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segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18312: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capítulos 26 (O primeiro castigo no mato) e 27 (O paludismo)


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > O 1º cabo cond autor José Claudino da Silva, ostentando um bigode que não era "regulamentar"...

Foto (e legenda): © José Claudino da Silva (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Continuação da pré-publicação do próximo livro (na versão manuscrita, "Em Nome da Pátria") do nosso camarada José Claudino Silva [foto atual à esquerda]

Nasceu em Penafiel, em 1950, foi criado pela avó materna, reside hoje na Lixa, Felgueiras. Tem orgulho na sua profissão: bate-chapas, agora reformado. Tem o 12.º ano de escolaridade. 

Foi um "homem que se fez a si próprio", sendo já autor de dois livros, publicados (um de poesia e outro de ficção). Tem página no Facebook: é avô e está a animar o projeto "Bosque dos Avós", na Serra do Marão, em Amarante.  É membro n.º 756 da nossa Tabanca Grande.

Sinopse:

(i) foi à inspeção em 27 de junho de 1970, e começou a fazer a recruta, no dia 3 de janeiro de 1972, no CICA 1 [Centro de Instrução de Condutores Auto-rodas], no Porto, junto ao palácio de Cristal;
(ii) escreveu a sua primeira carta em 4 de janeiro de 1972, na recruta, no Porto; foi guia ocasional, para os camaradas que vinham de fora e queriam conhecer a cidade, da Via Norte à Rua Escura.

(iii) passou pelo Regimento de Cavalaria 6, depois da recruta; promovido a 1.º cabo condutor autorrodas, será colocado em Penafiel, e daqui é mobilizado para a Guiné, fazendo parte da 3.ª CART / BART 6250 (Fulacunda, 1972/74);

(iv) chegada à Bissalanca, em 26/6/1972, a bordo de um Boeing dos TAM - Transportes Aéreos Militares; faz a IAO no quartel do Cumeré;

(v) no dia 2 de julho de 1972, domingo, tem licença para ir visitar Bissau,

(vi) fica mais uns tempos em Bissau para um tirar um curso de especialista em Berliet;

(vii) um mês depois, parte para Bolama onde se junta aos seus camaradas companhia; partida em duas LDM parea Fulacunda; são "praxados" pelos 'velhinhos', os 'Capicuas", da CART 2772;

(viii) faz a primeira coluna auto até à foz do Rio Fulacunda, onde de 15 em 15 dias a companhia era abastecida por LDM ou LDP; escreve e lê as cartas e os aerogramas de muitos dos seus camaradas analfabetos;

(ix) é "promovido" pelo 1.º sargento a cabo dos reabastecimentos, o que lhe dá alguns pequenos privilégio como o de aprender a datilografar... e a "ter jipe";

(x) a 'herança' dos 'velhinhos' da CART 2772, "Os Capicuas", que deixam Fulacunda; o Dino partilha um quarto de 3 x 2 m, com mais 3 camaradas, "Os Mórmones de Fulacunda";

(xi) Dino, o "cabo de reabastecimentos", o "dono da loja", tem que aprender a lidar com as "diferenças de estatuto", resultantes da hierarquia militar: todos eram clientes da "loja", e todos eram iguais, mas uns mais iguais do que outros, por causa das "divisas"... e dos "galões"...

(xii) faz contas à vida e ao "patacão", de modo a poder casar-se logo que passe à peluda;

(xiii) ao fim de três meses, está a escrever 30/40 cartas e aerogram as por mês; inicialmente eram 80/100; e descobre o sentido (e a importância) da camaradagem em tempo de guerra.

(xiv) como "responsável" pelo reabastecimento não quer que falte a cerveja ao pessoal: em outubro de 1972, o consumo (quinzenal) era já de 6 mil garrafas; ouve dizer, pela primeira vez, na rádio clandestina, que éramos todos colonialistas e que o governo português era fascista; sente-se chocado;

(xv) fica revoltado por o seu camarada responsável pela cantina, e como ele 1º cabo condutor auto, ter apanhado 10 dias de detenção por uma questão de "lana caprina": é o primeiro castigo no mato...; por outro lado, apanha o paludismo, perde 7 quilos, tem 41 graus de febre, conhece a solidariedade dos camaradas e está grato à competência e desvelo do pessoal de saúde da companhia.


2. Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capºs 26 e 27


[O autor faz questão de não corrigir os excertos que transcreve, das cartas e aerogramas que começou a escrever na tropa e depois no CTIG à sua futura esposa. Esses excertos vêm a negrito. O livro, que tinha originalmente como título "Em Nome da Pátria", passa a chamar-se "Ai, Dino, o que te fizeram!", frase dita pela avó materna do autor, quando o viu fardado pela primeira vez. Foi ela, de resto, quem o criou. ]


26º Capítulo  > O PRIMEIRO CASTIGO NO MATO 

[O capº 25 -  As Mensagens Natalícias - já aqui foi reproduzido em poste de 22 de dezembro último (**)]

No dia 25 de Abril de 2017, para comemorar o dia da liberdade, fui convidado a discursar, perante uma plateia onde até deputados do parlamento europeu marcaram presença, além de outras ilustres figuras da política, da arte e da cultura de Portugal. As minhas primeiras palavras foram: - Olho para vós e tenho a sensação de que estou ao mesmo nível de todos. É isso que nos permite a democracia. Sermos todos iguais.

No dia 25 de Outubro de 1972, o 1º cabo condutor, (éramos dois) encarregado da cantina, soube qual o castigo que apanhou: 10 (DEZ) dias de detenção.

As funções dele eram a de servir os camaradas com os produtos existentes na cantina e também a população civil. Não me perguntem porquê, mas regras ditavam que na cantina não se podia estar com a cabeça tapada. Em contrapartida, fora da cantina não podíamos andar de cabeça destapada.

Querem saber qual foi o crime? O 1º cabo exigiu a um dos senhores Alferes que tirasse a boina da cabeça. Fez isso sem estar em sentido e sem pedir por favor. O senhor Alferes participou o sucedido ao comandante que, muito ao jeito dos militares, ajuizou e condenou o pobre 1º cabo.

Parece-lhes ridículo? Eu já tivera um castigo na Metrópole, embora muito mais leve, por assobiar. Enchera 20 flexões.

O meu colega estava-se nas tintas para os 10 dias de detenção; tínhamos sido todos condenados a um exílio, num presídio penitenciário, por dois anos, só que o castigo impedir-nos-ia, no caso de o pretendermos, passar o mês de férias a que tínhamos direito, ao fim de um ano de comissão, na Metrópole.

Não será necessário afirmar que a disciplina, mesmo naqueles confins do mundo, era duma exigência tal que torturava. Admito que com o decorrer do tempo foi aliviando um pouco mas, nos primeiros meses, até formatura diária era obrigatória, com o uniforme completo e a barba feita. Arrotava-se de náusea.

Como já frisei, tinha deixado crescer bigode, porém, como na foto da caderneta militar tal não constava, fui obrigado a cortá-lo ou teria de fazer um requerimento superior.

Aproveito para lhes contar um caso divertido, precisamente com a caderneta. Não podendo usar bigode, interroguei o capitão se podia ter a altura que tenho, ou se deveria usar a que a caderneta mencionava. É que eu meço um metro e setenta e seis e na caderneta consta que meço um metro e meio. Não me proibiu de usar a minha altura real.

Juro que nos encontros anuais de ex-combatentes, já me apeteceu enfiar um barrete na cabeça do ex-alferes mas ele iria dizer-me que eram outros tempos e só cumpriu ordens. Era assim, por muito estúpidas que as ordens fossem.


27º Capítulo  > O PALUDISMO


Não acreditei minimamente no que tinha escrito quando, após estes anos, li que tinha passado de 63 para 58 quilos em quatro dias e acreditei menos quando também li que tinha atingido 41 graus de febre.

Está ali escarrapachado na carta:

“Apanhei o paludismo, nem tenho forças para escrever! – Não digas à minha avó” - dizia eu.

Dois dias depois, já pesava apenas 56 quilos. Isto estava a ficar complicado.

Acreditem que já vários colegas que tinham estado com essa doença, alguns dos quais, como também já vos disse, por serem analfabetos era eu que escrevia por eles, me proibiam que dissesse aos familiares, principalmente pais, algo que fosse grave e que os pudesse afligir.

Tínhamos consciência de que eles nada poderiam fazer para nos ajudar,  por isso, para quê atormentá-los com os nossos problemas?

Era, pois, natural que até nesse aspecto tenhamos aprendido a contar com a lealdade de uns para com os outros, e, mais uma vez, tive sorte.

O Leal e o Moreira cuidaram de mim, alimentando-me o melhor que puderam. Também o Lopes, enfermeiro, dos poucos alentejanos da companhia, que desviava vitaminas para mim e me obrigava a tomar MILO. No batalhão, tínhamos um excelente médico que vinha de 15 em 15 dias, e enfermeiros que faziam da sua profissão uma missão de coragem, de abnegação e sacrifício, em nome de todos nós. Enfermeiros que participavam nas operações no terreno, que além das armas e munições, para sua defesa, tinham de carregar a pesada mochila de medicamentos e que, em caso de ataque, pura e simplesmente não se podiam abrigar, pois tinham de socorrer os feridos. Eram esses os nossos anjos brancos, embora nos tratassem com o camuflado vestido. 

O paludismo não me venceu nem a nenhum dos soldados da companhia. Recordo que até esta data dois colegas já tinham sido evacuados por contraírem hepatite. Dizia-se que tinham feito de propósito para adoecerem. Não acredito

Agradeço aos meus amigos e à magnífica equipa de saúde da minha companhia que, por vezes, e em circunstâncias extremas, socorreram e trataram, com uma sensibilidade fora do comum, todos, e creio que fomos mesmo todos, que em algum momento daqueles dois anos precisaram dos seus serviços. Ficámos a dever-vos ser mesmo muito amigos.

[Continua]
_______________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 3 de fevereiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18280: Ai, Dino, o que te fizeram!... Memórias de José Claudino da Silva, ex-1.º cabo cond auto, 3.ª CART / BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Capítulos 23 e 24: A partir de outubro de 1972, aumentei a requisição (quinzenal) de cervejas: de 5 ml para 6 mil... Por outro lado, fiquei chocado quando pela primeira vez ouvi dizer que éramos colonialistas...

(**) Vd. poste de 22 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18122: O meu Natal no mato (43): as mensagens natalícias de 1972, gravadas pela RTP a 23 de outubro... E se a gente morresse, entretanto ?...Como não tinha pai nem vivia com a minha mãe ou com os meus irmãos, tive de dizer “querida avó” e mais umas balelas obrigatórias... (José Claudino da Silva, ex-1º cabo cond auto, 3ª CART / BART 6520/72, Fulacunda, 1972/74)



quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16615: O que é feito de ti, camarada ? (6): Carlos Filipe Coelho (ex-Soldado Radiomontador, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74)... Um resistente, duplamente resistente... Faz hoje anos... Parabéns, amigo, e até sempre! (Juvenal Amado)



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L5 > Galomaro > CCS/BCAÇ (Galomaro, 1972/74) > Carlos Filipe, radiomontador, à civil... Um homem gentil que aqui aprendeu a amar aquela terra e aquela gente...




A caminho da Guiné, num dos navios da nossa marinha mercante, o "Angra do Heroísmo", que largou do Tejo em 18/12/1971, cheio que nem um ovo...

Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L5 > Galomaro > CCS/BCAÇ (Galomaro, 1972/74) > Carlos Filipe, radiomontador, uma especialidade pouco usual...



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Setor L5 > Galomaro > CCS/BCAÇ (Galomaro, 1972/74) > Carlos Filipe, radiomontador 




Guiné > Bissau > Hospital Militar 241 > O Carlos Filipe, radiomontador, da CCS/BCAÇ (Galomaro, 1972/74) esteve internado 32 dias em Bissau, antes de ser evacuado, com hepatite,  para o Hospital Militar da Estrela em Lisboa, onde esteve 173 dias.


Fotos © Juvenal Amado (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1.  Mensagem, com data de 9 do corrente, do  Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas,  CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74; autor de "A Tropa Vai Fazer De Ti Um Homem - Guiné, 1971 - 1974"  (Lisboa: Chiado Editora, 2015, 308 pp.)


Carlos,  mando aqui alguma coisa escrita para o poste do Carlos Filipe. Também envio fotos que tenho dele e junto a talhe de foice,  porque falo do Jamba,  uma foto em que o Catroga trata do filho dele.

Um abraço, Juvenal
Encontramo-nos a miúde na Amadora [,onde vive, sozinho, viúvo, com uma filha a viver no Cacém, e doente, doente de longa duração, mas resistente...]

Bebemos um café numa esplanada muito agradável perto da casa dele. Falamos de tudo mas em especial da Guiné, da sua situação interna, da sua classe politica, do seu injustiçado e sofrido povo.

Não consegue esconder desgosto por ver o partido de Amilcar Cabral não ser melhor que os demais, depois de tantas lutas, também ele se afunda na corrupção, no lodo dos interesses instalados e dos que se querem instalar.

Soubemos há tempos que o quartel de Galomaro foi transformado em armazém serração, que faz parte da praga que abate as suas florestas e que por isso não se pode filmar nem fotografar. As provas do crime, aguardam por embarque para Bissau em Bambadinca, ou no Xime. No Geba,  rio que cruzamos cheios de dúvidas e ansiedades das chegadas e alegrias das partidas, cumprirão mais uma etapa que levará a madeira das milhares de árvores abatidas para a China.

Para trás fica a destruição do meio ambiente, a sua fauna e flora. A Guiné que nós conhecemos, é só um resquício na nossa memória, é como vermos alguém morrer jovem e belo, vamos sempre lembrá-lo assim.

Acabamos por lembrar Galomaro mais o Regála, o Jamba [, foto à esquerda,] que era do PAIGC na clandestinidade, andava dentro do quartel por onde queria e lhe apetecia, a alegria das lavadeiras, Bafatá com os seus restaurantes e o seu comércio vibrante, a piscina, a praça, os vendedores de óculos de sol e relógios das melhores marcas “suíças” que só trabalhavam o tempo de sair da cidade....

As loucuras dos almoços às 10 da manhã, com whisky e charutos para rematar, pois a coluna tinha que sair com o correio o mais tardar às 11,30. Bebíamos mais uma para a viagem no caminho já à saída de Bafatá à esquerda,  numa tasca que,  segundo diziam.  eram de um individuo de Alfeizerão, que jogava com um pau de dois bicos e nem um copo de água dava à malta. Mandava-nos ir beber ao poço e era se queríamos.

Carlos ri-se da minha forma de falar, relembrar,  e dos rodeios que faço para lá chegar. Há dias levei-lhe um emblema do nosso batalhão. Só para ver aquele olhar iluminar-se e aquele corpo magro que resiste ao sofrimento crescer um palmo, metaforicamente falando, valeu apena.

Telefonou-me no dia 4 deste mês e eu não dei por isso. Quando reparei telefonei-lhe logo mas já não me atendeu. Tenho-lhe telefonado todos os dias sem conseguir falar com ele. Não me admiro,  pois por vezes está semanas e meses sem falar comigo, até que um dia vejo que é ele,  atendo, fico a saber, pela sua voz sumida e fraca, que esteve internado, ou que a quimio o deitou abaixo de tal maneira que nem comer nem beber consegue.

Volto-me a encontrar com ele e lá voltamos à Guiné e ao blogue dele,  Bissau Resiste, onde ele se digladia com guineenses e não só, de tendências e religiões várias. Facto que lhe grajeia amigos e possivelmente mais inimigos.

Fico a pensar onde vai buscar semelhante força.

Não sei quando vou falar com ele novamente, não sei se lhe consigo dar os parabéns pelo seu aniversário pessoalmente, mas nem por isso quero deixar esquecido e vou beber um copo à sua resistência e força, que o faz vencer todos os dias mais um dia.

Parabéns, Carlos Filipe.  recebe um abraço deste teu camarada, que o 3872 juntou e a Guiné uniu.

Até sempre, amigo.

Juvenal


Um resistente: o Carlos Filipe Coelho (ex-soldado radiomontador, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74) ... Foto atual... Vive na Amadora, sozinho, viúvo, com uma filha a viver no Cacém, e doente, doente de longa duração, mas resistente, duplamente resistente, um lutador...Tem 22 referências no nosso blogue.... Mas no seu blogue, "Bissau Resiste", tem mais de 7 mil postes publicados, em 4 anos, desde meados de 2013...




Cabeçalho do blogue do Carlos Filipe, "Bissau Resiste", criado em agosto de 2013 e atualizado até ao início de outubro de 2016. Tem mais de 70 seguidores. O nº de postes anuais é notável:  2016 (926); 2015 (3215); 2014 (2391); 2013 (790).


 2. Comentário do editor:

Caro Juvenal, és um grande ser humano. O que fazes pelo teu (e nosso)  amigo e camarada, é digno de registo, é um exemplo para todos nós, É isso a camaradagem e a solidariedade humana. É também esse espírito da Tabanca Grande.

Sim, eu sabia que Carlos Filipe estava (ou esteve) doente, há uns anos atrás.  Mas não sabia era o resto da história nem lo prognóstico da doença...  Há estoicismo e dignidade na maneira como o Carlos tem enfrentado a adversidade e fintado a morte.

Se conseguires estar com ele,  hoje, no dia do seu aniversário natalício, dá-lhe um abraço, de todos nós,  do tamanho do poilão da Tabanca Grande e bebe um copo com ele, por ele, por ti  e por todos nós, que merecemos viver mais uns aninhos cá na terra, para compensar os que perdemos na guerra... Mesmo de muletas... por que como diz o provérbio popular "mais vale andar neste mundo de muletas  do que no outro em carretas"... (LG)
___________

terça-feira, 26 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P16018: Na festa dos 12 anos, "manga de tempo", do nosso blogue (1): Heróis de uma guerra que nunca existiu e que por isso, não vão ficar para a história: o Paranhos, o Pimentel, o Peniche, o Pinto e eu (Luís Graça)



Caldas da Rainha > RI 5 > Juramento de bandeira > 1968


Foto: © Abílio Duarte (2016). Todos os direitos reservados. [Edição. L.G.]



1. No dia 23 de abril de 2016, o nosso blogue fez 12 anos. Publicámos o nosso poste nº 1 em 23/4/2004. E depois desse mais de 16 mil. A efeméride não pode passar despercebida.


12 (doze!) anos é idade maior na Net (que nasceu no início dos anos 90 do século passado): com menos disso, já muitos blogues morreram.

12 (doze!) anos é "manga de tempo", dava para fazer 6 (seis!) comissões na Guiné, desde o princípio ao fim da guerra (1961/74).

12 (doze!) anos é cerca de um sétimo da esperança de vida (média) aos 65 anos, em 2012, de alguém, como eu, que tenha nascido em 1947.

Camaradas (e amigos/as):

12 (doze!) anos é "manga de tempo"!... Por isso, o 12º aniversário do nosso blogue merece ser comemorado, por muito cansados que estejamos da guerra, da vida e... do blogue!...

Traduzida em números, a atividade do nosso blogue representa:

(i) 16 mil postes;

(ii) 714 membros inscritos (formalmente na nossa Tabanca Grande, dos quais infelizmente 44 já morreram), oriundos dos mais diversos sítios onde vivem camaradas nossos (e também alguns amigos), da Austrália à América, da Suécia ao Brasil, de Paris ao Mindelo, de Viana do Castelo a Bissau, de Lisboa a Macau;

(iii) 700 álbuns, 59  mil imagens (, incluindo mais de 300 vídeos):

(iv) 63 mil comentários;

(v) 7,8 milhões de visualizaçõs de páginas;

(vi) 11 encontros nacionais, anuais, da Tabanca Grande, desde 2007, com cerca de dois mil inscritos;

(vii) e,  sobretudo,  muitas memórias e muitos afetos partilhados entre todos nós...


O blogue nasceu em 23/4/2004. E por essa altura eu escrevi, à laia de justificação para passar a dedicar o meu blogue pessoal (Blogue-Fora-Nada) unicamente à Guiné, à experiência (partilhada) da guerra na Guiné (primeiro circunscrita aos anos de 1969/71 e depois alargada, muito rapidamente, ao período de 1963/74):

"Trinta anos e tal anos depois. Para que não digam, os (por)tugas mais novos, que a Guiné nunca existiu. Que a guerra da Guiné nunca existiu. Ou que nunca ouviram falar da guerra colonial (em África). Uma guerra que marcou, se não um povo inteiro, pelo menos toda uma geração. A minha geração.

"Desenterro estes escritos, guardados no sótão da casa e sobretudo no sótão da memória, em homenagem a todos os que derramaram o seu sangue na Guiné, entre meados de 1969 e o 1º trimestre de 1971. Ou que deram o melhor da sua vida, a sua juventude, a sua generosidade, os seus sonhos, as suas ilusões. Pela Pátria, dizia-se então. Ou por nada, o que é pior.

"Há trinta e tal anos... Em homenagem aos que combateram, de um lado e de outro, nos três teatros de operações (Angola, Moçambique e Guiné). Em particular aos meus camaradas, portugueses e guineenses, da Companhia de Caçadores nº 12 (CCAÇ 12). Que se bateram com dignidade, bravura, galhardia e honra (mas também com ética!) na Zona Leste, Setor L1, da Guiné. (...)

"Há trinta e tal anos... Em homenagem também aos que fizeram o 25 de abril de 1974. Foi no meu tempo, na Guiné, entre os milicianos, que o moral das tropas começou a deteriorar-se. Inexoravelmente. E a contaminar os oficiais e os sargentos do quadro, já poucos, velhos e cansados. Por exemplo, em 26 de novembro de 1970, a escassos três meses da minha rendição individual e do meu regresso a casa, mandei impunemente à merda toda a hierarquia militar do aquartelamento de Bambadinca, do tenente-coronel aos majores e capitães, depois de termos sofrido um dos nossos piores reveses militares, a CCAÇ 12 e a CART 2714 [Companhia de Artilharia aquartelada no Xime], no decurso da Operação Abencerragem Candente: seis mortos e nove feridos...

"Tudo aconteceu por grave erro que na altura imputámos ao major, segundo comandante do BART 2917, um militarão de artilharia [, antigo professor da Academia Militar,] que não gozava da simpatia dos alferes e furriéis milicianos. Abreviando razões, o comandante da força, que integrava a fatídica Operação Abencerragem Candente (...), obrigara-nos a repetir o percurso de véspera (25 de novembro de 1970), a caminho da Ponta do Inglês (Região do Xime, na confluência dos Rios Geba e Corubal)... Contra as mais elementares regras de segurança militar! É que na Guiné bichos e homens sabiam que nunca se pisava duas vezes o mesmo trilho e nunca se bebia duas vezes a água do mesmo rio...

"Ainda recordo, com nitidez, as palavras que dirigi, depois do regresso a Bambadinca, na parada, alto e em bom som, frente às instalações do comando do BART  2917, utilizando a mesma linguagem de caserna com que me fizeram soldado à força (...): 'Assassinos, criminosos de guerra, limpo o cu às folhas do RDM [ Regulamento de Disciplina Militar]'...

"Podiam ter-me mandado prender por insubordinação, por grave infracção ao RDM, por crime de lesa-pátria... Não o fizeram, não tiveram coragem de o fazer: pediram apenas ao médico (miliciano) que me desse um Valium 10; o meu capitão, por seu turno, achava que eu andava muito cansado... Diagnóstico: distúrbio emocional, muito frequente na época entre as NT (nossas tropas).

"E no final da comissão fiz-lhes a história dos seus gloriosos feitos em combate. Deram-me um louvor, averbado na minha caderneta militar, pela qualidade e seriedade do meu trabalho ... jornalístico. Dei-lhes a volta e fiz a crónica da guerra, baseado em toda a informação classificada a que tive acesso, para além das minhas próprias memórias, já que também fui um operacional com intensa actividade (...).

"O acesso aos arquivos da CCAÇ 12/CCAÇ 2590 contou, naturalmente, com a cumplicidade de um dos sargentos do quadro. Um alentejano, de origem proletária, que meteu o chico (leia-se: seguiu a vida da tropa), e que me alcunhou carinhosamente de soviético ou camarada Sov, ao que julgo saber por eu ser do contra (...).

"Dezenas de exemplares da história da CCAÇ 12, tirados a stencil, acabaram por ser distribuídos pelos tugas da companhia ( e em particular pelos meus camaradas milicianos), chegando assim à Metropóle, mau grado as instruções do capitão que, aflito e em vésperas de ser promovido a major, a mandara classificar como documento reservado. Onde quer estejas, meu caro Sargento P[iça], vivo ou morto, eu ainda tenho uma dívida de gratidão para contigo! E do meu capitão, então com 37 anos, uma comissão na Índia e três em África, eu só posso dizer que era um bom homem e um bom portuga. "(...)


Camaradas e amigos/as: dou o pontapé de saída, com um texto que fui repescar ao meu já muito rapado baú... Cada um de vocês pode também contribuir, com textos, fotos e outros documentos inéditos (ou reformulados), para animar a Tabanca Grande e festejar os 12 (doze!) anos do nosso blogue. O administrador  deste condomínio (que não é fechado!) agradece!... LG



2. Heróis de um guerra que nunca existiu e que, por isso, não vão ficar para a história: o Paranhos, o Pimentel, o Peniche, o Pinto e eu


por Luís Graça (*)





– E no fim quem levou a taça foi o capitão!... Pelo menos, sabemos que chegou a general de duas estrelas, disse-me o Pinto...Paz à sua alma, no caso de já ter morrido! – ouviu-se a voz do Paranhos, à segunda rodada de espumante da Bairrada, com que acompanhávamos o leitão, num restaurante de beira de estrada, ali para os lados da Mealhada, na antiga estrada nacional nº 1.
– Em boa verdade, pouco se soube dele, depois do 25 de abril... Não deu nas vistas, por boas ou más razões. Acho que estava num batalhão, no leste de Angola, na altura do 25 de abril, Ouvi dizer que era coronel, na guarda fiscal ou coisa parecida… Sim, e deve ter chegado a brigadeiro! – opinou o nosso vaguemestre, o Pinto que, depois da tropa, foi dos que continuou a estudar e era agora dono de uma pequena empresa de contabilidade em Coimbra, e um dos organizadores do encontro.
– Deu-me uma porrada, nunca fui à bola com ele! – desculpou-se o Paranhos… Hoje deve estar cheio de graveto…
– Mas, era a vida dele, a carreira dele! – atalhou o ex-alferes Pimentel, transmontano, advogado e autarca, que nada tinha perdido do seu espírito de reverência em relação a todas as hierarquias deste mundo.
– E depois nós éramos milicianos, estávamo-nos nas tintas para as divisas e os galões! – atalhei eu, tentando, sem jeito, deitar água na fervura.
– E, nós, soldados do contingente geral!... Carne para canhão, porra!– ripostou o Paranhos.
– Estávamos todos metidos no mesmo barco, essa é que essa! – opinou o Pimentel. – E demos o melhor à Pátria, quando a Pátria nos chamou para cumprir o nosso dever.
– Mas mesmo assim havia diferenças, carago! No meio daquela merda toda – desculpem lá a expressão! – vocês até eram uns fidalgos: tinham patacão, graveto; tinham messe, bar, bebidas estrangeiras; iam matar a malvada a Bafatá; comiam umas garinas, brancas ou verdianas,  de vez em quando, em Bissau; vinham de férias, na TAP, à Metrópole…

E lá continuou o reguila, o "corrécio", do Paranhos a vociferar contra os privilegiados dos tugas de 1ª classe que na guerra tinham messe, com direito a comer de garfo e faca e toalha branca na mesa:
– Olha que nem toalhas de plástico tínhamos na merda do refeitório!... Nós, os tugas, de 2º classe... Se é que podíamos chamar àquilo um refeitório, chamávamos-lhe a "manjedoura"...
– Exageras, ó Paranhos! – emendou o Pinto. Até nem se comia mal, pelo menos eu esforcei-me...
– Qual quê!?... E depois alguns dos milicianos que eu conheci,  na tropa e na Guiné,   se calhar até nem queriam outra vida se não fosse terem de andar com a puta da canhota no mato!.. Não falo dos chicos, nem vou citar nomes, muito menos quero referir-me à malta da nossa companhia que deu o litro e meio, que foram uns heróis... Mais: alguns milicianos que eu conheci (e vocês também), nunca tinham ganho um tostão na puta da vida, a não ser a mesada do velho...
– Calma aí e para o baile, ó Paranhos! Estás a ser injusto, ao meter tudo no mesmo saco ! – interrompeu, de chofre, o ex-vaguemestre Pinto – Havia milicianos e milicianos como havia chicos e chicos. Eu não posso queixar-me, que não fui operacional, mas houve vaguemestres que morreram em combate.
– E, se calhar, até cangalheiros, corneteiros e barbeiros,  dentro do arame farpado! – ironizou o Paranhos.
– Muitos de nós, furriéis e alferes, já trabalhávamos – comentei eu, ajudando a cortar o fio à meada do discurso torrencial (e potencialmente perigoso) do Paranhos, a quem a segunda garrafa de espumante, barato,  começava a abrir as goelas da desinibição e da "inconveniência"... Todos sabíamos que, no passado,  ele "tinha mau vinho"...
– Cá o Zé Soldado como eu já era chefe de família e há muito que fossava no duro, antes de ir parar com os quatros costados à Guiné. É bom que não se esqueçam disto, carago!... Quanto ao resto, reconheço que éramos todos iguais, tugas e nharros, alferes, furriéis, cabos e soldados, que elas no mato não traziam código postal, não distinguiam nem preto nem branco, de primeira ou de segunda...
– Ou nos ataques ao quartel, que lá também se morria, dizes bem... –  acrescentou o Pinto, conciliador.


Vinte anos depois do nosso regresso...


O Paranhos, o nosso cabo Paranhos!... Era com emoção, com alguma emoção, mal contida e disfarçada, que eu voltava a abraçá-lo, ali num restaurante da Mealhada, em 1991, vinte anos depois do nosso regresso, no verão de 1971!... O Paranhos, com o seu inimitável sotaque tripeiro e a franqueza que era timbre da boa gente do Norte!...

Passámos, muito naturalmente, a tratarmo-nos por tu... Tínhamo-nos tornado amigos (ou, talvez melhor, confidentes e cúmplices um do outro, camaradas, no sentido etimológico do termo, já que na tropa não havia nem colegas nem amigos, mas apenas gente que partilhava o mesmo chão, a mesma caserna, o mesmo bivaque, a mesma tenda, o mesmo abrigo,  o mesmo beliche, a mesma cama, o mesmo buraco, a mesma viatura e às vezes o mesmo leito de morte!) nessa longa noite em que viajáramos juntos, de comboio, do Campo Militar de Santa Margarida até ao cais de embarque, em Lisboa, no Cais da Rocha Conde de Óbidos.

Entre dois tragos de bagaço de vinho verde tinto, rasca, o Paranhos fora-me contando a sua vida, os seus sonhos, os seus projetos, a mim, seu confidente de circunstância, vizinho de lugar e companheiro de infortúnio, lucidamente deprimido, à medida que o comboio da CP, requisitado pela tropa, galgava as terras banhadas pelo Tejo, pela calada da noite, envergonhadamente, só com as luzes de presença nos carruagens apinhadas de militares e de bagagens. Ao fundo, um acordeão, desafinado e melancólico, ainda nos punha mais deprimidos, a escassas horas de embarcarmos no velho Uíge da carreira colonial.

Do seu longo e pastoso monólogo, retirei algunas notas que assentei no meu diário (ou que guardei na minha memória): para lá do Douro, ficava uma infância pobre, uma adolescência truculenta, uma filha de mãe solteira, um futuro incerto de operário do têxtil ou da ferrugem, já não me recordo bem. Filho de pequenos rendeiros pobres, de Entre Douro e Minho, cedo pegara na trouxa para apanhar o comboio da Linha do Douro e assentar arraiais numa ilha na freguesia de Paranhos, no Porto, razão de ser da alcunha que lhe deram na tropa.
– Em busca de melhores dias, já que em casa o caldo, a broa e o verde tinto mal chegavam para dez bocas.
– Fome... mesmo, a sério ?! – insinuei eu, timidamente.
– Não, meu furriel, você não sabe o que é isso: uma sardinha para três em dia de festa; um bocado de toucinho quando se matava o porco lá pelo Natal; um caldo de água quente, pencas (ou couves, como vocês chamam em Lisboa) e pão de milho esfarelado para aconchegar o estômago; batatas com batatas, quando as havia, castanhas cozidas no tempo delas… Mas um homem habitua-se a tudo... Fome, fome, não. Digamos que passei necessidades... Eu e os meus irmãos e sobretudo os meus pais, para não falar dos pais dos meus pais que já não cheguei a conhecer…
– Tal como dizia o povo, "esta vida não chega a netos, nem a filhos com barba"...– interrompi eu.

E, no Porto, na sua Paranhos, ainda popular e rústica, onde havia grandes quintas até aos anos sessenta e tal, onde se cultivava pencas e milho, numa apinhada “ilha”, em que se juntara gente fugida da miséria dos campos,  de Cinfães, Baião e Marco de Canaveses, faria entretanto a sua "universidade da vida": marçano, barbeiro, trolha, biscateiro, futebolista, empregado de café, chulo de puta fina – “azeiteiro, como se diz na minha terra”… até descobrir o duro caminho que o levaria aos portões da fábrica, ali para os lados de Massarelos, se bem percebi.
– Ainda tive uma cautela premiada aos 18 anos, que me deu uns contos de réis... Mas tão depressa vieram, como se foram... Sempre tive alguma sorte ao jogo e basto azar nos amores... Mas quanto aos “cães grandes", deixe-me que lhe diga:  aprendi a tirar-lhes o boné e a cuspir-lhes na sombra desde o dia em que, descalço, mas já com pelo na venta, e os tomates inchados, acompanhava o meu velhote na visita anual à Casa do Fidalgo, pelo São Miguel, para acertar a renda: dois terços do vinho, metade do milho, a melhor fruta para a senhora, a viúva de um juiz salazarista que tinha tantas quintas na zona quantos os dedos nas mãos…

Falava do seu velho pai, "pai e patrão" (sic), com ternura contida e com o respeito comovido que lhe mereciam os queridos mortos de que a História não fala. Tinha falecido no princípio do ano de 1969, de cancro no estômago, segundo creio,  nas vésperas da ordem da sua mobilização para a Guiné. Portanto, a dor ainda "estava em ferida" e o luto por fazer.
– As alegrias passam, meu furriel. Só as desgraças e as injustiças nunca se perdoam e nem se esquecem. As tainadas, as bezanas, tudo isso a gente caga e mija... Veja o senhor meu pai, já falecido. Trabalhou uma vida inteira como uma besta de carga para morrer pobre como Job, sem um cantinho a que chamasse seu, como qualquer cabaneiro ou sem abrigo. Mal sabendo ler e escrever!... Fez tropa nos Açores, no tempo da II Guerra Mundial, andou a mourejar nas minas de ferro de Moncorvo, antes de se casar… Ainda pensou nos camiunhos de ferro,  mas o que valia um homem sem s 4ª classe ?!... Conheceu muitos fidalgos, como ele chamava aos senhorios ou patrões… Sempre o conheci de chapéu na mão, agradecendo a suas senhorias o grandessíssimo favor de continuar na terra por mais um ano, depois do São Miguel… Viveu uma vida emprestada, viveu por favor dos "cães grandes"... É isso que me revolta, carago. E é por isso que me chamam reguila, "corrécio"… Mas eu digo-lhe: há coisas que um homem nunca esquece por muitos tombos que dê na puta da vida, por muitas bezanas que apanhe ou por muitas sacanices que faça, ou por muitos coices que dê e leve… E eu já fiz muita merda, confesso, em quarenta e tal anos de vida que já cá cantam.

A guerra quer nunca existiu

Curiosamente, verificava ali na Mealhada, vinte anos depois de "tudo ter acabado em bem", como dizia o conciliador do Pimentel, que nenhum de nós se desculpava por feito aquela guerra. Para alguns de nós, por ventura para a maior parte de nós, tugas, agora despidos, desfardados, paisanos, passados à peluda, nus de corpo e alma como no dia em que fomos à inspecção, alcunhados de ex-combatentes do ultramar, últimos guerreiros do império, mal amados como todos os veteranos de guerra,   de todas as guerras– "mas vivinhos da costa como o carapau, graças a Deus!" (era o Peniche, o básico, o nosso artista de variedades, com jeito para imitar personagens, e que já então gostava de mascarar-se de mulher) – , tinha sido afinal a primeira e a última grande aventura das nossas vidas cinzentas, um rito de passagem, uma iniciação (entre dolorosa e divertida) à vida adulta. Uma espécie de acidente de percurso. Um pesadelo climatizado. Uma trovoada fantasmagórica numa bela noite de verão tropical. Um abcesso. Um furúnculo. Uma dor de dentes...
– Não fiquei mais homem por ter estado na Guiné! – acrescentou o Paranhos – Mas passei a dar mais valor à camaradagem e à vida, isso sim!
– Eu também! – concordou o Pinto.
– Um parto, meu furrriel, um parto, o nosso segundo parto! – arrematava o Peniche, no meio da galhofa geral.
– É, pá, deixa-te lá de merdas, trata-me por tu, se fazes favor! – atalhei eu, com algum desconforto.

No fundo, parvo, ingénuo ou idealista, talvez eu esperasse ouvir a confissão pública de alguém que, agora, à distância dos acontecimentos e na atmosfera distendida de um restaurante de beira de estrada, conhecido do nosso antigo vaguemestre, quisesse tomar partido e se levantasse para fazer um discurso puro e duro sobre a traição dos capitães de Abril, do Spínola, do Costa Gomes, do Caetano e de todos os gajos que andaram a gozar connosco aqueles anos todos, obrigando-nos a chafurdar na merda e no sangue. Ou então sobre o trágico equívoco que fora a guerra colonial, ceifando vidas, gastando cabedais, hipotecando o futuro. Mas não, nenhum dos presentes levantara o copo para gritar Viva ou Morra !...Nem nenhum de nós usava a expressão "guerra colonial"... não sei se por pudor, inibição ou tabu. Nem muito menos o Pimentel, que já tinha algum traquejo da política e conhecia as manhas dos cortesãos quando vinham à corte, na capital do reino. Afinal, agora ele era autarca do poder local democrático, e ser autarca em Trás-os-Montes era um posto mais alto do que tenente-coronel na tropa do nosso tempo, na então província portuguesa da Guiné!...

É que todos fazíamos o jogo da cumplicidade, jogo cujas regras tacitamente ninguém estava disposto a violar. Porque o momento era único, era mágico, e todos sabíamos que nunca mais voltaria a repetir-se, apesar das trocas de cartões e de fotos da família, e dos eflúvios do álcool e das promessas de, para o ano, irmos todos, com as nossas "bajudas", comer uma valente feijoada à transmontana e provar a famosa posta mirandesa, para lá do Marão "onde mandam os que lá estão" (assegurava o Pimentel, dos poucos de nós que subira na vida, e que logo se ofereceu para organizar um encontro com todos os mecos da companhia, logo que a malta conseguisse completar a lista dos nomes e moradas).
– Nunca lá pus os butes, e bibo no Porto, carago! – ironizou o Paranhos, tripeiro de gema,  que continuava, a miúde, a trocar os vês pelos bês, sentindo que ainda lhe achavam alguma graça, os gajos do sul, os "mouros".

No fundo, sabíamos que, na vida, há momentos irrepetíveis, pelo que nem os fantasmas, dolorosos, do passado, nem as paixões, ainda mornas, do presente, nem muito menos as inquietações, impercetíveis, do futuro deveriam perturbar este insólito,  fugaz  mas ternurento encontro de meia dúzia de ex-combatentes da Guiné, mesmo quando, já no fim do almoço e depois de uma nova rodada de uísques (de uma Old Parr de 1971 que o vago-mestre trouxera de lembrança, "from Sctoland to the Portuguese Armed Forces"), alguém (, creio que o Peniche ou o Pimentel) tivera o mau gosto (ou o azar) de evocar os mortos da companhia...
– Agora é que foderam tudo! – desabafou o Paranhos, à beira de um  ataque de choro.

Nunca conheci nenhuma alma tão sensível como a dele. Ou melhor: nenhum ator, com lágrima tão fácil como a dele... (…)
________


Nota do autor:

(*) Nenhum destes heróis foi condecorado, muito menos o "corrécio" do Paranhos que, apesar de ter levado uma porrada do sacana do 1º sargento, de cavalaria, ainda em Santa Margarida, agravada pelo capitão, era um dos nossos melhores operacionais, um homem de grande generosidade e bravura. Felizmente que nenhum de nós fora condecorado no 10 de junho, muito menos a título póstumo.... Também nenhum destes heróis existiu. Nem poderiam existir: afinal, perdemos, senão a guerra, ou pelo menos o império. E, em boa verdade, esta guerra nunca existiu... Em todo o caso, qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência. 

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Guiné 63/74 - P15531: Notas de leitura (791): "A Rua Suspensa dos Olhos", de Ábio de Lápara (pseudónimo literário de José A. Paradela): reprodução do capítulo 7 com a descrição da viagem de seis meses, aos 17 anos, em 1955, aos bancos de pesca do bacalhau: Parte I


1. Por cortesia de autor, pela grande amizade que ele nutre pelo editor do nosso blogue (e vice-versa), e pela paixão que o nosso blogue tem demonstrado pela epopeia da pesca do bacalhau (que chegou a ser alternativa à guerra colonial), transcrevemos, em três postes,  o capítulo 7 (A viagem “O Mar por Tradição”), pp. 83-107, do livro A Rua Suspensa dos Olhos, de Ábio de Lápara (edição de autor, Aveiro, 2015) (*)

O autor, ilhavense, filho de marinheiro, evoca e descreve com enorme ternura e talento a rua onde nasceu e cresceu, e onde conheceu algumas das figuras humanas da sua terra, que marcaram a sua memória e o seu imaginário ...

Como já escrevemos em poste anterior, "um simples olhar de relance pelo índice do livro, de 164 pp., permite advinhar quanto humanidade, ternura, inocência, traquinice, generosidade e poesia havia na rua suspensa dos olhos"...

Já tínhamos prometido aqui publicar aqui, no todo ou em parte, com a devida autorização do autor, o relato da sua viagem de seis meses na safra do bacalhau, nas costas da Terra Nova e da Groenlândia, quando ainda adolescente, aos 17 anos, e como estágio final do curso da Escola Profissional de Pesca, em Pedrouços, Lisboa, é chamado para embarcar e fazer "A Viagem" (*)...

É uma experiência que o marcou para o resto da vida, não só pela dureza das condições de vida a bordo como pela descoberta e reforço da camaradagem, solidariedade e amizade entre a tripulação (marinheiros e pescadores)..

A vida deu, entretanto,  outras voltas e o autor não seguiu o destino dos seus antepassados... Aluno brilhante, acabou por ganhar uma bolsa de estudo, ficar em Lisboa e poder aceder à universidade, sendo hoje um nome de referência da arquitetura e urbanismo em Portugal. (Entraria para o curso de arquitetura na Escola Superior de Belas Artes, no ano letivo de 1960/1961; fundou e geriu a empresa PAL - Planeamento e Arquitectura, com sede em Lisboa, e ainda em atividade; tem obra por todo o país, e em especial na Região Autónoma da Madeira).

O livro está fora do mercado livreiro, tratando-se de edição de autor. Mas, contra reembolso, pode ser pedido autor, através do seu endereço pessoal. Ver igualmente a sua página pessoal no Facebook.


2. A Rua Suspensa dos Olhos > 7. A viagem “O Mar por Tradição”, de Ábio de Lápara (2015) > Parte I (pp. 83-91)


Naquele tempo, eu já sabia que nem tudo eram rosas neste mundo.  (**)

Os dois anos anteriores tinham-me imposto um crescimento veloz, na passagem do mundo do brincar para o do trabalho; na perda dos amigos, porque ao abandonar o liceu perdi a maioria deles; no novo convívio com os mais velhos, companheiros de trabalho, e na enorme mudança dos conversares, agora afastado do ambiente estudantil. 

Dois anos depois, completados os dezasseis, eu iria partir novamente. Atingida a idade da diáspora entre os cúmplices companheiros de então, foi um tempo de despedidas! Por um lado, entre os que, chamados pelos pais, seguiam para outros continentes, impondo-me segunda perda de companheiros, por outro, eu, que ia partir também, consciente de que ninguém me chamara e portanto no outro extremo, à chegada, ninguém me esperaria. 

Quando isso aconteceu, na minha mala pouca coisa levava. Entre duas mudas de roupa, um sabonete perfumado que a mãe lá pusera seria o cheiro mais próximo de casa e a única réstia de carinho materno durante longos tempos. 

Levava comigo também uma paixão adolescente, subjacente na permanência do pensar, que dava suporte ao sofrido dia a dia, como um bálsamo! 

Era um amor feito de lembranças e palavras suspensas no desejo de as dizer sem conseguir. Conversas prontas, feitas de perguntas e respostas, ocupando todo o espaço livre entre os afazeres, correndo como um filme de imagens nítidas do objecto ausente, de impossível contacto, como só acontece nos sonhos. Imagens feitas de fugazes momentos junto dela, de olhares comprometidos, pedaços de gestos e sussurros vindos do Jardim e de outros cantos da minha vila. 

Lisboa para mim não era novidade. Por ali vivera entre os doze e os catorze anos. Os “eléctricos” e as anacrónicas carroças desse tempo, puxadas por mulas e machos, calçados no ferrador do Altinho, eram-me familiares, bem como os escuros guindastes dos cais e os navios que na infância frequentara com os meus pais. 

Esses conhecimentos minoraram algumas difculdades práticas mas não o desatino interior de alguém que, habituado a dispor de um nome e da liberdade de gerir o seu dia a dia no trabalho, passou num ápice, a ser designado por um número. Nunca tinha sido aluno interno e embora no liceu tivesse um número na turma, continuava a ser conhecido pelo meu nome. Era uma sensação esquisita, a que levei algum tempo a adaptar-me. 

 Como o castigo era algo que não almejava, tratei de compreender o funcionamento daquela realidade: a Escola ProfIssional de Pesca. Prudente, resolvi vestir a alma de cinzento e clareá-la só nos momentos de folga, evitando demasiada visibilidade. Tentei recuperar dois ou três antigos companheiros de liceu residentes em Lisboa para sair ao fim de semana, mas,  fardado de pescador, verifiquei que estavam pouco interessados na companhia. Paciência… aprendi que o preconceito molda com frequência a alma humana. 


Costa Nova > Ria de Aveiro > 25 de Agosto 
de 2008 > Um amigo comum,  do nosso 
editor e do nosso camarada Jorge Picado, 
o arquitecto José António Boia Paradela 
(pseudónimo literário, Ábio de Lápara). 
Foto de LG..
Botas de cabedal atanado, umas calças e um boné de burel castanho sombrio, áspero como palha, e uma camisa de xadrez em tons avermelhados, eram o ferrete com que o regime (#) marcava os filhos dos pescadores que quisessem seguir as pegadas dos pais. Porém, nem os nossos pais se vestiam assim! Talvez algum nazareno mais antigo, durante o trabalho, mas em terra usavam fato, camisa e gravata ou colarinho desabotoado como era hábito no tempo. 

Assim, resolvi passar a ser o Sessenta, de modo muito assumido, e fazer novos amigos. Mas não me perguntem os nomes deles. Eram o Trinta e Três, da Ericeira, o Cem, da  Gafanha, o Onze,  da Nazaré, o Vinte Cinco, de Ílhavo…e por aí fora! E o Sessenta passou a ser um dos meus números mágicos!

Éramos cem alunos procedentes de várias localidades costeiras, ente os quais dois cabo-verdianos que não aguentaram as saudades da ilha. Entristeceram de tal  
modo durante as duas ou três semanas iniciais que tiveram de regressar à procedência. Claro que não foram só as saudades, mas também as notórias diferenças culturais, na capital de um império à qual a negritude colonial, naquele tempo, quase não tinha acesso. Porém, mais do que isso, foi sobretudo a incapacidade de um bafiento paternalismo institucional para verter a dose de ternura necessária em tal situação. Dois entre cem, crioulos em caldo de portugas, liberdade da praia posta em prisão guardada por quatro cabos da marinha! Ao fim de alguns dias, foram-se.

A verdade é que nos restantes noventa e oito, as condições adversas da nova situação geraram cumplicidades e solidariedades inesquecíveis, que ficaram para a vida como faróis colocados ao longo da costa, para esconjurar o mal no meio da procela. Se essa lição não fosse aprendida tornava-se difícil, mais tarde, o entendimento mútuo e até a comunicação com a linguagem exclusiva do olhar em momentos cruciais de necessária entreajuda a bordo. Ali fiz, pois, aprendizagens várias: As do convívio institucional, da solidariedade, do jogo do desenrasca e também, da perda da inocência!

Inesquecíveis foram as travessias do rio metafórico da minha aldeia, em grupo, aos fins de semana, na visita às esconsas escadas das ruas da Bela Vista e do Ferragial, na área portuária, onde para muitos de nós, recém chegados da província, a iniciação sexual tinha uma aura de magia negra: Subir a escada escura com a respiração suspensa… e não só pelo cheiro da urina na escuridão dos degraus (urinar após o acto, evitava as maleitas blenorrágicas, dizia-se), pulsação aumentada, bater à porta, esperar a sua abertura, com parcimónia, por uma senhora de prazo esgotado…

Depois, o jogo do olhar escolhendo a parceira de entre as que se sentavam em volta na prática de alguns aperitivos, aceitando moedas de pequeno valor colocadas por mãos, ora hesitantes ora atrevidas, na comissura dos seios generosamente expostos pelos decotes… Para os de educação católica, onde se instilara o medo do fogo eterno, restava ainda um sentimento de pecado…

Duros tempos! Ainda hoje me lembro do hálito bafiento do prior da igreja de S. Paulo a quem, ajoelhado, algumas vezes confessei esses “pecados”! E saía perdoado, cheio de alívio até à próxima oportunidade, que a carne é fraca… Poderia desenvolver mais o tema desta instituição corporativa da panóplia instrumental de um tal [Henrique] Tenreiro de má fama, mas confesso que ela faz parte do meu universo privado que não me apraz recordar, embora este sentimento se tenha desenvolvido mais tarde, quando a consciência social e política despertou.

Na verdade eu não pagava nada. Tinha comida, cama e roupa lavada. E formação profissional… Era uma benesse do Estado Novo, que devíamos aceitar agradecidos. Num país com nove milhões de pessoas, noventa podiam anualmente ascender a aprendizes de pescador de bacalhau! Uma honra portanto!…

Mas não descurei a teoria e aprendi que o bacalhau era um teleósteo, na sua classificação científica. Fiz um saco para o pão e um cinto para as calças em arte de marinheiro. Aprendi a escamar e amanhar peixe, a remar e navegar à vela no Tejo até ao Ponto Final, um tasco da outra margem, onde por vezes se descansava um pouco antes do regresso. Ali se bebia um copo quando para isso havia dinheiro, para empurrar o quarto de “pão de segunda” da merenda que a instituição fornecia.

Porém o balanço final resultou muito positivo em termos humanos. Foi uma experiência longa, num microcosmos com personagens interessantes, cada uma a seu modo, das quais algumas ainda moram comigo: Duas Eugénias, uma digna do céu, outra, talvez do purgatório; um director ausente, apenas presente na missa dominical rezada pelo Capelão do Gil Eanes, que, dizia-se, escondia whisky sob o altar para traficar em St. Jonh’s; um senhor contabilista, todo vestido de um luto negro pela morte de uma jovem filha, que se movimentava por ali indiferente à rapaziada, como se fôssemos galinhas de um qualquer aviário; um mestre de redes, excelente pessoa, que de noite, contava-se, para assustar os alunos, teria encarnado na lendária Princesa que habitara aquela mansão e dera o nome ao Largo fronteiro. Envergando um lençol sobre a cabeça, percorria o corredor junto das camaratas, até que um dia apareceu com uma equimose no sobrolho provocada por um aluno mais afoito que,
definitivamente, desmascarou o farsante.

As disciplinas teóricas eram ministradas por alguns professores, normalmente dos quadros da Marinha de Guerra, que faziam daquilo um complemento pecuniário. E, finalmente, quatro monitores, qual deles o mais bizarro, cabos de marinha, que se revezavam na condução dos alunos com métodos de manutenção da ordem por vezes achibantados, embora a esta distância me pareçam criaturas simpáticas e complacentes, com direito ao minha admiração.

De um deles se dizia ter sido gaseado na Grande Guerra, pela saliência esbugalhada do olhar. Outro, tomava da pinga, que lhe abrilhantava os olhos… Outro ainda, mulherengo de saltar o muro, impunha-se pela corpulência e vozeirão militar; e o de menor estatura, fazia-se respeitar pelo cacete escondido sob a farda, onde o alcache e o boné de marinheiro justo à minúscula cabeça lhe conferiam um ar de miniatura. Quando alguma quezília surgia, usava aquele argumento sobre nós sem curar de ouvir o preço da restumenga!

As tardes passadas no rio, remando ou velejando, eram normalmente divertidas, escapando um pouco ao rigor da disciplina na Escola. Os monitores abrandavam a exigência disciplinar e aproveitavam para prevaricar um pouco também, saltando na outra margem para beber uns copos,  ou para confraternizar com os colegas da velha fragata das Índias, “D. Fernando II e Glória”.

A fragata Dom Fernando II e Glória, ancorada em Ponta
Delgada, Açores, em 1878, na sua última viagem da carreira
da Índia. Encomendada em 1821, foi lançada à água
em 1841. Veleiro, em madeira, tinha 50 bocas de fogo.
Na sua vida útil, faz cem mil mil marítimas, o equivalente
a cinco voltas ao mundo. Está hoje fundeada em Almada, e
funciona como museu.
Fonte: Museu da Marinha, Lisboa.
Imagem do domínio público.
Cortesia de Wikimedia Cmmons.
Fundeada no meio do Tejo, nesse tempo, era albergue de crianças desprotegidas. Ali atracávamos estabelecendo convívio fraterno, uma vez que alguns dos colegas da nossa instituição eram de lá oriundos. Por isso os designávamos por “fragatas”.

Mas se o nosso comportamento, durante o périplo ribeirinho se tornasse menos contido, logo surgia o devido castigo:
Safa lanches!– ordenava o cabo monitor em frente da saída de esgotos do Caneiro de Alcântara. Fundeados no local, obrigava-nos a comer o magro quarto de pão com torresmo, cercados pelo fétido líquido.

Cumprida que fosse a via sacra ao longo de cerca de ano e meio, havia que pagar o vinagre e o fel, e ainda a coroa de espinhos: embarcar na frota da pesca do 
bacalhau, em navio de pesca à linha, 
onde seriam descontadas as despesas 
que a Escola tinha efectuado connosco, algumas delas impostas pela própria instituição, tais como a aquisição de roupa, normalmente de fraca qualidade, para “A Viagem”.

Assim a aparente benesse do Estado Novo era agora descontada ao longo dos dois ou três primeiros anos de faina obrigatória na pesca do Bacalhau. Como naquele tempo, tudo era decidido na ausência dos interessados, fui colocado numa vetusta glória da frota, o “Gazela Primeiro”, um pequeno navio de três mastros armado em lugre-patacho, isto é, com velas redondas no mastro de vante e velas latinas nos dois restantes [vd. fotop aqui].

Fui ver o barco. Fiquei desolado. O aspecto era miserável, talvez porque ainda não tivesse sido arrumado e limpo para a nova campanha, mas o beliche que me estaria destinado era atravessado por um dos mastros! Por ter sido bom aluno, (nesse aspecto tinha nítida vantagem sobre os colegas por ter um nível de estudos um pouco mais avançado) foi-me prometido um regresso aos estudos por uma instituição ecuménica cuja direcção promovia algumas bolsas de estudo para filhos de pescadores que, naquela Escola, tivessem revelado capacidades para poderem vir a ser oficiais da marinha mercante.

Nessa medida, pareceu-me que embarcar no “Gazela”, era embarcar no passado, e eu tinha só dezassete anos e toda uma promessa de vida à minha frente. Alegando essas razões, pedi para ser “matriculado” num navio de pesca à linha que tinha sido construído recentemente. Aceite o pedido, fui colocado na tripulação do Lousado”, assim se chamava o navio [vd. foto aqui].

Acabado o curso, cumpria-se mais uma vez, o caminho inquestionável do mar por tradição, que atirava para o Atlântico Norte um naco de juventude, amputando-lhe definitivamente as hipóteses de desenvolvimento humano a que deviam ter direito. E isso apenas a troco de um vencimento regular, embora reduzido, mas que não tinha paralelo nos outros moldes de pesca do país, sujeitos às vicissitudes do clima e de um sistema corporativo claustrofóbico onde a miséria era maior.

Corria o ano de 1955 [e não 1954, como escreve o autor, (LG)], longe ainda dos tempos da emigração maciça e da guerra colonial.

(Continua)

[Fixação de texto, ilustrações, links e notas, exclusivamente para efeitos deste poste: LG]
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Nota do autor:

(#) O regime do Estado Novo alimentava-se de populismos, inventava tipicismos, louvava a pobreza franciscana, transpunha a glória da pátria para fora do presente: a glória passada, para o século XVI, a glória futura, para o Além, nas asas da concordata. Exactamente ao contrário do seu inspirador nazismo, que destinava o povo a incarnar uma raça superior e mandava costurar as fardas mais elegantes do planeta! Uma ligeira diferença entre Braunau e Santa Comba Dão!… Ambos os resultados foram repugnantes, mas os métodos mais macios, como sabemos, perduraram mais tempo…)
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Notas do editor

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14291: Fotos à procura de... uma legenda (53): Os "Unidos de Mampadá", à despedida, em Nhala, em agosto de 1974... (António Murta / António Carvalho / José Manuel Lopes)


Foto 1A


Foto 1B


Foto 2A


Foto 2B

Guiné > Região de Tombali > Nhala (a nordeste de Buba) > 1974 > Agosto de 1974 >  Os "Unidos de Mampatá", em final de comissão, foram despedir-se dos "periquitos" de Nhala (2ª CCAÇ/BCAÇ 4513)... Recorde-se que a CART 6250 foi mobilizada, pelo RAP 2, partiu para o TO da Guiné em 27/6/1972 e regressou em 24/8/1974. Esteve em Mampatá e Ilondé.Comandante: cav mil inf  Luís de Jesus  Ferreira Marcelino, nosso grã-tabanqueiro.

Fotos (e legenda): © António Murta (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


1. Comentário do António Murta (*) [ex-alf mil inf , Minas e Armadilhas, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513. Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74]

Olá, José Carlos [Gabriel]. Então não te lembras do rapazinho do saco da TAP? Era o Alf Capelão e chegou a ir várias vezes a Nhala em diligências do seu ofício, sujeitando-se às partidas escabrosas dos alferes anfitriões.

Não recordo o nome dele, nem da maioria dos que aparecem nas fotos, embora me lembre de todos. Agora sei os nomes do António Carvalho (camisa aberta, cinturão, cigarro na boca), e do José Manuel Lopes (à esquerda, camisola azul, bigodinho), porque os encontrei aqui na Tabanca Grande. 

Já quanto ao Alf Carlos Farinha, (por trás à esquerda, de óculos escuros, a esconder-se do fotógrafo, aliás, todos os alferes ficaram na parte de trás do grupo), quanto a ele, dizia, nunca me esqueci do seu nome nem do seu rosto, porque chegámos a ser parceiros de "quarto", aquando da minha estadia em Mampatá com o meu Grupo de Combate. 

O Capelão, confesso, não sei se pertencia à CART 6250 de Mampatá. Que eram todos camaradas magníficos, não tenho dúvidas, Cap Luís Marcelino incluído, também ele camarada tabanqueiro.

António Murta (ou só Murta, para os conhecidos!)

22 de fevereiro de 2015 às 00:35 


2. Comentário do António Carvalho (*) [ex-Fur Mil Enf da CART 6250/72, Mampatá, 1972/74]

Com referência à 2ª foto [2A e 2B]

Na cabine do Unimog: o Zé Manel, da Régua, na frente, de calções às riscas;  e, por trás, o Nina (Mecânico). [Foto 2A]

Entre as Bandeiras: na frente o levanta-minas (Vilas Boas) , de óculos, sentado [Foto 2A]; por trás,  o Vieira da Madeira, de cigarro na boca e bandeira na mâo; por trás deste, o Carlos Farinha (só se lhe vê a cabeça) era o Alferes que substituía o Capitão [Foto 2A].

À direita das bandeiras ( da esquerda para a direita): Quarto da frente, Rato (de camisola vermelha), eu (de camisa camuflada, calças nº 1 e chinelos de dedo), o capelão do Batalhão e o Simões (professor da companhia) [Foto 2B].

Sete de trás: Benvindo ?  Transmissões? Alferes do Pel Caç Nat,  Pinto... O rapaz da camisa à Jimmy Hendrix, seria o  Murta? Alferes Esteves, de Mirandela e o Fernandes de Lisboa (cigarro na mão esquerda) [Foto 2B] (**)

Carvalho de Mampatá

22 de fevereiro de 2015 às 03:37


3. Poema do Josema [José Manuel Lopes], já aqui publicado há uns largos atrás, e onde se evocam alguns dos supracitados "Unidos de Mampatá" (***)... 

[Na altura, em março de 2008, ainda não o conhecia pessoalmente, falávamos ao telefone... Dele escrevi que se tratava de "uma voz muito original, pessoal, uma surpreendente revelação da escrita poética sobre a guerra colonial na Guiné".] (LG]

Calor, cansaço, suor,
saudades de tudo
e de um rio...
mas podia ser pior,
pois há ali o Corubal
com sombras e água boa;
nem tudo é mau, afinal,
não é o Douro, eu sei,
nem o Tejo de Lisboa,
são outros os horizontes,
falta o xisto e o granito,
as encostas e os montes,
mas diga-se, na verdade,
há o Carvalho, 
há o Rosa,
há um hino à amizade,
há o Gomes e o Vieira,
a sonhar com a Madeira,
há o Farinha e o Polónia,
gestos [d]e solidariedade,
há o Esteves e o Pinheiro,
amigos e sinceridade,
há o Nina e até amor,
também sofrimento e dor,
há o desejo de voltar
e um apelo à liberdade.

Josema

Mampatá, 1974


[fixação de texto: LG]
________________


(**) Último poste da série > 15 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14261: Fotos à procura de... uma legenda (52): a boeira, de Candoz, também conhecida por alvéola ou lavandisca, noutros sítios (Luís Graça)

(***) Vd. poste de 28 de março de 2008 >  Guiné 63/74 - P2694: Poemário do José Manuel (5): Não é o Douro, nem o Tejo, é o Corubal... Nem tudo é mau afinal.... Há o Carvalho, há o Rosa...

Para ter acesso à maioria dos poemas publicados (série "Poemário do José Manuel"), vd  poste de 29 de setembro de  2009 > Guiné 63/74 - P5033: Poemário do José Manuel (30): O sol queima em Colibuia...

Vd. ainda poste de 27 de fevereiro de 2008 >  Guiné 63/74 - P2585: Blogpoesia (8): Viagem sem regresso (José Manuel, Fur Mil Op Esp, CART 6250, Mampatá, 1972/74)

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P11027: Blogoterapia (222): Agradecendo os vossos mimos, as guloseimas (para a alma), em dia de aniversário com capicua... (Luís Graça)



Vídeo (2' 14'') > Lisboa > Mouraria > Quarta edição do Festival TODOS – Caminhada de Culturas 2012 > Terraço da Casa dos Amigos do Minho, R do Benformoso, nº 244 > 14 de setembro de 2012, 20h00 - 22h00 > Festa de abertura com a atuação dos Guents Dy Rincon (*). 

Vídeo: © Luís Graça (2012). Todos os direitos reservados.


Reproduz-se aqui, com a devida vénia (a todos os participantes, a começar pelos músicos), um momento, muito bonito, deste convívio musical intercultural, numa das "aldeias" da Lisboa desconhecida para muitos lisboetas, habitantes, forasteiros, passantes, transeuntes, caminhantes,  enfim,  turistas apressados, que é a Rua do Benformoso e a lendária Casa dos Amigos do Minho...  Nesta rua vivem, trabalham, respiram, transpiram, passam, muitas centenas de pessoas das cerca de 30 etnias que residem na zona do Martim Moniz / Intendente / Mouraria, e onde decorre todos os anos, desde 2009,  o Festival Todos - Caminhada de Culturas, de que sou fã...

Este vídeo (em que se ouve e se dança um funaná para todas as idades, pesos e medidas!) é uma forma, singela, modestíssima, de retribuir os mimos, as guloseimas (para a alma), que me deram, ontem,  em dia de aniversário, os meus muitos amigos e camaradas com que me orgulho de contar aqui, e que convivem comigo à sombra do mágico e fraterno poilão da nossa Tabanca Grande. Em dia de aniversário, ainda para mais com capicua (, ou seja, número que se lê igualmente da direita para a esquerda ou da esquerda para a direita e ao qual se atribui boa sorte)...

Das mensagens que me mandaram, através do nosso correio interno bem como dos comentários publicados  no poste P11021,  fui (re)pescar nomes e pequenos excertos que quero partilhar com todos os nossos leitores.

Os parabéns que me foram dirigidos vejo-os sobretudo como felicitações, em prosa ou em verso,  pela nossa obra comum, por este blogue e por tudo o que ele significa, para muitos de nós, portugueses, guineenses e outros que o fazem, que o editam, que o leem, que o comentam, que o divulgam... E também como um reforço adicional da nossa motivação (individual e coletiva) para prosseguir este projeto que é, primordialmente,  partilha de memórias (e de afetos) à volta da experiência de uma guerra e de uma terra, Guiné-Bissau, antiga colónia portuguesa. A todos/as fico muito grato.

(i) Recebe um abraço e os votos de muita saúde e boa disposição para levares em frente, e por muitos anos, esta tua tarefa de reunires ex-combatentes em teu redor (Carlos Vinhal);

(ii) Espero que tenhas muitos mais, e tenho a certeza que vais ter, porque tu mereces, pelo que tens feito pelos ex-combatentes da Guiné. Um até breve em Monte Real (José Manuel Cancela);

(iii) Que os futuros anos te continuem a proporcionar toda a saúde física e intelectual que desejares (Jorge Narciso);

(iv) Que tenhas saúde e muitos anos para comandar este Batalhão de Tabanqueiros (Agostinho Gaspar);

(v) Quero enviar-te um abraço, / Sincero, crê que o é,/ E agradecer-te teu espaço, / Onde se vive a Guiné (Manuel Maia);

(vi) Força para continuares a caminhada, para continuares a dar vida a esta grande casa da amizade e das lembranças (Felismina Mealha);

(vii) Comandante amigo, é um prazer para mim ter-te entre as pessoas que admiro e estimo (Zé Teixeira);

(viii) Manga de Ronco hoje, o chefe de tabanca faz anos.Muitos parabéns Luís, espero que tenhas saúde para continuares com estes atabancados (César Dias);

(ix) Que tenhas força, para continuar a nobilíssima missão em que te empenhaste (Vasco Pires);

(x) Que a alegria e o prazer, que proporcionas aos antigos combatentes e não só, quando repartes o teu blogue, te seja recompensada, um milhão de vezes mais! (Tony Borié):

(xi) O blogue agradece e eu também (Raul Albino);

(xii) Ao meu indefetível camarada e grande amigo Luís Graça, aqui, em Santa Maria da Feira, bato a pala e na posição de sentido, não num ritual militar mas sim num respeito e elevada consideração pelo homem que soube juntar os ex-Combatentes da Guiné numa grande e afetiva família (Rui Silva);

(xiii) Para o jovem Henriques e o velho Graça, a mesma Amizade! (Jorge Cabral);

(xiv) Um timoneiro jamais perde o rumo da sua navegação. Segue sempre na linha da frente. Força e um até breve (Zé Saúde);

(xv) Muita coragem (e paciência) para continuares a dar vida e a impulsionares este espaço que te ultrapassou, tenho a certeza (...). Produto de um esforço enorme. Pessoal (teu e dos incansáveis colaboradores directos) e também colectivo, já que o Blogue é a 'montra' dos trabalhos de tantos e tantos que colaboram com a sua participação. (Hélder Sousa);

(xvi) Parabéns para o Luís / Que faz versos a rigor. /Não sou só eu quem o diz: / Fá-los com Graça e amor! (Tó Zé Pereira);

(xvii) De Penafiel vai a palavra mágica que faz todo o sentido "Parabéns", neste dia (Joaquim Peixoto e Margarida);

(xviii) Gostaria também de albergar, nestes votos, a importante criação deste blogue e todo o conjunto daqueles que nele participam com rigor e paixão. (Mário A. Vasconcelos);

(xix) Parabéns ao menino Luis (Virgínio Briote);

(xx) Feliz Aniversário. Parabéns. Manga di Saúde para Bó. Longa Vida. Mantenhas. Alfa Bravo (Luís Borrega);

(xxi) Um grande abraço- igual ao que trocamos no dia 12 de julho de 2009 no palácio de cristal no Porto (A.Dias);

(xxii) Ainda com o meu navio cheio de água com o rombo, muito grande, que levou, aqui me apresento a dar-te um abraço de parabéns e desejar-te que continues com a tua obra que consegue juntar tanta malta ao teu redor na tua, nossa, Tabanca Grande. (Vasco A. R. da Gama);

(xxiii) Forte abraço para ti extensivo a todos que te acompanham, da Terra dos Bacalhaus Vivínhos do Aquário (Jorge Picado);

(xxiv) A avaliar pela quantidade (e qualidade) dos comentários que precedem este, é evidente que estás nomeado para cumprires muitas mais missões (José Câmara);

(xxv) Um dia em cheio, com muitos pecados, e que o champagne apresente muitas bolinhas em ascenção. E ainda te desejo muitas reincidências por muitos e felizes anos. [JD (Zé Manuel Dinis)]

(xxvi) Desejar parabéns depois do dia de aniversário não é chegar atrasado, é dar nas vistas e... desejar no princípio de um novo ano que continues por cá [jteix (Jorge Teixeira)];

(xxvi) E ainda muitos abraços, beijinhos e xicorações de parabéns de mais todos estes amigos e camaradas da Guiné, que se lembraram de mim (e não tinham nenhuma obrigação de se lembrar!), no dia dos meus 66 anos....

Abel Santos, Adriano Moreira, Amaral Bernardo, António Marques, António Melo, Berlarmino Sardinha, Carlos A. J.Pinto, Carvalho de Mampatá, Eduardo campos, Fernando Chapouto, Fernando Costa, Filomena, Henrique Cerqueira e Dulcineia (Ni), Henrique Matos, Hugo Guerra e Ema, J. Armando Almeida, JERO, João Manuel Félix Dias, Joaquim Mexia Alves, Joaquim Pinho, José Martins e Manuela, Juvenal Amado, Manuel Amaro, Manuel Carvalho, Manuel Marinho, Manuel Reis, Manuel Resende, Manuel Serôdio, Mário Miguéis, Miguel Pessoa e Giselda, Paulo Santiago, Rogério Cardoso, Torcato Mendonça, Valentim Oliveira, Vasco Ferreira, Veríssimo Ferreira. (**)

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Notas do editor:

(*) Sítio oficial MySpace > Guents dy Rincon > (... E porque tudo o que é lusofonia, divulgar é preciso!)

Autobio(grafia):

(i) A banda Guents dy Rincon define-se como um exército de pescadores multiculturais, pacíficos e pacifistas, sem armas mas com muita alma que zelam paulatinamente através das Belas Artes para um novo mundo emergente sem barreiras nem fronteiras;

(ii) Guents dy Rincon é um projecto world music que explora os diversos ritmos cabo-verdianos (Funana, Batuque, Coladeira, Finaçon, Morna, Mazurka, Samba, etc…), além das influências dos ritmos Afro-Latinos;

(iii) A Banda surgiu no inicio de 2007 através de Santos Cabral, cantor e compositor, originário da Ilha de Santiago Cabo Verde, que no inicio contou com o apoio de alguns amigos para levar adiante o seu projecto.;

(iv) Entre esses amigos do inicio estavam Eduardo Casal, percussionista Argentino, Marco Papain, acordeonista Francês e Maurício Lobão,  percussionista Brasileiro;

(v) A razão da escolha deste nome, Guents dy Rincon em crioulo cabo-verdiano, é pelo facto de Santos Cabral que é originário do concelho de Santa Catarina cujo centro é a cidade da Assomada da qual Rincon é uma freguesia com bastante influência cultural, decisiva na identidade do povo da ilha de Santiago, ao qual o projecto musical Guents dy Rincon pretende ser fiel;

(vi)  Actualmente Guents dy Rincon é formada por um quinteto de músicos experientes com currículos internacionais: Santos Cabral, Cabo Verde (Voz e Guitarra), Mauricio Lobão, Brasil/ Holanda (Percussão e voz), Luzia, Espanha (Guitarra e Bass), Zé Brás, Cabo Verde  (Guitarra e Cavaquinho), Zé Mário, Cabo Verde  (Percussão, Voz);

(vii) Todas as composições e estruturas musicais são originais da Banda;

(viii)  Guents dy Rincon já actuou em diversas salas conceituadas como: Goethe-Institut Portugal; Instituto Franco-Português; Onda Jazz; Chapitô; Braço de Prata; Festa do Avante 2009, entre outras… 

(ix) Guents dy Rincon é actualmente também um movimento cívico que zela pela convergência das belas artes a nível intercultural e internacional, participando intelectuais de várias vertentes entre esses: pensadores, líderes associativos, historiadores, antropólogos e artistas de diversas áreas;

(x) Esse movimento surge da necessidade do desenvolvimento de uma nova forma das relações humanas no espaço da CPLP no séc XXI com novos ideais necessários às novas mentalidades na renovação dos actuais moldes de orientação e desenvolvimento das relações humanas;

(xi) Uma nova visão justa e coerente na reflexão, no âmbito das culturas dos povos como meio de dispor novas verdades inerentes à evolução de uma nova corrente do espírito humano;

(xii)  Contatos: Santos Cabral 351-967859152 / Zé Mário (Direcção Musical) 351-963377248 / 
Mauricio Lobao (Holanda) 0031631967090  / www.mauriciolobao.com  / mauricio.unlimited@gmail.com