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quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Guiné 63/74 - P5003: Controvérsias (36): A Justiça Militar e os presuntos implicados (João Seabra)

1. Uma peça (de antologia, de finíssimo humor...) que eu acabo de receber do ilustre jurista João Seabra, ex-Alf Mil da CCAV 8350, Piratas de Guileje (Guileje, 1972/74), e querido (como todos os demais) membro da nossa Tabanca Grande:

Caro Luís,

Recebi, há dias, um mail teu em que vinha anexo o actual RDM (*).

Andando para trás no blogue, encontrei uma sugestão tua para que eu e o Jorge Cabral, entre outros, nos pronunciássemos sobre as hipotéticas consequências criminais do constante numa narrativa do Amílcar Ventura (**).

Antes de mais, deixa-me dizer-te que tenho o Amílcar na conta de boa pessoa. Aliás, já foi muito simpático comigo, a propósito de uma correspondência tumultuária que manteve, há tempos, com um terceiro e que desencadeou, por iniciativa deste último, numa grande agitação em cavalariças e canis.

Todavia, aqui para nós, parece-me (podendo estar enganado) que a história dele é uma fantasia que terá descambado em convicção. Aliás não é a primeira, nem será a última, que aparece no blogue.

O menos que se poderá dizer é que o frete foi muito pouco produtivo. Porque não levou ele mais dois ou três bidons de gasóleo? Era para uma emergência?

De qualquer modo, o RDM dispõe sobre ilícitos disciplinares, e a matéria de que se trata é de natureza criminal e está contemplada no Código de Justiça Militar (CJM). Que eu saiba, ao CJM em vigor em 73-74 seguiu-se outro de 77, outro de 2003, e ainda outro mais recente.

Acontece que as minhas áreas de actuação profissional são as do direito fiscal e do direito das sociedades. Neste momento, por exemplo, estou muito atrapalhado porque tenho de opinar urgentemente sobre a vexatória questão da hipotética neutralidade fiscal da fusão inversa. Se calhar vou-lhe chamar reverse merger porque, como diria o Serafim Saudade, “o verdadeiro artista é o que fala estrangeiro”.

Do CJM ocorre-me – “entre as brumas da memória” – a curiosa figura do “presumido delinquente”, e pouco mais. E mesmo assim, porque – por vezes e com grande gáudio – ouço colegas espanhóis aludirem aos “presuntos implicados”.

Para tratar adequadamente a vertiginosa questão da sucessão de leis penais, e da qualificação da hipótese em causa, a pessoa indicada é, realmente, o Jorge Cabral. Mas seria um desperdício, porque o iria distrair das valiosas opiniões periciais que nos vai dando sobre matérias menos áridas.

No fundo seria preferível encerrar o assunto, como o fez, há muitos anos, um magistrado do Ministério Público, quando soube que tinha sido bem sucedido num concurso para a carreira diplomática.

Os impulsos processuais do Ministério Público, designam-se, no nosso jargão, por “promoções”.

Vai daí o nosso futuro diplomata, no primeiro processo que lhe chegou às mãos, exarou o seguinte:

Tendo decorrido o prazo,
e operado a prescrição
vão os autos para arquivo
- eis a minha promoção.


Aplicando o que antecede a mim próprio, diria que muito me preocupa a eventualidade de, involuntariamente, concorrer para envenenar o ambiente de um blogue fundado por um grupo de amigos e que vive, sobretudo, da inexcedível dedicação dos seus editores.

Assim sendo, vou fazer o possível para, de futuro, escrever apenas para arquivo ou para “presuntos interessados”. Se e quando tiver tempo, já se vê.

Abraço amigo do
João Seabra

P.S.: Uma observação (ou “nota”, como se diz agora) final. Fiz serviço militar na Guiné na condição de “compelido”. Mas, uma vez lá, a situação, para mim, era muito simples: de um lado estavam as nossas forças (às quais eu pertencia) e do outro o inimigo. Tudo o mais são subtilezas que estão fora do meu alcance.

[ Revisão / fixação de texto / bold, a cor: L.G.]

___________

Notas de L.G.:

(*) Dirigido ao Jorge Cabral e com conhecimento a outros juristas da nossa Tabanca Grande:

"Jorge: Aqui tens o novo RDM... Não sei se tens tempo e pachorra para o analisar, do ponto de vista daquilo que pode interessar ao nosso blogue e à nossa Tabanca Grande".

(**) Vd. poste de 24 de Setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5002: O segredo de... (7): Amílcar Ventura: Ajudei o PAIGC por razões políticas e humanitárias

sábado, 18 de julho de 2009

Guiné 63/74 - P4705: Meu pai, meu velho, meu camarada (9): Testemunho do Coronel Pára Sílvio Araújo sobre o Cap-Pára João Costa Cordeiro (João Seabra)


1. Mensagem de João Seabra, ex-Alf Mil da CCAV 8350, Piratas de Guileje (Guileje, 1972/74), com data de 17 de Julho de 2009:

Caro Luís,

Se ainda vier a propósito, podes publicar o testemunho do Coronel Pára Sílvio Araújo e Sá (já falecido) e Comandante do BCP 12, sobre o Capitão João Cordeiro (RELOPS nº 16/73 "Dinossauro Preto", de que há pouco tempo obtive cópia no AHMS).






Tenho estado sem "ir ao blogue", porque tenho o trabalho atrasadíssimo e gostava de ter 10 dias de férias, a partir de 28 de Julho.


Se tiver tempo, ainda porei à tua consideração (e de mais uns quantos) uns esclarecimentos, acompanhados de pedido de conselho.


Abraço,
João Seabra

Imagem: © João Seabra (2009). Direitos reservados

_____________
Notas de M.R.:

(*) Vd. último poste da série em:

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4436: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: tradução de Miguel Pessoa (4): Alguns comentários

1. Mensagem de Miguel Pessoa (*), para Luís Graça, com data de 29 de Maio de 2009:

Assunto: Comentários ao texto do Matt Hurley

Luís

Da experiência que já tenho dos timings da publicação dos Postes no blogue, não me parece que o texto do Matt Hurley venha provocar grandes comentários por parte dos bloguistas. Mas lembro que durante a preparação da tradução solicitaste pareceres a diversos tabanqueiros. Pelo menos tenho conhecimento destes que incluí mais abaixo. Devidamente adaptados, talvez queiras introduzi-los como comentários ao Poste ou incluí-los na série "Comentários que merecem ser Postes" (desculpa lá se não é esse o termo, mas estou a escrever de cor...). Isto é uma simples sugestão.

Abraço
Miguel


2. Assim, seguindo a sujestão do nosso camarada Miguel Pessoa e a indicação do Editor do Blogue...

Comentários ao texto do Matt Hurley:
De João Seabra

Luís
Cá recebi o sumário do trabalho do Matt Hurley. Não tenho grande coisa a acrescentar em relação ao que te escrevi ontem. Tal como o autor, também não vejo que lições se possam tirar de experiências passadas que tenham alguma utilidade para uma doutrina da contra-insurreição actual.

Acho mesmo que as cidades constituem hoje o derradeiro maquis. Já não há, praticamente, terrenos difíceis onde as técnicas modernas não sejam mais do que suficientes para pôr fora de combate potenciais insurgentes. Os helicópteros actuais, os dispositivos de observação nocturna, a observação espacial, o empastelamento electrónico das transmissões adversas, a extraordinária precisão das armas e munições actuais, etc., tornam irrisórios os tradicionais santuários geográficos (montanhas, pântanos, florestas, etc.).

Restam as cidades, onde os guerrilheiros se podem movimentar com facilidade desde que, evidentemente, as forças armadas modernas se abstenham de as arrasar (como os Russos fizeram em Grozny).

Isto vale especialmente para o Iraque, onde 90% da população é urbanizada.

Sobre a tradução do Miguel, diria que escolheste a pessoa indicada. Prefiro (mera opinião) o termo situação para traduzir status, em vez de estado da arte sobre o tema, expressão que, parece-me, talvez mal, poderia induzir em confusão entre o estado da literatura sobre a arte e o estado da arte propriamente dita.

Só há uma expressão que me parece relativamente obscura (mais por culpa do autor do que do tradutor): a que se refere à não linearidade na guerra. (uma vez que) as operações efectuadas a uma escala relativamente pequena e os seus efeitos imediatos tinham desproporcionado profundamente o impacto….

A linearidade de uma função exprime efectivamente uma relação de proporcionalidade (directa). A não linearidade sugere uma desproporção. Entre o quê? meios e resultados? meios e efeitos? meios e impacto? efeitos impacto? O que é o impacto?

Enfim, o problema pode não ser do autor (e muito menos do tradutor), mas deste específico leitor, que é particularmente obtuso.

Acho o texto interessante e gostaria de o ver publicado no blogue. Quanto mais não seja porque enuncia explícitamente uma tese que merece estudo, e com a qual, possivelmente, haverá quem esteja em desacordo.

Mas eu sou dos que pensam que a controvérsia (racional) é mais profícua do que o chamado consenso.

Abraço
João Seabra


De Manuel Augusto Reis

Caríssimo Luís
Aqui vai, tarde e a más horas, a minha modesta opinião sobre o trabalho de doutoramento de Mr. Mattew H. Hurley.

Sobre o estudo de caso considero-o muito bem conduzido e o resultado das investigações vêm de encontro ao que nós, no terreno, vivíamos e sentíamos. Sem a eficácia de actuação da Força Aérea, na Guiné, ficávamos deveras fragilizados.
Mr Matew H. Harley fala na nossa superdepência das NT, no terreno, da eficaz actuação da FAP. Não só no aspecto operacional, mas também no aspecto logístico (alimentação, correio, evacuação de feridos ou doentes, etc...). Esta era, de facto, a realidade.

A sua ligação ao 25 de Abril é feliz, pois com a crescente evolução tecnológica (mísseis terra-ar) e a intensificação da sua utilização por parte do PAIGC, a actuação da FAP ficava bastante limitada (o que foi notório a partir de Maio de 73) e o recolher a Bissau tornava-se inevitável. Havia que fazer algo. Um desaste de grandes dimensões transformar-se-ia num vexame para nós aos olhos do mundo.
Isto apressou o 25 de Abril (estava previsto para Julho, dizia-se nos bastidores revolucionários).

Um abraço amigo
Manuel Reis


De Hélder V. Sousa

Caro Luís Graça
Quase conseguindo cumprir o prometido, aqui vão alguns, poucos, comentários ao trabalho do Matthew Hurley.

Como disse antes, não devo ter reparado ou entendido que o enviado anteriormente seria para comentar e disso me penitencio.

Ontem, como te disse, fui a Vila Franca de Xira para participar na divulgação pública do "Manifesto da Memória" das gentes da Secção Cultural da União Desportiva Vilafranquense, que foi muito interessante. Disso poderei falar mais tarde, se achares que possa ter algum interesse. Entre a malta do meu tempo (geracional e de actividades), encontrei uma amiga minha, chamada Ana Diogo (aliás, a médica Ana Diogo), que me disse que através dum texto que lhe enviei, publicado no nosso Blogue, ela te reconheceu e disse que tinha sido tua aluna numa formação qualquer e que até se conheciam e se davam bem.

Então, agora em relação ao artigo, começo por dizer que não tenho muita coisa a dizer.

No ponto 5. Esboço dos Capítulos, está indicado o conteúdo que ele pretende desenvolver. Parece-me que a sequência indicada é a óbvia, aquela que resultará duma abordagem com a distanciação necessária para obter o que pretende, estudar em simultâneo a acção da FAP e a acção do PAIGC para contrariar ou tentar contrariar a acção da FAP, e vice-versa.

Parece-me que ele irá pelo caminho que tentará mostrar que entre esses dois parâmetros de observação há muito de inter-relação, muito de causa-efeito. Assim, numa primeira fase a FAP, mesmo com meios limitados (relativamente poucos aparelhos e pouco modernos) será senhora incontestada dos céus da Guiné e isso será de uma importância não só inquestionada como irá obrigar o PAIGC a desenvolver actividades de defesa aérea. Com o desenrolar os tempos foi possível ao PAIGC introduzir equipamentos mais modernos e eficazes, obrigando a FAP a reajustar a sua estratégia, o seu modo de operação.

Sabe-se, sentiu-se e o autor faz eco disso, socorrendo-se inclusivamente do nosso Blogue (e também dos relatos datados do livro do A. Graça de Abreu), que a sombra protectora da FAP foi sempre um factor de grande importância para as operações no terreno, fossem elas de apoio às acções propriamente ditas, em acções de evacuações, de cobertura, até de simples meio de ligação com a rectaguarda, de que a distribuição de correio não era a menos importante. A perturbação do modus operandus da FAP, motivada pela adaptação da estratégia a aplicar para contrariar a tal entrada en cena dos "Strella", coincidindo com um cada vez maior efeito diluidor que progressivamente ia desgastando as NT foi também certamente uma contribuição decisiva para ajudar a criar o ambiente que culminou no 25 de Abril.

Do estudo sistemático comparado das acções de uns e outros o Autor tentará extrair as suas conclusões no sentido de retirar daí as lições que considerará relevantes para os actuais desafiosde insurreições com que se defrontam hoje os Estados Unido e os seus aliados, já que é sua firme convicção que esse estudo contém em si o que de mais paradigmático se poderá obter nesse sentido.

Como conclusão acho que é muito interessante que alguém, com a importância que tem o Autor, considere a nossa guerra, em particular a da Guiné, como uma fonte de ensinamentos e que muito poderão ajudar nos actuais desafios. Bem, talvez não seja de espantar assim tanto, afinal não é isso que temos andado a provar este tempo todo? Que a Guiné foi especial? Que essencialmente se deve a isso (não só mas também) o êxito do nosso Blogue?

Depois é reconfortante (e dá uma merecida pontinha de orgulho) saber que o Autor se socorreu do conteúdo do Blogue para defender alguns pontos de vista e que para além de textos e depoimentos lá contidos também o utilizou como veículo de contacto com elementos relevantes, como o caso do Miguel Pessoa. E que também se socorreu do livro do António Abreu.

Quanto aos pormenores de datas e outras questões técnicas, que eventualmente possam conter falhas, erros ou imprecisões (que não se quer que existam, até para não serem factores comprometedores) não me posso pronunciar por desconhecimento de causa.

Bem Luís, não sei bem se era este tipo de comentário que tinhas em mente, mas foi o que consegui fazer.

Um abraço
Hélder S.


De Alberto Branquinho

COMENTÁRIOS

1 - Pág. 9 do texto em inglês - linha 12:
«...I suspect it involves a complex interplay bettween national policy, military will, tactical considerations, weapons technology, superpower rivalry and insurgent motivation

Digo eu: - It's all right, sir !

Já ouvi falar de tudo isso em qualquer parte... mas poderia explanar (se é que está ciente disso) um pouco mais sobre o que é que entende por national policy?

Era só a política de São Bento e arredores ou algo mais? E sobre o estado da Nação?

É preciso ter em atenção a TENTAÇÃO (norte-) americana average de querer simplificar tudo o que não é States. E, além disso, de ver o mundo à sua imagem e semelhança.

E segue:

By unreaveling some of that complexity, I intend to demonstrate the link between the employment of a shoulder-fired air missile and the collapse of an empire!! (o sublinhado e a exclamação são meus).

Ao menos poderia ter dito que o SIMPLES shouder-fired air missile poderá ter sido um possível CATALIZADOR e não a CAUSA que produziu esse EFEITO. But Portugal is so small, gentlemen... don't you agree?

2 - Gostava muito saber o que pensa de todo este escrito do Matt Hurley o nosso camarada António Graça de Abreu, que entende que os Strela não afectaram a supremacia aérea Portuguesa, pois que comia em Cufar os repolhos (transportados pela FAP) que tinham chegado nesse mesmo dia a Bissau por via aérea.

3 - Mais haveria a dizer, mas o que vai em 1. acima é a parte fundamental.

Alberto Branquinho
__________

Notas de CV:

(*) Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, Guiné (1972/74), actualmente Cor Pilav Reformado

Vd. último poste da série de 27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4430: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (3): Parte III (Bibliografia)

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4271: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (10): Respondendo ao João Seabra (António Martins de Matos)

1. Mensagem, com data de 19 de Fevereiro último , de António Martins de Matos (que foi Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, e que é hoje Ten Gen Res):


Amigo Luis: Tinha prometido não voltar ao tema Guileje.Atendendo que este é mais Gadamael e que o João Seabra merece uma resposta, junto te envio um comentário ao seu texto.

Um abraço
António Martins de Mato.


2. Dossiê Guileje / Gadamael (10) > Resposta ao João Seabra

Caro amigo:

Os meu respeito e admiração por tudo o que passaste em Guileje e Gadamael. Gostei dos teus comentários, quando me bates, és construtivo. Só isso me faz voltar ao tema que considerava terminado.

Sobre a data da ida a Kandiafara, estou 98% seguro de ter sido em 18 Junho de 1973.

Durante o dia fomos lá por três vezes, no total entregámos 36 bombinhas (12 de cada vez), das que o José Casimiro Carvalho, também ele “Pirata do Guileje” diz que “até abanam os tomates”.

Da primeira vez receberam-nos com Strelas, antiaérea de 37 mm e quádruplas de 12,7 mm. Da segunda vez, com as antiaéreas de 37mm e 12,7 mm. À terceira já não disseram nada.

Resultados, só os do PAIGC nos poderão informar.

Cabe aqui um parêntesis para registar o modo interessante como os nossos amigos da Guiné Bissau vêm a guerra, e como nós vamos aceitando este estado de coisas.

Só ... grandes operações ....,grandes vitórias, ... grandes destruições.

Em relação à FAP, abateram 400.000000000 aeronaves!!!

Alguém já viu, leu algo sobre os seus desaires?

Nesta história Guileje/Gadamael, tiveram alguma baixa? Ou foi só malhar nos tugas?

Simpósio cá, lá, acolá, não querem, não podem, não sabem?

Na mesma onda está o documentário da Diana Andringa, As duas faces da Guerra. Com todo o respeito por “gregos e troianos”, só vi uma das faces da guerra, a outra foi pura e inexplicavelmente esquecida.

A haver um prémio para reportagens tendenciosas, ... está no papo.

Voltando ao tema... Quanto ao pedido de apoio do Cap Folques - “ Ó Tigres, não se vão embora que estes gajos querem-me deixar aqui sozinho” - , ele não comandava Pára-quedistas mas sim Comandos Africanos.

Também eu penso que o BCP 12 e os seus homens deveriam ter sido homenageados pelo que fizeram na Guiné, em especial durante o Maio/Junho 73.

Finalmente e em relação a um tema que é amiúde relatado, a falta de regulação do tiro do obus 14 cm, onde o ónus da ineficácia é sempre atribuído à FAP e que, como dizes, terá feito com que os projécteis tenham sido distribuídos “in the middle of nowhere”, cá vai mais uma acha para a fogueira:

A pergunta é: Porque razão os obuses de 14 cm não estavam reguladas?

O que diz o livro do CL [Coutinho e Lima], página 44 - “em virtude das restrições do emprego dos meios aéreos, não tinha sido possível fazer a regulação do tiro do material de 14 cm”. ~E na página 78 volta a afirmar que “os obuses não foram regulados por falta de meios aéreos”.

Terá sido mesmo assim? Analisemos a situação.

Os obuses eram três, só dois foram para o Guileje, isto em 16 de Maio, (cinco dias antes da retirada), um deles estava inoperativo, ou seja, APENAS UM OBUS PODIA SER REGULADO.

Ainda assim, a regulação poderia ter sido feita, pois que as restrições da FAP resumiam-se a aterrar e descolar de Guileje, os aviões podiam voar a 6000 pés, altitude mais que ideal para o regular o tiro da artilharia.

Pergunta que deixo no ar:

“ALGUEM PEDIU A REGULAÇÃO DO TIRO DE ARTILHARIA PARA O ÚNICO OBUS OPERATIVO DE GUILEJE?”

Um abraço

António Martins de Matos


PS - Acabo estes temas sem estar seguro como se escreve a palavra, Guileje com J ou Guilege com G. (**)

__________

Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 23 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4239: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (9): Eu, a FAP, o BCP 12 e a emboscada de 18 de Maio (João Seabra)

(**) Vd. poste de 29 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2800: Em bom português nos entendemos (1): Guidaje e não Guidage (Luís Graça / Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa)

Vd. texto relacionado > Guileje (e não "Guiledje")

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Guiné 63/74 - P4239: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (9): Eu, a FAP, o BCP 12 e a emboscada de 18 de Maio (João Seabra)

1. Mensagem de João Seabra, ex-Alf Mil da CCAV 8350, Piratas de Guileje (Guileje, 1972/73), com data de 18 de Fevereiro de 2009:

Caro Luís,

Pedindo desculpa por o fazer tão tardiamente, volto à vexata quaestio de Guileje/Gadamael.

Já tinha dado a entender que a minha colaboração não seria muito fluente, por razões que expliquei: os nossos amigos do QP (Coutinho e Lima, Miguel Pessoa, Martins de Matos, Nuno Rubim) estão na reserva – e eu não sei o que me estará ainda reservado.

Nunca gostei da expressão "cerco de Guileje" (se bem que, em certo sentido, possa ser apropriada) e – em texto de 2005 publicado no P63/74 de 27/1 – exprimo-me assim "Guileje foi isolado mediante a interdição dos seus acessos rodoviários a Gadamael e à água potável …". E, acima, refiro que Guileje era um destacamento "dependente, para o seu aprovisionamento de complicadas colunas rodoviárias múltiplas, de e para Gadamael, com uma pontualidade que poderia servir de exemplo à CP…".

Convém que estas afirmações sejam melhor explicitadas – nomeadamente no que se refere às colunas Guileje/Gadamael/Guileje aproveitando, para expressar uma sincera homenagem a duas unidades da FAP que muito admiro: a BA 12 (especialmente aos pilotos de Fiat G-91) e o BCP 12 e para fazer alguns comentários à última mensagem de António Matos Martins (*).

Numa próxima oportunidade enviarei uma mensagem, a qual – para alívio geral – será, espero, a última sobre este tema.

Em anexo, vai então um ficheiro, cujo interesse para publicação – de uma vez só ou fraccionadamente – deixo ao teu critério: é o Pastelão II, o qual, como é da praxe, é maior e mais temível do que o primeiro.

Abraço
João Seabra


Força Aérea, o BCP12 e a Coluna Guileje/Gadamael/Guileje (*)


A. Eu e a Força Aérea na Guiné


Refere António Martins de Matos, numa das suas mensagens, que a FAP na Guiné é (foi) muitas vezes esquecida e injustiçada.

Mas não por mim, certamente.

Sempre tive o maior respeito por este Ramo, por todas as suas acções de apoio, de projecção de forças helitransportadas, etc., desempenhadas, muitas vezes, em situações-limite, e com meios insuficientes.

Mas ao respeito acresce uma genuína e profunda admiração – que não é de agora – quando se trata de voo de combate.

E à admiração junta-se alguma inveja da minha parte, quando leio os textos do Miguel Pessoa e do Sr. Tenente-Coronel J. Pinto Ferreira: que capacidade para transmitir, clara e concisamente, tanta informação relevante, pontuando aspectos técnicos e acontecimentos trágicos com notas do mais fino humor!

Tal admiração que já vinha do antecedente, torna-se agora superlativa, ao tomar conhecimento cabal do esforço e da perícia exigidas aos 6 (seis!) técnicos pilotos de Fiat G-91 existentes na Guiné nos meses de Abril, Maio e Junho de 1973.

O que fica dito é evidentemente extensivo ao António Martins de Matos, apesar das nossas divergências em relação às concretas questões de que agora se trata.

E é justamente ao António Martins de Matos que eu peço para – em relação ao seu propósito de não escrever mais sobre este tema – abrir a seguinte excepção:
- Escreve-se no P3737 de 14/1/2009 (1) que "o ataque a Gadamael foi sustido depois de se ter bombardeado Kandiafara",

- Interessa-me (e interessará a muita gente) saber em que dia (ou dias) se verificou tal bombardeamento, quais os meios e armas utilizados, e, supondo que o respectivo resultado não foi fotografado ou filmado, quais as notícias que há a tal respeito, de que fontes, se foram observadas explosões secundárias, por quem e em que circunstâncias.

Se o António Martins de Matos não quiser (ou não puder) satisfazer a nossa curiosidade, servindo-se da sua Caderneta de Serviço Aéreo, ou de outros elementos, apelo para o Miguel Pessoa nos mesmos termos e para os mesmos efeitos.

B. Factos, argumentos, especulações, opiniões, interpretações e juízos de valor

Ao ler o P3872 (2) de António Martins de Matos (AMM), lembrei-me do último de uma série de e-mails que enviei, no ano passado, ao Nuno Rubim, que estava de partida para o Simpósio sobre o Guileje, prestando-lhe uma série de informações que ele me pediu, e lá encontrei o seguinte trecho:

"Não dê como bom tudo o que lhe conto, sem exame crítico e confronto com outras fontes".

Neste aspecto o trabalho do historiador tem certas semelhanças com o tratamento de informações militares.

No meu caso especial – além de eventuais falhas de memória e lapsos de percepção – há dois factores que podem afectar o meu discernimento:

- a minha lealdade ao Coronel Coutinho e Lima;
- a minha admiração sem limites pelo BCP 12.

Aliás, do lado do PAIGC também avultam certas, por assim dizer, liberdades poéticas, como, por exemplo, a do assalto a Guileje.

Vendo recentemente o filme “As Duas Faces da Guerra”, ouvi o Sr. Presidente da República de Cabo Verde dizer que uma coluna de Guileje para Gadamael tinha sido esmagada.

Portanto, este vosso amigo, a bem dizer, deveria ter contemplado todas estas peripécias – não do alto, como AMM – mas junto do Altíssimo.

Além disso, há também aqui uma motivação pessoal muito importante: se, na altura própria não discordei da decisão do Coronel Coutinho e Lima, seria asqueroso que agora o fizesse.

Não há, no que antecede, qualquer honestidade especial ou probidade intelectual a louvar. Aliás, na minha primeira intervenção, e antes de a tal ter sido perguntado, “aos costumes disse logo que me considero amigo do Coronel Coutinho e Lima”.

Dito isto, entendo que se se procura o registo do que efectivamente aconteceu – prescindindo do testemunho dos que estiveram em Guileje (de um lado e do outro) em Maio de 73 – o melhor é desistir já.

Os depoimentos de quem tem interesses especiais nas questões a resolver, não podem, nem devem, ser postos de parte. Devem, isso sim, ser ponderados com especiais cautelas, em função da sua consistência interna, e do confronto com outros elementos de prova.

Dirá AMM que não foi isso que disse. Mas é isso que vai pressuposto ou sugerido quando afirma que “devem ser os que não estiveram em Guileje que podem fazer uma análise crítica dos acontecimentos, pela simples razão que poderão fazer esse estudo com a cabeça e não como coração”.

Vai aqui implícito – mas não demonstrado – que quem não esteve em Guileje, por esse simples facto, está isento de “paixões demagógicas e de ideias pré-concebidas” (não gosto da expressão, mas é certo que está consagrada).

E, à cautela, ainda considera, dentro da vasta classe dos que “não estiveram em Guileje”, uma categoria residual: a dos que não pensam, porque se pensassem, pensariam como ele (AMM).

Sucede que é virtualmente impossível que alguém tenha estado na Guiné em 1973 não tenha qualquer ideia pré-concebida sobre os acontecimentos de Guileje.

Mais que não seja, porque a retirada, não autorizada pelo Comandante-Chefe, de uma guarnição de um destacamento, cria logo uma fortíssima aparência desfavorável, propícia a toda a espécie de pré-conceitos, pré-juízos, ou mesmo juízos sumários (que são naturais e não têm nada de censurável).

Veja-se, a este propósito, o Post 3881 de 12 Fevereiro (3), pelo Vasco da Gama, que afirma com toda a franqueza, que teve receio pela vinda da CCAV 8350 para o Cumbijã, achando melhor falar previamente com os seus homens a tal respeito.

Se se tratasse de submeter, agora, o sucedido em Guileje a qualquer tipo de julgamento – nem que fosse o célebre julgamento da história - aceitaria de bom grado a minha exclusão do júri, em nome da necessária distinção entre parte e julgador (mas teria sempre o direito de ser ouvido).

Mas como, segundo AMM, “não se trata de encontrar culpados ou inocentes”, não me considero desqualificado para o debate.

Dito isto, reconheço as minhas limitações, e não só aceito como agradeço a quem me quiser corrigir.

Afinal, corrigir os ignorantes é uma das obras de misericórdia espirituais (suponho até que vem logo a seguir a consolar os aflitos).

Àcerca da célebre distinção entre facto e opinião, diria que é muito mais árdua do que parece.

Aliás, diria mesmo que, em se tratando de condutas humanas – mesmo as mais triviais (bola na mão ou mão na bola, quem é que promoveu o contacto, etc.) – há sempre um vasto campo para a opinião.

Ensina-me até a minha experiência profissional, que é muito raro que duas, ou mais, pessoas que presenciaram o mesmo acontecimento o descrevam da mesma maneira (e, se o fizerem, é melhor desconfiar).

Ademais os factos são estabelecidos mediante provas, e no exame crítico das provas avultam sempre juízos de valor (portanto matéria de opinião), mais que não seja sobre o respectivo valor de convicção ou valor probatório.

Aliás, basta ligar a televisão para perceber que é muito frequente que as pessoas que mais estridentemente protestam, reportar-se só a factos, (por oposição a opiniões) terem a irresistível tendência para enunciarem, principalmente, conclusões destituídas de premissas ou fórmulas passe partout.

Finalmente, gostaria de acentuar o óbvio: os factos precisam de ser interpretados, só assim se apura o seu sentido e alcance ou, se quiserem, o seu significado.

Já em matéria de alcance de armas, pode-se aplicar a velha máxima, segundo a qual o material tem sempre razão (salvo avaria ou deterioração das munições).

No livro a Retirada do Guileje, há várias alusões a um canhão 85mm, a armas novas, a projécteis muito rápidos, a situações em que o lapso de tempo entre a saída e o impacto é de 3 ou 4 a 5 segundos, ou mesmo em que há o impacto primeiro e só depois se ouve a saída.

Confortavelmente instalado, e 36 anos depois, resolvi fazer uma busca apressada pelo WordWide Equipement, e lá encontrei as seguintes armas de artilharia de campanha:

a. O canhão (ou peça) soviético de 85 mm D44 (fotografia em anexo)

- Alcance em tiro indirecto: 15,65 Km
- Velocidade do projéctil à saída do cano: 1030 m/s
- Peso da granada: 10 Kg.
- Não é um canhão sem recuo. Tem um recuperador hidráulico.
- Foi produzido entre 1945 e 1953.

b. A peça de 130 mm M-46 modelo 1954, soviética (fotografia em anexo)

- Alcance em tiro indirecto c/projéctil Frag-HE OF-44: 22,5 Km
- Velocidade do projéctil à saída do cano: 930 m/s
- Peso da munição completa: 33 Kg

É hoje minha convicção que estas armas terão sido intensivamente utilizadas contra a nossa posição de Guileje, uma delas (a peça 85 mm) muito mais frequentemente do que a outra, e muito plausivelmente faziam fogo a partir da Guiné-Conacri. Suponho até que uma parte muito substancial do fogo IN teria essa origem.

A distância de Guileje ao ponto mais próximo da fronteira é de 7,5 Km; de Guileje a Kandiafara, em linha recta, é de 17,4 Km; e de Kandiafara a Gadamael, também em linha recta, 21,8 Km (Google Earth).

Mas lá está: é preciso mudar de armas.

Quer isto dizer que eu concordo com a tese de AMM? Não concordo.

Por um lado não atribuo o relevo que ele dá à questão de saber se o fogo de artilharia do IN vinha de dentro do nosso território ou da fronteira. Pelo contrário: acho que é uma questão relativamente secundária – por motivos que explicarei numa próxima oportunidade.

Por outro lado, entendo que houve fogo de outras armas:

- morteiro pesado 120 mm, se bem que utilizado de noite e em muito menor grau do que se verificou em Gadamael;

- canhão sem recuo B10 de 82 mm, arma muito portátil (no fundo tem certas semelhanças, de princípios de funcionamento, com alguns LGF, mas mais pesado e com maior alcance);

- morteiro 82 mm, o qual fazia parte da dotação dos bigrupos do IN.

Todas estas armas faziam, obrigatoriamente, fogo do lado de cá da fronteira.
As peças de artilharia de campanha são mais difíceis de regular do que os morteiros. As acima referidas estavam perfeitamente reguladas para Guileje: ao contrário do que sucedia em flagelações anteriores, a percentagem de impactos dentro do perímetro do aquartelamento excedia os 90%, melhorando de dia para dia.

Já em Gadamael o IN nunca conseguiu regular capazmente o tiro destas peças: ao fim de 24 horas de experiência, já sabia que os projécteis supersónicos caíam, na sua maior parte, na margem oposta do braço do rio Cacine que por lá passava, ou, quando muito, junto ao arame, pelo lado poente.

Já o morteiro pesado 120mm aí (em Gadamael) foi utilizado com grande intensidade e precisão, seguindo todas as movimentações mais significativas de pessoal dentro do quartel.

Não me pareceu que o GRAD 122 mm (Katiusha) tenha sido utilizado contra Guileje.

Foi-o todavia em Gadamael com uma certa precisão. Como é que sei? Vi restos dos respectivos projécteis, designadamente numa enorme cratera na parte inferior da pista.

Evidentemente que valem sempre – para o que antecede como para o que se segue – as prevenções anteriormente feitas para os meus eventuais lapsos de memória e erros de percepção.

Quem assim o entender, poderá conjecturar que a operação sobre Guileje foi cuidadosamente planeada, e que Gadamael terá sido um, por assim dizer, alvo de oportunidade, para o qual se aproveitou um poderoso dispositivo já reunido.

Também se poderá fazer suposições sobre o que ainda sobrava para Guileje, senão ocorresse a retirada: entre 31 de Maio e 2 de Junho houve tantos impactos dentro de Gadamael, como em Guileje durante quatro dias.

Em Gadamael, fiz uma observação muito mais aprofundada do tiro de armas pesadas do IN e dos seus efeitos do eu em Guileje.

Aliás em Guileje adquiri uma aversão especial e duas coisas: abrigos (preferi valas bem feitas e visão desimpedida para as orientações do fogo IN, e clara percepção dos seus efeitos acústicos) e itinerários obrigatórios.

Escusado será dizer que valas bem feitas (bons parapeitos, estreitas e profundas, em linha quebrada com um homem em cada segmento), era coisa que não existia em Guileje. E muito menos em Gadamael, onde, inicialmente, as valas, que não chegavam para toda a gente, eram largas e com cerca de 50cm de profundidade (quando muito), em segmentos de linha recta de grande extensão, de tal modo que, cada granada que lá caísse, enfiava logo três ou quatro pessoas.

C. O BCP 12

Quando a CCP 122 (transportada pelo rio Cacine) chegou a Gadamael, vindo da península do Catanhez (no dia 2JUN73 e não no dia 3, como saiu por lapso em meu escrito anterior), trazia consigo um conhecido meu: o Alferes Miliciano Pára Afonso, que andou no Liceu D. João de Castro com um dos meus irmãos.

Fomos conversando, e ele apresentou-me ao Comandante da sua Companhia, o Capitão Pára Terras Marques e, posteriormente, ao Comandante da CCP 123 Capitão Pára Cordeiro (morto estupidamente num acidente ocorrido num salto de grande altitude).

Se bem me recordo, a CCP 122 tomou posição ao longo do lado poente da Tabanca, paralelamente à pista. A sensação que eu tive, nos primeiros contactos, foi a de que aquela tropa já tinha sido puxada até aos limites, principalmente na complexa ocupação da península do Catanhez e, eventualmente, em outras operações.

No primeiro dia, constatei que a CCP 122 levava, talvez, vinte minutos a tentar sair do aquartelamento: a qualidade do fogo inimigo era tal, que dirigiam flagelações para os pontos onde se tentavam as saídas, orientados por um posto de observação avançada, situado (como se veio a descobrir) num local imediatamente a sul do braço do rio Cacine que passava por Gadamael, e numa quota relativamente mais alta, porque o quartel desenvolvia-se em declive suave até ao rio.

Muitas vezes, os bigrupos e as Companhias só se conseguiam agrupar já fora do arame. Notei que as tropas - pára-quedistas – devido ao seu treino e mentalidade eminentemente ofensivos – reagiam, às vezes, um pouco temperamentalmente ao facto de se verem batidas passivamente, no aquartelamento, pelo fogo das armas pesadas do IN.

De qualquer modo, diria que passavam muito mais tempo fora do que dentro do aquartelamento, tendo sempre em Cacine, em recuperação, uma das Companhias.

Pois bem: o dispositivo do IN em torno de Gadamael foi, ao longo de três ou quatro semanas de operações, literalmente empurrado pelo BCP 12, desde o arame de Gadamael até bem para lá da fronteira com a Guiné-Conacri.

O fogo do IN foi perdendo não só intensidade como, sobretudo, qualidade (à medida que lhe era negada a observação avançada), e as, por assim dizer, bases de fogos que tivesse a veleidade de manter, dentro do alcance de Gadamael, seriam inevitavelmente cercadas e aniquiladas.

Evidentemente que a FAP desempenhou aqui um importante papel: o seu apoio de fogo às operações do BCP 12 foi intensíssimo.

Contra ela o IN reagia com tudo o que tinha disponível, além do Strela (sobre cujo uso só posso conjecturar), recordo-me distintamente de ouvir insistente fogo de anti-aérea convencional, provavelmente de quádruplas.

Efectivamente os Fiat G91 estavam, nessa altura, pintados de cinzento metálico. Julgo até recordar-me de um dos seus indicativos rádio: "Níquel" (mas também posso estar a divagar).

Suponho que havia todo um histórico de colaboração profissional entre o BCP 12 e os pilotos de Fiat-G91, que tornava a combinação muito eficiente.

A este propósito, o António Martins de Matos tem toda a razão: o apoio de fogo pela FAP tem toda a sua eficácia muito condicionada à colaboração das forças terrestres, e compreendo a exasperação de um piloto que só obtém indicações vagas.

Em 21 de Junho de 73, a CCP 121, comandada pelo então Tenente (hoje Major General) Hugo Borges, aproveitando o barulho da chuva torrencial, conseguiu cercar um importante acampamento do IN 8 Km a sudeste de Gadamael – tendo conseguido entrar dentro das valas deles e aberto fogo a partir daí.

Não consigo descrever os metros cúbicos de armamento e munições capturados, parte dele transportado em Zebro do DFE n.º 22 para Cacine, e o restante, por terra, para Gadamael.

Foi esta mesma Companhia que, em 23 de Maio, saiu de Binta e chegou a Guidage, sofrendo quatro mortos embora a coluna, e os elementos dos DFE n.ºs 1 e 4 que a acompanhavam, terem tido de voltar para trás.

Nem esta Companhia, nem o Batalhão, tiveram qualquer condecoração, individual ou colectiva, por estas acções.

Segundo a verdade oficial da época, salvaram Gadamael o Capitão (Major General) Manuel Soares Monge, e o Coronel (Major General) Rafael Durão.

O primeiro destes oficiais é, sem dúvida, uma pessoa inteligente e sensata, e a sua influência junto do General Comandante-Chefe terá, certamente, contribuído para que tenham sido, tardiamente, tomadas as decisões que se impunham sobre Gadamael.

Como escrevi ao Nuno Rubim, compreendo que aos responsáveis, actuais e passados, da Guiné Bissau não lhe apeteça organizar um simpósio sobre a temática compreensiva de Guileje e Gadamael.

Mas que os nossos responsáveis, à época das ocorrências, tenham votado ao esquecimento o desempenho do BCP 12 em Gadamael, é triste. Muito triste.

Uns dias antes do sucesso da CCP 121, a CCP 122 teve a infelicidade de cair em forte emboscada, onde sofreu, parece-me, cerca de quinze feridos, os quais vieram aos ombros dos seus companheiros até ao aquartelamento, e daí foram evacuados por sintex ou Zebros para Cacine.

Foi portanto com grande surpresa que li o P3783 (4) de António Martins de Matos, onde refere ter o Major Raul Folques, ferido, dito por rádio: “Ó Tigres, não se vão embora que estes… querem deixar-me aqui, sozinho”.

Como também me surpreende, a referência, na operação Ametista Real, a desaparecidos (três, segundo Matos Gomes, treze segundo Almeida Bruno) – mas aqui a surpresa resulta certamente da ignorância das circunstâncias concretas.

Especulando com meras aparências, poderia dizer que o BCP 12 tinha uma, por assim dizer, técnica de combate diferente.

Não quero deixar passar a oportunidade sem homenagear a memória do Sr. Tenente Coronel (Coronel Pára) Sílvio Araújo e Sá, Comandante do BCP 12 e do COP5 desde 5/6/73.

Admito que a extremidade do esforço a que teve de submeter a sua unidade, lhe tenha proporcionado inimizades dentro dos seus subordinados.

Para mim, no entanto, constituiu uma grande novidade: um Comandante perfeitamente lúcido (numa altura em que os mais altos responsáveis andavam à deriva, a começar pela General Comandante-Chefe), que tinha uma noção precisa da situação, e os meios indispensáveis para sobre ela actuar.

Convém salientar que o BCP 12 actuou em Gadamael abordando o IN, e o seu dispositivo, nas circunstâncias e nas oportunidades que entendia, e que eram as escolhidas pelo seu perspicaz oficial de operações Major (Coronel) Moura Calheiros, sem quaisquer restrições impostas pelo uso de itinerários obrigatórios ou constrangimentos de abastecimento e rotação de pessoal, o que tudo fluía, à vontade, pelo Rio Cacine.

Fica então aqui este testemunho de um não-pára-quedista, que eu entendo dever prestar, porque, tanto quanto os conheço, se nos dirigirmos à maior parte deles, é difícil arrancar-lhes mais que cinco palavras: - “Fez-se o que foi preciso”.

D. A Coluna Guileje-Gadamael-Guileje

1. Como já referi, Guileje dependia, em absoluto, de colunas de reabastecimento de e para Gadamael, cujo processo de execução se passa a sumariar:

a. Saíam de Guileje dois pelotões da respectiva Companhia e uma secção de milícias picando a estrada;

b. À frente ia a milícia, a qual, a partir da ramificação, para Guileje, da estrada Gadamael-Gadembel (ponto B do extracto de carta em anexo, e de ora em diante o cruzamento) flanqueava a estrada, isto é: seguia um itinerário paralelo, a 30 ou 40 metros da mesma, do lado da fronteira;

c. O pelotão da frente da nossa Companhia (determinado por escala), prosseguia pela estrada, indo estacionar perto de um pontão sobre o rio Bendugo, cerca de 5 Km adiante do dito cruzamento, no limite da Zona de acção da Companhia;

d. O pelotão de trás instalava-se no cruzamento;

e. Do lado de Gadamael adoptavam-se disposições idênticas;

f. Estabelecida a segurança lateral do lado da fronteira, partiam: uma coluna (carregada) de Gadamael para Guileje, e outra de Guileje para Gadamael para ir aí carregar;

g. Ambas as colunas levavam embarcado um pelotão das respectivas Companhias;

h. A coluna de Guileje levava ainda uma autometralhadora Fox (c/duas metralhadoras pesadas Browning 12,7 e 7,9) e uma viatura descoberta White com uma Breda 7,9 mm;

i. A coluna de Gadamael para Guileje levava uma viatura White;

j. A estrada era muito apertada, a mata, de ambos os lados, muito fechada, e o único sítio onde as duas colunas se podiam cruzar era, justamente, perto do pontão sobre o rio Bendugo: a que chegasse primeiro, esperava pela outra;

k. A coluna de Gadamael descarregava em Guileje e regressava;

l. A coluna de Guileje carregava em Gadamael e regressava;

m. Concluídas estas extraordinárias manobras (que se iniciavam pelas 7.00h), os pelotões de segurança apeados regressavam aos aquartelamentos respectivos (o que sucedia pelas 15.00h)

n. Durante a execução das colunas estava estacionada (parece-me) na pista de Guileje, uma DO-27 armada com rokets e foguetes. A partir de Abril as colunas deixaram de contar com protecção aérea por este meio.

Estas manobras, que envolviam cerca de 80% do efectivo de cada Companhia, não tinham, para o Comando-Chefe, a consideração de actividade operacional.

Entre Junho e Outubro todas as linhas de água que passavam por esta estrada transbordavam, e Guileje ficava isolada de Gadamael durante 4 meses. Razão pela qual, durante o mês de Maio, as colunas se efectuavam dia-sim, dia-não, seguindo sempre os mesmos horários e rotinas.

Tal frequência, comprometia, inevitavelmente, a actividade de patrulhamento das duas Companhias envolvidas.

No caso particular do ano de 1973, era necessário pôr em Guileje todos os abastecimentos necessários para 4 meses de isolamento, e ainda os obuses 14 cm que chegavam, levar as peças 11,4 cm, que partiam, e respectivas munições, o que poderia determinar que as colunas viessem a ser diárias.

2. Combates do dia 18 de Maio de 1973

Na semana anterior, por ordem do Major (Coronel) Coutinho e Lima, saí com o meu pelotão para tentar regular o tiro de um morteiro 10,7 cm (o outro foi requisitado, com as respectivas munições para Cufar), para o chamado cruzamento (ponto B da carta em anexo).

Após várias tentativas e aproximações, julguei aperceber-me de dois ou três impactos, senão no cruzamento, pelo menos lá perto.

Aproximei-me para tentar o reconhecimento dos pontos de impacto, mas não consegui, por a mata ser muito densa.

No dia 18 de Maio de 1973, às 7.00h, saíram de Guileje, por esta ordem:

- uma secção de milícias reforçada;
- o pelotão do alferes Manuel Reis, destinado a estacionar no Bendugo;
- o meu pelotão, destinado a estacionar no cruzamento.

Como se verá, com início a 200 ou 250 metros do cruzamento, o IN tinha instalado, na estrada, 16 a 18 potentes fornilhos, os quais, por serem accionados à distância por um dispositivo eléctrico, podiam ser enterrados a profundidade que evitasse a sua detecção pelas picas – trabalho de sapadores especiais.

Tinha chovido durante a noite, e o sargento de milícias deparou-se com uma pegada (livro a Retirada de Guileje), ou com um troço de fio eléctrico (segundo me contaram outros milícias), e começou a sondar com a pica.

Foi logo abatido, eventualmente por um atirador especial.

Imediatamente todos (ou grande parte) dos fornilhos foram accionados (prematuramente) por controlo remoto, seguindo-se uma fortíssima acção de fogo do inimigo (várias metralhadoras ligeiras e LGF RPG7), causando imediatamente 4 feridos graves e alguns ligeiros, além do morto já referenciado.
O morteiro 10,7cm do aquartelamento fez dois ou três tiros, tendo suspendido o fogo por indicação do alferes Manuel Reis porque as granadas quase caíram em cima do nosso pessoal.

Refira-se que havia um único especialista em armas pesadas de infantaria, o Furriel Mil Neves, que estava incluído no GC do Alferes Manuel Reis, estando o tiro de morteiro 10,7 , nesse dia, cometido ao 1.º Sargento encarregado do material Dias Ferreira.

E porque é que o Manuel Reis levou o único especialista em morteiros pesados da Companhia? Provavelmente porque não tinha outro Furriel disponível.

Enquanto isto se passava, eu estava situado no pontão do rio Mangojá, e pensei abrir fogo de morteiro 60mm.

Acabei por não o fazer, por não ter confiança, nem em mim próprio, nem no atirador habitual, para fazer tiro indirecto a tão curta distância, temendo um acidente por fogo amigo.

Entretanto o Manuel Reis recuou, trazendo os feridos graves, e cedeu-me a vez. Já tinha levado a sua dose (e que dose!).

Ficaram junto da cratera do 1.º fornilho, o cadáver do sargento da milícia e várias armas.

Pedi via rádio, que transmitissem ao Capitão Quintas que pretendia que me enviassem a Fox, a White, um unimogue e dois morteiros 60 mm e respectivos pratos.

Com cerca de 12 homens do meu pelotão (e dois do pelotão do Manuel Reis que se voluntariaram, vindo um deles a morrer) saímos da estrada para a esquerda (em relação ao sentido da nossa marcha) em linha pelo resto da lala do rio Magojá, fazendo fogo para a orla do mato denso com tudo o que tínhamos (dilagramas, LGF 8,9 etc.).

Reentrámos na estrada no local onde estavam o cadáver do Sargento de milícias e as armas abandonadas, e avancei até à cratera aberta pelo 3.º fornilho.

Entretanto, chegou à estrada (pontão sobre o rio Mangojá) não o que eu tinha pedido (Fox e Unimogue) mas a coluna completa, com a Fox em 2.ª posição.

Voltei a correr para trás, soltando todas as improprérios que me vieram à cabeça.

Enfim, tristes figuras.

Conseguimos que a Fox passasse para a frente, e tomasse posição imediatamente antes da cratera do 1.º fornilho.

O pelotão da CCaç 3520 (Companhia de Cacine) que estava de reforço a Guileje, apeou-se no ponto A, do extracto de carta anexo, e aí ficou.

Na coluna vieram mais quatro milícias entre as quais o velho Adulai Sila ou Adulai caçador (morreu em Gadamael) cuja presença me acalmou.

Entretanto, passou por mim disparado um corrécio – Furriel Mil Op Esp Marques dos Santos, transferido para o COP5 na sequência de uma punição - transportando um morteiro 60mm sem prato e uma caixa das respectivas granadas, que me ultrapassou em cerca de 20 metros (ainda lhe gritei: - Pára aí!).

Seguiu-se nova e violenta acção de fogo do IN (metralhadoras ligeiras e RPG7).

Na altura eu estava em pé na estrada (que estupidez!), com um LGF 8,9 nas mãos, que um milícia (Tala Camará) tentava municiar.

O dito milícia levou um tiro que lhe entrou por debaixo da clavícula esquerda e lhe saiu por cima da omoplata do mesmo lado, mas só carne limpa.

Saltei para dentro da cratera do 3.º fornilho, arrastando-o comigo.

As Browning 12,7 e 7,9 da Fox (que enfiavam a estrada), responderam ao fogo IN, enquanto este durou.

O 1.º Cabo Rabaço, do pelotão do Manuel Reis, que estava duas ou três posições atrás de mim (com o lança rockets de 37 mm), foi atingido por estilhaços do RPG7, sendo que, ao que julgo lembrar-me, um deles se terá cravado entre duas vértebras. Morreu no quartel, 3,5 horas depois, por falta de evacuação.

O Furriel Marques dos Santos escapou miraculosamente, mas deixou, no ponto onde retrocedeu, o morteiro 60 e respectiva caixa de granadas.

Nunca pensei que 20 metros fossem uma distância tão grande. Enfim, eu e o Adulai Sila lá fomos, em sprint, buscar o morteiro e as granadas, e só à volta o IN reagiu pelo fogo.

Lembro-me que mergulhei para a cratera do 3.º ou 4.º fornilho de tal maneira que parti a coronha da G3.

Enquanto isto, não consegui restabelecer o fogo do morteiro 10,7. Um obus 14 terá feito 55 a 70 tiros, tendo os projécteis caído in the middle of nowhere, alguns, muito para sudeste do cruzamento (já me referi em escrito anterior, aos problemas de falta de regulação do tiro desta arma).

Retirámos para a aquartelamento, tendo a Fox de fazer mais de 100 metros em marcha atrás.

Da parte do inimigo não me parece que tenham praticado um grande feito de armas.

Perante pouco mais de uma dúzia de espontâneos, vagamente comandados por um atarantado alferes, tinham a obrigação de nos abater ou capturar a todos.

Não me parece que uma Fox imobilizada fosse grande obstáculo para uma dúzia de RPG2 e RPG7.

Tudo visto, não apanharam uma arma sequer.

Não houve apoio aéreo por falta de condições meteorológicas (nuvens baixas?).

A Repoper recomendou que, de futuro, se coordenassem as colunas com as condições meteorológicas adequadas.

O que o Coronel Coutinho e Lima poderia fazer talvez (e digo-o sem raiva) – lançando cartas de Tarot.

Ainda por cima, atenta a minha rudimentar instrução militar, confesso que não saberia como lidar com um ATAP, na modalidade de bombardeamento a picar, com bombas de 750 libras, lançadas dos 5000 pés.

Provavelmente, teríamos que nos dirigir para o ponto A da carta anexa, e depois ir reconhecer o resultado.

E nem quero imaginar o que seria, se o ATAP fosse dirigido a partir do aquartelamento.

Quanto ao efectivo que nos emboscou, estimo-o em um bigrupo (40 homens, fora os sapadores especiais) talvez um bigrupo reforçado (70 homens) das FAN (forças armadas nacionais) e não das FAL (forças armadas locais).

Como?

a. Considerando a intensidade do fogo de metralhadoras ligeiras Degtyarev: não seriam menos do que 4 ou 5 destas armas.

b. O fogo de RPG7 foi intenso, sempre enfiando a estrada. Nas imediações do ponto B a mata é densíssima e é impossível usar esta arma. Onde a mata abre, e é possível dispará-la é no cruzamento propriamente dito. Calculo portanto que o dispositivo inimigo teria uma extensão de 200 a 250 metros.

Evidentemente que só poderia ter a certeza se mandasse parar a guerra com um apito, e passasse revista à subunidade inimiga (podia ser que encontrasse algum tão mal ataviado como o Vasco da Gama).

E como é que eu sei que havia 16 a 18 fornilhos e não menos?

A bem dizer não sei: só fui até à 6.ª cratera. Penso todavia, ter visto mais duas à frente.

O Comandante Fefé Cofre do PAIGC refere 18 fornilhos comandados por “cordão que ia até aos abrigos dos sapadores” (“As Duas Faces da Guerra”, testemunho a considerar com as reservas já enunciadas).

Posto isto, pode-se conjecturar sobre o que deveríamos ter feito.

Envolver o IN?

Com o efectivo disponível, não sei quem é que envolveria quem. Ademais o IN deveria ter-se prevenido contra essa manobra, quer com minas e armadilhas (aproveitando os seus sapadores) quer com uma equipa de reserva por detrás do seu dispositivo.

Sondar, mais profundamente, a zona de morte da emboscada? Até onde? Até ao 10.º fornilho? Até ao 18.º?

Uma coisa tenho eu por certa: se não fosse o Sargento da milícia Jan Samba, e a nossa coluna apeada tivesse entrado mais 200 (ou 100) metros, o Coronel Coutinho e Lima poderia ter-se apresentado, no seu briefing com o General Comandante Chefe, levando – a crédito das suas modestas pretensões – uma carnificina satisfatória.

Uma curiosidade:

36 horas antes destes acontecimentos, a estrada tinha sido toda picada, tinha-se realizado colunas nos moldes descritos e – no local onde o IN montou o seu dispositivo – esteve instalado um Gr Comb nosso.

É caso para dizer que quem vai ao mar perde o lugar. E também para introduzir um tema que, ao que parece, o António Martins de Matos não leva em devida consideração: O IN tinha o irritante hábito de se movimentar.

Outra curiosidade:

O milícia Tala Camará (não confundir com outro, o Tala Uri Camará), veio para Portugal, em meados da década de oitenta. Falando muito mal o português, foi ao Depósito de Adidos (onde fui desmobilizado) e apareceu em casa dos meus sogros, cuja morada eu tinha indicado como meu domicílio na disponibilidade, procurando por mim.

João Seabra

Canhão (ou peça) soviético de 85 mm D44

Peça de 130 mm M-46 modelo 1954, soviética

Extracto de Carta

Fotos: © João Seabra (2009). Direitos reservados.

__________

Notas de CV:

Vd. postes de:

(1) 14 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3737: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (11): Um erro de 'casting', o comandante do COP 5 (António Martins de Matos)

(2) 11 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3872: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (21): Resposta de António Martins de Matos a Nuno Rubim

(3) 12 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3881: Considerações sobre o P3853: Apontamentos sobre Guileje e Gadamael (Vasco da Gama)

(4) 23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3783: FAP (1): A diferença entre o desastre e a segurança das tropas terrestres (António Martins de Matos, Ten Gen Pilav Res)

(*) Vd. postes da série Dossiê Guieje / Gadamael 1973:

24 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3788: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (1): Depoimento de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3789: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (2): Esclarecimento adicional de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)

25 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3790: Dossiê Guileje / Gadamael (3): "Um precedente grave" (Diário, Mansoa, 28 de Maio de 1973) ... (António Graça de Abreu)

27 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)

29 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3816: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (5): Strellado nos céus de Guileje, em 25 de Março de 1973 (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav)

1 de Março de 2009 >Guiné 63/74 - P3954: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (6): A posição, mais difícil do que a minha, do Cap Cmd Ferreira da Silva (João Seabra)

4 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3982: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (7): Ferreira da Silva, ex-Capitão Comando, novo comandante do COP 5 a partir de 31/5/1973

15 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4035: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (8): Amigo Paiva, confirmas que fomos vítimas de ameaças e pressões (Manuel Reis)

domingo, 19 de abril de 2009

Guiné 63/74 - P4216: (Ex)citações (23): Homenagem à memória do Capitão Pára-quedista João Costa Cordeiro (João Seabra)

1. Comentário de João Seabra (1), ex-Alf Mil da CCAV 8350, Piratas de Guileje (Guileje, 1972/73) deixou um comentário no P4184 (2) :

Caro Miguel Pessoa,
Deixa-me aproveitar a boleia, para homenagear a memória de um dos Comandantes da CCP 123 que conheci em Gadamael, o Capitão Pára João Costa Cordeiro, valoroso combatente e ser humano de eleição, estupidamente falecido num acidente.

Foi a ele que, pela primeira vez, ouvi o comentário "fez-se o que foi preciso" (que não me recordo de ver aqui mencionado, mas a que faço alusão num texto que, por ser muito pesado, talvez tenha circulado fora do blogue, entre os interessados).

Poderia multiplicar-me em adjectivos sobre o meu homenageado. Bastará, todavia, referir o seguinte:

- A minha Companhia (CCAV 8350) e a CCAÇ 4743, saíram de Gadamael em 25JUN73, sendo substituídos pela 3ª Companhia do BCAÇ 4612, pela CCAV 8452 e pela CART 6252;
- Com a situação em Gadamael já perfeitamente controlada, mas ainda perigosa, estas Companhias passaram a beneficiar de treino operacional que lhes foi ministrado pelas Unidades do BCP 12, proporcionando-lhes conhecimento da Zona e a confiança que se pode imaginar;
- A CCP 121 e a CCP 122 terão regressado a Bissau em 7JUL73;
- Ao que julgo saber, a CCP 123, por iniciativa do seu Comandante,voluntariou-se para ficar em Gadamael durante mais dez dias, para completar o trabalho de treino operacional das ditas Companhias.

Era assim o Capitão Cordeiro. Para ele, entre o que "era preciso fazer", porque entendia ser também esse o dever de uma unidade de elite da Força Aérea, incluía-se, se houvesse oportunidade, ministrar à chamada "tropa macaca", um aperfeiçoamento operacional que o Exército já não estava em condições de ministrar.
Sobre este exemplo de genuína camaradagem, o Jorge Canhão é das pessoas mais indicadas para falar.
Lastimei bastante, algumas generalizações depreciativas em que alguns dos nossos amigos, levados pela indignação, se deixaram cair, relativamente aos Quadros Permanentes das FA.
Bons e maus profissionais há em todas as carreiras. E a arrogância é muito comum na espécie humana.
Quando penso nos nossos camaradas "do Quadro", prefiro lembrar-me - em representação de muitos outros - do Capitão Cordeiro e do Tenente-Coronel Brito, que não conheci mas que não deixou de voar em nosso apoio, ameaçado por armas cujas características não eram conhecidas e sem que as necessárias contra-medidas tivessem sido estabelecidas.

Desculpa o abuso.
Abraço
João Seabra
__________

Notas de CV:

(1) Vd. poste de 1 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3954: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (6): A posição, mais difícil do que a minha, do Cap Cmd Ferreira da Silva (João Seabra)

(2) Vd. poste de 9 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4164: Comentários que merecem ser postes (3): O Gen A. Bruno gostava de fardas e do elas representavam em tempo de paz(Santos Oliveira)

domingo, 1 de março de 2009

Guiné 63/74 - P3954: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (6): A posição, mais difícil do que a minha, do Cap Cmd Ferreira da Silva (João Seabra)

1. Mensagem, enviada em 25 de Fevereiro de 2009, pelo João Seabra, membro da nossa Tabanca Grande, advogado com escritório em Lisboa, ex-Alf Mil da CCAV 8350, Piratas de Guileje (Guileje, 1972/73) (aqui na foto, à esquerda, no Cumbijã));

Assunto - O Coronel Comando na reserva Ferreira da Silva (*)

Luís,

Conforme indicações tuas (**), contactei, há duas semanas, com o Sr. Coronel Comando Ferreira da Silva, que, ademais, é (ou foi) meu Colega de profissão.

Não se mostrou agastado comigo pelo escrito em que eu o refiro – de uma maneira não tão respeitosa como devia – e propôs-me que escrevêssemos um texto conjunto sobre Gadamael.

O Coronel Ferreira da Silva foi inicialmente colocado no Batalhão de Comandos da Guiné, numa operação no Morés, a sua viatura (um Unimogue) rebentou uma mina que matou os demais ocupantes, tendo ele sofrido fracturas nos dois braços e mais ferimentos, e sido obrigado a pedir a sua própria evacuação.

Evacuado para Portugal, pediu para terminar a sua comissão na Guiné, sendo colocado no CIM [Centro de Instrução Militar] de Bolama.

No dia 31 de Maio de 1973, foi recolhido de helicóptero e depositado em Cacine, seguindo-se uma viagem de sintex para Gadamael onde foi despejado ao fim da manhã, para substituir o Sr. Coronel (hoje Major General) Durão, com quem teve uma brevíssima conversa, onde lhe foi sugerido que o Sector estava calmo e controlado.

Este último oficial, seguiu imediatamente para Cufar, via Cacine, no mesmo sintex.

O Coronel (então Capitão) Ferreira da Silva nem teve tempo para reconhecer o aquartelamento, e mal conheceu os capitães das duas Companhias [ ali estacionadas ].

Ao princípio da tarde desse mesmo dia começaram as flagelações a Gadamael, e no dia seguinte de manhã os dois capitães foram evacuados.

O Capitão (hoje Coronel) Ferreira da Silva não conhecia os demais oficiais e, naquela confusão, não sabia onde os encontrar.

Dito isto, o proverbial “tratamento jornalístico” encontra logo um grande motivo de interesse: “ficou sem oficiais”.

Aflige-me a ideia de ser injusto ou excessivo com qualquer pessoa, especialmente um ex-camarada de armas.

Relendo cuidadosamente o meu texto de há cinco anos (**) – e vendo as coisas com mais lucidez – posso ter dado a entender que a debandada teria sido induzida por uma ordem dele, quando, na realidade, tudo estava predisposto para que tal acontecesse, em vista da confusão e falta de condições de comando que reinavam no aquartelamento, como descrevi no meu texto em causa.

É, nomeadamente, a isso que me refiro quando digo que “só por comodidade de expressão se pode falar em tropa comandada pelo Capitão Ferreira da Silva”.

Quanto à ordem em si, diria que, efectivamente, a melhor maneira de proceder numa flagelação daquela amplitude seria a de, observando as tendências e a orientação do fogo IN, procurar os pontos menos batidos logo que, para isso, se proporcionasse a oportunidade. E se a indicação for, por hipótese, para seguirem para a Tabanca, e a população estiver a fugir, a tendência do pessoal, entregue a si próprio, é para entrar na procissão.

Com a minha vasta experiência nesta matéria, o melhor conselho que posso dar, a quem se vir envolvido numa situação semelhante, é que nunca tente mudar de posição quando sentir os impactos insuportavelmente perto: o próprio uso das armas que nos flagelam, acabará por desviar o fogo de nós.

Aliás, eu próprio, tendo observado as diversas tendências do fogo IN durante a tarde de 31 MAI e a manhã de 1 JUN, acabei por escolher – para me posicionar a mim e ao meu pelotão, à medida em que iam chegando do tarrafo e de Cacine – o topo superior da pista, junto ao início da estrada Gadamael-Ganturé-Guileje, ao lado do pelotão de canhões sem recuo comandado pelo meu amigo, e condiscípulo de vários anos nos Salesianos do Estoril, Alferes Rocha.

O então Capitão Comando Ferreira da Silva ficou em Gadamael até 1974, e pode contar-nos coisas muito interessantes sobre aquele sector, no pós JUL 73.

Tem algumas dificuldades com a Net, mas eu vou pôr-lhe o meu “dispositivo” à disposição.

Quanto ao seu processo de averiguações para atribuição de condecoração militar, eu não poderia ser uma testemunha menos indicada: tenho a tendência para banalizar as situações, e se me perguntarem se me recordo de algum acto que revele heroísmo, só me ocorrem termos como “decência”, “sensatez”, “bom-senso” … quando muito o termo anglo-saxónico “gallantry”.

Uma coisa é certa: no dia 1 JUN73 a posição dele era muito mais difícil do que a minha.

Abraço
João Seabra

2. Comentário de L.G.:

Como eu já tive oportundiade de dizer, ao telefone, ao nosso camarada Ferreira da Silva, o seu lugar é aqui, junto a nós, no seio da Tabanca Grande. Ele não precisa de convite formal. Vamos recebê-lo de braços abertos. Sê bem vindo, camarada. Um Alfa Bravo para ti e para o João.
__________


Notas de L.G.:

(*) Vd. postes desta série:

24 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3788: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (1): Depoimento de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3789: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (2): Esclarecimento adicional de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)

25 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3790: Dossiê Guileje / Gadamael (3): "Um precedente grave" (Diário, Mansoa, 28 de Maio de 1973) ... (António Graça de Abreu)

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3788: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (1): Depoimento de Manuel Reis (ex-Alf Mil, CCav 8350)

27 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)

29 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3816: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (5): Strellado nos céus de Guileje, em 25 de Março de 1973 (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav)


(**) Em 6 de Fevereiro de 2006, mandei o seguinte mail ao João Seabra:

João: Estou no Norte... Só volto no domingo... O Ferreira da Silva, dos comandos, que esteve contigo em Gadamael, queria falar contigo e explicar-se... Pede o teu número de telemóvel.. Ainda é periquito nas coisas da Net... O mail dele é: ferreiradasilva43@gmail.com

Vive em Coimbra, onde é advogado e alfarrabista... Diz que tem muitos livros sobre a guerra, que vai coleccionando... Quer entrar para o blogue e contar as suas histórias, embora não tenha muito jeito para estas coisas... Mas antes precisa de falar contigo, explicar-se, repor a verdade de algumas situações... Diz que o Eduardo Dâmaso, do Público (****), deturpou as suas palavras... Posso dar o teu mail e/ou telefone ? Ou podes tu entrar em contacto com ele ?... Telemóvel dele é (...).
Um abraço. Luís

(***) Vd. poste de 27 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)

(****) Vd. trabalho de investigação do jornalista Eduardo Dâmaso, onde há vários erros factuais (Público, 26 de Junho de 2005):

15 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P878: Antologia (42): Os heróis desconhecidos de Gadamael (Parte I)

15 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P879: Antologia (43): Os heróis desconhecidos de Gadamael (II Parte)

(....) Ninguém entregou a condecoração ao coronel

Uma investigação de Eduardo Dâmaso

O coronel Ferreira da Silva resistiu com um punhado de homens ao avanço do PAIGC sobre Gadamael. Sem artilharia, sem apoio aéreo, sem oficiais, sem médico, sem posto de rádio e com poucas munições. Foram louvados e o coronel chegou mesmo a ser condecorado por Carlos Fabião. Mas nunca recebeu a Cruz de Guerra.

Foi ao pôr do sol do dia 1 de Junho de 1973 que os três ou quatro soldados que sobravam da tropa comandada pelo recém-chegado capitão dos comandos Ferreira da Silva ficaram sem artilharia, sem apoio aéreo, sem oficiais, sem médico, sem posto de rádio e sem munições de morteiro ali por perto. Foi nesse dia que o hoje coronel reformado e advogado Ferreira da Silva conquistou uma das suas mais vivas memórias da guerra colonial e também uma condecoração, a Cruz de Guerra, que nunca chegou a receber.

Ferreira da Silva, que antes tinha estado em Angola, acabara de poisar em Gadamael no dia 31 de Maio depois de uma nomeação relâmpago para a chefia do Comando Operacional 5 (COP5). Iniciara a comissão na Guiné em Dezembro de 1971, nos Comandos Africanos, e alguns meses depois foi ferido com gravidade. Evacuado para Lisboa, onde convalesceu, regressou à Guiné a seu pedido em Janeiro de 1973 e foi colocado em Bolama a comandar uma companhia de instrução.

A 31 de Maio, pelo meio-dia, chega ao quartel de Gadamael que vivia sob as brasas do episódio da retirada do capitão Coutinho e Lima do quartel de Guileje, situado a cerca de oito quilómetros do primeiro. Ferreira da Silva só teve tempo para um breve contacto com os dois comandantes de companhia ali presentes. Por volta das 15.00 começaram as flagelações com mísseis, morteiros e canhões sem recuo. Nesse dia houve um morto e um ferido. (...)


Vd. também poste de 27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3831: Tabanca Grande (110): João Seabra, ex-Alf Mil da CCAV 8350, Guileje, 1972/73


1. Mensagem de João Seabra (*), ex-Alf Mil da CCAV 8350,  Guileje, 1972/73, com data de 26 de Janeiro de 2009:

Luís,

Já respondi aos comentários que a minha mensagem suscitou.

É-me perfeitamente indiferente que me chamem cobarde, herói, ou nem tanto nem tão-pouco. A única coisa que me repugna é que me representem – ou eu próprio involuntariamente me apresente – como ex-coitadinho.

Não posso deixar de aceitar o amável convite para que integre a Tabanca. Mas também não posso prometer ser um participante muito assíduo. Limitarei as minhas próximas intervenções (as quais ocorrerão depois da publicação do pastelão) ao estritamente necessário para esclarecer a questão de Guileje/Gadamael.

Penso que, aliás, que o pastelão e o relato do Manuel Reis, são complementares, mais morteiro 120 mm, menos morteiro 82mm (que até poderá ter sido usado). Não sei se o regresso dele foi às 12h, 13h (ou às 12.22h ou às 12.59h): regressou quando acabou a grande flagelação de morteiro 120mm da manhã de dia 1/6/73, na sequência da qual a maior parte da guarnição fugiu efectivamente para o Tarrafo, e daí a maior parte foi para Cacine e alguns regressaram ao quartel.

Os dois capitães foram, mais precisamente, feridos no dia 1/6/73, pelas 11,00h. Os dois simultaneamente, porque estavam ambos no único abrigo que havia em Gadamael: o das Transmissões.

Procurarei usar da urbanidade desejável, o que poderá não excluir alguma nota de humor ou ironia.

Só tenho duas fotografias da Guiné – ambas no Cumbijã, gozando da hospitalidade do nosso amigo Vasco da Gama.

Também não tenho nenhuma fotografia actual tipo passe, vai então uma das últimas férias.

Não sei se as digitalizações em anexo ficam publicáveis.


João Seabra no Cumbijã

Abraço
João Seabra

2. Comentário de CV:

Caro camarada João Seabra, não te convido a entrar, porque já fazes parte da família. Desejo que ao contrário do que dizes, participes com regularidade no nosso Blogue, isto não prejudicando a tua actividade profissional, não só quando se fale de Guileje, mas também quando se fale de outros assuntos relacionados com a nossa passagem pela Guiné.

Em nome da Tertúlia da Tabanca Grande deixo-te os habituais, mas indispensáveis votos de boas-vindas.
__________

Nota de CV:

(*) Vd. postes de

23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3782: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (18): Obrigou-se o PAIGC a combater em Gadamael... (João Seabra)

27 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)

Vd. último poste da série de23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3784: Tabanca Grande (109): Manuel Rodrigues, ex-Fur Mil Mec Auto Rodas da CCAÇ 3491, Dulombi e Galomaro, 1971/74

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Guiné 63/74 - P3801: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (4): Cobarde num dia, herói no outro (João Seabra, ex-Alf Mil, CCav 8350)


1. Carta ao Director do Público, enviada pelo João Seabra, advogado com escritório em Lisboa, ex-Alf Mil da CCAV 8350 (Guileje, 1972/73) (*);

Senhor Director,

Tendo lido as peças de Eduardo Dâmaso “A nave dos feridos, mortos, desaparecidos e enlouquecidos” e “Ninguém entregou a condecoração ao coronel”, publicadas no “Público de 26/6/2005”, achei conveniente pôr à sua disposição as tardias considerações que se seguem, às quais dará o destino que bem entender.

Fui alferes miliciano na Ccav 8350, retirada de Guileje, em 22/5/73, por sensata decisão do comandante do então COP5, sr. major (coronel) Coutinho e Lima.

Nunca estive a bordo da “fragata Orion” (não seria uma LFG – lancha de fiscalização grande?), pela simples razão de que nunca me ausentei de Gadamael na sequência dos ataques dos dias 1/6/73 (uma quinta-feira) e seguintes.

Escreve-se numa das peças em causa: “os três ou quatro soldados que sobraram da tropa comandada pelo recém-chegado capitão Ferreira da Silva, ficaram sem artilharia, sem apoio aéreo, sem oficiais, sem posto de rádio ...”.

Não foi assim.

Para além de mim próprio, permaneceram no interior do destacamento, o alferes Luís Pinto dos Santos, comandante do pelotão de artilharia do Guileje e o alferes Rocha, comandante de um pelotão de canhões sem recuo 57 mm (e já vão três oficiais), e ainda, pelo menos, um furriel, e algumas (poucas) praças desta mesma unidade e da CCaç 4743 (a companhia originariamente de guarnição a Gadamael).

Além disso, encontravam-se em patrulha próxima do aquartedamento um pelotão da CCaç 4743 (com o seu alferes) e outro da CCav 8350 (alferes Reis).

Sou portanto uma das raras pessoas, que reúne em si a dupla qualidade de “cobarde” que, sob as ordens do major (coronel) Coutinho e Lima, retirou do Guileje e de pretenso “herói” de Gadamael. Nesta última condição fui louvado por despacho do General Comandante-Chefe de 28/8/73.

E não saímos de Gadamael por razões de decência básica (havia mortos e feridos que não podiam ser abandonados) e de elementar sensatez (uma retirada, devidamente comandada, é uma manobra militar, mas não consigo imaginar nada de tão perigoso como uma debandada).

Acontece que, na situação que se gerou em 1/6/73, só por comodidade de expressão se poderá falar em “tropa comandada pelo recém-chegado capitão Ferreira da Silva”.

Para o perceber, há que retroceder às peripécias que determinaram a retirada de Guileje, e às que se lhe seguiram.

Ao contrário de Guileje, Gadamael era uma posição sustentável, com poços de água potável muito próximos do perímetro exterior do aquartelamento, dotada de um cais acostável, acessível por via fluvial através de LDM, que na praia-mar navegavam sem dificuldades no braço do rio Cacine em cuja margem se situava.

Já Guileje era um destacamento absurdo, necessitando de organização de colunas escoltadas para reabastecimento de água a 3,4 Km,  dependente, para o seu aprovisionamento, de complicadas colunas rodoviárias múltiplas, de e para Gadamael, com uma pontualidade que poderia servir de exemplo à CP, e que ficava completamente isolado na época das chuvas.

O inimigo (termo convencional pelo qual designarei a entidade que nos pretendia matar, estropiar ou capturar, e a quem, se tivéssemos oportunidade, faríamos outro tanto) conseguiu conjugar duas vastas operações, práticamente simultâneas, ao norte sobre Guidage e ao sul sobre Guileje.

A primeira dessas operações, quase esgotou a chamada reserva do comando chefe, em tropas especiais.

Os meios utilizados pelo inimigo, tanto em artilharia como em infantaria, eram quantitativa e qualitativamente muito superiores aos das nossas guarnições de quadrícula.

A este propósito, tem interesse a leitura do artigo, publicado no Público, de 26/7/2004, pelo comandante Osvaldo Lopes da Silva do PAIGC, se bem que a desenvoltura com que este oficial transita da astronomia para a geografia e da geografia para a topografia, me sugira não ter sido ele o autor do plano de fogos na operação sobre Guileje.

Seja como for, dada a prioridade à defesa de Guidaje, Guileje foi isolado mediante a interdição dos seus acessos rodoviários a Gadamael e à água potável, através de emboscadas permanentes, por unidades de infantaria do inimigo, numerosas e dotadas de superior poder de fogo, minagem em profundidade dos itinerários, e sujeito a contínuo bombardeamento por todas as armas pesadas de que o inimigo dispunha.

Retirada a guarnição, e população, de Guileje, através de um itinerário ainda não reconhecido pelo inimigo, foi recebida em Gadamael, pelo então coronel (agora brigadeiro na reserva) Rafael Durão (Comandante do CAOP3, com sede em Cufar) esclarecido oficial, cuja primeira medida consistiu em promover uma formatura da CCav 8350, para ademoestar os respectivos oficiais, sargentos e praças, em bom vernáculo militar. O major Coutinho e Lima foi enviado para Bissau, onde permaneceu detido, pelo menos até ao 25/4/74.

Ainda hoje estou para perceber por que razão, confirmada a sua evacuação, o aquartelamento de Guileje não foi imediata e intensivamente bombardeado pela Força Aérea. Provavelmente havia quem acalentasse a fantasia de uma reocupação imediata. Certo é que o inimigo continuou a flagelar a posição após a nossa retirada, e só nela entrou dois a três dias depois (como diria Alves a C.ª: “ que coisa prudente é a prudência!”).

Dir-se-ia que, naquela conjuntura, se afigurava, pelo menos, bastante provável que o inimigo procurasse balancear, sobre Gadamael, os abundantes e sofisticados meios que tinha reunido para a operação de Guileje.

Nessa eventualidade – e sem prejuízo do indispensável patrulhamento em profundidade – eram necessárias providências urgentes.

Antes de mais – porque em Gadamael não havia obras ou abrigos adequados a uma guarnição entretanto duplicada – impunha-se a necessária actividade de organização do terreno, fortificando o destacamento, reforçando os espaldões de armas pesadas, abrindo trincheiras eficientes, enquadrando as subunidades, dotando-as de postos de combate defensivos bem determinados e interligados entre si e com o comando.

Em vez disso, o pessoal da CCav 8350 foi caóticamente disperso, em alojamentos de ocasião, pelos cerca de 40 000 m2 do aquartelamento, sem contacto com os seus oficiais e com o comando. Não se iniciaram quaisquer obras defensivas.

Por iniciativa de alguém que não consigo identificar, nas semanas anteriores operou-se uma radical alteração do material à disposição dos pelotões de artilharia de Guileje e Gadamael: as peças 114 mm (Guileje) e 105 mm (Gadamael), foram substituídas por obuses de 140 mm.

Ora, tanto as peças de artilharia de campanha como as próprias armas pesadas de infantaria, quando instaladas numa dada posição, necessitam de regulação do tiro, mediante a observação dos respectivos pontos de impacto, geralmente através de observação aérea, que já se sabia ser impraticável a partir do momento em que o inimigo passou a dispor de misseis solo-ar Strella-SA7.

As causas da desregulação são variadas, tendo a ver, designadamente, com choques sofridos pelas armas durante o serviço, com as condições meteorológicas, com insuficiências de cartografia, etc..

Os nossos obuses 140 mm (modelo 1943), tinham portanto a interessante função de fazer barulho e, nos casos em que abriam fogo de noite, de fornecer indicações de ajustamento do tiro do inimigo.

Nesta prometedora situação, o coronel Durão – certamente a benefício do brio e da disciplina – pôs de parte qualquer trabalho de organização defensiva, determinando um patrulhamento que se pretendia agressivo e que envolvia, em permanência, dois a quatro pelotões de entre as duas companhias.

De tal actividade resultaram dois contactos com pequenos grupos de reconhecimento do inimigo (os quais, por definição, evitam empenhar-se em combate), a quem foram capturadas três espingardas automáticas Kalashnikov.

No dia 31 de Maio de 1973 (uma quarta-feira), de manhã, o coronel Rafael Durão, retirou-se para Cufar, tendo chegado à lúcida conclusão que o inimigo, em consequência dos nossos “sucessos”, tinha retraído o seu dispositivo, sendo improvável um esforço sério da sua parte sobre Gadamael. Tratou-se evidentemente de uma bazófia só comparável com a sua idílica ignorância das intenções e do sistema de forças do inimigo.

Em sua substituição deixou o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva. Nesse mesmo dia, à tarde, iniciou o inimigo uma forte flagelação sobre Gadamael, utilizando, sobretudo, morteiros 120 mm, mas também foguetões Katyusha de 122 mm e peças de 130 mm, com uma qualidade de tiro surpreendente.

No dia 1 de Junho, o fogo da artilharia do inimigo intensificou-se qualitativa e quantitativamente e, entre as 10 e as 13 horas, uma área de 20 000 a 30 000 m2 do destacamento de Gadamael encaixou, seguramente, entre 350 e 400 impactos de morteiro 120 mm, provocando consideráveis baixas na guarnição.

Os dois capitães (comandantes, respectivamente, da Ccaç 4743 e da Ccav 8350), foram evacuados entre as 10,30 e as 11,00 horas, e não “ao princípio da tarde”.

Apercebendo-me de que se estava a gerar uma debandada, tentei impedi-la, pelas razões acima expostas, com resultados muito limitados.

O pessoal estava completamente entregue a si próprio e a falta de condições de comando era total: só conseguíamos transmitir ordens a quem nos passasse ao alcance da voz.

Dois dos três espaldões das peças de artilharia receberam granadas de morteiro 120 mm, que feriram, mataram ou dispersaram a totalidade das respectivas guarnições.

O pessoal que ia debandando dizia-me que o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva tinha dado ordens para se “sair do quartel”.

Dirigindo-me a uma das posições da artilharia, encontrei o alferes Luís Pinto dos Santos, que sobreviveu, com ferimentos ligeiros, e resolvemos ambos procurar o capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva, para lhe perguntar se tinha ordenado a evacuação do aquartelamento. Respondeu-nos que tal não era a sua intenção, tendo apenas recomendado ao pessoal que se deslocasse temporariamente “para fora do arame”, isto é, para o exterior do perímetro do destacamento, uma vez que o seu interior estava a ser intensamente batido pela artilharia inimiga.

Fizemos-lhe saber que tal “deslocação temporária” tinha degenerado em debanda incontrolável.

O alferes Pinto dos Santos, com a minha ajuda, conseguiu improvisar um mínimo de serventes (entre os quais o furriel de transmissões da CCav 8350) para activar um dos três obuses 140 mm, à cadência de um tiro de quarto de hora em quarto de hora.

Tudo visto, recolheram-se os mortos, evacuaram-se os feridos por via fluvial, e garantiu-se, com fogo esporádico de obus 140 mm, de morteiro de 81 mm e de canhão sem recuo de 57 mm, uma aparência de capacidade de reacção que dissuadisse um eventual reconhecimento em força por parte do inimigo (que aliás não se mostrou muito afoito).

Enfim: o trivial.

As munições para as armas pesadas eram transportadas do paiol em uma viatura Berliet temerariamente conduzida por um cabo escriturário (Raposo) da CCaç 4743, o qual, na volta, também transportava feridos para locais de embarque.

Nesse mesmo dia 1 de Junho à tarde:

Reentraram no quartel os dois pelotões que estavam em patrulha exterior; desembarcaram, de helicóptero, dois oficiais de confiança do Comando Chefe (capitães Caetano e Manuel Soares Monge) e o coronel Rafael Durão (pessoa dotada de coragem física em proporção inversa à do respectivo discernimento).

No dia 3 de Junho (Sábado), desembarcou a companhia 122 de paraquedistas (capitão Terras Marques), e no dia seguinte a 123 (capitão Cordeiro).

Uns dias mais tarde chegou a companhia de paraquedistas nº 121 (comandatada pelo então tenente, e hoje tenente-general, Hugo Borges), o que significa que foi deslocado para Gadamael um batalhão completo de paraquedistas (BCP 12).

Entre sexta-feira, dia 2/6/73 e o domingo seguinte, a presença do major Pessoa, do BCP 12, pôs termo ao efémero comando do capitão (coronel /dr.) Ferreira da Silva) no, assim chamado, COP5.

Um verdadeiro e próprio comando das forças de Gadamael foi estabelecido no domingo (4/6/73) na pessoa do tenente-coronel Araújo e Sá (comandante do BCP 12).

Nesse mesmo dia – por razões que, para mim, permanecem obscuras – o major Pessoa (era o 2º comandante do BCP12) retirou-se de Gadamael.

Apesar de não figurarem habitualmente como “heróis de batalha de Gadamael”, as operações das diversas companhias paraquedistas, em cerca de duas semanas, desarticularam o dispositivo inimigo, sofrendo baixas moderadas (uns 25 a 40 feridos, na maior parte ligeiros, com estilhaços de RPG 7).

Nunca será demais sublinhar a qualidade destas tropas de elite. Recordando os contactos que mantive com os seus oficiais (designadamente os capitães Terras Marques e Cordeiro), anoto, como curiosidade, que se mostravam extremamente críticos (no limiar do humor negro) em relação aos fundamentos e à condução da guerra, sendo a sua considerável eficiência, fruto exclusivo de um extraordinário brio profissional.

O corpo de tropas pára- quedistas – das melhores que se poderiam encontrar, inclusivé a nível da NATO – foi destroçado, como unidade combatente, em 1975. Ao que me consta o brigadeiro Rafael Durão e o major Pessoa tiveram, nessa meritória obra, a sua função, cada um do seu lado, respectivamente, no “11 de Março” e no “25 de Novembro”.

Não sei se o tenente coronel Fabião tinha condecorações para atribuir. Recordo que o alferes Pinto dos Santos e eu próprio fomos ouvidos como testemunhas num processo de averiguações para atribuição de condecoração militar ao capitão (coronel/dr.) Ferreira da Silva, pelo major (brigadeiro) Manuel Soares Monge, no quartel general do Comando Chefe, em Bissau.

A nenhum de nós dois pareceu que fosse caso de condecorações a propósito do que se passou em Gadamael no dia 1 de Junho de 1973 (excepção feita ao cabo Raposo, atentos o seu posto e especialidade).

Recordo-me que, na altura, o então capitão Caetano me disse que tinha chegado a “fase dos baldes de plástico” (brinde comercial muito apreciado à época). Temíamos o aproveitamento de tal “fase” para transformar o capitão Ferreira da Silva numa espécie de contra-exemplo, em relação ao major Coutinho e Lima.

A serem atribuídas condecorações, deveriam elas ser, obviamente, atribuídas a oficiais, sargentos ou praças das tropas paraquedistas.

A partir da chegada do BCP 12, a CCav  8350 e a CCaç 4743 não tiveram qualquer actividade operacional de relevo.

Aliás nem poderiam ter, uma vez que não tinham treino, nem armamento, para se defrontar com a infantaria inimiga em reconhecimento avançado, do que foi feita a (desnecessária) demonstração no dia 4 de Junho, quando um pelotão da CCav 8350, reduzida a uma dúzia de elementos, caiu numa emboscada a menos de 1 km do aquartelamento, sofrendo quatro mortos (entre eles o respectivo alferes) e cinco feridos graves.

Será a este episódio que o dr. Ferreira da Silva, por equívoco, se quererá referir quando alude a “seis paraquedistas mortos no mesmo dia” (os cadáveres foram efectivamente recuperados por um pelotão de paraquedistas).

O objectivo desta pretensa patrulha era o de “descongestionar” o aquartelamento da sua, por assim dizer, densidade humana, face à eficiência do tiro da artilharia inimiga. Em suma: a CCav 8350 e a CCaç 4743 tinham passado a desempenhar a proverbial função de carne para canhão.

Note-se que a nossa tropa de quadrícula (companhias tipo caçadores), nem sequer estava dotada de uma metralhadora ligeira decente (a nossa inacreditável HK-21 encravava ao fim de cinco ou seis tiros).

As tropas especiais usavam as metralhadoras ligeiras MG 42 e, em considerável quantidade, equipamento capturado ao inimigo: metralhadoras ligeiras Degtyarev, lança granadas RPG 2 e RPG 7, espingardas automáticas Kalashnikov. Excelente material que, ainda hoje, está ao serviço, do Iraque ao Afeganistão, do Sudão à Libéria.

Tive a inspiração de selecionar, de entre os meus pertences, que carreguei de Guileje, um grande livro: Bouvard et Pécuchet, de Gustave Flaubert.

Quando saí de Gadamael, faz agora trinta e dois anos, tinha chegado a uma passagem célebre: “alors une faculté gênante se développa dans leur esprit, celle de percevoir la bêtise e de ne plus pouvoir la tol
érer.” [ “então uma faculdade embaraçosa se desenvolveu em suas mentes, a de perceber a estupidez e não mais ser capaz de tolerá-la.” [tr. do editor LG ]

Dê a este enfadonho relato, Sr. Director, o destino que bem entender.

João Seabra

Antigo Alferes Miliciano da CCaV 8350 (1972/74)

P.S. - Porque, em certos aspectos factuais, confirma algo do acima relatado, junto segue extracto da minha folha de matrícula. 

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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 25 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3790: Dossiê Guileje / Gadamael (3): "Um precedente grave" (Diário, Mansoa, 28 de Maio de 1973) ... (António Graça de Abreu)