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quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25109: Por onde andam os nossos fotógrafos? (18): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte IV: Bem-vindos a Nhala!

Foto nº 16


Foto nº 17


Foto nº 18


Foto nº 19


Foto nº 20


Foto nº 21


Foto nº 22

Guiné > Região de Quínara > Nhala e Buba >  2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74)  

Fotos (e legendas): © António Murta (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Estamos a recuperar, selecionar e reeditar algumas das melhores fotos do António Murta, ex-alf mil inf  MA,  2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74). (*)

O Murta nasceu em Cantanhede, em 1951, vive atualmente na Figueira da Foz. Está reformado há mais de 10 anos. Passou a integrar a Tabanca Grande em 2014.

Tem já cerca de 110 referências no nosso blogue, é  autor de uma notável série, "Caderno de Memórias de António Murta"...  de que se publicaram mais de 4 dezenas de postes.

Só começou a fazer fotos a cores ("slides") quando comprou,  vindo de férias, uma Olympus compacta: "Digitalizados com um scanner normal, são uma triste amostra dos originais. Com muito deles optei por fotografar a projecção em suportes variáveis, com os inconvenientes que também isso acarreta." . 

 Fotos nºs, de 16 -17 > Nhala, 1973:

Foto nº 16 > Pórtico de entrada da tabanca
Foto nº 17 > Centro do aquartelamento com mulheres que vem da fonte.

29 de Abril de 1973 (domingo)  (**)


(...) À chegada da coluna a Nhala, e ainda antes de termos descido das viaturas, num ápice, formou-se uma pequena multidão vinda da tabanca, sobretudo mulheres e crianças, que nos receberam com palmas, cânticos, enfim..., se não em apoteose, pelo menos com grande euforia. 

Fiquei entre contente e surpreso, a achar tudo um bocado exagerado. Seria sempre assim? Não foi preciso passarem muitos dias para ter uma explicação, plausível, para aquele acolhimento tão efusivo.

(...) E cantavam acompanhando com palmas:

Periquito vai pró mato / Ó lé, lé, lé!, Velhice vai no Bissau / Ó lé-lé – lé-lé!.

Esta cantilena, soube depois, era conhecida em quase todo o território da Guiné. E eram-lhe acrescentados outros versos, que só aprendi mais tarde, muito brejeiros e, pareceu-me, ao sabor da inspiração do momento:

"Mulher grande cá tem cabaço, / Ó lé, lé, lé! / Bajuda tem manga dele / Ó lé-lé – lé-lé"
"Mulher grande cá tem catota, / Ó lé, lé, lé! / Bajuda tem manga dela / Ó lé-lé – lé-lé"

E voltavam ao princípio com o Periquito vai pró mato, etc. etc.

(...) Desembarcados com armas e bagagens, havia que distribuir o pessoal pelas acomodações previamente preparadas pelo comando da Companhia que iríamos render (após um longo período de sobreposição das duas companhias para o nosso treino operacional e para conhecimento da nossa área de acção).

Verificámos que o aquartelamento estava ainda em obras, com alguns edifícios inabitáveis e valas a rasgar o chão. Mas em vias de conclusão. Não foi fácil acomodar duas companhias numa área pensada para apenas uma e em vias de conclusão. Parte de nós fomos distribuídos por pequenas palhotas na tabanca. Apesar disso foi com satisfação que constatámos que iríamos ter condições condignas de alojamento. 

Eu, confiante, imaginava já os melhoramentos de conforto a introduzir, o arranjo e embelezamento dos exteriores que tornassem a nossa estadia mais agradável, sobretudo no regresso das saídas para o mato. Até lá, havia que desenrascar. A mim também foi destinada uma pequena palhota mesmo no início da tabanca, portanto, fora da área militar. Cabiam apenas, lado a lado, duas camas de ferro e aí fiquei com outro camarada até à conclusão das obras no aquartelamento. Nalguns casos foi até ao fim da comissão dos “velhinhos”. Pouco espaço nos restava dentro da palhota, mas era um abrigo e, além disso, tinha qualquer coisa de exótico a condizer com os cheiros, o pó e o calor de África. Pessoalmente, gostei da experiência.

(...) A população de Nhala é Fula. Os adultos parecem muito indiferentes em relação a nós, ou mesmo frios. Dependem muito da tropa, mas estão fartos de tropa. As mulheres e as bajudas atravessam o aquartelamento para se deslocarem à fonte que fica a pequena distância, num baixio. Está sempre alguém a passar para um lado e para o outro com bacias à cabeça e com a roupa que nos lavam. (...)

As bajudas, algumas bonitas, e toda a criançada são uma simpatia. É contagiante a alegria delas e um bálsamo para a nossa saúde mental. Ainda assim, como já disse, os “velhinhos” de Nhala parece que já não beneficiam desse bálsamo. Aproveitando as recomendações deles, vamos escolhendo as nossas lavadeiras. A oferta é grande, de modo que se fazem “contratações” despreocupadamente. 

E em matéria de sexo, como é? Já em Bolama aprendemos que há lavadeiras “que lavam tudo” por pouco mais que a mensalidade da roupa lavada. «Desiludam-se!». As fulas são muito reservadas e pouco permissivas. Contam-nos um caso ou outro de envolvimento com militares, mas excepcionais e por questões de afecto. A tropa em geral vai brincando, mais ou menos inocentemente, com as bajudas mais velhitas, mas sem consequências nem gravidade. De vez em quando, por ocasião da entrega da roupa lavada aos soldados, lá vem uma delas fazer queixa:

- Alfero, o soldado Manel do teu pelotão apalpou minha mama!

E eu perguntava:

- Ai, sim? E não lhe deste uma estalada?

E estava o caso resolvido.(...)

Fotos nºs 18-22 > Mulheres de Buba (***)

(...) Não recordo a data (1973 ou 1974) nem a razão deste evento em Buba, com grande aparato de viaturas, mulheres e militares à mistura, mas garanto que foram momentos de grande descontracção os que nos proporcionaram as mulheres de Buba, com a sua alegria, vitalidade e carácter forte. 

Reconheço na assistência, soldados do meu grupo de combate e de outro grupo de Nhala. No meio da roda de dançarinas, pode ver-se o cap mil João Brás Dias,  da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 de Buba, animando a festa. (...) (***)

(Seleção, reedição de fotos, revisão / fixação de texto: LG)

___________

sábado, 20 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25090: Por onde andam os nossos fotógrafos? (17): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte III: A caminho de Nhala: em 28 de abril de 1973, viagem de Bolama a Buba


Foto nº 9
 

Foto nº 10


Foto nº 11


Foto nº 12


Foto nº 13


Foto nº 14


Foto onº 15

Guiné > Região de Quínara > Buba  > 1972

Fotos (e legendas): © António Murta (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Estamos a recuperar e a selecionar algumas das melhores fotos do António Murta ex-alf mil inf  MA,  2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74). (*)

Nasceu em Cantanhede, em 8 de janeiro de 1951, vive atualmente na Figueira da Foz. Está reformado há mais de 10 anos. Passou a integrar a Tabanca Grande em 12 de novembro de 2014.

Tem já cerca de 110 referências no nosso blogue, é  autor de uma notável série, "Caderno de Memórias de António Murta"...  de que se publicaram mais de 4 dezenas de postes.

Só comçou a fazer fotos a cores ("slides") quando comprou,  vindo de férias, uma Olympus compacta: "Digitalizados com um scanner normal, são uma triste amostra dos originais. Com muito deles optei por fotografar a projecção em suportes variáveis, com os inconvenientes que também isso acarreta." . 

 Fotos nºs, de 10 a 15:


A caminho de Nhala  > Viagem Bolama - Buba  28 de Abril de 1973 (sábado)

(...) Partimos para o interior sul da Guiné, destinados ao Sector S-2, com sede em Aldeia Formosa. (...) 

A viagem, por rio até Buba, fez-se em lanchas da Marinha, LDG ou LDM, já não recordo. Depois de amontoar o pessoal, bagagens e equipamentos, a lancha entra Rio Grande de Buba acima. Fico desconcertado com o estuário do rio, desmesurado, parece que ainda estamos no oceano. 

Mais adiante, as margens do rio, longínquas, entram com a sua vegetação densa e assustadora água adentro. Ou é o rio que se agiganta floresta dentro em ambas as margens? Começam a aparecer os primeiros afluentes, qual deles o mais grandioso. 

Para quem, como eu, ignora tudo de navegação, fica admirado de o piloto ir tão seguro, no meio do rio, sem embicar por engano num daqueles afluentes. Começa a anoitecer. A lancha, que até aí avançava a toda a potência, de repente, apaga todas as luzes e passa a seguir de mansinho, com os motores a ronronar em surdina, num som cavo e profundo. Daí a pouco não se vê nada e perde-se a noção da trajectória do barco. É como se vogássemos no breu, sobre o silêncio sepulcral do rio e da floresta. Demora até que os olhos se habituem à escuridão e comecem a distinguir a massa escura das margens. 

O pessoal, como sempre muito expedito, acomoda-se como pode, a monte, e prepara-se para passar a noite na paz possível do momento. Nota-se uma certa apreensão com aquelas margens. Nunca se sabe quando dali pode surgir um ataque. Eu, sempre inapto para me acomodar de qualquer maneira, vagueio nas zonas menos apinhadas mas acabo por me sentar de encontro à cabine da lancha numa espécie de arca de chapa que, afinal, é a blindagem de um motor eléctrico. Sinto por baixo de mim a vibração do motor e uma zoada contínua e incomodativa. Daí que estivesse livre o lugar, penso. Fico virado para a amurada de bombordo e para a margem negra onde julgo ver duendes e afins que correm no escuro acompanhando a lancha. Mas o cansaço e as emoções vencem-me e adormeço beneficiando da lassidão que me dá o ronronar da lancha.

De repente acordo ao som de tiros, estremeço, abro os olhos e é dia. Ferido pela luz, semicerro os olhos, levanto-me e tento perceber o que está a acontecer à minha volta. Os tiros - de G3 - continuam, mas como todos estão serenos em redor, alguns ainda dormindo e outros cavaqueando entre risadas, sento-me de novo tentando aquecer e endireitar o pescoço que está afectado pela posição em que dormi. Mais tiros. Percebo que é à proa e, irritado, levanto-me para ver o que passa. 

Espantoso! Um marujo munido de garrafas vazias vai-as atirando com força lá para a frente e outro, de G3 em punho, tenta acertar-lhes na água enquanto não se afundam. Fiquei furioso. Apeteceu-me abordá-los e perguntar-lhes se a barca não tinha patrão... Mas contive-me, não fossem atirar-me borda fora. 

Por outro lado - há sempre um outro lado -, comecei a ficar mais tranquilo em relação à segurança da viagem: se estavam naquela galhofa em pleno dia, deviam saber que o podiam fazer. Era porque estávamos a chegar e o perigo tinha ficado para trás. E não me enganei. A lancha parecia seguir a toda a potência mas, subitamente, abranda e vira um pouco à direita. Descobre-se um cais e os primeiros edifícios de Buba, até aí encobertos pela densa vegetação da margem. O rio, tão dentro já do território, continua ainda imponente.

Estamos, enfim, em Buba, a dois passos de Nhala. O espectáculo que vislumbro da amurada, virado para a ponte-cais e a rampa de terra vermelha que leva aos primeiros edifícios do aquartelamento – que por serem num ponto alto ocultam a tabanca e o resto -, deixa-me, nesse instante, uma imagem tão amável de África, tão marcante, que nunca mais esqueci. Mas tanto pode ser a “porta” de entrada para o Éden, como para o inferno. Só o tempo revelará.

Bem no cimo, à esquerda, um edifício de tipo colonial e uma enorme árvore florida de vermelho - jacarandá (?) -, chamam a atenção ainda antes do desembarque. Do lado direito, junto de uma árvore de porte e altura descomunais, percebe-se um dos edifícios do aquartelamento.

(Continua)

(Seleção, revisão/fixação de texto, negritos, edição de fotos: LG)

Legendas:

Foto nº 9 > O rio Grande de Buba (1974)

Foto nº 10 > Buba: a ponte-cais, com uma LDG a partir, aproveitandpo a maré-cheia (1974)

Foto nº 11 > Buba, 1973 – Vista a partir da rampa que vem do rio. Slide feito muito depois do dia da chegada, a partir de um ângulo oblíquo em relação à primeira visão e num dia sem esplendor. 

Foto nº 12 > Buba, 1973 – Vista parcial do aquartelamento, lado direito, obtida de costas para o rio. 

Foto nº 13 > Buba, 1973 – Ao cimo da rampa com o Rio Buba ao fundo. A árvore florida é uma acácia (e não uma jacarandá, planta que dá flor azul, e é nativa da América do Sul).

Foto nº 14 > Buba, 1973 – Fotografia da praxe para impressionar a namorada e a família. Eu, sobre o obus 14.

Foto nº 15 > Buba, 1973 – Fotografia da praxe para impressionar os amigos. Bajudas e mulheres de Buba.

9 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25051: Por onde andam os nossos fotógrafos? (16): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte I:

sábado, 13 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25064: Por onde andam os nossos fotógrafos? (17): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte II: chegada no T/T Uíge, as primeiras impressões, Spínola em Bolama, início da IAO...


Foto nº 5

Guiné > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bolama > Bolama > 27 de março de 1973, desfile perante o gen Spínola



Foto nº 6

T/T Uíge > 20 de Março de 1973 > Jantar de despedida. "Eu sou o rapaz da esquerda, aí no pequeno corte (...). À minha esquerda  está o Alf Torres da 1.ª CCaç (Buba), e à direita,  com a cara sobreexposta, o Alf Mota da 3.ª CCaç (Aldeia  Formosa). Do outro lado da mesa, dois Alferes do QP (presumivelmente,  SGE). 


Foto nº 7 

T/T Uíge > 20 de Março de 1973 > Jantar de despedida. "Eu sou o rapaz da esquerda, aí no pequeno corte (...). À minha esquerda  está o Alf Torres da 1.ª CCaç (Buba), e à direita,  com a cara sobreexposta, o Alf Mota da 3.ª CCaç. (A. Formosa). Do outro lado da mesa, dois Alferes do QP (sfuramente SGE) 
 


Foto nº 8 

Guiné > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bolama > Bolama >  CIM > Abril de 1973 – Capitão B. C. (cmdt da 1.ª C/BCAÇ 4513) observa uma granada de RPG 7 (ou 2 ? ). A seu lado, um dos elementos do Grupo de Combate do Marcelino da Mata, "Os Vingadores".


Fotos (e legendas): © António Murta (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1.  Nesta série, "Por onde andam os nossos fotógrafos?",  começámos agora a revisitar, selecionar,  recuperar e reeditar  algumas das melhores fotos do António Murta (de seu nome completo António Manuel Murta Cavaleiro), ex-alf mil indf MA, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) (*). 

Vive na na Figueira da Foz. É autor da notavel série "Cadermos de Memórias do António Murta", de que nos socorremos para enquadrar, melhorar e complementar as legendas. (**)

  
Fotos nºs 6 e 7 > BCAÇ 4513, a caminho do CTIG, a bordo do T/T Uìge


(...) 20 de Março de 1973 (terça-feira) – N/M "Uige", jantar de despedida

Estava quase no fim a viagem e isso era marcado por um jantar de despedida. Não muito diferente dos outros jantares, teve, todavia, algo indefinível que o tornou mais solene. (...) A ementa, impressa a bordo, dizia assim:

"O Capitão de Bandeira, Comandante, Oficiais e restante tripulação do navio apresentam as suas despedidas aos Exmos. Oficiais, assim como a todos os componentes do Contingente Militar desejando muita saúde e as maiores felicidades. Paquete “Uíge”, 20 de Março de 1973"

Seguiam-se as páginas com a lista completa dos oficiais (e sargentos?) a bordo. (Não sei o que me passou pela cabeça para, muitos anos mais tarde, ter digitalizado a capa da ementa e pequenos fragmentos daquela lista e ter destruído todo o resto.) (...)


22 de Março de 1973 (quinta-feira) – Chegada a Bissau

 
(...) Desloquei-me para o outro lado do navio, olho em frente, e lá estava Bissau, ainda distante mas já ali. Eram 9h50 locais, 11h50 de Lisboa. Reparei, ainda, que o resto dos passageiros já devia estar ali na amurada desde manhã cedo a observar. Alguns faziam comentários mas, se calhar a maioria, conjecturava em silêncio. Os rostos, curiosos, eram de ânsia e apreensão.

A cidade de Bissau vista dali do navio parecia muito rasa de edifícios, e subia ligeiramente a partir do cais. Tudo o mais, quer olhássemos à esquerda ou à direita, parecia uma fita verde quase ao nível das águas, para trás da qual nada mais se via. O navio continuou fundeado ao largo entre a Ilha do Rei e a cidade. 

Todo o dia foi passado a bordo e era suposto aí permanecermos até ao transbordo para as lanchas da Marinha que nos levariam a Bolama, nosso primeiro destino. Mas à noite, já atracados à ponte-cais que liga ao porto propriamente dito, convencemos o comandante do Uíge, com a intervenção influente do cap B. C. – que conhecia Bissau visto ter feito na Guiné o estágio do seu curso de capitão, antes de regressar à Metrópole para se integrar no nosso Batalhão – convencemos o comandante, dizia, a deixar-nos sair para uma pequena exploração e, se possível, beber uns copos.

Eram precisamente 23h55 quando, pela primeira vez, pisei terra africana. Sem prazer nem desprazer, embora com alguma curiosidade. (...)


23 de março de 1972 (sexta feira) - Partida para Bolama

(...) Deitei-me à 1h30 da madrugada (última noite no navio), para me levantar às 3 horas e preparar a saída para Bolama, com os soldados de duas Companhias, a bordo de uma LDG da Marinha. Pelo menos outra se lhe seguiria com o resto das tropas. Saímos de Bissau às 5 horas da madrugada e chegámos a Bolama às 10 horas. Era uma sexta-feira, 23 de Março de 1973. (...)

(...) O que recordo foi a recepção que nos fizeram dezenas de crianças e algumas mulheres, habituadas que estavam a que à sua terra estivessem sempre a chegar novos contingentes, à medida que outros saíam. E zumbiam à volta dos tropas a oferecer os préstimos das lavadeiras que, sabiam, poucos iriam dispensar. Pediam também dinheiro (patacão) de mão estendida. Eram uns safados e umas safadas, muito batidos naqueles contactos, mas muito bonitos e gentis. Foi o primeiro contacto com o calor humano local, a suavizar angústias, medos indefinidos e dúvidas sobre o futuro.

Faltava instalarmo-nos e fazer o reconhecimento da cidade. Um espanto! Como fora possível que uma cidade daquelas, tão pequena e desprezada, tenha sido a capital da Guiné? Só estou a ver uma explicação: em toda a Guiné não havia outra com melhores condições e infra-estruturas para ser a capital da colónia. Até ao desenvolvimento de Bissau. (Ou seria por estar a bom recato das beligerâncias do interior da colónia? Ou para evitar novas ocupações estrangeiras? Em termos de história, isso foi anteontem, em quinhentos anos de presença portuguesa...). Ainda assim, uma avenida – não asfaltada – leva-nos, subindo, a um grande jardim público abandonado, no topo do qual se apresenta o imponente edifício que fora a Administração da colónia. Lateralmente e não muito distante havia o Hotel Turismo, pequeno mas com alguma nobreza, que fora a filial do Banco Nacional Ultramarino inaugurado em 1903 e que, agora, era a Messe de Oficiais.

Para além dos quartéis, havia as escolas, a igreja, a tipografia, o Clube dos Bombeiros com os seus matraquilhos, ping-pong e bar, onde íamos à civil beber uns copos e observar as senhoras brancas, mulheres dos outros oficiais. Junto ao cais, na baixa, havia uma piscina que só utilizei uma vez por receio daquelas águas. Melhor que tudo era o restaurante de portugueses onde, quando era possível, tirávamos a barriga e a alma de misérias.

Esta pequena urbe empoeirada e quente não é nada do que tinha imaginado mas, nas horas amenas dos fins de tarde, dava-me imenso prazer deambular pelas suas ruas quase desertas, apreciando as suas casas coloniais, muito abandonadas, com as sua varandas típicas, e ir descendo até ao cais onde me sentava sozinho a assistir ao pôr-do-sol, imaginando as praias da minha Figueira da Foz. Depois, lembrava-me que estava sentado ao contrário, virado para o canal de Bolama e para o continente, e que à minha esquerda tinha o norte e não o sul, e levantava-me irritado e virava costas. Para mais, dali de frente, de S. João, é que têm partido os mísseis do PAIGC nos ataques à cidade, segundo nos dizem, para susto dos periquitos. Mas, quando podia, voltava lá.

Nesses entardeceres cálidos e perfumados mas cheios de luz, era um espectáculo apreciar os bandos de morcegos, aos milhares, num esvoaçar barulhento e nervoso. Tudo era novidade. E os abutres (jagudis) com o seu ar decrépito nos ramos secos das árvores? Quando escurecia continuavam a ver-se as suas silhuetas, atentas e diligentes, para bem da salubridade da cidade. (...)


Foto nº 5 > Desfile do BCAÇ 4513 perante o gen Spínola


27 de Março de 1973 – (terça-feira)[ou dia 28?] – Chegada do General Spínola
 

Há muito que todo o Batalhão se encontrava em formatura frente ao edifício da Administração, no topo do grande jardim central de Bolama, aguardando a chegada do General. 

(...) Como me tinham prevenido os “velhinhos” de Bolama, com ar de gozo, o discurso que o General faria às tropas, começaria assim: «Conheço-vos a todos! É como se tivesse vindo convosco no barco. Etc., etc.» 

E o General disse-nos do alto da escadaria: «Conheço-vos a todos! É como se tivesse vindo convosco no barco. Também eu sou um soldado como vocês! Etc. etc.».  (...)


21 de abril de 1973 (sábado) – Primeiras mortes

(...) Soube hoje – fim da 2.ª semana de campo – que um alferes que viajou comigo no Uíge, mas que não recordo, e que estava a fazer a IAO no interior da província e não em Bolama, morreu acidentalmente com uma rajada na cabeça. Era de noite e levantou-se para ir urinar. Ao regressar, uma das sentinelas, seu soldado, não o reconheceu. É a versão que corre. 

Ontem, aqui no porto de Bolama, estava também num caixão, dentro de um barco da Marinha, o corpo de um rapaz que morreu nas mesmas circunstâncias. É o medo e a inexperiência a fazerem das suas.

Aqui em Bolama continuamos a estranhar a ausência de um ataque com mísseis do PAIGC a partir de S. João, ali no continente, mesmo em frente a esta parte da ilha. Todos os Batalhões que nos antecederam foram atacados, quase sempre logo após a chegada, com objectivos evidentes. (...)


(Continua)

(Seleção, revisão/fixação de texto, negritos, edição de fotos: LG)

_________________

Notas do editor LG:


(**) Vd. os primeiros postes da série:

16 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14373: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (1): Embarque para a Guiné, 16 de Março de 1973

terça-feira, 9 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25051: Por onde andam os nossos fotógrafos? (16): António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª C/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74) - Parte I: Em 16 de março de 1973 estávamos irremediavelmente a partir no N/M Uíge...



Foto nº 1

Lisboa  > Cais da Rocha Conde de Óbidos > 16 de março de 1973, meio da tarde >  Partida do Batalhão de Caçadores 4513 no navio Uíge rumo à Guiné.

(....) Estava repleto o navio e os militares alcandoravam-se nos locais mais improváveis, para além de escadórios e da amurada, na ânsia de serem vistos pela multidão de familiares que acenavam do cais. Era uma cena já de todos conhecida, militares e famílias, que ao longo dos anos a viram – e temeram – pela televisão e pelos jornais. 

"No que me toca, e depois de ter perdido de vista o meu pai no cais, apoderou-se de mim uma fria indiferença. Estava ali a começar uma odisseia, uma aventura no desconhecido, mas que haveria de ter um fim, que só podia ser o regresso. Recordo estas sensações porque as preparei antes e me agarrei a elas no momento crucial. 

"Apesar disso, foi no instante em que o bojo do navio se desencostou lentamente do cais, que tive o momento mais penoso e cruel. Não tinha pensado nesse detalhe tão significativo: o brevíssimo instante da separação. Estava quebrado, definitivamente, o fiozinho que ainda me ligava a casa, aos familiares, ao meu país e a uma esperança tola de que, até ao último instante, acontecesse algo de extraordinário, um cataclismo, uma morte bombástica, sei lá..., morreu o Amílcar Cabral e não aconteceu nada, mas podia morrer o Marcelo, cair a Ponte Salazar e o barco ficar ali encalhado!... Nada. Não aconteceu nada. 

"Afinal, estávamos irremediavelmente a partir. E não tinham partido milhares de outros antes de mim? (...) (Poste P14373 (***).

Foto nº 2 

Guiné > Região de Quínara > Nhala > 2ª C/BCAÇ 45143 (Aldeia Formosa, Buba e Nhala, 1973/74) > 1973 > O alf mil inf MA António Murta: "um estado d'alma"



Foto nº 3

Guiné > Região de Quínara > Nhala > 2ª C/BCAÇ 45143 (Aldeia Formosa, Buba e Nhala, 1973/74) > Pós-25 de Abril de 1974  > O alf mil inf MA António Murta, em primeiro plano, sentado no capô da Berliet MG-20-79.

Foto nº 4

Guiné > Região de Quínara >  Nhala (a nordeste de Buba) > 1974 > Agosto de 1974 > Os "Unidos de Mampatá", a CART 6250/72 (Mampatá, 1972/74), em final de comissão, foram despedir-se dos "periquitos" de Nhala (2ª C/BCAÇ 4513)... À esquerda, assinalado por um quadrado amarelo, o nosso António Carvallho, o "Toni", mais conhecido por "Carvalho de Mampatá".  O nosso fotógrafo, o António Murta,  estava lá.

Um cartão de boas festas 2014/2015 original, criação do António Murta

Fotos (e legendas): © António Murta  (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Continuamos à procura dos nossos fotógrafos (*)


A fotografia é um dos recursos mais valiosos do nosso espólio. Não sabemos ao certo quantas imagens já publicámos no nosso blogue em vinte anos (desde 2004). Uma estimativa por baixo aponta para mais de 100 mil. Já publicámos mais de 25 mil postes, o que daria uma média de 4 fotos ou imagens  por poste. 

Fotógrafos (ou donos de álbuns fotográficos com grande interesse documental) são seguramente muitas dezenas. Alguns de nós tornaram-se até fotógrafos com talento, no CTIG ou até depois, na peluda. A maioria não tinham tirado fotografias. Comprou uma máquina em Bissau (em geral, de "made in Japan", e mais baratas do que na metrópole), e levou-a para o mato. (**)

As suas fotos  têm suscitado a curiosidade de cineastas, jornalistas, investigadores, etc., que de tempos a tempos recorrem ao nosso blogue para cedência de imagens. Temos uma política sobre esse assunto; cópia digital das fotos é cedida, para efeitos não-comerciais,  mediante acordo tanto dos edtores como dos titulares dos créditos fotográficos. Julgamos que, enquanto antigos combatentes, temos esse dever de serviço público. Mas também exigimos que respeitem a propriedade intelectual e não façam uso indevido do material cedido.

A mítica Olympus Trip 35, de que se terão
vendido10 milhões de unidades entre 1967
e 1984... Ideal para se tirar fotos em férias
(daí o nomedo modelo, "trip"),  
despreocupadamente
2. Hoje começamos a recuperar e a selecionar algumas das melhores fotos do António Murta, de seu nome completo António Manuel Murta Cavaleiro, ex-alf mil indf  MA,  2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74). 

Nasceu em Cantanhede, em 8 de janeiro de 1951, vive atualmente na Figueira da Foz. Está reformado há mais de 10 anos. Passou a integrar a Tabanca Grande em 12 de novembro de 2014.(***) 

Tem 105 referências no nosso blogue, sendo autor de uma notável série, "Caderno de Memórias de António Murta"...  de que se publicaram pelo menos 42 postes (****)

Não nos conhecemos pessoalmente mas já temos falado ao telefone (ainda ontem, data do seu aniversário). Não sei o que fazia profissionalmente, constato que tem um grande talento para o desenho (veja-se o cartão de boas fesats que nos mandou no final do ano de 2014) (vd. imagem acima) (*****).

Exigente consigo e com os outros, escreveu sobre a sua atividade de fotógrafo amador:

(...) "As minhas fotografias, no geral, não têm grande qualidade: quando fui para a Guiné nem máquina tinha. Usei uma emprestada por uma amiga, mas demasiado básica e pouco fiável. Nas primeiras férias comprei uma Olympus compacta e passei a fazer, quase sempre, slides. Digitalizados com um scâner normal, são uma triste amostra dos originais. Com muito deles optei por fotografar a projecção em suportes variáveis, com os inconvenientes que também isso acarreta." (...) (***)

(Continua)
_____________



(****) Vd.postes de:

16 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14373: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (1): Embarque para a Guiné, 16 de Março de 1973


(*****) Vd. poste de 18 de dezembro de 2014 > Guiné 63/74 - P14044: Sob o poilão sagrado e fraterno da nossa Tabanca Grande: boas festas 2014/15 (4): Cartão original de António Murta

terça-feira, 21 de novembro de 2023

Guné 61/74 - P24870: Álbum fotográfico do António Alves da Cruz, ex-fur mil at inf, 1ª C/BCAÇ 4513/72 (Buba, 1973/74) (12): agosto de 74, momentos de convívio e descontração


Foto nº 57  > Da esquerda para a direita,  ex-furriel Carola (do quadro), ex-cap mil João Luís Brás Dias, ex-fur mil mil Lavos (de transmissões), eu e e o ex-alf mil Gatões (de costas)


Foto nº  58 >  O pessoal na palheta.


Foto nº 59 > O Cap Brás Dias com o Lavos


Foto nº 60  >  O cap Brás Dias na brincadeira com o Lavos, a colocar o chapéu e as divisas do fur Carola


Foto nº 61 > O Brás Dias e o Lavos


Foto nº 62 >   Da esquerda para a direita: Carola (de costas), Brás Dias, Raposo, Lavos,  eu e o Gatões (de costas)


Foto nº 63 > O Lavos já muito bem aviado. Eu, à direita.

Guiné > Região de Quínara > Buba > 1ª C/BCAÇ 4513/72 (Bula, 1973/74) >   Agosto de 1974, momentos de convívio e descontração. 

Fotos (e legendas): © António Alves da Cruz (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



António Alves da Cruz: lisboeta,
vive em Almada, trabalhou na Lisnave;
partiu para o CTIG em 16/3/73
e regressou a casa 6/9/74.

1. Mais fotos, enviadas a 11 do corrente, às 19:12, do álbum do António Alves da Cruz (ex-fur mil at inf, 1ª C/BCAÇ 4513/72, Buba, 1973/74), que tem já cerca de duas dezenas de referências no nosso blogue.  

Amigo Luís,  são os últimos "slides"... Estamos em agosto de 74, a poucos dias de nos virmos  embora,  a descontração já era outra.

 Deste grupo de camaradas, que eu saiba os que já não estão entre nós são o Raposo e o Gatões (Foto nº 62).

Quando quiseres publica os "slides" que enviei a 2/9/23 (n=32),  salvo o erro,  e referentes à  entrega de Buba ao PAIGC. Se for necessário enviar novamente,  diz.

Um forte abraço, Cruz


Guiné > Região de Tombali > Colibuía, 10 de junho de 1973 (ou 74?)  >  BCAÇ 4513/72 (Aldeia Formosa, 1973/74) > Em baixo, a partir da esquerda: 

(i) cap mil João Luís Brás Dias, cmdt  da 1.ª CCAÇ, Buba; 

(ii) cap mil Joaquim M. Guerreiro Dias, cmdt  da 3.ª CCAÇ, Aldeia Formosa (faleceu em agosto de 2013); 

(iii) cap mil Luís Marcelino, cmdt da CART 6250/72, Mampatá, integrada no nosso Batalhão;  e
(iv) alf mil António Murta, cmdt  do 4.º Pel /2.ª CCAÇ,  Nhala (atrás, um tenente do QP, de quem não recordo o nome, que ainda conheci com o posto de sargento-ajudante, excelente pessoa e muito bonacheirão).

Foto (e legenda): © António Murta (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Nota do editor:

Último poste da série > 17 de outubro de  2023> Guiné 61/74 - P24764: Álbum fotográfico do António Alves da Cruz, ex-fur mil at inf, 1ª C/BCAÇ 4513/72 (Buba, 1973/74) (11): paisagens e rostos de camaradas que não esquecemos

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Guiné 61/74 - P24806: As nossas geografias emocionais (13): A fonte da Colina de Madina, 1945 (Manuel Coelho / Cherno Baldé / António Murta)

Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4

Guiné > Região de Gabu > Madina do Boé > CCAÇ 1589 / BCAÇ 1894, "Os Tufas" (Bissau, Fá Mandinga, Nova Lamego, Beli e Madina do Boé, 1966-68) > 1967 > A "Fonte da Colina de Madina", construída em 1945. ao tempo do governador Sarmento Rordrigues. Fotos do álbum do Manuel Coelho, um dos nossos grandes fotógrafos.



Manuel Coelho, um dos bravos
 de Madina do Boé (1966/68)


1. Quatro  grandes fotos do Manuel Coelho (fotos nºs 1, 2, 3 e 4), um dos bravos de Madina do Boé, ex-fur mil trms, da CCAÇ 1580 (1966/68) (natural de Reguengos de Monsaraz, vive em Paço d'Arcos, Oeiras; tem 45 referências no nosso blogue, ingressou na Tabanca Grande em 12 de julho de 2011).


(i) Excerto de mensagem do Manuel Coelho,  com data de 23 de julho de 2018 às 19h45 (*):

(...) Parabéns pelo esforço (conseguido) de mostrar uma região tão importante para nós como para o PAIGC. Quem sobreviveu aqui a este conflito não esquece, fica marcado no nosso pensamento e, mesmo após 50 anos. ainda dói!

Quem dera ter a veia poética do Luís ou de outros camaradas para explicar em verso o calvário de meses de isolamento, com falta de reabastecimento, ataques diários, etc...

Para comparar envio mais algumas fotos [inéditas,] do meu álbum, começando pela da célebre "Fonte da Colina de Madina" [que ainda lá estava em 1998]...

Em relação a esta fonte, ela servia não só para fornecer os bidões para banho como para as lavadeiras fazerem o seu trabalho. Para beber tinha de se ferver ou desinfectar devidamente. (...)



Guiné-Bissau> Região de  Gabu > Boé > Madina do Boé > 1998 > A famosa fonte da Colina de Madina, com ornamentação de azulejo português, pintado à mão, de 1945. Parece(ia) haver vestígios de impacto de balas de armas automáticas (?), ou então os azulejos foram picados ou ainda (outra hipótese) estão deteriorados por ação do uso e das intempéries.


Guiné-Bissau> Região de Ganu > Boé > Madina do Boé > 1998 > A famosa fonte da Colina de Madina é um sítio onde se concentra(va) alguma população civil da escassa que há (havia)  nesta região semidesértica, e a única da Guiné que é acidentada (com cotas que sejam quase aos 300 metros). Fotos do álbum do nosso querido amigo e camarada  Xico Allen (1950-2022), que aqui esteve em 1998. As fotos chegaram-nos às mãos em 2006, por intermédio do Albano Costa (**).

Fotos (e legendas): © Francisco Allen / Albano M. Costa (2006). Todos os direitos reservados [Edição e çegendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. Dois comentários de:  (i)  nosso colabor permanente Cherno Baldé, que vive em Bissau, e tem 285 referências no nosso blogue;  e (ii)  António Murta, ex-alf mil inf MA, 2ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), autor da notável série "Caderno de Memórias de A. Murta"; membro da Tabanca Grande desde 12/11/2014, tem mais de 100 referências no nosso blogue; vive na Figueira da Foz.

2.1. Cherno Baldé:

(...) Falando sobre as fontes ou nascentes de água em locais estrategicamente situadas junto de pequenas elevações de terreno, como tenho visto um pouco por todo o território, no Norte, Sul, Este e Oeste, fico sempre maravilhado com a  vista e na presenca deste apurado conhecimento do terreno e da noção do que pode ser um desenvolvimento durável e autossustentado stricto sensu

O que mostra, claramente, que os "colonialistas" que nos governaram nos anos 30 e 40 (aqui certamente no tempo de Sarmento Rodrigues), tinham uma visão de longo prazo e uma noção clara sobre o que era o desenvolvimento autossustentado, centrado nos recursos e bens disponíveis localmente e na sua utilização racional e equilibrada a bem da comunidade.

O Manuel Coelho diz que a água precisava ser fervida antes do seu consumo, mas a verdade é que ela é servida assim mesmo e muitas vezes é do melhor que ha (Iagu Sabi) e, pessoalmente, já a bebi muitas vezes, diretamente da fonte, em Bafatá, Quinhamel, Canchungo e, comparada com a água das nossas bolanhas do leste, era uma maravilha d'água e ainda hoje é. (**)

(...) É o que tenho estado a dizer aos mais novos, sempre que vejo esses maravilhosos locais com as suas fontes quase centenárias, mas que ainda continuam vivas e a jorrar água limpa e da melhor que há disponivel ao beneficio das populações locais e com nomes proprios que as populações lhes deram.

Encontrei-as em Bafatá (Boma), Bissau, Quinhamel (Hoilan), Canchungo, Catiá, Bambadinca, Madina de Boé e sei que existem e estão espalhadas por todo o território nacional.

Já não podemos dizer o mesmo dos furos e bombas manuais que os novos projectos de desenvolvimento, fruto da coooperação e das ajudas internacionais,  espalharam nas zonas rurais em anos recentes, mas que normalmente duram pouco, nãp sabendo ao certo se não teriam, também, um aplicativo de obsolescência programada, como se diz atualmente sobre todos os produtos do capitalismo moderno que nos calhou em escala. (...) | 25 de julho de 2018 às 13:27


2.2. António Murta:

As fotografias 3 e 4 da Fonte da Colina de Madina, que parece ser já um memorial, são muito bonitas e tecnicamente quase perfeitas: pelo enquadramento, pela gama de cinzentos, pela textura, e pelos reflexos que nos dão a sensação de vida daqueles instantes. 

Sei que não é isso que está em discussão e desculpem o arrazoado, mas é porque fiquei que tempos a olhar para elas. Não desmereciam o ilustre Ansel Adams (1902-1984), um especialista do preto e branco, sem contudo carregarem a rigidez técnica obsessiva que tiravam sensibilidade às fotografias dele. 

Parabéns ao Manuel Coelho.(...) | .26 de julho de 2018 às 00:56 
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Notas do editor:

(**) Vd. poste de 10 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11822: Álbum fotográfico do Xico Allen: região do Boé, 1998: trágicos vestígios 'arqueológicos' da guerra colonial, entretanto já destruídos ou desaparecidos...