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domingo, 28 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4597: FAP (30): Ferro Q.B. para acalmar as hostes (Miguel Pessoa)

1. Mensagem de Miguel Pessoa (1), ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje Coronel Pilav Reformado, com data de 25 de Junho de 2009:

Luís, Carlos : 

Agora que começa a assentar a poeira do IV Encontro, envio-vos um texto para publicação. Como é habitual, não tendo eu trazido registos do que fiz, tive que puxar pela memória, evitando ao mesmo tempo puxar pela imaginação...
Abraço.
Miguel


FERRO Q.B.

Este texto tem o inconveniente de ser pouco preciso, pois escrevo-o apenas de memória, sem o recurso a documentos, mapas ou outros auxiliares. Também é um testemunho (limitado na sua percepção) de um simples executante que, pela sua posição na hierarquia estabelecida, desconhecia naturalmente as grandes decisões tomadas por quem orientava a guerra.

Não houve a pretensão de compilar dados históricos precisos a nível de um Arquivo Histórico, mas simplesmente referir factos, tentar adivinhar outros e transmitir o que nos ia na alma naqueles momentos.

É um facto (que suponho que muita gente conhece) que a Força Aérea efectuou diversos ataques na raia da Guiné-Bissau, em locais onde estavam estabelecidas bases do PAIGC - nunca contra as populações locais. Os danos co-laterais podem surgir nestas situações - mas desconheço se os houve nestes casos concretos.

Para além das bases de fogos do PAIGC contra aquartelamentos próximos da linha da fronteira, um dos objectivos principais foi a barcaça que transportava pessoal e material que depois entrava no nosso território pelo Corredor de Guileje, nomeadamente até Ponte Balana. Aquele meio de transporte estava localizado próximo de Kandiafara e estrategicamente defendido por anti-aéreas (AAA) localizadas em Kandiafara e Simbeli.

Tendo-se decidido interromper, ou pelo menos limitar esses movimentos, foram realizadas diversas saídas para eliminar esse meio em simultâneo com ataques às anti-aéreas já referidas, de modo a limitar a sua acção contra os outros aviões. Eram missões que impunham um certo respeito, quando se via à nossa volta a fogachada da AAA (frase presunçosa, mais própria dos cenários da 2.ª Guerra Mundial, Coreia ou Vietnam, mas vou deixar ficar... embora reconheça que as pessoas possam ter tendência para exagerar a gravidade das situações em que estiveram envolvidos).

Para mim, que tive por várias vezes as funções de marcador dos voos da Esquadra 121 (vulgo oficial de operações da Esquadra - eu era tenente, mas fui muitas vezes o 2.º na hierarquia da Esquadra), cabia-me nessas funções nomear os pilotos para as missões que nos tinham sido destinadas para o dia. Calculam o meu incómodo ao indicar os nomes dos pilotos para estas missões de visível risco, sabendo que eles podiam ficar lá. Noblesse oblige, indicando eu os pilotos, naturalmente tinha que avançar logo com o meu nome, que é assim que podemos exigir algo aos outros... E nunca tive problemas na aceitação das nomeações que fazia, embora pudesse calcular o que eles estavam a pensar (*).

Integrarmo-nos num cenário de guerra não é acto que se consiga num momento; inicialmente sentimo-nos chocados com o que sucede à nossa volta - e que foge à nossa compreensão - existindo depois uma escalada de acontecimentos que, dia-a-dia, nos vai insensibilizando (ou embrutecendo) e criando em nós defesas que nos levam a aceitar os riscos com um sentimento de inevitabilidade - penso que isso sucedeu com todos nós num determinado momento da nossa comissão - "o que tiver que ser será" (**). No fim, tornámo-nos pessoas diferentes, não necessariamente piores mas certamente mais cépticos (realistas?) em relação ao que podíamos esperar da vida - pelo menos naquelas circunstâncias.

Mas, voltando à nossa história: Felizmente (e também para descanso da minha consciência) nessas missões na raia nunca perdemos nenhum piloto. Inicialmente deslocavam-se helis para eventuais evacuações, no caso de um piloto ter que se ejectar - ficavam de alerta em aquartelamentos do sul. Mas com o tempo (e sem perdas de Fiats) cada vez se afastavam mais esses meios para a base mãe, acabando por se fazer o alerta a partir da BA12; escusado será dizer que estávamos aviados se tivéssemos que nos ejectar sem esse apoio atempado - felizmente sabia o francês suficiente para perguntar a um local o caminho para a Guiné-Bissau...

Simultaneamente foram repetidamente atacados objectivos dentro do nosso território - nomeadamente estradas, pontes, pontos de cambança (travessia) nos rios - localizados em zonas não ocupadas pelas NT, cuja destruição permitisse limitar a progressão do IN. Este grande esforço da Força Aérea e da Esquadra 121 durante um determinado período do segundo semestre de 1973 (não consigo precisar datas - Setembro? Outubro?) teve resultados palpáveis, pois tanto ferro largado fez reduzir visivelmente as flagelações aos aquartelamentos, pelas dificuldades logísticas provocadas ao IN. Mas era um desgaste enorme para os aviões, pilotos, mecânicos e para a logística: havia que repor lotes de combustível e de armamento, fazer a manutenção e/ou reparação dos aviões, dar algum descanso ao pessoal. E não poderia prosseguir eternamente, por isso com o tempo esse esforço teve que ser reduzido - com o consequente aumento dos ataques aos nossos aquartelamentos.

Miguel Pessoa

Bissau > Bissalanaca >BA 12 > 1974 > O então Ten Pilav Miguel Pessoa..

Notas do autor:

(*) Também não havia muitos para escolher... O número de pilotos de Fiat era normalmente de 6 a 9, na melhor das hipóteses (se incluirmos 2 ou 3 oficiais superiores com funções de comando na BA12 e que, naturalmente, não voavam permanentemente na Esq 121) e chegou a estar reduzido a 4 ou 5 no início de Abril de 1973, depois do abate de 2 aviões em finais de Março (com a morte de um piloto e a inibição de outro por um período de 4 meses).

(**) Num artigo para um jornal, já há uns tempos, um jornalista perguntava-me, tendo em conta o que eu tinha passado com a minha ejecção e posterior recuperação, se tinha sentido medo quando voltei a voar naquele território. Respondi-lhe que "sim, pois não sou inconsciente". E como, em jeito de brincadeira lhe disse que "por vezes parecia que iam dois no avião, eu e o meu medo" (frase parva para dizer a um jornalista), isto foi logo puxado para o título do artigo, deturpando o seu sentido.

O que não expliquei ao jornalista (e que lamento agora) foi que, face ao esforço que para mim representou a ultrapassagem deste episódio, no caso de vir a ser novamente atingido e ter que me ejectar (voltando a passar por tudo o que já tinha passado), eu não tinha medo de morrer mas sim de ficar vivo...
__________

Notas de CV:

(1) Vd. poste de 15 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4528: Um velho filme de 8 mm que agora nos surpreende e delicia (George Freire / Miguel Pessoa)

Vd. último poste da série de 7 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4477: FAP (29): Encontros imprevistos (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

terça-feira, 10 de março de 2009

Guiné 63/74 - P4007: Blogoterapia (95): Há mais vida no alfabeto da guerra, para lá dos G: Guileje, Gadamael, Gandembel, Guidaje... (António Matos)

1. Mensagem do António Matos (ex-Alf Mil, CCAÇ 2790, Bula, 1970/72 (*):

Meu caro Luis Graça

Aqui fica algo que tem vindo a demonstrar-se impossível de não fazer bater com o pé a pedir mais atenção a TODOS quantos combateram na Guiné nos idos de 1963-74.

Pouco me impressiona se se perturbarem consciências pesadas, daí que te agradeça publiques este meu desabafo / reflexão.
Um abraço,
António



2. Reflexão,
por António Matos

Acompanho este blogue desde o dia da minha apresentação em 1 de Novembro de 2008.

(i) Fiz artigos, contei estórias, contribuí para a história do pelotão, da companhia, do batalhão, de Bula, da Guiné;

(ii) Falei de lugares e de movimentações militares;

(iii) Ouvi relatos de outros ex-combatentes;

(iv) Prazentei-me com belos trechos de prosa e poesia de muitos camaradas;

(v) Estabeleci polémicas;

(vi) Intervi noutras;

(vii) Reencontrei amigos ao fim de trinta e tal anos;

(viii) Deram-se-me a conhecer alguns nomes mais interventivos no blogue;L

(ix) Conheci realidades individuais fantásticas;

(x) Maravilhei-me a ler relatos de combates;

(xi) Comovi-me com os sentimentos de outros;

(xii) Consegui colocar no mapa da Guiné pontos como Gandamael, Gandambel e Guileje .

(xiii)... Mas, c'os diabos!, houve quem fizesse a guerra igualmente feroz noutros sítios daquele território !!


Estou cansado de ler em todo e qualquer poste eesses nomes como se a guerra da Guiné se limitasse ao tal cerco, à tal retirada, à tal proximidade com a loucura!

Começo a pensar que se está a subvalorizar toda a intervenção de todos os outros milhares de jovens que do mesmo modo combateram, se feriram, se estropiaram, morreram!

Com o maior dos respeitos por quem possa ter tido uma acção militar sem descanso, pergunto, alguém sente que fez férias naquelas paragens ?

Alguém sente que os combates em que participou foram menores do que os outros ?

As balas em Guileje feriam mais do que as de outros lugares ?

Graças a Deus que há humanistas que se têm deslocado à Guiné em obra de apoio àquelas gentes;

Graças a Deus que emergiram escritores que têm abanado as consciências mais anquilosadas;

Graças a Deus que até já houve simpósios (não isentos de críticas ácidas consultáveis na Net ).

A ideia que me foi transmitida no princípio foi de que se pretendiam as estórias na 1ª pessoa para que um dia se conseguisse fazer a história daqueles anos.

Apoiei desinteressada e apaixonadamente esse projecto mas receio que, quem vier ler a catadupa de textos que, felizmente, ultrapassaram a barreira da periclitante assiduidade, conclui que a guerra da Guiné foi Guileje e o resto foi paisagem ...

Às tantas a dar azo a que, afinal, haja quem diga que se morria, não da guerra mas de acidentes viários ...

Não dou conselhos a ninguém mas não me coíbo de sugerir reflexões.

Desde já que a parte editorial do blogue tente "caldear" estas informações de modo a não criar um elefante branco de deturpada realidade que não ajudará ninguém a entender a nossa intervenção no teatro operacional nem a sermos fiéis à memória de tantos e tantos que já não nos acompanham e não conseguem fazer ouvir as suas vozes.

Não posso acabar esta minha intervenção sem me dirigir pessoalmente a dois tipos de ex-combatentes:

- Aos que foram colocados em Guileje e outros G...

Recebam um abraço (não direi do tamanho do Cumbijã porque não sei se é suficientemente grande) mas do tamanho daqui até à Lua ( parafraseando Sardet ) pelo respeito que me merece a vossa heroicidade, mas permitam-me que não esqueça todos os outros que banharam a Guiné com o seu suor, com as suas lágrimas e com o seu sangue !

- A todos os outros

Participem activamente neste nosso/vosso espaço de modo a que a história em que fomos actores seja contada de corpo inteiro e para que amanhã não sejam assaltados por esta sensação estranha do tipo "pequeno ciúme" que agasta, molesta, e nos consome em lume brando ....

Bem hajam !
António

2. Comentário de Luis Graça, editor (Na foto à esquerda, em Bambadinca, Sector L1, no século passado, em cima de um Unimog, c. 1970, ao lado de um grande amigo, Tony Levezinho, ambos Fur Mil da CCAÇ 12):

Assunto - Polarização / saturação do nosso blogue no tema Guileje / Gadamael

Camarada António:

Viva!.. Só posso estar de acordo contigo. A guerra da Guiné (e a nossa vivência dela) ia de A a Z como o alfabeto... Seria seguramente empobrecê-la (em termos da sua geografia, sociografia, historiografia, arqueologia, museologia...) se a reduzíssemos apenas à letra G... Eu pessoalmente, tal como tu e muitos outros camaradas, conhecemos os mais diversos sítios, qual deles o mais exótico, dos cenários de guerra... A guerra estava por todo o lado, do Choquemone ao Fiofioli, de Varela ao Xitole, de Buruntuma a Canjadude, de Tite a Cacine, do Morés ao Cantanhez, do Rio Cacheu ao Rio Corubal, de Bissau a Bafatá, de Teixeira Pinto a Madina do Boé, da Ilha do Como ao Saltinho, da Ponta do Inglês a Piche, de Cufar a Copá, de Fá Mandinga a... Conacri, ou de Lisboa a... Cacine.

A tua crítica é também, em primeiro lugar, à minha orientação editorial que parece, objectivamente, favorecer a publicação de textos sobre a batalha de Guileje/Gadamael... Ora, eu tenho a obrigação, até pelas próprias regras que criei e que fazem parte do nosso contrato de cavalheiros, em garantir o pluralismo das vivências, experiências, memórias, idiossincrasias, sentimentos, perspectivas, informações opiniões de todos e de cada um, a diversidade dos tempos e dos lugares, etc...

A alimentação desta 'máquina voraz' que se tornou o blogue (com expectativas e exigências cada vez mais altas) é um problema precariamente resolvido dia a dia, por um número crescente de colaboradores/autores e uma equipa (reduzida) de três editores, voluntários, a tempo parcial...

A diversidade e a qualidade das mensagens/textos/postes que publicamos também dependem da quantidade. Para garantir igualdade de oportunidades a todos é preciso também um esforço acrescido da nossa pequena equipa. Não basta fazer "copy & paste" das mensagens que nos chegam... O processo não é automático, por causa do "Garbage in, garbage out" (se sai lixo, sai lixo, uma velha máxima que aprendi do meu tempo da imnformática fiscal)...

Concordo que temos andado demasiado polarizados em lugares como Guileje / Gadamael e e centrados, obsessivamemnte, nos meses de Maio / Junho / Junho de 1973, polarização essa que está a atingir a saturação, e que foi provocada em parte por dois acontecimentos: (i) a realização do Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008); (ii) o lançamento do livro de Coutinho e Lima, em finais do último ano.

Dito isto, aceito que temos de fazer uma recentragem dos temas do blogue, apelando à participação activa de gente que esteve noutras frentes, noutras épocas e até em outros ramos das Forças Armadas, para além do Exército. Se já reparaste, não conseguimos trazer à nossa blogosfera os nossos camaradas da Marinha (temos três ou quatro representantes dos nossos bravos marinheiros, mas que andam mudos e calados)... A malta da Força Aérea está a aparecer, de devagarinho... mas com excelentes histórias. Vamos dar-lhes mais tempo de antena.

Concordo contigo que devemos privilegiar os contadores de histórias na 1ª pessoa do singular, sem menosprezar... os treinadores e comentadores de bancada.

Disto isto, vamos ao trabalho!

Um Alfa Bravo. Luís Graça

PS - Até por que o melhor do blogue não és tu, não sou eu, não é o A e o B, o soldado ou o general... Somos todos nós, ex-combatentes, de um lado e de outro... Há muito que eu teria fechado a loja, se nós fossemos apenas meia dúzia de 'poetas mortos' ou, pior ainda, como alguém insinuou, um 'clube de saudosistas'...

_____________

Nota de L.G.:

(*) 1 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3390 Tabanca Grande (95): António Garcia de Matos, ex-Alf Mil da CCAÇ 2790, Bula (1970/72)

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3932: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (23): Resposta do autor do livro a António Martins de Matos (Parte II)

1. Texto de Coutinho e Lima, enviado em 10 de Fevereiro último.

Comentário sobre a apreciação de “ A RETIRADA DE GUILEJE” de António Martins de Matos (Coutinho e Lima)

2ª (e última) Parte (*)


Sobre a maneira de actuar da Força Aérea, foi afirmado:

“…o apoio aéreo em vôo baixo, com metralhadoras e foguetes, ainda que possa aumentar o moral das tropas, é, e será sempre, completamente inadequado”.


O Sr Ten Gen terá que confrontar o Sr General da FA Lemos Ferreira, na altura Coronel Piloto Aviador, Comandante da última parelha de FIAT G-91, que prestou Apoio Aéreo a Guileje, na tarde de 21 MAI 73. No seu depoimento (págs 137/138, resposta à 2ª. Pergunta), declarou:

“…o pedido teve execução com bombardeamento nos locais mais suspeitos e igualmente com metralhamento…”.

Este apoio “completamente inadequado” (na opinião do Sr Ten Gen), foi apreciado, de maneira diversa, por Guileje (pág. 140, último comentário):

“…o pessoal presente na guarnição considerou esta missão de Apoio Aéreo a mais eficaz de todas”.

Não só contribuiu para aumentar o moral das tropas, que tão baixo estava, como também neutralizou o Inimigo, que não mais se manifestou na área bombardeada e metralhada.


“Um homem sem perfil, …”.

Não reconheço ao Sr Ten Gen autoridade para avaliar o meu “perfil”, até por que não me conhece.


Quanto ao “erro de casting” que, segundo o Sr Ten Gen, foi a minha nomeação para o COP 5, não sou a pessoa indicada para comentar.

São ainda apontadas “algumas decisões” que não terão sido as mais correctas”.

Tenho muito prazer em esclarecer tais “decisões”.

“O estabelecimento da sede do COP5 em Guileje em vez de Cacine ou Gadamael”.

Na página 24 do meu livro (nº. 4. Sede do COP 5), está explicada a razão por que a sede foi em Guileje.

“…troca de armamento sem razão aparente…”

Em 24 JAN 73 (3º. dia de existência do COP 5), propus a substituição das 3 Peças de Artilharia de 11,4 cm por 3 Obuses de 14 cm (pág. 25); o motivo desta proposta foi o conhecimento que eu tinha, de que as munições de 11,4cm estavam a acabar, o que não se verificava com as granadas de 14 cm. A proposta incluía também a permanência das Peças, em Guileje, enquanto houvesse munições, juntamente com os Obuses; as Peças regressariam a Bissau, no final da época das chuvas.

O atraso na substituição do material de Artilharia (em 18 MAI 73 só estavam em Guileje 2 Obuses), conjugado com a ordem para as peças seguirem para Bissau (via Gadamael), antes mesmo de se completar a substituição, diminuiu grandemente o apoio de fogo de Artilharia (a arma mais potente que tínhamos), quer em quantidade, quanto em qualidade; em vez de 3 Peças, passaram a existir 2 Obuses, com a agravante de o tiro das primeiras estar perfeitamente regulado (por observação aérea) e a impossibilidade de regular o tiro dos Obuses, por falta de meio aéreo, para o efeito. O fogo de Artilharia, sem regulação de tiro, mostrou-se pouco eficaz, comprovado na reacção à emboscada do dia 18 MAI.

“Suspensão da actividade operacional”

A palavra “suspensão” é da inteira responsabilidade do Sr Ten Gen; o que eu propus, em 27 ABR 73 (Pág 32, mensagem 588), foi.

“…SOLICITO REDUÇÃO MÍNIMO PARTIR 30 ABR ACTIVIDADE OPERACIONAL CCAV 8350…”

A justificação era a proximidade da época das chuvas e o grande atraso das obras em Guileje.

A resposta da REP/OPER foi:

“…AUTORIZADO, MEDIDA POSSÍVEL DEVE CONTINUAR ABERTURA ESTRADA MEJO”,

o que foi feito.

Ficam assim explicadas as decisões que “contribuíram para o agravamento da situação”, com que discordo totalmente. Tais decisões, nomeadamente a terceira (da minha parte houve apenas uma proposta), quando muito, não permitiram detectar os movimentos do Inimigo, na fase de instalação do seu dispositivo. Se não tivesse havido redução da actividade operacional, poder-se-ia ter constatado, mais cedo, a NÃO EVACUAÇÃO DE FERIDOS GRAVES, se os houvesse.

Importa, relativamente a Guileje, conhecer o que pensava o Comando-Chefe.

Na Reunião de Comandos efectuada em 15 MAI 73, sob a presidência do Sr General Spínola, o Sr Chefe da Repartição de Operações afirmou:

“ Se não forem concedidos os reforços solicitados e as armas que permitam às NF enfrentar o In actual, para lhe evitar, a breve prazo, a obtenção de êxitos de fácil exploração psicológica e graves efeitos tácticos da maior influência no moral das NT, julga-se que será necessário remodelar o dispositivo, reforçando guarnições que sob o ponto de vista militar se considerem essenciais e que permitam, à luz de outras concepções de manobra, desencadear mais tarde acções ofensivas com forças de grande envergadura para recuperação de posições enfraquecidas, ou estruturar uma manobra de feição caracterizadamente defensiva baseada na implantação de um certo número de pontos de apoio a sustentar a todo o custo…”.

Os reforços solicitados eram tais que, estou certo, o próprio Comando-Chefe estava ciente que não podiam ser satisfeitos pela Metrópole.

A remodelação do dispositivo, preconizada em 15 MAI 73, já devia ter sido feita; com efeito, as hostilidades em Guidage tinham começado em 8 MAI 73 e, no que diz respeito a Guileje, o Comando-Chefe possuía elementos de informação suficientes para prever o seu início, a curto prazo.

O último “cenário” apresentado, parece que seria o preconizado para Guileje, já que o Sr. Comandante-Chefe, ao nomear o Sr Coronel Paraquedista Rafael Durão para novo Comandante do COP 5, alterou a Missão deste (pág 117 – Resposta à 1ª Pergunta):

“…No dia 21 recebi directamente de Sua Excelência o General Comandante-Chefe ordem para manter a todo o custo o destacamento de Guileje, naquele local, para o que devia verificar as necessidades em meios para lá colocar os abastecimentos de toda a ordem, mais de 200 toneladas…”

A missão de “manter a todo o custo”, era a mais exigente e que, no limite, poderia significar que era preciso aguentar até ao último homem; não era esta a Missão que me estava confiada, pois se o fosse, não poderia ser efectuada a retirada.

Não posso deixar de referir que, naquela data (21 MAI), com o aquartelamento de Guileje sujeito a intensas, constantes e prolongadas flagelações, desde as 20 horas do dia 18 MAI, a preocupação era “ colocar lá os abastecimentos…”, em vez de, em primeira prioridade, desarticular o dispositivo do Inimigo, de modo a aliviar a forte pressão que estava a ser exercida sobre as Nossas Tropas.

Na mesma Reunião de Comandos de 15 MAI 73, o Sr. Brigadeiro Leitão Marques, Comandante Adjunto Operacional do Comando-Chefe (oito dias mais tarde seria nomeado para proceder a Auto de Corpo de Delito contra mim), afirmava, conforme consta na acta da referida reunião:

“…No mínimo, e disso não restam quaisquer dúvidas, o In está a preparar as necessárias condições para conquista e destruição de guarnições menos apoiadas por dificuldades de socorro (GUIDAGE, BURUNTUMA, GUILEJE, GADAMAEL, etc), a fim de obter os êxitos indispensáveis à sua propaganda internacional e manobra psicológica – isto está já ao alcance das suas possibilidades militares.

Quanto às vantagens para a manobra psicológica In, não podemos esquecer que qualquer êxito pode conduzir à captura de prisioneiros em número tal que possa constituir um elemento de pressão psicológica sobre a Nação Portuguesa.

…tal elemento será aproveitado ao máximo para desmoralizar a retaguarda e manter-se-á até serem atingidos os objectivos finais em todas as PU”. (Os negritos são meus).

A decisão de retirar de Guileje tem de ser comparada com a outra modalidade de acção, que era a de permanecer no local. Nas páginas 76 a 82 do meu livro, estão indicados os factores em que baseei a minha decisão.

Embora não dispusesse, na altura, da informação privilegiada do Sr. Comandante Adjunto Operacional, o meu conhecimento das possibilidades do IN, conjugado com a não atribuição de qualquer reforço, a não evacuação de feridos e com os outros factores referidos nas páginas indicadas, levaram-me a considerar a posição insustentável e, em consequência, decidir efectuar a Operação de Retirada.

A alternativa era o cenário exposto pelo Sr. Brigadeiro Leitão Marques. Com a retirada, que foi um êxito, surpreendendo totalmente o Inimigo, foram evitadas as graves consequências, que eu previa como certas, para as Tropas Portuguesas, Milícia e População.

“Todos nós, que estivemos na Guiné, temos alguns fantasmas”.

O Sr Ten Gen faz uma generalização abusiva; na expressão “todos nós”, seguramente que não estou incluído; nunca tive fantasmas.

Também recuso, liminarmente, a designação de “herói”ou “anti-heroi”. Assumi as minhas responsabilidades de Comandante, fiz o que achei que se impunha ser feito e arquei com todas as consequências resultantes da minha decisão.

Relativamente ao que se passou em Gadamael, não quero deixar de fazer algumas considerações, tal como fiz no meu livro (págs 92 a 95 - Comparação entre as situações de GUILEJE e GADAMAEL).

Parece que não se colheram nenhuns ensinamentos do que ocorrera em Guileje. Com a guarnição de Gadamael muito aumentada, em minha opinião, impunha-se a adopção das seguintes medidas:

- Melhoramento das condições de defesa do aquartelamento (vá lá saber-se por que nunca foram construídos abrigos semelhantes aos de Guileje).

- Reforço urgente com tropa especial.

Parece lícito questionar que, se a guarnição de Gadamael tivesse sido reforçada em tempo oportuno (o reforço inicial só foi accionado em 2 JUN 73, sendo que a acção inimiga teve início em 31 MAI, pelas 14 horas), as consequências, para as NT e população, não teriam sido menos graves. Ninguém pensou que as tropas presentes em Gadamael, cujo estado físico e moral foi descrito pelo Sr. Alferes Miliciano Médico Antunes Ferreira (pág. 188), não estavam em condições de enfrentar um ataque em força do PAIGC?

E como se explica a “debandada”, que se verificou em Gadamael, dos Militares e da População, para fora do quartel (matas circundantes e margens do rio).

Responda quem souber.

Um ponto em que estou de acordo com o Sr Ten Gen Martins de Matos, qual é a homenagem ao Batalhão de Caçadores Paraquedistas nº 12, à qual me associo.

Para terminar, quero manifestar o meu apreço e grande consideração pela actuação da Força Aérea Portuguesa; em variadíssimas situações, muitas de extrema dificuldade e risco, tive oportunidade de constatar o seu alto grau de preparação, profissionalismo e espírito de missão. O apoio da FAP, importantíssimo para as Forças Terrestres, é merecedor da nossa maior gratidão.

Coutinho e Lima
Cor Art Ref
____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste anterior > 18 de Fevereiro de 2009 Guiné 63/74 - P3910: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (22): Resposta do autor do livro a António Martins de Matos (Parte I)

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3839: FAP (4): Drama, humor e... propaganda sob os céus de Tombali (Miguel Pessoa, Cor Pilav Ref)



Guiné > Região de Tombali > Arredores de Guileje > 26 de Março de 1973 > Forças do BCP 12 (talvez da Companhia de Caçadores Pára-quedistas 122, estando a CCP 123 a montar segurança) e do grupo de operações especiais do Marcelino da Mata são fotografadas no momento em que recuperam o piloto do Fiat G-91 que tinha sido atingido na véspera por um Strella (*)... Apesar de ferido e fatigado (passou 22 horas, sozinho no mato), o Ten Pilav Miguel Pessoa conseguiu deixar-se fotografar para a posteridade com um sorriso amarelo e sobretudo com uma grande dignidade... A foto é do Srgt Pára-quedista Delgadinho Rodrigues, da CCP 123/BCP 12. O Marcelino da Mata aparece em primeiro plano, à direita do piloto, de óculos e de catana na mão.




Guiné > Bissau > Bissalanca > BA12 > A chegada do hospital, em maca, do Ten Pilav Miguel Pessoa. Do lado direito, a Enf Pára-quedista Giselda Antunes. Foto do Srgt Coelho, da secção fotográfica da BA12.


"Caro Luís: Olhando para as fotos que acabei de te enviar, lembrei-me que não te expliquei a razão de eu segurar uma garrafa de espumante na mão, enquanto era transportado na maca... Não, não fazia parte do meu kit de sobrevivência! E eu também não estava a soro! Na minha transição do local da evacuação para o hospital, o heli aterrou primeiro no aquartelamento do Guileje, onde alguém resolveu presentear-me com a referida garrafa. Devo dizer que nunca cheguei a bebê-la pois, tendo sido mais tarde evacuado para Lisboa, resolvi deixá-la à guarda das nossas enfermeiras pára-quedistas, as quais confirmaram a boa qualidade do produto e o gosto requintado do pessoal do Guileje. Um abraço, Miguel Pessoa".






Comunicado das Forças Armadas Portuguesas, publicado na impressa da época, em que se relatava, em versão cor de rosa, o "acidente" de que foi vítima o Pil Av Miguel Pessoa.



A máquina de propaganda do PAIGC: curioso, que os comunicados para o exterior eram publicados em francês (a Guiné estava numa zona francófona e a cúpula política do PAIGC vivia em Comacri). Trad. de L.G.:

" PAIGC - Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde.

"COMUNICADO - 4 Aviões colonialistas abatidos em menos de 48 horas

"No domingo, 25 de Março [de 1973], por volta das 15h, dois aviões colonialistas (um jacto Fiat G-91, tipo NATO, e um caça-bombardeiro Norte-americiano T-6 Texan/Harvard) foram abatidos pelos nossos combatentes perto do campo fortificado de Guileje, no sul do país. 

"Esta nova vitória da nossa DCA [Defesa Contra Aviões] que, em menos de 48 horas, abateu um total de 4 aparelhos inimigos (ver nosso comunicado de 25 de Março), foi obtida no curso de uma importante acção conduzida pela nossa artilharia pesada contra o campo fortificado de Guileje. Os dois aviões tinham vindo em socorro da guarnição de Guileje para tentar impedir a continuação da operação que causou pesadas perdas humanas e materiais às tropas inimigas"



"Por outro lado, a 22 de Março [de 1973], às 9h00, na secção de Cachamba, do sector libertado de Cubucaré, tropas colonialistas desembarcadas de helicópteros Alouette foram violentamente atacadas pelos nossos combatentes que lhes infligiram uma perda de pelo menos 5 mortos e um grande número de feridos. Apesar dos reforços desembarcados de 12 helicópteros, por volta das 16h30, os nossos combatentes do Exército Popular e das FAL (Forças Armadas Locais) rechaçaram os agressores colonialistas que sofreram outras perdas, incluindoa morte de um sargento.

"27 de Março de 1973. Pelo Comité Execuitivo da Luta, Aristides Pereira".

Fotos: © Miguel Pessoa (2009). Direitos reservados (A pedido do autor, não se divulga no blogue o seu endereço de e-mail)


1. Mensagem do Miguel Pessoa, Cor Pilav Ref (**):

Caro Luís

Tendo conhecimento do texto do José Manuel Pinto Ferreira sobre o Strella, contactei-o para ele o disponibilizar para o blogue. Para isso tinha preparado uma introdução para ti, seguida do texto original, terminando com uns comentários meus. Como ele decidiu reenviá-lo directamente para ti, fico sem saber o que é que seguiu. Se achares que falta qualquer coisa, diz-me (***).

Para complemento do texto do ex-Cap Pinto Ferreira, então Comandante da Esq 121 (já agora, informo que ele saíu da Força Aérea com o posto de Tenente-Coronel), junto 4 fotos:

A primeira é cópia de um comunicado do PAIGC em que relata, em versão hardcore, os resultados obtidos no dia 25 de Março. Como se pode ver por este panfleto de propaganda do PAIGC, os resultados reportados eram muito superiores aos realmente obtidos, de tal modo que, a serem verdade, a Força Aérea teria ficado sem aviões... e ainda ficava a dever uns tantos!

Embora pareça pouco nítida, a foto suporta perfeitamente uma ampliação, sendo totalmente legível (para quem perceba francês...).

A segunda mostra a versão softcore do outro lado, que todos nós devemos ter sentido em muitas ocasiões. O regime suavizava toda a informação negativa que pudesse desmoralizar o cidadão comum. Por isso eu tive uma simples avaria e saí daquilo impecável...

A terceira foi tirada nas matas do Guileje enquanto me transportavam para a orla, onde estava o AL-III para me evacuar. Agradeço ao Sarg Pára-quedista Delgadinho Rodrigues ter-me proporcionado uma boa reportagem do acontecimento (que guardo com grande estima), bem como a oferta dos respectivos negativos, o que me dá à-vontade para te enviar esta foto sem lhe dar cavaco... Mas esta referência ao responsável pela foto é perfeitamente merecida.

A última tem o crédito do Sargento Coelho, da Secção Fotográfica da BA12, que, para além do trabalho operacional de revelação dos fimes tirados pelos Fiat G-91 nas missões de reconhecimento, também se dedicava às reportagens fotográficas dos eventos mais significativos da BA12, e que amavelmente me ofereceu este negativo. Foi tirada na placa da Base quando da minha vinda do hospital, a caminho da enfermaria da Base. Podes ver nela a enfermeira pára-quedista Giselda Antunes, que acompanhou toda a minha evacuação.

Compreendo que, para um texto generalista sobre o Strella, as fotos são demasiado ligadas a um único acontecimento, o que pode parecer um pouco chauvinista da minha parte. No entanto, como deves compreender trata-se do único material de que disponho. Farás o favor de utilizar aquele que achares melhor.

Um abraço

Miguel Pessoa
________

Notas de L.G.:

Título do poste, da responsabilidade do editor

(*) Vd. poste de 29 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3816: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (5): Strellado nos céus de Guileje, em 25 de Março de 1973 (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav)

(**) Vd. postes da série FAP:

23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3783: FAP (1): A diferença entre o desastre e a segurança das tropas terrestres (António Martins de Matos, Ten Gen Pilav Res)

31 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3825: FAP (2): Em cerca de 60 Strellas disparados houve 5 baixas (António Martins de Matos)

1 de Fevereiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3826: FAP (3): A entrada em acção dos Strella, vista do CAOP1, Mansoa, Março-Maio de 1973 (António Graça de Abreu)

(***) A publicar na próxima oportunidade, nesta série, com introdução e notas de Miguel Pessoa.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3768: Fauna & flora (14): Mascote, no prato e até para chapéu. Em Paiúnca, Guileje, Cumbijã...(J. Casimiro de Carvalho/Vasco da Gama)

Acerca do macaco cão

1. Mensagem do José Casimiro Carvalho





Aqui vai uma das minhas mascotes (macaca). Tive-a em Paúnca (Pirada).
Era normal em Guileje, quando andávamos em patrulha, vermos ao longe os macacos. Em grupos de cerca de 15 que, quando nos viam, paravam com ar desafiador e ladravam e depois seguiam.

Um nativo com o escalpe de um macaco cão na cabeça (era uso). Zona de Nhala.

Em Cumbijã matei um macaco cão com um tiro de G-3, tirei-lhe a cabeça e a pele e levei-o para o quartel de Colibuia. Nessa noite foi um petisco.
Coisas da idade. Hoje não o faria.
Espero ter ajudado.

J Carvalho
2. Mensagem de Vasco da Gama
Vi-os, aos macacos-cães, às dezenas entre Colibuia e o Cumbijã. À medida que a estrada ia avançando, eles começavam a escassear.
Nunca os observei com olhar científico, mas na zona acima referenciada, sobretudo numa extensa bolanha, quase todos os dias, a coluna que regressava ao Cumbijã, os avistava a atravessarem em bandos a estrada vindos de sul em direcção ao norte.
Recordo-me perfeitamente da forma ordeira como faziam a travessia da estrada em bicha de pirilau, e como os de maior porte se colocavam no meio da estrada para que os mais pequenos passassem em segurança! Isto eu testemunho.
Um camarada da minha companhia, o primeiro cabo cripto Melo enviou-me uma fotografia e um pequeno texto que eu te vou reencaminhar. No meu aquartelamento deram-me a provar macaco cão. Lembro-me perfeitamente de ter trincado um naco de carne que era só músculo e não fui capaz de engolir o que quer que fosse. Peço desculpa pelo modesto contributo, mas quem dá o que tem....
Vasco da Gama
______
Notas de vb:
Último artigo da série em
19 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3758: Fauna & flora (13): Macaco cão a ladrar, gente do PAIGC a chegar (Joaquim Mexia Alves)

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3407: Em busca de... (51): Os Bravos da CCAÇ 726, Guileje, 1964/66 (Aurélia Duarte / Henrique Almeida Duarte)





Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1864/66) > Fotos do Henrique Almeida Duarte, enviadas com muita ternura pela sua sua filha Aurélia Duarte, na esperança de que "algum companheiro o reconheça"...

Fotos: © Aurélia Duarte (2008). Direitos reservados


1. Mensagem de Aurélia Duarte, com data de ontem:


Assunto - Ex combatente Henrique Almeida Duarte


Olá, Luís:

Há cerca de mais ou menos 3 meses, enviei-lhe um email a pedir ajuda para encontrar amigos do meu pai, Henrique Almeida Duarte, residente em Casebres, concelho de Alcácer do Sal, ex-combatente da Guiné. Eles embarcaram a Dezembro de 64 e regressaram em Janeiro de 66.

Mas não tive sucesso [nas minhas diligências] (*).

Apareceu em minha casa um colega do meu pai, mas eu estava de férias, esse colega era o fotógrafo e lembrou-se perfeitamente do meu pai, mora em Almada, mas infelizmente não deixou contacto.

Aqui estou eu de novo mais uma vez a pedir ajuda. Junto a este email envio-lhe umas fotografias do meu pai, talvez assim algum companheiro o reconheça.

Desde já lhe agradeço pela vossa atenção. Vou deixar aqui os meus contactos:

Aurélia de Fátima Repolho Duarte;
Email: aureliaduarte3@live.com.pt ;
Telemóvel:934762969.


Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 > 1964/65 > Aspecto dos trabalhos de fortificação do aquartelamento e tabanca. Foto Alberto Pires (o Teco), que chegou às mãos do Nuno Rubim, por intermédio do Carlos Guedes, três bravos da CCAÇ 726... que o Henrique Almeida Duarte e a sua filha, Aurélia, gostariam de (re)encontrar e abraçar.

Foto: ©
Nuno Rubim (2006). Direitos reservados


2. Comentário de L.G.:

Cara amiga Aurélia:

Filha de um camarada, nossa filha é. Começo por saudá-la e dizer quanto aprecio as diligências que está a fazer, através do nosso blogue, para encontrar camaradas do seu pai, que tenham pertencido à mesma unidade. Seguramente que os vai encontrar e seguramente que fará bem ao seu pai poder um dia destes abraçá-los e recordar os bons e os maus momentos que passaram juntos, no sul da Guiné. Obirgado pelas fotos que nos mandou com tanta ternura mas também ansiedade.

O seu pedido anterior foi publicado em má altura, no mês de Agosto, mês de férias e de menor actividade do nosso blogue. Voltamos a publicar um segundo pedido, na esperança (e na certeza) de que desta vez será mais bem sucedida.

Temos, entre nós, na nossa Tabanca Grande - que você (ou o seu pai) poderá passar a integrar a partir de hoje, se assim o desejar - um dos comandantes da CCAÇ 726, na altura o Cap Art Nuno Rubim, hoje coronel na reforma. Poderá contactá-lo por email.

Outros dois camaradas do seu pai, nossos conhecidos, são o Alberto Pires (mais conhecido por o Teco) e o Carlos Guedes. O fotógrafo de que fala e que procurou o seu pai quando você estava de férias, pode muito bem ser ele, o Teco. (Não tenho a certeza se ele mora em Almada; pelo que voê me disse ao telefone ele terá mostrado ao seu pai fotografias desse tempo passado em Guileje).

A malta da companhia reune-se todos os anos: este ano, em 24 de Maio passado, realizou-se o 18º Almoço-convívio da CCAÇ 726, em Arados, Benavente, tendo o evento sido organizado pelo Estêvão Lopes e esposa, que vivem em Arados, freguesia de Samora Correia, concelho de Benavente (Contactos: Telef. 263 656 742 / tm: 919 458 799). Sugiro que volte a entrar contacto com este camarada, que de resto já lhe sido indicado pelo nosso diligente co-editor Carlos Vinhal. Pelo que me diz ao telefone, o Estêvão Lopes não terá reconhecido o seu pai só pelo nome. O que é natural: já vão mais de 40 anos. Além disso, na tropa só eramos conhecidos pelo último apelido ou por alcunha. As fotos que nos mandou vão ajudar-nos.

De acordo com a informação que já publicámos no nosso blogue, a CCaç 726, durante a comissão na Guiné (Guileje, 1964/66), sofreu 10 mortos, dos quais 9 em combate. Eis aqui a lista (pode ser que o seu pai se recorde de alguns nomes) (**):

Furr Mil António Gonçalves da Silva, em 29 Nov de 1964, por ferimentos em combate;
1º Sarg Joaquim Balsinhas, em 28 Fev 1965, por explosão de armadilha IN;
1º Cabo Amadeu Jaló, em 28 Maio de 1965, por doença, no HMP, em Lisboa;
1º Cabo Enf Manuel Moreira Marques, em 28 Jun de 1965, por ferimentos em combate;
Sold Cond Armando Gonçalves da Fonseca, em 28 Ago de 1965, por ferimentos em combate;
1º Cabo Elísio Santos Filipe, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Mil Mussa Bela Camará, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Cond José Luís L. Pereira, em 29 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Luciano Florêncio, em 7 Set 1965, por AP, em Cutia, ao serviço do Gr Cmds "Vampiros".
1º Cabo João Seborro, em 7 Nov 1965, por ferimentos em combate.


Aurélia (e Henrique):

Conte connosco e com os bravos da CCAÇ 726. Os amigos e camaradas da Guiné desejam as melhoras do seu pai que, pelo que você me acaba de dizer ao telefone, está num programa de tratamento do stresse pós-traumático de guerra. Dê-nos conta do sucesso dos seus contactos. Até breve. Boa saúde, bom trabalho.

Luís Graça.

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 17 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3137: Em busca de... (34): Camaradas da CAÇ 726 (Aurélia de Fátima)

(...)"Eu sou Aurélia de Fátima Repolho Duarte, filha de Henrique Almeida Duarte que partiu para a Guiné em 29 de Dezembro de 1964 e regressou a Portugal em 1966.

"O meu pai era Atirador e pertencia à Companhia 726, de Infantaria. Saiu para a Guiné do Quartel de Évora.

"Fugiu ao embarque uma vez e teve 16 dias preso na prisão de Caxias e foi libertado, depois de ter sido detectada a doença. Então partiu para a Guiné, como eu já referi.

"É residente em Casebres, concelho de Alcácer do Sal, distrito de Setúbal. Sofre da doença de stress pós-traumático.

"Está um pouco esquecido, mas lembra-se do Furriel Padilha que era de Vila Real, e de quatro colegas, mas não se lembra os nomes deles, apenas se lembra onde viviam. Eram dois colegas de Vendas Novas, um de Pias e um de Castro Verde.

"Aguardo resposta se possível, e desde já muito obrigada pela atenção.

"Sem mais assunto de momento, me despeço com ansiedade, aguardando uma resposta. Muito obrigada" (...).



(**) Sobre a CCAÇ 726 ver postes de:

10 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P862: O nosso novo tertuliano, o Coronel Nuno Rubim

14 de Outubro de 2006 >Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726)

17 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2360: A CCAÇ 726, a primeira Companhia a ocupar Guileje (2): 10 mortos e mais de metade do pessoal ferido em combate (Virgínio Briote)

14 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3060: Convívios (74): CCAÇ 726 (Guileje, 1964/66), em 24 de Maio de 2008, Arados, Benavente (Nuno Rubim)

22 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3082: Convívios (76): Ainda o 18º encontro dos bravos da CCAÇ 726 (Nuno Rubim)

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3286: Convívios (88): Confraternização de Asp Of Mil do 2.º Curso de Rangers de 1967, CIOE, Lamego (Idálio Reis)


1. Mensagem do nosso camarada Idálio Reis, ex-Alf Mil da CCAÇ 2317, Gandembel/Balana, 1968/69, com data de 6 de Outubro de 2008:

Assunto: Uma saudosa confraternização de aspirantes milicianos que integraram o 2.º Curso de Rangers de 1967, no CIOE em Lamego.

Indelevelmente, quanto mais este vagar do tempo se prolonga, maior um ror de saudades se nos afaga.

Essa estulta armadilha que nos agrilhoou quando muito jovens, em plena flor da idade em que se começa a tactear o destino da Vida, é espectro que jamais se sume, tantos foram os companheiros que então se nos atravessaram naquela curta encruzilhada temporal.

Efectivamente, com alguns desses sobejou laços de apertada amizade, que depois do ciclo da tropa, circunstâncias inerentes vieram a esvaecer, por força de porfiados afãs que a cada um houve então que encetar. O recomeço foi tão difícil ...

Hoje, com mais tempo livre, porventura mais propensos para readquirir essa comunhão de afinidades imperecíveis, procuramos apaziguar as dolentes saudades restadas, e assim dando azo ao reencontro, passados 41 longos anos, juntámo-nos para o amplexo do reconhecimento e da renovação, e fundamentalmente, relembrar os que foram brutalmente excluídos por um perecimento antecipado, onde uma guerra imposta fez semear dor, martírio, sangue.

Um dos elementos do grupo, o António Brandão, viria a sofrer um profundo choque, quando soube da morte do Almeida Fonseca, um cabo-verdiano com quem privara muito de próximo, e que acabaria por rumar até Moçambique. Aqui, a cerca de metade da comissão, morreria em combate no dia 5 de Janeiro de 1969, na Serra do Mapé, com mais 6 companheiros da CCaç 2321; este trágico desastre, está bem expresso no melhor Blogue referente à guerra naquela Província.

À sua memória, prometeu-lhe que haveria de raiar um dia para lhe prestar a homenagem, que em seu entendimento merecia, pois sentiu que fora injustiçado por omissão, ao ser um dos que no fim do Curso não fora merecedor da entrega do crachá "Operações Especiais".

Empenhou-se pois este velho Companheiro, que fez a sua comissão em Angola, na tarefa de ir ao encontro dos paradeiros dos que com ele tropeçaram no CIOE, ainda no quartel antigo, onde fomos então escolhidos 70 aspirantes, a dividir por 2 turmas.

Neste seu porfiar, acabou por já encontrar uma parte substantiva. E com a prestimosa ajuda do António Albuquerque, um homem do distrito, entenderam que estava chegado o o momento adequado, e vão ao encontro do Comandante da Unidade, dando-lhe a conhecer que aí desejariam perpetuar as memórias dos companheiros mortos.

E assim, no pretérito fim-de-semana, aglutinou-se um grupo de 20 cidadãos (18 ex-militares do Curso, a que com muito agrado se juntaram 2 instrutores), que foi recebido e homenageado com enorme nobreza pela Unidade, ante uma parada de honra presidida pelo seu militar mais graduado - o Comandante.

Tratou-se de um acto de sublime dignidade, perpassado por um forte e comovente sentimento de saudade, em que pudemos recordar os que tombaram em África: o Rogério de Carvalho, da CART 2338, na Guiné, em 17 de Abril de 1968 (nas imediações de Canjadude), o Almeida Fonseca e o Eusébio Silva (8 de Março de 1969) em Moçambique. Também foram lembrados os já ausentes, subtraídos pelo determinismo da força da Lei da vida.

Após este honroso acto, seguiu-se um suculento almoço, em que satisfeitos pela forma como a jornada decorrera, nos reapresentamos, e com a óbvia conclusão que os anos começavam a pesar e os cabelos a branquear, foi entendido por unanimidade, que seria de bom grado que este convívio se repetisse para sempre.

Em anexo, envio 3 fotografias: numa delas, está presente o Comandante da Unidade em amena cavaqueira com alguns (i) ; uma outra, representa o grupo que esteve presente (ii); outra, apresento à Tertúlia, um dos homens de Guileje, o alferes Torres Veiga da CCaç 2316/BCaç 2835 (iii).

Um forte abraço a todos,
do Idálio Reis.


Lamego > CIOE - Centro de Instrução de Operações Especiais > Foto 1 > O comandante da unidade em amena convaqueira com o grupo

Lamego > CIOE - Centro de Instrução de Operações Especiais > Foto 2 > O grupo de antigos Asp Of Mil do 2.º Curso de Rangers de 1967.


Lamego > CIOE - Centro de Instrução de Operações Especiais > Foto 3 > Um dos homens de Guileje, o alferes Torres Veiga, da CCaç 2316/BCaç 2835.

Fotos e legendas: © Idálio Reis (2008). Direitos reservados.

________________

Notas de CV:

(1) - Vd. postes de

5 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3113: Os funerais dos nossos camaradas Pára-quedistas (4): As exéquias fúnebres (Idálio Reis)

4 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2718: Fórum Guileje (11): Relembrando a velha Guileje do Zé Neto e do Eurico Corvacho, onde perdi 2 soldados em combate (Idálio Reis)

1 de Abril de 2008 > Guíné 63/74 - P2708: Construtores de Gandembel / Balana (5): Ponte Balana não era dos piores sítios do Tombali... (Idálio Reis)

26 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2689: Construtores de Gandembel / Balana (2): O papel da CART 1689 (8 de Abril a 15 de Maio de 1968) (Idálio Reis)

3 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2326: O Hino de Gandembel e a iconografia do soldado atormentado pelo desassossego (Idálio Reis)

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3258: PAIGC: Instrução, táctica e logística (16): Supintrep, nº 32, Junho de 1971: Itinerários de abastecimento (A. Marques Lopes)


Guiné > PAIGC > Algures numa região libertade do sul, presume-se > Foto do inevitável e incontornável Bara István, reporter fotográfico da agência de notícias húngara MTI > 1970 > "Csendes dzsungel folyó, Guinea-Bissau, 1970" (segundo o meu fraco húngaro, "Guiné-Bissau, 1970: o silêncio da floresta e do rio"...). Esta e outras fotos fazem parte da sua fotogaleria, disponível - aparentemente copy left - no seu sítio comercial (em húngaro): Fotó Bara Fotográfiai és számítástechnikai szaküzlet. Em 1969/70 ele andou pela Guiné-Conacri e pelas regiões do sul controladas pelo PAIGC. Esta e outras fotos fazem parte da sua fotogaleria.

Fonte / Source: Foto Bara > Fotogaleria / Photogalery (com a devida vénia / by courtesy )


1. Continuação da publicação do Supintrep, nº 32, de Junho de 1971, documento classificado na época como reservado, de que nos foi enviada uma cópia, através de mais de um dúzia de mails, entre Setembro e Outubro de 2007, pelo nosso amigo e camarada A. Marques Lopes, Cor DFA, na situação de reforma, que é residente da Tabanca de Matosinhos, a maior das tabancas da nossa Tabanca Grande...

Este texto já circulou pela nossa tertúlia, através de mensagem de 29 de Setembro de 2007. Esta série tem vindo a ser publicada, com alguma irregularidade, desde há um ano, e está longe de ter chegado ao fim.

Como temos dito e redito, a divulgação deste e doutros documentos sobre a organização e o funcionamento do PAIGC é meramente ididáctica, não implica, por nossa parte, qualquer juízo de valor. E, não é de mais referi-lo, não é um documento do PAIGC (embora utilize fontes escritas e orais ligadas à guerrilha que então nos combatia); pelo contrário, tem como origem o próprio Com-Chefe da então província portuguesa da Guiné. Trata-se de Supintrep que foi distribuído aos comandos das unidades do CTIG em Junho de 1971.(Supintrep: Do inglês, Supplementary Intelligence Report, ou seja, Relatório de Informação Suplementar.) (LG)


PAIGC: Instrução, táctica e logística (16) > Itinerários de abastecimentos


Revisão e fixação de texto: AML/LG. Notas, em itálico, de AML.
[ Estes são dados muito interessantes e importantes para cada um de nós poder comparar com a sua experiência pessoal quando esteve no terreno.]


a. ITINERÁRIOS DE ABASTECIMENTOS

(1) Generalidades

É a partir de Conacri que, sem quaisquer condicionamentos na utilização dos itinerários da Rep Guiné e com algumas restrições nos da Rep Senegal, são abastecidas as principais bases e, a partir destas, o interior do TO.

O itinerário principal, como que a “espinha dorsal” da cadeia logística montada pelo PAIGC, é aquele que, saindo de Conacri, segue por Boké, Koundara, Kolda, Tanaff e Ziguinchor, estabelecendo uma “cinta” à volta da nossa Província, da qual partem itinerários secundários para o reabastecimento das regiões fronteiriças e daqui para o interior do TO, utilizando os chamados “corredores” de infiltração. Veja-se anexos I e J [mapas inseridos no fim - LG].

É, pois, o conjunto de itinerários que o IN utiliza, tanto no interior como no exterior, para concretização da sua actividade logística, que vai ser apresentado no presente capítulo.


(2) INTER-REGIÃO SUL


Existem em apoio à Inter-Região Sul duas Bases Logísticas de grande importância: Kandiafara e Boké, sendo a primeira orientada para apoio das Frentes de Buba/Quitafine, Catió, Quínara e Bafatá/Xitole e a segunda mais orientada para a Frente Bafatá/Gabu Sul, muito embora seja ponto de desembarque, passagem e controle de reabastecimentos detinados a Kandiafara e dos detinados à Inter-Região Norte. A maioria dos reabastecimentos chegados a Kandiafara, e provenientes de Conacri, são transportados em viaturas, via Boké, ou nos barcos do PAIGC directamente ou também via Boké.

Uma vez em Kandiafara, os abastecimento são armazenados nas instalações do Partido a eles destinados (5.f deste documento) até serem distribuídos pelas diferentes Frentes.

A partir de Kandiafara são os seguintes os itinerários utilizados:


- Para a fronteira




O itinerário Kandiafara-Kansambel é percorrido por viaturas para reabastecimento dos efectivos sediados na região de Kansambel/Mampatá-Bacirgo. Durante a época das chuvas fica intransitável mesmo para viaturas ligeiras visto que a enchente do rio Gudiagol impede a passagem na região entre Sintchuro e Kansambel. Quando isto sucede nem por isso o reabastecimento deixa de se fazer, sendo então o material e os víveres transportados a dorso por carregadores vindos para o efeito de Kasembel.

O itinerário Kandiafara-Bissamaia é utilizado para reabastecimento das unidades sediadas na região de Sansalé e Sector de Quitafine.

A existência e a recente ampliação de instalações do PAIGC em Bissamaia leva a concluir da existência de um complexo logístico para apoio do Quitafine, sendo o material dali trabnsportado em canoas com motor fora de bordo, sempre de noite, através do rio Baraban e rio Carach até Cambom.

Do antecedente era utilizado o porto de Kadinié (Rep Guiné) como ponto de passagem para a ilha de Canefaque, onde existia a principal “arrecadação” do Quitafine.

As limitações impostas pela Rep da Guiné à utilização desse porto pelos barcos do PAIGC vieram alterar o estado de coisas, pelo que os barcos passaram a dirigir-se, como se refreriu, a Cambom.

Como se disse, Boké é uma base logística de passagem, controle e armazenamento que, ao mesmo tempo, apoia a Frente Bafatá-Gabu Sul. Esta Frente, cujo comando se encontra na Base de Kambera, é abastecida por três itinerários que se dirigem a Nhantafará/Dalabare, Kambera e Lela/Vendu Leili, onde está referencida a presença deforças do IN.



- Para o interior

As colunas de reabastecimento para o interior, quer se destinem à Frente do Quínara ou Bafatá/Xitole, quer se destinem a Buba ou à Frente de Catió, uilizam para a infiltração de material o “corredor” de Guileje (**). A utilização deste “corredor” é feita por colunas apeadas e por viaturas, que, partindo de Kandiafara para Simbéli, seguem por TN até Porto Balana, onde o IN terá um hipotético “porto” e donde os reabastecimentos seguem por canoas através do rio Balana ou a dorso até à região de Salancaur/Unal.

No entanto, a maioria das colunas não se limitam a ir a Porto Balana aguardando a chegada do material em viaturas, indo a Simbéli a maior parte das vezes e mesmo a Kandiafara.

Pode esquematizar-e o itinerário seguido pelos reabastecimentos até à região de Salancaur/Unal do seguinte modo:





Em Salancaur/Unal as colunas irradiam para as várias Frentes conforme os itinerário que a seguir se descrevem:



- Para a Frente BAFATÁ/XITOLE


Do antecedente está recortada a linha de reabastecimento entre esta Frente e a fronteira sul, pelos seguintes itinerários:



Os carregadores que vão buscar material à fronteira são recrutados nas tabancas sob controle IN e reunidos normalmente na área de Cancodeia de onde partem. A cambança do rio Corubal é feita de acordo com o itinerário seguido. Se seguem por Portugal-Ualé, cambam na área compreendida entre Mina e Satecutá, se seguem o itinerário Gã Gregório-Bantael Silá o rio Corubal é cambado na área entre Fiofioli e Cancodeia Beafada.

As colunas que utilizam este último percurso logo que chegadas a Bantael Silá cambam o rio Cumbijã e seguem de canoa ou apeadas até à área de Salancaur. A partir de Salancaur tnto um como outro itinerário têm seguimento pelo “corredor” de Guilege até Simbéli, da maneira já descrita.

As colunas gastam dois dias para fazerem o percurso de dia e dois para o regresso, tendo sido referenciado o seguinte itinerário para uma coluna que utilizou o itinerário de Bantael Silá:

- Às 12h00 partida da região de Cancodeia, chegando à noite a Bantael Silá onde comeram e pernoitaram; saída de Bantael Silá no dia seguinte ao romper do dia, com chegada a Simbéli às 12H00;

- Partida de Simbéli na manhã do dia seguinte, tendo pernoitado em Bantael Silá;

- Saída de Bantael Silá na manhã seguinte, com passagem no cruzamento de Buba às 12H00 e chegada a Cancodeia ao anoitecer.

Verifica-se, assim, que as colunas para a Frente Bafatá/Xitole vão até Simbéli onde aguardam o material vindo de Kandiafara.

Após o regresso, o material é depositado na região Mina/Fiofioli, onde existe a principal “arrecadação” da Frente.

Do antecedente está recortada a intenção do IN em abrir uma linha de reabastecimento entre esta Frente e o Boé, o que evitaria a ida das colunas à fronteira sul por um itinerário onde a acção das NT nas sua zonas fulcrais (cruzamento de Buba e Uané) se fez sentir.

Assim, em meados de Setembro de 1969 saíram do Sector 2 (hoje Frente Bafatá/Xitole) dois bigrupos a fim de irem buscar reabastecimentos ao Boé (possivelmente Tourdoutala), os quais, no regresso, accionaram armadilhas colocadas pelas NT junto do itinerário Mansambo/Xitole. O percurso efectuado por este bigrupos foi o seguinte:

- Mina-Galo Corubal– estrada Xitole/Mansambo (a norte do rio Pulom)–Duá– Salifo–Barquege (A)–Láli Buaro (A)–Porto Djarga (onde cambaram o rio Corubal)–Madina Dongo-Tourdoutala, fazendo no regresso o itinerário inverso.

Após esta data, este itinerário, a que se chamou “corredor do Quirafo”, não voltou a ser utilizado, admitindo-se no entanto que o IN venha a procurar utilizá-lo como alternativa.


- Para a Frente do QUÍNARA

O recrutamento e reunião do pessoal é feito nas regiões de Gã Pará e Gã Formoso, após o que as colunas se dirigem ao Injassane pelo seguinte itinerário:

Gã João – Canjeque – Binhalom – Uaná Porto – Farená – Injassane

Em Injassane, as colunas escoltadas por um bigrupo deste Sector deslocam-se através do “corredor” de Missirá (já esquematizado) até à região de Sambaso, onde o bigrupo da escolta regressa ao seu Sector no dia imediato à chegada. Os caregadores dormem em Sambaso e no dia seguinte, ao romper da manhã, saem para a fronteira sem escolta, utilizando dois procedimentos:
- Se há canoas na região do Unal, seguem a via fluvial até Porto Balana e daqui, apeados, até à fronteira pelo “corredor” de Guileje;

- Se não há canoas na região do Unal, os carregadores cambam o io Lenguel para o rio Nhancobá, cambam o rio Cumbijã para Chim-Chim Dari e daqui para Simbéli, através do “corredor” de Guileje.

No regresso é utilizado o mesmo itinerário até Sambaso, local onde os carregadores dormem. Na manhã seguinte seguem para Uané, sendo escoltados no percurso Sambaso-Uané por um bigrupo do Sector de Buba. Uma vez em Uané é novamente o bigrupo de Injassane que toma à sua responsabilidade a segurança da coluna.

A partir de Injassane o itinerário para a região de Gã Formoso é inverso do que já se referiu.

Os itinerários utilizados pelas colunas de reabastecimento da Frente do Quínara podem ser esquematizados do seguinte modo:



- Para a Frente de CATIÓ

Na esquematização dos itinerários seguidos pelas colunas de reabastecimento para esta Frente há a considerar os vários sectores em que ela se divide. Assim, para o Sector de Cubisseco e o Sector de Tombali as colunas convergem em Chugué (1510 1120 E9-92) seguindo por Chacoal - Bantael Silá – Salancaur - Chinchin Dari e daqui pelo “corredor” do Guileje até Simbéli.

No regresso as colunas seguem o itinerário inverso até Chugué, donde irradiam aos seus destinos. Se a coluna se destina a Cubisseco podem ser utilizadas duas linhas de reabastecimento, a saber:



Se a coluna se destina a reabastecimento às unidades de Tombali o itinerário a partir de Chugué segue para Bária, onde se encontra o comando do Sector e possivelmente a arrecadação principal.
O aparecimento de muitas canoas na região de Chugué/Flaque Umbaná denuncia a existência de um “complexo logístico” de apoio à Frente de Catió, o qual se completa com as instalações de Salancaur. Os reabastecimento serão transportados por via fluvial desde Porto Balana, com movimentos normalmente efectuados de noite para Flaque Umbaná-Chugué.

Este itinerário por via fluvial substitui com vantagem o apeado Chugué - Bantael Silá - Chinchin Dari, já referido.

Para o Sector do Cubucaré as colunas passam por Cadique Nalú/Lauchandé - Uangané/Boche Palace - atravessam a estrada Bedanda/Mejo em Bedanda 8 I2-22 - seguem a estrada para Salancaur Cul, a qual abandonam na região do ponto de cota 27 em Bedanda 8 I1-42 - passam a sul do braço W do rio Demba Chiudo – atravessam a vau o braço Leste do mesmo rio – Salancaur – Chinchin Dari e daqui pelo “corredor” do Guileje até à fronteira.

No regresso da fronteira é normalmente feito o itinerário inverso, podendo, no entanto, também ser efectuado o percurso Simbéli – Uali Sachá – Afiá – Quebo – cambança do rio Jabel e rio Jarendioul – Ameda-Lai – Jemberém – Cadique Nalu – Calaque Balanta.

Aproveitando o “complexo logístico” montado no rio Cumbijã, já referido, as colunas para este Sector podem seguir até Salancaur e daqui, em canoas, até Porto Balana, fazendo no regresso o itinerário inverso.

- Para o Sector do Como as colunas seguem via Tobali por:

Chugué – Timbó – Cansalá – Guelache – Cachanga – Gantonaz – Tambacunda – cambança do rio Cobade em Catió 4 F1-33 – cambança do rio Como em I, Caiar 6 H2-98 – Como

ou via Cubucaré por:

Calaque Balanta – cambança do rio Cumbijã em Cacine 3 E9-14 – Camelonco – ilhéu de Caiame – Como


- Para a Frente BAFATÁ – GABU SUL (INTERIOR)


Os grupos dependentes do comando desta Frente, e que actuam no interior do TO (regulados de Bassi, Paiai e Binafa), são reabastecidos a partir de Kambera (comando da Frente) através dos seguintes itinerários:



(3) INTER REGIÃO-NORTE


Para o reabastecimento da Inter-Região Norte o PAIGC utiliza viatura que, a partir de Conakry ou Boké, seguem os seguintes itinerários:




Koundara é o complexo logístico da Inter-Região Norte, sendo a partir daí que são reabastecidas directamente todas as bases das Frentes de Bafatá/Gabu Norte e S. Domigos/Sambuiá e, indirectamente, todas as bases e acampamentos das Frentes Canchungo/Biambe e Morés/Nhacra.

Para concretização de toda a actividade logística da Inter-Região Norte no exterior do TO, são referidos os itinerários que se referem:


- Para a Frente BAFATÁ-GABU NORTE


- Para a Base de Foulamori por:

Koundara – Kifaia – Gaouai – Koumbia – Doumbiagui – Kambambolou – Kankodi – Kitiara – Foulamory

Este itinerário é o normalmente utilizado para o reabastecimento de Foulamory, muito embora esteja detectado um outro que, saindo de Koundara, segue para Sare Bodio – Sare Modi – Soutumourou (até aqui em viatura) – Koumbagni – Foulamory (este último troço apeado), cosiderando-se, contudo, de menor utilização.

- Para a região de Foulamansa/Missirá/Djalajã por:

Koundara – Sambailo – estrada central 18 – Kaorané – Foulamansa/Missirá

Este é o itinerário de abastecimento da base de Foulamansa, havendo indícios que denunciam a abertura de um itinerário que a partir de Missirá conduz à região de Djalajã (Rep Senegal), passando pela região de Niji, em Território Nacional, com o fim de mais facilmente se abastecerem as forças eventuialmente sediadas nos acampamentos de Lengael Serenaf e Banguri.

- Para a região de Suco, Sare Kanta e Sare Djanque:

Para reabastecer as unidades sediadas nestas regiões as viaturas utiizam o itinerário Koundara – Velingara – Pakourou – Kaoné (Sare Kanta). A partir daqui, e dado que a travessia do rio Geba não pode ser feita por viaturas, é necessário organizar colunas apeadas para atingir a região de Sare Djanque.

- Para a região de Sambolecunda:

É utilizado o itinerário Koundara – Linnkirinc – Velinga – Rá – Kounkané – Dabo – Kolda – Dioulacolom – Guiro Bocar – Sale – Quinhé (Sambolecunda)

Está referenciado também o uso de bicicletas para a efectivação das colunas de reabastecimentos ao longo da linha de fronteira, presumindo-se que isso aconteça devido não só ao mau estado dos itinerários durante a época das chuvas, mas também às restrições impostas ao trânsito de viaturas carregadas com material pelas Autoridades Senegalesas.

- Para a Frente S. DOMINGOS/SAMBUIÁ


[Tenho, naturalmente, procurado informar-me mais particularmente sobre a implantação do PAIGC nesta Frente S. Domingos/Sambuiá. Segundo a "História do Batalhão n.º 3846", que esteve no Norte da Guiné de 09ABR71 a 01MAR73 no Sector 06 (S. Domingos), o PAIGC tinha, al´m daquelas que eu conhecia, como SANO e SAMINE, as seguintes bases naquela zona

- Base de SIKOUM (no Senegal, longitudinalmente entre S. Domingos e Ingoré), comandada por Tenda Intabe, com um Bigrupo;

- Base de Poubosse/Campada, onde estava sediado o Corpo do Exército n.º 199-A/70, comandado por Quecuta Mané, e constituído por: 03 Bigrupos, 02 Grupos, 01 Grupo de Morteiros 82, 01 Grupo de Artilharia (canhões s/recuo), o1 Grupo Especial de Bazookas. Segundo a informação INDIO 1 C-4, esta base teria um efectivo de 450 homens. Abaixo um esquema incluído no SUPINTREP N.º 31, referindo, no entanto, o Corpo do Exército n.º 195:




Luís Cabral, cofirma, em "A Crónica da Libertação", que era o CE 199-A, comandado por "Quemo"(e não Quecuta) Mané que actuava na zona de S. Domingos/Sambuiá. Segundo ele, a bandeira deste Corpo do Exército "era toda vermelha, com uma grande estrela vermelha ao centro; ao alto do canto esquerdo tinha uma pequena bandeira do PAIGC; no canto direito, em baixo, a indicação do Corpo do Exército 199-A. Diz ele, no mesmo livro, que havia um Corpo de Comando formado para dirigir a luta no Norte, enquadrado pelos " "peitos vermelhos" (combatentes que se destacaram em acções especiais)". Seria o "Comando da Inter-Região [Norte]" referido na imagem do SUPINTREP N.º 31 (acima)? ou haveria dois Corpos do Exército, o 195 e 199-A, a actuar naquela Inter-Região?...;

- Base de M'Pack, com 01 Bigrupo e 01 Grupo de Morteiro 82;

- Base de Kassoum/Kaguit, com 01 Bigrupo, comandado por Gorgui Unfalde e depois por Malan Djata.

Diz também a História do BCAÇ 3846 que havia as seguintes "linhas de infiltração":

- PIRGUI/UERECHOLI:/Rio GUNAL/Rio PORTO MADEIRA/JOL:

- SIKOUM/SEDENGAL/APILHO/Rio CHURRO:

- BESSOLUM/Rio SAPATEIRO/MATA GAUNHA/Rio CURRO:

- BOUTOUPA/Rio CATEI./Rio POII.ÁO DE LEÁO/CAMBOIANA:

- POUBOSSE/Rio CAMPADA/Rio POll.ÀO DE LEÁO/CAMBOIANA:

- BARRACA BATATA/MAMBAIÁ/Rio JUGUL/CAMBOIANA:

- BABONDA/SUNCUTOTO/Rio BACHAMOR/CAMBOlANA;

- KAGUlT/BUNHAQUE/MATO COLAGE/CAUSSO/CAMBOlANA:.

- KASSOUM/MATO ELIA/Rio BULIGUTE/RI0 DEFENAME/RIO BOLOR/Rio CACHEU:

- KASSOUM/Rio URAMUAI/Rio DEFENAME/Rio BOLOR/Rio CACHEU;

- KASSOUM/Rio URAMUAI/Rio BULIGUTE/Rio DEFENAME/Rio BOLOR/Rio CACHEU;

- SANTIABA MANJAK/Rio COLE/Rio DEFENAME/RIO BOLOR/Rio CACHEU.

A. Marques Lopes]



O IN utiliza para movimentar as suas viaturas de reabastecimento às bases desta Frente a chamada “Estrada Grande”, isto é, a estrada que, a partir de Koundara, segue por Linnkiring – Velingará – Dabo – Kolda – Bantankoutou – Sonco – Sare Tening – Tanaf – Ierã – Samine – Ziguinchor. É pois a partir deste itinerário principal que saem ramificações que conduzem às diferentes bases. Assim,

- Para Faquina:

Kolda – Bantankoutou – Sonco – Lenquerim – Faquina

As viaturas vão apenas até Bantankoutou. Os reabastecimentos a partir daqui são transportados por carregadores que em Lenquerim cambam a bolanha de canoa para passarem à base de Faquina.

- Para Sinchã Djassi (Hermancono):

Kolda – Sare Tening – Hermacono

- Para a base de Cumbamory:
Kolda – Tanaf – Ierã – Mankolecunda – Cumbamori

- Para Dungal:
Kolda – Tanaf – Dungal

- Para Sano:
Kolda – Samine – Sano

- Para Sikoum Bafatá:
Kolda – Tanaf – Samine – Goudomp – Sekoum

O material e víveres vindos da Rep. Guiné (Koundara) passa como vimos em Dinnkiring e Kolda, locais onde é feito pelas autoridades da Rep. Senegal controle das viaturas e material transportado; a partir de Kolda o material é usualmente acompanhado por pessoal do Exército Senegalês, embora em escolta à distância.

No terminal da “Estrada Grande” encontra-se Zinguinchor, sede do comando da Inter-Região Norte, mas que no quadro da logística do PAIGC não parece desempanhar papel relevante dado que, segundo os elementos disponiveis, apenas apoiará os grupos sediados em M’Pack e Kassou.

O reabastecimento das Frentes do interior da Inter-Região Norte é feito por colunas de carregadores através dos “corredores” tradicionais de infiltração e suas variantes, sendo sempre feitos em movimentos vindos do interior, razão pela qual se descrevem estes “corredores” no sentido inverso àquele em que, até aqui, se tem descrito p fluxo dos reabastecimentos.

Estão detectados os seguintes:

“Corredor” de Sitató, com início em Faquina

“Corredor” de Sambuiá, com início em Cumbamory

“Corredor” de Lamel, com início em Sinchã Djassi

“Corredor” de Sano, com início em Sano [pelo lado Este, entre Barro e Bigene - A.Marques Lopes]

“Corredor” de Canja, com início em Pirgui [pelo lado Oeste, entre Barro e Sedengal - A- Marques Lopes]


- Para a Frente de Morés/Nhacra


Para o Sector do Morés são utilizados os “corredores” de Lamel e Sitató, podendo também com menos frequência utilizar o de Sambuiá, segundo os itinerárioa que se referem:


“Corredor” de Lamel
Morés – estrada Mansabá/Farim sensivelmente em direcção a Biribão – Biribão – cambança do rio Camjambari nas proximidades da tabanca de Béssia – Bricama – cambança do rio Jumbembem – cambança do rio Lamel – estrada Jumbembem/Farim – Fambantã, seguindo depois um carreiro até um local nas proximidades da fronteira onde a coluna aguarda a chegada do material. Este vem da arrecadação existente na base de Sinchã Djassi e é transportado até ao referido local em viaturas, sendo ali entregue às colunas que o esperam. O regresso é feito pelo itinerário inverso, tendo o percurso (ida e volta) uma duração de cerca de seis dias. Os locais de pernoita pensa-se que serão em Biribão e Fambantã.

“Corredor” de SITATÓ
O percurso utilizado pelas colunas que do Morés se dirigem a Faquina é feito pelo “corredor” de Sitató segundo o itinerário que se indica:

Morés - Madina – Biribão (onde pernoitam) – Canjambari – Sare Buco – Sumabanta – Sulccó (onde pernoitam) – Faquina

Este itinerário é utilizado na ida e no regresso e leva três a quatro dias a ser percorrido, em cada um dos sentidos.


“Corredor” de SAMBUIÁ

A possibilidade de reabastecer o Morés por colunas que através do “corredor” de Sambuiá passem ao Iado e daqui ao Morés é viável, não estando no entanto referenciada a utilização deste itinerário, a não ser na entrada de algumas personalidades.


[Disse-me o Lúcio Soares, quando estive com ele o ano passado [, 2006], que, em 1968, depois de passar o comando de Sinchã Jobel para o Gazel, e quando já era comandante da base do Morés, sofreu aí uma emboscada quando se dirigia ao Senegal - até lhe disse que, se calhar, tinha sido eu...; numa outra emboscada aí também, foi referenciado o Luís Cabral, que ia de jipe - A. Marques Lopes]


As forças do Sector de Nhacra podem ser abastecidas de Norte, através do “corredor” de Sitató até Canjambari e daqui para Gussará, Uassado até Suarecunda, onde se encontra a principal arrecadação do Sector. Não é este porém o itinerário normal para reabastecer o Sector, mas sim a partir da Inter-Região Sul.

Os carregadores, utilizando canoas, aproveitam o fim da maré vazante e a maré enchente para, a partir da foz do rio Malafo, cambar o rio Geba e entrar no curso do rio Corubal que sobem até ao Injassane, a partir donde as colunas seguem apeadas o itinerário já referido do “corredor” de Missirá.

O regresso é feito novamente em canoas, aproveitando a maré vazante que as leva até meio do curso do rio Geba e daqui, empurradas pelo iníco da enchente, até à foz do rio Malafo.

Os percursos no rio Corubal e rio Geba são feitos durante a noite, sempre condicionados às marés.

Do antecedente estavam detectados dois itinerários que, saindo de Suarecunda, faziam a ligação com o Sector de Morés, conforme o seguinte esquema:





Estes itinerários, que serviam especialmente para que os elementos IN do Morés pudessem vir ao Hospital do Sara, parece contudo que estão abandonados.


- Para a Frente CANCHUNGO/BIAMBE

O Sector do Biambe pode ser reabastecido através dos “corredores” de Canja, Sano, Sambuiá, Lamel ou mesmo Sitató, portanto por todos os “corredores” actualmente referenciados.

Se as colunas vão reabastecer-se a Faquina ou Sinchã Djassi são utilizados os “corredores” de Lamel e de Sitató, a partir de Canjambari/Biribão, locais que atingem Naga por:

Insumeté – Contuba/Muno – Iador – Cossuba – Concolim – Biambe – Queré – Namedão – Morés – Coli Sare – Madina

Se as colunas vão à base de Cumbamory é utilizado normalmente, que na ida quer no regresso, o “corredor” de Sambuiá, segundo os itinerários que se descrevem, até Samoge:

Insumeté – Concolim – Jagali – cambança do rio Cacheu em Binta G3-61 – Udasse – Simbor – Sambuiá – Samoge

Insumeté – Concolim – cambança do rio Cacheu em Binta 2 C6-89 – Simbor – Sambuiá – Samoge

Insumeté – Sibicunto – Tancroal – cambança do rio Cacheu em Binta 5 B6-86 – Buborim – Sambuiá – Samoge

Insumeté – Concolim – cambança do rio Cacheu em Binta 2 B4-94 – Malã – Bolom – Samoge

De Samoge as colunas seguem para Cumbamory onde, após recebido o abastecimento, regressam pelos itinerários inversos.

Se o reabastecimento é feito na base de Sano as colunas de carregadores utilizam em princípio, na ida e no regresso, o “corredor” de Sano por:

Insumeté – Iador – Biur – cambança do rio Cacheu em Bigene 5 I2-47 – Suar – Limane – Bucaur – Singap – Toubakouta, onde, junto duma arrecadação do Partido, recebem o material vindo de Samine.


[Samine é no Senegal, muito perto de Barro, tal como Sano, e, segundo Luís Cabral, em "Crónica da Libertação", o PAIGC tinha aí um armazém de material de guerra - A. Marques Lopes]


Pode também ser utilizada uma variante deste “corredor” por:

Saiamcuto – Barro Grande – cambança do rio Cacheu em Bigene 5 G5-32 – Biur – Iador – Insumeté, ou mesmo o “corredor” de Sambuiá, fazendo os movimentos de ida e regresso por itinerários diferentes.

Se as colunas utilizarem o “corredor” de CANJA podem seguir os itinerários:

Insumeté – Fajã – cambança do rio Cacheu em Bugem [Bigene?...] 5 E8-23 – Ponta Nova – Mansacunda – Sinchã Mamadu – Kossi

Insumeté – Fajã – cambança do rio Cacheu em Bigene 4 D3-92 – Santana – Mansacunda – Sinchã Mamadu – Kossi

Insumeté – Brufa – cambança do rio Cacheu em Bigene 1 H9.81 – Canja – Bissabur – Kossi

Insumeté – Brufa – cambança do rio Cacheu em Bigene 1 H9.81 – Canja – Bissabur – Pirgui

[Era a Titina Silá quem dirigia a Norte o Comité da Milícia Popular e que tinha como missão organizar a passagem de pessoas e mercadorias nas cambanças do rio Cacheu, segundo diz o Luís Cabral no seu livro "Crónica da Libertação". Diz aí também que ele, Luís Cabral, mais o Chico Mendes eram os responsáveis da Frente Norte - A. Marques Lopes]


- Para o Sector de CANCHUNGO

Para os reabastecimentos deste Sector está referenciada a ida de colunas de carregadores a Sinchã Djassi (Hermacono), Cumbamory e Sano, de onde trazem o material e víveres para a região de Caboiana/Churo, onde se encontra a principal arrecadação do Sector.

Os itinerários utilizados são os que já foram descritos pelo que se faz somente referência ao percurso feito até à região de Insumeté.

As colunas partem de Caboiana/Churo, seguindo por Barme, Balem, Banhida, Gaguepe, Jopá. De Jopá partem dois itinerários que, seguindo por Ponta Vicente, Bucula e Ponta Matar ou Gipo-Ponta Neaga, se reunem novamente em Ponta Ponhasse, seguindo por Santarém, Jundum, Empabá até ao Insumeté, seguindo depois os itinerários já descritos.

Eventualmente, admite-se que este Sector possa ser reabastecido pelo “corredor” de Campada por

Caboiana/Churo - cambança do rio Cacheu em Poilão de Leão - Campada – Poubosse

Este corredor, já em tempos utilizado pelo In, não está actualmente a ser usado.





[Para melhor compreensão da organização e papel dos "corredores" , mostro esta imagem abaixo que define como o PAIGC tinha distribuídas as suas Frentes de Luta. Pertence ao SUPINTREP N.º 31 (de que, com tempo, também hei-de dar conhecimento) - A. Marques Lopes]



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Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 16 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3211: PAIGC: Instrução, táctica e logística (15): Supintrep, nº 32, Junho de 1971 (XV Parte): Os Armazéns do Povo (A. Marques Lopes)

(**) Vd. postes de:

16 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2650: Uma semana involvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (6): No coração do mítico corredor de Guiledje

17 de Março de 2008 > Guine 63/74 - P2655: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (7): No corredor de Guiledje, com o Dauda Cassamá (I)

17 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2656: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (8): No corredor de Guiledje, com Dauda Cassamá (II)