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sábado, 29 de agosto de 2020

Guiné 61/74 - P21303: Os nossos seres, saberes e lazeres (408): No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (4) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Março de 2020:

Queridos amigos,
Ponte da Barca fora a minha fronteira em duas deambulações anteriores, partindo do Gerês e passando pelo Soajo. Fiquei maravilhado com a ponte e com o tratamento paisagístico derredor.
Agora era diferente, tratava-se de uma peregrinação limiana em homenagem a um querido amigo que mesmo cego queria saber com a maior regularidade possível o que se passava na terra-berço e concelhos limítrofes. Catorze anos consecutivos de leituras de jornais como Aurora do Lima, Cardeal Saraiva, Notícias da Barca ou Notícias dos Arcos, leituras onde se chegava mesmo a esmiuçar toda a necrologia, tinham forçosamente consequências em desenhar a peregrinação a redondezas limianas.
O meu saudoso amigo tinha várias obras sobre o românico minhoto, indiscutivelmente apegado ao que se fazia em Oviedo e terras da Galiza, mas que, como ele sublinhava atroador e abaritonado, era ali que estava o bilhete de identidade do nosso perdurável sentimento religioso. Por isso se foi a Bravães e no dia de hoje passeei por Ponte de Lima acenando-lhe entre o céu enevoado.

Um abraço do
Mário


No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (4)

Mário Beja Santos

Saí do arraial minhoto de Ponte da Barca, o fito é a Igreja de S. Salvador de Bravães, fundada entre 1080 e 1125, terá sido templo de um pequeno mosteiro rural beneditino, e mais tarde dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, que terão construído o edifício atual. Não esqueço a importância que lhe conferia o professor de História de Arte em Portugal, Jorge Heitor Pais da Silva, um comunicador espantoso, naqueles anos em que se mostravam slides. Ele explicava acessivelmente o Primeiro Românico, a partir do século IX, associado à Reconquista Cristã, a disseminação dos templos pelas terras portucalenses, a arquitetura da Reconquista, a singeleza da pedra, a escultura e a tumulária, a importância dos monges cavaleiros, como, na rudeza das tomas e retomas de território se impunha uma arquitetura onde o modelo básico da igreja era o basilical. E no caso português, este saudoso mestre ia direito ao Alto Minho, à bacia do Lima, e à importância estratégica de ligar Braga a Compostela. E a sua voz abaritonada subia de volume e entusiasmo quando nos mostrava Bravães.





Agora socorro-me do que se pode ler no primeiro volume da sua História de Arte Portuguesa, Círculo de Leitores, 1995, coordenado pelo historiador Paulo Pereira: “Com uma estrutura arquitetónica de grande simplicidade, é composta por uma só nave e capela-mor rectangulares, sendo de maiores dimensões a primeira, ambas cobertas por teto de madeira. A escultura ornamental encontra-se concentrada na porta principal, inserido num corpo avançado, constituindo um dos mais importantes programas iconográficos do românico português. Nos colunelos, o destaque vai para a representação da cena da Anunciação, com duas grandes estátuas-colunas figurando a Virgem e o Arcanjo S. Gabriel. As restantes colunas são preenchidas com motivos geométricos e zoomórficos, sendo particularmente interessantes os chacais e, sobretudo, o curioso entrançado formado pelas serpentes”.



Porta lateral

Porta lateral

O historiador Paulo Pereira analisa cuidadosamente os conteúdos escultóricos românicos, o Cordeiro de Deus, figuração simbólica do Cristo imolado, os leões, as serpentes (estas representam as forças primordiais/vitais existentes na natureza e que o homem tanto teme); mas também os leões-atlantes, o sol e a lua, a expressão do ser humano, a simbologia dos vícios e virtudes, o uso de pássaros afrontados e de todas as remissões que conduzam à devoção. Contempla-se Bravães, sente-se o berço da nacionalidade, a crença no divino nesta entrada fulgurante do românico português, marcador da nossa identidade. Debruço-me sobre uma inscrição indecifrável, a ver se encontro obra que me diga alguma coisa, regresso ao epicentro desta viagem que teve a sua razão de ser na homenagem que pretendo prestar a um limiano orgulhoso das suas origens, Carlos Miguel de Abreu de Lima de Araújo. À chegada, apeteceu passar pela ponte até Arcozelo, houve mesmo vontade de voltar ao carro para visitar as igrejas românicas de Ponte de Lima, Santo Abdão, na Correlhã, Espírito Santo, em Moreira e Santa Eulália em Refoios, talvez fique para mais tarde quando se organizar a visita ao património religioso da vila e da Além da Ponte. Mas não, vou até ao pelourinho de Ponte de Lima.


O pelourinho existia no areal do Rio Lima, símbolo do poder absolutista, estava fora das muralhas. Ganharam os liberais, foi transferido para a Praça da Rainha, seguiu-se um certo caos, houve dispersão dos elementos, a base e as pedras da plataforma foram utilizadas no passeio, o fuste numa hospedaria, o capitel no pátio interior do Asilo D. Maria Pia, o escudo na Fonte do Largo de S. João e a esfera armilar perdeu-se, só em 1936 se fabricou a atual estrutura. Independentemente de todas estas peripécias, há que reconhecer que é muito belo nas suas feições oitocentistas, destacando-se na parte frontal o “corpo de cantaria com escada de dois braços, de acesso ao segundo piso, rasgado inferiormente por vão em arco de volta perfeita”.


Regresso ao meu alojamento para arrumar tarecos, chuviscou e parece que a luminosidade nos transporta ao tempo medieval, não é verdade mas marca os contornos, vinca as linhas dos edifícios, o lajedo rebrilha, é uma consolação para o olhar, escolhem-se dois ângulos possíveis, para mim são impressíveis imagens que não gostaria de esquecer desta peregrinação, olho para aquele enevoado tão típico da terra minhota, e comovo-me.



Ponte de Lima tem lugar ímpar no conjunto dos solares de Portugal. Consegui um mapa que vai de Melgaço às Calhetas de S. Miguel. A parte de leão está na vila mais antiga de Portugal, a saber: Casa da Várzea, Casa do Barreiro, Casa do Crasto, Paço de Calheiros, Quinta da Aldeia, Casa de S. Gonçalo, Casa do Outeiro, Casa do Anquião, Quinta da Roseira, Quinta da Agra, Casa das Torres, Quinta de Santa Baía, Quinta do Casal do Condado, Quinta do Rei, Casa da Lage. Estamos a falar de solares que permitem alojamento, outras casas há que estão abertas ao público, e são solarengas, mas só se pode visitar o interior e os jardins. É o que se passa com a Casa de Nossa Senhora de Aurora, que mais tarde irei visitar. É esta profusão de solares, alguns deles palácios na verdadeira acessão da palavra, convocam o ouro e o açúcar vindos do Brasil, sobretudo nos séculos XVII e XVIII. E daí a espantosa profusão de brasões, não deve haver vila portuguesa com tanta presença fidalga.


O General Norton de Matos (1867-1955) era limiano, aqui nado e falecido. O seu pai era fidalgo da Casa Real e cônsul da Grã-Bretanha e Irlanda em Viana do Castelo. Militar com uma invejável folha de serviços, ministro e governador de Angola, onde passou a figurar na História, membro proeminente da Maçonaria e candidato presidencial pela oposição nas eleições de 1949, desistiu perante a patente falta de condições democrática. Não esquecer que também vinha aqui na mira de encontrar camélias floridas, deu gosto ver o destemido militar perto de uma cameleira simultaneamente viçosa e fenecente.


Ali perto do busto do General Norton de Matos está uma mansão que é um verdadeiro compósito de castelo e murada, seguramente que o proprietário gostava do neogótico, de merlões e seteiras e despendeu bom dinheiro pondo granito a toda a altura num edifício neorromântico e com pozinhos de Arte Nova. Era irresistível não ficar fascinado pela bizarria.


Quem diz solares barrocos não deve esquecer as capelas e outros templos religiosos, é caso da chamada Capela das Pereiras que se ergueu junto das muralhas, sofreu muito com o terramoto e ali está, no alto da escadaria, a falar forte e feio de traça barroco. Havia a sugestão de visitar o seu interior, no restauro foi encontrada pintura primitiva, encontrei sempre a capela fechada, mas fiquei muito satisfeito com esta imponência e a tocante discrição dos elementos escultóricos. Por hoje basta, estou ansioso por um bom caldo verde e um pãozinho com presunto, e acabar o dia despegado a ver correr as águas do Lima entre os focos de luz. Amanhã também é dia, vou passarinhar por aqui, ver se encontro um antigo combatente da Guiné e passear-me entre camélias.


(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 22 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21281: Os nossos seres, saberes e lazeres (407): No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (3) (Mário Beja Santos)

sábado, 22 de agosto de 2020

Guiné 61/74 - P21281: Os nossos seres, saberes e lazeres (407): No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (3) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Março de 2020:

Queridos amigos,
Hoje é dia da primeira saída de Ponte de Lima. É uma estranha sensação ter andado catorze anos a ler periodicamente os jornais de Viana, Ponte da Barca ou de Arcos de Valdevez, entre outros, tudo esmiuçado, até a necrologia, sempre que se falava numa publicação, havia que fazer um telefonema para encomendar a obra, o primo em Viana do Carlos Miguel ficava responsável pelo caudal das compras, casos havia em que eu telefonava para bibliotecas e arquivos, começava um tempo de impaciência até chegarem as obras, tudo quanto se publicava sobre o Alto Minho tinha prioridade.
O Carlos Miguel tinha os seus ciclos nostálgicos, umas vezes dizia-me que não queria morrer sem que lêssemos certas obras, a tudo eu dizia que sim, e lembro-me perfeitamente de um dia ele me ter dito que já não sabia onde tinha posto a Casa Grande de Romarigães, de Aquilino Ribeiro, perguntei-lhe se achava bem a minha edição com ilustrações de João Abel Manta, estou ainda a vê-lo com uma pose quase religiosa quando comecei: "Quando se procedeu ao restauro da casa grande, que foi solar dos Meneses e Montenegros, houve que demolir paredes de côvado e meio de bitola em que há um século lavrava a ruína, ocasionando-lhes fendas por onde entravam os andorinhões de asas abertas e desníveis com tal bojo que a derrocada parecia por horas. Num armário, não maior que o nicho de um santo, embutido na ombreira da janela, que a portada, em geral aberta, dissimulava atrás de si, encontrou-se uma volumosa rima de papéis velhos".
E começou uma nova saga de leitura, peripécia vivida ali para os lados de Paredes de Coura.

Um abraço do
Mário


No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (3)

Mário Beja Santos

Hoje é dia de Ponta da Barca, mas sem ir ao Lindoso. Dentre as assinaturas que o meu saudoso amigo Carlos Miguel de Abreu de Lima de Araújo fazia de jornais de imprensa regional constava o Notícias da Barca, que lhe lia religiosamente quando chegava. Não é a primeira vez que venho à região, em férias no Gerês era inevitável passar pelo Soajo e, sempre que possível, parar aqui para admirar a ponte e o casco histórico em Alto Minho, Carlos Ferreira de Almeida refere: “Rústico, montanhês, mas também fidalgo, o concelho de Ponte da Barca tem uma curiosa evolução. Na Idade Média, quando o transporte fluvial no Lima era relativamente intenso, Barca era, a jusante, o último embarcadouro possível. Desde a foz até aqui, o rio desliza, brando, serpenteando entre margens de salgueiros e bancos de areia. Daqui para montante, o Lima corre em leito geralmente baixo, com bastantes pedras e saltando de degrau em degrau”. Agora percebe-se como é itinerário apetecível para a lampreia. Tudo foi feito para aqui amesendar, o dia está relativamente acinzentado, para fazer horas para o almoço e despertar o apetite nada melhor que subir a ladeira e descer até ao rio. Se é verdade que o lugar relevante do seu património vai para a ponte, há muito a ganhar em visitar a Matriz, deve o seu risco ao engenheiro vianês Manuel Pinto de Vilalobos, harmoniosamente posicionada, com escadaria monumental, capelas laterais, valioso recheio, altar-mor rococó e cá fora brasão. Antes de lá chegar deu-se com quinta fidalga, coisa que não é nada incomum por estas bandas.






Ferreira de Almeida, muito curiosamente, entronca a vida rural circunvizinha a este casco histórico, os Paços do Concelho, dos meados do século XVIII, a Casa dos Farias, com muro fronteiro, ameado e brasonado, e a Casa de Santo António, edifício da segunda metade de 700, dotado de uma bela fachada e capela lateral com retábulo da época. É sabido que há farta discussão sobre a terra-berço de Diogo Bernardes, há a crença de que o bardo, figura-suprema do bucolismo, nasceu na margem direita do Lima, numa casa pertencente à família dos Pimentas, a Casa da Prova de Baixo e a da Prova de Cima, à cautela, e por pura ignorância na matéria, abstenho-me de comentários, seja o que Deus quiser. Segue o passeio e encontram-se belos azulejos a decorar o portão de casa da vila, irresistível não captar a imagem pela elegância dos desenhos e cores. E fica-se especado a contemplar a Capela de Nossa Senhora da Lapa, lá está bem à vista o brasão de armas dos Magalhães, confrange o mau estado relativo deste templo que transita do maneirismo para o barroco, paciência, é elegante e um dia terá obras.



Desce-se até à ponte, e dá-se a palavra ao que escreve Carlos Ferreira de Almeida: “A ponte tem um lugar relevante por ser, no género, uma das mais notáveis obras construídas no Portugal medieval. Ela é um singularíssimo exemplo de quanto uma arquitetura modifica uma paisagem que lhe cria novos volumes e outros pontos referenciais. Aí, nada ficou igual depois da sua construção. Com perto de duzentos metros de comprido de dez amplos arcos, apoiados em fortes pilares com talha-mares, conservando a altura dos primeiros templos, esta obra teve duas grandes reformas, uma nos fins do século XIX que visou o alargamento do seu piso e outra, em 1761, reconstruiu e modificou os dois arcos centrais. Da construção medieval conservam-se oito arcadas, ligeiramente quebradas. São as que se apoiam nos pilares que apresentam olhais. Foi, sem dúvida, uma obra inspirada no prestigiado modelo da de Ponte de Lima”.




Ponte da Barca tem, desde o século XVIII, feira quinzenal, que alterna com a dos Arcos de Valdevez. Junto da ponte há um edifício icónico que alguém da terra disse ser conhecido pelo velho mercado. O que importa é que está muito bem requalificado, e ali bem perto desponta, bem garboso, o pelourinho. Não deixa de ser curioso quando andei a arrecadar literatura avulsa sobre o verdejante Alto Minho encontrei uma brochura alusiva em que era o castelo de Lindoso a proposta mais apetecível para fazer turismo. Será, a visita fica para a próxima, o próximo agora é ir para a mesa e saborear rojões, à tarde quero passar por Bravães e mais alguma coisa, o meu saudoso amigo disse-me um dia que é preciso olhar para Bravães para perceber o sentimento português. Assim seja.


Imagine o leitor, e tome isto como ciência certa, que após o obrigatório caldo verde e a pratada de rojões e um café abagaçado para esmoer as banhas da fritura, se veio para a rua para passeio pedestre à beira Lima e seguir para outras paragens. A roda do destino trocou as voltas, andava-se por ali naquela amenidade a ouvir as águas revoltas do Lima quando se começaram a soltar as notas das concertinas, era festa rija com certeza, talvez romaria ou filarmónica a desfilar. Fui ver, e dali não saí e uma hora passou veloz. Não se percebe o minhoto sem a música e o baile. No interior da farta tenda concentrava-se no centro, em círculo, os mestres da concertina, jovens e adultos de diferentes idades, viola e creio que um reco-reco. A alegria dos bailantes era esfusiante. Como quem não sabe é como quem não vê, cheguei-me a alguém que era nitidamente da terra e que cumprimentava, prazenteiro, quem chegava e quem partia. Que festa era aquela, seria o orago da terra, quando se realizavam os bailes e outras perguntas adjuvantes. O dito senhor mirou o forasteiro e deu-lhe as seguintes explicações ou coisa parecida: “Meu caro senhor, o minhoto sem bailarico não pode andar alegre. O que aqui vê acontece todos os domingos, começa por esta hora e vai até os músicos e os bailantes se cansarem. Está-nos na alma este ritmo, este modo de dar ao corpo, temos diferentes modalidades de música folclórica, dança-se aos pares, as concertinas aceleram e anda tudo num rodopio. Onde há minhoto há concertina, temos ranchos folclóricos em todas as povoações, a música está-nos no sangue”. E ali estive, compartilhando à distância o que de vibrante há nos sentimentos lúdicos minhotos. E agora, não sem algum pesar, deixa-se esta festa para ir até Bravães, convém não esquecer que esta rota de saudade tem por mercê um limiano, um tanto vianês, que amou o seu terrunho até ao último dia da sua vida, e de quem fui cúmplice catorze anos a fio, lendo-lhe os jornais, os livros, as revistas, e ele escutava, fazia comentários, regressava até à Casa da Feitosa, guardava infinitas saudades, as tias, os primos, a consoada. E a viagem prossegue.


(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 15 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21256: Os nossos seres, saberes e lazeres (406): No Alto Minho, lancei âncora na Ribeira Lima (2) (Mário Beja Santos)

domingo, 3 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14560: Blogpoesia (414): do alto Minho... a Berlim, de regresso a casa (J. L. Mendes Gomes, ex-alf mil, CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66)


Lisboa > Livraria Bar Les Enfants Terribles > Cinema King > 2 de novembro de 2013 > 19h00 > Sessão de lançamento do livro de poesia do nosso camarada J. L. Mendes Gomes, "Baladas de Berlim"  (Lisboa, Chiado Editora, 2013) > Da esquerda para a direita: Luís Graça, que apresentou o livro: o autor e o seu filho mais velho, Paulo Teia, padre jesuíta, que apresentou o pai e o poeta; e ainda a representante da Chiado Editora...

Foto: © Virgínio Briote (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]


Berlim > 2012 > Joaqum Luis Mendes Gomes,  com dois dos seus netos


Foto: © J. L. Mendes Gomes (2012). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]




Leiria > Monte Real > Palace Hotel Monte Real > X Encontro Nacional da Tabanca Grande > 18 de abril de 2015 > Ao centro, o Jorge Rosales, "régulo" da Tabanca da Linha, tendo à sua esquerda o seu solícito e competente "secretário", o "pira" Zé Dinis... À ponta esquerda, o nosso poeta J. L. Mendes Gomes  que nos deu este ano a alegria da sua presença. Tem casa em Mafra mas mora, uma boa parte do ano, em Berlim... Entre ele e o Rosales, o mais veterano dos três, o José Augusto Ribeiro...

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados

alto minho...

subi às terras altas do alto minho,
cada vez mais verdes,
cheias de rochas e de castelos,
igrejas brancas
e campanários.

onde o vinho cresce enforcado por estas gentes pacatas
e derrama a sua bênção
lá por volta do mês de agosto.
e uma manta alta de pinheiros bravios
se estende abundante
por essas encostas serranas.

e há rios caudalosos,
minho, lima, cávado e ave,
descendo em correrias,
lá das montanhas,
serpenteando campos
e vinhedos,
em busca do mar.

onde havia mulheres tão atentas e corajosas,
como a maria da fonte,
fazendo frente
e pondo na ordem
os desacatos loucos
desses políticos.

onde vive um povo alegre
e trabalhador,
que enxameia de festas e romarias,
a temporada fértil
do estio e do outono...

onde portugal se enlaça a espanha,
pelo norte e pelo leste.

póvoa de lanhoso, 

na casa do meu irmão, 
11 de Abril de 2015
4h36m

ouvindo "nocturnos" de chopin

Joaquim Luís Mendes Gomes


desabafo

cheguei de novo a berlim, 

deixei-a despida, gelada e triste,
encontrei-a verde, 
recheada de arvoredo,
denso e gigantesco,
entrelaçando as casas. 

um céu azul e luminoso,
um fervilhar de gente alegre e descontraída a passear na rua,
nada de stresses,
vivendo a vida em festa.

desigualdades, aqui não há. 
toda a gente igual
e trabalha, 
cada um faz bem o que sabe e que é capaz. 
toda a gente dorme descansada...

como gostaria eu que o meu portugal,
que é tão lindo e rico, 
vivesse igual. 
mas não,
há uma casta de privilegiados,
parasitas e oportunistas,
uma dúzia só... 
que os explora. 
desenfreadamente. 
como uns selvagens... 
apoderaram-se do poder. 
e, pasme-se!, pela via democrática!...
que terrível paradoxo. 
que ninguém desata...

aqui há ordem, 
respeito das regras. 
tudo funciona perfeito,
desde as escolas, tribunais e aos hospitais. 
cada um tem sua vez. 
e não espera muito. 
o estado se preocupa, se antecipa 
na solução dos problemas dos seus cidadãos.
uma verdadeira sinfonia,
com bons maestros. ...
e não estou a exagerar nem a fantasiar.

berlim, 3 de maio, 11h45

[ex-Alf Mil, CCAÇ 728, 
Cachil, Catió e Bissau, 1964/66]

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Nota do editor:

Último poste da série > 3 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14559: Blogpoesia (413): No dia em que se lembram todas as Mães, um poema do nosso camarada Domingos Gonçalves, ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887 (Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68)

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6751: (In)citações (1): O tocador de harmónica de Guileje (Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento)

 



Vídeo (''52):  Tocador de Harmónica. Antigo milícia, ao tempo do abandono do aquartelamento pelo Exército Português, em 22 de Maio de 1973. Museu de Guileje (em construção), finais da época das chuvas, 2009. Também podes visualizar aqui.

 

Vídeo (''47): Tocador de Harmónica. Antigo milícia, ao tempo do abandono do aquartelamento pelo Exército Português, em 22 de Maio de 1973. Museu de Guileje (em construção), finais da época das chuvas, 2009. Também podes visualizar aqui.


Vídeos alojados em You Tube > Nhabijoes (2010): © AD - Acção para o Desenvolvimento  (2009) / Blogue Luís Graça  & Camaradas da Guiné (2010). Direitos reservados



1. O Pepito deixou-me há uns meses atrás um CD com seis vídeos, quatro dos quais com actuações de um tocador de harmónica (ou gaita-de-beiços) que executa de cor músicas portuguesas, ouvidas no tempo da guerra colonial. Não tenho o seu nome, ou melhor, tenho-o registado algures. Era mílicia ao tempo da CCAV 8350 (Piratas de Guileje, 1972/73).  A gravação foi feita frente ao Museu de Guileje,  em Guileje, em finais da estação das chuvas de 2009, se não me engano.

Dois outros vídeos mostram uma lavadeira desse tempo a cantar uma música dos tugas (5º vídeo), e um par a dançar, frente ao museu (6º vídeo). Por razões técnicas, só consegui até agora carregar os dois primeiros vídeos na nossa conta (Nhabijoes) no You Tube.  Espero que os nossos leitores apreciem e comentem. Os nossos agradecimentos ao Pepito, com o pedido expresso de, um dia destes, transmitir ao artista o nosso apreço e a nossa admiração pela sua espantosa memória musical.  E, já agora, Pepito, na volta do correio (que é como quem diz, quando visualizares os vídeos), diz-nos o nome do tocador e confirma ou não as informações aqui prestadas...

É natural que haja imprecisões, na minha legenda e nos meu comentário, mas o que me apraz registar é este momento, único, surpreendente e até tocante, em que um amigo guineense desconhecido nos presta,  a todos nós, uma pequena homenagem... Claro que isto é um fenómeno de aculturação (antecipando-me à lição de sapiência dos doutos...),  resultado de um convívio estreito, de largos anos, entre homens que estiveram juntos na mesma guerra, embora (é bom nunca esquecê-lo) étnica, linguística, mental, social e culturalmente separados por muita coisa... A música tem um tremendo poder encantatório e até identitário...

Damos aqui lugar a uma nova série, (In)citações, que é uma espécie de contraponto às (Ex)citações... Espero poder publicar nesta nova série vídeos e outros materiais dos nossos amigos e camaradas guineenses...

Já recuperámos, aqui, a letra desta canção popular portuguesa, minhota, que as nossas avós, tias e mães cantarolavam:

Letra: Popular

(Refrão)

Todos me querem,
eu quero só um,
quero o meu amor,
não quero mais nenhum.

Todos me querem,
eu quero alguém,
quero o meu amor,
não quero mais ninguém.

Quero, eu quero,
eu quero, eu quero,
Amanhã vou me casar,
Já passei a roupa a ferro.

Já passei a roupa a ferro,
já passei o meu vestido,
Amanhã vou-me casar
e o Manel é meu marido

(Refrão)

Todos me querem,
eu quero só um,
quero o meu amor,
não quero mais nenhum.

Todos me querem,
eu quero alguém,
quero o meu amor,
ñão quero mais ninguém.

O Manel é meu marido,
O Manel é quem me adora,
O Manel é que me leva
da minha casa p'ra fora.

(Refrão) (...)


Da minha casa p'ra fora,
da minha casa p'ra dentro,
O Manel é quem me leva
no dia do casamento.

(Refrão) (...)

Digo adeus à Serra d'Arga,
Digo adeus a S. Lourenço,
Não te digo adeus a ti,
Porque sabes o que penso.

Refrão (...)