em 21 de Agosto daquele ano fui para o CISMI em Tavira, tirar a especialidade de Armas Pesadas de Infantaria.

Terminada a especialidade fui colocado no RI 15, em Tomar, onde fui promovido a 1.º Cabo Miliciano, e, no dia 28 de Fevereiro de 1967 fui transferido para o GACA 2, em Torres Novas, para dar a escola de recrutas, sendo integrado na CART 1744, que no da 20 de Maio de 1967, embarcou no paquete Uíge tendo como destino a Guiné. Fui graduado em furriel miliciano na data de embarque.

Chegado à Guiné-Bissau, no dia 25 de Maio de 1967, descemos para uma LDM, onde nos foi distribuído o armamento, e navegando toda a noite chegámos no dia seguinte ao Cacheu, permanecendo ali até ao 27 de Maio, de manhã, e depois tendo embarcado num barco que nos transportou até S. Domingos.

Como Companhia de Intervenção a minha companhia, a CART 1744,  esteve presente em operações em S. Domingos, Susana, Ingoré, Cacheu e o meu pelotão esteve 15 dias no Sedengal em emboscadas para os eventuais fugitivos de uma grande operação que decorria na mata da Coboiana,  no Cacheu.

De regresso, embarquei no paquete Niassa, no dia 15 de Maio de 1969, tendo desembarcado em Lisboa no dia 21 do mesmo mês.

Mais tarde fui promovido a 2.º sargento miliciano.

No dia 13 de Junho de 1969 tomei posse do lugar que me aguardava na Repartição e Finanças de Montemor-o-Velho, como aspirante de finanças, e 2 anos e pouco após a posse, estava a rescindir o contrato, para tomar posse como Administrador de Posto em Angola. [Foto à esquerda,]

Regressado em 1975, fui colocado, no dia 21 de Janeiro de 1976, como funcionário administrativo da Escola Preparatória de Terras de Bouro, que abandonei em 30/09/1979, porque no dia 1 de Outubro (dia seguinte) tomei posse como chefe de secretaria da Câmara Municipal da Lourinhã, lugar que abandonei por transferência para a C. M. das Caldas da Rainha. 

No dia 2 de Dezembro de 1991, tomei posse como Director Administrativo da C. M. da Covilhã, sede do Concelho da freguesia da minha naturalidade.

Passei à aposentação no dia 30 de Setembro de 1994.

Presentemente,  para além de aposentado, exerço funções como advogado, na cidade das Caldas da Rainha, onde resido desde o dia 30 de Setembro de 1984.

Junto as 2 fotos da praxe [e mais algumas da página no Facebook].

Um abraço do
José Salvado


2. Comentário do coeditor CV:

Em nome do Luís Graça e demais editores, colaboradores permanentes e demais amigos e camaradas da Guiné, que se junta simbólica e fraternalmente à sombra do poilão da Tabanca Grande, dou-te as boas-vindas.

Cumpridas as formalidades de apresentação, passas a constar dos nossos registos como o grã-tabanqueiro n.º 715. Ficas a saber que és o primeiro representante da tua companhia, a CART 1744, da qual sabemos pouco.

Esperamos que nos digas mais coisas sobre o tempo que passaste no Cacheu e, já agora, por que não, podes também escrever sobre os tempos passados como administrador de posto em Angola.
Obrigado pela tua vontade em integrar este grupo de antigos combatentes que passaram pela Guiné entre 1961 e 1974. Como costumamos dizer, o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande, nela cabemos com tudo aquilo que nos une e até com aquilo que nos pode separar, por exemplo, a política, a religião e... o futebol.

Muita saúde e longa vida, camarada José Salvado,
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Nota do editor:

Último poste da série > 19 de abril de 2016 > Guiné 63/74 - P15992: Tabanca Grande (485): Completando o processo de adesão do António Osório, que vive em Vila Nova de Gaia: foi fur mil rec inf, CCS/QG/CTIG (Bissau, Cacine, Gadamael, Cameconde, 1970/72)

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P15950: Pré-publicação: O livro de Mário Vicente [Mário Fitas], "Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra" (2.ª versão, 2010, 99 pp.) - VII Parte: VI - Por Terras de Portugal: (i) Tavira...

Capa do livro (inédito) "Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra", da autoria de Mário Vicente [Fitas Ralhete], o nosso querido camarada Mário Fitas, ex-fur mil inf op esp, CCAÇ 763, "Os Lassas", Cufar, 1965/67, e cofundador e "homem grande" da Magnífica Tabanca da Linha, escritor, artesão, artista, além de nosso grã-tabanqueiro da primeira hora, alentejano de Vila Fernando, concelho de Elvas, reformado da TAP, pai de duas filhas e avô.

Esta edição é uma segunda versão, reformulada, aumentada e melhorada, do livro "Putos, gandulos e guerra" (edição de autor, Estoril, Cascais, 2000). E tem prefácio do nosso camarada António Graça de Abreu:

(...) "No seu livro Pami na Dondo (2005) a partir de uma história verídica Mário
Vicente ficciona as agruras, desventuras e algumas alegrias de uma jovem guerrilheira do PAIGC, capturada pelas tropas portuguesas em meados das décadas de sessenta. Pami na Dondo, o nome da guerrilheira, acabaria por gradualmente se inserir no seio da população africana na aldeia controlada pelos portugueses e por ter um relacionamento singular e extremado com alguns militares estacionados no pequeno mas importante aquartelamento de Cufar.

"O outro título saído da inteligência e da pena de Mário Vicente é Putos, Gandulos e Guerra (2000). Reformulou, aumentou e melhorou esse texto e publica-o agora como Do Alentejo à Guiné, Putos, Gandulos e Guerra.

"Com laivos e tintas biográficas, este livro fala-nos de um menino nado e criado na aldeia de Vila Fernando, no Alentejo profundo, Calças de Palanco – este o original nome do puto – que será o gandulo e o homem na esteira e por dentro da guerra na Guiné. Eram as malhas que o então estertor do Império entretecia. Na preparação como militar, o rapaz faz o curso de sargentos milicianos em Tavira e depois conclui a especialidade de Ranger em Lamego. A aprendizagem para a guerra é impiedosa e dura. Mas necessária, em África o conflito agudiza-se." (...)

A pré-publicação desta versão, no nosso blogue, em formato digital, está devidamente autorizada pelo autor.  Neste cap VI,  ele, o Vagabundo, revisita as terras de Portugal por onde passou, na tropa, antes de ser mobilizado para o TO da Guiné: Tavira, Elvas, Lamego, Oeiras... Recorde-se,  por outro lado, que o nosso Vagabundo é natural de Vila Fernando, Elvas. A Colónia a que ele se refere no texto a Colónia Correcional de Vila Fernando (instituição de internamento de jovens delinquentes que ali funcionou entre 1895 e 20079. Era também uma herdade agrícola com mais de mil hectares de suiperfície (em 1967). No período de 1955 a 1976 foi seu diretor o engº Manuel Joaquim da Silva Rente.


Texto e foto: © Mário Fitas (2016). Todos os direitos reservados



Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra

VI - Por Terras de Portugal: Tavira, Elvas, Lamego, Oeiras... 

Tavira (pp. 27-28)

por Mário Vicente [, foto atual à direita]

Tavira!... Oh!... doce Tavira! Terra linda!... Montes cobertos de amendoeiras, de figueiras e alfarrobeiras, com os teus belos vales enfeitados de laranjais, és mesmo um encanto!... Apenas um senão te rouba a encantadora beleza, terra de lindas capelas e igrejas: o nauseabundo cheiro expelido pelos esgotos do teu belo e sinuoso rio Gilão, quando a maré vazante os deixa a descoberto.

A tua bela ilha de fina areia branca, afagada por salgadas ondas transparentes, onde nas dunas se espreguiçam lindas mulheres de tez escura, sangue mourisco e olhos amendoados, como moiras encantadas que de quando em vez se transformam em sedutoras sereias, deixando presos incautos marinheiros, melhor dizendo militares, atirados para a escola do CISMI, onde se perde a vergo­nha e se aprende a vivência no "Canil da Vida". Terra de loucuras e de prazer.

Chegou aqui criança, menino de coro virgem para a safadice! Daqui saiu sem vergonha e malandro, perfeitamente enquadrado com a vida militar, como Vagabundo. Confirmando, em pouco tempo, aquilo que o professor da Colónia lhe tinha aconselhado:
– Rapaz,  olha e tem calma! Nem bom cavalo, nem bom soldado!... Se és bom cavalo, todos te querem montar. Se és bom soldado, todos te querem mandar.

Verdade matematicamente confirmada: dois mais dois, igual a quatro. A arte de como aprender a roubar foi facílima! Primeira revista à companhia de instrução. O protector de boca, da Mauser, tinha-se misteriosamente evaporado: foi ao ar. Para além de o pagar e comprar outro na Feira da Ladra, levou um corte de fim-de-semana. Nunca mais voltou a acontecer. Como os gatos, um olho aberto outro fechado o militar aprendeu a caçar. Protector de boca sempre no bolso, só na hora da revista apare­cia na espingarda. Mas, mesmo assim numa ida aos balneários quase em cima da revista, ficou pela segunda vez sem o famige­rado protector. Meus amigos, paciência, outro terá de arder!... Vagabundo roubou o que mais a jeito estava e na revista, a sua arma estava completa. Resultado: tudo mais fácil, limpo, sem grande trabalho e nada dispendioso!...

Aprendeu nas salinas a mergulhar na lama! Desgraçados do cabo Baidalo, do Churro, e outros, já homens de certa idade, cabos aprovados que para singrarem na Guarda [Nacional] Republicana ou no Exército tinham de tirar a especiali­dade, assim eram integrados no Curso, juntos àquela malandragem toda. Coitados, já não tinham idade para entrar naquilo!
– O quê?
– Os gajos não querem? Malta a eles!

Incitava o Suiças, acabadinho de sair do tirocínio em Mafra. A malta lançava-se sobre os desgraçados como alcateia de lobos sobre a presa, e eram obrigados pela matula a chafurdarem tam­bém na lama das salinas.

Na Atalaia muitas coisas aprendeu para além da ordem unida e armamento. Aprendeu vendo! Como se destrói um ho­mem,  despersonalizando-o e  transformando-o em farrapo. O tripeiro Pintainho com fobia das alturas, ser obrigado a subir ao muro alto, mão direita erguendo os restos de velha vassoura transformada em facho, lágrimas de raiva contida rolando pela face ser obrigado a gritar:
– Eu sou o Maior, eu sou o Melhor!

Degradante!... Vergonhoso, não só por ver um miúdo homem bom, sincero e honesto ser obrigado a descer tão fundo, anulação completa da sensibilidade humana!
– Não!

Com o ex-seminarista Clemente, frequentou nos primeiros tempos as belas igrejas de Tavira aos domingos. Entretanto, viu o Doutor,  vindo do Instituto de Reeducação (onde esteve internado) metido nisto, fazendo leituras na missa misturado com a alta sociedade da terra. Achou demais para tal figurão e infelizmente acertou. Pouco tempo depois falou com o Doutor  pelas grades da prisão e verificou que estaria com graves problemas. Só que ali já não seria a transferência para Leiria, mas sim o Forte da Graça em Elvas, ou outro presídio militar, o que seria bem mais complica­do. Vagabundo teve pena do Doutor.

Na sua metamorfose constante, Vagabundo transforma-se em abutre. Monte Gordo! Marie Luise! Filha de mãe france­sa e de pai emigrante português. Treinou um pouco o francês e não só. Momentos de loucura! A menina de Lyon, em férias e o militar Vagabundo, rolaram nas areias finas da praia e mergulharam nas quentes águas do Atlântico,  influenciadas pelo Mediterrâneo. A sensibilidade de Marie Luise transformou Vagabundo,  aprendeu comme il faut doucement. L´étalon! Pourquoi être mâle latin!? [, O garanhão ! Porquê ser macho latino ?!].

Em pouco tempo as reservas que tinha levado, evapora­ram-se. Houve que mandar um SOS para os velhotes, solicitando papel. Neste espaço de pede e recebe, é apanhado por um fim-de-semana, completamente limpo. Com Abledu, saiu dando umas voltinhas pelos cafés junto ao jardim e um saltinho ao outro lado do Gilão, para visitar uns familiares do camarada e amigo elvense. Sábado à noite regressa sem dispensa de fim de semana e de recolher à sua caserna.

Conversa com Clemente, vai aos balneários e vê uma banca de batota montada. Lá estavam os amigos madeirenses doidos pelo jogo. Completamente limpo, volta para o beliche, e tenta cravar o ex-seminarista. Este adivinha do que se trata. Nega e dá-lhe um sermão. Insiste! Bondoso, Clemente acede e passa-lhe cinco “croas”. Vai direito aos balneários e troca a massa para durar mais tempo. Atira cinquenta centavos para um montinho. O banqueiro vira as cartas, debaixo dos cinquenta centavos estava um rei. Negoceia a banca por vinte paus. Já dá para fazer umas jogadas e passar o tempo. Agora arrisca cinco coroas e perde três vezes seguidas, mais cinco coroas e novo rei. Aqui faz bluff, cem paus pela banca ou fica banqueiro. Jogo de alto risco. Ele sabe que não tem dinheiro no bolso para suportar a banca. Arrisca mas pode dar bronca e pancadaria. Fica banqueiro e as coisas começam a correr bem. Vai ganhando e perdendo a banca. Meia noite, já à luz da vela, levanta-se e diz que para ele termina. Conta o dinheiro. Tem no bolso mil quatrocentos e cinquenta escudos, mais uns trocados. Vai-se deitar. Acorda Clemente e dá-lhe um rolo de cinco notas de vinte.
– Toma lá as cinco “croas”. Amanhã vamos almoçar a Vila Real, O.K.?

Tavira, o antigo CISMI. Fevereiro de 2014. Foto de LG
Universidade Aberta, vai aprendendo a sobreviver, no mundo cão. Razão tinha Niotetos (in "Pássaro fora da Gaiola"):
– Eu não devo nada ao cabrão do meu pai! Se sou o que sou, foi porque estudei. O gajo limitou-se a fazer-me numa noite de gozo.

Aula de táctica, mesmo com o estômago vazio, Vagabundo sentiu vómitos e uma forte dor no estômago. As entranhas embrulharam-se-lhe todas. Nunca tinha ouvido tal. Seria possível um indivíduo falar assim do próprio pai? Mais!... passeando com a mulher pela rua, virava-se para trás e, directamente para a malta, dizia:
– É boa, não é!? Mas é minha!

Assim, com estes professores, ia sendo formado um futuro furriel miliciano do Exército Português, em África. Quando em Dezembro de 1963 o já cabo miliciano Va­gabundo recebeu a guia de marcha para se apresentar no Bata­lhão de Caçadores n.º 8 em Elvas, onde tinha sido colocado, não ficava com muitas saudades do CISMI, antes pelo contrário criou uma certa alergia ao próprio Algarve.

 (Continua)
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sexta-feira, 18 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15872: Pré-publicação: O livro de Mário Vicente [Mário Fitas], "Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra" (2.ª versão, 2010, 99 pp.) - VI Parte: V - Vagabundo


Vila Fernando em festa..., Banda do Instituto de Reeducação (c. anos 60)



Capa do livro (inédito) "Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra", da autoria de Mário Vicente [Fitas Ralhete], o nosso querido camarada Mário Fitas, ex-fur mil inf op esp, CCAÇ 763, "Os Lassas", Cufar, 1965/67, e cofundador e "homem grande" da Magnífica Tabanca da Linha, escritor, artesão, artista, além de nosso grã-tabanqueiro da primeira hora, alentejano de Vila Fernando, concelho de Elvas, reformado da TAP, pai de duas filhas e avô.

Esta edição é uma segunda versão, reformulada, aumentada e melhorada, do livro "Putos, gandulos e guerra" (edição de autor, Estoril, Cascais, 2000). 

A sua pré-publicação, no nosso blogue, em formato digital, está devidamente autorizada pelo autor.

Texto e fotos: © Mário Fitas (2016). Todos os direitos reservados


Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra >  V Vagabundo (pp. 25-26)

por Mário Vicente [, foto atual à direita]


Calças de Palanco acaba finalmente os estudos e ingress­a, como educador, no Instituto de Reeducação. Faz aqui então uma experiência interessante, na recuperação de menores, sendo integrados na escola de Baden Powell. Os primeiros resultados foram bastante animadores. Pena foi não ter sido continuado o aproveitamento desta semente.

Mais maduro e na convivência com a cultura, a sua vida começa a transformar-se. Nos corredores do Instituto, há sã convivência e aprende-se muito com os mais velhos, cuja vida é já súmula da experiência. E há a brincadeira, às vezes um pouco brejeira, que inofensivamente vai divertindo o pessoal.

Rafael de Oliveira, para além da cultura e arte em termos de teatro, gosta da brincadeira e teatraliza, por vezes, no dia a dia.

Um dia de muita chuva, enquanto Manuel vai aviando um quartilho de açúcar, o Sr. Zé vai apontando na caderneta. Rafael de Oliveira entra procurando cravar um proibido cigarro. Otília fazia as queixas de tanta chuva e de tanta água. Até a sua senhora, de manhã, tinha encontrado uma minhoca atrás da porta, o que foi aproveitado para uma logo directa, do produtor e coreógrafo, exclamando:
– Oh rapariga, isso não é admiração nenhuma. Vê lá tu que a minha Maria hoje de manhã encontrou uma na cama!
– Não me diga?
– Verdade!...

À hora de almoço já todo o prédio da Colónia sabia do aparecimento da minhoca na cama da Dª. Maria Florete.

E assim seguia o entrosamento na vida de Calças de Palanco, que colabora e chega a integrar a Conferência de S. Vi­cente de Paulo. Os excluídos da sociedade principiam a mere­cer-lhe grande atenção. Na sua mente, começam mesmo a delinear-se hipóteses de missionário em África, ou mesmo, quem sabe, a entrada no seminário. Crente, entrosado e estudioso da vida de Cristo, julga estar no caminho certo da sua vida.

Mas não somos nós que delimitamos os nossos cami­nhos. Os desígnios de Deus são imponderáveis, como se diz e eternamente continuará a dizer-se! Sempre assim será!

Existirá sempre um senão! E ele existiu e tornou-se realidade, pois é precisamente neste momento que na sua vida entra uma mulher a sério. Tânia!

Naquele dia do Santo Mártir, à tarde depois da procissão, junto ao Pelourinho quando o Maestro da Colónia com a sua banda de excluídos procurando reinserção, atacou o seu reportório. Os olhares, cruzando-se e penetrando-se, aconteceu! Bem fundo, no âmago dos seus sentimentos e coração, Calças de Palanco sentiu a transformação dentro de si.

Eis a mudança! Eis a alma gémea! Nunca será sua mas jamais o largará! Começou aqui a sua metamorfose em Vagabundo.

Sua irmã mais nova interpela-o e goza com ele:
– Corres com as pernas partidas para lados do norte!

Só que ele não vê, não ouve ninguém só existe para ela. É aconselhado, amigos e outros tentam abrir-lhe os olhos, para o logro em que está a cair. Impossível! O pior cego é, de facto, aquele que não quer ver. Na sua verdade, na sua honestidade, há gente que antevê que vai sair ferido. É doloroso ver perder a esperança nas pessoas, é triste ver as pessoas serem traídas, é horrível ver a reacção do leão ferido.
– Aqui, tu,  estrangeiro, não serás ninguém para os outros. Vão-te trair!

Fantásticas e veras, estas palavras do padre António por volta dos anos sessenta. O padre mais parecia bruxo! Bom homem, o padre António! Por onde andará? Será que ainda continua pobre, as calças bem coçadas, bainhas desfiadas por debaixo de uma batina, também há muito a pedir reforma?!... Em tempos idos andaria ele por terras de Endovélico, Deus dos Lusitanos, o que seria Terena, Alandroal ou Mourão, conforme João Aguiar descreve na "Voz dos Deuses".

Calças de Palanco sente-se traído. É evolutivo o seu estado de desespero, sem coragem na sua cegueira consentida. Começa a sua adulte­ração. Seu amigo Niotetos tenta trazê-lo à realidade, mas em vão, a sua revolta começa a definir o sangrar de uma companhia dolorosa que o levará a grandes loucuras.

Com João Valente forma a "patrulha", alcunha atribuída por os dois andarem na boa vida até altas horas da noite. Fazem cantar os galos da aldeia às horas mais díspares, pois descobri­ram qual deles dava o mote. Os santos populares este ano são vividos, como o princípio do fim de uma era. A "patrulha" é tramada, tem em mãos todos os cadernos da pequena aldeia, é o princípio de um Verão diabólico!

Seis de Agosto de 1963. É patética a despedida com Niotetos Principalmente quando este olhos nos olhos lhe diz:
– Nunca mais serás o mesmo. Só aquela mulher, se quisesse, te poderia ajudar e ser a tua salvação, caso contrário entrarás no fosso e na lama.

Calças de Palanco já não é, já foi, já não existe, ele é neste momento “Vagabundo”. Viva o Vagabundo!

Sete de Agosto. Com o ti Lagarto na condução, o carro de cavalos começa a subir a ladeira. Deixando a sua aldeia, a caminho do CISMI - Centro de Instrução de Sargentos Milicianos de Infantaria em Tavira, Vagabundo leva guarda de honra. Acompanham-no até ao ramal da Terrugem, Saragoça (sem concertina), Carmélia, Peta e João Valente. No cruzamento, ao cimo da ladeira, olha para as indicações das povoações no sentido Norte. O seu pensamento não resiste. A coragem é areia esfarelando-se entre dedos. Olhos húmidos, sente a afloração de saudade que viverá escondida, da mulher que nunca irá esquecer.

Revolta-se. Os companheiros de meia viagem, calados, pressentem que algo de estranho se está a passar. Fala alto, mas ninguém o entende. Lá, bem dentro, o coração sangrando pede-lhe amor, mas a cabeça recusa. Nunca mais! Poderias fazer de mim um "bibelô." Agora é tarde!

Tânia, comigo irão sempre a tua franzina figura e teus negros olhos cintilantes. A tua negação ficará eternamente cica­triz aberta, dentro do peito do cigano errático em que me trans­formei. O resto será aventura. Olhou para os amigos e lembrou-se das palavras de Niotetos: nunca mais seria a mesma pessoa. Um abraço a todos e até ao meu regresso. Esperem pelo Vagabundo, gritou, sem nenhum som lhe sair da garganta.

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terça-feira, 29 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13445: Em busca de... (246): CISMI, 4ª Companhia, Tavira, agosto de 1963... a que pertenceu o vosso grã-tabanqueiro Manuel Luís Lomba... (Armando Sousa / Francisco Mota Lopes)



Foto de perfil da página do Facebook CISMI 4ª Companhia Agosto de 1963.


1. Mensagem do nosso leitor (e camarada) Armando Sousa, com data de 21 de maio passado:




Boa tarde, Luis Graça.

Não obstante não ter feito o meu tempo de guerra colonial na Guiné, mas sim em Angola, abordo o teu blogue para pedir-te o favor de me forneceres o mail do Manuel Lomba, um rapaz que fez comigo o Curso de Sargentos Milicianos, em Tavira. Somos um grupo também de  ex-combatentes, que pretende reunir o Primeiro dos nossos Primeiros Pelotões ( CISMI - Tavira - Agosto de 1963). Sabemos que o Lomba cruzou mails contigo e, por essa razão, te pedimos esse favor.

Para a Tabanca Grande votos de um número infinito de aderentes.
Para ti, um abraço do camarada




2. Resposta de LG, com data de  21 de maio último, ao  Armando Sousa com conhecimento ao Manuel Luís  Lomba [, foto atual à direita]


Armando: Obrigado pelo pedido e pelos votos de sucesso para o nosso blogue, o mesmo é dizer, pela causa de todos nós, qualquer que seja o TO que nos coube. Aqui tens o contacto do Manuel Lomba, a quem dou conhecimento deste mail...Se quiseres escrever sobre o CISMI e o nosso tempo de Tavira, tens as portas abertas do nosso blogue. Um alfabravo, Luís Graça

3. Nova mensagem de LG, para o Armando Sousa, com data de 22 de maio último



Camarada:

Eu sou um "pira". "maçarico", "checa", comparado com vocês... Passei por Tavira, CISMI, no 4º trimestre de 1968...Mas tenho muito gosto em pôr as páginas do nosso blogue ao serviço das vossas iniciativas... Temos algum impacto: 656 membros registados (, 5% dos quais já morreram, infelizmente), 1 milhão de visualizações por ano... Vejam aqui 32 referências ao CISMI, onde todos passámos bons e maus bocados

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/CISMI

O Manuel Lomba por certo que vos vai contactar. E eu tenho muito gosto em fazer um apelo, no blogue, à rapaziada desse tempo... Infelizmente, muitos não vão à Net, não teêm email... Mas têm os filhos e os netos...

Também podem usar a nossa página do Facebook, Tabanca Grande Luís Graça:

https://www.facebook.com/profile.php?id=100001808348667

Armando, um alfabravo (ABraço) fraterno... Somos uma espécie em vias de extinção... Luis Graça

Quartel da Atalaia, Tavira, jan 2014. Foto de LG

4. Mais três mails do Armando Sousa, com data de 22 de maio:



 (i) Boa tarde, Luis Graça.

Ainda ontem trocámos mensagens e já hoje te estou a "bater à porta".


Na verdade, ao referir-me no meu contacto anterior, que "somos alguns que pretendem reunir o primeiro dos primeiros pelotões no CISMI 1963", estava a incorrer num erro de informação porque o objectivo era a Companhia. 

Lembrámo-nos logo, em uníssono, de fazer a nossa primeira publicitação na Tabanca Grande, do Luis Graça, (que nos parece ser, ele mesmo, CISMI 1968) e de lhe agradecer a rápida informação que nos fez chegar, a propósito da localização do Manuel Lomba ( que, por motivos pessoais, ainda não deu acordo de si).

E,então, Luis Graça, aqui fica a nossa mensagem: "CISMI - 4ª Companhia - Agosto de 1963, quer encontrar-se", os contactos poderão ser para os mail s

armandopsousa@hotmail.com 

ou

 francisco_motalopes@hotmail.com

Esperemos que muita gente compareça à chamada.


O Armando Sousa e o Francisco Mota Lopes agradecem o teu contributo.

Um abraço fraterno de camaradas



(2)  Luis Graça, um muito obrigado pela tua disponibilidade.

Entretanto, vamos tentando outras vias e pensar que, daqui a um ano, talvez tenhamos um bom número de "rapazes" nas nossas "listas".

Fico, também, ao teu dispor, para aquilo que pretenderes de mim.

Um alfabravo

(3) Boa noite, Luis Graça.

Criámos uma página CISMI 4ª Companhia Agosto de 1963, no Facebook. O nosso desejo, como é evidente, é que a referida página seja visitada por muitos camaradas e, se possível, um Gosto, para que a mesma não seja eliminada. Pedimos, uma vez mais, a tua colaboração para publicitares esta "maçarica" página na prestigiada Tabanca Grande.

Um fraterno alfabravo do Armando Sousa

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Nota do editor:

Último poste da série > 4 de julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13365: Em busca de... (245): Francisco Neto, ex-1.º Cabo Art do 15.º Pel Art (Guileje e Gadamael, 1973) (Luís Paiva)