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sábado, 24 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6780: Os nossos seres, saberes e lazeres (23): O Grupo de Bombos 4 Estações, na Tabanca de Candoz (Luís Graça)

 

 Marco de Canaveses, Paredes de Viadores, Candoz, Quinta de Candoz > Festa de Nossa Senhora do Socorro, 24 de Julho de 2010. Actuação do Grupo de Bombos 4 Estações que acompanham o mordomo da festa, casa a casa, na recolha de donativos.

 Da Tabanca de Candoz, em festa, envio votos de boas férias (ou simples bom fim de semana) a todos os amigos e camaradas da Guiné, membros da Tabanca Grande e aos demais leitores do nosso blogue. Mesmo aqui é difícil esquecer a guerra (ou não falar da guerra), e muito menos o blogue...

 Cá na Tabanca de Candoz, além de mim, há mais dois antigos combatentes, dois cunhados meus, um que esteve em Angola (Camabatela, 1969/72), José Ferreira Carneiro, 1º Cabo Trms Inf; e outro em Moçambique, onde foi gravemente ferido, por acidente com arma de fogo (uma pistola metralhadora Uzi), que o levou às portas da morte.

O António Ferreira Carneiro, na altura conhecido como o "Brasileiro", é hoje deficiente das Forças Armadas: foi atingido em sete órgãos. Pertencia ao Destacamento 664, da Companhia de Intendência (Tete, 1964/66), sendo comandante o Alf Mil Patrício. O 1º Sargento era o Anmtónio Teles Touguinha, já falecido, que se veio a revelar grande amigo da família. Era natural de Vila do Conde. Havia ainda dois furriéis açorianos, de que o António já não se lembra o nome.  Ao todo, eram cerca de 25 militares, viviam numa vivenda em Tete, em plena cidade. Os graduados eram apenas 2 cabos, 2 furriéis e 1 alferes.

O "Brasileiro" (alcunha por que era conhecido) foi ferido em Julho de 1964 e transferido para o HMP, em Lisboa, em Dezembro desse ano. No HMP passou cerca de oito meses.  Regressou à vida civil em Agosto de 1965. Era refractário, tendo estado no Brasil entre os 18 e os 24 anos. Foi "caçado", quando regressou à Pátria... Nasceu em 25 de Fevereiro de 1939, na Ribeira, Paredes de Viadores.

Em Tete, foi 1º cabo magarefe... Ainda hoje procura malta da sua subunidade bem como o médico que o operou em Tete ("Era a maior alegria que me podiam dar, saber do paradeiro dos meus camaradas de Intendência bem como do médico que me salvou"). Ele vive em Custóias, Matosinhos.

Um primo deles, e da minha mulher, Maria Alice Ferreira Carneiro,  antigo presidente da Junta de Freguesia de Paredes de Viadores, o comerciante José Ferreira, esteve por sua vez na Guiné, na CCS do BART 2866 (Bissau, Pelundo, 1969/70). Era 1º cabo sapador. Passou 15 meses em Bissau e sete no Pelundo. Actuavam em todo o CTIG, colocando minas ("algumas de vinte quilos"). Não temos ninguém da sua unidade, aqui no nosso blogue

Vídeo (2' ''02):  Luís Graça (2010). Alojado em You Tube > Nhabijoes

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 Nota de L.G.: 24 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6641: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (22): José Corceiro, um bom filho, um melhor pai, um avô babado

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5801: Memória dos lugares (69): O isolamento de Bedanda (Mário Silva Bravo, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 6, Bedanda, 1971/72)



1. O nosso camarada Mário Silva Bravo (ex-Alf Mil Médico na CCAÇ 6, Bedanda, 1971/72) enviou-nos a seguinte mensagem, em 7 de Fevereiro de 2010:


Camaradas,

Mais uma mensagem com o propósito de descobrir gente (foto 1), que há tantos anos conheci e que gostaria de saber onde estão.

Envio outra foto (2), de Bedanda, com o objectivo de recordar a todos os que vivemos estes momentos, que a vida tem fases de tudo e até de carências e limitações ultrapassáveis.

É claro que com a idade que nós tínhamos, tudo era mais fácil e não provocava grandes males.

Foto 1: GUINÉ > 1971/72 > GRUPO NORTENHO: Da Esquerda para a direita - Lopes (Cozinheiro, de Torre de D.Chama;), Dias (Enfermeiro, de Viana do Castelo); Cripto (Não me lembro do seu nome, nem naturalidade), Nelinho (Atirador, do Porto) e Eu (Médico, do Porto).

O isolamento de Bedanda

Foto 2: GUINÉ > BEDANDA > 1971/72: Abastecimento aéreo.


Por vezes e por dificuldades de circulação via fluvial, era necessário abastecer a CCaç 6, por via aérea, através do lançamento de alimentos (e também correio), usando um avião North Atlas. Na foto, podemos ver dois pára-quedas a atingirem o solo e também um militar a deslocar-se para o ponto de aterrragem dos ditos.

Este modo de abastecimento, tinha como consequência inevitável, uma refeição muito original, frango de estilhaços, que queria dizer só isto:  o frango era lançado sob a forma de congelado e,  ao atingir o solo, partia-se em múltiplos bocados. Não havia outra solução – cozinhá-lo mesmo assim e daí o seu nome, tão elucidativo.

É claro que com alimentos, o pessoal da Força Aérea trazia também o tão esperado correio, que diminuía um pouco a saudade da Metrópole.


Um abraço,
Mário Bravo
Alf Mil Médico da CCAÇ 6

Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
Fotos e legendas: © Mário Bravo (2009). Direitos reservados.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5258: A tragédia de Cufar, sábado, dia do Diabo, 2 de Março de 1974 (António Graça de Abreu)







Guiné > Região de Tombali > Cufar > Fotos obtidas de slides do António Graça de Abreu, autor de Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura (2007)... São fotos, carregadas de horror, impotência e luto.

Nas páginas 200-2003 do citado livro, pode ler-se o seguinte (resumo):
Foi no dia 2 de Março de 1974, sábado, um "dia do diabo" (sic)... Entre Cufar e o porto do rio Manterunga, numa picada que não teria mais de cem metros, batida milhares de vezes pelos jipes e demais viaturas militares, os guerrilheiros do PAIGC lembraram-se de lá deixar uma brinquedo de morte: uma vulgar mina anti-carro, reforçada por uma bomba de um Fiat (!) que não tinha explodido... Um jipe do pelotão da Intendência, o PINT 9288, comandado pelo Alf Mil João Lourenço (membro da nossa Tabanca Grande) (*), accionou o engenho. Os cinco ocupantes, dois militares, brancos (o Fur Mil Pita e o Sold Santos, o Jeová), e três civis, estivadores, guineenses, encontraram aqui a morte...

Mais à frente, outra mina, enterrada no lodo do rio, provocou a explosão, em cadeia, de batelões atracados ao cais e carregados de bidões de gasolina... Cerca de duas dezenas de estivadores perderam a vida, num cenário dantesco..."Vi coisas nunca vistas e que nunca mais quero ver", escreveu o António...

Fotos: © António Graça de Abreu (2009). Direitos reservados.


1. Mensagem de 5 do corrente, remetida pelo António Graça de Abreu :

Meus caros Luís, Vinhal e Magalhães Ribeiro:

Peço-vos que publiquem este texto que está no meu Diário da Guiné, nas paginas 200-203. Creio ser valioso porque agora o posso acompanhar com os slides que fiz na altura e só a semana passada consegui digitalizar. É um documento importante a mês e meio do fim da guerra na Guiné [, a duas semanas do 16 de Março de 1974, nas Caldas da Raínha]. Estas duas minas, na picada e no lodo, provocaram 19 mortos, em Cufar. Algumas fotografias são cruéis, mas não há muitas imagens como estas. Deixo ao vosso arbítrio a sua publicação.

Um abraço forte do

António Graça de Abreu


Cufar, 3 de Março de 1974

Hoje é domingo, dia do Senhor, o nosso Deus salvador do mundo. Ontem foi dia do Diabo, Santanás andou por aqui à solta. Ignoro se o Céu existe, mas sei que ontem viajei pelos caminhos do Inferno.

Tudo começou às quatro da tarde com um rebentamento fortíssimo a quatrocentos metros do quarto onde eu dormia uma sossegada sesta. Acordei sobressaltado, vesti-me rapidamente. Lá fora já havia gente a correr e a gritar.

O rio Cumbijã passa a dois quilómetros de Cufar, mas existe o rio Manterunga, um pequeno afluente, melhor um braço de rio que chega quase até à nossa povoação. A quinhentos metros daqui construiu-se um pequeno pontão, um cais de abicagem no
Manterunga.

É aquilo a que chamamos o “porto interior”, utilizado por barcos de pouco calado que chegam carregados de Bissau e descarregam neste porto. Quando a maré está cheia, os batelões sobem o rio e ficam ancorados lá em baixo. A maré desce e os barcos pousam em cima do lodo do leito do rio que é mole e não lhes danifica o casco. Voltam a aproveitar uma maré-cheia para regressar a Bissau. São batelões pequenos, uma espécie de barcaças com motor que trazem para aqui muitos produtos de que necessitamos todos os dias, sobretudo gasolina para abastecer os aviões e helicópteros.

Entre Cufar e o porto do rio Manterunga existe uma picada de terra batida com umas centenas de metros. Até ontem circulava-se nessa estradinha com o maior à vontade, considerava-se a estrada como fazendo parte dos caminhos de Cufar. Já passei por lá dezenas de vezes conduzindo os jipes e é um dos trajectos que costumo utilizar nos meus crosses.

Os guerrilheiros não andam longe e conhecem bem estes lugares, estão em casa. Na picada, a cinquenta metros do porto interior resolveram colocar uma mina anti-carro reforçada por uma bomba dos nossos Fiats que não havia explodido. A mina foi accionada pelo jipe do pelotão de Intendência, até há uns tempos atrás comandado pelo [João] Lourenço (*), meu ex-companheiro de quarto. Foi o estouro monumental, o rebentamento desta mina que me acordou. Iam cinco homens no jipe, dois brancos, um furriel da Intendência[, o Pita e] o Santos, Jeová, mais três negros estivadores dos batelões de Bissau. Quatro deles morrerem logo, os corpos voaram e caíram desfeitos a mais de cinquenta metros do local da mina, o jipe também voou e poisou de rodado para o ar, completamente destruído a vinte metros da estrada. Sobreviveu o furriel Pita, mas dizem-me agora que morreu no hospital de Bissau.

Às sete e meia da tarde, já noite escura, ouviu-se novo rebentamento. Ataque?!... Houve logo gente a saltar para as valas. Eu estava no meu gabinete e percebi que não se tratava de um ataque. Para os lados do porto interior cresciam chamas enormes. Peguei num jipe e avancei pela picada a grande velocidade em direcção ao porto. Um soldado quis vir comigo mas quando me viu a acelerar por ali abaixo, saltou do jipe e deixou-me sozinho. Em menos de um minuto estava junto do buracão feito pela mina anti-carro da tarde e não podia avançar mais. Logo ali, diante de mim ardiam os batelões com labaredas que subiam a mais de quinze metros. Iluminei o caminho com os faróis do meu jipe. Na minha direcção corriam meia dúzia de homens com o corpo em chamas, e gritos atrozes, lancinantes.

Os batelões transportavam umas dezenas largas de bidões de gasolina. Ora os guerrilheiros haviam deixado outra mina anti-carro enterrada no lodo do rio Manterunga. Quando a maré desceu, o fundo de um dos barcos tocou na mina que rebentou perfurando-lhe o casco. De imediato, a gasolina pegou fogo. Começaram a rebentar bidões e num ápice os três batelões que estavam juntos começaram a arder, um incêndio colossal. Os homens da tripulação e os estivadores que jantavam dentro dos barcos foram regados com gasolina, alguns deles, com os rebentamentos, foram projectados em todas as direcções.

Os homens ardiam como tochas, gritavam, vinham direitos a mim. O inferno deve se um lugar bem mais agradável do que aquelas dezenas de metros de picada com pessoas a serem consumidas pelas chamas, o ar, o escuro da noite empestado por um horrível, um nauseabundo cheiro a carne humana queimada. Despi a minha camisa e com ela tentei apagar restos do fogo que cobria aqueles homens. Meti quatro negros no carro, dei a volta com o jipe e subi, acelerando em direcção a Cufar. Uma viatura blindada Fox descia a picada com os faróis e as metralhadoras apontadas para nós.

Eram os primeiros militares que acorriam à explosão dos barcos. Gritei-lhes para pararem. Ficaram espantadíssimos por encontrarem ali o alferes Abreu em tronco nu com homens todos queimados dentro do jipe. Rodeei a Fox com dificuldade – ocupava quase toda a picada, – e em segundos cheguei com os desgraçados à enfermaria de Cufar. Foram deitados em macas e regados com água. Dois grupos de combate da 4740, bem armados, desciam entretanto para o porto interior e havia mais pessoas atingidas pela gasolina a arder, a caminho. Não era mais comigo.

Hora e meia mais tarde, com a pista iluminada pelas garrafinhas com petróleo veio o Nordatlas que transportou quase uma dezena de homens horrorosamente queimados para o hospital de Bissau. O Bastos, o médico, disse-me que apenas três tinham hipóteses de sobreviver.

Faltava alguma tripulação e estivadores. Hoje, de manhã cedo, o espectáculo era ainda tenebroso, dantesco. Os batelões continuavam em chamas e no lodo do rio Manterunga havia sete corpos carbonizados, espalhados em volta dos barcos. Os homens a arder saltaram para o lodo e morreram ali, meio enterrados na lama cinzenta. Faltavam corpos que não foram encontrados, caíram ao rio e quando a maré subiu devem ter sido levados pela corrente. Apareceu um último cadáver todo esventrado, comido pelos abutres.

Vi coisas nunca vistas e que nunca mais quero ver.

Os homens que morreram queimados ou desapareceram eram todos africanos, o que provocou algum alívio entre a tropa branca. Apenas o Jeová e o furriel Pita da Intendência eram nossos, nossos amigos.[1]

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[1] O soldado Rodrigo Oliveira Santos, Jeová, era natural da freguesia de Romariz, Vila da Feira; o furriel miliciano Pita da Silva nasceu no Funchal, Madeira.

[ Revisão / fixação de texto / legenda / bold a cor / título: L.G.]
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Nota de L.G.:

(*) Vd. postes de:
17 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4366: Tabanca Grande (144): João Lourenço, ex-Alf Mil, PINT 9288, Cufar (1973/74)

16 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1284: A Intendência também foi à guerra (Fernando Franco / António Baia)

domingo, 28 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4598: Estórias avulsas (35): O porco que andava à solta (José Carlos Neves)

1. O porco que andava à solta é uma estória que o José Carlos Neves, (*), ex-Soldado Radiotelegrafista do STM, Cufar, 1974, nos enviou em mensagem do dia 26 de Junho de 2009:

O porco que andava à solta

Um belo dia resolvemos (eu e alguns Camarada da Intendência) ir tomar banho à piscina que era nem mais nem menos do que uma pedreira onde a água da chuva se concentrava e formava uma bela piscina. E por estranho que pareça até estava limpa.

Estávamos a refrescarmo-nos quando demos pela presença de um porquinho muito jeitoso na borda da água. Como a fominha apertava, não se pensou duas vezes. Um saiu da água pegou na G3 e zás, lá estava o porco morto. O pior é que um tiro de G3 faz barulho e logo quase de imediato a Senhora que andava a pastar os porcos apareceu.

Procurou o porco por todos os lados, só se esqueceu de o procurar debaixo de água, onde ele foi parar antes que viesse alguém. Até aqui tudo bem, só que a dita Senhora que não era parva nenhuma e já sabia com quem lidava, não saía dali. O porco tinha que estar em algum lado. E estava! Debaixo dos meus pés porque teimosamente queria vir à superfície.

O tempo foi passando até que passou uma viatura do Exército. Fizemos sinal e lá pararam. Explicámos a situação e eles fizeram-nos companhia até que a Senhora resolveu afastar-se por uns momentos. Foi o suficiente para o porquinho, num salto acrobático, saltar da água para cima da carripana.

O problema todo é que tivemos que repartir o bicho por mais gente o que ficou menos para cada um. Mas mesmo assim deu para matar a fominha.

Escusado é dizer que a tal Senhora no dia seguinte foi perguntar pelo porco ao Comandante, mas nós, que também não éramos completamente parvos, tratámos logo de enterrar as tripas e apagar todos os vestígios do crime.

Esta foi uma das estórias que vou tendo para contar.
Qualquer dia conto outra se virem interesse nisso.

Um Alfa Bravo para toda a Tabanca Grande
José Carlos Neves
Soldado Radiotelegrafista do STM
Cufar, 1974
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 18 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4546: (Ex)citações (31): Tenho pena daquele povo afável que vive hoje na miséria absoluta! (J. Carlos Neves)

Vd. último poste da série de 14 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4519: Estórias avulsas (34): Desertei depois de ter vindo da Guiné (Manuel Maia)

terça-feira, 19 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4377: Tabanca Grande (145): João Lourenço, ex-Alf Mil do PINT 9288 (Cufar, 1973/74)

1. Mensagem do nosso no tertuliano João Lourenço (*), ex-Alf Mil do PINT 9288, Cufar, 1973/74, com data de 18 de Maio de 2009:

Conforme prometido junto 2 fotos antigas e 3 actuais, deixo ao teu critério a escolha para o blog.

Um Abraço
João Lourenço


2. Comentário de CV:

Caro João Lourenço

Estás formalmente apresentado à Tertúlia com o envio e publicação das fotos da praxe.

Uma vez que vais estar presente no nosso próximo Encontro, será mais fácil reconhecer-te.

Deixo-te um abraço virtual e votos de boa saúde.
Carlos Vinhal
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 17 de Maio de 2009 >
Guiné 63/74 - P4366: Tabanca Grande (144): João Lourenço, ex-Alf Mil, PINT 9288, Cufar (1973/74)

domingo, 17 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4366: Tabanca Grande (144): João Lourenço, ex-Alf Mil, PINT 9288, Cufar (1973/74)

Guiné > Região de Tombali > Cufar > Foto (obtida por Luís Graça) de um slide do António Graça de Abreu, apresentado no dia 2 de Outubro de 2008, na Biblioteca-Museu República e Resistência / Espaço Grandella, por ocasião da conferência do nosso amigo e camarada sobre o seu livro Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura (2007), no âmbito do ciclo de conferências "Memórias literárias da guerra colonial" (I Série, 2008)...

Essa foto, carregada de luto, impotência e dramatismo, foi reproduzida no seu livro, página 201, com a seguinte legenda: "Buraco de mina-anticarro, na picada de Cufar para o porto interior"... Foi no dia 2 de Março de 1974, sábado, um "dia do diabo" (sic)...

Entre Cufar e o porto do rio Manterunga, numa picada que não teria mais de cem metros, batida milhares de vezes pelos jipes e demais viaturas militares, os guerrilheiros do PAIGC lembraram-se de lá deixar uma brinquedo de morte: uma vulgar mina anti-carro, reforçada por uma bomba de um Fiat (!) que não tinha explodido... Um jipe do pelotão da Intendência, o PINT 9288, comandado pelo Alf Mil Lourenço, accionou o engenho.

Os cinco ocupantes, dois militares, brancos (O Fur Mil Pina e o Sold Jeová), e três civis, estivadores, guineenses, encontraram aqui a morte (*)...

Mais à frente, outra mina, enterrada no lodo do rio, provocou a explosão, em cadeia, de batelões atracados ao cais e carregados de bidões de gasolina... Cerca de duas dezenas de estivadores perderam a vida... Um espectáculo dantesco, escreveu o António..."Vi coisas nunca vistas e que nunca mais quero ver"...

Foto: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008). Direitos reservados.


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1. Mensagem, de hoje, de João Lourenço:

Meu caro Luís,
"Tropecei" no teu blogue e gostava não só de me encontrar com o pessoal das nossas "férias tropicais" como de pertencer ao grupo e ir ao almoço de dia 20.

Fui o 1º Comandante do PINT 9288, estive lá em Cufar até ao terrível dia da morte do meu Furriel Pita e do Jeová no mesmo Jipe que eu próprio tinha conduzido na estrada para o porto interior nesse dia de manhã cedo, antes de ir em serviço a Bissau chamado pelo Cap Manuel Duran Clemente, meu 2º Comandante.

Estive no Hospital com o Pita o pouco tempo em que o coração dele resistiu ao destino que era inevitável. Hoje resta apenas a memória gravada no monumento em Belém de homenagem a todos os que deram a vida. Tal como a maioria, nunca soube o nome do Jeová, penso que estará homenageado no mesmo monumento.

Convivi com a CCaç 4740, o CAOP 1, ainda me lembro de alguns, poucos, bons momentos, como a célebre recepção aos piras em que lhes demos arroz com marmelada..., antes de vir a nossa janta reforçada, etc.

Lembro-me bem do Baía e de mais alguns, havia o Furriel Cardoso, um moço do Norte que era Bate-chapas... um 1º Cabo que ficou no BINT de Bissau, que era aqui da Figueira onde habito agora e que gostava de voltar a encontrar,etc.

Não percebo muito de informática mas tenho ajuda em casa, contacta-me logo que possível. 

Um abraço
Cumprimentos
João Lourenço
(Ex Alferes Miliciano Lourenço)

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2. Comentário de L.G.:

João: 
Sê bem vindo. Sabes que a "malta da bianda" nos era muito querida... Além disso vejo que és da Figueira: Temos vários camaradas daí, que já pertencem à nossa Tabanca Grande (António Pimentel, Vasco da Gama, Artur Soares, etc. - cito de cor). Vou tomar boa nota do teu pedido, incluindo a a inscrição no nosso encontro, a 20 de Junho. Vou publicar a tua mensagem, na série Tabanca Grande... Do CAOP 1, do teu tempo de Cufar, tens cá o António Graça de Abreu. E do BINT, o Baía (aqui na foto, à direita) bem como o Franco (que estava em Bissau).

Se tiveres, duas fotos digitalizadas (uma antiga e outra actual), seria óptimo. Se não, mandas mais tarde. Boa saúde para ti.

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3. Eis como o António Graça de Abreu saudou a entrada do novo membro da nossa Tabanca Grande:

Meu caro Luís:
Tu mereces uma estátua! Agora, graças a ti, descubro o Lourenço.
Junto cópia do mail que lhe enviei para teu conhecimento.

Vou para Macau 6º. feira, dia 22 de Maio. Regresso de Macau dia 5 de Junho. Lá vai ser lançado o meu último livro, Poemas de Han Shan. Han Shan é um homem fabuloso, meio budismo zen, meio quase tudo.

Claro que estarei no nosso encontro na Ortigosa, dia 20. Dia 3 de Julho parto para Xangai com os meus filhos (a minha mulher já lá estará) e só regresso de Xangai no dia 3 de Setembro. Não viajo para a China há quatro anos, vou-me reciclar.

Estarei sempre atento ao blogue e tenho quase toda escrita uma longa Carta Aberta a Salazar e a Marcelo Caetano que depois peço para tu publicares.

Obrigado pelo teu infatigável labor por todos nós.
Um abraço,
António Graça de Abreu

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4. Mail enviado pelo Graça de Abreu ao João:

Lourenço, caríssimo:
És um dos que faltava na minha lista de gente importante de Cufar. A companhia 4740 (os açorianos, o cap, Dias da Silva, etc.) já está, fui a dois convívios desses homens que foram nossos companheiros em Cufar.

Sou o alf mil António Abreu do CAOP 1. Vivemos no mesmo quarto durante uns meses, Junho a Novembro de 1973, creio. Fazíamos lá uns jantares meio-escondidos com frangos assados roubados do teu pelotão de intendência. Conto tudo isso no meu Diário da Guiné que quero que leias.

Depois de Cufar, foste para Bambadinca e Bissau.

Na altura eu escrevi um diário de guerra. Foi publicado em 2007, com o título Diário da Guiné. Lama, sangue e água pura [vd. capa, foto à esquerda].

Tu, Lourenço, entras no livro, até transcrevo na íntegra um aerograma que me enviaste de Bambadinca. Há dois anos não te pedi autorização para o publicar porque ignorava por completo o teu paradeiro.

Vou mandar-te o livro pelo correio, dá-me-me a tua morada e, se vais ao encontro do blogue Luís Graça e Amigos na Ortigosa, dia 20 de Junho, encontramo-nos lá. Faremos contas do livro e um esfuziante balanço das nossas vidas. Podes também telefonar-me.

Um abraço e até breve.
António Graça de Abreu

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5. Resposta do L.G. ao António:

António:
A estátua, não, muito obrigado. Mas a tua amizade, sim, acho que a mereço... Ainda bem que o 'puzzle' vai-se completando, ainda bem que tu encontraste mais um camarada de Cufar...Tens alguma foto do Lourenço? Podes mandar-me o aerograma digitalizada, que ele te mandou de Bambadinca?... Vou ver, agora com outros olhos, o teu Diário...

Quanto à viagem à China... Sabes o que se passou em Macau durante a Revolução Cultural? Se souberes algo sobre isso, escreve... Teve, de certo, influência na 'nossa' guerra... Que seja uma bela jornada para todos vós, a viagem à China... 
Luís

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6. Segunda mensagem do dia, enviada pelo João Lourenço:

Meu caro Luís, 
Vou precisar de mais informações, morada, para ir ter com o pessoal da "bianda" no dia 20 [de Junho, à Ortigosa]. Já entrei em contacto com o Abreu... um espectáculo. Sabes alguma coisa do pessoal dos outros PINT, o 9286, 9287 e 9285?

A única notícia que tive em muitos anos foi o falecimento precoce, por doença, do meu colega do PINT de Farim, que era do Porto, o Alferes Lima. Nada sei do Luís Beiroco, de Buba, nem do Carlos Mota, de Bambadinca.

Tinhamos no Pint 9288 um rapaz aqui da Figueira que era o nosso Cabo cortador/magarefe, ficou em Bissau sempre, talvez o Franco ou o Martins se lembrem e saibam dele. Se souberem avisem.

Um abraço
João Lourenço
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Nota de L.G.:

(*) Sobre a Intendência e sobre este dia negro para o BINT, em Cufar, vd. postes de:

23 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3229: História resumida da Companhia de Terminal e do Batalhão de Intendência (José Martins)

12 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3196: Em busca de...(39): Companhia Terminal (Bissau, 1973/74) (Daniel Vieira)

20 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2462: Convívios (38): Minitertúlia da Intendência / Administração Militar, Belém, Lisboa, 18 de Janeiro de 2008 (Fernando Franco)

16 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1284: A Intendência também foi à guerra (Fernando Franco / António Baia)

20 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1195: Ameira: O nosso encontro fez-me bem à alma (Fernando Franco)

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3943: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (5): Quero exprimir a minha revolta (Fernando Franco)

1. Mensagem do nosso camarada Fernando Franco, ex-1.º Cabo Caixeiro do Pelotão de Intendência (PIAD), Cufar, 1973/74, com data de 26 de Fevereiro de 2009:

Amigos, há muito que ando afastado de escrever algo, mas não de visitar o nosso blogue e não fosse um conselho do meu psiquiatra, que em vez de me alienar de tudo sobre a Guiné, deveria fazer o contrário, porque me ia sentir e dormir melhor, se tal me agradasse como vinha acontecendo.

Como tal aqui estou revoltado, para me juntar a tantas outras vozes indignadas, com o que se escreve sobre nós , ex-combatentes.

Falam e escrevem como tivessem, alguma vez, sentido na pele o medo de morrer ou ficar mutilado, numa guerra que nos impuseram e a que não fugimos, simplesmente enfrentámos cada um à sua maneira... E como escreve o Mário Fitas, “fomos combatentes e não assassinos”.
Escreverem sobre as noites e dias sucessivos que passámos em alerta máximo nos ataques, patrulhas, colunas militares ou outras operações sempre com os nossos mil sentidos a funcionar em pleno, isso não merece a pena falar ou escrever, pois será que alguma vez aconteceu?

Apesar de ter sido um felizardo em relação a outros camaradas que frequentam o nosso blogue, digo bem alto e escrevo que passei por alguns momentos desses e que ainda hoje me atormentam com noites mal dormidas, momentos de solidão e má disposição, enfim igual a tantos outros camaradas que sofrem, ainda na pele, todos esses momentos nas nossas mentes.
Cada um tenta superar esses momentos de crise duma forma ou doutra e todos temos a certeza, os que estivemos na guerra “não fomos assassinos mas sim combatentes”.

Um abraço para todo o pessoal da Tabanca Grande
Fernando Franco

OBS: Negrito da responsabilidade do editor
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3942: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não asssassinos (4): Compreendo o que vos vai na alma (Virgínio Briote)

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3587: Controvérsias (16): Chicos, furras e ripanços em Catió, 1968 (Jorge Teixeira - Portojo)


Guiné> Região de Tombali > Catió > CCS do BART 1913 (Catió 1967/69) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Catió - Quartel >

"Foto nº 4 - Foto tirada de cima do depósito da água do quartel [JUL 1967]. Vista parcial da parte nova do quartel. A parada com o cepo (raiz) do Poilão, à esquerda as casernas nº 1 e nº 2, ao centro o edifício do comando, por detrás deste as camaratas de sargentos e depois destas as novas messes ainda em construção, tal como a camarata de oficiais à direita. O telhado vermelho era a messe e bar de sargentos".

 
Guiné> Região de Tombali > Catió > CCS do BART 1913 (Catió 1967/69) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Catió - Quartel > "Foto nº 25 - No novo Bar de Sargentos em 1968. De pé os Fur Mil Pires, Mendonça, Laurentino (do serviço Foto Cine de Bissau), Condeço e Cabrita Gonçalves; em baixo o Teixeira e o Gil".

Guiné> Região de Tombali > Catió > CCS do BART 1913 (Catió 1967/69) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Catió - Quartel > "Foto nº 18 - Os Fur Mil Viriato Dias e Mendonça no varandim do velho edifício da messe de sargentos".

Guiné> Região de Tombali > Catió > CCS do BART 1913 (Catió 1967/69) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Catió - Quartel > "Foto nº 11 - O Fur Mil Vitor Condeço sentado na raiz do Poilão, tendo por fundo o edifício do comando". [O Vitor, 63 anos, reformado, residente no Entroncamento, foi furriel miliciano mecânico de armamento, CCS do BART 1913, Catió, 1967/69].


Guiné> Região de Tombali > Catió > CCS do BART 1913 (Catió 1967/69) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Catió - Quartel > "Foto nº 9 - O porco fugiu da pocilga e foi passear na parada. Ao fundo à esquerda o depósito de géneros e a padaria, em frente a cozinha, refeitório e bar das praças. Vê-se o furriel vagomestre Rijo com um cozinheiro com o tabuleiro da amostra da refeição para o comandante fazer a prova".



Guiné> Região de Tombali > Catió > CCS do BART 1913 (Catió 1967/69) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Catió - Quartel > "Foto nº 32 - Cerimónia militar em Fevereiro de 1968. Militares, civis da administração, correios e comerciantes. Da esquerda para a direita, [?], de costas o Cap Médico Morais, o Comandante Ten Cor Abílio Santiago Cardoso, quatro funcionários dos Correios e Administração, os comerciantes Srs. José Saad e filha, Mota, Dantas e filha, Barros, depois o electricista civil Jerónimo, e o Alf Capelão Horácio".



Guiné> Região de Tombali > Catió > CCS do BART 1913 (Catió 1967/69) > Álbum fotográfico de Vitor Condeço > Catió - Quartel > "Foto nº 1 - Vista aérea de Catió, onde se vê na parte superior a zona do quartel".

Fotos e legendas: © Victor Condeço
(2007). Direitos reservados.


1. Mensagem do Jorge Teixeira (Portojo) (*), membro da nossa Tabanca Grande e da Tabanca de Matosinhos, com data de 8 de Dezembro último:

Assunto - Tema Ganância

Caro Luís:

Um abraço.

O nosso camarada Jorge Picado teve de explodir e com razão (**).

São coisas guardadas há muito tempo e em qualquer momento saiem. E talvez até pelo que se vê hoje em dia, o sentido da revolta é grande. Mas sempre soubemos que os milicianos é que pagaram sempre. Faziam a guerra, faziam a revolta e faziam a cobertura à maior parte da chicalhada. À maior parte, disse eu, porque havia chicos bons.

Quero dar o meu apoio ao Jorge. E já agora, e se quizeres publicar, dou a minha estória para o tema GANÂNCIA. Quando cheguei a Catió, em meados de Maio de 69, disseram-me que era obrigatório fazer uma messe. Não fazia ideia o que isso era. Por ordem de velhice ao contrário, acho que fui o próximo. Mas não me lembro se a fiz em Junho ou Julho [de 1969]. Sei apenas que me desenrasquei. Se bem me lembro do mês, foi em Outubro que rebentou uma bomba. Havia rapinanços em Catió.

Levantou-se um inquérito e, claro, apanharam uns tantos furriéis milicianos [, furras]. Como todos os inquéritos que têm conclusão, o pequeno é que apanha. Claro que o 2º Cmdt, de quem não me lembro o nome, responsável pelos reabastecimentos, não teve nada a ver com o caso; nem o capitão, cmdt da CCS, de quem apenas lembro o apelido, o Tim Tim, que muito a propósito e a tempo, lhe arranjaram uma consulta de psiquiatria e foi evacuado; nem o 1º sargento, o pica estradas (lembro do nome mas fica cá guardado), apelido derivado ao seu enorme nariz e nunca por ter saído do aquartelamento, nem para ver um jogo de futebol, quanto mais em qualquer missão.

Esse furriéis foram o vague-mestre da CCS, o meu querido amigo Rijo, o Oliveira que estava na altura no destacamento de Ganjola, outros que por lá também passaram anteriormente e de quem não me lembro do nome. Sei que pagaram em dinheiro desfalques que havia nas contas da CCS. O calo dos superiores tinha de bater na inexperiência dos furrieizitos milicianos. Não que eles fossem santos, sei lá, mas como sempre acontece, só alguns comeram.

No meio disto tudo, tinha vindo para Catió um capitão para cmdt de operações. Não me lembro do nome deste senhor. Que por inerência ficou cmdt da CCS, olhando ao sucedido. Resolveu chamar-me para ir fazer a vaguemestria do rancho. Perguntei:
- Mas eu, porquê ? Só pertenço à CCS por motivos operacionais e de alojamento.
- Porque fez uma boa messe de sargentos.

Isto foi novidade para mim. Tive de aceitar mas coloquei condições. Raramente recebíamos frescos; mesmo arroz, tivemos num determinado período que comprar nos armazens de Catió, porque nem bianda havia. Então carne, peixe e legumes era coisa que raramente havia. A população era-nos hostil e não vendia nada. Raramente a CCS alugava avioneta e comprava fora do reabastecimento mensal, fosse o que fosse.

As minhas condições foram: Fornecimento semanal de frescos por avioneta e uma comissão de soldados escolhida pelos próprios que fizesse o acompanhamento da vaguemestria. Aceites as condições e após apresentação de orçamento, foi fácil verificar que a companhia tinha imensos lucros com o rancho.

Não falo dos outros sectores que não eram da minha responsabilidade: Combustíveis, artigos para os bares e cantinas, etc. (Mas também sei de estórias...).Os furriéis não poderiam ser culpados nem de metade do que lhe atribuiram de culpas. Mas a chantagem que exerceram sobre eles com castigos que poderiam ir até à rendição individual foi de tal forma que eles aceitaram confessar-se culpados.

Imagino, melhor, sei o que pensou ao Rijo, desportivamente um internacional português, já com 27 anos. Este homem nunca mais foi o mesmo.

Factos: Na altura acho que tínhamos entre 17 ou 19 escudos diários para alimentação. Não recordo. Pois demonstrei que era possível fazer diárias com frescos, custos de transportes, refeições extras para o pessoal que chegava de madrugada de patrulhamentos ou outros serviços no mato, reforço alimentar para os sentinelas e pessoal de serviço no aquartelamento, reforço de rações de combate, não só com esse dinheiro como ainda sobrava algum, mas pouco é certo, nessa altura, ao fim do mês. E haviam refeições extras para oficiais - ah meu cmdt Cardoso, quantas vezes lhe levei um petisco ! -, e sargentos que vinham ao rancho pedir um pratinho.

A véspera de Natal de 69 foi um exemplo, principalmente para alguns furriéis, pois o safado do Dias não quis alinhar e deu salsichas na messe. E houve festas com convidados da população - Dia da Artilharia, dia de Natal e Ano Novo, da despedida da unidade em finais de Fevereiro. E sobrava sempre da nossa panela para as crianças nativas, embora o pessoal se alimentasse bem melhor. E ainda deu para alguns suplementos aquando da partida do pessoal da CCS, pois havia excedentes ( vinho, conservas de frutas, pão, pelo menos isso que me lembre); e a CCS que veio render a do [BART] 1913 [1967/69] ainda lucrou muitas dezenas de contos desses excedentes (***).

Mas tudo isso já existia no depósito antes da minha tomada de posse. Quando fiz o inventário haviam cerca de 100 contos de excedentes. Só que o Rijo, o Oliveira e os outros não sabiam nada de contas. E dinheiro vivo era preciso para tapar buracos. E os lucros dos autos de perca, destruição, apodrecimento e afins ?

Nas cargas e descargas de mercadorias, eram caixas de batatas, cervejas, bidões de gasóleo, whisky, etc que caíam ao rio - e na barriga dos fuzas que faziam a segurança dos batelões - ou que chegavam podres e por aí fora...

Façam agora uma pequena conta, bem simples: transformem só 1 escudo por dia de excedente alimentar por militar; Para uma média de 100 bocas diárias (cheguei a dar refeições a 140 pessoas); durante 18 meses mais ou menos que foi o tempo anterior à minha tomada de posse... Acrescentem os desvios de gasóleo à população civil, mais os artigos dos bares extraviados e os lucros da comercialização (mais de 150 pessoas em média diária e com poucos abstémios) - e vejam qual a soma.

Mais: Se eu tinha 100 contos de excessos alimentares, quando recebi o depósito, se os milícias e soldados africanos podiam comprar géneros e cujo valor era descontado nos prés, pagos directamente pelo comando da companhia; explique alguém, se é capaz, sendo esta comandada por um oficial do QP e dirigida por sargentos igualmente do QP, quem ficou a lucrar ?

Se os furras não tinham acesso a dinheiro como é que houve desfalque? Portanto, camarada Picado, não foste o único a levar com a experiência dos profissioinais das comissões.

Um abraço de amizade
Jorge/Portojo


2. Comentário de L.G.:

É, no mínimo, saudável e honroso que este tema (aqui levantado pelo José Manuel Dinis, pelo Jorge Picado e agora pelo Jorge Teixeira) seja exposto, analisado e debatido no nosso blogue... Não há (ou não devia haver, mas eu julgo que não há) tabus entre nós: já aqui discutimos tudo ou quase tudo, incluindo questões que ainda hoje nos dividem e são dolorosas...

A máquina de guerra - neste caso, da guerra do Ultramar - movimentou muito dinheiro e, como muitos de nós se aperceberam no terreno, no TO da Guiné, também alimentou a pequena e a grande corrupção... Independentemente do efeito (positivo e negativo) que teve na economia nacional, a guerra do Ultramar fosse também um bom negócio para alguns. Como em todas as guerras. A nível local, provincial, nacional e internacional.

Interessam-nos aqui não as especulações mas sim os depoimentos. A verdade é que, localmente, tínhamos uma visão muito limitada das coisas. Alguns de nós lidaram com dinheiro, material, compras, intendência, contabilidade, finanças, gestão de messes e refeitórios, obras (nos quartéis e nos reordenamentos)... Alguns de nós comandaram subunidades e fizeram comissões liquidatárias... Alguns de nós tinham especialidades na área da administração militar ou equivalente (vague-mestres, contabilistas, etc.). A maior parte de nós, os operacionais, não tínhamos jeito, tempo e sobretudo competências para lidar com dinheiro, material, compras, gestão de messes, etc.

Já não é altura para, passadas quase quatro décadas, fazer ajustes de contas - nesta como noutras matérias... Já não há contas a ajustar nem com os nossos superiores hierárquicos nem entre camaradas (... tal como não há contas a fazer contra os nossos inimigos de outrora). Eu, pessoalmente só tenho contas a ajustar comigo e com a minha memória.

Se falamos disto, é por que a guerra da bianda era também a nossa pequena guerra de todos os dias... Comíamos mal e porcamente na Guiné: a verdade é que, como defende o Jorge Teixeira, poderíamos ter comido um pouco melhor, se não fora também a ganância e a incompetência de alguns...

Mas atenção: é preciso respeitar o bom nome e não pôr em causa a honestidade e a reputação da generalidade dos nossos camaradas, que foram vague-mestres, sargentos de secretaria, alferes de contalidade, capitães milicianos, pessoal da intendência, etc. Daí para cima, podemos ter suspeitas mas não sabemos nem metade da missa...

No meu tempo, por exemplo, dizia-se à boca cheia que havia meninos a mamar com o reordenamento de Nhabijões [sector L1 da Zona Leste, Bambadinca, 1969/71], onde foram gastos milhares de rachas de cibe, milhares de chapas de zinco, toneladas de tijolos de adobe, feitos pela população local, milhares de horas de trabalho de voluntários à força, do exército, tugas que na vida civil eram trolhas, cabouqueiros, carpinteiros, marceneiros, picheleiros, condutores, etc. Não sei quem ganhou nem me interessa isso hoje. Mesmo assim quero acreditar que o exército tivesse os seus próprios mecanismos de fiscalização e de controlo.

De qualquer modo, o mote está dado. Escrevam sobre este tema, os que sabem e podem... Quanto a alguns termos do nosso calão de caserna (chicos, chicalhadas, furras, ripanços...), aqui usados: é bom lembrar que não têm propriamente um sentido pejorativo. E não se faz, no texto que se acaba de publicar, generalizações abusivas. Isto passou-se em Catió, no ano da graça de 1968. Ponto final parágrafo.

Parabéns ao Jorge, pela oportunidade e vivacidade do seu depoimento. Ele fala do que sabe e viu, por isso fala de cátedra. Embora fale do que se passava no downstairs, na cave... Ele nunca subiu ao upstairs, aos pisos de cima, pelo que nunca podia saber o que se passava em Bissau ou em Lisboa, nos gabinetes dos chefes de estado-maior ou nos conselhos de administração das empresas com interesses na Guiné...

Parabéns ao Vitor, por que ele foi, sem dúvida - até agora - o melhor fotógrafo da linda vila colonial de Catió, no sul, na região deTombali, e da gente que por lá passou, pela vila e pelo seu quartel... Gente do melhor, seguramente. Dos outros, poucos, que não souberam (ou não quiseram) ser nossos camaradas, não falamos aqui.
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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1652: Tertúlia: Três novos candidatos: José Pereira, Hélder Sousa e Jorge Teixeira

7 de Setembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3180: Tabanca Grande (84): Jorge Teixeira, ex-Fur Mil, Guiné, 1968/70

5 de Outubro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3270: O meu baptismo de fogo (3): Catió, 6 de Junho de 1968 (Jorge Teixeira)

Vd. ainda o poste de 20 de Novembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3489: Blogues da nossa blogosfera (4): Nasceu o bloguinho, o blogue da Tabanca de Matosinhos (Álvaro Basto)

(**) Vd. poste de 6 de Dezembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3576: Controvérsias (11): A ganância e o modo como se geriam as finanças nas Unidades (Jorge Picado)

(***) CCS do BART 2865,
Catió, 1969/70: vd. poste de 12 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3302: Tabanca Grande (91): António Varela, ex-Fur Mil Sapador da CCS/BART 2865, Catió, 1969/70

(****) Sobre Catió desta época, vd. ainda os seguintes postes:

19 de Janeiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2453: O que fazia um militar da ferrugem como eu ? (Victor Condeço, ex- Fur Mil Mec Armamento, CCS/BART 1913, Catió, 1967/69)

6 de Junho de 2007 >
Guiné 63/74 - P1819: De Catió a Lisboa, de menina a Mulher Grande ou uma história triste com final feliz (Gilda Pinho Brandão / Luís Graça)

3 de Dezembro de 2006 >
Guiné 63/74 - P1335: Um mecânico de armamento para a nossa companhia (Victor Condeço, CCS/BART 1913, Catió)

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3229: História resumida da Companhia de Terminal e do Batalhão de Intendência (José Martins)

1. Em mensagem do dia 16 de Setembro de 2008, o nosso camarada José Martins, ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5 - Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70, enviou-nos um resumo da História da Companhia de Terminal e do Batalhão de Intendência.

Nunca é demais agradecer a disponibilidade do José Martins sempre pronto para nos fornecer dados importantes sobre a história da guerra colonial na Guiné.



Guiné > Região de Tombali (Catió) > Cufar > Rio Cumbijã >1973 > Foto que documenta as brutais consequências do accionamento de uma mina, colocads pela guerrilha do PAIGC junto ao cais acostável de Cufar, onde havia um destacamento do PINT (Pelotão de Intendência) 9288 ... A mina, escondida no lodo, foi accionada por um barco, ao atracar ao cais. O barco, que levava carga da Intendência, pegou fogo e ficou destruído...


Companhia de Terminal

Identificação CTerm

Comandantes:


Cap SGE [1] Herman Mendes Schultz Guimarães
Cap SGE Luís dos Santos Figueiredo

Inicio: 01NOV72

Extinção: Finais de SET74

Síntese da Actividade Operacional

A subunidade foi criada a partir do Destacamento de Terminal existente no CTIG [2], a título experimental, desde 01ABR72.

Após aprovação do respectivo QO [3] por despacho ministerial de 07JUN72, ficou na dependência directa da Chefia do Serviço de Transportes da Guiné.

Desenvolveu a actividade inerente à sua especialidade, relativas às tarefas de estiva, transportes exteriores e internos por meios rodoviários, fluviais e aéreos, despacho e desalfandegamento de todos os materiais e bagagens transportados por via aérea ou marítima; para o efeito dispôs de secções de cargas no cais da Bolola e na BA 12 [4]

Em finais de SET74 foi extinta e desactivada.

Glossário

1. SGE - Serviço Geral do Exército.

2. CTIG - Comando Territorial Independente da Guiné

3. QO – Quadro Orgânico

4. BA – Base Aérea

Acidente ocorrido em 02 de Março de 1974, com o rebentamento de uma mina anticarro, por um batelão carregado de gasolina, ao acostar ao cais de Cufar.

Morreram, de imediato, os seguintes civis assalariados/estivadores em serviço na Companhia de Terminal – Cufar. A causa da morte foi considerada resultante de Ferimentos em Combate, e os seus corpos foram inumados no cemitério de Cufar:

AISSELÉ IÉ, número 579, filho de Aliam Cá e Oqueamione Ié, natural da freguesia de Biombo, concelho de Bissau;

AUGUSTO AJUPKIQUE, número 289, filho de José Ajuplique e Maria Sábado, natural da freguesia de Caio, concelho de Teixeira Pinto;

AUGUSTO FERNANDES, número 747, casado com Dabedi Sanha, filho de Fernando João e Enguesse Pauiça, natural da freguesia de Encheia concelho de Bissorã;

INDOM Á CÓ, número 56, filho de Indato Có e Odiquiu Ié, natural da freguesia de Biombo, concelho de Bissau;

JOSÉ DA SILVA IÉ, filho de Lefem Ié e Equidjoque Ié, natural da freguesia de Biombo, concelho de Bissau;

OCANTE DJÚ, número 418, filho de Acevelo Djú e Maria Djú, natural da freguesia de Bigene, concelho de Farim;

ODAILÓ IÉ, número 295, filho de Odor Ié e Anhola Dju, natural da freguesia de Biombo, concelho de Bissau;

Nesse mesmo dia, 02 de Março de 1974, depois do acidente acima descrito, rebentou uma mina antipessoal seguida de emboscada, que feriu o assalariado/estivador LONA INSALA, casado com Insuli Cabi, filho de Insala Ungué e Sidú Indami, natural da freguesia de Santa Ana, concelho de Mansoa, que veio a falecer a 07 de Março de 1974, no Hospital Central de Bissau, por ferimentos em combate, tendo sido inumado no Cemitério de Bissau.

Também ficaram feridos no rebentamento da mina anticarro:

CARLOS ALBERTO PITA DA SILVA, Furriel Miliciano de Intendência, com o número mecanográfico 12957372, do Pelotão de Intendência nº 9288, mobilizado no 2º Grupo de Companhias de Administração Militar, em Lisboa, solteiro, filho de Teodoro Boaventura Pita da Silva e Maria Isabel Ivens Ferraz Pita da Silva, natural da freguesia do Monte, concelho do Funchal – Madeira, tendo falecido em 17 de Março de 1974 no Hospital Militar de Bissau, vitima de ferimentos em combate, tendo sido inumado no Cemitério de Nossa Senhora das Angústias, no Talhão dos militares falecidos no ultramar.

RODRIGO OLIVEIRA SANTOS, Soldado - Caixeiro, com o número mecanográfico 18070469, do Pelotão de Intendência nº 9288, mobilizado no 2º Grupo de Companhias de Administração Militar, em Lisboa, solteiro, filho de Manuel Gomes dos Santos e Gracinda Alves de Oliveira, natural de Fafião, freguesia de Romariz, concelho da Feira, faleceu, vitima de ferimentos em combate, tendo sido inumado no Cemitério de Romariz.


BInt, cuja divisa era, Bene Servire Maxima Gloria Est

Batalhão de Intendência da Guiné

Identificação BInt

Comandantes:


Major SAM [1] Carlos Gonçalves
Major SAM António Monteiro
Major SAM Augusto Soares Pinheiro
Major SAM José Maria Teixeira
Major SAM António Monteiro Alves dos Santos
Major SAM António Avelino de Abreu Parente
Major SAM António Madeira Peste
Major SAM António Alberto Bravo Ferreira
Major SAM Emídio José Brandão dos Santos Marques

2.ºs Comandantes (a partir de 01AGO67)

Capitão SAM Manuel de Oliveira Rego
Capitão SAM José Luís de Sousa Jorge
Capitão SAM António José Calvo de Almeida Pereira
Capitão SAM Manuel António Duran dos Santos Clemente

Início: 01JUN64

Extinção: 14OUT74

Síntese da Actividade Operacional

O BInt foi criado com base em QO [2] aprovado por despacho ministerial de 21NOV63 e englobou uma Companhia de Intendência, uma Companhia de Depósito, então constituídas, e os quatro destacamentos de Intendência, então existentes em Bissau, Tite, Bula e Bafatá, este instalado depois em Bambadinca, a partir de 02JUN66, e, mais tarde, outro pelotão instalado em Farim, a partir de 01JAN67, sendo considerado uma unidade da guarnição normal.

Em 01ABR68, as funções de Companhia de Depósito passaram a ser executadas por um novo órgão, então criado, o Depósito Base de Intendência e a partir de 01SET68, o batalhão passou a ser constituído pelas subunidades designadas por Companhias de Intendência de A/D [3], Companhias de Intendência de A/G [4], e Pelotões de Intendência, tendo ainda sido instalado outro pelotão em Cufar, a partir de 01AGO73.

Nesta situação, forneceu apoio logístico às unidades e subunidades em serviço na Guiné, efectuou a reparação dos meios de frio, máquinas de escritório e de bobinagem, entre outros, para o que dispunha também de equipas itinerantes.

Ministrou também instrução de formação de especialidade de intendência de padeiros, magarefes, caixeiros e outras. Manteve ainda as reservas de combustíveis e lubrificantes e accionou o funcionamento dos centros de fabrico de pão e de abate.

Em 14OUT74, após entrega das instalações e equipamentos ao PAIGC [5], o batalhão foi desactivado e extinto.

1. SAM – Serviço de Administração Militar
2. QO – Quadro Orgânico
3. A/D – Apoio Directo
4. A/G – Apoio Geral
5. PAIGC – Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde

José Martins

Fotos: © Fernando Franco(2006). Direitos reservados.
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Nota de CV

Vd. poste de 12 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3196: Em busca de...(39): Companhia Terminal (Bissau, 1973/74) (Daniel Vieira)

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Guiné 63/74 - P3196: Em busca de...(39): Companhia Terminal (Bissau, 1973/74) (Daniel Vieira)

Guiné > Região de Tombali (Catió) > Cufar > Rio Cumbijã >1973 > Foto que documenta as brutais consequências do accionamento de uma mina, colocads pela guerrilha do PAIGC junto ao cais acostável de Cufar, onde havia um destacamento do PINT (Pelotão de Intendência) 9288 ... A mina, escondida no lodo, foi accionada por um barco, ao atracar ao cais. O barco, que levava carga da Intendência, pegou fogo e ficou destruído... Terão morrido quase duas dezenas de africanos. Este episódio também é descrito no libro do nosso camarada António Graça de Abreu, Guiário da Guiné: Sangue, Lama e Água Pura (2007). Na altura ele estava em Cufar, como Alf Mil, no CAOP1.

Às vezes esquecemo-nos destes valorosos camaradas da Intendência que também corriam riscos de vida nos seus destacamentos e nas viagens que faziam pelas rios e braços de mar da Guiné, ou acompanhando as colunas logísticas por terra... O 1º Cabo Enf António Baia, amigo do Fernando Franco, ambos membros da nossa Tabanca Grande, pertencia a este PINT e assistiu a esta tragédia (aliás, dupla, por que uma outra mina destruiu, no mesmo dia, um viatura militar e matou malta nossa).

O Fernando Franco, em Bissau, fez Guarda de Honra, até ao Hospital, ao cortejo fúnebre com os restos mortais dos dois soldados do PINT que morreram na explosão da mina anticarro.

Foto: © Fernando Franco (2006). Direitos reservados.


Telefonou-me o ex-Fur Mil Daniel Vieira, que fez parte da Companhia Terminal, sediada em Bissau, mais exactamente na antiga Fábrica da Cana de Açúcar, por detrás do Cemitério, em instalações que outrora terão pertencido à Casa Gouveia. Lembram-se ?

Eu nunca ouvira falar desta Companhia Terminal, cuja missão era fazer os reabastecimentos das unidades espalhadas pelo TO da Guiné, por ar, terra, rio e mar… Iam a todo lado, de Buba a Bambadinca...

Pois bem, pelo que o Daniel Vieira me contou ao telefone, e que eu aqui reproduzo, ele chegou à Guiné, em rendição individual, em Março de 1973 e foi um dos últimos militares a abandonar o território, em Outubro de 1974.

Pelo meio, aí por volta de 12 ou 13 de Março de 1974, foi ferido no Rio Geba, por ocasião de um ataque do PAIGC, no Geba Estreito, entre o Xime e Bambadinca, a um batelão carregado com 24 toneladas de munições. Morreu um cabo da Companhia Terminal, para além de 13 ou 14 africanos (civis ou militares, não faço ideia). Ele depois poderá contar mais pormenores: não sei se o batelão foi ao fundo, se houve explosões em cadeia, etc.


O Daniel Vieira (Fur Mil Vieira, como era conhecido) esteve três dias no HM241, em Bissau, e, depois da convalescença, terá sido colocado no aeroporto de Bissalanca.

Ele procurou-me por que nunca mais teve notícias dos seus camaradas da Companhia Terrminal. E anda à procura de pistas que o levem a reencontrar a malta dessa unidade, que não pertencia ao BIG – Batalhão de Intendência Geral (*) e que, estranhamente, não tinha número. Diz-me ele que era uma espécie de companhia ad hoc, formada nessa altura (1973), em Bissau, com malta de rendição individual…

Ele próprio era atirador de infantaria, tendo passado pelas Caldas da Rainha, Tavira e Castelo Branco (tal como eu...). Lembra-se que o comandante da Companhia Terminal era um capitão do quadro permanente, já entradote na idade, com os seus 50 e tal anos, natural da região de Viseu. Muitos anos depois do 25 de Abril, quando o tentou localizar, já tinha morrido.

Dos seus camaradas furriéis milicianos lembra-se do Barradas, que era alentejano, do Vilaça, que morava em Cascais, e do Mestre, que seria de Sacavém ou de Alhandra (já não pode precisar bem). Dos Alf Mil lembra-se do Tenrinho e do Morais. Do 1º cabo que morreu do Geba, tem o nome, em documentos que não tinha ali à mão.

Nunca mais encontrou esta malta, para grande desgosto seu… E gostaria ainda de ter essa alegria. Costuma ir aos almoços-convívios dos Antigos Combatentes da Guiné, que se realizam todos os anos a 5 de Outubro, e que são organizados pelo Isaías Peralta. A última edição, o 26º almoço-convívio, em 2007, foi em Viseu. E o próximo será em Pombal. Mas até à data ainda não conseguiu localizar ninguém da sua Companhia Terminal.

É por essa razão que se dirigiu ao nosso blogue. Foi a filha, psicóloga, que lhe falou em nós. E da possibilidade de, através da Internet, obter pistas sobre os seus antigos camaradas. O filho, por sua vez, que está a tirar um curso de informática, ajudou-o a fazer pesquisas no nosso blogue. E daí o contacto, telefónico, que estava a efectuar.

Ficou entusiasmado com o conteúdo do nosso blogue e a nossa vasta rede de contactos. Pediu-me se o ajudava. Naturalmente, respondi-lhe que sim: é essa a nossa missão (e vocação). Convidei-o a integrar a nossa Tabanca Grande. Aguardo o envio de algumas fotos digitalizadas, em formato jpg, que me vai enviar através do filho.

Entretanto, aqui vai o resto da sua história. Tendo sido ferido em serviço, em combate, no ataque acima referido, no Geba Estreito, acabou por lutar pelo seu direito à reintegração nas Forças Armadas. Há seis anos (se percebi bem…) foi reintegrado, no Exército, como 1º sargento. Passou os últimos quatros anos nos serviços de saúde militar, aqui em Lisboa, Campolide. É amigo do nosso camarada Manuel Rebocho, com que fez o curso para a Sargento-Mor. Está entretanto reformado como Sargento-Mor, DFA.

O Daniel Vieira, novo membro da nossa Tabanca Grande, vive em Porto de Mós, distrito de Leiria, e autorizou-me a divulgar os seus contactos: Telefone > 244 402 876 ; Telemóvel > 65 274 287.

Se alguém tiver alguma informação sobre a Companhia Terminal (Bissau, 1973/74), entre em contacto com o Daniel Vieira ou com os editores do blogue. Um por todos e todos por um, como no nosso tempo de Guiné.

Luís Graça, editor

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Nota de L.G.:

(*) Sobre o BIG, representado na nossa Tabamca Grande pelo Fernando Franco e pelo António Bais (cito de cor...), vd. os postes de:

20 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2462: Convívios (38): Minitertúlia da Intendência / Administração Militar, Belém, Lisboa, 18 de Janeiro de 2008 (Fernando Franco)

16 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1284: A Intendência também foi à guerra (Fernando Franco / António Baia)

16 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1283: Os nossos intendentes, os homens da bianda (Fernando Franco / António Baia)

20 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1195: Ameira: O nosso encontro fez-me bem à alma (Fernando Franco)

Guiné > Bissau > Batalhão de Intendência Geral (BIG) > 1974 > O Fernando Franco, 1º cabo Caixeiro. Esteve em Bissau entre 1973 e 1974 numa CIAG (Companhia de Intendência de Apoio Directo). É muito provável que conhecesse a Companhia Terminal e o nosso Daniel Vieira.

Também temos outro camarada, o Diamantino Figueira, que pertenceu ao BIG, Bissau, 1971/73. Telefone de contacto: 214752070 (restaurante, na região de Cascais).

Foto: © Fernando Franco (2006)

Vd. último poste da série de 7 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3182: Em busca de... (38): Causas da morte do Alf Mil Manuel Sobreiro (Mampatá, 1968) Parte II (José Martins)