quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3408: Ser Solidário (23): Expedição à Guiné-Bissau 2009: 'Vamos Encher um Contentor' (Xico Allen)


1. Mensagem do nosso camarada Xico Allen, ex-1.º Cabo At Inf da CCAÇ 3566, Empada e Catió, 1972/74, com data de 2 de Novembro de 2008, dando conta da realização em curso de mais uma Expedição de Solidariedade à Guiné-Bissau, desta vez organizada, não por ele, mas pelos camaradas da Associação Humanitária Memórias e Gentes, de Coimbra, com quem de resto ele tem colaborado.

Assunto: Expedição à Guiné-Bissau 2009





"O sorriso enriquece os recebedores
sem empobrecer os doadores"






Apartado 45
3046-801 TAVEIRO (COIMBRA)

Contacto: E-mail
j.moreira@sapo.pt
Telem.: 96 402 80 40
Paulo Quintana
Associação sem fins lucrativos
Matriculada na C.R.C. de Coimbra
NIPC 508 343 461

Parceiro especializado da LIGA DOS COMBATENTES para acções humanitárias
____________

Coimbra, 02 de Novembro de 2008

Meus Amigos

Começamos a trabalhar para a Expedição Humanitária Portugal-Guiné-Bissau/2009.

Esta Associação (de todos nós) precisa da colaboração de toda a gente, fundamentalmente de vós, que tão bem conhecem a realidade daquelas gentes, sobretudo as crianças, deficientes e doentes. Vamos, uma vez mais, alegrar aquelas Instituições (que têm rosto e que são credíveis) minimizando as suas carências.

Tenho a certeza que vão empenhar-se para que esta missão seja mais um marco das nossas vidas "fazendo o bem". Temos local de armazenamento, temos pessoas para encaixotar, temos transporte, temos grua e temos contentor… por isso, a ordem é: VAMOS ENCHER UM CONTENTOR!!!

Não interessa quem vai ou quem não pode ir, pretende-se, isso sim, da colaboração de todos vós, para mais esta nobre missão.

É desejo de todos que o contentor esteja já no mar ou em Bissau, quando sairmos de Portugal, para isso, é urgente começar a angariar bens de todo o tipo, inclusivamente, bens alimentares "duradouros".

Apelo aos meus amigos que não fiquem expectantes… peçam aos vizinhos, aos amigos, às empresas, às instituições (inclusivamente hospitalares), enfim, vamos pedir a toda a gente (pois não estamos a pedir para nós).

A nível de secretariado (cartas, e-mails, etc) cá estarei para tratarmos em conjunto, se assim vós o entenderdes.

Não vos enfado mais!!!

Recebam um grande abraço do
Moreira
______________

Nota de CV

Vd. último poste da série de 11 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3297: Ser solidário (22): A Tipografia da ADFA (Luís Nabais)

Guiné 63/74 - P3407: Em busca de... (51): Os Bravos da CCAÇ 726, Guileje, 1964/66 (Aurélia Duarte / Henrique Almeida Duarte)





Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1864/66) > Fotos do Henrique Almeida Duarte, enviadas com muita ternura pela sua sua filha Aurélia Duarte, na esperança de que "algum companheiro o reconheça"...

Fotos: © Aurélia Duarte (2008). Direitos reservados


1. Mensagem de Aurélia Duarte, com data de ontem:


Assunto - Ex combatente Henrique Almeida Duarte


Olá, Luís:

Há cerca de mais ou menos 3 meses, enviei-lhe um email a pedir ajuda para encontrar amigos do meu pai, Henrique Almeida Duarte, residente em Casebres, concelho de Alcácer do Sal, ex-combatente da Guiné. Eles embarcaram a Dezembro de 64 e regressaram em Janeiro de 66.

Mas não tive sucesso [nas minhas diligências] (*).

Apareceu em minha casa um colega do meu pai, mas eu estava de férias, esse colega era o fotógrafo e lembrou-se perfeitamente do meu pai, mora em Almada, mas infelizmente não deixou contacto.

Aqui estou eu de novo mais uma vez a pedir ajuda. Junto a este email envio-lhe umas fotografias do meu pai, talvez assim algum companheiro o reconheça.

Desde já lhe agradeço pela vossa atenção. Vou deixar aqui os meus contactos:

Aurélia de Fátima Repolho Duarte;
Email: aureliaduarte3@live.com.pt ;
Telemóvel:934762969.


Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 > 1964/65 > Aspecto dos trabalhos de fortificação do aquartelamento e tabanca. Foto Alberto Pires (o Teco), que chegou às mãos do Nuno Rubim, por intermédio do Carlos Guedes, três bravos da CCAÇ 726... que o Henrique Almeida Duarte e a sua filha, Aurélia, gostariam de (re)encontrar e abraçar.

Foto: ©
Nuno Rubim (2006). Direitos reservados


2. Comentário de L.G.:

Cara amiga Aurélia:

Filha de um camarada, nossa filha é. Começo por saudá-la e dizer quanto aprecio as diligências que está a fazer, através do nosso blogue, para encontrar camaradas do seu pai, que tenham pertencido à mesma unidade. Seguramente que os vai encontrar e seguramente que fará bem ao seu pai poder um dia destes abraçá-los e recordar os bons e os maus momentos que passaram juntos, no sul da Guiné. Obirgado pelas fotos que nos mandou com tanta ternura mas também ansiedade.

O seu pedido anterior foi publicado em má altura, no mês de Agosto, mês de férias e de menor actividade do nosso blogue. Voltamos a publicar um segundo pedido, na esperança (e na certeza) de que desta vez será mais bem sucedida.

Temos, entre nós, na nossa Tabanca Grande - que você (ou o seu pai) poderá passar a integrar a partir de hoje, se assim o desejar - um dos comandantes da CCAÇ 726, na altura o Cap Art Nuno Rubim, hoje coronel na reforma. Poderá contactá-lo por email.

Outros dois camaradas do seu pai, nossos conhecidos, são o Alberto Pires (mais conhecido por o Teco) e o Carlos Guedes. O fotógrafo de que fala e que procurou o seu pai quando você estava de férias, pode muito bem ser ele, o Teco. (Não tenho a certeza se ele mora em Almada; pelo que voê me disse ao telefone ele terá mostrado ao seu pai fotografias desse tempo passado em Guileje).

A malta da companhia reune-se todos os anos: este ano, em 24 de Maio passado, realizou-se o 18º Almoço-convívio da CCAÇ 726, em Arados, Benavente, tendo o evento sido organizado pelo Estêvão Lopes e esposa, que vivem em Arados, freguesia de Samora Correia, concelho de Benavente (Contactos: Telef. 263 656 742 / tm: 919 458 799). Sugiro que volte a entrar contacto com este camarada, que de resto já lhe sido indicado pelo nosso diligente co-editor Carlos Vinhal. Pelo que me diz ao telefone, o Estêvão Lopes não terá reconhecido o seu pai só pelo nome. O que é natural: já vão mais de 40 anos. Além disso, na tropa só eramos conhecidos pelo último apelido ou por alcunha. As fotos que nos mandou vão ajudar-nos.

De acordo com a informação que já publicámos no nosso blogue, a CCaç 726, durante a comissão na Guiné (Guileje, 1964/66), sofreu 10 mortos, dos quais 9 em combate. Eis aqui a lista (pode ser que o seu pai se recorde de alguns nomes) (**):

Furr Mil António Gonçalves da Silva, em 29 Nov de 1964, por ferimentos em combate;
1º Sarg Joaquim Balsinhas, em 28 Fev 1965, por explosão de armadilha IN;
1º Cabo Amadeu Jaló, em 28 Maio de 1965, por doença, no HMP, em Lisboa;
1º Cabo Enf Manuel Moreira Marques, em 28 Jun de 1965, por ferimentos em combate;
Sold Cond Armando Gonçalves da Fonseca, em 28 Ago de 1965, por ferimentos em combate;
1º Cabo Elísio Santos Filipe, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Mil Mussa Bela Camará, em 28 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Cond José Luís L. Pereira, em 29 Ago 1965, por ferimentos em combate;
Sold Luciano Florêncio, em 7 Set 1965, por AP, em Cutia, ao serviço do Gr Cmds "Vampiros".
1º Cabo João Seborro, em 7 Nov 1965, por ferimentos em combate.


Aurélia (e Henrique):

Conte connosco e com os bravos da CCAÇ 726. Os amigos e camaradas da Guiné desejam as melhoras do seu pai que, pelo que você me acaba de dizer ao telefone, está num programa de tratamento do stresse pós-traumático de guerra. Dê-nos conta do sucesso dos seus contactos. Até breve. Boa saúde, bom trabalho.

Luís Graça.

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 17 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3137: Em busca de... (34): Camaradas da CAÇ 726 (Aurélia de Fátima)

(...)"Eu sou Aurélia de Fátima Repolho Duarte, filha de Henrique Almeida Duarte que partiu para a Guiné em 29 de Dezembro de 1964 e regressou a Portugal em 1966.

"O meu pai era Atirador e pertencia à Companhia 726, de Infantaria. Saiu para a Guiné do Quartel de Évora.

"Fugiu ao embarque uma vez e teve 16 dias preso na prisão de Caxias e foi libertado, depois de ter sido detectada a doença. Então partiu para a Guiné, como eu já referi.

"É residente em Casebres, concelho de Alcácer do Sal, distrito de Setúbal. Sofre da doença de stress pós-traumático.

"Está um pouco esquecido, mas lembra-se do Furriel Padilha que era de Vila Real, e de quatro colegas, mas não se lembra os nomes deles, apenas se lembra onde viviam. Eram dois colegas de Vendas Novas, um de Pias e um de Castro Verde.

"Aguardo resposta se possível, e desde já muito obrigada pela atenção.

"Sem mais assunto de momento, me despeço com ansiedade, aguardando uma resposta. Muito obrigada" (...).



(**) Sobre a CCAÇ 726 ver postes de:

10 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P862: O nosso novo tertuliano, o Coronel Nuno Rubim

14 de Outubro de 2006 >Guiné 63/74 - P1173: A fortificação de Guileje (Nuno Rubim, Teco e Guedes, CCAÇ 726)

17 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2360: A CCAÇ 726, a primeira Companhia a ocupar Guileje (2): 10 mortos e mais de metade do pessoal ferido em combate (Virgínio Briote)

14 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3060: Convívios (74): CCAÇ 726 (Guileje, 1964/66), em 24 de Maio de 2008, Arados, Benavente (Nuno Rubim)

22 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3082: Convívios (76): Ainda o 18º encontro dos bravos da CCAÇ 726 (Nuno Rubim)

Guiné 63/74 - P3406: Notícias da região de Tombali, Setembro de 2008: Chamarra e Guileje/Mejo (Nuno Rubim)

Guiné-Bissau > Setembro de 208 > Os dois "expedicionários" nas motorizadas que utilizaram: Moisés Caetano Pinto (Tino) e o Honório Correia (ambos trabalham na AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau).
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Chamarra > Setembro de 2008 > Uma placa que eles encontraram em Chamarra, os "Gatos Negros". Julgava eu que esse era o emblema da CCaç 5, mas os dizeres mostram CArt 16... ( creio que é 1612 ). Talvez algum camarada possa
explicar o facto (**).
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mejo > A Awa, viúva do Régulo Suleimane, de Guileje. A foto da direita foi tirada em Mejo e por ela se pode ver que os medicamentos que o Honório e Tino levaram para o tratamento da vista dela deu resultado (na ida levaram os remédios indicados por um oftalmologista, indicaram a posologia e no regresso puderam constatar dos resultados da sua aplicação).

Fotos (e legendas): © Nuno Rubim (2008) . Direitos reservados.


1. Mensagem do Nuno Rubim, Cor Art Ref, membro da nossa Tabanca Grande, especialista em história da artilharia, ex-comandante da CCaç 726 (Guileje, desde o final de Jan 66 até Junho de 1966) e da CCaç 1424 (também em Guileje, de Junho até Dezembro de 1966). (Anteriormente tinha comandado a CArt 644 Mansabá, e a CCmds).


Aproveitando as suas férias, o nosso já conhecido Moisés Caetano Pinto (Tino) e o Honório Correia, que também trabalha na AD - Acção para o Desenvolvimento, deslocaram-se no final de Agosto / início de Setembro ao Sul da Guiné e realizaram algumas pesquisas que eu lhes pedi.

Tratou-se, fundamentalmente, de entrevistarem ex-combatentes de ambos os lados, Régulos e outra pessoas, fazerem o levantamento das Tabancas existentes junto às estradas e caminhos (para o que levaram Fichas de Tabanca a preencher ), visitar locais de antigos quartéis portugueses e bases do PAIGC, etc ...

Desempenharam-se da tarefa de forma muito positiva, entregando-se totalmente a esse trabalho, mau grado várias as dificuldades, a mais gravosa das quais a época pouco propícia (chuvas).

Considero altamente positivo o resultado final da "expedição" e com um pouco mais de experiência ambos poderão vir a constituir uma mais-valia importante nos trabalhos de campo que porventura venham a realizar. Espero eu contar com eles na próxima vista à Guiné.

O planeamento durou cerca de dois meses e o projecto aprovado foi realizado
praticamente na íntegra. Foram executadas várias medições GPS, tiradas mais de 300 fotografias e gravadas várias entrevistas.

Desta feita envio-vos três fotos interessantes [publicadas acima].

Um abraço

Nuno Rubim

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 3 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3168: Ser solidário (20): Bissau: O triste caso da Cadi e a ajuda extraordinária do Tino, que trabalha na AD (Nuno Rubim)

(**) Vd. poste da I Série do blogue > 19 de de Janeiro 2006 > Guiné 63/74 - CDLXI: O meu diário (José Teixeira, enfermeiro, CCAÇ 2381) (8): Chamarra, Janeiro de 1969

(...) Guiné-Bissau > Chamarra > Novembro de 2000 > Vestígios da presença dos tugas, a CART 1612 (?), "bravos e leais" ... É espantosa a emoção com que se mostram (os guineenses) e se (re)descobrem (os portugueses) estes toscos marcos da nossa passagem por terras da Guiné...

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3405: Efemérides (12): Nuno Álvares Pereira, um dos primeiros Portugueses em África (José Martins)

Um dos nossos primeiros Combatentes em África: Nuno Álvares Pereira, o Condestável e o Beato Nuno

Nasceu em 24 de Junho de 1360 – Dia de S. João;
Morreu em 1 de Abril de 1431 – Domingo de Páscoa ou
1 de Novembro de 1431 – Dia de Todos os Santos.



Durante a sua vida, foi pagem, combatente e, depois de ficar viúvo, distribuiu os seus bens e recolheu-se ao Convento do Carmo, edificado a suas expensas, sem contudo professar, em 15 de Agosto de 1423, adoptando o nome de Irmão Nuno de Santa Maria.

No Calendário Carmelita, que se encontra em Itália na Biblioteca da Parma e composto entre os anos de 1456 e 1478, que se destinava na ser usado pelos Carmelitas Portugueses, refere que já se celebrava a festa de Sanctus Nonius O Carm (São Nuno da Ordem dos Carmelitas) no dia 1 de Abril, prova de que havia sido inscrito no registo da Vida dos Santos Carmelitas.

Em 21 de Julho de 1437, o Rei D. Duarte envia uma carta ao Abade D. João Gomes em que lamenta não ter recebido cópia do despacho oficial dado pelo Papa Eugénio IV, com pontificado entre 3 de Março de 1431 a 23 de Fevereiro de 1447, afim de iniciar o processo de Canonização do Santo Condestável, forma como era conhecido pelo povo português, ainda em vida e após a sua morte.

Nas cortes realizadas em 1641, o rei D. João IV solicitou ao Papa Urbano VIII, com pontificado entre 6 de Agosto de 1623 a 29 de Julho de 1644, a canonização de Frei Nuno de Santa Maria, sendo este pedido renovado em 20 de Janeiro de 1674, pelo rei D. Pedro II ao Papa Clemente X, com pontificado entre 29 de Abril de 1670 e 22 de Julho de 1676.

A 15 de Janeiro de 1918 a Sagrada Congregação dos Ritos aprovou a Festa de D. Nuno a realizar em 6 de Novembro, com base na confirmação de Culto Antigo. Bento XV, com pontificado entre 3 de Setembro de 1914 e 22 de Janeiro de 1922, seis dias mais tarde, a 23 de Janeiro de 1918, eleva às honras dos altares como Bem-aventurado ou Beato, e dado como exemplo aos militares que combatiam na I Grande Guerra.

No ano de 1940, durante a 2ª Guerra Mundial o Papa Pio XII declarou que o Beato Nuno devia “ser modelo a seguir por todos os militares que combatiam na guerra”, e tentou a canonização por decreto, como “exemplo do soldado cristão num tempo de guerra”.

Os Prelados Portugueses também solicitaram a reabertura de canonização ao Papa Pio XII, com pontificado entre 2 de Março de 1939 e 9 de Outubro de 1958, que foi autorizada em 28 de Maio de 1941, mas obstáculos colocados pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, impediram que fosse canonizado por decreto pontifício.

No ano de 1960, quando se iniciou a comemoração do 6º centenário do seu nascimento e as suas relíquias percorreram o país, a Ordem do Carmo reabriu, de novo, o processo, mas o início da Guerra do Ultramar e toda a polémica que a envolvia, e com receio que se valorizasse mais o seu papel como soldado do que como religioso, impediu o avanço do processo.

Nuno Alvares Pereira, ao desembarcar em Ceuta em 21 de Agosto de 1415, tornou-se num dos primeiros combatentes portugueses em terras de África.

É patrono do Exército Português, e, provavelmente, o próximo Santo Português, terá a sua festa no próximo dia 6 de Novembro, com liturgia própria.

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Nota de vb: Vd. poste anterior desta série

25 de Setembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3239: Efemérides (11): Comemoração do 35.º Aniversário da declaração unilateral da Independência da República da Guiné-Bissau (Casa da Guiné-Bissau, Coimbra)

Guiné 63/74 - P3404: Recortes de imprensa (9): Em Gandembel - O adeus à Guerra (José Teixeira / César da Silva)

1. Mensagem com trabalho reenviado pelo nosso camarada José Teixeira, ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/70, em 2 de Novembro de 2008, com um desabafo de que seria a segunda vez que o estaria a mandar. Ao Zé, as nossas desculpas.


2. Através do Almeida, o camarada da CCaç 2317, que nos tem deliciado com a canção de Gandembel, na Tabanca de Matosinhos, chegou-me à mão uma reportagem do Diário Popular com data de 17 de Março de 1969 sobre Gandembel, assinada pelo jornalista César da Silva.

Gandembel é um local mítico da Guerra na Guiné, que alguns dos camaradas que em 1 de Março passado visitaram aquando do Simpósio sobre Guiledge.

O Título Em Gandembel – O Adeus à guerra seduz qualquer ex-combatente que tenha andado pela Guiné nessa época, a ler o referido artigo que abaixo descrevo.

O seu conteúdo espelha bastante bem o inferno de Gandembel. Estranho para mim, é o facto de a Censura política ou a Pide terem deixado passar este artigo, em pleno tempo de guerra, com uma descrição tão rigorosa do que era a guerra naquele local, que eu, estando em Mampatá Forreá e participando nas colunas de reabastecimento de algum modo testemunhei. Talvez porque Gandembel à data da vinda a lume do artigo, já estivesse desactivada.

Pode ler-se por exemplo: Afinal isto dará uma ideia do que efectivamente é a guerra no Ultramar? Pois eu permito-me pensar, de acordo com o que pude observar directamente na Guiné, que o conflito naquela Província não será melhor nem pior que o do Vietname, desde os quadros dirigentes, aos operacionais, desde a mentalização dos soldados inimigos, ao material por ele utilizado, o que é exactamente o mesmo.

Ao ler o artigo ficamos a saber que os fortes de Gandembel e Balana foram construídos com o objectivo de libertar, já nessa altura (princípios de 1968) a pressão sobre Guiledge, o que veio a acentuar-se após o abandono destas praças, em fins de 1968 e culminou com o seu abandono forçado em 1973.

Interessante também a descrição exagerada, a meu ver, das acções dos Páras, bem como a hilariante história do leite para o comandante Nino, que foi efectivamente verdadeira. Tanto quanto sei, porque acompanhava de perto a movimentação dos Páras e o seu enfermeiro era um camarada amigo, colega de curso, que mais tarde foi gravemente ferido numa A/C a caminho de Fulacunda, onde morreram creio que sete camaradas, tais encontros com o IN aconteceram e muitos mais, pois todos os dias ouvíamos em Mampatá o matraquear da metralha. Foi de facto apanhado manga de material, bem como o leite para o Nino. A quantidade de IN mortos, tal como é descrito, é que me parece exagerada. Talvez o Idálio Reis ou o Hugo Guerra nos possam dar uma ajuda, repondo tanto quanto possível a verdade dos factos.

Zé Teixeira




3. EM GANDEMBEL – O ADEUS À GUERRA

por Cesár da Silva ( com a devida vénia e homenagem pela sua coragem em ter ido até Gandembel e por ter escrito um artigo tão realista)

A operação “Bola de fogo” foi lançada pelas Forças armadas no dia 8 de Abril de 1968. Na madrugada do dia nove, após violento combate, foi fixada, com carácter provisório, a posição de Gandembel. Situava-se o referido ponto estratégico da estrada da estrada que, vinda de Kandiafara e passando por Cimbéli, na República da Guiné, liga a rodovia Mampatá-Cameconde, no nosso território. Em Kandiafara encontrava-se o grande depósito de material de guerra de Amilcar Cabral no Sul e Cimbali era o quartel general do comandante de todas as operações da zona.

Esta posição (a) permanentemente ocupada por soldados do exército, por vezes reforçada por tropas especiais, destinava-se a impedir a utilização inimiga do já famoso corredor de Guilege, o mais importante ao Sul da Guiné, na tentativa de evitar infiltrações de efectivos humanos e matérias no nosso território. No entanto, dada a proximidade da fronteira, o inimigo desencadeava diariamente violentos ataques de armas pesadas, quase sempre do outro lado da linha de demarcação, pelo que foi resolvido mudar o centro de operações dois quilómetros mais para norte, sobre a estrada do Balana, pois era mais seguro lançar os movimentos a partir daí e continuar a controlar o que para o inimigo constituía importante via de comunicação com grupos do interior.

Esforços e sacrifícios indizíveis

A fixação dos efectivos no actual ponto não foi, de modo algum, obra fácil. Pelo contrário, exigiu esforços e sacrifícios indizíveis. Para que o leitor possa fazer uma ideia aproximada, dir-lhe-emos apenas, o seguinte: Gandembel, tem a superfície de 40 decâmetros quadrados e está toda minada de valas e cercada de arame farpado, com espaços armadilhados; os soldados vivem em abrigos fortificados, construídos com milhares de toneladas de toros de árvores, pedra e terra removida. Pois tudo isso feito a braços, visto que os nossos rapazes, só dispunham de uma moto serra e duas viaturas. No gigantesco trabalho participaram todos os soldados com a respectiva arma numa das mãos e, na outra, uma pá, um machado, uma picareta, ou simplesmente, nada. Trabalharam continuamente de dia e de noite, mas apenas nos intervalos dos combates que eram obrigados a travar, ou que eles procuravam por força das circunstâncias, pois Gandembel nunca deixou de constituir alvo permanente para o inimigo, que contra ele ainda hoje dirige brutais ataques, quase sempre apoiados por armas pesadas.

O maior potencial de fogo inimigo na Guiné

É na zona de Gandembel que o inimigo possui o maior potencial de fogo e foi contra esta posição que utilizou, pela primeira vez na Guiné, o morteiro 120mm. Foi, também na mesma zona que plantou o maior número de fornilhos (minas reforçadas com torpedos de TNT), que se destina a cortar itinerários, pois tem grande potência e, portanto poder destruidor (b). Também é utilizada contra colunas militarizadas.

Muitas vezes no decurso das flagelações nocturnas o inimigo tentou penetrar no aquartelamento, chegando mesmo a cortar o arame farpado da primeira fiada e estabelecer abrigos pessoais perto da segunda, portanto praticamente dentro da unidade. Foi sempre repelido.

O auxilio das forças especiais

Os pára-quedistas deixaram quatro mortos em Gandembel e levaram alguns feridos, mas foram capazes de façanhas como a seguinte: numa nomadização orientada até algumas centenas de metros da fronteira, surpreenderam certa madrugada um bi-grupo inimigo (cerca de oitenta homens). Dizimaram-no completamente em menos de uma hora e estabeleceram contacto com outro que vindo da República da Guiné, pretendia socorrer aquele. Para esses já não foi tão mau, pois regressaram com sete elementos ao outro lado da fronteira, sem ferimentos graves. Cerca de seis toneladas de armas e munições e um grande carregamento de víveres, além de documentação importante, foi o balanço do espólio. É inacreditável, mas o que se segue, pode ser testemunhado pelos rapazes de Gandembel e pelos “Páras”. Do carregamento apreendido faziam parte víveres de vária espécie e leite para o comande “turra” João Nino. Alguns dias depois, ao anoitecer, alguns “turras” gritavam da orla da floresta

“pára-quedista gatuno dá-nos o leite do Nino. Dá-nos o leite do Nino, que ele precisa, está doente”

Pois os “Páras”quiseram levar-lho, mas eles, que tanto tinham implorado, não esperaram e fugiram.

Dois exemplos do que é a guerra na Guiné

Os rapazes de Gandembel supriram dificuldades à custa de um esforço heróico inigualável de abnegação e sacrifício sem conta. Apesar de debilitados fisicamente, pois desde o dia oito de Abril do ano passado, que não sabem o que é uma cama e muito menos um lençol, continuam a operar com elevada moral, até vinte e quatro horas por dia, prontos para entrar em combate. E para se avaliar em definitivo da capacidade do inimigo na zona, do elevado nível técnico dos seus quadros, que em tudo se aproxima, sem sombra de exagero do que acontece no Vietname, daremos apenas dois exemplos:

Uma coluna rodava de Guiledge para Gandembel com abastecimentos, protegida por dois grupos de combate. Em dada altura, o IN emboscado, disparou intensa fuzilaria, e, subitamente abriu numeroas colmeias de abelhas, atrás das quais fez explodir potes de fumo. Os soldados, martirizados pelos insectos não podiam permanecer no mesmo sítio para se protegerem.

Frequentemente, o IN inicia a flagelação com armas pesadas ao cair da noite e termina somente na madrugada. No dia 15 de Julho do ano passado, Gandembel sofreu um ataque desses, que agora já é par de vários outros. Mas, à altura, foi considerado o maior da Guiné desde o princípio da guerra. Forma disparados sobre a posição 236 granadas de canhão sem recuo e mais de 300 de morteiro 82 e 120.

Afinal isto dará uma ideia do que efectivamente é a guerra no Ultramar? Pois eu permito-me pensar, de acordo com o que pude observar directamente na Guiné, que o conflito naquela província, não será melhor nem pior que o do Vietname, desde os quadros dirigentes aos operacionais, desde a mentalização dos soldados inimigos ao material por ele usado, que é exactamente o mesmo.

Visita do Bispo de Madarsuma (c)

Gandembel foi a última posição avançada da Guiné que visitei durante a minha estadia nesta Província. Cheguei ali de helicóptero com o bispo de Madarsuma, Vigário Castrense das Forças Armadas, no dia de Natal. Recebeu-nos o comandante da sub-unidade, e, pouco depois comparecia também o governador e comandante chefe das Forças Armadas da Guiné. Assistimos à missa campal em ambiente de fervorosa fé. O prelado e o Governador partiram. Eu quis ficar. Era o meu adeus à guerra e queria portar-me com dignidade perante aqueles jovens soldados que me olhavam risonhamente, talvez comentando o facto de à nossa chegada (a do bispo de Madarsuma e a minha) ter sido festejada pelos “turras” com algumas descargas de morteiro e de metralhadoras pesadas. Julgo até, que eles comentavam entre si o facto de os normais habitantes de certo abrigo me terem ali, quando estes entraram (…) ao explodirem as primeiras granadas. Eu pensava que "gato escaldado de água fria tem medo ...” e tentava adivinhar a sensação do bispo de Madarsuma, que subitamente se sentiu agarrado por um braço no meio da parada e levado para o mesmo abrigo, onde eu já me encontrava.

O Adeus à Guerra

Depois do jantar, um dos oficiais perguntou-me:
- Amanhã não quer ir à ponte? (d)
- Pois claro que vou – respondi-lhe.
- Isso dependerá da festa que os turras nos deram esta noite, concerteza...
- Concerteza que não, senhor alferes! Eu sou um homem que tem medo. Por isso sou capaz de fazer o que todos os outros homens fazem e não são as minas de que há pouco me falou que me assustam.

No dia seguinte, visitei o pessoal de Ponte Balana, mas tive de regressar em corrida, para apanhar o helicóptero que me transportaria a Bissau. Os soldados reuniram-se à volta do aparelho insistindo em que querem receber exemplares do “Diário Popular” com mais frequência e pedindo para eu ver o que poderia fazer nesse sentido.

Foi o meus adeus à guerra. Um adeus com o coração amargurado e o pensamento cheio de admiração por tão extraordinários soldados.

César da Silva
_____
Notas do Zé Teixeira:

a. Suponho que se quer referir a Guiledge, pois nunca ouvi falar em Cimbali
b. Infelizmente eram utilizados para matar soldados portugueses e não só cortarem as picadas. Com isso podiamos nós bem.
c. D. António dos Reis Ribeiro – bispo titular de Madarasuma e Forças Armadas Portuguesas .
d. Fortim de Ponte Balana


Foto 1 > Gandembel > 1968 > Vista geral

Foto 2 > Gandembel > 1968 > Porta de armas

Foto 3 > Gandembel > 1968 > Construindo um abrigo.

Foto 4 > Gandembel > 1968 > Depois do trabalho, o mercido banho
Fotos: © Almeida (de Gandembel) (2008). Direitos reservados

Foto 5 > Gandembel > 2008 > Restos de um abrigo

Foto 6 > Gandembel > 2008 > Restos de um abrigo

Foto 7 > Ponte Balana > 2008 > O poço onde os “rapazes” de Gandembel iam buscar água

Foto 8 > Ponte Balana > 2008

Fotos: © José Teixeira (2008). Direitos reservados

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 25 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3240: Recortes de imprensa (8): 35 anos de independência da pátria de Amílcar Cabral

Guiné 63/74 - P3403: In Memoriam (11): Júlio Marques, ex-1º Cabo, CCAÇ 2382, Buba, 1968/70, morto no dia de finados (Idálio Reis)

1. Mensagem do Idálio Reis, com data de hoje. Engenheiro agrónomo, reformado, residente em Cantanhede, foi Alf Mil Op Esp, CCAÇ 2317, Gandembel/Balana, 1968/69:


Meus caros Luís, Vinhal e Briote.

Perdemos mais um companheiro que viveu essa guerra que outrora se travou na Guiné. E há um enorme sentimento de perda.

Cordialmente, Idálio Reis


ASSUNTO: Morreu o Júlio Marques, meu conterrâneo e contemporâneo em terras da Guiné


A efemeridade da vida. Regressava o Júlio, da missa de finados celebrada no cemitério da freguesia, quando o seu coração o trai repentinamente, caindo fulminado por uma paragem cardíaca, deixando na maior dor os seus entes mais queridos.

Morre ainda relativamente novo, com 63 anos, após uma vida em que a sorte que lhe estava reservada, de tantas vezes lhe foi adversa, dando mostras de não o querer bafejar.

Paradoxalmente, o Júlio teve uma juventude feliz, mercê de um desvelado afã dos seus pais, que lhe proporcionaram que fosse estudar, e que viria a abandonar por iniciativa própria, algum tempo antes de ser chamado a cumprir o serviço militar.

Não quis, soube ou teve bastante capacidade para aproveitar a benesse ofertada, e os resultados que conseguiu almejar, foram praticamente nulos. E quando chega da Guiné, a única opção que foi capaz de enfrentar e para a qual estava melhor talhado, como a de tantos outros, foi a de dar continuidade à agricultura que era a forma de vida da casa paterna, e que, em princípio, lhe auguraria um futuro com algum desafogo.

Numa aldeia essencialmente rural, a sua casa agrícola despontava entre as melhores, e, conhecedor da actividade, rasgava-se-lhe um horizonte com razoáveis perspectivas para se inserir no seu meio. Estávamos mesmo no princípio da década de 70.

E os primeiros tempos correram-lhe de feição, sentindo-se um homem feliz, ainda que apenso a muito trabalho e canseiras. Mas esta agricultura, de minifúndio, vai entrando em crise, acentuada de ano para ano, e o Júlio perde rentabilidade. Dificulta-se-lhe a vida, manifestam-se dificuldades impossíveis de superar, e hoje vivia para sobreviver, com uma agricultura de subsistência.

Das vezes que nos encontrávamos, reconhecia nele um homem vencido pelas vicissitudes da vida. Cansado, sem queixumes, continuava bastante apegado às suas courelas, pois só com muito esforço conseguia juntar algum pecúlio para o seu quotidiano.

Tinha como vício o tabaco, e tantas vezes o aconselhava para deixar o cigarro. Ripostava-me que andava a tentar abandonar e que um dia o faria. Debalde!

Se lhe apontava este conselho, era tão só para ter um motivo de conversa, pois era bastante lacónico, pouco propenso para falar do que quer que fosse. E, em poucos minutos, desculpava-se e seguia o seu destino. Tornara-se um aldeão “à antiga”, um homem bom, com um tipo de vida muito caseiro.

Éramos conterrâneos, vivíamos nos extremos da aldeia, e durante a meninice raramente brincámos conjuntamente. A nossa grande amizade foi muito cimentada, quando a minha Companhia esteve em Buba, onde ele já se sediava, julgo que pertencendo à CCaç 2381 ou CCaç 2382 como 1º cabo.

No pretérito dia 1, tínhamo-nos cumprimentado no cemitério da freguesia. Era um homem que sempre dedicou um carinho muito especial à memória dos seus pais, que tanto labutaram por ele. Talvez, neste dia de homenagear mais sentidamente os nossos, um turbilhão de sentimentos e comoções mais transparece nas preces que lhes endereçamos. Não resistiu no Júlio.

Em dia de finados, porventura cismando na roda e rumo que a sua vida tomara, num ápice uma folha de Outono tomba para sempre. E deixa-nos mais pobres, pois a perda de um amigo é sempre uma fatalidade pesarosa.

Curvo-me em silêncio à perenidade da memória do homem grande que foi o Júlio Marques. Até sempre, bom amigo.

Um forte abraço a toda a Tertúlia
do Idálio Reis.

Guiné 63/74 - P3402: Acção psicológica a funcionar... O Desporto em Chão Manjaco (Jorge Picado)


1. Mensagem do nosso camarada Jorge Picado, ex-Cap Mil da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, com data de 1 de Novembro de 2008

Amigos e Camaradas

Estava com disposição de contar algo sobre a minha estada em Chão Manjaco e saíu-me a prosa que se segue.


Apsico a funcionar em Teixeira Pinto

Quando da minha apresentação, citei numerosos nomes de povoações, a maioria dos quais do Chão Manjaco, que levaram até a questionar o que saberia sobre o fatídico dia da morte dos Três Majores nesse Chão. Claro que, sobre esse acontecimento, só sei o que é do conhecimento geral, uma vez que nessa época andava por terras do Chão Balanta.

Já me referi, sobre a história da minha passagem por MANSABÁ, como acordei e acabei por ser colocado no CAOP 1 em TEIXEIRA PINTO. Como disse então, creio que foi com uma ajudinha directa ao então Comandante desse Agrupamento que na altura se encontrava de férias na Metrópole, mas, como agora quem poderia confirmar já cá não mora e, valha a verdade, depois de regressar não mais quis pensar nesses assuntos, não sei exactamente como ocorreu o facto.

A verdade é que pouco mais de 15 dias depois de me ter apresentado na CArt 2732 recebi a Nota n.º 7007/A, de 15MAR71 da 1.ª REP, dando-me conhecimento da colocação no CAOP 1 em substituição do Cap. Pinto de Lima, mandando-me apresentar logo que seja desnecessário. Estes amaldiçoados formalismos vertidos naquela expressão fizeram com que o nosso brilhante co-editor Carlos Vinhal tivesse que aguentar por mais uns tempos este desajeitado ex-Capitão

Assim em 04MAI71 saí às 6 horas da manhã de BISSAU para TEIXEIRA PINTO, numa coluna que atravessando o Rio Mansoa na jangada em JOÃO LANDIM cerca das 6h30m chegou ao seu destino cerca das 13 horas.

Tratando-se dum percurso para mim desconhecido – depois de JOÃO LANDIM com rumo a Norte apanhava-se a bifurcação antes de BULA, onde não se entrava e, rumando para Oeste passava-se por CÓ, PELUNDO e finalmente a nova casa – sempre em estrada bem asfaltada e de bermas bem desmatadas, mas a verdade é que, mesmo não conhecendo tal itinerário, já não senti qualquer emoção como tinha sentido cerca de 15 meses antes quando pela 1.ª vez rumei a MANSOA.

A verdade é que agora já era naturalmente um velho e não um reles periquito virgem nestas andanças. Os meus olhos já não vasculhavam para todo o lado à espera de ver aparecer a todo o momento os ferozes turras. Preocupado? Sempre. Mas agora, encarando com naturalidade e uma grande frieza a realidade duma paisagem desertificada, sem tão pouco saborear a possível beleza que, em circunstâncias de normalidade poderia usufruir.

A minha estadia neste Agrupamento não se comparou em nada com o restante tempo passado até aí nas outras localidades, dada a natureza das funções que passei a desempenhar e a aparente calma que se vivia. No entanto o meu alheamento por tudo que me cercava mantinha-se, raramente entrecortado por lapsos de lucidez.

Para me posicionar e enquadrar quem ler estas recordações esclarecerei que, quando cheguei o CAOP 1 tinha por Cmdt o Cor Art Gaspar P. de C. Freitas do Amaral, mais tarde substituído pelo Cor Pára Rafael F. Durão e lembro-me do Maj CEM Inocentes – Chefe do EM –, Maj CEM Barroco – Of Op (?) –, Cap Art Borges – Adj Of Op e meu camarada de quarto –, havendo possivelmente mais um que não recordo. Perdoem-me todos os outros, Alf e Fur do CAOP propriamente dito, mas de quem já não tenho na lembrança.

Passei a ser adjunto do Of Inf e Acap/Pop (?), o Maj Santos Costa, ficando com as tarefas relacionadas com os assuntos da Acap/Pop e assim, tendo deixado a G-3 ou qualquer outra arma, passei a empunhar lápis e bloco de notas de forma a documentar-me sobre os encontros que se efectuavam com as populações e os chefes das mesmas, anotar as preocupações, queixas, os avanços e atrasos na execução das obras planeadas e depois, no gabinete, redigir actas das reuniões e relatórios para serem remetidos ao COMCHEFE.
Depois deste intróito o que hoje quero recordar são 3 factos, de natureza desportiva, inseridos no âmbito das actividades da APSICO, ocorridos durante a minha permanência.

O 1.º diz respeito a uma prova de ciclismo organizada pelo CAOP – a 1.ª, não sabendo se posteriormente se realizou mais alguma – naquela localidade e designada por Circuito de Teixeira Pinto, da qual guardo 2 fotografias (tiradas por quem?) já bastantes deterioradas, mas que envio em anexo para que ajuízem da possibilidade de serem apresentadas.
Teve lugar esta prova no dia 12SET71, Domingo, como não podia deixar de ser e acerca dela transcrevo as parcas notas que constam da Agenda.

[Circuito T. Pinto -/9 inscritos. 15 voltas à Avenida, 24 km/1h 5m, por cima de lama, água e sob um calor tórrido. (10,15 -11,20). 1.º Abdul Karim (Pel.)]

Portanto e esclarecendo melhor, este circuito que decorreu na Avenida Central, constou de 15 voltas à mesma perfazendo um total de cerca de 24 km, tendo sido realizado em 1h05m, pelo menos pelo vencedor que foi um tal Abdul Karim (não sei se o nome estará correctamente grafado) do PELUNDO. Os inscritos teriam sido 9, segundo a nota, ainda que pela foto estejam alinhados à partida 10 (?).

A prova contou, como não podia deixar de ser, com a presença das Autoridades – Militares, Civis, Religiosas e Tribais – tendo-se iniciado às 10h15m e terminado às 11h20m. Como refiro a pista estava toda enlameada, cheia de poças de água – ainda visíveis nas fotos – e o calor era já elevado, condições aliás próprias da época (estava-se na época das chuvas).

As bicicletas eram as vulgares pasteleiras, como todos se devem lembrar, já muito usadas, mas que nem por isso fazia desanimar os concorrentes, como se pode observar, naqueles momentos antes da partida mais interessados quiçá a sonhar qual deles se transformaria no herói, face à inúmera assistência que povoava os passeios, mas principalmente perante as bajudas presentes!

Se as fotos puderem ser recuperadas, nelas se observarão alguns dos aspectos que enumerei, desde o ar descontraído – algum mais concentrado – dos concorrentes e suas maravilhosas máquinas, passando pelo terreno e o tipo de avenida que era de 2 faixas com separador central, até à numerosa assistência que emoldurava os passeios e não só, pois até no telhado duma casa em construção (?) se empoleiraram para ver melhor.

São visíveis 3 militares dos quais, admito que o de calções seja o Maj Inocentes, enquanto sobre os outros 2, apesar de perfil e postura de andar dum deles se parecer comigo, não ouso fazer qualquer sugestão. Só posso garantir que estava presente.

Finalmente tenho que confessar e, mais uma vez isto sucede, sempre que visiono estas fotografias me interrogo. Será que estive mesmo nestas paragens? Não teria sido um sonho? É que não tenho a mínima ideia daquilo que vejo. É como se nunca tivesse pisado aquela rua e, no entanto, nem eu sei quantas as dezenas de vezes que percorri aqueles cerca de 1600 metros da avenida fosse de jeep, Unimog ou mesmo a pé.

É isto que mostra o verdadeiro estado de alma em que me encontrava. Andava por ali, impessoal, aéreo, olhando, mas não vendo, qual sonâmbulo deambulando por entre a multidão e a paisagem. Por isso tudo aquilo se esfumou rapidamente, quando, naquela fase, devia ser o contrário. Se era a zona mais tranquila por onde passei, devia ser aquela cujas recordações mais perdurassem. Mas afinal não foi assim. Vá-se lá saber porquê.

Já quando logo no principio de 2007 li "Diário da Guiné. Lama, Sangue e Água Pura" do António Graça de Abreu, que me fartei de anotar, fiquei admirado por muitas das passagens que conta de TEIXEIRA PINTO, das quais não guardo recordação. Até quando ele cita o cinema, me admirei e no entanto, se não vi lá qualquer filme (não me lembro), pelo menos tive de assistir a uma sessão onde uma entidade religiosa da Mauritânia proferiu uma palestra em marabu (?).

O 2.º, que aconteceu no Domingo 26SET71, foi uma Prova de Atletismo, denominada pomposamente Légua de Teixeira Pinto que decorreu no mesmo lugar e constou de 3 voltas à mesma Avenida, num total de 5 km.
Deste acontecimento não guardo fotos e as notas ainda são mais parcas.

[Légua de T.PINTO. 10h – 30 c – 3 voltas Av. 5 km]

Iniciou-se às 10h, quando o tempo quente e húmido já fazia naturalmente mossas, contando com maior número de concorrentes, 30, naturalmente porque para o ciclismo era preciso montada e estas não abundassem, creio eu. Não posso explicar porque nem sequer o nome do vencedor anotei.

O 3.º acontecimento ocorreu no Domingo 3OUT71 e tratou-se dum Jogo de Futebol interno, para consolidação das relações entre militares metropolitanos e africanos. Uma equipa da CCS do BCaç 2905 contra uma representação da CCaç 16.

Devo dizer que estas partidas, realizadas sempre com o espírito de confraternização, eram sempre uma incógnita quanto ao seu desfecho, pois nunca se sabia quando poderiam dar para o torto. Recordo-me que antes de se tomar a decisão de as efectuar ponderava-se muito o risco e tomavam-se algumas cautelas… nesta, porém, não houve problemas, talvez porque o resultado final se traduziu num empate a 1 golo.

Apenas escrevi como notas [Futebol – CCS x CCAÇ 16 (1-1)].

E por hoje já chega de maçada.
Abraços
Jorge Picado



Fotos a que se refere o camarada Jorge Picado. Tiradas antes da partida para as 15 voltas pela Avenida Principal de Teixeira Pinto, que se completaram no tempo de 1 hora e 5 minutos.
Pena que viessem em tão mau estado. O que se conseguiu é muito pouco, em termos de resolução.

_____________

Nota de CV

Vd. último poste de Jorge Picado de 28 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3369: Em busca de... (49): Resultado das buscas da causa da morte do conterrâneo de Jorge Picado, João Nunes Redondo, ex-Fur Mil Sap

Guiné 63/74 - P3401: Blogoterapia (70): Notícias da Tabanca Grande (Carlos Vinhal)

I. O Carlos Vinhal, que é um mouro de trabalho, mandou-nos hoje, a todos nós, um ficheiro pdf com a lista, actualizada dos nomes e dos endereços de email do pessoal da Tabanca Grande (ou tertúlia, como dizíamos originalmente, com algum pretensiosismo).

Garantimos que essa lista está em boas mãos, não correndo o risco de ir parar, por exemplo, aos ficheiros dos recrutadores de mancebos para guerras futuras. A verdade é que já somos, entre amigos e camaradas da Guiné, cerca de 280, residentes nas mais diversas partes do país, desde Miranda do Douro a Faro, e da Madeira aos Açores, e até no estrangeiro, na diáspora portuguesa (Austrália, Brasil, Canadá, EUA, França, Holanda, República Checa...). Sem esquecer a nossa querida Guiné-Bissau...

O Carlos aproveitou a oportunidade para esclarecer algumas dúvidas sopbre o envio de comentários, que voltamos a reproduzir aqui:

Caros camaradas e amigos tertulianos

Junto vos envio lista actualizada dos endereços da tertúlia.

Como aparecem amiúde camaradas a solicitar endereços, sugiro que a guardem em ficheiro nos vossos PCs e que a substituam sempre que vos envie outra mais actualizada.

Por outro lado, aparecem camaradas a queixarem-se de que não conseguem fazer comentários no Blogue por não terem conta no Google e lhes ser sugerido abertura de uma.

Deixo uns tópicos para deixarem o vosso comentário. Lembro que é uma forma fácil e rápida de interagirem com os camaradas que escrevem.

1 - Clicar na palavra Comentários existente no fim da cada postagem
2 - Escrever o texo na caixa, não esquecendo de indicar o nome para evitar o anonimato
3 - Introduzir os caracteres produzidos pelo Google na caixa de Verificação de palavras
4 - Na área de Seleccionar uma identidade, escolher a opção Anónimo
5 - Finalmente clicar em Publicar o seu comentário

Os editores estão disponíveis para, dentro dos seu conhecimentos, ajudar nas eventuais dificuldades que possam surgir aos tertulianos.

Pelos editores
Carlos Vinhal



II. Aproveitamos para reforçar o pedido da equipa editorial para que toda a gente participe também no blogue, regularmente, com os seus comentários, críticas ou sugestões. Participar significa, etimologicamente falando, tomar parte em, ser protagonista, ser actor... Não queremos que sejam sempre os mesmos a mandar bitaites. Além disso, já ninguém precisa mais de pedir licença e pôr-se em sentido, para fazer o seu comentário, crítica ou sugestão. Estamos todos na peluda e esquecemos o famigerado RDM:

Amigo ou camarada da Guiné:

A tua opinião é muito importante para nós. Podes (e deves) escrever, no final de cada poste ou texto, o que te aprouver: um pequeno comentário, uma nota adicional, um reparo, uma crítica, uma sugestão... Basta clicares duas vezes sobre comentários que aparece no fim de cada texto, antes dos Marcadores (palavras-chave).

O teu comentário será publicado instantaneamente, sem moderação. Se voltares ao blogue (clicando no ícone Refresh, por exemplo) , encontrarás logo o teu texto. Escreve com total liberdade e inteira responsabilidade (o que significa respeitar as boas regras de convívio que estão em vigor entre nós: por exemplo, não nos insultamos uns aos outros, somos capazes de conviver com as nossas diferenças, discordamos sem puxar da G3...).

Não precisas de ter uma conta Google/Blogger. Podes fazer um comentário como anónimo, mas é conveniente (e desejável) que deixes sempre um contacto teu (nome, localidade, antiga unidade e, se possível, e-mail, no caso de ainda não pertenceres à nossa Tabanca Grande). Os amigos e os camaradas da Guiné não se escondem no anonimato, são pessoas habituadas a dar a cara.

Um Alfa Bavo (ABraço).
Os editores LG/CV/VB

Guiné 63/74 - P3400: Histórias engraçadas (António Matos) (1): A fábrica de Mafra ou como se fazia um militar

1. Mensagem de 2 de Novembro, enviada pelo António Matos, ex-Alf Mil, CCAÇ 2790, Bula, 1970/72 (*):

O ser humano, quando transformado em militar, mesmo que à força, adquire características ímpares que lhe permitem graus de sobrevivência excelentes ainda que, para alcançar esse estádio, passe por situações e provações complicadas mas, por vezes, hilariantes.

Desde os bancos da escola (leia-se recruta) que nos habituámos a chafurdar em charcos nauseabundos e a sermos obrigados, ao chegar ao quartel, a apresentarmo-nos 10 minutos depois lavados, penteados, barba feita, fardados a preceito e, calcule-se, com aquelas botas engraxadas e a brilharem !!!

E não é que todos conseguíamos a façanha ?

Desde miúdo de tenra idade que, em minha casa, eu era obrigado ( felizmente !!) a fazer a minha cama antes de sair para a escola. Essa especialização deu-me a facilidade para na tropa não ter essa função como um quebra-cabeças em oposição a alguns camaradas que não tinham como hábito aquela arte de bem esticar lençóis sem deixar ruga que os levava a cumprir 100 flexões!

Em minha casa havia a célebre expressão do saudoso Pai que dizia Aqui não há não gosto!, e com isso tudo o que caía no prato era devorado com prazer. Em oposição, na tropa, todos vimos camaradas a revirarem as tripas quando eram confrontados com a necessidade de enfardarem com aquelas comidas enlatadas que, para eles, eram intragáveis.

Aliás cheguei a fazer verdadeiros banquetes com os pitéus que alguns desprezavam ...

Na tropa, muitos fomos barbeiros de ocasião na tentativa de safar o camarada que se descuidara e não cortara a trunfa o suficiente que lhe permitisse gozar o fim de semana.

Também o fui e, de tesoura em riste, aparei a guedelha ao Teófilo Leite, em Mafra, ao fim de cuja operação de estética, ele ganhou o fim de semana e eu habilitei-me à forca ! Qualquer semelhança da cabeça dele com um parafuso sextavado, não era pura coincidência !

Eu assentei praça em Mafra. A complexidade arquitectónica do Convento transformado em quartel dava-nos durante a 1ª semana uma certa condescendência da parte dos instrutores para pequenos atrasos à formatura pois não raras eram as vezes em que um tipo se perdia nos corredores e primeiro que desse com a saída ....

Eu vivia em Guimarães, de onde me deslocava todos os fins de semana para uma verdadeira transformação física e psicológica bem ao jeito da Laranja Mecânica. Nessa altura, um dos meus camaradas de viagens e de pelotão era o Abreu.

O Abreu usufruía do beliche de cima (1º dtº), do par de beliches ao lado do meu, sendo que eu habitava o rés-do-chão esquerdo. Certa madrugada, o Abreu terá sofrido duma violenta diarreia e começou a chamar pelo camarada do 1º esqº (o Barbosa, pegador de touros ) do qual pretendia que lhe indicasse onde raio eram os sanitários. As altas horas dessa madrugada não permitiram que o Barbosa acordasse daquele sono rônquico e, entretanto, o Abreu continuava a chamá-lo na tentativa de o acordar.

O Abreu acaba por se calar no preciso momento em que o Barbosa despertou virando-se para ele:
- Eh pá o que foi ? o que queres ?

Com cara de desesperado, o Abreu apenas lhe disse:
- Nada ! Já me caguei!

Um abraço,
António Matos

________________

Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores:

1 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3390 Tabanca Grande (95): António Garcia de Matos, ex-Alf Mil da CCAÇ 2790, Bula (1970/72)

2 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3392: Blogoterapia (67): Homenagem aos que choram (António Matos)

Guiné 63/74 - P3399: Estórias cabralianas (40): O meu sonho de empresário (falhado): a construção de uma tabanca-bordel (Jorge Cabral)

1. Mensagem do Jorge Cabral, enviada ao editor L.G.:

Amigão,

Aí vai estória, acompanhada de um Grande Abraço extensivo ao Vinhal e ao Briote.

Jorge Cabral


2. Estórias cabralianas (40)


Explicação de L.G.:

Mais uma estória cabraliana... ou história, para os purista da língua. Uma questão que, de resto, está em aberto, no blogue; mas, que me perdoe o Norberto Gomes da Costa, eu não vou alterar o título da série, só por não ser linguisticamente correcto. O nosso camarada não suporta o vocábulo estória. Um dia destes vamos falar sobre isso. Tenho uma opinião diferente da dele... De qualquer modo, deixem-me dizer que as histórias do Jorge Cabral só podem ser... estórias, tal como as estórias do Luandino Vieira ou do Mia Couto, dois grandes escritores lusófonos que renovaram a nossa língua comum e a literatura em português. É bom que os portugueses se habituem à ideia de que não são donos da língua portuguesa...

Voltando ao Cabral: ele está, aliás, em dívida comigo e com o resto do pessoal da Tabanca Grande e demais visitantes do nosso blogue. Prometeu-nos escrever 50 estórias. É assim que vem no contrato. E um contrato, num país de juristas, tem muita força... O Jorge Cabral é jurista, não ia agora aceitar que eu fosse rasurar o documento e substituir o vocábulo. Estórias cabralianas já pagam direitos de autor e só podem do Jorge Cabral. Esta é o nº 40. Faltam 10 para ele pagar o resto da dívida e a gente um dia publicar-lhe o livro... Proponho que o lançamento do futuro livro seja no Maxime.

After-War, Cabral Empreendedor Putófilo
por Jorge Cabral


Claro que lembro do Tosco! (**). Havia pretas, mulatas e até uma chinesa. Todas, mais os copos, trataram-me da saúde. Entrava sempre a coxear, por via dos descontos… Mas o meu preferido era o Bolero, onde jantava no primeiro andar, antes do Tango em baixo, tocado a rigor por uma orquestra de cegos. Ainda lá fui após o 25 de Abril. A mesma orquestra, as mesmas putas, mas a música mudara – Todos em coro cantávamos a Internacional.

Foi porém no "Sempre em Festa” – Ritz Club (***) – onde além do mais, cortava o cabelo e fazia a barba, que estabeleci contacto comercial, com um simpático casal de artistas octogenários. Eles actuavam lá, vestidos de noivos, num número brejeiro, ao qual aliás ninguém ligava…

Convidei-os a investir num negócio que afiançava altamente lucrativo… Uma Embaixada de putas à Guiné e até, se tudo corresse bem, a construção de uma Tabanca – Bordel.

Acharam a ideia excelente, e eu comecei o recrutamento. Já tinha onze inscrições… quando resolvi pedir ajuda ao Barbosa Henriques (****). Era preciso sensibilizar o Exército e a própria Pide, para este importante esforço de guerra. Ao invés de me ajudar, o Capitão, pregou-me uma valente descompostura:
- Mas o Cabral está maluco? Agora quer ser chulo?

Muito triste, desisti. A minha carreira de empresário acabou antes de começar.

Anos mais tarde, propus ao Conselho Científico da Escola onde leccionava, a implementação de uma Cadeira nova – Putologia.

Recusaram.

Porra, tenho sido mesmo um gajo incompreendido!...

Jorge Cabral
________

Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 25 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3237: Estórias cabralianas (39): O Marido das Senhoras (Jorge Cabral)

(**) Vd. poste de 30 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3380: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (10): Quando a guerra era com os copos... ou o elogio do Tosco, em Lisboa (Jorge Félix)

(***) Vd. poste de 5 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3025: Os nossos regressos (7): Perdido, com um sentimento de orfandade, pelos Ritz Club, Fontória, Maxime, Nina... (Jorge Cabral)

(****) Militar de carreira, Barbosa Henriques, nascido em Cabo Verde, foi instrutor da 1ª Companhia de Comandos Africanos, em Fá Mandinga, em 1970. Faleceu em 2007. Era coronel comando na reforma. Vd. postes de:

19 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1536: Morreu (1)... Barbosa Henriques, o ex-instrutor da 1ª Companhia de Comandos Africanos (Luís Graça / Jorge Cabral)

19 de Março de 2007> Guiné 63/74 - P1611: Evocando Barbosa Henriques em Guileje (Armindo Batata) bem como nos comandos e na PSP (Mário Relvas)

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3398: Pensar em voz alta (Torcato Mendonça) (16): O veterano e o Macaquinho

O Veterano e o Macaquinho

Meus Caros

Estava por aqui e, de um texto antigo apaguei, acrescentei, falei com o Macaquinho e anexei. Se o fulano (macaquinho) falasse diria estar o "dono" e amigo com problemas de "cuca".

Não sabe que existem pessoas que vão, em estupidez, muito para além do egoísmo. Curiosamente chocamos com eles no nosso quotidiano e já pensamos ser a normalidade. Devia dizer antes: eu e não nós.

Aconteceu-me, escrevi e aí vai o escrito.Desabafos numa noite Outonal...



Torcato Mendonça

ex-Alf Mil da CART 2339 (1968/69)

A tarde envelhece rápida, cada vez mais rápida, à medida que este Outono avança.
Ouvi-te atentamente.
Desligaste sem acabarmos a conversa.
Talvez por isso, ia sair mas parei. Sentei-me a pensar. Fico calado, nada digo? Mas, pensando melhor, porque não o faço?

Diz, na esquerda do blog sermos uma espécie em extinção. Não vou tão longe ou não quero ir. Penso é que há muita gente a "borrifar-se" nos antigos Combatentes. Depois a geração dos nossos filhos tem outros problemas e a que se instalou, entre nós e eles, quer é tratar da sua vidinha.
Por isso resolvi alinhar umas palavras e enviar-te. Preciso fazê-lo.

Também eu envelheço, neste Outono de vida, cada vez mais curta, mais enrugada em cada dia que passa. Por isso e não só, respondo-te, pois, escrevendo.

Perguntaste-me porque nunca mais escrevi no Blogue. Não és o primeiro a fazê-lo. Posso responder-te de várias formas. Depois juntas tudo, agitas e terás, possivelmente, a resposta. Assim:
- Tive um Julho quase parado. Idem em Agosto e um Setembro igual. Claro que andei por aqui e ali. Pouco, é certo, e, muito menos que o habitual. O Outubro voou ou quase nem o senti, tal a voragem dos dias.
- Posso acrescentar que me faltou a vontade, inspiração e preferi ler a escrever. Gosto de o fazer. Música em fundo e apago-me, ou, se preferires, vou caminhando conforme o tema da leitura.
- Mas se acrescentar os montes de leituras e trabalhos atrasados, muitos ainda assim permanecem, para pena minha, já estás mais perto.
- Posso ainda acrescentar algo que me levou muito tempo e deu um imenso prazer. Porventura prazeres de jovem ou de homens com rugas de mil sóis.

Bem aí tens quase tudo. Agitas então e zás sai a resposta…Acrescenta ainda o hábito quebrado ou interrompido. Mas África, a Guiné está sempre presente.

Isto sem falar de assuntos que me transcendem. O blog não é meu e os Editores são soberanos. Ponto final.

Olha, aí por fim de Agosto e Setembro estive quase um mês, menos, sem ler o blog. Fi-lo depois ao correr da “rodinha” do rato. Estive “fora” e sem Net.Gostei de uns escritos e nem tanto de outros. Fiz dois ou três comentários em “mata insónia”. Caminhar pela noite é a normalidade. Hábitos e gostos ou a necessidade do silêncio, da solidão, do encontro connosco.

Ao ler aqueles escritos todos, verifiquei um ponto comum: a saudade, o gosto pela Guiné e pelas suas gentes. Feitiço, não de mulher, mas daquela Terra.

Depois pensei:
– Então não é preferível ler tal diversidade de opiniões e de memórias, a escrever? Ou, se for escrevendo, vou arquivando. Claro que tenho aqui uma resma para teclar, uma série de escritos que já foram. Outros terão que ser cortados aqui e acolá – género trabalho de alfaiate do antigamente – e depois ver o que deles fazer.
Acrescento ainda que os ventos não sopram de feição. Outras vidas.

Falei de comentários. Fiz alguns. Um ou dois viraram post. Não queria comentar ou intrometer-me tanto. Um, há muito tempo, era sobre um dos mais conhecidos Pilotos da FAP. Conheci-o. O Capitão Neto, nascido no ex-Congo Belga, creio eu amigo do Jean… tratava o Piloto Honório por irmão. Aliás tratavam-se por irmãos. O Cap. Neto, antes ou quando regressamos à Metrópole no Uíge, contou-me o que se passou no desastre do Cheche. Não te vou contar agora, pois disso já muito se falou. Merecia um dossier.

Cherno Rachide

Comentei vários escritos ou posts. Poucos? Muitos? Nem sei que te diga. Um, que era mail virou post também. Era sobre a hipotética duplicidade da actuação de Cherno Rachide.

Claro que, forçosamente, a sua actuação tinha que estar de acordo com as duas forças beligerantes. Era um homem africano, profundamente conhecedor do seu Povo. Outros, não africanos, não fariam jogo duplo? Só que agente duplo pressupõe uma “arregimentação”. Ora se aplicada ao Cherno talvez seja forte demais. Se aplicada a outros nada tem de anormal ou pejorativo. Não se faz nenhuma guerra sem serviços de informação capazes. Perdem-se sempre sem eles…adiante!

Um comentário, talvez mais um cumprimento, um abraço, foi sobre o tratamento que o Estado continua a dar aos antigos combatentes, ao abandono dos militares africanos que connosco trabalharam, aos que por lá ficaram sepultados e aos que, após a “libertação” foram, cobardemente, fuzilados.


O meu macaquinho

Devo comentar menos. Quando leio e, caso não me agrade ou agradando, sinta vontade de dizer algo, por vezes não posso nem devo falar para não levantar polémicas, falo com o meu Macaquinho.

Não conheces o meu macaquinho? Bem, tenho vários e variados. Um é especial e acompanha-me há muitos anos. Senta-se sobre a secretária. Baixo, talvez dez ou doze centímetros, pelo negro e macio, cara marota de tom acastanhado. Tinha um apito. Com o tempo ou, se preferires, a idade, estragou-se. Antes, se abanado apitava. Agora só se ouve o barulho do rolar do apito.

É o meu confidente. Zango-me com ele, questiono-o sobre todos os temas. Como felizmente não fala, se o fizesse que problema tínhamos, ajuda a descarregar o bom ou mau humor, os problemas que um tipo tem e por aí fora. Ora falar mais com o macaquinho é menos problemático e ele logo me “diz” os caminhos a percorrer.

Aí tens um monte, uma mão cheia de motivos para nada de préstimo escrever. Repara que, caso tenhas lido o blogue, terás tido ocasião de sentir textos de forma e conteúdo diferente. Gente nova a arejar, a fazer pensar e sentir que, posso estar enganado, mas é bola de neve – rola e engrossa no tempo. Disse isso ao Luís Graça há muito tempo. Parece-me ter razão.


Para pensar

Mas não esqueçamos os “velhos”. Um colocou cinco questões que me têm feito pensar. Já escrevi e risquei. Voltei a pensar. Difíceis as questões. Tu que criticas sempre. Tu, que para lá da crítica, tenho que to dizer, nada ou pouco fazes a não ser em teu proveito ou que te traga algo… pensa nelas, medita e diz-me. Podes ficar aborrecido por te ter chamada egoísta, no mínimo. Pára, pensa e diz-me. Eu atrevo a repetir a questões:

(i) O heroísmo do soldado Português;
(ii) A confiança que os soldados depositavam em nós, os quadros;
(iii) A nossa passagem por África, que beneficio social e económico trouxe para Portugal;
(iv) A nossa religiosidade, de então e actual, e o porquê da diferença;
(v) As nossas famílias, que amarguras passaram por cá aquando da nossa ausência.

Então? Difíceis? Pois eu meditei, escrevi, risquei, voltei a reflectir e a escrever. Falta muito para chegar onde quero.
Serás tu capaz de, depois de pensar bem nelas, ou numa ou noutra somente, escreveres a dizeres-me o que pensas?

Já me mandaste “passear”. Fazes mal. Se reflectisses e escrevesses algo, fazia-te bem.

Olha, eu “falei” com o macaquinho, em troca de conversa de louco e peluche, mas isto é assunto sério demais. Pensa e diz algo, a mim claro. Eu continuo a reflectir e a escrever. Não mostro a ninguém. Se um dia o fizesse, enviaria primeiro a uma ou duas pessoas…

Até…

Torcato Mendonça

Um alentejano que vive hoje no Fundão
__________

Notas: artigos relacionados em

2 de Novembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3394: Blogoterapia (68): Amnésia, vergonha, denegação ou ocultação dos próprios nossos mortos (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P3397: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (1): A ida, do RI5 a Bissau


Luís Faria,
ex-Fur Mil Inf MA
CCAÇ 2791,
Bula e Teixeira Pinto,
1970/72


Capítulo I > A minha viagem - Do RI5 a Bissau

Em 1969 era eu, um bom moço, melhor rapaz e estudante do antigo 7.º ano, quando me convidaram para o RI5 [Regimento de Infantaria nº 5, nas Caldas da Rainha), sob o comando de Giacomino Mendes Ferrari (creio ser o nome correcto). E por lá andei a fazer a recruta com as insígnias de Instruendo. Até que, chegou a hora de escolher uma das Especialidades disponíveis, a saber: Amanuense, Atirador e Operações Especiais. Dado que para Amanuense não ia concerteza e para Atirador era certo, optei por ser o melhor da minha rua e só por isso pelas Op Especiais!

Por lá apareceu um dia o famoso Cap Robles e… lá fui parar a Lamego, ao CIOE [Centro de Intrução de Operações Especiais].

Boa comida, bons pequenos almoços… e há que optar: Op Esp (Rangers) ou Comandos? Fui parar a Penude, ao novo Quartel dos Comandos sob o comando Cap Jaime Neves. Boa comida, más dormidas!...

Estávamos no Inverno, um frio de rachar e depois de muitas peripécias que recordo com saudade a camaradagem, a disciplina, a preparação física e bélica adquiridas, o conhecimento humano em várias vertentes… muito me serviram na Guiné!... Dizia eu do frio de rachar… e um belo (!?) regresso de fim de semana, vou dar com o corpo na enfermaria, com gripe. Lá se foram o salto da ponte, o esgoto, o slide e o rapel!... E lá fui eu para Tancos, sem crachá, mas com os conhecimentos, tirar o curso de Minas e Armadilhas (nada de novo) com direito a Diploma, claro está!

Depois de ter resolvido, a contento, um problema grave de despromoção e prisão por ter invadido um aquartelamento da NATO (entrei com o meu amigo Meirinhos e outro por um buraco na rede), eis-me a caminho do RI 16, Évora, cidade do Templo de Diana, para formar Companhia com destino à… Guiné (o pesadelo que poucos quereriam !)

Ao tempo Salazar morreu, Tenentes ausentaram-se, falou-se que a guerra na Guiné tinha amainado e ia acabar (grande alívio !!!), enfim, valeram aquelas donzelas simpáticas e de fala doce e musicada, que nos distraíram o pensamento. Certo, Jorge Fontinha? E já que o nosso Tenente se ausentou, quem assumiu o comando do 4.º Gr Comb, deixando o 3.º, fui eu, por ser o Furriel mais antigo. E assim, o Jorge Fontinha (Op Esp), o Chaves (açoriano) e eu, lá demos instrução ao 4.º Gr Comb, levando-o até ao aquartelamento abandonado do RAC-Espargal em Oeiras, de onde embarcámos, em 19 de Setembro de 1970, depois das cerimonias habituais - Movimento Nacional Feminino, cigarros, Parada, despedidas e mais (só um meu irmão soube da minha partida) - no paquete inclinado para bombordo Carvallho Araújo, que nos levou ao destino, via Açores e Cabo Verde.

Ao entrarmos no Geba, já noite, na amurada a pensar e a sentir o cheiro caraterístico daquela Terra, entrei em alerta ao ver que os Turras já nos estavam a atacar com objectos incendiários que vogavam pelas águas em direcção ao barco...

Ufa… que alívio?! Afinal era apenas fauna marítima eléctrica!!!!!

E eis-nos atracados no cais do Pijiguiti, prontíssimos para o IAO e para o que mais viesse. Estávamos a 2 de Outubro de 1970. A partir desta data nos iríamos transformar em Homens, rapidamente…

Um abraço a todos os Tertulianos
Luís Sampaio Faria


Foto 1 > Luís Faria na Parada do RI5, Caldas da Rainha, cujo Comandante era o Coronel Giacomino Mendes Ferrari

Foto 2 > Fevereiro de 1970 > Luís Faria já no Curso de Comandos, em Penude, no novo Quartel dos Comandos sob o comando Cap Jaime Neves.

Foto 3 > Setembro de 1970 > RI 16 > Luís Faria durante a Semana de Campo

Foto 4 > A bordo do Carvalho Araújo, saída de Angra do Heroísmo, a caminho da Guiné

Foto 5 > Setembro de 1970 > Luís Faria em Ponta Delgada

Foto 6 > Cabo Verde > Luís Faria em Mindelo, Ilha de São Vicente durante a escala do Carvalho Araújo naquele Arquipélago

Fotos: © Luís Faria (2008). Direitos reservados.

___________________

Nota de CV

Vd. poste de 31 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3388: Tabanca Grande (94): Luís Sampaio Faria, ex-Fur Mil da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto (1970/72)

Guiné 63/74 - P3396: Em busca de... (50): Ainda as pesquisas de referências de António Andrade Júnior da CART 1692, Guiné 1967/69 (José Martins)

1. Em 26 de Outubro de 2008, Gonçalo Andrade mandou esta mensagem ao nosso Blogue:

Amigo Luis Graça,
O meu pai foi combatente na Guiné (Cameconde), aproximadamente entre 03/1967 e 03/1969.
Infelizmente, o mesmo faleceu, vítima de acidente de viação em 1979 (tinha eu 8 anos) e a minha mãe também faleceu em 1983 (eu com 12 anos) igualmente de acidente automóvel.
Desta forma, não tenho quem me dê informações ou referências e ando em busca das origens.

Pelo referido, excepto as datas e algumas fotografias, nada mais sei, nem nome/número da Companhia, nem ramo das forças armadas a que pertenceu.
Gostava de obter informações a seu respeito, fotografias e filmes onde aparecesse e de saber se a sua Companhia se organiza em confraternizações.

O seu nome era António Andrade Júnior e era natural de Estremoz, nascido em 1945.
(...) (*)



2. No dia 27 o nosso camarada José Martins dirigia-se assim ao Gonçalo Andrade e à Tertúlia e ao Goçalo Andrade, filho do nosso camarada António Andrade Júnior que pertenceu à CART 1692:

Bom dia Camaradas e meu novo FILHO.
Para o Gonçalo, começo por enaltecer a sua atitude de procurar as origens. Chamo-te filho porque defendo que OS FILHOS DOS NOSSOS CAMARADAS, NOSSOS FILHOS SÃO.

(...) (**)

3. Mais recentemente (30 de Outubro de 2008 (?)) o Gonçalo Andrade mandou este mail ao nosso camarada José Martins:

Boa Noite Amigo José Martins,
Falamos há dias no seguimento deste e-mail, na altura não relacionei de imediato com o primeiro e-mail e quero agradecer, sinto-me como um filho efectivamente.

No trabalho de pesquisa, virei as minhas 65 fotografias ao contrário e procurei ordenar datas e locais. A maior parte nada diz no verso. Contudo apurei as seguintes datas e localidades:

30/08/1967 Cacoca
23/10/1967 Cacine
03/11/1967 Cacine
08/11/1967 Cacoca
Ano 1968 - Todas Cameconde
16/02/1969 - Bissau

Penso que bate mais ou menos certo com a informação que me enviou no anexo deste mail.

Tenho também recebido algumas informações do camarada António José Pereira da Costa que diz julgar ter servido com o meu pai e me perguntou se, no espólio, via referências a CART 1692 - SPM 4248 (?).

Andei muitos anos a ganhar coragem para esta demanda (e foi preciso chegar aos 37 anos). Senti-me na obrigação! Tenho 2 filhos de 10 e 3 anos, netos de avós que não conheceram. Queria partilhar com eles estas memórias e deixar-lhes as raízes que não tive, para além do orgulho que deverão ter de um avô que sofreu na pele os males de uma guerra e transmitir-lhes este espírito de camaradagem que vai faltando no mundo moderno.

Um abraço muito amigo
gonçalo andrade

P.S.: O Arquivo Militar, a tal caixa n.º 81 é consultável? Também pedi informações para a Liga Combatentes. Ajudaria chegar à lista dos incorporados, já que até ver não demos com a Caderneta Militar.

4. Em 30 de Outubro, José Martins respondia:

Bom dia Gonçalo
Acho muito bem a preocupação de saber as origens, para se saber como vamos para o futuro.

Sei o que é ter um avô, que se admira, sem se ter conhecido.
O meu avô materno esteve em Moçambique nos finais do Século XIX.
Mais tarde, veio a bater com os costados em França, onde apenas esteve entre Janeiro e Junho de 1917, tendo sido evacuado para Portugal, com incapacidade permanente e total para o serviço militar. Foi reformado muito novo, tinha a minha mãe mais ou menos oito anos, como gaseado de guerra.

Um irmão do meu pai, tio paterno portanto, tambem esteve em França, integrado no mesmo Regimento. Mais tarde, em 1962, fundaria em corpo de voluntários em São Salvador do Congo, sendo o seu primeiro Comandante, quando tinha 62 anos, exactamente a minha idade.

Eu estive na Guine entre 1968/1970, como Furriel de Transmissões.
Estes foram os combatentes da Familia.
No entanto há mais duas gerações: o meu bisavô materno e o meu filho mais novo (são três - 36 / 37 / 29 anos e um neto com quase treze anos)

Enfim, vamos ao que interessa:

No Arquivo Histórico Militar (2.ª a 6.ª feira) das 11,30 às 17,00 horas é possivel consultar a documentação e, a pedido, tiram fotocópias cujo preço, por ser documentação tão importante, é quase de borla. É nessa documentação que devem constar o nome e outros elementos de todos os militares que fizeram parte do batalhão, além de outras informações relacionadas não só com o desenvolver da campanha, mas tambem no aspecto disciplinar.

Neste início de dia estou a dar conta da correspondencia que tenho neste mail (profissional) para depois me dedicar ao trabalho, pois logo à tarde (19 horas) vou estar numa conferência de um antigo combatente, Cristovão de Aguiar, que escreveu um livro sobre a sua Unidade, na Biblioteca Museu Republica e Resistência, em Benfica/Lisboa.

É tudo. Um forte abraço e continução de uma boa pesquisa, que vai compensar.
José Martins

5. Hoje, dia 3 de Novembro de 2008, recebemos esta mensagem do Diogo, relatando todos os pormenores dos resultados das diligências efectuadas até agora.

Caros Amigos (espero não me ter esquecido de ninguém),

O sentimento de gratidão é imenso perante tanta vontade em ajudar e espiríto de companheirismo. Ver a divulgação nos blogues foi o pico! Tenho recebido fotografias, mapas, informações e tudo em pouco mais de 1 semana!

A persistência compensa e os meus amigos apontaram TODOS na direcção certa, nomeadamente os senhores José Martins (1) e António José Costa (2)(perdoem-me não pôr as patentes militares) através da informação da Companhia, mapas e fotografias, dado que, após intensa procura, apareceu ontem a Caderneta Militar (que anexo).

Efectivamente, o meu pai, António Andrade Juniór, esteve na Guiné entre 08 Abril de 1967 (data de embarque) e 03-03-1969 (data de embarque em Bissau). Serviu na CART 1692 e no BART 1914 (Sem Temor!!) - RAL 1. O seu N.º Mecanográfico foi 01758066 Classe 1966/3.ºt.

Nas fotos vi referências a um Nunes, Engenharia e a um Espadinha e o senhor António José Costa, também já me identificou alguns dos locais das fotos e, confirma-se assim que serviu com o meu pai.

Dado este importante primeiro passo, tomo a liberdade de pedir que me continuem a fazer chegar informação, nomeadamente fotos, filmes, história e episódios da BART 1914 e tudo quanto relaccione o meu pai, nomeadamente dos camaradas que com ele privaram. Em busca das memórias perdidas... dado que, uma árvore de grande porte, sem raízer firmes, torna-se frágil.

Sei também que, para mim são memórias não contadas e que pretendo recuperar e que, para os meus amigos, poderão ser aquelas que pretendem manter no baú. Pelo facto peço desculpa.

Por fim, caso este BART ou Companhia, organizem confraternizações, gostaria eventualmente de poder participar em representação do meu pai. Gostaria de conhecer os seus camaradas. Seria uma honra, por representação, pertencer a esta família.

Anexo a caderneta do meu pai, penso que ajude (3).

Nutro por todos vós, caros amigos, um sentimento de grande respeito, admiração e amizade.

Grato por tudo quanto já me fizeram chegar e que ajuda a conhecer o pai que tão cedo perdi e uma parte muito importante da sua vida.

Um grande bem haja. Tudo quanto precisarem da minha parte pessoal ou profissionalmente, fico ao vosso dispor.

Atentamente
gonçalo andrade
________________

Notas de CV

(1) - Trata-se do nosso camarada José Martins, ex-Fur Mil Trms Inf da CCAÇ 5

(2) - Trata-se do nosso Tertuliano Cor António José Pereira da Costa

(3) - Infelizmente não foi possível publicar a Caderneta Militar por ter chegado em formato PDF

(*) Vd. poste de 26 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3360: Em busca de... (47): Referências a meu pai, António Andrade Júnior, Cameconde, 1967/69 (Gonçalo Andrade)

(**) Vd. poste de 28 de Outubro de 2008, Guiné 63/74 - P3367: Em busca de... (48): Resultado das pesquisas efectuadas em busca de referências de António Andrade Júnior, CART 1692 (1967/69)