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terça-feira, 10 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22447: Efemérides (351): Ainda e sempre o naufrágio no rio Geba, em 10/8/1972, em que perdemos três camaradas (Jorge Araújo, ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494 / BART 3873, Xime e Mansambo, 1972/1974; agora em férias prolongadas nas "Arábias")


 

Foto (e legenda): © Jorge Araújo (2014). Todos os direitos reservados. (Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné).





1. Mensagem enviada hoje, às 9h09, pelo nosso coeditor Jorge Araújo  (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), e agora de férias prolongadas nas "Arábias" 


 

Caros Camaradas,

Os meus Bons Dias desde as «Arábias».

Faz hoje quarenta e nove anos (1972.08.10-2021.08.10) que vários elementos do contingente militar da CART 3494, a terceira unidade de quadrícula do BART 3873, tiveram de “mergulhar”, sem o desejarem, nas águas revoltas, escuras e lodosas do Rio Geba, na região do Xime/Bambadinca (Sector L1), 
onde, por efeito da falta de bom senso mesclado com alguma improvisação, perderam a vida três jovens milicianos, naquele que ficou gravado como o «Naufrágio do Geba».

Ao recuperar esta horrenda efeméride que a todos marcou, naturalmente mais aos que viveram e sobreviveram à experiência, quero prestar a minha sentida homenagem aos que pereceram naquele acidente náutico: 

José Maria da Silva Sousa
Manuel Salgado Antunes
Abraão Moreira Rosa.

Para compreender a trágica ocorrência devem-se ler os postes:

Com um abraço de amizade e muita saúde,
Jorge Araújo

 ________

Nota do editor:

Último poste da série > 1 de agosto de 2021 > Guiné 61/74 - P22421: Efemérides (350): Fez 55 anos, em 30/7/1966, que parti para o CTIG, no T/T Uíge, para ir formar em Bolama o Pel Caç Nat 54... Estive depois em Mansabá, Enxalé, Missirá, Porto Gole, Ilha das Cobras e Ilha das Galinhas (José António Viegas, fur mil art, 30/7/1966 - 22/9/1968)

quinta-feira, 29 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22152: In Memoriam (392): Claúdio Ferreira (1950-2021), ex-fur mil art, CART 3494 (Xime e Mansambo, 1971/74)... Passa a integrar, a título póstumo, a Tabanca Grande, sob o nº 840 (Jorge Araújo)

 


IN MEMORIAM

HOMENAGEM AO CAMARADA

CLÁUDIO MANUEL MARQUES FERREIRA [1950-2021]

- Ex-Fur Mil Art da CART 3494 (Xime-Mansambo, 1971-1974) –

por Jorge Araújo

 


Camaradas,

Serve o presente para dar-vos conta de mais uma notícia que nunca estamos preparados ou desejamos fazê-lo. Trata-se de mais uma baixa no contingente da minha CART 3494, desta feita a do meu/nosso camarada Cláudio Manuel Marques Ferreira (1950-2021), ex-furriel do meu Grupo de Combate (o 1.º), com quem partilhei, durante os já longínquos anos de 1972-1974, para além do mesmo espaço de pernoita, muitos momentos de verdadeira amizade e solidariedade e, também, muitas emoções, nomeadamente ao calcorrear os mesmos caminhos que nos "couberam em sorte", todos eles situados a sul do Xime.

Com efeito, este triste e sentido desfecho já estávamos a prever há algum tempo, precisamente quando o telemóvel do Cláudio Ferreira deixou de comunicar. É que no final do mês de Março, o camarada António Bonito contactou-me perguntando se sabia algo sobre o camarada Cláudio Ferreira, uma vez que lhe ligou mas o seu telefone estava desligado. Este era o indício do que já tinha acontecido… e que hoje foi, lamentavelmente, confirmado.

Descansa em paz, camarada Cláudio Ferreira!

Em sua homenagem, recordo aqui alguns momentos que fazem parte da memória colectiva da CART 3494, que no próximo mês de Outubro comemora meio século de existência, quando a Unidade se constituiu no RAP 2, em Vila Nova de Gaia, preparando a sua missão Ultramarina.


Foto 1 > Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Xime > Setembro de 1972 > Da esquerda para a direita: Cláudio Ferreira, João Godinho e Jorge Araújo, trio de furriéis responsáveis pelo 1.º Gr Comb.

 

◙ - MEMÓRIAS DO DIA 9 DE AGOSTO DE 1972 (VÉSPERA DO NAUFRÁGIO NO GEBA)


(…) O dia 09 de Agosto de 1972, 4.ª feira, foi passado no cumprimento das diferentes tarefas logísticas internas como sejam: limpeza, recolha e abastecimento de água pelos diferentes abrigos e outros serviços de manutenção ao aquartelamento, sob a orientação operacional dos três furriéis do grupo: Cláudio Ferreira, João Godinho e Jorge Araújo.


Concluídas as diferentes missões, o restante tempo que faltava para encerrar o dia foi utilizado no jantar, na messe, e depois recolhemos ao nosso "TZero", procurando recuperar energias para o dia seguinte, já que a missão atribuída na escala era de «intervenção», desconhecendo-se, naquele momento, o que estava previsto ou pensado para esse efeito.


Já na posição de deitado, recebendo o ar fresco da ventoinha suspensa na estrutura da cabeceira da cama, pois estávamos na "época das chuvas", eis que entra no quarto o camarada Cláudio Ferreira, com ar de poucos amigos, contando que tinha sido chamado ao Gabinete do CMDT da Companhia, ex-Cap. António José Pereira da Costa, líder da CART 3494 desde 22Jun1972, recebendo instruções para preparar a sua Secção (Bazuca) reforçada com mais alguns elementos do Gr Comb (o 1.º), com o objectivo de no dia seguinte, de manhã, participar num patrulhamento a efectuar na margem direita do Rio Geba, estando prevista a inclusão, na acção, do Major de Operações do BART 3873, ex-Major de Artª. Henrique Jales Moreira.


Perante os sinais de ansiedade transmitidos em cada frase emitida e o nervosismo sentido em cada movimento corporal, logo o questionámos – eu (Jorge Araújo) e o João Godinho – o que se passa contigo?


A resposta não foi imediata. Mas, depois de alguma insistência, afirmou sentir-se um pouco em baixa de forma. Perguntei-lhe se queria que eu fosse no seu lugar. A sua resposta foi afirmativa, deixando cair, então, um grande fardo que tinha sobre os seus ombros. (…)


Seria que estava a adivinhar ou a persentir algo negativo? – (ver P10246)

 


Foto 2  > Guiné > Zona Leste >Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Xime > Dezembro de 1972 >  Messe de Sargentos - Da esquerda para a direita J. Pacheco [Fur, 20.º Pel Art], João Godinho [Fur], Serradas Pereira [Alf], João Fernandes [Fur], Cláudio Ferreira [no acto de cantar] e Jorge Araújo [de costas].

 


Foto 3 > Guiné > Zona Leste >Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > Abril/1973 > Em 1.º plano, da esquerda para a direita: os Furriéis Jorge Araújo, Cláudio Ferreira, Abílio Oliveira e João Godinho; em  2.º plano (e pela mesma ordem): Acácio Correia [Alf], Luciano Costa [Cap], Luciano de Jesus [Fur] e José Araújo [Alf, 1946-2012].

 


Foto 4 > Guiné > Zona Leste >Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Mansambo > Julho de 1973 > Da esquerda para a direita,  Carvalhido da Ponte [Fur Enf], Acácio Correia [Alf], Cláudio Ferreira [Fur], Manuel Ramos [1.º Cabo - 1950-2012] e Rogério Silva [Sold Radiot - 1950-2002]  (foto do álbum do Acácio Correia).

 

◙ - VISITA AO CLÁUDIO FERREIRA NO CENTRO DE MEDICINA DE REABILITAÇÃO DE ALCOITÃO EM 28 DE JULHO DE 2015


Ao termos conhecimento de que o camarada Cláudio Ferreira se encontrava hospitalizado no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, três dos seus camaradas: o Acácio Correia, o Luciano de Jesus e o Jorge Araújo, tomaram a iniciativa de o visitar, em 28 de Julho de 2015, 3.ª feira, para lhe levarmos a amizade e solidariedade de todo o colectivo, transmitindo-lhe o ânimo de que precisava para superar as dificuldades físicas e psicológicas porque estava a passar naquela ocasião.

Foi com muita emoção que nos recebeu e durante cerca de duas horas, contou-nos alguns dos detalhes que o tornaram dependente de uma "cadeira de rodas". Não deixou, também, de viajar pelas memórias de longa data, relativas ao tempo vivido na Guiné.

Quanto ao seu estado físico, ele tem a sua génese num acidente de viação, ocorrido em 2009 no IC9, entre Tomar e o Entroncamento, que lhe provocou várias fracturas expostas em ambos os membros. Ao fim de um ano em recuperação a sua mobilidade permitia-lhe já fazer uma vida normal.

Em 2014, seis anos depois, começou a sentir sinais de falta de equilíbrio até que um dia [em Novembro], ao descer os degraus da escada da sua habitação, em Santarém, caiu desamparado, voltando a fracturar a perna esquerda em vários sítios, entre eles o fémur.

Levado para o Hospital local, aí foi sujeito a uma intervenção cirúrgica. No recobro, durante a recuperação da anestesia, nos primeiros períodos em que esteve acordado tomou consciência do seu corpo. Tudo parecia funcionar. Porém, decorrido algum tempo nesse estado de repouso, entre vigílias e sonos, constatou que não executava a motricidade voluntária dos membros inferiores, pelo que chamou a equipa médica, disso lhe dando conta.

Feitos os exames de diagnóstico do protocolo, voltou ao Bloco para nova cirurgia. Foi-lhe dito, sumariamente, pela equipa médica desta segunda operação, que tinha sido removido um coágulo sanguíneo, o qual contribuiu para esta última situação.

Daí estar no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, entregue à supervisão técnica dos especialistas nesta área científica, na expectativa de recuperar o que deixou de funcionar de um momento para outro – a mobilidade dos membros inferiores.

Eis algumas imagens dessa nossa visita.



Foto 5 > Cascais >  Alcoitão > Julho de 2015 >  O camarada Cláudio Ferreira durante a amena cavaqueira, recordando momentos passados em comum há mais de quatro décadas, no CTIG.  

 


Foto 6 > Cascais > Alcoitão > Julho de 2015 >  O camarada Cláudio Ferreira ouvindo o relato do Acácio Correia (à direita),   relacionado com a sua visita à Guiné-Bissau, em 1998, na qual incluiu os locais palmilhados pelo colectivo da CART 3494.

 


Foto 7 > Cascais> Alcoitão > Julho de 2015 >  Um novo trio olhando para a câmara do camarada Luciano de Jesus: da esquerda para a direita, Jorge Araújo, Acácio Correira e Cláudio Ferreira

 


Foto 8 > Cascais > Alcoitão > Julho de 2015 > A equipa que conviveu com o camarada Cláudio Ferreira, levando-lhe os afectos e a solidariedade de todos os membros da CART 3494.

 


Foto 9 > Cascais > Alcoitão > Julho de 2015 > O camarada Cláudio Ferreira dirigindo-se ao colectivo dos «Fantasmas do Xime», enviando-lhes um GRANDE ABRAÇO e votos de muita saúde.

Fotos (e legendas): © Jorge Araújo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Hoje, que soubemos da sua morte, resta-nos enviar à sua família, e amigos, os nossos mais sentidos pêsames, dizendo-lhes que o nosso camarada Cláudio Ferreira continuará a estar presente… SEMPRE!

 

Saudações,

Jorge Araújo.

28.Abr2021


Comentário do editor LG:


Jorge, e continuará sempre, na nossa  memória, o Claúdio Ferreira, ao passar a integrar, a título póstumo, a nossa Tabanca Grande. Ficará, simbolicmante, inumado, no talhão nº 840, à sombra do nosso sagrado poilão. (**)


Fico sensibilizado também pela vossa solidariedade, ao visitá-lo no Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, em julho de 2015 (***).  São exemplos desses que devem ser conhecidos e louvados. 


Fica também aqui expressa, em público, a nossa solidariedade na dor, endereçada à família e aos amigos e camaradas mais próximos.

_____________


Notas do editor:


(*) Último poste da série > 7 de abril de 2021 > Guiné 61/74 - P22077: In Memoriam (391): Maria Cristina Robalo Allen Revez (8/3/1943 - 5/4/2021) - A Cristina, a Guiné e a sua presença na nossa sala de conversa (Mário Beja Santos)

(**)  Último poste da série > 29 de março de 2021 > Guiné 61/74 - P22048: Tabanca Grande (517): Jean Soares, ex-1º cabo de radiolocalização, Batalhão de Reconhecimento de Transmissões (Trafaria, e Maquela do Zombo, 1972/75): enfermeiro psiquiátrico reformado, a viver em França, em Caen, Normandia, e que está a tentar a recuperar a nacionalidade portuguesa que perdeu... Nasceu em Pirada... Senta-se à sombra do nosso poilão, no lugar nº 839.


(***) Vd. poste de 26 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15162: História da CART 3494 (10): A dimensão humana do colectivo da CART 3494 (Jorge Araújo)

sábado, 13 de março de 2021

Guiné 61/74 - P22000: Memórias cruzadas da região do Xime: a Op Garlopa e o ataque ao Enxalé, em 19 de julho de 1972, ao tempo da CART 3494 (Jorge Araújo)


Imagem de satélite da região do Xime/Enxalé [Sector L1] com infografia da área percorrida durante a «Operação Garlopa» e o modo como foi pensado/executado o ataque IN ao Enxalé, factos ocorridos ao longo do dia 19 de Julho de 1972, 4.ª feira, e que fazem parte das muitas memórias gravadas pelo colectivo da CART 3494 (1971/74).

 


Foto 1 - Enxalé (Jul'72). Uma das áreas atingidas durante o ataque IN à tabanca e ao Destacamento do Enxalé, onde se encontrava o 2.º Gr Comb da CART 3494, ocorrido em 19 de Julho de 1972, 4.ª feira, a partir das 20h20, e que teve uma duração de 20 minutos (aproximadamente). 

 


Foto 2 - Xime (19Jul72). Grupo de elementos da população sob controlo do PIAGC, no subsector do Xime, capturado em 19 de Julho de 1972, no decurso da «Operação Garlopa», num total de 10 indivíduos.


Jorge Alves Araújo, ex-Furriel Mil. Op. Esp./RANGER, CART 3494

(Xime-Mansambo, 1972/1974)

MEMÓRIAS CRUZADAS DA REGIÃO DO XIME EM 19 DE JULHO DE 1972 (4.ª FEIRA) NO TEMPO DA CART 3494

- A «OPERAÇÃO GARLOPA» E O ATAQUE IN AO ENXALÉ -

► ADENDA AO P21960 (02.03.2021)

1.   - INTRODUÇÃO



Previno, desde já, que a presente adenda ao poste acima mencionado, não está directamente relacionada com a narrativa "do baú de memórias" do camarada José Ferraz de Carvalho, ex-fur mil op esp da CART 1746, titulada "não matem a bajudinha!", mas aproveita a legenda da foto que nela consta para a cruzar com outras "Memórias do Xime", em que estivemos envolvidos três anos depois, eu e o camarada cmdt António J. Pereira da Costa… entre outros, naturalmente!


2. - «OPERAÇÃO GARLOPA» EM 19 DE JULHO DE 1972.  


●► A «OPERAÇÃO GARLOPA I», também designada por "Acção", foi agendada para o dia 19 de Julho de 1972, 4.ª feira, para a qual foram mobilizadas as seguintes forças:


■ CCAÇ 12 – a 4 Gr Comb

■ CART 3494 – a 3 Gr Comb

■ CCP 121 – a 2 Gr Comb

■ Apoio aéreo de DO-27 e Helicanhão.


Segundo o livro da "História do BART 3873", p. 75 (capa ao lado), apenas consta o seguinte: "o percurso definido para esta operação/acção foi: "Bambadinca - Xime - Ponta do Inglês - Ponta Varela e Xime, consistindo numa batida, precedida de batimento da Artilharia do 20.º Pel Art (sediado no Xime) e heli-colocação (CCP 121). 


As NT destruíram oito tabancas, vários celeiros e recuperaram dez elementos da população (sob controlo do PAIGC). As NT não sofreram consequências.


Nota: Os locais anteriormente citados estão identificados na infogravura acima.


▬ OUTRAS «OPERAÇÕES» COM O MESMO NOME


●► «GARLOPA II» = Em 22 de Julho de 1972, sábado, envolvendo as seguintes forças:


■ CCAÇ 12 – a 4 Gr Comb

■ CART 3494 – a 3 Gr Comb

■ CART 3493 – a 1 Gr Comb

■ Apoio aéreo de DO-27 e Helicanhão.


A mesma fonte (pp 78-79) refere: "desencadeou-se a "operação/acção" com patrulhamento, emboscada e prévio batimento da Zona, na área de Xime - Madina Colhido - Ponta do Inglês e Poindom. Destruíram-se uma tabanca com dezassete moranças e capturaram-se peças de fardamento usado.


O IN flagelou com RPG-2 a CART 3494, causando-lhe um ferido ligeiro.


Além disso cumpre assinalar o denodo e destemor com que os Militares empenhados encaram os momentos de perigo, tal como sucedeu na flagelação havida no desenrolar da acção «GARLOPA II», aspecto este que se pode e deve reputar uma constante.


●► «GARLOPA III» = Em Setembro de 1972 (?), envolvendo as seguintes forças:


■ CCAÇ 12 – a 3 Gr Comb

■ CART 3494 – a 3 Gr Comb

■ Apoio aéreo de DO-27 e Helicanhão.


Sobre a 3.ª «GARLOPA», segundo a mesma fonte (p 81), é referido: "consistiu em patrulhamento e emboscada na zona Xime - Madina Colhido - Estrada da Ponta do Inglês e Poindom. As NT foram atacadas duas vezes no espaço de meia hora, sofrendo um ferido ligeiro.


3. - «ATAQUE AO ENXALÉ» EM 19 DE JULHO DE 1972.


Para o desenvolvimento deste ponto, recuperamos alguns factos historiográficos já publicados no Blogue, em particular a narrativa do meu/nosso camarada e amigo Luciano de Jesus (ex-fur mil art da CART 3494), escrita na primeira pessoa, por nele ter estado envolvido numa dupla missão: a primeira, por ser mais um elemento do grupo; a segunda, por ser o seu líder.

◙ Cito do P14022:

"Eram vinte horas e vinte minutos da data supra, estava eu a jantar na companha do furriel Benjamim Dias, quando rebentou o fogachal que logo fez estoirar com toda a iluminação do quartel. No céu via-se o rasto das balas tracejantes que tinham por missão orientar o fogo das armas pesadas em direcção do quartel. O furriel Dias saltou de imediato para o abrigo do nosso morteiro e fez um trabalho exaustivo de bater toda a zona circundante.

Eu fui ao gabinete buscar o mapa dos pontos marcados pela nossa bateria de obuses do Xime (20.º Pel Art), com o objectivo de orientar o nosso fogo pesado, logo que se localizassem os pontos de origem do fogo pesado IN. Nesse percurso passou uma canhoada a cerca de dez metros de mim que entrou pelo depósito de géneros, causando alguma destruição. Entretanto, o nosso posto mais acima no quartel, onde tínhamos alguns elementos utilizando também um morteiro pesado, fazia o seu trabalho de contenção, a um eventual avanço, respondendo em conformidade.

O ataque durou cerca de vinte minutos.

O grupo de assalto IN movia-se perto do arame farpado, fazendo fogo. O nosso pessoal despejava metralha. Uns enchiam carregadores e outros disparavam. A bazuca não funcionou. Esperámos nova vaga… mas ela não aconteceu… porque eles tiveram algumas baixas, graças à competência do nosso camarada Fur Art Josué Chinelo, do 20.º Pel Art [obuses 10,5] instalados no Xime, onde este observava perfeitamente, em posição privilegiada da margem esquerda do rio Geba, o desenrolar dos acontecimentos.

Com a sua experiência e saber, ainda que a olho nu, apontou ao ponto de origem do fogo pesado IN (canhão s/r) e… foi na muche. Acertou no posto de comando e fez algumas baixas entre os quais o comandante. Entretanto eles já tinham despejado o fogo todo.

Nessa altura chegou a milícia da tabanca com um ferido grave, um sargento de um dos pelotões. Ainda enviamos um grupo até ao rio para evacuar o ferido para o Xime e recolher mais munições, pois o stock tinha ficado muito em baixo. O ferido entretanto veio a falecer durante a caminhada.

No dia seguinte, como seria de esperar, fizemos o reconhecimento do terreno. Encontrámos um ferido IN junto ao arame farpado; tinha um ferimento grave nas costas e outro na perna e estava em mau estado, crivado de estilhaços.

É de assinalar que este ferido pertencia ao grupo de assalto; tinha vindo da zona do Morés. Estava ferido, mas que eles julgaram morto por isso levaram a sua arma. Vestia uma farda de nylon verde azeitona, calçava bota de lona francesa e as calças tinham elásticos nas bainhas para passar por baixo do pé. Estava, pois, devidamente equipado.

Viemos a saber dias depois, por informantes privilegiados, que o IN, constituído por uma força de 150 unidades (3 bi-grupos, sendo 1 CE), reforçados com 1 canhão s/r, dois morteiros pesados, mais de uma dezena de RPG e um grupo de assalto, tinham feito a sua aproximação durante o dia. Ficaram na orla da bolanha e quando anoiteceu montaram o dispositivo. Um grupo de assalto [o do ferido] oriundo de um mangal e outro arvoredo do lado esquerdo do quartel [para quem está de costas para o Xime, logo a seguir ao final da bolanha).

O mais curioso é que montaram o canhão s/r na bolanha, junto a uma árvore isolada, e que não era visível do quartel mas amplamente observada do Aquartelamento do Xime e que foi [bem] aproveitado pela experiência do Josué Chinelo.

Dois dias depois fui de férias e foi aí que o Jorge Araújo se deslocou ao Enxalé até à chegada do Alferes José Henriques Araújo (1946-2012)".

Para além do guerrilheiro ferido, foram recuperadas cinco dezenas de invólucros de granadas de canhão s/r, um deles ainda com a respectiva granada, que não foi retirada devido ao facto de estar amolgado, e muitas dezenas de invólucros de outras munições, nomeadamente 7,62.

Do ataque ficaram, também, mais duas imagens "memórias" desse combate nocturno, que seguidamente se reproduzem.

 


Foto 3 - Enxalé (Jul72). Um chapéu "cubano" recuperado após o ataque de 19Jul72.




Foto 4 - Enxalé (Jul72). Imagens dum RPG-7 destruído durante o ataque de 19Jun72.



 

▬ O QUE DIZ A "HISTÓRIA" DO BART 3873 SOBRE ESTA OCORRÊNCIA


●► No 4.º fascículo; Julho de 1972, ponto 31. «INIMIGO»; alínea d) Subsector do Xime; refere-se o seguinte:


● "Em 192030, o Destacamento do ENXALÉ foi intensamente atacado e durante 20 minutos. A nossa reacção surgiu pronta e ajustada. Sofremos 1 morto [Milícia] e 2 feridos [Milícias]. O inimigo: 4 mortos, 7 feridos e 1 prisioneiro [ferido]. Salienta-se o tiro acertado de Artilharia do XIME em apoio às forças atacadas.


● Quanto ao ferido [prisioneiro], foi evacuado, primeiramente, para a enfermaria do Xime, sendo aí prestados, pelo camarada Fur Mil Enf Carvalhido da Ponte, todos os actos de enfermagem que se impunham, dos quais fui testemunha, seguido do pedido de evacuação para o Hospital Militar de Bissau (HM 241).

Estava, de facto, muito mal tratado, e ainda hoje me interrogo como é possível um ser humano resistir tanto tempo, sempre a perder sangue. O seu corpo mais parecia um "mapa político" onde, em cada estilhaço, estavam projectados vários espaços. 

Enquanto aguardava pela sua evacuação, perguntei-lhe se queria comer algo. Com um sinal positivo transmitido por um pequeno movimento de cabeça, pedi ao cozinheiro Machado algumas batatas cozidas, que já estavam prontas para o almoço desse dia, vindo a comer algumas metades… mas com muita dificuldade. Enfim… lá foi; mas a minha/nossa melhor expectativa era muito baixa.

Segundo informação oral dada, recentemente, pelo camarada Luciano de Jesus, algum tempo após o ataque, um elemento do seu Gr Comb, ao deslocar-se ao HM 241 em consulta externa, acabou por encontrar este guerrilheiro ferido, estando ele em franca recuperação.

    

▬ A MINHA IDA PARA O ENXALÉ DOIS DIAS DEPOIS


●► Dois dias após o ataque fui "convidado", pelo camarada Cmdt Pereira da Costa, para ir dar uma ajuda ao 2.º Gr Comb do Enxalé, aliás como é referido acima. E lá atravessei o Rio Geba, que as imagens abaixo confirmam.




Foto 5 - Rio Geba (21Jul72). Travessia em canoa entre o Xime e o Enxalé com o objectivo de apoiar o 2.º Gr Comb da CART 3494,  na sequência do ataque IN.

 


Foto 6 - Enxalé (22Jul72). Eu na companhia do camarada Fur Benjamim Dias e de dois elementos da população da tabanca, onde estes fizeram questão de partilhar connosco algumas porções de carne, como reconhecimento do nosso apoio.




Foto 7 - Enxalé (22Jul72). O Furriel Benjamim Dias em amena cavaqueira com alguns elementos da população, onde se falava, ainda, do episódio da antevéspera. 


 

4. - SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE ARTILHARIA 3494

       = XIME - ENXALÉ - MANSAMBO - BAMBADINCA - PONTE DO RIO UDUNDUMA (1971-1974)


Mobilizada pelo Regimento de Artilharia Pesada 2 [RAP2], de Vila Nova de Gaia, para cumprir a sua missão ultramarina no CTIG, a Companhia de Artilharia 3494 [CART 3494], a terceira e última Unidade de Quadrícula do BART 3873, do TCor Art António Tiago Martins (1919-1992), embarcou no Cais da Rocha, em Lisboa, em 22 de Dezembro de 1971, 4.ª feira, a bordo do N/M «NIASSA», sob o comando do Cap Art Vítor Manuel da Ponte da Silva Marques (o 1.º; até 22Abr72), Cap Art António José Pereira da Costa (o 2.º; de 22Jun72 a 10Dez72) e Cap Mil Inf Luciano Carvalho da Costa (o 3.º; de Dez72 a 03Abr74), tendo chegado a Bissau em 28 do mesmo mês.



4.1 - SÍNTESE DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA CART 3494


Após a realização da Instrução de Aperfeiçoamento Operacional «IAO», que decorreu no CMI do Cumeré, de 30Dez71 a 26Jan72, a CART 3494 seguiu em 28Jan72, em LDG, para o Xime, a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CART 2715 [25Mai70-25Mar72; do Cap Art Vítor Manuel Amaro dos Santos (1944-2014) - (1.º)], assumindo, em 15Mar72, a responsabilidade do respectivo subsector do Xime com um Gr Comb (o 2.º) destacado em Enxalé. 

Em finais de Mar73, foi substituída pela CCAÇ 12 [do Cap Mil Inf José António de Campos Simão] e foi colocada no subsector de Mansambo, onde rendeu a CART 3493 [28Dez71-02Abr74; do Cap Mil Inf Manuel da Silva Ferreira da Cruz], tendo destacado um Gr Comb para Bambadinca em reforço da guarnição local. 

Em 09Mar74, foi rendida no subsector de Mansambo pela 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4616/73 [05Jan74-12Set74; do Cap Mil Inf Augusto Vicente Penteado] e recolheu seguidamente a Bissau a fim de aguardar o embarque de regresso, tendo ainda colaborado na segurança de operações de descarga de navios. 


O regresso à metrópole realizou-se em 03 de Abril de 1974, a bordo do TAM (Transporte Aéreo Militar), (CECA; 7.º Vol; pp. 236-237).


Fontes consultadas:

Ø  Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 7.º Volume; Fichas das Unidades; Tomo II; Guiné; 1.ª edição, Lisboa (2002).

Ø  Outras: as referidas em cada caso.

Termino, agradecendo a atenção dispensada.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

03Mae2021

quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21680: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (23): Os meus/nossos três Natais no CTIG (Jorge Araújo, ex-fur mil op esp/ranger, CART 3494 / BART 3873, Xime e Mansambo, 1971/74)


Foto 1 > Ponta Coli (1972) > situada na estrada Xime-Bambadinca > local de muitas memórias do colectivo da CART 3494, tais como: (i) Local do "baptismo de fogo" dos elementos do 4.º Gr Comb, em 22 de Abril de 1972, em acção dirigida pelo Cmdt Mário Mendes (1943-1972); (ii) local da primeira baixa (a única em combate), em 22 de Abril de 1972, a do fur mil art Manuel da Rocha Bento (1950-1972): (iii) Local da segunda emboscada sofrida por elementos do 4.º Gr Comb, em 01 de Dezembro de 1972, devido a acção dirigida pelos Cmdts Mamadu Turé e Pana Djata. (iv) Local da recolha de cadáveres de dois guerrilheiros participantes na emboscada acima, incluídos no grupo de assaltantes (ou de assalto), e das suas respectiva armas: uma Kalashnikov (AK47) e um RPG. Os seus corpos foram inumados no cemitério de Bambadinca.

 

O nosso coeditor Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger,CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior, ainda no ativo; tem cerca de 270 referências no nosso blogue.

BOAS FESTAS

em tempo de pandemia "COVID-19"

RECORDAR É… TORNAR PRESENTE!

OS TRÊS NATAIS DA MISSÃO ULTRAMARINA NO CTIG


Mobilizada pelo Regimento de Artilharia Pesada [RAP 2], da Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia, a Companhia de Artilharia 3494 [CART 3494], a terceira Unidade de Quadrícula do Batalhão de Artilharia 3878 [BART 3873], do TCor António Tiago Martins [1919-1992], embarcou em Lisboa, no Cais da Rocha, a 22 de Dezembro de 1971, 4.ª feira, a bordo do N/M «NIASSA», rumo ao TO do Comando Territorial Independente da Guiné [CTIG], numa altura em que o conflito armado contabilizava nove anos.

A sua chegada ao Cais do Pidjiguiti, em Bissau, ocorreu a 29 de Dezembro, 4.ª feira.


 

Foto 2 > Cais da Rocha > Lisboa > 22 de Dezembro de 1971 > N/M «NIASSA». Mais um contingente de cerca de mil e quinhentos jovens milicianos rumo ao TO do CTIG. [foto do álbum do António Bonito, fur mil da CART 3494], com a devida vénia.


1.º NATAL (1971) a BORDO DO «NIASSA»

Ao terceiro dia de uma viagem de seis, mas que era só de ida pois o regresso não tinha data marcada, teve lugar a consoada de 1971, realizada em pleno Alto Mar, talvez na linha imaginária de Santa Cruz de Tenerife, no Oceano Atlântico Norte.

 



Foto 3 > Cais do Pidjiguiti > Bissau > 29 de Dezembro de 1971 > N/M «NIASSA». Desembarque do contingente metropolitano da foto 2. [foto do álbum do António Bonito, fur mil da CART 3494], com a devida vénia.

2.º NATAL (1972) NO XIME

Decorrido um ano da sua missão ultramarina no CTIG que, pode aceitar-se, coincidiu com a comemoração da primeira festa natalícia fora do contexto familiar do colectivo da CART 3494, esta a bordo do «Niassa», este voltou a sentir o ambiente simbólico dessa secular celebração religiosa anual, nomeadamente os membros da família cristã.


Esta segunda reunião natalícia, que por tradição cultural sempre foi considerada de relevante significado espiritual, incluindo o meio militar, foi organizada no Aquartelamento do Xime, espaço físico onde ficou instalada durante catorze meses a partir do qual operacionalizava as diversas acções diárias que lhe haviam sido confiadas.


Esta cerimónia, ainda que não tenha sido possível reunir todo o contingente da Unidade, pois 2.º Gr Comb estava destacado no Enxalé, sempre ajudou a elevar um pouco mais o ânimo individual, reforçando a solidariedade e o companheirismo entre os seus pares, valores importantes num contexto geográfico considerado de excepcional importância estratégia para a mobilidade da logística militar, e de civis, entre Bissau e a restante Região Leste, o primeiro por via marítima (rio Geba) e depois por meio rodoviário (e vice-versa) e, por isso mesmo, de grande exigência e rigor, logo de elevada inquietação e labor nos múltiplos desempenhos.

 


Foto 4 > Xime > Natal/1972. Alguns dos militares participantes no almoço/convívio, distribuídos por mesas colocadas na Messe de Oficiais.

 


Foto 5 > Xime > Natal/1972. Em primeiro plano; de pé, António Costa [1.º C]; José Pacheco [20.º Pel Art]; Jorge Araújo e Mário Neves [Furriéis].

 


Foto 6 > Xime > Natal/1972. Da esquerda para a direita: 1.º Sarg Orlando Bagorro [, morreu em 2018]; 1.º Sarg Carlos Simões; Alferes Manuel Gomes [morreu em 2014; metade do rosto]; Alferes José Araújo [-2012]; Alferes Maurício Viegas [20.º Pel Art]; D. Idalina Carvalho Pereira Jorge Martins; esposa do Cmdt BART [1923-2011]; TCor António Tiago Martins [1919-1992; Cmdt BART 3873]; Cap Mil Luciano Costa [3.º Cmdt da CART 3494] e Alferes Serradas Pereira [de costas].


3.º NATAL (1973) EM MANSAMBO


Já com vinte e quatro meses de comissão, mas agora em Mansambo, para onde seguimos em Março do mesmo ano, por troca com a CART 3493, realizou-se a 3.ª reunião natalícia, num tempo que ainda não era possível prever ou "adivinhar" o regresso ao Continente (à Metrópole), o qual só se veio a concretizar nos primeiros dias do mês de Abril de 1974, ou seja, a três semanas do «25 de Abril».

 


Foto 7 > Mansambo > Ceia de Natal/1973. Da esqª para a dtª: Serradas Pereira [Alferes]; António Costa, de pé [1.º C]; Luciano Costa [Cap Mil, 3.º Cmdt da 3494]; Lobo da Costa [Alferes]; João Manuel Sousa Teles [Major; 2.º Cmdt do BART 3873]; Carvalhido da Ponte [Furriel] e Cláudio Ferreira, de costas [Furriel].

 


Foto 8 > Mansambo > Ceia de Natal/1973. Da esqª para a dtª: Carola Figueira [1950-2017; Furriel]; António Costa, de pé [1.º C]; Orlando Bagorro [-2018; 1.º Sarg]; Serradas Pereira [Alferes]; Luciano Costa [Cap Mil 3.º Cmdt da 3494]; Jorge Araújo, de pé [Furriel]; Lobo da Costa [Alferes] e João Manuel Sousa Teles [Major; 2.º Cmdt do BART 3873].

 


Foto 9 > Mansambo > Natal/1973. Mesa 1 [esq.]: Abílio Oliveira; mesa central [esq/dtª]: João Godinho; Mendes Pinto; Sousa Pinto [1950-2012] e Benjamim Dias; mesa 3 [dtª]: Carvalhido da Ponte e Jorge Araújo – todos furriéis.

Termino esta pequena resenha histórica natalícia enviando a todos os camaradas tertulianos da nossa TABANCA GRANDE, e aos leitores assíduos do nosso blogue, os meus votos de BOAS FESTAS, ainda que o cenário de pandemia provocada pelo «coronavírus» nos imponha algumas restrições. Nós, os ex-combatentes, sabemos bem, por experiência própria, o que significa o conceito de "confinamento".

BOM NATAL E UM MELHOR 2021

Muitas Felicidades.

 

Com um forte abraço de amizade, e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

20DEZ2020.

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Nota do editor:

Último poste da série > 22 de dezembro de  2020 > Guiné 61/74 - P21677: Boas Festas 2020/21: Em rede, ligados e solidários, uns com os outros, lutando contra a pandemia de Covid-19 (22): Natal Santo que a todos nos abraça... (João Afonso Bento Soares, maj gen ref)

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21646: Casos: a verdade sobre... (19): A recusa dos militares guineenses da CCAÇ 12 em irem render a CART 3494 no Xime, em março de 1973, obrigando a uma intervenção do gen Spínola (António Duarte / Valdemar Queiroz / Luís Graça / Jorge Araújo)


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) > Um coluna logística ao Xitole... O pessoal fazendo uma paragem na famosa  Ponte dos Fulas, destacamento do Xitole.

A Ponte dos Fulas (sobre o Rio Pulom, afluente do Rio Corubal) era uma espécie de guarda avançada do Xitole (na altura, a unidade de quadrícula, do Setor L1, mais a sul, era a sede da CART 2716, em 1970/72).

Perspetiva: norte-sul, quando se vem de Bambadinca e Mansambo para Xitole e Saltinho. A ponte, em madeira, de construção ainda relativamente recente e em bom estado, era vital para as ligações de Bambadinca e Mansambo com o Xitole, o Saltinho e Galomaro... A ponte era defendida por um 1 Gr Comb do Xitole, em permanência, dia e noite... Na foto sãos visíveis, em segundo plano à esquerda, o fortim; em terceiro plano, ao fundo, à direita, as demais instalações do destacamento.

Foto: © Arlindo Teixeira Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Contuboel > 1969 > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > > O Valdemar Queiroz, com os recrutas Cherno, Sori e Umarau (que irão depois para a CCAÇ 2590 / CCAÇ 12). Estes mancebos aparentavam ter 16 ou menos anos de idade (!). Eram do recrutamento local.

Foto: © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentários sobre a alegada insubordinação da CCAÇ 12, em março de 1973 (*):

(i) António Duarte [ex-fur mil da CART 3493, a companhia do BART 3873, que esteve em Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972-1974; foi transferido para a CCAC 12 (em novembro de 1972, e onde esteve em rendição individual até março de 1974; tem 52 referências no nosso blogue]: 

Boa tarde Camaradas

Sou o António Duarte, que foi furriel atirador na Ccaç12 ente janeiro e dezembro de 1973.

Sei da recusa da companhia em seguir para o Xime, para substituir a CART 3494. Por azar em março de 73, estava eu em Portugal a gozar as minhas segundas férias e, como tal, deixei a CCAÇ 12 em Bambadinca e encontrei-a já instalada no Xime. 

Daquilo que me contaram, nomeadamente o Jioão Candeias da Silva e o António Manuel Sucena Rodrigues, a companhia recusou em seguir para o Xime, alegando transtornos na vida familiar. Não nos podemos esquecer que as praças eram, na esmagadora maioria, muçulmanos, com filhos e alguns com mais de uma mulher.

Por outro lado,  a segurança de Bambadinca nada tinha de semelhante com a do Xime.

Segundo parece a companhia formou e o comandante do batalhão [, BART 3893,]explicou o que se pretendia e levou com uma recusa. Parece que os graduados se demarcaram da situação.

Entretanto acabou por chegar o General Spínola que lhes deu a "volta", ameaçando que o chão fula, nestas circunstâncias de recusa, iria ser defendido por uma unidade de outra etnia, suponho balanta. Este facto seria uma vergonha para toda a comunidade fula da CCAÇ 12.

De qualquer forma o Candeias da Silva poderá dar mais detalhes. Infelizmente,  e por já nos ter deixado, o Sucena Rodrigues não pode ajudar.

Um abraço para todos e, se me permitem um mais apertado, para o Luís Graça
António Duarte.

13 de dezembro de 2020 às 13:53 (**)
 
(ii) Valdemar Queiroz [ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70; tem cerca de 120 referências no nosso blogue, e é um activo e incansável comentador]:

E interessante a recusa da CCAL 12 mudar de Bambadinca para Xime, alegando transtornos na vida familiar.

No caso da minha CART 11, também de soldados fulas, muçulmanos, com mulheres e filhos, como Companhia de Intervenção com o Comando em Nova Lamego, os quatro Pelotões estavam constantemente a mudar de local de permanência,  fazendo reforço a outras Companhia,  por exemplo,  em Canquelifá, Piche, Pirada, Paunca... E  quando se previa maior tempo de permanência fora da base lá seguiam com os soldados as mulheres, filhos e bagagens, para depois regressarem novamente a Nova Lamego.

Inclusive, depois de mais de um ano em Nova Lamego, toda a CART 11 mudou em definitivo para Paunca e não houve nenhum problema quanto a transtornos na vida familiar.

A vida no Xime era diferente de Bambadinca, mas em Piche, Canquelifá, Pirada ou Paunca também o era, e de que maneira, em relação a Nova Lamego.

Coisas da puta da guerra.

Abracelos
Valdemar Queiroz

13 de dezembro de 2020 às 14:59

(iii) Tabanca Grande Luís Graça:

Obrigado, António, pelo tua pronta e esclarecedora resposta. É certo que não estavas lá, em Bambadinca, em março de 1973, mas ouviste o testemunho dos teus camaradas. 

Só podia ser essa a razão da recusa: as praças guineenses da CCAÇ 12 tinham as suas razões pessoais, familiares e étnicas para não irem, de bom grado, para o Xime…

Não podia ser por medo: em quatro anos de guerra (duas comissões para a malta metropolitana…) eles já tinham dado sobejas provas de coragem, dedicação, lealdade, apego ao seu chão, e até de portuguesismo… 

Quem andou, como eu, com eles no mato, durante ano e meio, no tempo das chuvas e no tempo seco, no mato, em tabancas, em colunas, em destacamentos, etc., do princípio ao fim, sem o mais pequeno problema disciplinar ou humano, sabe do que fala…

E estou a falar da primeira geração, a da CCAÇ 2590/CCAÇ 12, ou seja, do período que vai de junho de 1969 a março de 1971. Éramos, como sabes, 6 dezenas de graduados e especialistas, oriundos da então “Metrópole”, a que se juntaram, em Contuboel, no CIM, mais 100 recrutas do recrutamento local, fulas e futa-fulas (sem esquecer 2 mandingas; depois começpu a vir, em rendição individual, um ou outro de fora do chão fula, como o Vitor Sampaio, que era mancanha, de Bissau, e um grande “reguila”). 

Sim, porque o sangue, começou a correr cedo, e para alguns a guerra depressa acabou… Lembro-me do batismo de fogo, em finais de julho de 1969, em Madina Xaquili, ainda em farda nº 3…

O Valdemar Queiroz, um dos instrutores mais queridos das nossas praças, sabe do que eu falo: deu-lhes a recruta e foi com eles ao juramento de bandeira, em Bissau, na presença de Spínola… E ele sabe bem como a parte deles eram crianças, com 16 anos ou menos...

Claro que o exército não era (nem é)  uma democracia… E não havia o hábito de perguntar à malta o que é que queriam para o jantar e muito menos que “resort” turístico preferia… 

Os batalhões de Bambadinca (BCAÇ 2852, BART 2917, BART 3873 e, no fim, BCAÇ 4616/73) usavam e usavam das unidades africanas (,milícias, Pel Caç Nat, companhias de caçadores, etc.). Estavam alia à mão, “eram da terra”, eram "pau para a toda a obra"…Até para "abrir valas" !... Resquícios do tempo do "trabalho forçado" ?!

Será que o comando do BART 3873 não olhou para aqueles homens, com quatro anos de guerra (!), e lhes perguntou a opinião ?

Percebo por que é que ninguém queria ir para o Xime (a começar pelos graduados e especialistas “metropolitanos” que, em Bambadinca, estavam no bem-bom, pelo menos em termos hoteleiros…). 

Os guineenses estavam, desde meados de 1969, a viver, com as suas famílias, na tabanca de Bambadinca (e, se calhar alguns, em Bambadincazinho, não posso jurar)… O Xime era o desterro, para mais a tabanca era exígua, as instalações militares ainda piores, e a população local era mandinga, com parentes no mato…. 

E, a propósito, gostava de saber como é que as duas comunidades passaram a coexistir… Talvez o nosso amigo José Carlos Mussá Biai, o "meino do Xime", hoje o senhor engemheiro, ainda tenha  recordações dos vizinhos fulas da CCAÇ 12... 

 Como se sabe, o Xime era o pior aquartelamento do Sector L1 e "embrulhava" com frequência no meu tempo… E, depois, do Xime até ao Corubal era a “terra de ninguém”, palco de frequentes e sangrentos episódios de guerra: bombardeamentos aéreos, barragens de artilharia, e da Marinha, emboscadas, golpes de mão, minas e armadilhas, operações de maior ou menor duração, muitas vezes tendo por guias prisioneiros do PAIGC…Não é por acaso que o Xime tem mais de 400 referências no nosso blogue, contra 200 do Xitole, 340 de Mansambo, 630 de Bambadinca…

Fico-me por aqui. Mas gostaria também de saber a “versão” dos nossos camaradas da CART 3494, como o Jorge Araújo, que muito provavelmente nem se deram conta do “drama” da malta da CCAÇ 12… 

De qualquer modo, “tudo está bem quando acaba em bem”… O Caco Baldé (, alcunha do gen Spínola, entre carimhosa e sarcástica),  geriu o conflito, utilizando a velha técnica dos cabos de guerra coloniais, ou seja, dividir para reinar… Claro que a caixinha de Pandora dos ódios étnicos teria que vir ao de cima, depois da independência… 

O que vai ficar para história é que Spínola criou expetativas demasiados altas para os fulas e outras etnias como os manjacos... O caso dos fulas foi paradigmático: morreram pelo seu "chão" e pela "pátria portuguesa", e  quando os portugueses se foram embora, a única coisa que tinham nos bolsos era o patacão pago até ao fim do ano de 1974... Foram miseravelmente tratados como simples mercenários.. Foarm sempre soldados de 2ª classe, que aprenderam a falar português durante a tropa e a guerra, e que nunca tiveram tempo de frequentar,  entre 1969 e 1974, os Postes Escolares Militares e tirar o exame da 4ª classe...Nunca ninguém se preocupou com a promoção escolar, profssional, social e cívica destes valorosos combatantes fulas a quem alguns de nós deve a vida. 

E a gente sabe, por fontes cruzadas, como Bambadinca (, em mandinga, “a cova do lagarto”) foi um altar de martírio para os nossos camaradas guineenses, fulas, que, infelizmente para eles,  acreditaram na nossa palavra e na "palavra de honra" dos novos senhores da guerra, o PAIGC...

José Carlos Suleimane Baldé (, meu camarada da CCAÇ 12 que seria capaz de dar a vida por mim ou pelo António Fernando Marques) e o António Baldé (da CCAÇ 11, pai da infeliz Alicinha, que eu e a Alice quisemos trazer para Portugal, e meu vizinho de Alfragide, hoje apicultor na sua terra) contaram-me coisas, atrozes, que se fizeram em Bambadinca, depois da independência, contra os "colaboracionistas", os "cães do colonialismo", que nos envergonham a todos e não honram a memória de Amílcar Cabral nem dos demais "mártires da liberdade da Pátria"... 

PS1 - O António Baldé, 1º cabo, natural de Contuboel,  esteve no CIM de Bolama (1966/69), np Pel Caç Nat 57 (São João, 1969/70) e na CART 11 (Paunca e Sinchã Queuto, 1970/71): é membro da Tabanca Grande, nº 610].

O ex-1º cabo José Carlos Suleimane Baldé, felizmente ainda vivo, espero, a morar em Amedalai, Xime, é  o único camarada guineense da CCAÇ 12, a integrar a Tabanca Grande, além do Umaru Baldé, este a título póstumo.

 PS2 - António e Valdemar, convenhamos que o tema é pouco natalício... Mas, infelizmente, o nosso blogue não é compaginável com as conveniências do calendário litúrgico... E as nossas conversas são como as cerejas...

Mas já agora: o João Candeias, que estava lá (, enquanto tu, António,  estavas no gozo da tua merecida licença de férias), diz que o Spínola apareceu acompanhado de "quadros africanos"... Seria o régulo de Badora, tenente de 2ª linha ? Ou figuras prestigiadas militares como o ten graduado 'comando' Jamanca que já estava a comandar a CCAÇ 21, se não erro ? O que é que tu sabes sobre isso ?

13 de dezembro de 2020 às 18:07 

(iv) Jorge Alves Araújo, ex-fur mil op esp/ranger, CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), nosso coeditor; tem 275 referências no nosso blogue]:

Camaradas,

Ao ler a presente narrativa notei que o camarada Luís Graça refere o meu nome,  pedindo-me que acrescente algo mais relacionado com a "recusa da CCAÇ 12 em render no Xime a minha CART 3494", no longínquo mês de Março de 1973.

Com efeito, não tenho memória de ter tido conhecimento de qualquer situação anormal relacionada com o tema em análise. E a justificação é a seguinte:

- A exemplo do ocorrido com o camarada António Duarte, eu também não participei na sobreposição entre as duas Unidades, uma vez que, como veio a ficar gravado na cronologia da H.U., a minha última missão no Xime acabou por ser a «Operação Guarida 18», realizada em 3 de Fevereiro de 1973, na região de Ponta Varela.

Nesta Operação conjunta, onde estiveram envolvidos seis Gr Comb (três da CART 3494 e três da CCAÇ 12), acabei por ter um "encontro imediato" com o IN (ver P13839). Concluída a missão, e após o regresso ao Aquartelamento do Xime, preparei-me para seguir para Bissau a fim de voar para Lisboa, de férias, onde cheguei dois dias depois.

Ao regressar ao Xime, em meados de Março de 73, para cumprir o restante tempo da comissão, foi com espanto que constatei que a minha CART 3494 tinha sido transferida para Mansambo, substituindo a (irmã) CART 3493, ocorrência que, segundo julgo saber, teve lugar na primeira quinzena desse mês.

Sobre este assunto, é o que posso afirmar.

Saúde para todo o auditório e um forte abraço... com distanciamento.

13 de dezembro de 2020 às 23:49
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(**) Último poste da série > 13 de dezembro de  2020 > Guiné 61/74 - P21641: Casos: a verdade sobre... (18): Os "momentos dramáticos" vividos pela CCAÇ 12, em março de 1973, obrigada a render no Xime a CART 3494 [António Lalande Jorge, ex-fur mil mecânico auto, CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, março de 1972 / abril de 1974)]