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domingo, 1 de janeiro de 2023

Guiné 61/74 - P23936: Mi querido blog, por qué no te callas?! (9): O nosso blogue à lupa dos lentes de Coimbra... Pequeno resumo da tese de doutoramento de Verónica Ferreira que nos caracteriza assim, em entrevista à Lusa: (i) uma espécie de comunidade de antigos combatentes à procura de um sentido para a participação na guerra colonial; (ii) com um lado nostálgico de partilha de memórias, mas também de revolta pelo sacrifício inútil e não reconhecido; (iii) com um postura defensiva e uma visão algo lusotropicalista do conflito; e (iv) onde há muitos "pequenos silêncios" e alguns tabus


Uma das imagens ícones (e mais plagiadas) do nosso blogue: o 2º Gr Comb da CCAÇ 12, 1969/71, no subsetor do Xitole do setor L1, Bambadinca, a atravessar uma lala.

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados.

[Edição e legendagem : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Antigos combatentes criam sentido de comunidade 
em blogues e Facebook, revela estudo

29-12-2022 11:22 | Porto Canal  / Agências (com  a devia vénia...)

Uma investigadora da Universidade de Coimbra analisou a participação em blogues e em grupos de Facebook de antigos combatentes na Guerra Colonial, espaços onde estes homens criam um sentido de comunidade, mesmo que com “silêncios” sobre aquele período.

O tema foi objeto de estudo da tese de doutoramento de Verónica Ferreira, investigadora do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, no âmbito do projeto de investigação CROME, que tem como objetivo fazer uma história da memória das guerras coloniais e de libertação combatidas entre o Estado português e os movimentos independentistas africanos.

O doutoramento centrou-se nas narrativas dos antigos combatentes em blogues (com especial foco para o maior blogue de veteranos, “Luís Graça & Camaradas da Guiné”) e em grupos da rede social Facebook.

Para Verónica Ferreira, a presença dos antigos combatentes em meios digitais espelha a necessidade dos próprios de “formarem uma espécie de comunidade”, de falarem das suas experiências passadas e de lhes darem um sentido.

Apesar de no Facebook e nos blogues a construção de narrativas ser diferente (nos blogues, há uma maior diversidade de relatos, enquanto o Facebook aparece como uma espécie de fórum), há “linhas narrativas transversais”, disse à agência Lusa a investigadora.

Verónica Ferreira nota que, para lá daquilo que é partilhado, das histórias ou experiências, é importante perceber “quais os silêncios que existem”.

“É preciso perceber a história da qual não se fala. Aquilo que se fala é sobretudo de um sentimento de revolta, por não haver reconhecimento do Estado do sacrifício dos combatentes. O silêncio surge em relação à violência perpetrada”, constatou, dando ainda conta de outros “pequenos silêncios”, como a homossexualidade, que não é falada, ao contrário de temas difíceis que acabam por ser abordados como a deserção ou filhos que foram deixados lá.

Segundo a investigadora, a violência cometida na guerra é evitada nos relatos que são partilhados e, no caso da relação com mulheres durante o período em que foram mobilizados, o assunto é “abordado de forma coloquial, em linguagem de caserna, nunca se analisando a violência por de trás dessas relações”.

Para Verónica Ferreira, “há uma postura defensiva” nos antigos combatentes, mesmo que não exista uma “narrativa homogénea”.

“Existem muitos combatentes, com contextos diferentes, com posições ideológicas diferentes, mas há uma linguagem defensiva, mesmo em relação àqueles que se posicionam de forma crítica, porque há sempre uma tentativa de justificar a participação” na Guerra Colonial, vincou.

Para a investigadora, que para além de análise dos blogues e grupos de Facebook também entrevistou colaboradores do blogue “Luís Graça”, há uma “perspetiva de legitimação da guerra”.

“Foram pessoas que viveram a guerra e têm que encontrar algum sentido para aquilo que viveram. Há uma tentativa de encontrar uma linha coerente para contar uma história de vida, que os satisfaça e que faça sentido”, notou.

Para além dessa postura defensiva, há também um lado nostálgico de contar as suas vivências, de reencontrar camaradas e de abordar as memórias de um momento em que “foram protagonistas da História”.

Se o diálogo entre antigos combatentes é sobretudo cordial, surgem, mesmo assim algumas tensões, que acabam por resvalar mais no Facebook, onde “é um pouco mais visível uma secção mais conservadora dos combatentes”.

Para Verónica Ferreira, apesar de ter havido sempre um esforço da extrema-direita para tentar cooptar os antigos combatentes, “nunca foi bem-sucedido”.

Essas tentativas são visíveis no Facebook, havendo inclusive um grupo ligado ao partido Ergue-te (antigo PNR), mas a cooptação “não parece que tenha sido bem-sucedida”, constatou.

Ao mesmo tempo, quer no Facebook quer nos blogues, a visão da Guerra Colonial é uma visão “lusotropicalista”, que olha de forma benevolente para a ocupação portuguesa, mesmo naqueles que se posicionaram contra a guerra.

A investigadora realça ainda a importância de se preservar o material que vai sendo partilhado e publicado nos blogues, especialmente em “Luís Graça & Camaradas da Guiné”, realçando que aquele espaço “é um manancial imenso de documentação, de relatos, de história oral”.

“Não existem programas que preservem aquela riqueza de material para além do esforço do Luís Graça e dos restantes camaradas. Seria uma perda imensa se o domínio fechasse e deveria haver um esforço para recolher e preservar aquele material de forma mais consistente”,
defendeu.

Notícia do Porto Canal | Agência Lusa, que nos chegou já ao findar do ano de 2022, pela mãos dos nossos camaradas Carlos Pinheiro e Miguel Pessoal. Fica bem na série "Mi querido blog", para inaugurar o ano de 2023  (**)... Fixação de texto / links / negritos: LG.
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segunda-feira, 2 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22423: Casos: a verdade sobre... (26): Forças Armadas Portuguesas, 1961/74: Nº de desertores, refractários e faltosos



Nº de desertores das Forças Armadas Portuguesas, no período de 1961/73  (Fonte: Cardina e Martins, 2019, p. 46)


1. O número de desertores, refractários e faltosos da guerra do ultramar / guerra colonial foi durante muito tempo (e continua a ser)  objecto de especulações e até de polémicas, por falta de investigação historiográfica compreensiva.(*)

Nos últimos cinco anos temos já dados, se não consolidados, pelo menos mais aproximados...  A metodologia da sua recolha é, porémm discutível, já que se baseiam  apenas em fontes administrativas (Excército). O investigador Miguel Cardina, da Faculdade de Coimbra,  aponta hoje para um número  de desertores da ordem dos 9 mil, podendo todavia essa estimativapecar por defeito. Um aspeto relevante: a deserção dá-se, na maioria dos casos na "metrópole# e não nas "frentes de combate", o que já há muito sabíamos  que respeitava ao CTIG.

 Embora sejamos um blogue de antigos combatentes, onde não cabe a figura do desertor como membro do nosso coletivo , isso não nos impede de falar sobre o assunto e de procurar saber mais sobre os desertores das Forças Armadas Portuguesas, no período de 1961 a 1974, em que durou a guerra, a par dos refractários e dos faltosos... 

Aliás, sobre este descritor, "desertores", temos mais de uma centena de referências...

De vez em quando o tema vem à baila, como recentente num artigo do investigador da Universidade de Coimbra, Miguel Cardina, publicado no "Público" de que tomamos a liberdade de reproduzir um excerto, para conhecimento dos nossos leitores.

2. Recortes de imprensa: 

Miguel Cardina, "Público", 30 de Julho de 2021 > Guerra à guerra: as oposições e a contestação anticolonial (Com a devida vénia)

https://www.publico.pt/2021/07/30/politica/noticia/guerra-guerra-oposicoes-contestacao-anticolonial-1972307

(...) Um estudo que efetuei, juntamente com Susana Martins (Miguel Cardina e Susana Martins, “Evading the War. Deserters and draft evaders of the Portuguese army during the colonial war”, E-Journal of Portuguese History, 2019, n.º 17/2):

(i) aponta para a existência de cerca de 9000 desertores (com lacunas pontuais em certos anos e ramos militares), a maioria deles desertando ainda em Portugal;

(ii) devendo a isso associar-se um número estimado de refratários na ordem dos 10 a 20 mil jovens;

(iii) e de faltosos à inspeção que rondará os 200 mil jovens - ou seja, perto de 20% dos rapazes chamados à inspeção na então metrópole, neste caso a partir de dados do próprio Exército.

Muitos deles não recusavam a guerra a partir de um posicionamento ideologicamente explícito e eram alheios às discussões políticas nas oposições. 

Além disso, nem todos os faltosos à inspeção o fizeram certamente para escapar da guerra: uma parte viria mesmo a regressar ao país para cumprir o serviço militar. No entanto, e como os trabalhos de Victor Pereira sobre a emigração têm sublinhado, é também possível ver estes trânsitos como parte das estratégias de resistência infrapolítica das classes populares. 

Com efeito, no gesto de emigrar intersetavam-se, frequentemente, as questões relativas ao sustento material e à busca de oportunidades de vida no exterior com o escape a constrangimentos de outro tipo, entre os quais, na vida dos jovens, pesava com especial relevo o fantasma de ser mobilizado para combater numa guerra distante. (...)

[  Revisão / fixação de texto / negritos, para efeitos de edição deste poste: LG    ]

3. Comentário do editor LG:

Fizemos uma primeira leitura, a correr, do artigo supracitado, de resto disponível aqui (em português do Google e no original em inglês, e também em formato pdf). Merece uma nota de leitura, e uma análise mais fina, quando tivermos disponibilidade de tempo. Para já limitamo-nos a reproduzir, com a devida vénia, um resumo (gráfico, acima)  dos dados relativos aos desertores por ano e por local (Portugal e os 3 teatros de operações).

Recorde-se que o Código de Justiça Militar de então definia como desertor aquele que se ausentava, indevidamente,  num prazo superior a oito dias, da unidade militar a que pertencia. As razões (e as circunstâncias) da deserção seriam naturalmente complexas, mas em princípio significavam a "recusa" da guerra.

Outra categoria estudada são os refratários (mancebos que faziam a inspeção mas que fugiam antes da incorporação militar), que não devem ser confundida com a dos faltosos (os que nem sequer faziam a inspeção militar). 

Entre 1967 e 1969 (os dados de que se dipõe),  cerca de dois por cento dos jovens,  chamados à inspeção,  foram considerados refratários: 1402 (2,26%) e 1967; 1268 (1,79%) em 1968; e 743 (1,09%) em 1969.  Não se dispõe de dados para os outros anos
.(Fonte: Cardina e Martins, 2019, p. 46).

Quanto aos faltosos, e de acordo com dados de 1985, do Estado-Maior do Exército, seriam da ordem dos 200 mil, no total,  no período entre 1961 e 1974 (Fonte: Cardina e Martins, 2019, p.47).

 Se os desertores e os refractários são um fenómeno mais próximo da "recusa" da guerra, a questão dos faltosos tem que ser vista no âmbito mais vasto do fenómemo da emigração.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21764: (De)Caras (168): Maria Ivone Reis, major enfermeira paraquedista reformada, faz hoje 92 anos e é uma referência para outras outras mulheres e para nós, seus camaradas: excertos de um seu depoimento, publicado em 2004 na Revista Crítica de Ciências Sociais - Parte I


[Imagem reproduzida com a devida vénia, de Margarida Calafate Ribeiro, "Dois depoimentos sobre a presença e a participação femininas na Guerra Colonial", Revista Crítica de Ciências Sociais [Online], 68 | 2004, p. 158.]



Angola > 1961 > A bordo de um Nord Atlas, com tropas paraquedistas.  A Maria Arminda à esquerda, a e Ivone Reis à direita (**).

Foto (e legenda): © Maria Arminda (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. A Maria Ivone Reis, major enfermeira paraquedista reformada, faz hoje a bonita idade de 92 anos. Infelizmente, é doente de Alzheimer, ao cuidado do IASFA - Instituto de Ação Social das Forças Armadas, há já uns largos anos, não nos podendo, por isso,  ler nem comunicar connosco. Mas isso não nos impede de lembrar a sua data de nascimento, 13 de janeiro de 1929 (*), e dar a conhecer o seu exemplo de pioneirismo, dedicação e camaradagem. (**)

Ela é, de resto, membro da nossa Tabanca Grande, com 25 referências no nosso blogue. Conheceu o TO da Guiné e ficou com uma relação muito especial com as as suas gentes!...

Sabemos,por outro lado,   do respeito e admiração que todas as antigas enfermeiras paraquedistas, mais novas, têm por esta nossa camarada, que é para elas uma referência. E também o é para nós, razão porque fomos buscar  um seu antigo depoimento, publicado em 2004 na Revista Crítica de Ciências Sociais (, editada pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra).

Com a devida vénia à editora e à autora (Margarida Calafate Ribeiro), tomamos a liberdade de selecionar e reproduzir aqui alguns excertos do longo depoimento da nossa camarada Maria Ivone Reis (***) , que pode ser lido na íntegra aqui:

 Margarida Calafate Ribeiro, "Dois depoimentos sobre a presença e a participação femininas na Guerra Colonial", Revista Crítica de Ciências Sociais [Online], 68 | 2004, colocado online no dia 01 outubro 2012, criado a 19 abril 2019. URL : http://journals.openedition.org/rccs/1212 ; DOI : 10.4000/ rccs.1212

 

Depoimento de Maria Ivone Reis (2004) (Excertos)

 

[Nascida em Sintra, há 92 anos]


(...) Nasci em Venda Seca, Belas, concelho de Sintra, em 1929. Éramos quatro irmãos, sendo eu a terceira. Lembro-me do nosso Pai, doente em casa; às vezes levava-me à rua a passear. Faleceu, tinha eu cinco anos. A nossa Mãe era doméstica. Após a morte do Pai, fomos para casa dos nossos avós maternos.

Dois anos depois, a Mãe faleceu, tinha eu sete anos. A causa da morte de ambos foi tuberculose pulmonar.

Os nossos avós maternos tiveram nove filhos. Viviam da agricultura e dos produtos lácteos dos animais. A minha Avó acolheu-nos, quatro netos, com carinho, mas muito exigente, sobretudo comigo, a rebelde!  

(…) A Avó, “analfabeta”, foi a minha grande catequista, ensinando-nos a fazer o bem e “nunca” o mal. O meu Avô nunca mandou os filhos estudarem. Logo, aos netos também não. Assim, os tios após a primária, se a fizessem ou não, trabalhavam na terra.


[Juventude: trabalhar para poder estudar]

(...) Na minha juventude, procurei trabalho, acompanhando crianças, desde que me facilitassem o tempo para estudar. Estive em três famílias, todas  extraordinárias no acolhimento que me deram.

A primeira família era de um diplomata americano. (…). A segunda família era muito agradável. Eram franco-belgas e tinham três filhos. Tratavam-me por “mademoiselle” (…) 

Passados quatro anos, conheci outra família, próxima de amigos comuns, que me desafiou para acompanhar uma criança de dois anos. Teria assim mais tempo para estudar. (...)


[Escola de enfermagem, 1958]

(...) Assim continuei até que, em 1958, conclui o Curso de Enfermagem Geral na Escola das Franciscanas Missionárias de Maria.

O terminar deste curso foi para mim a realização de um sonho que desde sempre alimentei. Quando era criança tinha estado num sanatório, em Francelos, perto de Espinho, porque naquela altura havia a primo-infecção e aquelas outras doenças do foro respiratório. 

Foi lá que conheci uma senhora, Guilhermina Suggia, que era violoncelista e era mundialmente conhecida, fazia concertos na Rússia e pelo mundo fora. Ela ia lá passar as férias, e contava muitas coisas das suas viagens, dos seus concertos e nós ficávamos todas espantadas… são coisas que para as crianças parecem sonhos. Pensei logo que queria ser pianista, mas foi no sanatório que percebi que queria mesmo era ser enfermeira. (…)


[Enfermeira no Hospital da CUF, 1959 e convite para enfermeira paraquedista em 1961]

(...) Comecei a trabalhar em 1959, no hospital da CUF e foi aí que fui abordada por uma colega da Escola para integrar uma equipa de enfermagem na Força Aérea, mais concretamente nos Pára-quedistas, para actuar em Angola, onde a guerra tinha estoirado, em 1961. 

O convite seduziu-me de imediato, disse logo: “Olhe, conte comigo, mas eu amanhã confirmo”. Eu tinha que dar uma satisfação à família com quem vivia, mas a minha decisão estava tomada. (…)

Quando me contactaram pensei que a minha ida como enfermeira era útil, e o importante era atenuar o sofrimento daquele que não tinha culpa nenhuma e que estava na frente de guerra. Não pensei na estratégia de guerra, o porquê da guerra. Achava que aquilo seria uma situação temporária e depois voltávamos. 

(...) Na verdade, nunca tinha pensado trabalhar em África. Quando as notícias da guerra em Angola chegaram, para mim, como para muita gente, foi uma surpresa. Tínhamos uma opinião desinformada e uma população que também não estava esclarecida, muito menos sobre o que se passava em África.

E aceitei o desafio, embora o vencimento fosse menor do que na CUF. Na verdade, eu nem perguntei nada, não perguntei quais eram as condições (…).. 

Fomos o princípio de um quadro de enfermeiras graduadas militares na Força Aérea. A nossa missão específica era de, a bordo, assistir e tratar os feridos ou doentes, combatentes ou população civil, e conduzi-los para o hospital indicado.

O pára-quedismo despertou em nós a consciência do medo, desenvolvendo, simultaneamente, a audácia de agir, com segurança, no risco e na adversidade. Na “retaguarda” da guerra, as equipas de evacuação aérea, pilotos e enfermeiras, estavam sempre prontas a responder à chamada, viesse ela das zonas de combate ou dos mais “esquecidos” aquartelamentos das tropas. Era uma vida intensa.


[Curso de enfermeira paraquedista em Tancos,  junho-agosto de 1961]

(...) Mas a nossa preparação tinha sido cuidada. Quando se reuniu o grupo de voluntárias – éramos 11, uma fracção de uma companhia – fomos convocadas para fazer testes de adaptação e de capacidade. Naquele tempo a mulher não estava ginasticada, não havia a prática de ginástica que temos hoje. Mas estes testes iniciais não eram eliminatórios. No curso que se seguiu as pessoas desenvolviam-se ou não, cumpriam as metas fixadas ou não.

Começámos onze e só ficámos seis, porque as outras não aguentaram os treinos. A guerra tinha começado em Março e nós fomos convocadas em fins de Maio. Fomos para Tancos fazer os testes a 25 ou 26 de Maio, e depois fomos para lá iniciar o curso no dia 6 de Junho, que é o dia do desembarque da Normandia, o dia mais longo, o dia D, como eu digo sempre.

Era um curso adaptado a nós, à nossa capacidade física, que não era igual à dos homens, tínhamos que fazer tudo numa dimensão adaptada à nossa resistência física. O primeiro salto foi a 2 de Agosto e fizemos todos os outros saltos até 8 de Agosto, data em que fomos brevetadas.

Na Força Aérea, nos pára-quedistas, já havia mulheres, civis, na parte administrativa. A nossa relação com os pára-quedistas era muito cordial.

Claro que eles tinham sido advertidos das circunstâncias em que nós íamos, porque é que íamos e portanto o estatuto que nos deram – e que lhes deram a eles – também acautelou o nível de relação que se propunha que houvesse e tudo correu muito bem.  . (…) No fim do curso estávamos envolvidas numa afectividade muito grande, porque realmente os pára-quedistas são excepcionais, são pessoas muito abertas, muito solidárias e amigos. E isso foi muito importante para nós vivermos a nossa missão.


[Partida para Angola, em 23 de agosto de 1961, com a Maria Arminda]

A 23 de Agosto fomos duas enfermeiras para Angola, como teste. Estávamos ainda a fazer fardas em Lisboa, quando foi anunciado que ia haver uma operação especial dos pára-quedistas no norte de Angola, na Serra da Canda e eles gostavam da nossa presença.

Era tudo à experiência: ver como é que nós nos dávamos, ver como é que os pára-quedistas reagiam à nossa presença. Mas não foi nada de especial porque aqueles pára-quedistas que nós fomos encontrar no avião para a Serra da Canda, tinham estado em Tancos em Junho,quando nós tínhamos ido para lá. Eles tinham embarcado para Angola em Julho. (…)

Em Luanda onde inicialmente aterrámos e onde ficávamos – tínhamos a messe e os alojamentos lá – vimos que as pessoas, os africanos e os europeus que estavam lá radicados tinham uma relação humana boa. Eram pessoas muito abertas a uma relação e, mesmo com a população local, não há dúvida nenhuma de que havia uma relação rica de sensibilidade e de vivência.

É claro que a situação de guerra veio alterar as coisas em todos os sentidos. E nós, a nossa presença militar também alterava tudo, mas nunca senti fricções. (...)

(Continua)

[Seleção / subtítulos / revisão e fixação de texto, para efeitos de publicação neste blogue: LG]

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de13 de janeiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21763: Parabéns a você (1922): Major Enfermeira Paraquedista Reformada Maria Ivone Reis (FAP, 1961/74)


(**) 13 de janeiro de  2012 > Guiné 63/74 - P9348: Parabéns a você (367): Maria Ivone Reis, 83 anos: enfermeiras, paraquedistas, amigas, companheiras de aventura e camaradas para sempre! (Maria Arminda)

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Guiné 61/74 - P19136: Agenda cultural (654): Colóquio internacional "Da Grande Guerra à Pandemia do Século: 1918 - o ano de todas as (des)ilusões". Data e local: 7 de novembro de 2018, Casa da Escrita, Coimbra. Organização: CEIS20/UC (Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX / Universidade de Coimbra)





1. Convite que nos chega,  com data de hoje, por mão de Sérgio Neto, historiador, CEIS20/UC (Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX / Universidade de Coimbra):


Caro Luís Graça,

Espero que esteja tudo bem. Vinha por este meio convidá-lo a estar presente no Colóquio "Da Grande Guerra à Pandemia do Século: O Ano de 1918", sobre o impacto deste ano que marca o fim da Primeira Guerra Mundial e da Gripe Pneumónica. Terá lugar na Casa da Escrita, em Coimbra, no dia 7 de Novembro, a partir das 9.30.

O colóquio faz parte de uma série de iniciativas que visam assinalar os vinte anos do CEIS20.

Envio o convite e o programa. Pedia, se estiver de acordo, a publicitação no vosso blog.

Agradecendo
Com os melhores cumprimentos

S. Neto
Investigador Integrado | Integrated Member
Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20) | Centre for 20th Century Interdisciplinary Studies (CEIS20)
Universidade de Coimbra | University of Coimbra
Rua Augusto Filipe Simões, n.º 33 | 3000-186 COIMBRA | PORTUGAL
Tel.: +351 239 708 870

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17869: Agenda cultural (592): Colóquio Internacional "O Ano de 1917", Universidade de Coimbra, Faculdade de Letras, 4ª feira, dia 18, das 10h00 às 18h30... Um ano que mudou o mundo, da revolução russa às aparições de Fátima e ao envio do 1º corpo expedicionário português para a Flandres, na I Grande Guerra...







1. Cartaz promocional do Colóquio Internacional "O Ano de 1917", Faculdade de Letras da Universidade denCoimbra, Anfiteatro II, 4º piso, amanhã, 4ª feira, dia 18 de outubro de 2018, das 10 às 18h30.

Organização de Clara Isabel Serrano e Sérgio Neto, do CEIS20/UC (Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX)

Conferencistas:

Nicolas Werth (IHTP/CNRS) 
Josep Cervelló (DHHA/URV) 
Manuel Loff (FLUP e IHC/FCSH/UNL) 
Francisco Assis (PE) 
Fernando Pimenta (CEIS20/UC) 
Sérgio Branco (IFILNOVA/FCSH/UNL, CEIS20/UC) 
João Madeira (IHC/FCSH/UNL) 

A conferência de abertura estará a cargo de Nicolas Worth (IHTP/CNRS), historiador francês especialista na história da União Soviética, que proferirá a conferência “Débats et controverses historiographiques autour de 1917”. 

No mesmo painel, moderado por João Paulo Avelãs Nunes, intervirá Josep Cervelló, historiador espanhol, já nosso conhecido, com o tema “De Barcelona a Fátima passando por Madrid”.

Recorde-se que em 2017, celebram-se vários primeiros centenários, desde a revolução russa às aparições de Fátima... Em 1917, é de lembrar, Portugal entrava na I Grande Guerra, com o envio de um corpo expedicionário para a Flandres. Mutos dos acontecimentos desse ano são desconhecidos dos nossos leitores. Por exemplo, em novembro de 1917,  "colunas militares alemãs, comandadas pelo general von Lettow, penetram profundamente no território de Moçambique, a partir da fronteira norte.",,, A 25 de novembro de 1917, em Negomano, morre o herói das "campanhas de pacificação" na  Guiné (1913-1915), Teixeira Pinto:

Domingo, 25 de Novembro de 1917 > Combate de Negomano, Moçambique

"Os portugueses são surpreendidos pelas forças alemãs em Negomano, Cabo Delgado, Moçambique. O resultado é um verdadeiro desatre para os portugueses. O ataque alemão fez vários mortos, oficiais, soldados europeus e africanos e o comandante Teixeira Pinto, abatido a tiro. Foram, ainda, feitos prisioneiros."..
.

É também de finais de 1917, o triunfo do sidonismo e o início da grave crise que levará, em 1926, ao derrube da I República, com a instauração da Ditadura Militar e depois a institucionalização do Estado Novo...


2. Mensagem, com data de 15 do corrente, de Sérgio Neto, historiador, autor de
"Do Minho ao Mandovi: um estudo do pensamento colonial de Norton de Matos" (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2016) (*)



Caro Luís Graça

Espero que esteja tudo bem. Vinha por este meio convidá-lo a estar presente no Colóquio "O Ano de 1917", sobre as revoluções russas (com uma comunicação versando a questão colonial portuguesa), que se vai realizar no próximo dia 18 de Outubro, pelas 10.00, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.

Envio o cartaz e o folheto contendo o programa. Pedia, se estiver de acordo, a publicitação no vosso blog.(**)

Melhores cumprimentos
S. Neto

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Notas do editor

(*) Vd. poste de 6 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17213: Agenda cultural (552): Lançamento do livro de Sérgio Neto, "Do Minho ao Mandovi: um estudo do pensamento colonial de Norton de Matos" (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2016): 10 de abril, 2ª feira, às 17h00, Casa Municipal da Cultura, Coimbra. Apresentação: professores doutores Luís Reis Torgal e Armando Malheiro da Silva

quarta-feira, 22 de março de 2017

Guiné 61/74 - P17168: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (41): Pedido de ajuda para tese de doutoramento sobre "o papel dos negros que combateram nas tropas especiais" (Sofia da Palma Rodrigues)

1. Mensagem da nossa leitora Sofia Rodrigues, doutorando pela Universidade de Coimbra:

Data: 4 de março de 2017 às 11:47
Assunto: Ajuda para tese de doutoramento

Caro Luís Graça,

Estou neste momento a começar a pesquisa para o meu trabalho de doutoramento. A minha tese analisará o papel dos negros que combateram nas Tropas Especiais portuguesas na Guiné-Bissau.

Estarei de partida, por um ano, para a Guiné em Outubro. Antes, gostaria de fazer uma recolha o mais exaustivas possível da bibliografia e documentação existente.

Queria pedir-lhe se me pode ajudar com referências bibliográficas de que se recorde,  escritas sobre este tema. Conheço o seu blogue e já lá encontrei algumas preciosidades. Mas nunca é demais perguntar.

Muito obrigada e fico a aguardar uma resposta da sua parte.
Sofia da Palma Rodrigues

www.sofiadapalmarodrigues.wordpress.com

Telef +351 96 862 08 10


Luís Graça
2. Comentário de LG:

Sofia, obrigado pelo seu contacto. Vou estar fora do país até ao princípio de abril próximo, mas não quis deixar de publicar a sua mensagem, na esperança de que alguns dos meus/nossos camaradas, que lidaram com soldados guineenses, a possam ajudar, com bibliografia e sobretudo com documentação, escrita ou oral.

A Sofia vai ter que esclarecer, com mais precisão, o que entende "por tropas especiais portuguesas":  refere-se apenas aos paraquedistas, fuzileiros e comandos ? Se sim, ficam de fora, as milícias, os pelotões de caçadores nativos, as companhias de caçadores formadas por soldados do recrutamento local (como era a minha, a CCAÇ 12 e outras que formavam a "nova força africana"...), os pelotões de artilharia, etc. Fica de fora o "grupo especial" do Marcelino da Mata, ficam de fora muitos milhares de guineenses que colaboraram com as nossas tropas durante a guerra coloniial na antiga Guíné portuguesa...

Por outro lado, convém termos critérios claros de inclusão / exclusivão em relação aos "negros" que estavam nas nossas fileiras: são só guineenses ? são também os cabo-verdianos ? são também  alguns guineenses de origem sírio-libanesa ?

Deixo aqui os seus contactos, que podem ser úteis para receber eventualmente respostas ao seu pedido.  Mande um email ao nosso coeditor Carlos Vinhal a esclarecer a questão de lhe pus... Pode igualmente deixar aqui a sua resposta na  caixa de comentários.

Também era bom podermos saber um pouco mais sobre si,  a sua motivação para estudar este tema, a universidade por onde vai fazer o doutoramento, os seus orientadores e equipa tutorial, os contactos que eventualmente precisa na Guiné-Bissau, etc. Se não erro, vive em  Lisboa, está ligada ao Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e tem-se interessado por  questões como cidadania global e pós-colonialismo nos países lusófonos, segundo informação da sua página no Facebook. Além disso, pelo que pesquisámos na Net, a Sofia adora histórias/estórias e tem uma paixão pela Guiné e as suas gentes,

Vamos, concerteza, poder ajudá-la, para além da informação e conhecimento que já adquiriu da leitura do nosso blogue, como de resto temos ajudado outros investigadores, nacionais e estrangeiros. Esteja à vontade para nos contactar. Boa sorte para o seu projeto académico.
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Nota do editor:

Último poste da série > 13 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17045: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (40): O jornalismo e a guerra colonial: contactos precisam-se de pessoas (civis ou militares) que tenham trabalhado na imprensa da Guiné portuguesa: O Arauro, Notícias da Guiné, Voz da Guiné... (Sílvia Torres, ex-oficial da FAP, doutoranda)

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Guiné 63/74 - P16684: Inquérito 'on line' (81): a avaliar pelo total de respostas (n=91), só uma minoria (15%) refere a existência de casos de deserção (n=15) na sua unidade (companhia ou equivalente)... Menos de metade do que terá ocorrido na metróple (=34)... Impossível saber se há casos repetidos... A nossa estimativa, grosseira, é de 500 casos de deserção em toda a guerra: 2/3 na metrópole, 1/3 no TO da Guiné


Universidade de Coimbra > Centro de Documentação 25 de Abril > "Guerra, Deserção e Exílio | Exposição virtual" > Jormais e revistas > Capa do boletim "Guerra à Guerra", nº 1,  maio de 1972,  do CDP - Comité de Desertores Portugiueses, Suécia. Tinha 16 páginas, impresso a offset, era escrito todo em inglês (com exceção de dois parágrafos, em português...) e custava 2 coroas suecas ou 2 francos franceses... Não se escondia as dificuldades que esperavam os jovens desertores e refratários portugueses, em países como a França, a Holanda ou a Suécia: a língua, a burocracia, o controlo policial, as dificuldades de alojamento, a demora na regularização da situção legal (às veses quase um ano), a busca de trabalho, etc. O país "mais acolhedor" ainda era a Suécia que, no entanto, não dava "asilo político" aos desertores e refratários.. As oportunidades de permanência eram melhores. Havia 3 seções do CDP, em Malmo-Lund, Estocolmo e Uppsala... Esta primeira edição do boletim era da responsabilidada seção de Malmo-Lund. Não aparece nenhum nome português associado a este coletivo. Pelo conteúdo e pelo grafismo, o boletim parece seguir uam orientação maoista. A posição do CDP face é deserção era clássica:(i) a deserção afeta moral e materialmente as forças armadas, principal esteio de apoio da burguesia que explora a classe trabalhadora em Portugal e nas colónias; (ii) os jovens portugueses não devem recusar fazer o  serviço militar, o seu treino é muito importante para o combate revolucionário a travar em Portugal (e não no exílio); (iii)  os jovens devem aguentar-se o mais tempo possível em Portugal; (iii) uma vez mobilizados para a guerra colonial, devem então desertar levando com eles as suas armas...  Nada mais simples, para...um sueco!


 (Reproduzido com a devida vénia...)

(...) "Por ocasião do Colóquio O (AS)SALTO DA MEMÓRIA : Histórias, narrativas e silenciamentos da deserção e do exílio, realizado em Lisboa, na FCSH-UNL, no dia 27 de Outubro de 2016, o Centro de Documentação 25 de Abril, da Universidade de Coimbra, oferece uma exposição virtual de documentos, selecionados a partir de vários dos seus fundos e coleções." (...) Há livros e outros documentos, hoje já raros (como este que se reproduz acima), que inclusive podem ser descarregados pelo visitante em pdf.


A. INQUÉRITO 'ON LINE':

"NA MINHA UNIDADE (COMPANHIA OU EQUIVALENTE) NÃO HÁ CASOS DE DESERÇÃO"




1. Nenhum caso, na metrópole > 46 (50%)


2. Nenhum caso , no TO da Guiné > 58 (63%)


3. Um caso, na metrópole  > 17 (18%)


4. Dois casos, na metrópole  > 4 (4%)


5. Três ou mais casos , na metrópole  > 3 (3%)


6. Um caso, no TO da Guiné  > 13 (14%)


7. Dois casos, no TO da Guiné  > 1 (1%)


8. Três ou mais, no TO da Guiné 0 (%)


Total de votos apurados >  91



A sondagem fechou na 5ª feira, dias 3, às 15h34.


B. Comentário do editor


Não sei se um dia ainda chegaremos a saber qual foi o número exato de refratários e desertores da guerra colonial (ou do ultramar, como se queira).

Era bom que os nossos jovens historiadores, que felizmente não fizeram a guerra, nem viveram as paixões dessa época, pudessem dar um contributo decisivo para o esclarecimento deste assunto, durante muto tempo tabu na sociedade portuguesa.

Há dias fomos confrontados com um número (8 mil desertores), avançado por dois jovens historiadores ligados ao Centro de Documentação 25 de Abril /(CD25A), o Miguel Cardina e a Susana Martins (*).


Mas voltando aos desertores da guerra colonial...

Há quem tenha a veleidade de encerrar a história por capítulos. É uma conceção errónea da investigação científica. A história é um domínio fortemente marcado pela conflitualidade teórico-ideológica. Continuaremos a assistir à utilização dos números sobre a guerra como “arma de arremesso” por diferentes sectores da sociedade portuguesa, e nomeadamente na leitura e interpretação da guerra colonial, da decolonização e do 25 de abril.

.Há ainda muitos contos por contar e  muitas contas por ajustar… Por outro lado,  "não há almoços grátis": sem financiamento não há investigação, mas quem financia  nem sempre o faz por puro amor da ciência (e neste caso da verdade  histórica). Resta-nos a confiança na ética e na autonomia dos investigadores e no controlo da qualidade feita pelos seus pares.

De alguim modo indiferentes a isso, o nosso blogue vai carreando, também,  alguns materiais que podem ajudar à compreensão (mais do que à quantificação) de fenómenos como a "adesão" e a “resistência” à guerra… E nesse sentido que abrimos, de há muito, as nossas páginas ao debate (sereno) sobre os combatentes, os refractários e os desertores. Somos um blogue de combatentes, de veteranos da guerra da Guiné. E a Guiné um bom local de observação.

O inquérito “on line” que decorreu durante uma semana, e que encerrou ontem, dá-nos mais algumas pistas para reflexão. Como sempre o temos dito, este não é um instrumento científico, é apenas uma forma de potenciar a participação dos nossos leitores no debate de temas que nos dizem respeito e que nos interessam. 

Os resultados que obtemos podem estar “enviesados”, por terem respondido ao inquérito leitores que não foram combatentes na Guiné, etc. Por outro lado, estamos sempre a fazer apelo à memória… E presumimos a boa fé dos nossos respondentes...De qualquer modo, , o conceito de "desertor" não é pacífico.. Enfim, demasiadas fontes de potencial enviesamento dos dados que não podemos controlar neste tipo de inquirição que, por razões técnicas, só admite uma pergunta...

Feitas estas ressaltavas, o inquérito sobre os “desertores”, não chegou a ter as desejáveis 100 respostas. Ficou perto, mas aquém. No total, tivemos 91 respondentes. O que é, em estatística, um "número grande", mas está longe de ser uma "boa amostra"...

É aquilo a que se chama uma mera amostra de conveniência. A metodologia não nos permite tirar conclusões generalizáveis… Estamos a falar de um milhão de homens em armas, durante um período, longo, que vai de 1961 a 1975, em toda a guerra colonial (cerca de 800 mil metropolitanos  + 200 mil africanos).

Há a perceção, por parte da historiografia militar e dos ex-combatentes, de  que o caso o número de desertores será sempre muito baixo (menos de 1% ou até .menos de 0,5 %), comparativamente com o dos refratários (que seriam da ordem dos 20%, ou sejam, 200 mil).(**)

Por cada  5 homens em armas,  haveria 1 refratário (, o que é um proproção brutal, mas deve ser tido em conta o contexto dos anos, marcados pela emigração em massa, que ultrapassou toda ca capacidade de controlo do regime então em vigor, o Estado Novo)...

Quanto aos desertortes é mais difícíl estimar uma  proporção.. A aceitar (memso com reservas) os 8 mil desertores, seria menos de 1 desertor (0,8)  por cada 100 homens em armas... Na prática, podemos arredondar:  1 homem por companhia (150/160  homens)... Na Guiné, ou melhor nas unidades que passaram pela Guiné, e usando esta proporção,. poderíamos ter entre 750 e 1500 desertores... Há quem continue a pensar que é muito, face ao conhecimento empírico que teve da situação, cá e lá...

Vejamos agora os nossos resultados... Admitindo que as respostas ao nosso inquérito, no nosso blogue, são dadas de boa fé, temos um fenómeno curioso: os nossos camaradas referem o dobro de casos de deserção na metrópole relativamente ao que se terá passado no TO da Guiné. Todos reconhecemos que era “mais fácil” desertar, apesar de tudo,  antes do embarque para a Guiné do que depois, no terreno (veja-se o caso da CCAÇ 2402). E nalguns casos, aproveitava-se as férias na metrópole para desertar (os 2 casos da CCAÇ 3498)…

24 respondentes referem casos de deserção na metrópole, passados na sua unidade (companhia ou equivalente)... Tudo somado daria no mínimo  34 casos; 17 assinalaram  um caso; 4 assinalaram dois casos; e 3 assinalaram 3 ou mais casos.

Quanto à deserções no TO da Guiné, durante a comissão, há apenas 14 respondentes que assinalam 15 casos.

No total (considerando a metrópole e o teatro de operações) temos, assim,   meia centena de casos.

Admitindo que cada respondente representa uma companhia (150/160 homens, em números redondos; nalguns casos, um pelotão, de morteiros, de caçadores nativos, de artilharia, etc.), teríamos cerca de 10% do de total dos homens que passaram pelo TO Guiné (que terão sido pelo menos uns 150 mil,  contando com os militares do recrutamento local mas excluindo as  milícias).

Se em 10% dos efetivos (15 mil) temos cerca de 50 casos de deserção (na metrópole e no TO da Guiné), extrapolando para a população (150 mil), teríamos 500 casos...

Esta estimativa é mais conservadora do que a dos historiadores do CD25A, mas não deve andar longe da verdade... Cerca de dois terços dos nossos respondentes  diz que não houve nenhum caso de deserção no TO da Guiné, na sua companhia. Cerca de metade diz que não houve nenhum, caso de deserção na metrópole.

É um estimativa grosseira,,, mas convém arriscar, até  para incentivar a pesquisa (metodologicamente mais controlada e rigorosa) deste problema...

Atreveríamo-nos a fazer a pôr a seguinte hipótese de investigação: poderá ter havido 150 deserções no T0 da Guiné, entre 1961 e 1974,  e as restanttes (350) poderão ter ocorrido na metrópole...

Pode haver. naturalmente, casos repetidos. E na metrópole os números poderão ser menos fiáveis... De qualquer modo, estes resultados parecem verosímeis. Quem passou pela Guiné, entre 1961 e 1974, sabe que os casos de deserção  foram esporádicos e até atípicos. O típico desertor estava longe de ser um indiíduo "politizado", "objetor de consciência", etc. (vd. casos de 1970: base naval de Ganturé, e CCS/BCAÇ 2893)...

E não houve deserções em massa, com raras exceções (por exemplo, o do ten comando graduado João Januário Lopes, da 1ª Companhia de Comandos Africanos, em Conacri, em 22 de novembro de 1970, na sequência da Op Mar Verde, ao todo cerca 26 homens, mesmo que haja dúvidas sobre as circunstâncias em que esta história ocorreu).

É sabido que organizações clandestinas que lutavam contra a guerra colonial, como o Partido Comunista, não incentivavam a deserção dos seus militantes (que de resto não seriam muitos, na época), embora pudessem e devessem  apoiar casos individuais ou coletivos (***)

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domingo, 24 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14657: Filhos do vento (31): Festival Rotas e Rituais, 2015: 22 de maio > Conferência "Filhos da Guerra": vídeo com a intervenção de Rafael Vale e Reis, especialista em bioética e direito da família ("Filhos do Vento: direito ao conhecimento das origens genéticas ?")



[ Pode-se aumentar o volume de som, clicando na imagem, em baixo, à direita]


1. Lisboa,  Cinema São Jorge, Festival Rotas e Rituais, 2015 > 22 de maio: conferência "Filhos da Guerra". Intervenção de Rafael Vale e Reis ("Filhos do Vento; direito ao conhecimento das origens genéticas ?")

Na mesa, da esquerda para a direita:

(i) Catarina Gomes (jornalista do Público, organizadora e moderadora do painel);

(ii) Margarida Calafate Ribeiro (professora e  investigadora-coordenadora no Cen­tro de Estu­dos Soci­ais da Uni­ver­si­dade de Coim­bra, autora dos  livros "África no femi­nino: as mulhe­res por­tu­gue­sas e a Guerra Colo­nial" (2007); "Uma his­tó­ria de regres­sos: impé­rio, Guerra Colo­nial e pós-colonialismo" (2004);  e ainda, em con­junto com Roberto Vec­chi,  "Anto­lo­gia da memó­ria poé­tica da guerra colo­nial" (2011); entre 2007 e 2011, coor­de­nou o pro­jecto "Os filhos da guerra colo­nial: pós-memória e representações");

(iii) Luís Graça (na qualidade de editor do blogue Luís Graça &  Camaradas da Guiné);

(iv) e Rafael Vale e Reis (especialista em bioética e direito da família, Universidade de Coimbra).(*).

Rafael Vale e Reis é assis­tente con­vi­dado da Facul­dade de Direito da Uni­ver­si­dade de Coim­bra e inves­ti­ga­dor do Cen­tro de Direito Bio­mé­dico da Facul­dade de Direito, da Uni­ver­si­dade de Coim­bra. Inte­gra a equipa do Obser­va­tó­rio Per­ma­nente para a Adop­ção no âmbito do Cen­tro de Direito da Famí­lia da Facul­dade de Direito de Coim­bra. É autor de "O Direito ao Conhe­ci­mento das Ori­gens Gené­ti­cas", publi­cado em livro pela Coim­bra Edi­tora em 2008.)(**).

Dos camaradas e amigos da Tabanca Grande, estiveram presentes, além do nosso editor, a Maria Alice Carneiro (que fez este vídeo), o Jorge Cabral, o Hélder Sousa, o Mário Gaspar, e o José António Viegas, algarvio. O  Jorge Cabral e o Mário Gaspar fizeram ntervenções no fim,

2. Sobre este tema, está a decorrer uma sondagem, desde hoje. A pergunta é: 

OS "NOSSOS FILHOS DA GUERRA" DEVERIAM PODER TER ACESSO À NACIONALIDADE PORTUGUESA

A resposta é dada através de uma escala de Likert (Vd. coluna do lado esquerdo, ao alto):

1. Discordo totalmente

2. Discordo

3. Não discordo nem concordo /Não sei

4. Concorrdo

5. Concordo totalmente

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quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13676: Os nossos camaradas guineenses (38): Reportagem, com vídeo, da revista "Sabado", e tese de doutoramento sobre os comandos africanos, de Fátima da Cruz Rodrigues (Coimbra, UC, 2012) (Virgínio Briote)


Lisboa >  Museu Militar >  15 de Abril de 2010 > Lançamento do livro do Amadú Bailo Djaló,  membro da nossa Tabanca Grande, "Comando, Guineense, Português" (Lisboa: Associação dos Comandos, 2010, 229 pp., 150 fotos, preço de capa: 25 €). É pena que não tenha saído o 2º volume, com as aventuras e desvanturas do autor, a seguir à independência do seu pais. Vive hoje em Portugal, na Amadora. Acabou a sua carreira militar como alf comando graduado, na CCAÇ 21, comandada pelo cap cmd grad JDamanca, um dos primeiros camaradas guineenses a ser fuzilado pelo PAIGC.

Foto: © Luis Graça (2010). Todos os direitos reservados

1. Mensagem do nosso querido amigo e camarada, editor jubilado, Virgínio Briote [, entrou para o blogue como coeditor em 11/7/2007; ex-alf mil comando, Brá, 1965/67]:


Data: 26 de Setembro de 2014 às 12:38

Assunto: Estudo sobre os comandos Africanos

Caros Luís e Carlos,

Para v/ conhecimento, com um abraço do VBriote (*)


2. De Wouter De Broeck {, jornalista,] para Virgínio Briote:

Enviada: 15 de julho de 2014 12:07

Assunto: estudo sobre os comandos Africanos

Caro Sr, Virgínio Briote,

Quero agradecer novamente a entrevista de há duas semanas. Foi muito útil para poder perceber o contexto que se vivia naquela altura.

Entretanto estou a trabalhar na matéria e lembre-me do estudo da socióloga da Universidade do Minho de que falou. Pode dar-me o nome dela, de maneira a que possa ir à procura do trabalho dela?

Muito obrigado,

com os melhores cumprimentos,

Wouter De Broeck  


Lisboa > Museu Militar > Sessão de lançamento de Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), 14º Volume – Comandos, Tomo 1 – Grupos Iniciais, 1ª ed., Lisboa, 2009 > 10 de Março de 2009 > Velhos Comandos de Brá : ex-furr mil João Parreira, ex-alf mil Virgínio Briote e coroneis Amadeu Neves da Silva e Vitor Caldeira. 

Cortesia do  fotógrafo Raimundo, ex-1º Cabo do Destacamento Foto-cine, do QG, e ex-combatente na Op Tridente (jan/mar 1964).

3. De Virgínio Briote para Wouter De Broeck

Enviada: 15 de julho de 2014 22:20

Assunto: Estudo sobre os comandos Africanos

Boa noite, Caro Wouter

A investigadora é a Doutora Fátima Rodrigues [...] (**)

Não falei com a Fátima sobre este assunto mas se ela lhe perguntar quem lhe deu o email pode dizer que fui eu. De qualquer dea formas, amanhã vou tentar contactá-la.

Obrigado pela visita.


4. Mensagem de Virgínio Briote para Wouter De Broeck

2014-07-16 12:31 GMT+02:00 

Bom dia

Acabo de falar com a Doutora Fátima Rodrigues que manifestou ter todo o gosto de falar consigo sobre a questão dos comandos africanos.

Cumprimentos do V Briote


5. De Wouter De Broeck  [, jornalista], para virgínio Briote:

Enviada: 26 de setembro de 2014 10:42

Assunto: Estudo sobre os comandos Africanos

Caro Virgínio,

Conseguimos publicar a nossa reportagem na revista Sábado. Está na edição que saiu ontem. Através deste link pode ver o vídeo que fizemos

 [Vídeo 4' 36''. "A vida do lado errado da história"; entrevistados: Amadi«u Bailo Djaló, Juldé Jakité, Sadjo Camará, Virgínio Briote].

De qualquer forma queria agradecer lhe outra vez a sua disponibilidade para e entrevista e as fotos - das quais usamos algumas no vídeo. Foi muito importante para poder perceber a história dos comandos africanos.

Um abraço,

Wouter


Leiria > Monte Real > Ortigosa > Quinta do Paul > IV Encontro Nacional da Tabanca Grande > 20 de Junho de 2009 > Em primeiro plano, o Virgínio Briote e o Amadu Djaló, um e outro muito acarinhados por todos. Não sei o que é o que Virgínio, um homem sábio, europeu, estava a pensar, mas possivelmente estava a organizar a sua resposta à questão, pertinente, levantada pelo Amadau, outro homem sábio, africano: "Os portugueses, a alguns povos, deram-lhes novos nomes e apelidos, livros para estudar e consideraram-nos civilizados. Desta civilização não precisávamos, mas faltava-nos a cultura, porque a cultura, de onde sai não acaba e de onde entra não enche. E no nosso Alcorão está tudo, moral, comportamento cívico e civilização e nós não precisávamos de ser civilizados, o que nos faltava era escola para aumentar os nossos conhecimentos"...


Foto (e legenda): © Luis Graça (2010). Todos os direitos reservados


6. Recorte de imprensa > Sábado, 26 de setembro de 2014

Sociedade > O que aconteceu aos comandos portugueses de origem guineense?

26-09-2014

A 24 de Setembro de 1973 a Guiné autoproclamou a sua independência e meses depois deu-se o 25 de Abril e o império colonial desmoronou-se. O que aconteceu aos comandos portugueses de origem guineense?

Por Wouter De Broeck

Amadú Bailo Djaló, hoje com 75 anos [, autor do livro de memórias "Guineense, comando, português", Lisboa, Associação de Comandos, 210,] teria preferido abrir uma barraquinha no mercado de Bafatá, a sua cidade natal, a ter-se tornado comando. Como cidadão português, era obrigado a prestar serviço militar. O pai ainda falou com o chefe da administração local, mas não escapou. Contra vontade, Amadú tornou-se soldado-condutor com a função de fornecer água às tropas. Pensou que ia ser uma passagem tranquila pela tropa, pois no início de 1962 o PAIGC apenas lançava ataques esporádicos. 

“Certo dia, um prisioneiro deu-me uma carta para entregar ao tio. Mas primeiro mostrei-a ao meu superior, que me disse que não podia aceitar nada dos prisioneiros. Como castigo, conduzi o jipe carregado com sacos de areia e segui 100 metros à frente da coluna, a fazer de rebenta-minas.”

De túnica branca e gorro verde na cabeça, as mãos sobre os joelhos, Amadú fala em frases curtas, como se lhe faltasse a respiração. Talvez seja o medo que volta a sentir, a fibrose pulmonar que o tem afligido ou o pequeno quarto abafado que aluga numa cave na Amadora. 

“Passado pouco tempo já não aguentava. Ofereci-me para o primeiro grupo de comandos. Só quando estava metido naquilo, é que percebi. Todas as noites havia saídas em missão, assaltos aos acampamentos do inimigo. Lamentei a minha decisão, mas já não tinha saída.”

Amadú integrou o grupo de comandos, que recebeu formação em Brá a partir de Junho de 1964. Dois anos antes, em Angola, o exército português já tinha recorrido a pequenas unidades de tropas de elite, inspiradas nos comandos franceses e belgas. As unidades espalharam -se pelas colónias, com um papel fundamental na guerra da Guiné.

“Nunca matei ninguém”

Sadjo Camará diz ter 74 anos, mas também podem ser 76. 

“Obrigaram-me a mudar a idade quando fui para a tropa. Devia ter uns 17 anos, nunca tinha ido à escola, vivíamos da agricultura. O serviço militar era obrigatório. Quem não fosse, ficava com a PIDE à perna.”

Sadjo coloca a boina vermelha de comando, quatro condecorações balançam sobre o bolso do seu casaco, o olhar cansado mal se move quando nos conta num suave tom cantado: 

“No dia em que entrei para o quartel o meu pai deu-me uma ordem: ‘Não mates ninguém. No campo de batalha, numa emboscada não tens culpa, mas nunca mates ninguém cara a cara. Não entres em igrejas dos muçulmanos nem lhes deites fogo, deixa em paz as mulheres e as crianças. Se fizeres o que te digo, vais viver muitos anos.’ E cumpri as ordens. Nunca matei ninguém, nunca bati em ninguém.”

Pode ler a reportagem na íntegra, na revista Sábado que está na banca a partir de 25 de Setembro. Veja aqui o vídeo.

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 15 de janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12588: Os nossos camaradas guineenses (37): Os milícias e outras tropas auxiliares: as estatísticas dos tombados (José Martins / António J. Pereira da Costa / Jorge Picado)

(**) Tese de doutoramento: Fátima da Cruz Rodrigues - Antigos Combatentes Africanos das Forças Armadas Portuguesas: a Guerra Colonial como Território de (Re)conciliação. Tese de doutoramento apresentada à Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra para obtenção do grau de Doutor. Coimbra: FEUC - Faculdade de Economia.UC - Universidade de Coimbra. 2012, 349 pp.








segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13638: Selfies / autorretratos (2): filho único, com pai emigrado no Canadá, podia também ter saído do país, aos 17 anos... Passei pela universidade de Coimbra e lutas académicas, tendo decidido participar na guerra colonial, contrariado e sabendo ao que ia (Manuel Reis, ex-alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, 1972/74)

1. Comentário de Manuel Reis ao poste P13623


[, Foto á esquerda: Manuel Augusto Reis, em Guileje, 1973:  foi alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã, Colibuia, 25/10/72 - 27/8/1974]

Amigo e ex-camarada Vasco:

Abriste uma frente de diálogo bastante interessante e que o Luís com o seu saber deu uma ajuda suplementar.

Conheço o Vasco desde os tempos de escola, com um percurso um pouco idêntico, mas trilhando o mesmo caminho: colégio de Anadia e Universidade de Coimbra e,  imagine-se, ....Gadamael. 

Aproveito para lembrar o percurso dos meus familiares no que à guerra diz respeito. Meu avó (materno) foi mobilizado para a 1ª guerra mundial e participou na batalha de La LYs. Consegui ouvir algumas peripécias, dispersas, dos momentos difíceis, que teve de suportar, na sua qualidade de granadeiro. 

No seu regresso era um homem destroçado anímicamente. A minha presença na sala tornava-se incómoda, pelo que me era dada ordem de retirada.

Na casa dos meus avós vivia-se um ambiente republicano, sendo o meu bisavô, Pedro, meu grande amigo, constantemente perseguido. A maior parte das noites eram dormidas em palheiros, afastados da sua residência. Lamento que o diário do meu avó se tenha extraviado, a sua importância, para mim, era bastante significativa.

Seguiu-se o meu pai, que é mobilizado para alinhar na 2º guerra mundial, sendo enviado para Moçambique, durante 3 anos, onde supostamente se previa um desembarque de tropas japoneses. Nada faria supor esta mobilização do meu pai, recém- casado. Não sofreu os traumas da guerra, mas a ausência da família foi dura.

Poucos anos passados, face ás dificuldades económicas, o meu pai emigra para o Canadá onde permanece durante mais de 20 anos. No ano em que eu completava 17 anos e perante o espectro da guerra que pairava sobre a minha cabeça, desloca-se a Portugal e coloca-me a possibilidade de emigrar também. 

O meu pai, homem simples do campo, tem a noção e a preocupação de que a guerra me espera.Possibilita-me que decida .Estar-lhe-ei  eternamente grato. Acabei por recusar, via a guerra ainda muito longe, e com um percurso académico satisfatório, nada o aconselhava. 

A minha entrada na academia, e o meu envolvimento nas lutas académicas, rasgaram-me outros horizontes e quando decidi, contrariado, participar na guerra que já se vivia nas ex-colónias, sabia para o que ia. A decisão era sustentada no plano familiar, pois na qualidade de filho único, não imaginava um afastamento prolongado dos meus pais.

Um grande abraço.

Vasco,  as caçoilas estão prontas!

Manuel Reis

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Nota do editor;

Último poste da série > 22 e setembro de  2014 > Guiné 63/74 - P13634: Selfies / autorretratos (1): por que é que fomos à guerra... (Vasco Pires / Luís Graça / Francisco Baptista / José Manuel Matos Dinis)

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Guiné 63/74 - P13269: Agenda cultural (323): II Colóquio Internacional Colonialismo, Anticolonialismo e Identidades Nacionais “A Guerra e as Guerras Coloniais na África Subsaariana no Século XX (1914-1974)”: Universidade de Coimbra, Departamento das Ciências da Vida, Antropologia, amanhã e depois, 12-13/6/2014






1. Com pedido de divulgação, reproduz-se mensagem, de 7 do corrente,  do nosso leitor  José Matos [e investigador, especialista em aviação militar, filho de uma camarada nosso, já há muito falecido, fur mil José Matos, da CCAV 677 / BCAV 5499, 1964/66]

Boa noite

No final da próxima semana decorre em Coimbra um colóquio sobre “Colonialismo, Anticolonialismo e Identidades Nacionais” promovido pelo Grupo “História e Memória” do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século 20 (CEIS20). 

Já está disponível no site do colóquio o programa e a ficha de inscrição. Agradecia a divulgação deste evento no vosso site.

José Matos



II Colóquio Internacional Colonialismo, Anticolonialismo e Identidades Nacionais
“A Guerra e as Guerras Coloniais na África Subsaariana no Século XX (1914-1974)”



Em Fevereiro 2008, integrado na “X Semana Cultural da Universidade de Coimbra” e organizado pela linha de investigação “Colonialismo, Anticolonialismo e Identidades Nacionais” do Grupo “História e Memória” do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século (CEIS20), teve lugar o Colóquio Internacional “Comunidades Imaginadas. Nação e Nacionalismos em África”.

O livro (parcialmente homónimo) de Benedict Anderson foi o ponto de partida, pretendendo-se teorizar, documentar e ilustrar as múltiplas faces da complexa questão nacionalista e as peculiares tonalidades que estas assumiram no cenário africano. Ao longo de dois dias, especialistas consagrados, jovens investigadores, assim como personalidades de formação diversa, enquadraram a problemática e analisaram, em especial, os países nascidos no rescaldo do fim do colonialismo português.

Sendo intenção dar continuidade a iniciativas similares, os investigadores da mencionada linha pretendem organizar o II Colóquio Internacional Colonialismo, Anticolonialismo e Identidades Nacionais, subordinado ao tema “A Guerra e as Guerras Coloniais em África no Século XX (1914-1974)”.

Com o objectivo de assinalar o centenário do início da I Guerra Mundial e os 40 anos do fim da Guerra Colonial/de Libertação, propõe-se que todos os investigadores interessados dêem o seu contributo com o envio de propostas no âmbito das seguintes temáticas:

1) Das Campanhas de Pacificação” à “Grande Guerra”

2) Cultura, representações e memórias da guerra

3) Demografia, Migrações e Refugiados de guerra

4) A Guerra Colonial/de libertação

5) Psicopatologias em contexto de (pós) guerra



Chamada de Trabalhos : datas importantes

(i) até 31 de Março era  prazo limite para a submissão das propostas;  até 15 de Abril – Comunicação dos resultados; até finais de Abril – Publicitação do programa

(ii) 12 e 13 de Junho – Realização do Colóquio [vd. programa,  em detalhe, em baixo] ;

(iii) 20 de Junho – Data para o envio do texto final para publicação

Data limite para o pagamento da inscrição: 25 de Maio de 2014: (i) Participante com comunicação – 10€; Participante sem comunicação (com certificado e materiais) – 5€

O colóquio terá lugar na:  Universidade de Coimbra, Deprartamento das Ciências da Vida, Antropologia

 Comissão Científica:

Ângela Coutinho | Daniel Gomes | Fernando Pimenta | Joana Damasceno  José Lima Garcia | Julião Soares Sousa |  Sérgio Neto

Comissão Organizadora:

 Alexandre Ramires | Ângela Coutinho | Clara Serrano | Daniel Gomes | Joana Damasceno | José Lima Garcia | Julião Soares Sousa | Marlene Taveira | Sérgio Neto

Programa:

 [, entre outras, chama-se a atenção das comunicação a apresentar, no dia 13, no painel IV - Guerras Coloniais, às 10h00, por José A. Matos  e Matthew M. Hurley, "A arma que mudou a guerra", referência ao Strela; bem como pelo nosso amigo, o historiador guineense Julião Soares Sousa, "A 'guerra de fronteira': Guileje e o corredor de Guileje"; de destacar ainda  a apresentação de testemunhos orais de antigos combatentes da guerra colonial, na tarde do dia 13 ]





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Nota do editor:

Último poste da série > 6 de junho de 2014 >  Guiné 63/74 - P13244: Agenda cultural (322): Lançamento do livro "Guiné-Bissau, um país adiado - Crónicas na pátria de Cabral", de Manuel Vitorino, dia 12 de Junho de 2014, pelas 18h00 na Biblioteca Florbela Espanca, em Matosinhos.