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quinta-feira, 23 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20891: (D)o outro lado do combate (59): A morte dos três majores no chão manjaco, em 20/4/1970, e a intervenção de Amíclar Cabral, três semanas depois, na reunião do Conselho de Guerra (Jorge Araújo)


 PAIGC > Conselho de Guerra > Reunãio de 11/5/1970 a 13/5/1970. Acta das reuniões. Detalha da Capa. 

[Amílcar Cabral: (...) Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos nossos camaradas do Norte. É a primeira vez que numa luta de libertação nacional se mata assim três majores, três oficiais superiores que, nas condições da nossa luta, equivale à morte de generais. (...)]




Jorge Araújo, ex-fur mil op esp / ranger, CART 3494 / BART 3873 (Xime e Mansambo, 1972/1974);  professor de eduxção física, docente do ensino superiro; nosso coeditor, autor da série "(D)o outro kado do combate"; régulo da Tabanca dos Emiratos,


GUINÉ: (D)O OUTRO LADO DO COMBATE:
A MORTE DOS TRÊS MAJORES NO CHÃO MANJACO
EM 20 DE ABRIL DE 1970 E A INTERVENÇÃO DE AMÍLCAR CABRAL NA REUNIÃO DO CONSELHO DE GUERRA TRÊS SEMANAS DEPOIS
1.   - INTRODUÇÃO
Saúdo a oportuna e sentida homenagem pública aos "sete militares chacinados pelo PAIGC no Chão Manjaco", feita ontem pelo camarada Manuel Luís Lomba - P20879.

A narrativa lembra a todos os que nele estiveram envolvidos ou dele foram tendo conhecimento ao longo dos últimos cinquenta anos (1970.04.20-2020.04.20), alguns antecedentes históricos e respectivas consequências.

Como fazemos parte do último grupo, os que foram coleccionando informações avulsas, umas vezes da autoria dos que viveram muito de perto este horripilante acontecimento, enquanto informantes e/ou observadores privilegiados, outras, corolário de diferentes análises documentais que, por serem feitas em síntese, ficam amputadas de detalhes que podem influenciar a compreensão da sua totalidade.

Partindo dos diferentes comentários dos camaradas: Luís Lomba, Manuel Carvalho e, particularmente, do Valdemar Queirós, quando coloca no seu texto "também não me lembro da informação do PAIGC sobre o assunto" (e eu também não!), levou-me a indagar junto do Arquivo  Amílcar Cabral, existentes na CasaComum, Fundação Mário Soares, algo relacionado com o tema.

Encontrei a "Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra", realizada em Conacri, de 11 a 13 de Maio de 1970, três semanas após a consumação do Massacre, sendo este o primeiro (e único) documento «(D)o Outro Lado do Combate» que, no meu entender, faz fé quantos às motivações dos seus "actores" e "autores".

Sugiro, também, a leitura da entrevista dada ao "cmjornal", por Francisco Rodrigues, publicada em 30Mar2008, um dos militares que esteve na recuperação dos corpos dos sete mártires. [in: https://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/vi-os-corpos-mutilados-dos-tres-majores, com devida vénia.



 PAIGC > Conselho de Guerra > Reunião de 11/5/1970 a 13/5/1970. Acta das reuniões. Capa


[Página 1]




2.   - A ACTA DA REUNIÃO DO CONSELHO DE GUERRA (ALARGADO)

Transcrição da intervenção de Amílcar Cabral (1924-1973), manuscrita por Vasco Cabral (1926-2005), secretário da reunião do Conselho de Guerra realizada em Conacri de 11 a 13 de Maio de 1970

► S.G. [Secretário-geral, Amílcar Cabral] – Saúdo os camaradas. É com o máximo prazer que fiz esta reunião que, desta vez, é em Conacri, para variar.

Desde a última reunião do B.P. [Bureau Político] até esta, a luta já mudou bastante. A Leste é uma mudança constante. Por ex.: fomos capazes de atacar Mansoa e Bissorã, com novas armas. Nesta altura, a posição do inimigo é diferente. O inimigo deve estar a pensar o que deve fazer para evitar os nossos ataques aos centros urbanos. Conseguimos fazer causar ao inimigo, em todas as frentes, um choque psicológico bastante grande. Conseguimos anular a tentativa do inimigo de desorientar as nossas populações.

A situação mudou também por causa da acção levada a cabo no Norte contra alguns oficiais superiores, em consequência da acção combinada das nossas forçadas armadas, da segurança e da Direcção do Partido.

A liquidação dos 3 majores, 1 alferes e alguns outros elementos (segundo alguns camaradas, um capitão e um chefe da Pide), mostrou que era falsa a propaganda dos tugas de que estavam à vontade na nossa terra. Por outro lado, os tugas estavam convencidos de que conseguiam comprar as nossas gentes.

Toda a política do Spínola [1910-1996], em consequência destas nossas acções está posta em causa para toda a gente, tanto dentro como fora da nossa terra, o nosso prestígio aumentou bastante e até mesmo para o nosso inimigo. Sobretudo esta liquidação dos oficiais superiores contribuiu para isso. O tuga pensava antes que nós todos éramos cachorros. O tuga agora já se convenceu do contrário. Isso aumentou a nossa dignidade, a nossa importância aos olhos do próprio inimigo.

A situação hoje é diferente da altura em que fizemos a reunião em Boké. Os nossos camaradas deram provas de capacidade. Nesta luta, como costumamos dizer, tudo é possível. Conseguimos levar armas pesadas do Sul para o Norte, quase sem perdas: perdemos dois camaradas e três armas. Os nossos camaradas foram capazes de enganar, discutir com eles, convencê-los, apesar da sua imensa experiência e capacidade e liquidá-los.

No intervalo da reunião de Boké para este, um ponto importante do nosso tema que é, o Kebo foi atraído diversas vezes. Isto é também importante. Sobre a passagem de armas do Sul para o Norte.


 [Página 2]

Através de certos camaradas que estão em Canchungo [mais conhecido por chão de manjacos], os tugas tentaram combinações com eles com vistas a desmoralizar a nossa gente. Tentaram, servindo-se de elementos da FLING [Frente de Libertação para a Independência da Guiné], portanto a um nível mais baixo, desmobilizar a nossa gente, sem resultados. Por consequência foram à prisão de quatro dirigentes da FLING. Tentaram contactar Albino, Braima Dakar e outros. E na região do Quinara. E também com gente na periferia da nossa luta: Luís Pinto e João Cabral.

Tentaram a ligação com André Gomes e com Quintino [Gomes; 1946-1972]. Eles avisaram a Direcção do Partido, para o interrogar. André Gomes deu mais uma prova de confiança no Partido. Ele mesmo supunha que os tugas queriam desertar. Só depois é que se viu o que queriam era desmobilizar a nossa gente.

O Secretário-geral deu o seu acordo à proposta mas pediu que agíssemos depressa. Luís Correia pôs-se, por sua própria iniciativa, em contacto com os camaradas da Zona, Lúcio Touchô também foi envolvido na combinação. Ele pôs-se em contacto com os tugas, mas quem devia falar era Braima Dakar que jogou um papel de defesa do Partido.

Os tugas escreveram cartas amáveis e respeitosas aos camaradas, um grande namoro. Deram-lhes muitos presentes. Propunham que os guineenses deviam substituir os cabo-verdianos, de quem já tinham feito uma lista negra de trinta e que deviam ceder os seus lugares a guineenses. Deram presentes vários: conhaque, whisky, vários panos para as mulheres, relógios, cigarros bons, etc..

Encontraram-se cinco vezes. Na quarta vez, esteve presente o governador [Spínola] que apertou a mão, tirando a luva, do nosso camarada André Gomes (Amílcar lê uma das cartas de um major, Pereira da Silva, a André Gomes).  No dia do encontro, deviam vir os nossos camaradas chefes e estava prevista a vinda do próprio governador [Spínola].

Os camaradas vieram de facto acompanhados das suas armas. Apareceu mesmo o Luís Correia e eles já sabiam da sua presença. Para não desconfiarem disseram-lhe que o Luís Correia estava presente e que era um alto responsável do Partido.

Durante as conversações com os tugas, foi decidido pararem os bombardeamentos aéreos e os combates. Isso aconteceu de facto: os nossos camaradas pararam também certas acções (Amílcar lê uma outra carta do Major [Alferes] Mosca). Braima Dakar aproveitou para fazer certas exigências. Pediu a libertação do seu país, a libertação de dois camaradas (Claude e José Sanhá) e foram mesmo soltos (já cá estão).

Durante a trégua, os camaradas levantaram minas na estrada de Bula-Binar.

Mesmo assim houve uma emboscada, aos tugas, na qual, segundo uma carta apanhada de um dos majores, afirmam que morreram quatro tugas.

[Será que se referem a: António da Silva Capela e Henrique Ferreira da Anunciação Costa, da CCAV 2487, em 18OUT69; e Joaquim José Ramalho Rei e Manuel Domingos Martins, da CCAV 2525, em 07Dez69]?

Também dão notícia dos ferimentos graves que sofreu um capitão que estivera com eles nessa reunião, ao tentar detectar minas: perdeu um braço e uma das vistas.
[Segundo José Paulo [Abreu Nogueira] Pestana (então capitão da CCAÇ 2466/BCAÇ 2861), "foi ele que mais tarde foi substituir o capitão [José Júlio da Silva de] Santana Pereira [CCAÇ 2367/BCAÇ 2845], ferido com uma mina antipessoal na zona de Có-Pelundo, onde se construía uma estrada entre Bula e Teixeira Pinto. Nunca podíamos descurar as minas colocadas nos trilhos, que já haviam vitimado um alferes (José Manuel Brandão, da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892, em 02Mar70) e ferido o capitão". - in https://www.cmjornal.pt/mais-cm/domingo/detalhe/conheci-os-tres-majores-assassinados (04Jan2009)], com a devida vénia.


[Página  3]

► Nino – Salienta a importância dos nossos camaradas terem levado à certa grandes homens dos tugas. Isso foi porque os tugas nos consideram como cachorros. Os tugas sentem hoje qual é a nossa força tanto moral como política.

► Amílcar – Este acto foi um acto de grande consciência política e um acto de independência. Foi um acto de grande acção e de capacidade dos nossos camaradas do Norte. É a primeira vez que numa luta de libertação nacional se mata assim três majores, três oficiais superiores que, nas condições da nossa luta, equivale à morte de generais.

Refere o artigo de [Cor Hélio] Felgas [1920-2008] na Revista Militar [n.º 4 – Abril de 1970] que, no fundo, é um grande elogio ao PAIGC. Diz algumas das suas observações a nosso respeito. Talvez que os tugas vão desenvolver uma acção de grande envergadura e de repressão.

Depois do acontecimento [dos majores], publicaram um pacto, ao qual propunham mais contactos com os nossos militares, mas não onde se realizaram [os anteriores] mais um em Canchungo e um em Pelundo.

Dizem que os nossos militares não cumpriram os preceitos de honra militar. Mas que eles cumprirão no futuro os deveres de honra militar. Eles afirmam que querem o fim da guerra. Também as populações de certas zonas (Mansoa, por exemplo) estão bastante influenciadas pela realidade, pela utilização de novas armas. Dizem por exemplo: "agora, mama acabou" (querendo significar que já não há protecção junto dos tugas nas cidades). Apelo aos camaradas para terem iniciativas, pensarem profundamente nos problemas, criarem, conhecerem bem cada um dos seus homens.
Anuncio os problemas que vão a seguir ser discutidos (ordem de trabalhos).
[…]
Fonte:

Citação:
(1970-1970), "Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry". CasaComum.org, Disponível http:htrp://hdl.handle.net/11002/fms_dc_34125.

Instituição:
Fundação Mário Soares
Pasta: 07073.129.004
Título: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra em Conakry
Assunto: Acta informal das reuniões do Conselho de Guerra, em 11 e 13 de Maio de 1970, manuscrita por Vasco Cabral.
Membros Presentes: Amílcar Cabral, Aristides Pereira, Luís Cabral, João Bernardo Vieira (Nino), Osvaldo Vieira, Francisco Mendes, Pedro Pires, Paulo Correia, Mamadu N'Djai [Indjai], Osvaldo Silva, Suleimane N'Djai.
Secretário: Vasco Cabral.
Data: Segunda, 11 de Maio de 1970 – Quarta, 13 de Maio de 1970.
Observações: Doc incluído no dossier intitulado Relatórios: 1960-1970.
Fundo: DAC – Documentos Amílcar Cabral.
Tipo Documental: ACTAS


Obrigado pela atenção.
Um forte abraço de amizade (virtual)… e votos de muita saúde em tempo de "clausura"
Jorge Araújo.
21ABR2020.
_______________

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20879: In Memoriam (364): Dos sete militares chacinados pelo PAIGC no “Chão Manjaco”, mártires da sua fé na autodeterminação e na consagração do direito do Povo da Guiné- Bissau ao poder (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav)

1. Em mensagem do dia 17 de Abril de 2020, o nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil Cav da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66) traz-nos à lembrança o Massacre dos Três Majores no Chão Manjaco  ocorrido há precisamente 50 anos.


IN MEMORIAM

Dos sete militares chacinados pelo PAIGC no “Chão Manjaco”, mártires da sua fé na autodeterminação e na consagração do direito do Povo da Guiné- Bissau ao poder.

Em 16 de Abril de 1970, o Governador e Comandante-Chefe General António de Spínola reuniu em Bissau cerca de 400 oficiais do CTIG (Comando Territorial Independente da Guiné), capitães do mato na sua maioria, para directivas e anúncio do “fim da guerra” – o fim do seu sonho louco, de sentar Amílcar Cabral no Palácio cor-de-rosa da Praça do Império, em Bissau, investido das funções de Secretário-Geral (Chefe do Governo) da Guiné, a oportunidade para o Capitão Vasco Lourenço, Comandante da CCaç 2549, na quadrícula de Cuntima, revelar a sua verve conspiratória e, também, o momento em que ele o tomou de ponta, com a inspecção ao seu comando, 15 dias depois, circunstância que ajudará à emergência do MFA (Movimento das Forças Armadas) e às suas consequências.

No entendimento do General Spínola, o “fim da guerra” da Guiné começara no Norte, pela transumância das FARP do comando do PAIGC o comando do Exército Português, trabalhada pela PIDE e manobrada pela nata dos oficiais do seu Estado-Maior, os malogrados Majores Magalhães Osório, Passos Ramos e Pereira da Silva, extensiva às restantes, por efeito sistémico, a começar pelas do Sul.


Para Amílcar Cabral e seus pares cabo-verdianos, a ideia spinolista do “fim da guerra” presenteou-os com a oportunidade de lhe aprontar a cilada da sua liquidação física (já recorrente, afirmará Nino Vieira), sob a superintendência do Comandante Pedro Pires, do Conselho Superior de Luta, manobrada por Quintino Vieira e Luís Correia, responsáveis da pide paigcista na região e na zona Norte, comandada pelo corajoso André Gomes, ora membro do Comité Executivo, que havia sido condecorado com a medalha da “Estrela Negra”, pelo seu êxito no ataque do aeroporto de Bissalanca com morteiros de 82, em 1968, e que o ex-milícia Braima Camará, implacável comandante militar da zona Norte, executou mas não consumou, pela falta de comparência do General Spínola.

O Comandante-Chefe surpreendera o seu 9.º encontro com a sua presença, abraçara o Quintino e o André, mostrou grande satisfação em corresponder à continência deste, o caso teve o seu desenvolvimento, foram aprazados o 10.º encontro, o dia D e a hora H para a renegação, com uma última condição pelos renegados: Só se renderiam ao Comandante-Chefe, com o seu armamento, mas ele e a sua escolta teriam de comparecer desarmados…

Pelas 16H00 do dia 20 de Abril de 1970, aqueles três Majores, o Alferes Miliciano Ranger Palmeiro Mosca, os naturais e milícias 1.º Cabo Patrão da Costa, condutor, Aliú Sissé e Mamadu Lamine, guias, todos inermes, compareceram no ponto de encontro, junto aos destroços duma autometralhadora Daimler, na estrada Pelundo-Jolmete, foram logo assassinados a rajadas de metralhadoras, cobardemente, e os seus corpos esquartejados à catanada, criminosamente.

“Sacrifício das vidas para nada” – últimas palavras do Major Pereira da Silva, o operacional daquela manobra.

Enquanto no seu tempo, o Major Teixeira Pinto era o “Capitão Diabo”, no tempo General Spínola, a Guiné era a “Spinolândia”, e nem sempre este terá estado à altura daquele seu predecessor.

Meio século antes, os antepassados manjacos da mesma região massacraram a pequena força portuguesa que construía um pontão, refugiaram-se no Senegal, Teixeira Pinto disfarçou-se de comerciante, fez o reconhecimento a todos, comandou a patrulha que os foi catar, cuidou de negociar a paz com a autoridade gentílica, mas vitorioso.

Terá havido um Alto-Comando para a Guerra da Guiné? Não obstante as evidências do aventureirismo militar, do grau de temeridade dessa operação e da tragédia do seu resultado, por se ter subestimado a “natureza substantiva” do IN, o Comandante-Chefe da Guiné não só não foi demitido, como a recorrência lhe será permitida, com a “vendeta” a Conacri, que serviu para projectar o prestígio do PAIGC e acelerar a internacionalização da sua guerra.

O “massa dos majores” e o quase falhanço do assalto a Conacri evidenciaram a mediocridade atávica da PIDE, como agência de informações para acções militares. 

Manuel Luís Lomba
____________

Nota do editor

Último poste da série de 3 de abril de 2020 > Guiné 61/74 - P20807: In Memoriam (363): Coronel Luís Fernando de ANDRADE MOURA (6-5-1933 - 23-3-2020), notável soldado da Pátria e da Democracia (Manuel Luís Lomba)

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Guiné 61/74 - P20557: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XXXIII: Joaquim Pereira da Silva, maj art (Galegos, Penafiel, 1931 - Pelundo / Jolmete, Guiné, 1970)




1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais, oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975, na guerra do ultramar ou guerra colonial (em África e na Ásia). (*)

Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva [, foto atual à esquerda], membro da nossa Tabanca Grande [, tendo sido, no CTIG, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972 ]




Penafiel > Galegos > Novembro de 2006 > Jazigo da família Pereira da Silva > A urna, coberta com a bandeira nacional, contendo os restos mortais de Joaquim Pereira da Silva, um dos três majores que morreram em 20 de Abril de 1970, na sequência da Operação Chão Manjaco. [Vd. poste P1500, de 6 de fevereiro de 2007 (**)].

Foto (e legenda): © Afonso M. F. Sousa (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

2. Sobre a tragédia do Chão Manjaco (em que foram barbaramente assassinados pelo PAIGC, em Jolmete, em 20 de abril de 1970, três oficiais superiores, um alferes miliciano, dois condutores de jipe e um tradutor, nativos, todos desarmados), temos dezenas de referências no nosso blogue. Ver em especial:

Três majores
Major Magalhães Osório
Major Passos Ramos
Major Pereira da Silva

(**) Vd. poste de 6 de fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1500: Dossiê O Massacre do Chão Manjaco (Afonso M.F. Sousa) (5): Homenagem ao Ten-Cor J. Pereira da Silva (Galegos, Penafiel)

quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Guiné 61/74 - P20418: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XXXII: Alberto Fernão Magalhães Sousa Osório, maj inf (Celorico da Beira, 1930 - Pelundo/Jolmete, Guiné, 1970)







1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais, oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975, na guerra do ultramar ou guerra colonial (em África e na Ásia). (*)


Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva [, foto atual à esquerda], membro da nossa Tabanca Grande [, tendo sido, no CTIG, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972 ]


2. Sobre a tragédia do Chão Manjaco (em que foram barbaramente assassinados pelo PAIGC, em Jolmete, em 20 de abril de 1970,  três oficiais superiores, um alferes miliciano,  dois condutores de jipe e um tradutor, nativos, todos desarmados), temos dezenas de referências no nosso blogue. Ver em especial:



Guiné > Região do Cacheu > Pelundo >  CCAÇ 2585/BCAÇ 2884 (Jolmete, Pelundo e Teixeira Pinto, 1969/71). c. 1969/70 > Visita de Spinola (é o terceiro, de costas)... Em primeiro plano,o major inf Magalhães Osório, oficial de operações do CAOP, mais tarde CAOP1. Esta foto foi tirada pelo Manuel Resende na inauguração da célebre estrada alcatroada Có - Pelundo: ele nessa altura  estava com baixa médica, no Pelundo, sendo o seu lugar era em Jolmete.
Foto gentilmente cedida pelo nosso camarada Manuel Resende (ex-alf mil da CCaç 2585/BCaç 2884, Jolmete, Pelundo e Teixeira Pinto, 1969/71), régulo da Magnífica Tabanca da Linha. (**)

Foto (e legenda): © Manuel Resende (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 1 de dezembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20402: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XXXI: Luís Filipe Rei Vilar (Cascais, 1941 - Susana, região de Cacheu, Guiné, 1970)

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P18988: Blogues da nossa blogosfera (103): "Memórias de Jolmete", de Manuel Resende: Cajan Seidi, o atual régulo de Jolmete, neto de Cambanque Seidi, o régulo de Jol que, em 1964, foi uma das cerca de 20 vítimas de represálias das NT (Manuel Resende / Eduardo Moutinho Santos)


Guiné-Bissau > 2017 > Moutinho dos Santos com Cajan Seidi, a quem convidou para  ir almoçar em Canchungo (ex-Teixeira Pinto).


Guiné-Bissau > 2017 > Moutinho dos Santos e o Fernandino Leite  com a Amélia,  a 3ª mulher de Cajan Seidi, e com os seus filhos,  em Jolmete.

Fotos (e legendas): © Eduardo Moutinho Santos / Manuel Resende (2018) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Blogue Memórias de Jomete > 30 de agosto de 2018 > Post nº 76 - Cajan, Régulo de Jolmete (*)

Manuel [Cármine] Resende [Ferreira] [, foto à direita,]
ex-alf mil art,  CCAÇ 2585 / BCAÇ 2884,
Jolmete, Pelundo, Teixeira Pinto
(, maio 69/mar 71)

Nota informativa para quem não se lembra: 

Moutinho dos Santos era alferes da Companhia que esteve antes de nós em Jolmete, a CCAÇ 2366. Era a Companhia do sr. capitão Barbeites. Depois de sair de Jolmete em 28 de maio de 1969 (, dia em que ficámos por nossa conta, e logo com um grave acidente com a bazuca do 1º cabo Brotas), tal como mais tarde o nosso alferes Almendra, foi graduado em capitão pelo sr. general Spínola e a Companhia foi para Quinhamel, gozar “férias”, mas ele, como capitão, teve que ir comandar outra Companhia no Sul [, CCAÇ 2381]. Presentemente exerce advocacia no Porto e é um excelente elemento [, um dos régulos,] da Tabanca Pequena de Matosinhos, com várias idas à Guiné para entrega de bens.


[Eduardo Moutinho Santos, ex-alf mil, CCAÇ 2366 (Jolmete e Quinhámel) e cap mil grad. cmdt da CCAÇ 2381 (Buba, Quebo, Mampatá e Empada); foto à esquerda]


Pergunto eu a Moutinho dos Santos:

“Amigo Moutinho Santos, recentemente estive com o Marques Pereira, alferes da minha Companhia, a 2585,  que vos sucedeu. Presentemente vive em Moçambique, e veio cá. Mostrei-lhe fotos do Cajan e disse-lhe que o Cajan tem um filho médico no Hospital de Santo António, creio que foste tu que me deste essa informação. Sabes quem é a mãe? perguntou ele, será a Maria Sábado, do nosso tempo ?.... Sabes alguma coisa dele, ou contactos... “ (*)


Resposta de Moutinho dos Santos:

Olá, Resende.

De facto, o Cajan Seidi, soldado milícia do Pelotão de Milícias de Djolmete, que "alinhou" connosco, e convosco, nas matas do Djol, tem em Portugal, mais especificamente no Porto, um "filho" médico, o dr. Jorge Seidi (conhecido entre os amigos por Jorgito). Ele faz parte das equipas de Urgências do Hospital de Santo António, penso que como contratado de uma empresa de "manpower" que presta serviços aos hospitais do Porto. Pus a palavra filho entre aspas, pois, na verdade ele não é filho biológico do Cajan, mas sim sobrinho.

Como sabes, segundo as "leis" da etnia manjaca, e de outras etnias da Guiné, em que os sobrinhos e primos também são considerados "filhos" quando vivem todos na mesma morança, o irmão que herda a "posição" (sucede no cargo) de outro irmão mais velho, também "herda" a mulher e os filhos do irmão. Com o Cajan sucedeu isso.

O avô do Cajan, de nome Cambanque Seidi, régulo do Djol, tinha vários filhos, sendo um deles o pai do Cajan, de nome Domingos, que foi morto pelo PAIGC logo no início da luta pela independência. O avô, ao tempo régulo, foi um dos mortos na "chacina" praticada em 1964 pelas NT contra os homens grandes da tabanca de Djolmete e outras do regulado.

Este "assunto" consta de um Post do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, ali colocado por um Furriel [, António Medina,] de uma companhia [, CART  527,] da guarnição de Bula / Teixeira Pinto em 1964, antigo combatente que emigrou para os USA (**)... O Cajan teria nesta data 15/16 anos...

[Foto à esquerda: Antonio Medina, ex-fur mil inf, CART 527, Teixeira Pinto, Bachile, CalequisseCacheu,Pelundo, Jolmete e Caió, 1963/65; natural de Santo Antão, Cabo Verde, foi funcionário do BNU, Bissau, de 1967 a 1974; vive hoje nos EUA desde 1980; tem dupla nacionalidade, portuguesa e norte-americana; é nosso grã-tabanqueiro desde 1/2/2014]

Este "assunto", a que ninguém se referia quando estivemos em Djolmete, e também nunca falado anteriormente quer pelo nosso Exército quer mesmo pelo PAIGC, foi-me confirmado pelo Cajan e por dois dos seus "filhos" que, inclusive, na última visita (2017) que fiz a Djolmete,  quiseram indicar-me o local onde foram enterrados, em "vala comum", muito perto do sítio onde os nossos 3 majores foram mortos em 1970...

Como o Cajan era o neto sobrevivo mais velho do régulo, veio a "herdar" o cargo do avô, pois o irmão/primo a quem tal cargo pertenceria já tinha falecido, deixando viúva a Quinta e o filho Jorge que - na altura em que estivemos em Djolmete - estaria à guarda de um tio em Dakar (Senegal) e internado numa Missão Católica. Oficialmente ninguém se referiu - que eu saiba - ao cargo do Cajan durante a nossa estadia em Djolmete.

Assim, o Cajan com o cargo de régulo do Djol, herdou como 1ª mulher a cunhada, de nome Quinta - que vivia em Djolmete ao tempo em que nós por lá estivemos -, de quem veio a ter mais 3 filhos (Joãozinho, falecido, Minguito e Melita, médica em Bissau). Actualmente está em Portugal com o filho,  dr. Jorge. O Cajan tem mais 4 mulheres... e 25 filhos ao todo...

A segunda mulher do Cajan é a Maria Sábado - nossa conhecida - de quem o Cajan tem vários filhos (um deles o Fidalgo que é professor e director da Escola E/B de Canchungo, ex-Teixeira Pinto).

A terceira mulher do Cajan é a nossa conhecida Amélia, de quem o Cajan tem 6 filhos (vários deles a viver em Bissau).

A quarta mulher do Cajan é a Emília de quem o Cajan tem vários filhos. 

Por fim, a quinta mulher, ainda muito nova, de nome Maria, também tem já filhos...

Para o ano, se tudo correr bem, se houver "patacão"  e a saúde ajudar, tenciono voltar à Guiné-Bissau e a Djolmete para, com a Tabanca Pequena de Matosinhos, fazermos a instalação de um poço artesiano, pois, os poços tradicionais que a ACNUR abriu na Tabanca de Djolmete, quando serviu de Campo de Refugiados dos independentistas do Casamance, secaram todos e a população (3.000 habitantes), que só tem uma hora de água por dia do poço do Centro de Saúde, voltou a ter de ir buscar a água à bolanha...

Depois falamos sobre este assunto.

Um abraço,
Eduardo Moutinho Santos

[Reproduzido com a devida vénia. Revisão  e fixação de texto: Blogue Luís Graça & Camarads da Guiné] 
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Notas do editor:

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17917: Notas de leitura (1009): “A PIDE no Xadrez Africano, Conversas com o Inspetor Fragoso Allas”, por María José Tíscar; Edições Colibri, 2017 (1) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Outubro de 2017:

Queridos amigos,

Há alguns anos atrás, por entreposta pessoa, pedi para conversar com António Fragoso Allas, anunciei previamente a questão primordial para o encontro: as eventuais ligações da PIDE/DGS com o assassinato de Amílcar Cabral. Almoçámos em Algés, numa atmosfera de grande amenidade e saí desse encontro com a garantia de que não houvera um mínimo de envolvimento da polícia política no conflito que separava abissalmente guinéus e cabo-verdianos.
Perguntei a Fragoso Allas por que não escrevia tão importantes memórias e tais aspetos clarificadores. Disse-me que mais tarde ou mais cedo tudo iria aparecer numa entrevista.
Como acaba de acontecer.

Um abraço do
Mário


De leitura obrigatória: o diretor da PIDE/DGS na Guiné, no tempo de Spínola, na primeira pessoa (1)

Beja Santos

“A PIDE no Xadrez Africano, Conversas com o Inspetor Fragoso Allas”, por María José Tíscar, Edições Colibri, 2017, é um documento impressionante, uma investigação de altíssima qualidade, um frente a frente entre uma investigadora de mérito, com obra consagrada, e um inspetor da PIDE/DGS que percorreu os diferentes territórios coloniais em guerra. Entrevista vastíssima, abrangente, abarcando as questões mais controversas desde a Operação Mar Verde até ao assassinato de Amílcar Cabral. Fragoso Allas vai para a Guiné substituir Matos Rodrigues com quem Spínola se incompatibilizara, chegara mesmo a pensar prendê-lo, ameaçara também suprimir a delegação da PIDE/DGS em Bissau se não ocorresse a sua substituição. A pressão é feita a seguir ao insucesso da invasão de Conacri, Allas só toma conta do lugar em meados de 1971.

Deixa bem claro que nunca recebeu diretivas de Lisboa por parte da PIDE/DGS, recebeu instruções muito genéricas do Ministério do Ultramar. Porquê a animosidade de Spínola, que queria terminar com a DGS na Guiné? Allas responde:

“Eu não sei com certeza, mas presumo que o jornal deve ter sabido que a DGS da Guiné fazia relatórios que enviava para Lisboa, dos quais não dava conhecimento ao governador. O General Spínola em várias ocasiões tem falado em desentendimentos importantes com a PIDE/DGS”.

Spínola pretendia que Allas aderisse ao seu projeto “Por uma Guiné Melhor”, e decidiu que ele passaria a assistir ao briefing diário na Amura, o que veio a acontecer. Allas refere as suas primeiras ações na Guiné logo o assassinato de um tenente senegalês por um capitão português, sublinha a recetividade da política da Guiné melhor, o programa da africanização das tropas, e emite parecer sobre a morte dos três majores, em Abril de 1970, dizendo:

“As mortes terão sido executadas por indivíduos vindos de Conacri para o efeito e, pelo menos, os chefes guinéus envolvidos nas negociações terão sido fuzilados. O assassinato dos majores produziu um maior desentendimento entre os guineenses e os cabo-verdianos porque eram guineenses os que estavam a negociar o regresso dos guerrilheiros à revelia dos comandos do PAIGC. Foram denunciadas as conversas com os militares portugueses, o comando do PAIGC mandou matar os majores e depois fuzilar os chefes dos guerrilheiros envolvidos na negociação”.

A sua grande preocupação era montar uma rede de informadores na Guiné, depois de ter avaliado a situação, reorganizou o gabinete do centro de cifra, seguiu-se a rede de informadores, os postos mais importantes da DGS estavam perto do Senegal, era o caso de Pirada, Bigene e Guidage, para a Guiné Conacri só havia o posto de Buruntuma. Explica a importância de Pirada:

“Estava localizado mesmo junto à fronteira com o Senegal. O posto estava dentro da casa de um comerciante. O agente da DGS ali colocado vivia dentro da casa do tal comerciante. Mas o que sucedia na prática era que o comerciante era mais agente da DGS que o próprio agente; 90% das vezes era o comerciante que atendia o rádio. Converteu-se num agente duplo. O comerciante chamava-se Mário Soares. Era habilidoso, tinha boas relações com as autoridades portuguesas e tinha bons contactos, também, com as do Senegal. Teve atuações muito importantes para nós. O Mário Soares era útil como agente de contrainformação. Quando queríamos enviar informações falsas ao PAIGC dizíamos-lhe que era muito secreto e então ele ia logo transmiti-las. As informações que ele fornecia sobre o PAIGC quase não serviam, porque nós sabíamos que ele também trabalhava para eles. Quando cheguei à Guiné, o General Spínola estava muito zangado com ele e queria mesmo expulsá-lo da província, mas isso não seria conveniente porque o posto da PIDE estava dentro da sua casa, pelo que me interessei para que ele continuasse na sua atividade”.

Fala-se de outro comerciante que também prestava informações à PIDE, Rodrigo Fernandes Rendeiro.

A conversa desliza para a infiltração do PAIGC. A rede interna era constituída por informadores e alguns dissidentes. Explica que uns por dinheiro, outros por frustração e despeito com o PAIGC. Eram 20 infiltrados. Não havia em Conacri informadores da DGS:

“Eram os nossos homens de ligação que falavam com elementos da estrutura do PAIGC em Conacri e davam-nos as informações. Aproveitavam-se as dissensões já existentes entre guinéus e cabo-verdianos, os maiores colaboradores eram de etnia Fula. Explica que Inocêncio Cani, tal como Momo Turé, nunca foram colaboradores da DGS, todos os documentos que referem nomes como Aristides Barbosa, Mamadu Turé e outros mais são documentos falsificados. Refere e incompatibilidade entre Rafael Barbosa e Amílcar Cabral. Fragoso Allas diz que nunca subornou Rafael Barbosa. Adianta que havia contactos com Nino Vieira: “Não era um contacto direto, eu nunca falei com ele, tinha pessoas que falavam com ele. Tentava-se trazer de volta. Ele tinha interesse em voltar mas tinha um problema: tinha sido condenado por crime penal e tinha fugido. Aquilo que estava a negociar connosco era voltar, mas não vir para a prisão. Esta ação era tratada através de mensageiros”.

A rede de informações de Fragoso Allas assentava primordialmente em djilas. Aliás, quando o jornalista José Pedro Castanheira consultou os arquivos da PIDE em Bissau à procura de conexões entre a polícia política e os assassinos de Amílcar Cabral não encontrou qualquer documento mas descobriu diversos relatórios de djilas que se movimentavam com grande facilidade sobretudo no Senegal. Com a Guiné Conacri era diferente:

“Havia indivíduos do PAIGC na Guiné Conacri que vinham à Guiné Portuguesa visitar as famílias e diziam que estavam cansados de estar lá. Se depois a família viesse dizer que se tinham apresentado não os prendíamos, mas aproveitava-se o contacto através da família para os captar”.

Afloram-se os contactos com a oposição a Sékou Touré, o agente Marcelo Almeida, os grupos especiais da DGS (GE/DGS), e os esforços para o estabelecimento de contatos com o Senegal. A conversa agora inflete para os encontros de Cap Skirring, Fragoso Allas pretende corrigir que só houve duas reuniões e não três, que nunca se falou em Amílcar Cabral nem em nenhuma hipotética entrevista entre este e Spínola, e antes de abordar o assassinato de Amílcar Cabral faz alusão à proposta feita ao Coronel Vaz Antunes pelo agente “Padre”:

Era já na fase em que os guinéus se recusavam a combater, em Junho de 1973. Em consequência havia umas centenas de guerrilheiros guinéus do PAIGC que se queriam entregar e com os quais foi estabelecido contacto em Farim, na fronteira, através do referido agente”.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 27 de Outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17908: Notas de leitura (1008): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (6) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Guiné 63/74 - P16321: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (51): Os portugueses tiveram tendência para menosprezar o PAIGC, antes e depois da guerra... Recordando uma cilada dos "homens do mato" aos homens grandes de Sancorlã/Cambaju, ao tempo da CCAÇ 412, Bafatá, 1963/65



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Regulado de Sancorlã > Cambaju > A família reunida em Cambaju, ano de 1965/66 > Em cima: Mãe (Cadi Candé), pai (Aliu Tamba Baldé) e Aua (prima irmã). Em baixo: Tulai (minha irmã), Eu (de boina verde), Carlos (hoje médico) e Aissatu (irmã da Aua). Esta foto foi tirada por um soldado português amigo da família. (*)




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Fajonquito > 1991 > Festa de Ramadão  > El-Hadj Aliu Baldé (Tamba), o pai do Cherno > Em 1937 fez parte do grupo de jovens que saiu de Canhamina para Contuboel para receber e homenagear os combatentes de Sancorlã que participaram na última guerra de Canhabaque (Ilhas Bijagós)... 

[Em rigor, foi uma expedição punitiva, contra os bijagós que se recusavm a pagar o "imposto de palhota", também conhecida por "quarta e última campanha de Canhabaque", decorrendo de 10 de novembro de 1935 a 20 de fevereiro de 1936... O pai do Cherno faleceu  em Bissau em setembro de 1999, porvavelmente com 80 anos.  Recorde-se aqui que El Hadj  é um título honorífico reservado ao crente muçulmano que, em vida, consegue ter a felidadade de fazer, com sucesso, pelo menos uma  peregrinação anual,  Hajj,  a Meca (LG)



Guiné-Bissau > Bissau > Maio de 1977 > Eu e a minha mãe (*) [Em 2011 ainda viva, embora já cega... O Chern fala dela com uma imensa ternura... Teria 80 anos de idade: disse ao filho que, por volta de 1936/37, quando o pai voltou de Canhabaque, a última batalha da "campanha de pacificação",  ela teria aproximadamente 9/10 anos de idade. (LG)]


Fotos (e legendas): © Cherno Baldé (2011). Todos os direitos reservados [Edição do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Comentário de Cherno Baldé ao poste P16317 (**):


Caros amigos JDinis e MLLomba,

Aproveito esta abertura para apresentar um exemplo típico de acontecimentos que foram reais, mas que, na altura devida, não mereceram a atenção devida dos portugueses e foi assim:

Em meados de 1964/5, salvo erro, como nos contaram (***), os elementos da guerrilha que actuavam na zona Norte (eixo Cuntima-Sitato-Cambaju), confrontados com a forte resistência do regulado de Sancorlã,  apoiado por um pelotão de metropolitanos de uma companhia sediada em Bafatá (penso que a companhia do Alcídio Marinho, CCAC 412,  Bafatá, 1963/65), contactaram os grandes de Cambaju e solicitaram um encontro para conversações "entre irmãos", longe dos olhares dos brancos.  Na realidade era uma cilada.

No dia combinado, os grandes de Sancorlã desconfiados, no lugar dos homens grandes e dos régulos, resolveram enviar os filhos mais velhos para negociar, divididos em dois grupos. O primeiro grupo ia preparado para as conversações, mas na retaguarda ia um segundo grupo discretamente armado para o que desse e viesse.

Antes de chegar ao local combinado,  o primeiro grupo caiu numa emboscada dos homens do mato que sem pré-aviso abriram fogo, matando duas pessoas e ferindo outras. Nao fosse a pronta intervenção dos homens da retaguarda, provavelmente, seriam todos chacinados.

Todavia, os portugueses não tiraram as devidas ilações deste acontecimento macabro, na primeira fase da guerra,  talvez porque os mortos eram civis armados e nativos guineenses ou por outras razões que nunca saberemos,  e não se tomaram as medidas que se impunham para que não viesse a repetir-se.

E, pasmem-se, esta mesma estratégia seria utilizada alguns anos mais tarde (1970) no chão manjaco, no que ficou conhecido como a tragédia dos 3 Majores, talvez o crime que mais abalou os portugueses e a sua cúpula dirigente na Guerra da Guiné e a retaliação não se faria esperar com a invasão de Conakri, em Novembro do mesmo ano.

Para terminar, acho que, muitas vezes houve tendência de menosprezar o PAIGC e as suas forças, antes e depois da Guerra, quando, na minha opinião, devia de ser tudo ao contrário.

Um abraço amigo,

Cherno AB

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Notas do editor:



(***) 31 de dezembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15556: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (50): Na minha língua materna, o fula, não existe a expressão "Feliz Natal"... Mas felizmente que a Guiné-Bissau é um país de tolerância religiosa, em que as duas religiões monoteístas, Islamismo e Cristianismo, coexistem bem com o animismo

terça-feira, 17 de maio de 2016

Guiné 63/74 - P16101: Efemérides (226): Dia 20 de Abril de 2016, triste aniversário; 46 anos se passaram sobre o assassinato do Chão Manjaco (Manuel Resende, ex-Alf Mil da CCAÇ 2585)



Pelundo - Major Osório em primeiro plano


Pelundo - Major Passos Ramos, o primeiro à esquerda; Major Osório,
último à direita e de costas



Alferes Mosca em primeiro plano ajudando na preparação da ceia de Natal de 1969

Fotos (e legendas): © Manuel Resende (Ferreira) (2016).


1. Mensagem do nosso camarada Manuel Resende (ex-alf mil da CCaç 2585/BCaç 2884, Jolmete, Pelundo e Teixeira Pinto, 1969/71), com data de 20 de Abril de 2016, a propósito da passagem do 46.º aniversário do assassinato dos Majores PASSOS RAMOS, MAGALHÃES OSÓRIO, PEREIRA DA SILVA; Alferes Miliciano JOÃO MOSCA; dois condutores e um tradutor, no Chão Manjaco, no dia 20 de Abril de 1970.




Triste Aniversário

Caros amigos e camaradas
Hoje é o dia 20 de Abril. Por acaso alguém se lembra do que aconteceu no dia 20 de Abril de 1970 em Jolmete, precisamente há 46 anos?

Neste dia não houve saída para o mato, não saímos do quartel nem para caçar. Achámos estranho, mas o nosso Capitão Almendra disse aos Oficiais, não sei se a mais alguém, talvez ao Dandi, depois do almoço, que se estava a passar algo de anormal.

Nesse dia iria acontecer uma reunião (a última) para a pacificação do “Chão Manjaco”, entre os chefes do PAIGC e os OFICIAIS do CAOP, num local junto à primeira bolanha a contar do Pelundo para Jolmete, a cerca de 4-5 Kms do Pelundo.
Essa reunião destinava-se a integrar todo o pessoal do PAIGC pelos aquartelamentos da zona, como já estava combinado em reuniões anteriores.

No dia anterior, Domingo 19, o CAOP esteve em Bula, e ao jantar, o Sr. Major Pereira da Silva recebeu um telefonema, presume-se de Bissau, dizendo que um tal “LUIS” iria estar presente na reunião no dia seguinte. Segundo o que me lembro dos comentários da altura, diziam que ele ficou cabisbaixo, mudo e pensativo, ... devido à presença inesperada dessa pessoa.

Estavam previstos 5 jipes (isto é o que me lembro da altura dos acontecimentos), mas ficaram reduzidos a três, pois o Sr. Major Pereira da Silva, que superintendia o assunto, não autorizou os outros a serem “martirizados”. Lembro-me de ouvir dizer que o nosso Capelão, Padre António Gameiro queria ir, mas não foi autorizado. Eu tinha a impressão que o nosso médico Dr. Diniz Calado, também queria ir, mas ainda há poucos meses estive com ele, abordei o assunto e o próprio disse-me “que nunca essa hipótese foi colocada, não queria participar em aventuras dessas”.

Bom, o local foi alterado para a segunda bolanha, a 5 Kms de Jolmete. Porquê? Como lá foram parar, cerca de 8 Kms mais a norte, mais próximos de Jolmete?

Devo confirmar que ouvi alguns tiros por volta das 3 da tarde (e muitas outras pessoas também ouviram). Foi muito comentado, pois nesse dia estávamos proibidos de “fazer fogo”, nem a caçar.

Foram barbaramente assassinados pois estavam desarmados:

Major PASSOS RAMOS
Major MAGALHÃES OSÓRIO
Major PEREIRA DA SILVA
Alferes JOÃO MOSCA
Nativo MAMADÚ LAMINE 
Nativo ALIÚ SISSÉ 
Nativo PATRÃO DA COSTA 

OBS: Os nativos eram dois condutores dos jipes e um tradutor.

Não é meu interesse aqui entrar em pormenores, pois apenas quero lembrar a memória destes Oficiais, que devem figurar em todos os escritos com letra maiúscula.

Junto algumas fotos tiradas por mim, lamento não ter nenhuma do Sr. Major Pereira da Silva.

Manuel Cármine Resende Ferreira
Alf. Mil. Art. em Jolmete (Pelundo – Teixeira Pinto)
CCAÇ 2585 – BCAÇ 2884

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2. Comentário do co-editor CV

São devidas desculpas ao Manuel Resende por só hoje estarmos a dar conta desta triste efeméride mas, como este assunto é por demais marcante na história da guerra da Guiné, qualquer dia é próprio para se falar dele.

Quanto a mim, não esqueço esta data porque foi o dia em que nos apresentámos, na Parada do Depósito de Adidos, ao General Spínola. A 21 seguiríamos para Mansabá para uma longa estadia, ali, que só terminaria a 23 de Fevereiro de 1972.

Temos mais de meia centenas de referência a este trágico episódio; Três majores | Alferes Mosca | Chão manjaco
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Nota do editor