Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 2317 (1968/69) > Março de 1968 > Durante a permanência em Guileje, foi-se recolhendo algum material para a construção de Gandembel/Ponte Balana. É o caso do aproveitamento de palmeiras, de cujos espiques se extraíam os cibes Na foto, um aspecto do abate das palmeiras.
Guiné > Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 2317 (1968/69) > Março de 1968 > Na fase de carregamento dos cibes.
Fotos (e legendas): © Idálio Reis (2007) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos Direitos reservados.
1. Continuação do texto da autoria de Idálio Reis (ex-Alf Mil At Inf da CCAÇ 2317 / BCAÇ 2835 (Gandembel e Ponte Balana, Nova Lamego, 1968/69):
Os Gandembéis: O Nosso Cancioneiro, as nossas músicas, os nossos poetas (Parte III) (*) (**)
(...) Já se torna bastante diferente, a narrativa seguinte, que os autores apelidaram de “Os Gandembéis”. É escrita em circunstâncias inteiramente distintas das do Hino, onde o último local de permanência, em Nova Lamego, ofertava um clima de paz, de sossego e tranquilidade.
A sua leitura, feita nos dias de hoje, parece trazer uma inefável doçura, dada a exemplar ilustração da história da nossa Companhia.
Trata-se de um texto, composto e adaptado por ‘2 humildes anónimos’ [, um deles o saudoso João Barge (1944-2010), foto à esquerda, no nosso V Encontro Nacional, em 2010, uns meses antes de morrer], que procurou fundamentalmente narrar a acção (épica), que um punhado de homens que então compuseram a CCAÇ 2317, tiveram que passar em terras da Guiné, mas onde prevalece pelas razões invocadas nestas memórias, os sítios contíguos ao rio Balana.
OS GANDEMBÉIS > Canto I
I
As armas e os barões assinalados
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por sítios nunca dantes penetrados
Passaram ainda além do Rio Balana,
E em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
Entre gente remota edificaram
Novo Reino que depois abandonaram;
II
E também as memórias gloriosas
Daqueles heróis que foram dilatando
A Fé, o Império e as terras viciosas
Do Olossato e Mansabá andaram conquistando,
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando;
Cantando espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar engenho e arte.
III
Cessem do Corvacho e do Azeredo
As conquistas grandes que fizeram;
Cale-se do Hipólito e do Loredo (#)
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto os que não tiveram medo
A quem Nino e Cabral obedeceram.
Cesse tudo o que a antiga musa canta
Que a dois três dezassete mais alto s’ alevanta.
IV
Por estes vos darei um Maia fero,
Que fez ao Moura e ao Calças tal serviço.
Um Nunes e um Dom Veiga (##), que de Homero
A Cítara para eles só cobiço;
Pois pelos Dois pares dar-vos quero
Os de Gandembel e o seu Magriço;
Dou-vos também o ilustre Goulart,
Que para si em Minas não tem par.
V
E, enquanto eu estes canto, e a vós não posso,
Bigodes Reis, que não me atrevo a tanto, (###)
Tomai as rédeas vós, do Grupo vosso:
Dareis matéria a nunca ouvido canto.
Começai a sentir o peso grosso
(Que pela Guiné toda faça espanto)
De RDMs e recusas singulares
De Gandembel as terras e do Carreiro os ares.(####)
VI
E, o que a tudo, enfim, me obriga
É não poder mentir no que disser,
Porque de feitos tais, por mais que diga,
Mais me há-de ficar ainda por dizer.
Mas, porque nisto a ordem leva e siga,
Segundo o que desejais de saber,
Primeiro tratarei da larga terra
Depois direi da sanguinosa guerra.
VII
Partiu-se de manhã, c’o a Companhia,(#####)
De Guileje o Moura despedido,
Com enganosa e grande cortesia,
Com gesto ledo a todos e fingido.
Cortam as viaturas a longa via
Das bandas do Carreiro, no sentido
De ir construir um quartel
Na inóspita e deshabitada Gandembel.
VIII
Já na estrada os homens caminhavam,
O intenso capim apartando;
Os ventos brandamente respiravam,
Nas viaturas as minas rebentando;
Da negra missão os soldados se mostravam
Decididos; e os aviões vão apoiando
A coluna com muita acrobacia
Porque no mais não passa de «fantasia.
IX
As roquetadas vêm do turra e juntamente
As granadas mortíferas e tão danosas;
Porém a reacção não consente
Que dêem fogo às hostes temerosas;
Porque o generoso ânimo e valente,
Entre gentes tão poucas e medrosas,
Não mostra quanto pode, e com razão:
Que é fraqueza entre ovelhas ser leão.
X
Da bolanha escondida, o grão rebanho,
Que pela mata foi aparecido,
Olhando o ajuntamento lusitano
Ao soldado foi molesto e aborrecido;
No pensamento cuida um falso engano,
Com que seja de todo destruído.
E, enquanto isto no espírito projectava,
Já com morteiros e canhões atacava.
XI
E uma noite se passou nesta rota
Com estranha emoção e não cuidada
Por acharem da terra tão remota
Nova de tanto tempo desejada.
Qualquer então consigo cuida e nota
No inimigo e na maneira desusada,
E como os que na errada missão creram
Tanto por toda a Guiné se estenderam.
(Continua)
Notas de L.G.:
(#) Cap Eurico Corvalho, comandante da CART 1613 (Guileje, 1967/68), falecido a 22/12/2011. Cap Carlos Azeredo, cmdt da CCAV 1616(BCAV 1879, que esteve no Olossato. Quanto ao Hipólito e ao Loredo, pede-se ao idálio Reis para identificar estes dois comandantes de companhia que, presume-se, andaram pela região do Oio, e devem ter pertencido ao BCAV 1879, 1966/68 (que, além da CCAV 1616, tinha ainda a CCAV 1615 e a CCAV 1617).
(##) Cap Inf Jorge Barroso de Moura, cmdt da CCAÇ 2313 (hoje general reformado); Alf Mil At Inf Mário Moreira Maia; Fur Mil At Viriato Martins Veiga; Sold apont metralhadora Jerónimo Botelheiro Nunes (a confirmar), cujo municiador morreu a 28/3/1968, nas imediações de Guileje
(###) Alf Mil At Inf Idálio Rodrigues F. Reis (hoje, eng agron ref, membro da nossa Tabanca Grande, residente em Cantanhede); Fur Mil At Inf Mário Manuel Goulart.
(####) Carreiro= Corredor de Guileje, corredor da morte...
(#####) Depois de passar, na IAO, por Mansabá e Olossato (de 15/2 a 15/3/1968), a CCAÇ 2313 seguiu de LDG para Cacine, e esteve em Guileje por pouco tempo (aí fazendo colunas logísticas para Gadamael e cortando cibes). A 8 de Abril de 1968 foi destacada para Gandembel, com a missão de construir um aquartelamento de raíz. Mas a 28 de março, tem os seus dois primeiros mortos, o Domingos Costa (Olival/vIla Nova de Gaia) e Manuel Meireles Ferreira (Pópulo / Alijó). A 8 de abril participa na Op Bola de Fogo...
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Notas do editor:
(*) Últinmo poste da série > 29 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9676: O Cancioneiro de Gandembel (2): Do Hino de Gandembel ao poema épico Os Gandembéis (Parte II) (Idálio Reis)
(**) Fonte: REIS, Idálio - A CCAÇ 2317 na Guerra da Guiné: Gandembel / Ponte Balana. Ed. de autor, [Cantanhede], 2012, pp. 201-204. [Livro a lançar no dia 21 de Abril de 2012, em Monte Real, no nosso VII Encontro Nacional; um exemplar será oferecido pelo autor aos camaradas inscritos].