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sábado, 2 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18704: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXIII: Como se faz um alferes miliciano do Serviço de Administração Militar (I)


Foto nº 9 > – Nas instalações da EPAM [, Escola Prática de Administração Militar], no Lumiar, em Lisboa: o meu último dia de Cadete... No dia seguinte seria promovido a aspirantes miliciano com divisas na diagonal, e direito a continência. Estava vestido com a farda nº 1 daquela época. Fins de Junho de 67.


Foto nº 10 > A minha foto tirada para o Bilhete de Identidade Militar, já como alferes miliciano, uns dias antes de embarcar para a Guiné. Porto, Setembro de 1967.

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Virgílio Teixeira (*), ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69); natural do Porto, vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado; tem 56 referências no nosso blogue.

GUINÉ 1967 /69 1967/69  > ÁLBUM DE TEMAS >  T001 – SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO  > CURSO DE OFICIAIS MILICIANOS  (COM)  > EPI | MAFRA; EPAM | LUMIAR, LISBOA  - Parte I


Virgílio Teixeira, hoje
(i) Como cheguei a Alferes Miliciano SAM (Serviço de Administração Militar)

Este devia ser o primeiro tema da minha participação no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, isto é, a incorporação militar, a instrução básica, o juramento de bandeira, a especialidade, a promoção a aspirante miliciano, os Estágios, a mobilização e a integração no Batalhão de Caçadores 1933 em Santa Margarida.

Mas,  como não foi, vai agora e ainda com tempo, pois tenho inesgotáveis temas para participar, não falando da vida ‘pós serviço militar’ que não é para aqui chamada.

Assim:

Com os meus 18 anos, isto é,  em 1961,  vou dar os chamados ‘sinais’ na minha Junta de Freguesia de Paranhos,  no Porto. Neste ano,  e na altura dos sinais, já tinha rebentado a guerra em Angola – a 4 de Fevereiro (em Luanda) e  a 15 de Março de 1961 (no noroeste),  com a ‘matança’ dos inocentes. 

O meu irmão mais velho – um ano e meio de diferença  - estava já na Índia há mais de um ano, pois a rebelião tinha também começado, em Dadra e Nagar Aveli, com os "satiagrás" a fazer o mesmo papel que futuramente coube aos nossos terroristas na nossa guerra de África. 

O meu pai já lá tinha estado na Índia, entre 1955 e 1958, no início da rebelião, por isso estou muito familiarizado com estas guerras todas. Nesse ano, em 18 de Dezembro de 1961, a União Indiana invadiu os territórios do Estado Português da Índia – Goa, Damão e Diu -, e fez prisioneiros os militares que lá estavam a cumprir o serviço, entre eles o meu irmão, sargento Rádio Montador. 

Esteve cinco meses em cativeiro no campo de concentração de Pondá, e curiosamente li aqui um artigo sobre este tema, e ele esteve a dois passos da relatada tentativa de fuzilamento de uma quantidade enorme de militares, por causa de uma fuga abortada de alguns, e depois um padre capelão veio salvar tudo [, Joaquim Ferreira da Silva, jesuita,d e Santo Tirso], temos na memória de estarem todos perfilados, e os "shiks" com as metralhadoras apontadas à espera da ordem de disparar. 

Tudo acabou em bem, tendo o meu irmão e restantes prisioneiros sido libertados em Maio de 1962, quando a guerra em Angola já estava em força com os primeiros contingentes militares a embarcar para lá. 

O espectro de vir a fazer o serviço militar como soldado tomou conta de mim. Tinha de dar a volta a isto.  Quando fui dar os 'sinais', isto é, em Junho de 1961, tive de dar as habilitações literárias. Apesar de estar a frequentar um curso comercial à noite, já no 4º ano, ainda não o tinha completado, pelo que o diploma que tinha para apresentar era apenas o da 4ª classe, nada mais.

Em 1962 começam a aparecer os primeiros mortos, militares, e dá-se um volte-face na minha vida. Como já conhecia o que era ser militar, pois passava alguns tempos nos quartéis onde o meu pai prestava serviço, e em especial a vida de um soldado, passou-me um clique pela cabeça, ‘eu tinha de ir fazer a tropa como oficial miliciano’... Era outra coisa, e ganhava mais. Eu já trabalhava de dia e estudava à noite. Não tinha muito tempo, mas imaginei, fiz as contas e atirei-me de cabeça.

Em poucos meses tinha de fazer um exame de admissão ao Instituto Comercial do Porto, pois tinha sido lançada uma experiência no ensino, com um curso de 2 anos, que daria equivalência ao 7º ano do Liceu, habilitação  mínima para ser admitido no COM.

Mas,  para esse exame, tinha de ter o 2º ano dos liceus, que nunca frequentei, pois quando acabei a primária, fui logo trabalhar, e aos 14 anos inscrevi-me no curso comercial, mas à noite, as matérias eram diferentes, e muito pouco sabia, pois a escola comercial tinha um curriculum escolar muito diferente dos liceus. 

Então preparo-me sozinho para esse exame do 2º ano liceal na época normal, e ao mesmo tempo começo em força a estudar tudo o que era do 5º ano, para fazer a admissão ao Instituto,  na 2ª época de Setembro de 1962.

Não sabia uma única palavra de Inglês, não sabia Física, nem Química, nem Ciências, nem Desenho, tinha umas noções de Português, Francês, Geografia, História e pouco mais. Uma senhora minha vizinha, ex-professora de Letras, oferece-se para me dar explicações de Inglês e aproveitei também para receber umas de Português, e não pagava nada, nem podia pagar.

Faltava-me a Matemática, o que eu sabia da escola comercial era cálculo comercial e aritmética, mas nada de Álgebra, Geometria e coisas dessas do liceu. Um amigo, que já frequentava a faculdade de economia, prontificou-se a dar-me umas explicações de Matemática num café ali para os lados do Campo Lindo, onde ele morava. Em pouco tempo consegui ‘perceber’ a matemática, e já não tinha problemas com isso, já sabia tudo até ao 5º ano.

As lições de Inglês e Português continuavam a bom ritmo e também absorvi rápido, porque era individual e intensivo, ao fim da tarde e fins de semana.  Veio a época de fazer o exame do 2º ano em Junho de 1962, e lá fui, tive algumas dificuldades em Desenho, pois nunca tinha feito ou estudado nada sobre desenho.

Mas safei-me e passei no exame do 2º ano liceal. Com esse diploma já me vou inscrever no exame de admissão ao Instituto Comercial. Ainda tinha uns dois meses e meio até lá, ia fazer na época de Setembro.

Mas o meu trabalho continuava, os horários mantinham-se por isso a alternativa era fazer verdadeiras maratonas e muitas directas com alguns, mas poucos que me acompanharam mas acabaram de desistir, não aguentaram este ‘ritmo’ alucinante. Estudava só nos cafés, com predominância do Café Cenáculo, inaugurado em 11 de Novembro de 1961. Era a minha sala de aulas e explicações, ficava sempre até fechar, já depois das 2 horas da manhã.

Na época de Setembro de 1962, faço o exame de admissão, e fico espantado comigo mesmo, pois tirei média acima de 14 valores, o que me dava acesso imediato á matrícula, sem fazer exames orais, que para mim era uma praga, não gostava nada.

Assim já tenho o 5º ano do Liceu, já podia ir para o Curso de Sargentos Milicianos (CSM)  Mas havia um preço a pagar, tive um esgotamento cerebral, não dormia, tinha de tomar comprimidos para não dormir e estudar até esgotar, todos os sítios e minutos eram para estudar, não comia muito bem, e perdi muito peso, fiquei esgotado, e comecei a tomar comprimidos de ‘ferro’ pela primeira vez.

Com 19 anos, em Outubro de 1962 inscrevo-me no Instituto, no 1º ano do ‘curso de acesso ao ensino superior’, era assim que se chamava. Só frequentava as aulas fora dos horários de trabalho, isto é das 8 às 10, e depois das 18 horas da tarde.

Era o curso da noite, sem rodeios nem vergonhas, era assim e ponto final. Tinha de competir com aqueles que tiveram um ciclo normal, com idades 2 a 3 anos mais novos, e todo o tempo do mundo para estudar. Comigo também entraram mais uns tantos, todos também com idades de adulto, para os cursos da noite, mas os exames eram feitos ao mesmo tempo dos de dia, não havia distinções nenhumas, nem benesses.

E aos 20 anos, em meados de 1963, vou à primeira inspecção militar, ali para os lados das Taipas,  na Cordoaria,  no Porto, onde existia um quartel velho. Ainda estava a frequentar o 1º ano do Instituto, ou seja o equivalente ao 6º ano do liceu.

Como pesava apenas uns 43 kg, os médicos acharam por bem mandar-me para casa e engordar um pouco mais. Fiquei adiado um ano. Foi-me dado logo o primeiro número de identificação militar – NIM – 00439364. Os dois últimos dígitos significam e ano previsto da minha incorporação – 1964 – o que não veio a acontecer.

Não sei porque fui adiado, mas hoje imagino que a tropa nessa altura não tinha muita gente letrada, para sargentos e oficiais milicianos, e eu tinha uma grande vantagem competitiva, frequentava um curso da área comercial, cujo objectivo era o curso de Economia, e tinha já nessa altura, em 1963, quase 9 anos de trabalho regular dentro da mesma área do curso que frequentava, uma área administrativa. E pessoal para servir como operacionais não faltava, era preciso quadros e técnicos, e havia aqui uma possibilidade comigo, penso eu agora, sem saber nada do que se passou.

Voltei no ano de 1964, novamente em meados desse ano e,  como estava mais ou menos na mesma, já não havia direito a mais um adiamento, por isso sou considerado ‘apto’ para toda o serviço militar e mantive o mesmo NIM, que viria a ser alterado.

Nesta época já estava praticamente feito o 7º ano, por isso já pertencia à próxima incorporação de Janeiro de 1965, para o Curso de Oficiais Milicianos (COM).

Acabei o Instituto também com média superior a 14 valores e assim entro directamente para a Universidade, sem precisar de exame de admissão, a que todos estavam sujeitos se não tivessem essa média do 7º ano.

Em Setembro de 1964 inscrevi-me no 1º ano do curso de Economia da Faculdade de Economia da Universidade do Porto. Um feito que sempre o considerei épico, para pessoas vindas da minha classe social, uma vez que nunca nasci num berço de ouro.

E o trabalho tem de continuar, pois é preciso pagar os estudos, e isso é tudo por minha conta, também é verdade que ganhava bem, acima da média, pois já exercia funções importantes nas empresas, apesar da pouca idade e habilitações básicas.

Novamente dou início a um novo curso, agora um curso superior, nas velhas instalações da Faculdade de Economia, na Praça dos Leões,  no Porto, em duas salas emprestadas pela Faculdade de Ciências, a Economia era um curso novo no Porto.

Mas não ia, ou ia muito raramente às aulas teóricas, porque eram em horário laboral, e eu estava matriculado como aluno ‘extraordinário’, que significava,  em termos mais práticos, alunos da noite, ou alunos de... segunda categoria.

Tinha aulas práticas obrigatórias das 8 às 10 da manhã, e depois da 6 horas da tarde. Os exames e provas correntes eram todas em conjunto, não havia distinções. Foi muito difícil, como também já havia sido no anterior Instituto Comercial, a cabeça estava cansada, tomava muitos comprimidos para as dores de cabeça – ainda me lembro do Optalidon, entretanto retirado do mercado. Passei a usar óculos devido ao cansaço da vista, mas lá fui por diante.

Conheci muita gente que mais tarde viria a ocupar os cargos mais importantes na administração e no Estado. Não vou mencionar ninguém porque não é importante agora. Não ganhei amizades nem confiança com esta gente, pois mal nos encontrávamos, só por mero acaso, nas aulas práticas para todos.

Entretanto já estava apurado, e pensei noutra possibilidade, já que aqui estou, com 21 anos em 1964, estou no 1º ano, mais 5 anos faço o curso, e em 1970, com 26 anos, estou a tempo de ir para a tropa, e se assim pensei assim executei. Pedi adiamento na incorporação do próximo ano de 1965, o ano normal da minha incorporação.

Faço o primeiro e segundo ano do curso, e já estamos em Setembro de 1966.  Mas surgem imprevistos, já conhecia a minha namorada, a estava perdido por ela, e com vontade de casar, e neste andar só com 30 anos lá chegaria e era tarde demais para mim, para ela não tanto, que tinha menos 5 anos, ainda ia a tempo com 25 anos.

E, afinal,  para quê?

Nunca tinha pensado chegar tão longe, havia outros, muitos outros problemas, isto que contei não foi assim tão fácil, na vida nada foi fácil para mim, eu tive de subir a pulso, nunca recebi nada de ninguém, nunca herdei um tostão até o dia de hoje. Mas,  como estas coisas, estas ‘histórias’ andam a percorrer as redes sociais, eu não queria adiantar muito mais, toda a gente tem acesso a estes conteúdos, e não quero, e muito menos a minha mulher que não gosta mesmo nada de redes sociais, mas tudo está já escrito no meu livro ‘não editado’ “A Minha Vida” (, está fechado a 7 chaves).

Assim,  num laivo de mais uma loucura das minhas, vou a Lisboa ao Ministério da Defesa Nacional, informando que queria desistir dos adiamentos, isto por volta de Novembro a Dezembro de 1966, e queria ser incorporada na próxima molhada.

E ainda avisei que, se não fosse feita a minha vontade, poderia até desertar. Não levaram a sério, senão metiam-me na gaiola. Assim ainda antes do Natal de 1966 já estou a receber a Guia de Marcha para Mafra, no dia 3 de Janeiro de 1967, teria de me apresentar pela 8 horas da manhã.

Ia fazer nesse mês os meus 24 anos, e nessa altura era uma idade ainda muito jovem, não se sabia de nada daquilo que os meus netos hoje sabem. Os tempos mudaram.

Um amigo meu com quem fiz algumas incursões pelo país, à boleia, de capa e batina, ele frequentava Direito em Coimbra, só viria a ir para a tropa muito mais tarde, e estava na Guiné no QG – no serviço de Justiça -, já era juiz de Direito, e com 31 anos estava lá no tal dia do golpe de estado do 25A4, e eu já estava casado e com 3 filhos menores. Este meu amigo é hoje ainda Juiz Conselheiro na Relação de Lisboa.

Em termos de comparação, os tempos em que os meus filhos estudaram, as mordomias que tiveram, os cursos superiores que frequentaram, os carros que tiveram para irem para as suas universidades, isto era tudo pago do meu bolso, não havia ajudas do Estado, também diga-se que nessa altura não me custava assim muito, pois trabalhava muito e ganhava bem.

Mas a vida dos meus netos, comparada com a minha e da minha mulher, é a noite do dia, não há termo de comparação, não é só com os meus, foi tudo com a maioria dos filhos da revolução. O país e o mundo mudaram muito nestes últimos 50 anos.

Quis exprimir isto para se ver até que ponto a força de vontade leva tudo à frente, não tive ajudas familiares, bem pelo contrário, acho que nunca acreditaram no que eu seria capaz de fazer, nem mais tarde reconheceram até onde cheguei. São coisas pessoais que estão encravadas na garganta como espinhas, por isso passemos à frente.

Fui para a tropa tirar o curso de oficiais milicianos porque fixei este objectivo que tinha de alcançar, não desisti nunca, não havia espaço temporal para nada, a não ser estudar e fazer exames. Devorava livros e Sebentas, decorei tudo, e agora a minha memória vai-me atraiçoando.

Gostava que em devido tempo, a minha família, pais, irmãos, conjugues, tivessem reconhecido esta façanha, mas não. Acho que ficou a inveja, e sei do que falo.

É desta forma que começa assim a minha saga, a vida militar, que viria a alterar por completo a minha forma de ser, de pensar, de agir, a irritabilidade e agressividade fáceis, importar-me apenas comigo e da minha nova família, a superproteção que imponho a mim próprio, a minha incapacidade de poder ver as consequências dos meus actos, devido ao excesso de fármacos que vou tomando diariamente até hoje, seguindo a minha própria automedicação.

Não vou continuar, ficamos por aqui e vou fazer os meus comentários às poucas fotos que tenho da minha vida militar até chegar à Guiné, e como nunca tive uma máquina fotográfica, estas fotos devem ter sido fornecidas pelos fotógrafos que acompanhavam a tropa e ganhavam a sua vida com este trabalho.

(Continua) 
_________________

Nota do editor:

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18671: Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias (António Graça de Abreu) - Parte XXXV: Goa, Índia: "um adeus no entardecer dos dias, e uma lágrima, para sempre"...


Índia > Goa > Velha Goa > A basílica do Bom Jesus

[A Basílica do Bom Jesus (em concani Borea Jezuchi Bajilika) é uma Basílica Menor, situado em Goa Velha, na Índia. É uma das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo e faz parte do conjunto arquitetônico de Igrejas e Conventos de Goa, Patrimônio da Humanidade pela Unesco, sendo um dos melhores exemplos da arquitetura de origem europeia no país. Foi construída entre 1594 e 1605, uma obra considerada rápida para os padrões da época (...) Em seu interior repousa o corpo de São Francisco Xavier, considerado O Apóstolo do Oriente.] (Fonte: Wkipedia > Basílica do Bom Jesus)



Índia > Goa > 18 de novembro de 2016  > O nosso camarada Antónioo Graça de Abreu e a esposa, na piscina do hotel


Fotos (e legendas): © António Graça de Abreu (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Viagem de volta ao mundo em 100 dias > Goa, Índia, 18 de novembro de 2016 (pp. 5-6, da terceira e última Parte)


Goa, Índia


Goa, um pé em Mormugão,
todo o olhar em Vasco da Gama.

Goa, do velho Afonso de Albuquerque,
espadeirando pelas costas do Malabar,
na aventura insana de conquistar o Oriente.

Goa, dos grandes vice-reis e senhores de outrora,
hoje em lápides enegrecidas pelo tempo.

Goa, de Bardez a Salsete, o pó resplandecente da fé,
e sinuosos silêncios.

Goa, de cem mil cruzes diante de cem mil lares,
braços de Cristo abertos para o mundo,
cemitérios de cristãos unindo céu e terra.

Goa, uma Roma Oriental cintilando na basílica do Bom Jesus,
cinco séculos a acastanhar a pedra,
e São Francisco Xavier, benfazejo e amigo,
num túmulo de prata, pedrarias e cristal.

Goa, da velhíssima Sé Catedral,
maior igreja da Ásia, imaculadamente branca,
no altar-mor, dois jovens, mais uns tantos amigos,
todos humildemente descalços,
um casamento em língua portuguesa.

Goa, da igreja de S. Caetano,
semelhante à basílica de S. Pedro,
para enlevar corações, levá-los a Roma
ou talvez ao paraíso.

Goa, da orgulhosa Pangim,
do bairro colonial das Fontaínhas,
onde se baila o corridinho,
e um cônsul português sorri e dança.

Goa, de especiarias e perfumes,
na carregação das naus,
para inebriar os dias e as noites.

Goa, da doce e formosa Manteigui,
nas palavras de Bocage “puta rafada”,
cujos “meigos olhos, que a foder ensinam
até nos dedos dos pés tesões acendem”.

Goa, dos breves companheiros de jornada,
o André, o Edgar, a Maria, o Reis,
dos Gomes Market, do Faria Heaven, do Santosh Garage,
tantos ramos florescendo da cepa lusitana
entretecidos pelo perpassar dos séculos.

Goa, das últimas famílias indo-portuguesas
entrecruzando sangue e afectos,
laboriosas gentes nas confusões do presente,
com as pedras e o coração no passado, construindo o futuro.

Goa, dos fortes de Tiracol ou da Aguada,
velhos canhões, há séculos disparando pedaços de nada,
para a águas do Mandovi e do vazio,
e um velho farol, o primeiro iluminando os mares da Ásia.

Goa indiana, pois claro,
com templos hindus para venerar os deuses,
Shiva, Brama, Vishnu, Krishna,
e pequenas divindades descansando no fundo do vale,
no recato sombreado dos palmares.

Goa, das praias de infindáveis areias,
Calangute, Dona Paula, ou Benaulim,
para humedecer o corpo e respirar o sol.


Goa, um adeus no entardecer dos dias,
e uma lágrima, para sempre. 



1. Continuação da publicação das crónicas da "viagem à volta ao mundo em 100 dias" [3 meses e oito dias], do nosso camarada António Graça de Abreu-

Escritor, poeta, sinólogo, ex-alf mil SGE, CAOP 1 [Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74], membro sénior da nossa Tabanca Grande, e ativo colaborador do nosso blogue com mais de 200 referências, é casado com a médica chinesa Hai Yuan, natural de Xangai, e tem dois filhos, João e Pedro. Vive no concelho de Cascais.


2. Sinopse da série "Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias"

(i) neste cruzeiro à volta do mundo, o nosso camarada e a sua esposa partiram do porto de Barcelona em 1 de setembro de 2016; [não sabemos quanto despenderam, mas o "barco do amor" deve-lhes cobrado uma nota preta: c. 40 mil euros, no mínimo, estimanos nós];

(ii) três semanas depois de o navio italiano "Costa Luminosa", com quase três centenas de metros de comprimento, sair do Mediterrâneo e atravessar o Atlântico, estava no Pacífico, e mais concretamente no Oceano Pacífico, na Costa Rica (21/9/2016) e na Guatemala (24/9/2017), e depois no México (26/9/2017);

(iii) na II etapa da "viagem de volta ao mundo em 100 dias", com um mês de cruzeiro (a primeira parte terá sido "a menos interessante", diz-nos o escritor), o "Costa Luminosa" chega aos EUA, à costa da Califórnia: San Diego e San Pedro (30/9/2016), Long Beach (1/10/2016), Los Angeles (30/9/2016) e São Francisco (3/4/10/2017); no dia 9, está em Honolulu, Hawai, território norte-americano; navega agora em pleno Oceano Pacífico, a caminho da Polinésia, onde há algumas das mais belas ilhas do mundo;

(iv) um mês e meio do início do cruzeiro, em Barcelona, o "Costa Luminosa" atraca no porto de Pago Pago, capital da Samoa Americana, ilha de Tutuila, Polinésia, em 15/10/2016;

(v) seguem-se depois as ilhas Tonga;

(vi) visita a Auckland, Nova Zelândia, em 20/10/2016;

(vii) volta pela Austrália: Sidney, a capital, e as Montanhas Azuis (24-26 de outubro de 2016);

(viii) o navio "Costa Luminosa" chega, pela manhã de 29710/2016, à cidade de Melbourne, Austrália;

(ix) visita à Austrália Ocidental, enquanto o navio segue depois para Singapura; o Graça de Abreu e esposa alugam um carro e percorrem grande parte da costa seguindo depois em 8 de novembro, de avião para Singapura, e voltando a "apanhar" o seu barco do amor...

(x) de 8 a 10 de novembro. o casal está de visita a Singapura, seguindo depois o cruzeiro para Kuala Lumpur, Malásia (11 de novembro);

(xi) Phuket, Tailândia (12-13 de novembro);

(xii) Colombo, capitão do Sri Lanka ou Ceilão ou Trapobana (segundo os "Lusíadas", de Luís de Camões. I, 1), em 15-16 de novembro. de 2016;

As armas e os barões assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;


(xiii) na III (e última) parte da viagem, Graça de Abreu e a esposa estão, a 17 de novembro de 2016, em Cochim, na Índia, e descobrem a cada passo vestígios da presença portuguesa; a 18, estão em Goa, seguindo depois para Bombaím.

____________

Nota do editor:

quinta-feira, 17 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18643: Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias (António Graça de Abreu) - Parte XXXIV: Cochim, Índia, 17 de novembro de 2016...cinco séculos depois de Pedro Álvares Cabral ter aqui aportado, com 4 navios


Foto nº 5 > Índia > 17 de novembro de 2016 >  Cochim > o  autor e a esposa. junto à catedral-basílica de Santa Cruz


Fotos (e legendas): © António Graça de Abreu (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]





1. Continuação da publicação das crónicas da "viagem à volta ao mundo em 100 dias" [3 meses e oito dias], do nosso camarada António Graça de Abreu-

Escritor, poeta, sinólogo, ex-alf mil SGE, CAOP 1 [Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar, 1972/74], membro sénior da nossa Tabanca Grande, e ativo colaborador do nosso blogue com mais de 200 referências, é casado com a médica chinesa Hai Yuan, natural de Xangai, e tem dois filhos, João e Pedro. Vive no concelho de Cascais.

2. Sinopse da série "Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias"

(i) neste cruzeiro à volta do mundo, o nosso camarada e a sua esposa partiram do porto de Barcelona em 1 de setembro de 2016; [não sabemos quanto despenderam, mas o "barco do amor" deve-lhes cobrado uma nota preta: c. 40 mil euros, no mínimo, estimanos nós];

(ii) três semanas depois de o navio italiano "Costa Luminosa", com quase três centenas de metros de comprimento, sair do Mediterrâneo e atravessar o Atlântico, estava no Pacífico, e mais concretamente no Oceano Pacífico, na Costa Rica (21/9/2016) e na Guatemala (24/9/2017), e depois no México (26/9/2017);

(iii) na II etapa da "viagem de volta ao mundo em 100 dias", com um mês de cruzeiro (a primeira parte terá sido "a menos interessante", diz-nos o escritor), o "Costa Luminosa" chega aos EUA, à costa da Califórnia: San Diego e San Pedro (30/9/2016), Long Beach (1/10/2016), Los Angeles (30/9/2016) e São Francisco (3/4/10/2017); no dia 9, está em Honolulu, Hawai, território norte-americano; navega agora em pleno Oceano Pacífico, a caminho da Polinésia, onde há algumas das mais belas ilhas do mundo;

(iv) um mês e meio do início do cruzeiro, em Barcelona, o "Costa Luminosa" atraca no porto de Pago Pago, capital da Samoa Americana, ilha de Tutuila, Polinésia, em 15/10/2016;

(v) seguem-se depois as ilhas Tonga;

(vi) visita a Auckland, Nova Zelândia, em 20/10/2016;

(vii) volta pela Austrália: Sidney, a capital, e as Montanhas Azuis (24-26 de outubro de 2016);

(viii) o navio "Costa Luminosa" chega, pela manhã de 29710/2016, à cidade de Melbourne, Austrália;

(ix) visita à Austrália Ocidental, enquanto o navio segue depois para Singapura; o Graça de Abreu e esposa alugam um carro e percorrem grande parte da costa seguindo depois em 8 de novembro, de avião para Singapura, e voltando a "apanhar" o seu barco do amor...

(x) de 8 a 10 de novembro. o casal está de visita a Singapura, seguindo depois o cruzeiro para Kuala Lumpur, Malásia (11 de novembro);

(xi) Phuket, Tailândia (12-13 de novembro);

(xii) Colombo, capitão do Sri Lanka ou Ceilão ou Trapobana (segundo os "Lusíadas", de Luís de Camões. I, 1), em 15-16 de novembro. de 2016;

As armas e os barões assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

(xiii) na III (e última) parte da viagem, Graça de Abreu e a esposa estão, a 17 de novembro de 2016, em Cochim, na Índia, e descobrem a cada passo vestígios da presença portuguesa; a 18, estarão em Goa.

3. Viagem de volta ao mundo em 100 dias > Índia, Cochim, 17 de novembro de 2016 (pp. 1-5 I e última Parte)

Cochim, Índia

A Índia de Mahatma Gandhi, de Nehru, dos nossos Afonso de Albuquerque e Vasco da Gama, na imensa lista de países que faltava conhecer.

Arribo a Cochim, tenho dois dias de estadia e decido perder-me pela velha Kochi (Cochim) associada a uma vetusta presença portuguesa. Foi Pedro Álvares Cabral o primeiro português, com quatro navios, a aportar a Cochim, em Dezembro de 1500. Após ter chegado ao Brasil em Abril do mesmo ano, as naus de Cabral continuaram viagem para Oriente pelo Cabo da Boa Esperança e pelo Índico, só tendo regressado a Portugal em Junho de 1501.

Cochim era já então um importante porto de mar e a missão de Pedro Álvares Cabral, para além da descoberta oficial do Brasil, tinha também a ver com o reconhecimento das terras da velha Índia. Logo depois, em nova viagem, Vasco da Gama desembarcou em Cochim e, em 1504, Afonso de Albuquerque aqui arribou tendo mandado construir uma fortaleza de que resta hoje apenas um pequeno troço amuralhado debruçado sobre o mar.

Éramos os indomáveis, destemidos e pouco ajuizados lusitanos de quinhentos. Com a inevitável decadência portuguesa pelo Oriente, Cochim acabou por passar para a posse dos holandeses em 1663 e mais tarde, a partir de 1795, seriam os ingleses os senhores do lugar.

Segui para a parte histórica de Cochim após discutir o preço da corrida com um dos muitos condutores de tuk-tuk que esperavam os turistas à saída do Costa. Paguei dois dólares por cerca de quinze quilómetros de caminho, com a premissa de primeiro ser levado a uma loja onde estive quase a comprar um belíssimo elefante em prata. Pediram-me 500 dólares US, ofereci 200, o preço desceu até aos 350, insisti nos 200, e o elefante ficou com o mercador de Cochim



Foto nº 1

Chego a Fort Kochi, a verdadeira Cochim antiga. Tudo casas baixinhas, de um ou dois pisos, algumas em arquitectura colonial muito elaborada [Fotos nº 1 e 2]. O restaurante “Oceanos” anuncia Portuguese Cuisine, Indo-Portuguese Cuisine, Old Fashion Christian Cuisine. São dez da manhã, não dá para almoçar ou jantar, mas que delícias gastronómicas se esconderão na cozinha deste restaurante?

Foto  nº 2 



Foto nº 3


Entro numa escola primária, católica, dirigida por freiras. As duas salas de aula têm as portas abertas para os rapazes verem os turistas estrangeiros, e vice-versa.

São só miúdos, de rosto aberto e bem disposto, vestem todos de igual, umas camisas aos quadrados vermelhos, brancos e pretos e saúdam-nos alegremente num inglês macarrónico. [Foto nº 3]



Foto nº 4

Logo adiante encontro as salas das raparigas, separadas do sexo masculino, que estão na hora de saída e usam um uniforme em vermelho e azul. [Foto nº 4]

 São bonitas estas crianças indianas, quase todas elas, dizem-me, de famílias católicas há muitas gerações. Em Montancherry, aqui ao lado, haveria de encontrar ao longo da estrada algumas igrejas e cemitérios cristãos e uma ou outra loja, ou casa, com os nomes Sylva, D’Cruz, Fernandes. Serão os descendentes dos soldados e casados portugueses dos séculos XVI e XVII que guarneciam as fortalezas e entrepostos junto ao mar, iam ficando por estes lugares, misturando-se com mulheres indianas ou até, mais raramente, de casamentos com as chamadas “órfãs d’el rei”, mulheres pobres portuguesas, filhas de soldados mortos nos muitos combates da época, ou senhoras de moral algo duvidosa, enviadas para a Índia para casarem até, se possível, com um nobre indiano, e constituírem família. Deixaram filhos, netos, etc., que hoje, creio, ainda com algum orgulho, usam o nome do tetravô lusitano.

Na Vasco da Gama Square, entro na igreja de S. Francisco, o primeiro templo católico europeu a ser construído pelos portugueses na Índia, em 1503. Lá dentro, no meio de muitas lápides e sepulturas de gente da nossa pequena nobreza, encontra-se o túmulo onde esteve o corpo de Vasco da Gama. O almirante-mor dos mares da Índia veio três vezes às terras indianas, em 1498, 1502 e 1524. A última viagem já não teria regresso. Velho e doente, com malária, Vasco da Gama morreu em Cochim, em 1524. O corpo permaneceu nesta igreja de S. Francisco até 1539 quando os seus restos mortais foram transladados para Portugal, pelo seu filho. Uns brasileiros de passagem recente resolveram deixar, ao lado do túmulo vazio, um galhardete preto e branco da sua querida equipa de futebol, o Clube de Regatas Vasco da Gama, exactamente o conhecido “Vasco da Gama”, do Rio de Janeiro.

A Cochim portuguesa é, por todas as razões, deveras entusiasmante. A uns quinhentos metros da igreja de São Francisco fica a catedral-basílica de Santa Cruz. [Foto nº 5, ao alto]

Edificada em 1550, foi demolida pelos ingleses em 1795 e reconstruída, de raiz, em 1888. É por isso, um templo mais moderno, todavia com mil histórias para contar. Ao lado funciona uma grande escola secundária católica que dá pelo nome de St. Mary’s School. São quatro horas da tarde. As alunas, só raparigas em traje azul e branco, saem da escola às centenas e centenas. Esperam-nas não sei quantos tuk-tuks para levar as meninas para casa, e dezenas de pais que vêm buscar as filhas, de mota. É um susto vê-las partir, enganchadas no pequeno banco das motorizadas, às vezes duas moças atrás e o pai conduzindo. Ninguém usa capacete e avançam às curvas pela estrada escalavrada.



Foto nº 6

Em Fort Kochi, junto ao mar, encontro um grande cemitério holandês com túmulos dos séculos XVIII e logo adiante aparece um conjunto de redes semelhantes às usadas na pesca tradicional no sul da China [Foto nº 6]. Curiosamente, também terão a ver com os portugueses que, fixados em Cochim, decidiram trazer este tipo de redes de Macau e que, com meia dúzia de chineses de permeio, ensinaram os indianos a usá-las. As redes estão presas a uma armação de canas de bambu ligada a uma longa vara que as faz subir e descer. Manejadas desde um passadiço em madeira, as redes mergulham no mar e lá permanecem entre cinco a vinte minutos. Toda a estrutura de bambu é depois içada, e a rede molhada faz uma concavidade no fundo do qual vem sempre algum peixe que os pescadores vendem logo ali. 

No jardim, junto ao lugar da pesca, existem uns mal-amanhados restaurantes onde os peixes podem ser fritos ou grelhados. Não me aguçaram o apetite até porque o lixo em redor, nas ruas, no jardim, na praia, nas águas do mar é mais do que assustador. Os indianos que me desculpem a opinião mas, em geral, estas gentes não primam pela limpeza e serão necessárias várias gerações para se melhorar a higiene e salubridade deste país.

Mais dois quilómetros, e estou no bairro de Montancherry. Um casarão decrépito assume o título de Palácio dos Holandeses. Foi outrora residência de nobres portugueses à deriva pela Índia. Depois vieram os homens dos Países Baixos. Meio museu, meio coisa nenhuma, delapidado pela passagem do tempo, o pobre palácio evidencia a inclemência dos séculos. E estava fechado, não deu para visitar.

Mais a sul temos a Sinagoga de Cochim e o quarteirão judaico, com umas tantas cruzes de David na fachada de velhíssimas habitações e lojas. Desde o século XI que existem judeus em Cochim mas esta sinagoga, única em toda a região, data de 1568, é visitável e tem toda a sobriedade de um lugar de reunião e de culto com, no salão, um conjunto notável de candelabros em vidro e o chão revestido com azulejos chineses do século XVIII. 

Esta parte da velha Cochim albergou também durante centenas de anos franjas de judeus que fugiam das perseguições na Europa. Chegavam a Cochim, vindos da Holanda, de Espanha, condenados a um distante exílio definitivo. No que nos diz respeito, recordemos o nosso Garcia de Horta que por aqui andou, viveu durante umas dezenas de anos em Bombaim e faleceu em Goa. Dizem-me que, com a fundação do estado de Israel, em 1948, a maioria dos judeus de Cochim partiu para Israel. Hoje viverão neste antigo bairro judaico apenas uma meia dúzia de judeus.

Há uma cidade nova de Cochim, do outro lado do braço de mar, que vista do alto do nosso Costa, parece limpa e organizada. Mas é nos quarteirões antigos deste burgo que o meu coração melhor pulsa e o sangue melhor circula.

(Continua)
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Nota do editor:

Último poste da série > 8 de abril de 2018 > Guiné 61/74 - P18502: Notícias (extravagantes) de uma Volta ao Mundo em 100 dias (António Graça de Abreu) - Parte XXXIII: Colombo, capital do Sri Lanka ou Ceilão ou "Taprobana", 15-16 de novembro de 2016

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18317: Bibliografia de uma guerra (86): “Contra o Vento, Portugal, o Império e a Maré Anticolonial (1945-1960)”, por Valentim Alexandre; Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2017 (4) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 7 de Dezembro de 2017:

Queridos amigos,

Não é de mais insistir, ao findar estas notas de recensão, que se trata de um estudo profundíssimo, rigoroso, porventura o melhor pano de fundo que possuímos na historiografia portuguesa contemporânea sobre a política externa portuguesa no pós-guerra face aos novos ventos da História - o surto independentista que se difundiu nos grandes e pequenos impérios coloniais.

Trata-se de uma organização admirável dos principais factos, respostas, hesitações, manobras de adiamento, quebra de alianças, informações alarmantes que chegavam ao Estado Novo por via de vozes autorizadas. Tudo em vão, a doutrina era inflexível, ou tudo ou nada, "a pátria não se discute". É neste ecrã de 15 anos de espera e turbilhão que em 1961 eclode a guerra colonial que levou o regime urdido por Salazar ao fundo. Demorará décadas a aparecer ensaio tão qualificado como este de Valentim Alexandre.

Um abraço do
Mário


Contra o vento: uma obra-prima da historiografia portuguesa (4)

Beja Santos

“Contra o Vento, Portugal, o Império e a Maré Anticolonial (1945-1960)”, por Valentim Alexandre, Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2017, é indubitavelmente um dos principais acontecimentos da edição historiográfica de 2017.

O investigador Valentim Alexandre tem sobejas provas dadas na área da história colonial, este seu opulento (e a partir de agora incontornável) levantamento é o fecho de abóbada, a consagração da sua carreira. Passamos a dispor, a partir deste trabalho, de uma sequência bem articulada para a cronologia os principais eventos que contextualizam o Império Português no pós-guerra, ressaltando a primeira ameaça, a crise de Goa (1954-1955), segue-se a pormenorização dos dados da grande veja da descolonização e a resposta dada pelo Estado Novo: o luso-tropicalismo – a política indígena, uma incipiente industrialização, as formas precárias de deslocação da população branca, nomeadamente para colonatos, a ONU como a principal arena a confrontar o império português, os atritos com o Vaticano, a reorganização dos dispositivos militares; e a manutenção das inquietações no Oriente, um tanto à semelhança de que ocorrera no decurso da II Guerra Mundial, mas agora fruto das descolonizações: Goa, Macau e Timor, devido ao aparecimento da União Indiana, da República Popular da China e da República da Indonésia.

Este último apontamento passa em revista, no período compreendido entre 1955 e 1960, como se procuravam superar riscos, ameaças e tensões no Oriente (Goa, Macau e Timor) e ter em consideração a matérias das conclusões apresentadas pelo autor.

Quanto a Goa, a diplomacia portuguesa sentia que já pouco podia contar com a Grã-Bretanha e os Estados Unidos. No encontro entre Foster Dulles e Paulo Cunha, o Secretário de Estado norte-americano recordou ao Ministro dos Negócios Estrangeiros português a posição do país em relação ao colonialismo: direito à independência, evitando-se a todo o transe independência prematuras para quem ainda não estivesse preparado para assumir as inerentes responsabilidades.

Em 1956, Salazar prepara um documento para o Conselho de Estado, não ignora que no Conselho Legislativo goês, a maioria dos membros eleitos constituía uma verdadeira oposição ao governo. Silva Tavares, Secretário-Geral do governo da Índia enviará uma carta a Sarmento Rodrigues onde escrevera:

“Continuo a pensar que a ideia da integração é impopular. Porém, não se pode inferir que todos sejam pela unidade com Portugal. Desde os partidários de uma restrita autonomia até aos partidários da independência e aos que só sentimentalmente gostam de falar em autonomia sem no fundo a desejarem, há as mais variadas cambiantes”.

Salazar sublinhou esta frase. Orlando Ribeiro também elaborou um extenso relatório sobre a sociedade da Índia Portuguesa, documento bastante pessimista: Goa aparecera a seus olhos “como a terra menos portuguesa de todas as que vira até então, menos portuguesa do que a Guiné”.

E, mais adiante:

“Ao contrário da África portuguesa, onde há o maior cuidado em empregar expressões como Metrópole e metropolitano, em Goa opõe-se esta província a Portugal e o Goês cristão opõe-se a português. É corrente sermos assim designados por gente muito próxima de nós na fala e nos usos, mas alheia ao nosso sentido de pátria. Pátria para o Goês é Goa”.

Valentim Alexandre detalha a evolução das tensões, a euforia efémera da sentença do Tribunal Internacional de Haia no processo interposto por Portugal contra a União Indiana em 1956, por alegada violação do direito de passagem entre Damão e os enclaves de Dadrá e Nagar-Aveli, dando razão a Portugal. A vitória durou pouco tempo, em Dezembro de 1960 as resoluções da Assembleia Geral da ONU sobre a “outorga da independência aos países e aos povos coloniais” constituíram um momento de viragem, as posições coloniais tinham os dias contados.

O autor igualmente explica como a política da República Popular da China assegurou temporariamente a posição portuguesa em Macau, mesmo sujeita a restrições e todo o processo timorense é detalhado.

 Atenda-se ao valor das conclusões desta vastíssima obra. Tendo saído indemne da II Guerra Mundial, o regime sabia que a ordem internacional estava radicalmente alterada, o sopro anticolonial não só rapidamente se espalhara pela Ásia, era ínsito à Carta das Nações Unidas e constituía elemento de referência nas políticas norte americana e soviética.

Portugal começa por não estar isolado na conceção da independência às colónias, mas deu-se uma evolução nas políticas britânica e francesa, os seus impérios desagregaram-se. Numa tentativa de atualização, o Estado Novo substitui as colónias por províncias ultramarinas, procura ir abolindo o conceito de indígena e do trabalho forçado, como o autor observa:

“Fruto da Repressão e da ausência de liberdades, a pax lusitana era um dos temas prediletos da propaganda do regime, que nela via a comprovação da excelência da colonização portuguesa e da sua especificidade”.

Dá-nos conta da ameaça que impendia sobre Macau e quanto a Goa, Lisboa recusava a mínima cedência de soberania, quais que fossem as garantias de respeito pelas identidade de Goa e pela influência cultural nela exercida pela metrópole.

Chegados a 1955, ninguém na cúspide do Estado Novo ignorava as crescentes ameaças que se avolumavam sobre o império. Até 1958, prevalecia a noção de que sob os territórios de África era um perigo a longo prazo. Subitamente, esfumou-se a ilusão. O regime procurava remoçar a mística imperial, confortar a tese da especificidade de Portugal como nação pluricontinental, foi alimento para consumo interno.

Perante um perigo iminente de diferentes contestações dos movimentos independentistas, o regime monolítico procurou modificar as forças armadas e a PIDE passou a ter muito mais trabalho em África. No campo da política interna, Salazar nunca aceitou hipóteses de entendimento com grande parte da oposição que até poderia ter cooperado numa frente comum na defesa do Ultramar. O mais longe que Salazar quis ir constou na sua aceitação de um plano de reformas, mostrou-se aberto a modificações da estrutura administrativa do Império, como sempre tudo muito lento e aferrolhado.

E assim termina este valiosíssimo trabalho:  

“Só o abalo produzido pelo início da Guerra Colonial, em 1961, dará o impulso necessário a reformas de fundo, com a abolição legal do indigenato e do trabalho forçado. Ainda em 1959-1960, avultam, mais do que o reformismo, o acréscimo da repressão, com as vagas de prisões, nomeadamente em Angola, e os massacres, na maior parte já com intervenção das Forças Armadas, que então marcam a vida das colónias portuguesas do continente africano, bem como Timor. Longe de se contraporem, reforma e repressão não passavam de duas faces das mesma política, tendente a preservar a soberania nacional sobre o Império – como os tempos iniciais da guerra em Angola, em 1961, tornariam evidente”.

Esta notável investigação é de leitura obrigatória, como se depreende.
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Notas do editor:

Vd. postes anteriores de:

10 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18198: Bibliografia de uma guerra (82): “Contra o Vento, Portugal, o Império e a Maré Anticolonial (1945-1960)”, por Valentim Alexandre; Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2017 (1) (Mário Beja Santos)

17 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18221: Bibliografia de uma guerra (83): “Contra o Vento, Portugal, o Império e a Maré Anticolonial (1945-1960)”, por Valentim Alexandre; Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2017 (2) (Mário Beja Santos)
e
24 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18246: Bibliografia de uma guerra (84): “Contra o Vento, Portugal, o Império e a Maré Anticolonial (1945-1960)”, por Valentim Alexandre; Temas e Debates/Círculo de Leitores, 2017 (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 31 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18271: Bibliografia de uma guerra (85): “O céu não pode esperar”, por António Brito; Sextante Editora, 2009 (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17458: Efemérides (257): A propósito do 10 de Junho, ainda os estranhos e excelentes portugueses no mundo... "Goa, um adeus no entardecer dos dias / e uma lágrima para sempre" (Poema e fotos de António Graça de Abreu)







India > Goa > Volta ao Mundo em 100 dias a bordo do mavio de cruzeiros "Costa  Luminosa" > 19 de novembro de 2016 > Lembrando o 10 de junho, "dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas... Lembrando ainda os portugueses e seus descendentes que ficaram nos antigos territórios portugueses de Goa, Damão e Diu. Nas duas últimas fotos, o autor e a esposa.

Foto: © António Graça de Abreu  (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

De: Antonio Graca de Abreu
Data: 12 de junho de 2017 às 17:02
Assunto: A propósito do 10 de Junho, ainda os estranhos e excelentes portugueses no mundo

Meu caro Luís

Ainda a propósito do 10 de Junho, lembrei-me de te enviar este poema meu,  escrito em Goa, Novembro 2016. Se achas que é de publicar, avança.  Fotos seguem noutro mail.

Abraço,
António Graça de Abreu
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Goa

por António Graça de Abreu




Goa, um pé em Mormugão,
todo o olhar em Vasco da Gama.

Goa, do velho Afonso de Albuquerque,
espadeirando pelas costas do Malabar,
na aventura insana de conquistar o Oriente.

Goa, dos grandes vice-reis e senhores de outrora,
hoje em lápides enegrecidas pelo tempo.

Goa, de Bardez a Salsete, o pó resplandecente da fé,
e sinuosos silêncios.

Goa, de cem mil cruzes diante de cem mil lares,
braços de Cristo abertos para o mundo,
cemitérios de cristãos unindo céu e terra.

Goa, uma Roma Oriental cintilando na basílica do Bom Jesus,
cinco séculos a acastanhar a pedra,
e São Francisco Xavier, benfazejo e amigo,
num túmulo de prata, pedrarias e cristal.

Goa, da velhíssima Sé Catedral,
maior igreja da Ásia, imaculadamente branca,
no altar-mor, dois jovens, mais uns tantos amigos,
todos humildemente descalços,
um casamento em língua portuguesa.

Goa, da igreja de S. Caetano,
semelhante à basílica de S. Pedro,
para enlevar corações, levá-los a Roma
ou talvez ao paraíso.

Goa, da orgulhosa Pangim,
do bairro colonial das Fontaínhas,
onde se baila o corridinho,
e um cônsul português sorri e dança.

Goa, de especiarias e perfumes,
na carregação das naus,
para inebriar os dias e as noites.

Goa, da doce e formosa Manteigui,
nas palavras de Bocage "puta rafada",
cujos "meigos olhos, que a foder ensinam
até nos dedos dos pés tesões acendem".

Goa, dos breves companheiros de jornada,
o André, o Edgar, a Maria, o Reis,
dos Gomes Market, do Faria Heaven, do Santosh Garage,
tantos ramos florescendo da cepa lusitana
entretecidos pelo perpassar dos séculos.

Goa, das últimas famílias indo-portuguesas
entrecruzando sangue e afectos,
laboriosas gentes nas confusões do presente,
com as pedras e o coração do passado, construindo o futuro.

Goa, dos fortes de Tiracol ou da Aguada,
velhos canhões, há séculos disparando pedaços de nada,
para a águas do Mandovi, para o vazio,
e um velho farol, o primeiro iluminando os mares da Ásia.

Goa indiana, pois claro,
com templos hindus para venerar os deuses,
Shiva, Brama, Vishnu, Krishna,
e pequenas divindades descansando no fundo do vale,
no recato sombreado dos palmares.

Goa, das praias de infindáveis areias,
Calangute, Dona Paula, ou Benaulim,
para humedecer o corpo e respirar o sol.

Goa, um adeus no entardecer dos dias,
e uma lágrima, para sempre.

António Graça de Abreu



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Nota do editor:
Último poste da série >  7 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17440: Efemérides (256): Faz agora 75 anos que foi afundado a oeste da Gronelândia o lugre bacalhoeiro ilhavense "Maria da Glória" por um submarino alemão... Dada o forte simbolismo da data, foi já proposta a Assembleia da República a instituição do dia 5 de junho como "O Dia Nacional do Bacalhau"...

segunda-feira, 5 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17434: Efemérides (255): centenário do nascimento do escritor, investigador e professor de literatura africana de expressão portuguesa, o leiriense Manuel Ferreira (1917-1992), capitão SGE reformado, ex-furriel miliciano, expedicionário em Cabo Verde, São Vicente, Mindelo, mobilizado em 1941 pelo RI 7 (Leiria)...Também fez comissões na Índia (1948-54) e em Angola (1965-67). "Creio que se pode perceber que estamos perante uma trajectória humana singular" (disse-nos o seu biógrafo, João B. Serra)



T/T Vera Cruz > A caminho de Angola > Em primeiro plano, o ten SGE Manuel Ferreira a bordo do paquete Vera Cruz em agosto de 1965 a caminho de Luanda. Cortesia de João B. Serra.

Foto (e legenda): © João B. Serra (2017). Todos os direitos reservados


1. Nota elaborada com dados fornecidos ao nosso blogue pelo programador cultural João B. Serra, natural das Caldas Rainha, historiador, professor coordenador do Instituto Politécnico de Leiria, e a quem foi cometida, pela autarquia de Leiria,  a missão de a realizar, em tempo recorde, uma exposição comemorativa dos 100 anos do nascimento do escritor leiriense Manuel Ferreira (1917-1992).


Manuel Ferreira (Gândara dos Olivais, Leiria, 1917- Linda a  Velha, Oeiras, 1992), conhecido como escritor, investigador e professor de literatura africana de expressão portuguesa, completaria 100 anos no próximo 18 de Julho.

Mas fez também carreira como militar, faceta que é menos conhecida: foi 1º cabo, furriel, 2º sargento, 1º sargento e, depois, alferes, tenente e capitão SGE,  tendo portanto frequentado a antiga Escola Central de Sargentos  (ECS) (, criada em 1896, em Mafra, tranferida depois para Águeda em 1926, transformada em estabelecimento em ensino superior, em 1977, com a designação de Instituto Superior Militar, e entretanto desativada, no início dos anos 90, para passar a existir, a partir de 1966, na Amadora,  o Instituto Politécnico do Exército).  Passou à reserva no posto de capitão, em 1974.

O Manuel Ferreira, órfão muito cedo,  de pai (que era ferroviário), alistara-se no exército em 1933, ainda menor, com 16 anos. Vai para Coimbra, cujo ambiente estudantil o fascina.   Completa o curso comercial. Mas quatro anos depois, envolve-se nas contestações à reforma (salazarista) do exército. Em julho de 1938,  com 21 anos, com o posto de 1º cabo,  é detido e colocado, no Porto, às ordens da polícia política. Transferido para Lisboa, para a prisão do Aljube, é julgado pelo  Tribunal Militar Especial de Santa Clara, um ano depois, sendo  absolvido, mas acaba por ser expulso das fileiras do exército. Entretanto, o tempo de prisão foi importante para ele em termos de formação político-ideológica,

 Regressa a Leiria e ajuda nos negócios do irmão até que,  em 1940, em plena segunda mundial,  volta ser chamado às fileiras do exército, E mobilizado, em 1941, para Cabo Verde.

O 1º cabo, promovido depois a furriel miliciano, Manuel Ferreira,  foi contemporâneo de alguns dos nossos pais, expedicionários em Cabo Verde durante a II Guerra Mundial, Esteve lá, na ilha de São Vicente, no Mindelo, cerca de seis anos,  de finais de 1941 até 1946. Foi mobilizado pelo RI 7 (Leiria), cujas forças (1º batalhão) ficaram aquartelada na zona de Chão de Alecrim enquanto o 1º  batalhão expedicionário do RI 5 (Caldas da Rainha)  estava estacionado na zona do Lazareto.

 Aproveita o tempo dessa comissão de serviço militar para continuar a estudar. Em 1944  concluirá o curso liceal (secção de letras), no liceu Gil Eanes, no Mindelo, A sua futura mulher, e também, escritora, notável contista, Orlanda Amarílis (1924-2013), natural de Santiago,  era da turma do Amílcar Cabral (1924-1973), natural da Guiné (Bafatá), mas filho de pais cabo-verdianos,

Casaram, Manuel Ferreira e   Orlanda Amarílis, em 1945. O seu primeiro filho ainda nasce no Mindelo.  Um dos professores que o marcou muito foi o escritor e linguista Baltazar Lopes, mas também Aurélio Gonçalves, aliás primo de Orlanda. Em contrapartida, Manuel Ferreira (que veio de licença de férias a Portugal em 1944, tendo aqui editado o seu primeiro livro, "Grei", coletânea de contos) terá sido o primeiro ou um dos primeiros (, a par de outros expedicionários)  a introduzir na ilha de São Vicente, a mais aberta e cosmopolita, as obras da nova geração de escritores portugueses, da escola neo-realista (como o Alves Redol, o Mário Dionísio e o Manuel da Fonseca). E começou, também ele, a dar os primeiros passos na ficção.

Este período é muito marcante (e decisivo) na sua vida.  A sua memória de Cabo Verde, a singularidade do crioulo, a "morabeza" do  seu povo, a sua cultura, a sua literatura, a sua música, as suas paisagens,  as suas tragédias (a seca, a fome, a emigração...), passam a fazer parte das vivênvias do homem, do cidadão e do escritor, das suas preocupações e áreas de trabalho intelectual e literário. Descobre em Cabo Verde uma segunda pátria. Ele é, de resto, um dos cofundadotes e animadores da revista literária "Certeza" (1944), de vida efémera (mas com impacto na vida cultural da ilha). (Publicaram-se dois números, o 3º terá sido proibido pela censura.).




Cabo Verde > São Vicente > Mindelo >  9/11/2012 > 11h11 >  Baía do Porto Grande e Monte Cara, ao fundo. 


Foto: © João Graça (2012). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Geraça & Camaradas da Guiné]



 Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mapa de 2007, da autoria de Francisco Santos. Imagem copyleft (Fonte: Cortesia de Wikipédia. Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > s/l > Ribeira de Julião (?) > Legenda no verso: "Jantar em San Vicente, Nosse terre. Nativos em festa. Recordações da minha estada em C[abo] Verde (Expedição). 1941-1943. Luís Henriques". Provável Foto Melo.

Foto: © Luís Graça (2006). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Geraça & Camaradas da Guiné]


Regressado ao continente em 1946, Manuel Ferreira é colocado no RI 7 (Leiria), Em 1947, publica na revista coimbrã "Vértice", em duas partes, um texto, pioneiro,  dedicado à literatura cabo-verdiana. Em 1948 edita, em Leiria, o livro "Morna: Contos Cabo-verdianos". Em 1947 tinha saído essa obra de referência da literatura cabo-verdiana que é o "Chiquinho", de Baltazar Lopes (Caleijjão, São Nicolau, 1907- Lisboa, 1989.)

 Como cidadão, e apesar de ser militar, também mantém relações com personalidades da oposição democrática, do MUD Juvenil, numa  época, o pós-guerra, em que ainda havia fortes esperanças no fim da ditadura salazarista. Naturalmente, a PIDE  vigia-o.

Em abril de 1948 é enviado para a Índia. Acompanham-no a mulher e o filho. Irá lá ficar até fevereiro de 1954. Manuel Ferreira, já com o posto de sargento, prossegue em Goa os seus estudos. Em 1949 conclui no liceu Afonso de Albuquerque a secção de ciências. Em 1952 fica diplomado com o curso de Farmácia da Escola Médico-Cirúrgica de Goa, enquanto por seu turno  Orlando tira o curso de professora primária na Escola do Magistério. Em 1949, tinha nascido o segundo filho do casal.

Regressa a Portugal em 1954. É colocado no R I 5, nas Caldas da Rainha, já só com funções de secretaria. E esse vai ser um período de grande grande produção literária, [Presumimos que tenha sido neste período, que o Manuel Ferreira frequentou a escol de Águeda; o nosso amigo João B. Serra consultou o seu processo individual, pode depois confirmar este dado omisso na nota biográfica que teve a gentileza de nos disponibilizar, de seis páginas],

Em 1958 é transferido para Lisboa. Em 1962, sai o seu primeiro romance de
temática cabo-verdiana, o "Hora di Bai", centrado na tragédia da seca e da fome de 1942, que o consagra definitivamente como escritor, reconhecido pela crítica e pelo público,. Em 1963 a Academia de Ciências de Lisboa atribui-lhe o prémio da criação literária Ricardo Malheiros.

Em 1961, é convidado para o lugar de secretário da  Sociedade Portuguesa de Escritores (SPE), de que é presidente o consagrado Ferreira de Castro (1898-1974). Em 1965, as instalações da SPE são atacadas e destruídas, sendo a  instituição dissolvida por decisão governamental, por ter tido a ousadia de atribuir a um "terrorista" do MPLA, preso no Tarrafal, o Grande Prémio de Novela desse ano... .O livro chamava-se "Luuanda", e o escritor, angolano, nascido em Portugal, era o Luandino Vieirapseudónimo literário de José Vieira Mateus da Graça (nascido em 1935, em  Nova de Ourém),

O então tenente SGE Manuel Ferreira é colocado em Angola para mais uma  comissão de serviço militar (1965/67). De regresso a casa, ainda tem tempo para concluir, em 1974, a licenciatura em ciências sociais e políticas do ISCSPU - Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina.

Depois de passar à reserva logo a seguir ao 25 de Abril, aceita de bom grado o convite para dar aulas na Faculdade de Letras de Lisboa. Será professor universitário de dezembro de 1974 até atingir os 70 anos, em 17 de julho de 1987, data em que teve de se jubilar, por imperativo legal. Foi mestre de toda uma geração lusófona numa área nova, na nossa universidade, como foi o ensino e a investigação da literatura africana de expressão portuguesa.

Na área da literatura infantil, tem 7 livros editados,  entre 1964 e 1977,   maioritariamente relacionados com o imaginário cabo-verdiano. Na ficção, destaque-se as reedições de "Morabeza" (1961) e "Hora do Bai" (1963), uma refundição de "Morna", com o título de "Terra Trazida" (1972) e, enfim, a narrativa "Voz de Prisão" (1971).

Ainda em vida, em 1991, por ocasião da passagem do 50º aniversário da sua chegada a Cabo Verde, o município do Mindelo homenageou-o com o título de  cidadão honorário. Em contrapartida, a sua cidade parece tê-lo redescoberto tarde...

Em suma,  se ele hoje fosse vivo, poderíamos também tratá-lo como  "nosso pai, nosso velho, nosso camarada". Parafraseando o seu biógrafo, João B. Serra, por este "curriculum vitae resumido", dá para perceber que "estamos perante uma trajectória humana singular".

De acordo com a informação do João B. Serra,  há diversas iniciativas em curso para celebrar o centenário de Manuel Ferreira, algumas recentes, outras previstas para julho. As comemorações prolongar-se-ão ao longo do ano em curso, em Leiria (onde nasceu e foi mobilizado para Cabo Verde), nas Caldas da Rainha (onde esteve colocado, no então RI 5), em Lisboa (onde foi professor, na Faculdade de Letras) e eventualmente noutras cidades portuguesas. E esperemos  que também no "seu" Mindelo, terra de sortilégio!

Dessas iniciativas iremos  dando noticia, aqui no nosso blogue. João B. Serra está também a ultimar a biografia de Manuel Ferreira,  para a qual conta, para já, com o apoio dos editores e colaboradores de dois blogues, o nosso, Luís Graça & Camaradas da Guiné, e o Praia de Bote (editado por Joaquim Saial, um alentejano que se apaixonou pelo Mindelo nos anos 60, e que tem, entre os seus colaboradores, o nosso camarada Adriano Lima. cor inf ref, que vive em Tomar, outro grande mindelense de alma e coração).
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sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Guiné 63/74 - P16788: Notas de leitura (907): “Histórias Coloniais”, por Dalila Cabrita Mateus e Álvaro Mateus, A Esfera dos Livros, 2016 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 29 de Novembro de 2016:

Queridos Amigos,

Trata-se de um trabalho poliédrico sobre levantamentos, marchas de protesto, resistência à brutalidade dos anos 1930 aos anos 1960, nas colónias portuguesas, não escondendo paradoxos e contradições, sobretudo quanto ao número de vítimas.

Estranhamente, e quanto à greve do Pidjiquiti, não fazem referência ao detalhado relatório que o Comando da Defesa Marítima da Guiné fez logo a seguir para Lisboa, observaram tudo à distância de centenas de metros, como se sabe. Concorda-se com os autores que Amílcar Cabral colheu o ensinamento que era inviável na Guiné, naquele período tentar a subversão urbana, ficou Rafael Barbosa e um grupo na subversão, a direção do PAI partiu para Conacri, preparar a logística da guerrilha e os apoios internacionais.

Um abraço do
Mário


Conflitos sociais que preludiaram os tempos anticoloniais

Beja Santos

“Histórias Coloniais”, por Dalila Cabrita Mateus e Álvaro Mateus, A Esfera dos Livros, 2016[1] é o livro póstumo de dois investigadores que se debruçaram sobre matérias das lutas de libertação nacional. Como referem na apresentação, este acervo de ensaios descreve conflitos sociais significativos e determinantes em todas as antigas colónias portuguesas. E definem: “Significativos, porque mostram a violência e brutalidade associadas a uma dominação colonial insensível aos problemas das populações. Determinantes, porque estes conflitos sociais contribuíram para a formação da consciência nacionalista tendo acelerado a marcha das populações para a independência ou para a integração dos territórios nos países a que pertenciam”.

Os investigadores escolheram os seguintes conflitos para análise: a revolta de «Nhô Ambrose», Cabo Verde; o massacre de Batepá, S. Tomé; a invasão dos Satyagrahis, Goa; a revolta de Viqueque, Timor; a greve do Pidjiquiti, Guiné; a manifestação de Mueda, Moçambique; a greve da Baixa de Cassange, Angola e o motim 1-2-3, Macau. Conflitos que se situaram entre 1934 e 1966.

O que se pode entender por significativo e determinante nestes conflitos?

“Nhô Ambrose” é um conflito social que assumiu uma enorme carga simbólica, à volta da fome num contexto de secas e da crise 1929, de profundo desemprego, em que o porto de Mindelo perdera enorme atividade. No dia 7 de Junho de 1934, um grupo que foi engrossando, de homens, mulheres e crianças, arvorando um pano preto a servir de bandeira, percorreu algumas ruas da cidade de Mindelo, assaltaram estabelecimentos, as autoridades declararam o estado de sítio na cidade, houve dois mortos e vários feridos. Baltazar Lopes irá reconstituir a tragédia da fome e do protesto no seu romance "Chiquinho". Anos mais tarde, Amílcar Cabral recordará os acontecimentos.

O massacre de Batepá é um dos acontecimentos mais hediondos do período colonial português na segunda metade do século XX. Os autores detalham o trabalho nas roças, realizado por trabalhadores forçados, trazidos de Angola, de Moçambique e de Cabo Verde. Faltava mão-de-obra, pensou-se então integrar os forros, descendentes de brancos e de escravos alforriados no século XVI nessas atividades. O Governador Carlos Gorgulho inventou uma revolta comunista e exerceu uma repressão sem precedentes, a tal ponto que os relatórios da PIDE comentam negativamente os excessos, duvidando de qualquer caráter comunista nos protestos e enunciando provas de brutalidade e violência: os prisioneiros foram torturados com varapaus, tiras de borracha e chicotes; obtinham-se confissões através da intimidação, da tortura e de falsas acusações; quando os prisioneiros sucumbiam, Gorgulho determinava: "atirem essa merda ao mar para evitar aborrecimentos". O Ministro Sarmento Rodrigues indignou-se e agiu para afastar Gorgulho do governo de S. Tomé. O déspota queixou-se a Salazar, acabou condecorado.

Se é claro que o que se passou em Goa com a invasão dos Satyagrahis anuncia a firme determinação da União Indiana em ocupar o Estado da Índia, como aconteceu em Dezembro de 1961, a revolta de Viqueque tem pontos nebulosos como a instigação da Indonésia que semeou sentimentos de dissidência entre timorenses. Houve mortos em número ainda hoje impossível de determinar e deportações para Angola. É sabido que vários rebeldes deportados estiveram entre os 36 fundadores do partido APODETI – Associação Popular Democrática Timorense, que, desde o início, declarou que um Timor independente só podia ser economicamente viável se fosse apoiado pelos seus irmãos da Indonésia.

A greve do Pidjiquiti continua ainda hoje a ter versões díspares. Os investigadores citam várias fontes mas estranhamente não referem o importante relatório do Comando da Defesa Marítima feito em cima dos acontecimentos e com observação direta, visto que as suas instalações estavam a escassas centenas de metros do palco do tiroteio e do massacre. O PAIGC tirou lições da repressão, tentou utilizar a greve como acontecimento seu, o que nunca foi verdade.

A manifestação de Mueda envolveu os Macondes que desejavam negociar o regresso massivo de compatriotas seus a Moçambique. A população da região estava descontente pelos baixos preços a que eram pagos os seus produtos, bastante inferiores aos praticados no Tanganica. As autoridades detiveram alguns Macondes e começou o tiroteio. Mais tarde, Eduardo Mondlane, fundador e primeiro presidente da FRELIMO, sublinhou que os incidentes de Mueda tinham sido um importante ingrediente para lançar os Macondes na luta pela independência.

O que se passou na Baixa de Cassange está hoje altamente documentado, foi o ensaio geral da guerra colonial. E como observam os autores, a repressão brutal da luta dos cultivadores de algodão contribui para cavar ódios raciais que explodiriam em atos de barbárie e morticínio, desencadeados em Março e Abril de 1961, em todo o norte de Angola.

O motim 1-2-3 foi assim designado pelo facto de a imprensa norte-americana se referir aos acontecimentos pelo mês e dia dos grandes protestos dos chineses de Macau, que constituíam afinal 95% dos 270 mil habitantes do enclave. Tudo começou em 15 de Novembro de 1966, um grupo de chineses não se compadeceu com a burocracia para o início de obras de reparação e ampliação de um velho edifício para aí se instalar uma escola. Exerceu-se repressão, os chineses praticaram desmandos e depois de um laborioso período de negociações, a autoridade portuguesa ficou reduzida ao mais simbólico e com cláusulas vexatórias: as autoridades portuguesas foram obrigadas a entregar os agentes secretos da Formosa, mais tarde executados; proibidas associações opostas à República Popular da China; pagamento de indemnizações superior a 2 milhões de patacas, às vítimas da repressão.

Os autores recordam o acervo de documentos novos que foi possível consultar depois do 25 de Abril, bem como a recolha de testemunhos presenciais.
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Notas do editor

[1] - Vd. poste de 29 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16774: Agenda cultural (517) Acaba de sair, "Histórias Coloniais", livro póstumo de Dalila Cabrita Mateus (1952-2914) e e Álvaro Mateus (1940-2013) . Edição: A Esfera dos Livros, Lisboa, 2016

Último poste da série de 28 de novembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16770: Notas de leitura (906): “António Carreira, Etnógrafo e Historiador”, por João Lopes Filho edição da Fundação João Lopes, Praia, Cabo Verde, 2015 (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14236: Historiografia da presença portuguesa em África (53): Revista de Turismo, jan-fev 1956, número especial dedicado à então província portuguesa da Guiné: anúncios de casas comerciais - Parte X (Mário Vasconcelos): Bissau, cidadezinha colonial, em 1956, onde chegam as modas de Lisboa


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Digitalizações: Mário Vasconcelos (2015). [Edição: LG]




1. Continuação da publicação de anúncios de casas comerciais, da Guiné. Reproduzidos, com a devida vénia, de Turismo - Revista de Arte, Paisagem e Costumes Portugueses, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2. (*).

Trata-se de uma gentileza do nosso camarada Mário Vasconcelos [,ex-alf mil trms, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72,Mansoa, e Cumeré, 1973/74; foto atual à direita] que descobriu um exemplar, já raro, desta edição, no espólio do seu falecido pai.

Hoje publicamos mais de anúncios de empresários de Bissau, com interesses em Bissau: era o caso, por exemplo, da Companhia dos Grandes Armazéns ALCOBIA, SARL, com sede na baixa lisboeta, que fornecia "mobiliário e decoração" para palácios do Governo (Guiné, Bié, Congo, Luanda...), hotéis, bancos, "e muitas outras entidades oficiais e particulares do Ultramar". Era uma casa famosa, fundada em 1914, instalado num edifício oitocentista,  na Rua Ivena, 14, esquina com a Rua Capelo...  e que ainda hoje existe   com sede na Av. Roma 48 - B - lj 1, Lisboa...

Ficamos a conhecer também:

(i) A. F. Parente & Ca, que tinha ao seu cuidao "todas as obras de asfaltamento das estradas da Guiné e da cidade de Bissau";

(ii) O Quiosque de Gelados, de Teresa Fiore, com os melhores sorvetes da cidade, cerveja das melhores marcas e esplanada; pelo apelido só pode ser uma senhora italiana, ou de origem italiana;

(iii) Empresa T. da Guiné, com "carreiras para todo o interior da província e Ziguinchor [Senegal,  o vizinho do norte, colónia francesa, que se tornaria independente em 4/4/1960]

(iv) Estação de Serviço Especializada Auto Bissau, de José Maria Melão: bate-chapas, pintura, mecânica;

(v) Império Lda, com fábricas de gelo, refrigerantes e fundição de metais; [há colecionadores com caricas de refrigerantes da marca Império Lda,, de Bissau!]

(vi) Jorge da Conceição Relvas de Carvalho, "O Transmontano", agente comercial (vinhos do Porto e outros produtos);

(vii) Costa & Campos Lda: agentes comerciais, representantes de Mourão da Costa Campos, Praça dos Restauradores, 13-3º Lisboa...

[Possivelmente Luís Joaquim Mourão da Costa Campos, Caranzalém,  Goa, 17.04.1903 / Lisboa 20.10.1989; no portal Geneall, lê-se que  foi: (i) funcionário do Banco Nacional Ultramarino; (ii) industrial e comerciante em Lisboa e na Guiné; (iii) grande empreendedor nas áreas da indústria hoteleira e turística; (iv) pioneiro em Portugal da atividade de catering à aviação comercial, e (v) pai de Carlos Alberto Wahnon Mourão da Costa Campos  (1927-2006), cor inf ref,   antigo comandante da CCAÇ 763 (Cufar, 1965/67) e depois do COP 3 (Bigene, 1973)].

Pormenor interessante: destas 7 empresas de Bissau, só uma tem nº de telefone no anúncio, a Empresa T. da Guiné... Era o nº 99... O telefone ainda era um luxo em 1956...Em Bissau o nº de telefone mais alto que encontrei até agora, nestes anúncios,  foi o da casa Benjamim Correia, uma das mais antigas, fundada no tempo da I República,em 1913... O nº de telefone era o... 156! Isto dá uma ideia da dimensão da rede telefónica!