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sexta-feira, 7 de outubro de 2022

Guiné 61/74 - P23681: Agenda cultural (818): doclisboa'22- festival internacional de cinema, 6-16/10/2022: Retrospectiva - A questão colonial: 35 filmes - Parte II: Guiné, Angola, a memória e as novas batalhas. Mesa redonda, dia 8, às 15h00 (Cinema São Jorge) e às 19h00 (Cinemateca)






Fotogramas, com a devida vénia, do filme de Flora Gomes, o pai do cinema guineense (n. Cadique, 1949), "Mortu Nega" (Morte Negada, em português, ou "aqueles a quem a morte recusou")... Voltou a passar no doclisboa, este ano, no passado dia 6 de outubro.. Mas está aqui disponível, no You Tube (falado em crioulo, com legendas em inglês e em português), em versão integral. Tem como protagonista uma poderosa e bela figura feminina, Diminga, uma "mãe coragem" (interpretada por  Bia Gomes). Ver aqui sinopse, enquadramento histórico, ficha artística e técnica do filme.

Na caixa de comentários ao poste P23676 (*), escreveu o António Rosinha: "Conheço de Flora Gomes dois filmes sobre a Guiné, este, "Mortu Nega", e os "Olhos Azuis de Onta". Muito interessantes. Penso que já poderia ter produzido outros sobre a sua terra" (6
de outubro de 2022 às 17:06).

A "primeira longa-metragem do realizador guineense Flora Gomes" já passou em tempos ba RTP, mas não o encontro na RTP Play, possivelmente por causa dos direitos de autor). Sinopse:  "Este filme, nas palavras do seu autor, é uma parábola africana. Conquistada a independência das colónias e eliminado o colonialismo português, a questão que se levanta é a África do século XXI. Uma África ? e é isso que Flora Gomes insinua ? que África não será sem as suas crenças, os seus mitos, a sua filosofia, a sua cultura." 

1. Este ano, na sua 20ª edição, o doclisboa tem na secção "Retrospectiva", dedicada à "questão colonial", um total de 35 filmes (de curta, média e longa metragem), que vão passar entre 6 e 16 deste mês. Continuamos, a título meramente informativo, a listar os filmes que vão passando cada dia. Neste caso, no próximo dia 8, sábado.

08 Out — 10:30 / 87’
Culturgest Pequeno Auditório

15 Out — 19:00 / 87’
Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro

A obra de Mario Marret, só recentemente reencontrada e restaurada, filmada em plena guerra na Guiné, já aflorava a questão das escolas de mato – um eixo fundamental da acção do PAIGC nas zonas libertadas. A relação entre a terra, a luta e a aprendizagem estão no coração dos dois filmes de Filipa César e Sónia Vaz Borges, a partir do arquivo em Navigating the Pilot School e da experiência física e sensorial em Mangrove School.


Nossa Terra
Mario Marret
1966/Guiné Bissau/35’

Nossa Terra é um filme de combate, um filme urgente, rodado durante a guerra de guerrilha na luta pela independência da Guiné-Bissau em meados dos anos 1960. “Era um testemunho. Não interessava o formato, a câmara, essas coisas todas. Estava um cineasta presente. O cineasta tem de estar no lugar onde o mundo se [...]


Navigating the Pilot School

Navigating the Pilot School
Filipa César, Sónia Vaz Borges
2016 /Portugal /12’

Frequentemente subestimadas enquanto tal, as guerras de libertação anti-coloniais foram também empreitadas de educação a grande escala. Considere-se as estratégias educativas seguidas pelo agrónomo Amílcar Cabral e o PAIGC. Entre elas, a Escola Piloto para “formar os melhores estudantes das nossas escolas nas zonas libertadas e [serem] integrados no nosso [...]

Mangrove School

Mangrove School
Filipa César, Sónia Vaz Borges
2022/Alemanha, França, Portugal/35’

“Voltámos à Guiné-Bissau para investigar as condições dos estudantes nas escolas da guerrilha nos mangues. Em vez disso, rapidamente nos tornámos nós próprios os alunos e a primeira lição era como andar. Se se caminhar direito, colocando primeiro o calcanhar no chão, imediatamente se escorrega e cai nas represas dos [...]

08 Out — 15:00 / 90’
Cinema São Jorge Sala 2

MESA REDONDA: A QUESTÃO COLONIAL

08 Out — 19:00 / 97’
Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro


A beleza que atravessa o Carnaval da Vitória, que regista o primeiro Carnaval de Angola independente em 1976, não esconde o trauma de vinte anos de guerra colonial, que se prolongará na violência da guerra civil. Vinte anos mais tarde, Sissako parte em busca de um amigo, e de si mesmo, e encontra um país cujas feridas resistem às simplificações históricas.

Esta sessão decorre no âmbito do projecto FILMar, operacionalizado pela Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema, integrado no Mecanismo Financeiro de Apoio EEA Grants 2020-2024.



Carnaval da Vitória

Carnaval da Vitória
António Ole
1978/Angola/39’

Filmado nas ruas de Luanda, Lobito e Benguela, o filme foca em particular os trabalhadores que se dividem entre os seus locais de trabalho e os preparativos e ensaios que culminam no dia da primeira grande festa da Angola independente: o “Carnaval da Vitória”. Esta sessão decorre no âmbito [...]




Rostov-Luanda

Abderrahmane Sissako
1997/Alemanha, Angola, Bélgica, França, Mauritânia/60’

Abderrahmane Sissako saiu da Mauritânia para Rostov, na Rússia, em 1980, para estudar cinema. Aí, fez amizade com Baribanga, um combatente pela liberdade angolano. 16 anos mais tarde, com uma fotografia de Baribanga no bolso, Sissako decide ir a Angola, um país ainda em convulsão, e procurar o seu companheiro há muito perdido. O [...]

(Continua)

[Seleção / revisão / fixação de texto / subtítulos / negritos / itálicos, para efeitos de edição deste poste: LG. ]
__________

Nota do editor:

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Guiné 61/74 - P23676: Agenda cultural (817): doclisboa'22- festival internacional de cinema, 6-16/10/2022: Retrospectiva - A questão colonial: 35 filmes - Parte I: Lugares: Guiné-Bissau, Senegal, Argélia, Angola, dias 6 e 7


Fotograma do filme "J'ai huit ans" (França, 1969, 10'). Cortesia de doclisboa2022


1. Aí está o nosso querido e aclamado doclisboa, na sua 20ª edição. Um  slogan que já se tornou um ícone: "Em Outubro todo o mundo cabe em Lisboa"... É uma referência a nível mundial este festival do cinema (documental). Organização notável da Apordoc - Associação pelo Documentário. Palmas para eles e elas que fazem estas coisas acontecer na nossa terra. 20 edições é obra. E a continuidade sem quebra da qualidade...

Das diversas secções (são 12), destacamos, para os leitores do nosso blogue, a Retrospectiva > A Questão Colonial. 

Vão passar, só nesta secção 35 filmes de curta, média e longa metragem.  Todos os filmes são legendados em português. Com a devida vénia, selecionámos os filmes que vão ser exibidos hoje e amanhã, na Cinemateca Portuguesa e no Cinema São Jorge.   

Eu, que sou fã do doclisboa, desgraçadamente, vou estar, durante a semana, na Lourinhã, a fazer fisioterapia... Espero que alguns dos nossos cinéfilos possam lá dar um salto e escrever duas linhas (críticas) sobre um ou mais destes filmes... Alguns, seguramente, serão polémicos...

Vamos apresentando, ao longo dos dias, a programação relativa a esta secção. Destaque para o filme "Mortu Nega" do realizador Flora Gomes (Guiné Bissau, 1988, 93’), considerado o filme "fundacional" da cinematografia guineense. Passa hoje, dia 6 de outubro, às 15:30, na Cinemateca Portuguesa,  Sala M. Félix Ribeiro.

Quem não puder vê-lo na sala de cinema, tem-no aqui, no You Tube. Falado em crioulo, com legendas em inglês e em português. Versão integral. 

Flora Gomes nasceu em Cadique, em 1949. Ver aqui sinopse, enquadramento histórico, ficha artística e técnica do filme "Mortu Nega", que em português quer dizer "morte  negada"). 

2. O texto  e as imagens, a seguir, são extraídos do programa do doclisboa'22, incluindo as sinopses dos filmes que aqui se reproduzem para mera informação dos nossos leitores. Como não os vimos, a não ser alguns excertos do "Mortu Nega", não podemos ter opinião sobre eles:

Parafraseando Sartre, algumas reflexões sobre a questão colonial… no cinema. No caso, cingimo-nos à história recente, ao continente africano e às antigas colónias portuguesas e francesas. 

O ponto de partida é o fim da Guerra da Argélia – simbolizando o fim das colónias francesas, habilmente mantidas sob o jugo neocolonial – que coincide com a decisão do Estado Novo de avançar para a guerra colonial. 

Rapidamente, a revisitação dos materiais das “colecções coloniais” revela-se desajustada, condicionada à recontextualização, que reduz o cinema ao documento. 

A viagem deriva, então, para os cineastas solidários e sobretudo o nascimento dos cinemas africanos. Resta saber se, como Ousmane perguntava a Rouch, quando houver muitos cineastas africanos, os cineastas europeus deixarão de fazer filmes sobre África.

Dois momentos fundacionais do cinema guineense e da colaboração de Flora Gomes e Sana na N’Hada, gestos híbridos entre ficção e reconstrução, em busca da imagem de um país e de um povo. O funeral de Amílcar Cabral, finalmente realizado com honras de Estado após a independência, simboliza o nascimento da nação e "Mortu Nega" o seu nascimento cinematográfico.

06 Out — 15:30 / 117’
Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro




O Regresso de Amílcar Cabral
Djalma Fettermann, Flora Gomes, José Bolama, Josefina Crato, Sana na N'Hada
1976/Guiné Bissau, Suécia/32’

Primeira produção de cineastas guineenses após a libertação do colonialismo português em 1974, O Regresso de Amílcar Cabral documenta a transferência dos restos de Amílcar Cabral de Conacri (onde foi assassinado em Janeiro de 1973) para Bissau em 1976. Uma cobertura intrigante do evento solene, gravações de canções guineenses e [...]

Mortu Nega

Mortu Nega
Flora Gomes
1988/Guiné Bissau/93’

Mortu Nega cobre o período entre Janeiro de 1973, durante os meses finais da guerra contra os portugueses, até à consolidação de uma Guiné-Bissau independente, em 1974 e 1975. O filme começa no mato com um transporte na rota de abastecimento de Conacri para a frente. A heroína, Diminga, e [...]

06 Out — 19:00 / 86’
Cinemateca Portuguesa Sala M. Félix Ribeiro



Africa on the Seine

Afrique sur Seine
Mamadou Sarr, Paulin Soumanou Vieyra
1955/Senegal/21’

De acordo com o Decreto Laval dos anos 1930, os projectos de filmes estavam sujeitos a censura prévia. Neste contexto, os realizadores não obtiveram autorização para filmar em África e, em vez disso, fizeram esta curta sobre as vidas de africanos em Paris. O filme revela questões de estudantes sobre [...]


La Noire…
Ousmane Sembène
1966/França, Senegal/65’
Diouana, uma jovem de uma aldeia senegalesa, deambula por Dacar todos os dias à procura de trabalho. Apesar da enorme oferta de mulheres desempregadas, dada a sua subserviência, é “escolhida” para ama de uma família francesa rica. Quando tem autorização para se mudar para França para viver com eles, parece [...]



07 Out — 16:45 / 68’
Cinema São Jorge Sala 3

Nestes filmes, rodados por cineastas militantes e solidários que desafiaram a censura em França, condensam-se os anos de violência da Guerra da Argélia – vividos no presente e na frente de combate em Algérie en flammes ou nas imagens que dela trazem as crianças exiladas na vizinha Tunísia em J’ai huit ans – e a força de esperança do país no Ano Zero da independência.


J'ai huit ans

J'ai huit ans
Olga Baïdar-Poliakoff, Yann Le Masson
1962/França/10’

Crianças argelinas, sobreviventes da Guerra da Argélia e refugiadas em campos tunisinos, mostram os acontecimentos trágicos que viveram através de desenhos que elas próprias fizeram. Banido em França durante 12 anos e apreendido 17 vezes, o filme foi sobretudo exibido clandestinamente.


Algérie en flammes

Algérie en flammes
René Vautier
1958/França/23’

Primeiro filme rodado no maqui do Exército de Libertação Nacional em 1956-57. O objectivo destas imagens da guerra, filmadas na zona de Aurès-Nementcha, era manifestar apoio popular à organização armada e encorajar o diálogo para a paz. O filme circulou imediatamente pelo munto inteiro, excepto em França, onde foi exibido [...]

Algérie, année zéro

Algérie, année zéro
Jean-Pierre Sergent, Marceline Loridan-Ivens
1962/França/35’

Seis meses após o fim da guerra, o filme esboça um retrato comprometido de uma Argélia recém-independente a braços com a enorme tarefa de reconstrução social e económica. O país é retratado pelas suas vozes rurais e urbanas, carregando as cicatrizes do colonialismo e a ameaça do terrorismo da OAS [...]


07 Out — 19:30 / 68’
Cinemateca Portuguesa Sala Luís de Pina

Uma sessão no limiar da história de Angola, entre a independência duramente conquistada e a ameaça da guerra civil, num breve momento de esperança no futuro da jovem nação. A passagem da câmara das mãos dos camaradas cineastas europeus para os jovens cineastas angolanos acontece também neste momento que o futuro não concretizou.


Nascidos na Luta, vivendo na Vitória
Asdrúbal Rebelo
1978/Angola/18’
Retrato das crianças nascidas ainda durante a guerra, membros dos Pioneiros – a organização juvenil do MPLA. Como o título prenuncia, o filme é feito num momento em que, no rescaldo do trauma da Guerra de Independência, se vive um momento de esperança no futuro de Angola e da revolução.


Guerre du peuple en Angola

Guerre du peuple en Angola
Antoine Bonfanti, Bruno Muel, Marcel Trillat
1975/França/51’´

O filme centra-se na situação vivida em Angola em Junho de 1975, quando a declaração de independência desencadeia uma guerra civil. Os cineastas, que aí se deslocaram para formar jovens angolanos, regressam com este filme, apresentando de forma inequívoca a guerra como a luta das pessoas e do seu movimento [...]

(Continua)

[Seleção / revisão / fixação de texto / subtítulos / negritos / itálicos, para efeitos de edição deste poste: LG. ]
_________

Notas do editor:

Último poste da série > 5 de outubro de  2022 > Guiné 61/74 – P23675: Agenda cultural (816): "Despojos de Guerra", mini-série da SIC, a ir para o ar nos próximos dias 6; 13; 20 e 27 de Outubro, no fim do Jornal de Noite. No dia 20, o episódio é dedicado aos nossos camaradas Giselda e Miguel Pessoa, "o casal mais strelado do mundo"

terça-feira, 27 de setembro de 2022

Guiné 61/74 - P23647: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (96): Os geradores nos quartéis também forneciam eletricidade para a população civil? (Manfred Stoppok, investigador alemão, a fazer um estudo sobre a história da energia elétrica na Guiné-Bissau, 1890-2020)


Diorama de Guileje > 2008 > A casota do gerador Lister: miniatura, da autoria de Nuno Rubim, destinada ao Núcleo Museológico de Guileje, Guileje, região de Tombali, Guiné-Bissau


Fotos (e legenda): © Nuno Rubim (2008). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Um gerador de marca Lister, parecido com o que deveria existir em Guileje. 

Imagem retirada da Net:  Nuno Rubim (2007)



1. Mensagem de Manfred Stoppok (foto à esquerda), antropólogo social, investigador de pós-doutoramento, da Universidade de Bayreuth, Alemanha

 
Data - 26 de setembro de 2022, 16:44
Assunto - A electrificação e os militares na Guiné-Bissau nos anos 1960

Exmos Senhores,

O meu nome é Manfred Stoppok, sou investigador pós-doc na Universidade de Bayreuth,  Alemanha. 

Já fui várias vezes à Guiné-Bissau, e neste momento faço um estudo sobre a história da eletricidade no país.

Eu descobri nos arquivos históricos ultramarinos em Lisboa que, durante a guerra de 1961/74,  uma grande parte da capacidade de produção de eletricidade estava nas mãos das forças armadas portuguesas: dos 59 lugares com geradores fora de Bissau, 47 tinham somente um gerador nas mãos das forças armadas, e somente 19 tinham uma distribuição civil.

Em termos da capacidade de produção, ambas, a administração civil e as forças armadas,  tinham cerca de 1 MW cada um no total.

Este aspeto é provavelmente uma coisa muito especial no desenvolvimento do sector de energia. Neste sentido, tenho algumas perguntas, na resposta às  quais os senhores talvez me possam ajudar.

(i) Os geradores dos militares forneciam eletricidade em geral somente para os quartéis – para uso próprio – ou também forneciam eletricidade para as unidades administrativas, escolas, hospitais,  etc.? Ou até mesmo para alguns particulares ou comerciantes?

(ii) Ou havia uma iluminação pública das ruas naqueles lugares? 
Em pelo menos alguns casos isso acontecia, havia eletricidade para a administração, mas eu não sei se isso  era a regra ou a exceção.

(iii) E, bem interessante para mim, o que é aconteceu com os geradores militares na hora da independência da Guiné-Bissau? O mais provável é que os geradores tenham sido levados para Portugal, o que significou a perda de quase 50% da capacidade de produção fora do capital Bissau. Ou será que estes equipamentos ficaram na Guiné?

Eu agradecia muito se os senhores puderem e quiserem partilhar as suas experiências comigo ou então indicar-me  onde posso encontrar documentação sobre estas coisas.

Eu também estarei em Lisboa por duas ocasiões nos próximos meses – no final do outubro de 2022 e no início de fevereiro de 2023 – e teria muito gosto em ter um encontro pessoal com quem quiser partilhar as suas informações e memórias relativamente a este assunto,

Com os melhores cumprimentos
Dr. Manfred Stoppok

[Revisão e fixação de texto, negritos: L.G.]

Manfred Stoppok | Post-Doc Researcher

f: funded by Fritz Thyssen Foundation
a: University of Bayreuth – Social Anthropology
e: manfred.stoppok@uni-bayreuth.de
w: www.history-electrification.com



Capa do livro "A Engenharia Militar na Guiné: o Batalhão de Engenharia". Coordenação do Gabinete de Estudos Arqueológicos da Engenharia Militar. Lisboa: Direção de Infra-estruturas do Exército, 2014, 166 pp.


Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 > Bambadinca > CCS / BART 2917 (1970/72 > Vista (parcial) da tabanca de Bambadinca, com o Rio Geba ao fundo, e a saída para leste (no sentido de Bafatá)... Em primeiro plano, lado nordese do quartel e um dos abrigos, sobranceiros à tabanca, e a morança do comerciante português Rodrigo Rendeiro, do outro lado do arame farpado... Ficava do lado direito, quando se subia, vindo de Bafaté e do rio Geba, a famosa rampa de acesso ao quartel e posto administrativo de Bambadinca. São visíveis, na foto (se for ampliada), os postos de iluminação pública, ao longo da rua principal (que ia do quartel até ao porto fluvial).

Foto: © Benjamim Durães (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região do Oio > Porto Gole > Março / Abril de 1968 > CART 1661 > Trabalhos de electrificação do aquartelamento a cargo de uma equipa do BENG 447, onde se integra o José Nunes, autor desta imagem...

Foto (e legenda): José Nunes (2009).  Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. Comentário do editor LG:

Meu caro Manfred: vamos tentar  ajudá-lo (*). Obrigado pelo seu contacto. Procurei  melhorar a sua mensagem em português. Mas não temos, à partida, grande informação (e muito menos conhecimento)  sobre a eletrificação da Guiné-Bissau no nosso tempo (1961/74). E falta-nos, enquanto antigos combatentes, uma visão geral sobre a situação da eletrificação do território... 

Nos quartéis, havia pelo menos um gerador (nalguns casos, haveria um sobresselente para suprir avarias) que funcionava preferencialmente à noite. Nunca ou raramente estavam a operar 24 horas por dia. Fez-se um esforço por eletrificar todos os aquartelamentos localizados em povoações importantes. E isso competia à engenharia militar (BENG 447).

Havia quartéis maiores do que outros, e alguns estavam implantados nas próprias povoações, sendo natural que contribuissem para a ilumição pública fora do perímetro do arame farpado, nas proximidaxes da porta de armas e na rua principal da localidade (caso de Bambadinca, Teixeira Pinto, Nova Lamego, Farim, Catió...). 

Em localidades como Bambadinca (onde eu estive, de julho de 1969 a março de 1971, e que teria, na altura 2 mil habitantes, e cerca de 400 militares), e que era um posto administrativo fazendo parte do município  de Bafatá (a segunda maior cidade do território, a 30 quilómetros, a nordeste),  o perímetro militar integrava as instalações e a casa do chefe de posto, a escola (com a casa da professora, cabo-verdiana), bem como uma capela cristã... O edifício dos correios, se bem recordo, já ficava fora... As casas comerciais estendiam-se ao longo de uma rua de trezentos metros que era ilumianada, tanto quanto me lembro... O resto (duas tabancas) ficava às escuras... O gerador militar também fornecia luz ao posto de intendência no porto fluvial, na margem esquerda do rio Geba Estreito, a escssas centenas do aquartelamento, sede de um batalhão (BCAÇ 2852 e depois BART 2917)...

Os frigoríficos (tanto dos comerciantes civis como os da tropa, e de um ou outro particular) eram alimentados a petróleo. E alguns de nós, graduados,  tinham também pequenos frigoríficos, nos quartos para manter frescas as bebidas  como a cerveja... (Um luxo, a cerveja gelada, o gelo para o uísque, a água de Vichy e de Perrier...).

Por outro lado, temos ainda a memória do cinema ambulante, que passava, mesmo no tempo da guerra, por algumas povoações mais importantes do leste da Guiné. E havia localidades que tinham sala de cinema (Bafatá, Teixeira Pinto, Nova Lamego...).

É importante que fale com os nossos camaradas do BENG 447, o Batalhão de Engenharia nº 447, que estava sediado em Brá, Bissau, e era responsável também pela construção e eletrificação das instalações militares no mato.

Fica aqui o seu apelo. Vamos ver se aparece informação relevante para si e o seu projeto sobre a história da electricificação da Guiné, terra a que nos ligam fortes laços afetivos e muitas memórias (boas e más). Vejo que fala e/ou escreve português. Isso facilita os contactos. Boa sorte, boa saúde, bom trabalho. LG

PS1 - Temos ideia que houve, no tempo do governador  Sarmento Rodrigues (1945/49) e depois do general António Spínola (1968/73), uma melhoria da eletrificação do território. Mas não temos informação detalhada. Por outro lado, Bissau estava muito melhor iluminada, à noite,  antes da independência do que depois. Em 2008, quando lá voltei, a cidade vivia às escuras. Fale também com o nosso camarada Mário Beja Santos, que é um enciclopédico estudioso da história da presença portuguesa no território, bem como  o nosso camarada Patrício Ribeiro, fundador e diretor da empresa, com sede em Bissau, Impar Lda, do sector de energia.  Dar-lhe-ei depois os contactos,

PS2 - O nosso José Nunes (José Silvério Correia Nunes), ex-1º Cabo Mecânico de Eletricidade no BENG 447 (Brá, 15Jan68 - 15Jan70) esteve na Central Elétrica do Quartel General, em Bissau. Tem, por certo, conhecimento da matéria. (Vd. o precioso poste P2470, de 22 de janeiro de 2008 " (**)
___________


(**) Vd. 22 de janeiro de  2008 > Guiné 63/74 - P2470: Diorama de Guileje (5): Geradores na Guiné (José Nunes)

(...) Estive na Guiné de 15 de Janeiro de 1968 a 15 Janeiro de 1970. Fiz assistências e electrificações em aquartelamentos, Porto Gole, Enxalé, Ponta do Inglés, Bolama, Bissum-Naga.

Acerca dos manuais que o Camarada Coronel NUno Rubim precisa, deve ser difícil pois nunca os vi em 2 anos e um dia de Comissão, nem na escola Militar tivemos acesso a eles.

Os grupos geradores mais utilizados eram: 500/250 KVA, 150, 50/47,5 KVA.

No Quartel General (QG), na Central nova, havia dois Dorman de 250 KVA, com 6 cilindros, refrigeração a água por radiador e, um grupo gerador de emergência Lister de 75 KVA.

Na Central velha, existia operacional um Deutz de 12 cilindros em V, refrigerado a ar e um Lister de 50 KVA.

Na Engenharia 
 [ BENG 447] e no Hospital Militar estavam os grupos geradores maiores.

No mato, normalmente, encontravam-se geradores com potências de 50, 20 e 7,5 KVA.

As marcas Stanford e Frapil para pequenas potências até 20 KVA. As motorizações eram diversas: Dorman, Deutez, Lister e EFI produção nacional.

Em Porto Gole havia um Lister de 47,5/50 KVA, na Ponta do Inglês havia um Gerador de 20 KVA que lá fui levar com um operador de Motores Fixos 
[ e que se avariou, obrigando o pessoal a recorrer à iluminação a petróleo com garrafas de cerevja] .

Ajudei a transferir o grupo gerador, na lama, da LDP (Lancha de Desmbarque Pequena)  para cima do Unimog, a descarregar no local e a fazer ligações de potência.

Por azar, o meu camarada inverteu a polarização na excitação e o gerador ficou inoperacional.

Tive de me pirar porque fui lá desenfiado só para ajudar e para ver se o Operador vinha no mesmo dia para Bissau, mas ficaram sem iluminação e o Engenheiro ficou lá até ao próximo transporte, regressando eu a Porto Gole onde levei uma valente piçada.

Ponta do Inglês 
[destacamento do Xime, na foz do rio Corubal], iluminação? A bazucas [garrafas de cerveja, de 0,6 l] cheias de petróleo penduradas no arame farpado.

A iluminação nos aquartelamentos era feito com cibes 
[ rachas de troncos de palmeira] a fazer de postes, linhas de cobre nú de 2,5 mm2, circuito fechado em anel, lâmpadas Philips 150 Watts spot.

Os quadros eléctricos eram em baquelite, equipados com fusíveis ou disjuntores quando os havia.

Não havia uniformização nos geradores, tal como muita coisa era comprada ao sabor de quem dava melhor percentagem, mas a maioria dos aquartelamentos tinha geradores de 7,5 ou 20 KVA. (...)

 

Vd. também postes de:

26 de agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4867: Memória dos lugares (35): Porto Gole, Março/Abril de 1968, CART 1661 (José Nunes, ex-1º Cabo, BENG 447, Brá, 1968/70)

sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Guiné 61/74 - P23558: Agenda cultural (821): Filme a não perder: "Montado, o Bosque do Lince Ibérico", realizado pelo naturalista Joaquín Gutiérrez Acha, uma produção luso-espanhola (2020, 94 minutos). Em exibição nos cinemas.


M
ontado, o Bosque do Lince Ibérico: Um filme a não perder. Um coprodução luso-espanhola (2020, 94 minutos). Um orçamento de 4 milhões de euros.  Surge na sequência da candidatura do montado a património da humanidade da UNESCO  Estreia em Portugal no dia 11/8/2022.

Rodagem: período de 18-20 meses: locais: Alentejo (Pt), Andaluzía (Es), Estremadura (Es), Castilla-León (Es). Conclusão do filme 2020.

Ver aqui o trailer oficial:


Segundo informação da distribuidora, a Zero em Comportmento, "este filme, surge na sequência da candidatura do montado a património da humanidade da UNESCO e leva-nos, através do olhar particular de Joaquín Gutíerrez Acha, numa viagem imersiva.

" Com a narração da atriz Joana Seixas, o realizador mostra-nos um raro exemplo de boas práticas da interferência do homem no curso da natureza em voos contemplativos sobre este bosque ancestral na Peninsula Ibérica."

Em exibição em Lisboa, com sessões programadas (em setembro e outubro) também para Seia, Castelo Branco e Coimbra. Sessões do filme podem ser feitas a pedido (nomeadamente municípios), para a distribuidora, através de formulário disponível aqui.

Sobre o realizador e a ficha técnica. ver aqui.

1. Montado, o Bosque do Lince Ibérico

Documentário 94 min | 2020 | M/6 

Realizado por Joaquín Gutiérrez Acha

Elenco:  Joana Seixas


Sinopse

O montado é um ecossistema peculiar que contém em si uma enorme biodiversidade e riqueza natural, desempenha funções importantes na conservação do solo, na qualidade da água e na produção de oxigénio, é um pilar importante da economia local e dá origem a uma paisagem particularmente bela. 

Feita de bosques abertos, de azinheiras e sobreiros que só se encontram na Península Ibérica, lembra-nos a Savana africana. 

Um lugar onde a Natureza se cruza com a actividade humana, em que nem a floresta sai prejudicada, nem a larga comunidade de predadores que nele luta pela sobrevivência.” é deste modo que a actriz Joana Seixas, a narradora, vai descrevendo as imagens captadas pelo documentarista e naturalista espanhol Joaquín Gutíerrez Acha que, para este filme, contou com um orçamento de quatro milhões de euros. 

O filme estreou em 11/8/2022, está em exibição em Lisboa, no Cinema City Alvalade, todos os dias, às 13h25, 15h25, 19h50.

Fonte: Público > CineCartaz (com a devida vémia...)

Informação mais detalhada sobre o filme: 

Wilder >  “Montado, o bosque do lince-ibérico” vai ter novas sessões, 
por  Helena Geraldes | 18.08.2022 


2. A versão original,  em castelhano, está disponível (incluindo legendas em castelhano) na rtve play (desde 11/6/2022 até 8/5/2032)

Dehesa, el bosque del lince ibérico


Duração: 01:33:25 

Sinopsis

En la Península Ibérica existe un bosque muy particular, la Dehesa; un bosque único en el mundo donde descubrimos sensaciones muy diversas. Aquí, las selvas espesas del pasado se adaptaron a la actividad del hombre creando un ecosistema de especies autóctonas en perfecto equilibrio, hasta ahora.
 
Fonte: rtve play (com a devida vénia...)

domingo, 3 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23136: Agenda cultural (806): Salgueiro Maia - O Implicado, filme de Sérgio Graciano (Portugal, 2021, 1h 55m), a estrear nos cinemas no próximo dia 14


Cartaz do filme Salgueiro Maia - O Implicado, 
a estrear nos cinemas no próximo dia 14 d abril de 2022

Cortesia da distribuidora Cinemundo



SALGUEIRO MAIA - O IMPLICADO

Estreia em cinema: 14 de Abril de 2022


Ficha técnica:

Título original: Salgueiro Maia – O Implicado

País e no de produção: Portugal, 2021

Duração: 1h 55m

Classificação do filme: M/12

Realizador: Sérgio Graciano

Elenco: Tomás Alves, Filipa Areosa, Frederico Barata, Catarina Wallenstein, José Condessa

Género: Biopic; Drama


disponível no conta Cinemundo / You Tube


Sinopse:

Salgueiro Maia – O Implicado
, constitui o primeiro retrato, a projetar no grande ecrã, daquele que é considerado o herói e o símbolo mais puro do 25 de Abril de 1974. Fernando Salgueiro Maia, o anti-herói não ocasional, produto de uma formação académica e militar, foi um homem que soube pensar o futuro, seguir as ideias, contestando-as, vivendo uma vida cheia, alegre e fértil, solidária e sofrida – se não tem morrido prematuramente aos 47 anos, teria agora 75.

Através de uma abordagem moderna, intimista e emocional, Salgueiro Maia – O Implicado retrata as histórias que ainda não foram contadas sobre o Capitão de Abril. As pequenas revelações que permitem perceber melhor de onde vinha a moderação, a valentia, a educação e a firmeza com que sempre se apresentou publicamente, e que foram a chave para que a Revolução dos Cravos tenha sido como foi.

Mais do que um docudrama, Salgueiro Maia – O Implicado é uma história de ficção baseada em factos históricos, relatos pessoais, revelações íntimas, emoções reais de quem acompanhou o capitão ao longo de toda a vida. Um filme que revela o outro lado de uma personagem mítica e que presta homenagem ao homem, ao estudante, ao militar, ao pai, ao amigo e ao ímpar militar de Abril.

Com Tomás Alves, Frederico Barata, Filipa Areosa e Catarina Wallenstein nos papéis principais e guião de João Lacerda Matos, o filme parte da biografia exclusiva e da investigação de António de Sousa Duarte.

A produção é da Sky Dreams Entertainment que tem como coprodutora a colombiana 11:11 Films & TV

O filme será distribuído pela Cinemundo e conta com os apoios/parcerias da RTP, PIC/ICA/Turismo de Portugal e CM Lisboa.

(Fonte: Cinemundo, com a devida vénia...)

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Nota do editor:

Último poste da série > 26 de março de 2022 > Guiné 61/74 - P23115: Agenda cultural (805): No âmbito das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril: lançamento de nova edição do livro "Salgueiro Maia - Um homem da liberdade", de António Sousa Duarte: Lisboa, Quartel do Carmo,1 de abril de 2022, 17h30

quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22747: Memória dos lugares (432): Tabatô, a tabanca da utopia, a 10 km, a nordeste de Bafatá - Parte III


Guiné-Bissau > Bissau > Dezembro de 2009 > Hotel SPA Coimbra, sito na Av Amílcar Cabral >   Da esquerda para a direita, o João Graça, músico e médico,  português, o Mamadu Baio (músico da tabanca mandinga de Tabatô,), Victor Puerta (cooperante espanhol / Barcelona, ONG Intercanvi), Catarina Meireles (médica portuguesa), Jandira (só se vê o rosto,  guineense, à data era namorada do Alexandre Lopes um dos donos do Hotel SPA Coimbra)...

A menina da frente e o primeiro rapaz (de pé.  não recordo o nome, convivi pouco, ) eram namorados, e estavam em cooperação mas no âmbito informático/administrativo em Bissau. Também já não  recordo se eram portugueses.

A última pessoa sentada é a Enf Luísa, de Coimbra, no mesmo projeto que eu - ONG Saúde em Português. Éramos como D. Quixote e Sancho Pança (não sei quem era o quê... ehehe) e auto-batizamo-nos de Catarina Sanhá e Luísa Baldé .... ehehehehe.

O último senhor em pé é o Dr. Miguel Lopes - dono/proprietário do Hotel (com o irmão Alexandre e a mãe, D. Francelina).
 
Local: lobbi bar do restaurante do Hotel Spa Coimbra (recentemente inaugurado). Este jantar foi-nos oferecido, a mim e à Luisa, em gratidão à alegria que levávamos à Casa (e despedida antes de Natal... também)!
 
Foi-nos permitido convidar amigos e, de entre aqueles que estavam em Bissau e podiam vir... resultou esta fabulosa moldura humana.

Legenda: Catarina Meireles (2021)
 
Foto: © João Graça  (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complemenetar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné-Bissau > Região de Bissau > Tabatô > 28 de Novembro de 2009 > A cerimónia do Tabaski... em que pela 1ª vez participaram três europeus, não-muçulmanos, duas portuguesas e um espanhol... Uma das portuguesas foi a Catarina Meireles, médica, que aparece nas fotos a seguir,  nas fso (a 3ª, a contar de cima), com uma criança mandinga ao colo; e na 2ª, partilhando a refeição)... Na 1ª foto, de cima  a temos uma vista geral da assembleia, durante a cerimónia do Tabaski, na aldeia mandinga de Tabatô, a ea nordeste de Bafatá, a escassos 10 km. 



Guiné-Bissau > Região de Bissau > Tabatô > 28 de Novembro de 2009 > Festa do Tabaski >  O Mamadu Baio ,. à esquerda, partilhando a refeição do dia com a Catarina  Meireles e um putro estrangeiro


Guiné-Bissau > Região de Bissau > Tabatô > 28 de Novembro de 2009 > Festa do Tabaski >  A Caytarina Meirelss com um menina mandinga
 

Fotos (e legendas): © Catarina Meireles   (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complemenetar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Tabatô > 16 de dezembro de 2009 > 9h30 > O chefe da aldeia, Mutar Djabaté, pai do músico Kimi Djabaté, e ele próprio um grande balofonista (tocador de balafon)... É um dos atores principais do filme do João Viana, "A batalha de Tabatô" (2013), juntamente com Fatu Djabaté e Mamadu Baio. Sinopse do fil
me: "Depois de anos a viver em Portugal, o pai de Fatu regressa a África para assistir ao casamento da filha com Idrissa Djebaté. Ela é professora universitária e seu futuro marido é um músico conhecido. A festa de casamento é em Tabatô, um lugar extraordinário onde todos os seus habitantes são, há 500 anos, músicos djidius, cantores-poetas que narram contos e lendas representativos da vida africana. No caminho até lá, à medida que as recordações se avivam, o velho senhor começa a revelar traumas esquecidos da sua juventude, enquanto soldado mandinga na guerra colonial, décadas antes.
Filmado na Guiné- Bissau, é a primeira longa-metragem de ficção de João Viana, que foi distinguido com uma menção honrosa na edição de 2012 do Festival Internacional de Cinema de Berlim." CineCartaz / Público.

Foto (e legenda): © João Graça   (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 

1. Tabatô passou-nos completamemte ao lado, ao tempo da guerra colonial, Era uma aldeia, discreta, de músicos, com raízes ancestrais no antigo império do Mali e depois no reino do Gabu, Fica a 10 km, a nordeste de Bafatá, do lado direito da estrada que segue para Contuboel (e a cerca de 15 km, a sul desta povoação, onde  alguns de nós estiveram no respetivo Centro de Instrução Militar, em 1969)(*).

Depois da independência da Guiné-Bissau, form etnomusicólogos, como o canadiano Sylvain Paneton quem pôs Tabatô no mapa, com um estudo "seminal", de 1987, sobre o "balafón" (**).

Mas só em março de 2010 é que se realiza o Festival de Cultura Tradicional do Balafon, que traz à aldeia a conunicação social (rádio, televisão, jornalistas, nacionais e estrangeiros). Mas uns meses antes a aldeia era visitada por potugueses, como o João Graça e a Catarina Meireles, ambos médicos. Notável é o facto de, sendo mulher, a Catarina  ter conseguid conseguido  mesmo assim participar na festa do Tabaski (***), o que a antropóloga social brasileira   ainda não conseguira. É desta investigadora o importante estudo sobre a música afro-mandinga, com raiz em Tabató (****):

Eis alguns excertos sobre Tabatô e a sua população e a sua história, extraídos da tese de doutoramento da Carolina Carret Höfs, com a devida vénia:

(...) Está localizada a 12 km de Bafatá, na zona leste do país, e (...) é conhecida pela sua população ser maioritariamente de griots ["djidius"] , apesar de ser dividida em duas metades.

(...) A segunda metade é habitada pelos descendentes do régulo fula. Há ainda em Tabato uma família que é tida como de cativos, sendo o patriarca destes o homem mais velho da tabanka, mas que não tem a autoridade do patriarca de apelido griot.

(...) Embora considerada uma tabanca mandinga, Tabatô está sob o regulado de um homem fula, que mantém uma certa autoridade sobre os mandingas que ali vivem, como podemos ver na maneira como exerce a sua autoridade nas reuniões na mesquita, em que se fala fula, e nas reuniões sobre assuntos da tabanca, como foi a dos preparativos para o Festival de Cultura Tradicional do Balafon, realizado em Março de 2010 [e que deu grande visibilidade nacional e até internacional a Tabatô].

Naquela altura, era imprescindível o aval do régulo fula como também de um guia de visitas, que foi preparado para receber a comitiva vinda de Bissau. A casa do régulo antigo estava entre os outros pontos de interesse, como o polón (a grande árvore em que está enterrado o patriarca), o mato sagrado, a casa-museu. (pág. 63)

(...) Tabato é uma pequena aldeia formada por uma moransa de descendentes do régulo fula
responsável pela vinda da família de Bundunka Djabaté para aquela zona do país. Estas casas foram construídas na primeira metade da aldeia, ao passo que os descendentes do griot mandinga ocupam a segunda metade das terras.

Estava-se nos fins do século XIX, quando Bundunka Djabaté chegou a Tabatô com as
suas esposas e os seus dois filhos, partindo de Kankan na Guiné-Conakry, a chamado de um
régulo fula cuja família, pouco a pouco, se foi espalhando por outras tabancas que pudessem nomear em língua fula, ao contrário do que se passou em Tabatô, uma das poucas localidades com nome mandinga que restaram depois da Guerra de Kansalá, quando o Império do Futa- Djalon se instalou onde antes estava o Reino do Gabu, última fronteira do Império do Mande (...).

Tabatô é uma referência também para griots de outras famílias na Guiné-Bissau, que
foram até lá para estudar com Ba Djabaté, e outros “grandes”, a arte do balafon e da djaliá. (pág. 214).

(...) Mutar Djabaté é hoje o homem grande de Tabatô, descendente do fundador da tabanca e, como chefe de família, ele é papesinho (pai pequeno) das gerações mais jovens, razão pela qual lhe devem respeito e sempre lhe apresentam, a ele e ao Conselho da família, as suas vontades, projectos e ideias. (...) (pág. 75)

(...) Até ao fim dos anos 1970 [, ou seja, desde a administração portuguesa até ao fim do regime de Luís Cabral ], os griots [ leia-se "djidius", em crioulo ] que ali estavam [ em Tabatô] viviam quase exclusivamente da sua arte [, atuando em festas, casamentos, choros...] o que ao longo do tempo se tornou insustentável pela própria conjuntura do país, obrigando muitas famílias a voltarem-se para a agricultura de exportação [ ,caso do caju, em particular], (e não apenas de subsistência, como acontecia até então), e entrando também nos grandes circuitos do êxodo rural [, estabelecendo-se em Bissau, por exemplo] e da migração internacional [, países vizinhos, Lisboa, Paris, Londres...] (...) (pág, 214).

(...) Na Guiné-Bissau e em Lisboa, os griots se apresentam não apenas em festas de
casamentos e baptizados ou no tabaski (a festa que celebra o fim do jejum do Ramadão),
como também participam em eventos voltados para o activismo social e engajamento em
questões sociais, como a dos direitos das mulheres, por exemplo. Entretanto, acompanhando
os diferentes contextos em que essas festas e suas actuações se dão, podemos perceber uma
diferença na maneira de se apresentar e realizarem sua performance, muito embora em todos eles preza-se por manter o propósito do djumbai, ou seja, do levar diversão às pessoas
presentes, mantendo aceso um dos propósitos da djaliá. (...) (pág. 157).

 
2. Grande exemplo do ecumenismo e da hospitalidade que em 2009 já se praticava em Tabatô,  é este relato da (Ana) Catarina Meireles (que hoje vive em Braga e é especialista em medicina geral e familiar). Merece voltar a ser reproduzido aqui no nosso blogue (***).


O Tabaski em Tabatô

por Catarina Meireles


No passado fim de semana (26-27 de nivembro de 2009) fui ao Tabaski - cerimónia de imolação do carneiro (por analogia: Páscoa dos Muçulmanos).

Depois de muitas resistências, dúvidas, declinações... lá consegui que me deixassem assistir ao ritual ("eucaristia") numa tabanca perto de Bafatá, de seu nome Tabatô - muito especial, particularmente pela sua forma de vida comunitária, que assenta na música e dança étnicas. São fabulosos!

Fui com mais uma amiga (portuguesa) e um amigo (espanhol). Vestimos roupas típicas, ocupamos as posições indicadas (segundo a ordem social vigente) e imitamos tudo o que nos diziam para fazer... E não me senti diferente... ao contrário, até me senti mais especial!

No fim do ritual, chamaram-nos (aos 3 brancos) para junto dos Homens Grandes e ajoelhámos em círculo.

Para quê? Para dar graças a Alá por esta dávida - pela primeira vez 3 brancos visitaram aquela tabanca no dia do Tabaski. Era um sinal divino de prosperidade e de vida longa (incluindo para nós!)

As explicações foram reforçadas várias vezes para que percebessemos o quão importante e bem-vinda era a visita dos 3 brancos.

Eu disse...
- Sim, 3 é número sagrado!

Eles rejubilaram com o entendimento do misticismo!

Foi-me pedido que falasse... e falei. Pedi uma cadeia de união - corrente de mãos dadas. Expliquei como fazer e disse:
- Não há preto, não há branco, somos todos irmãos... daí esta cadeia de união.

E do meu lado esquerdo soou uma voz meiga, dum dos homens que me acolheu nas 3 vezes que fui a essa tabanca:
- Obrigado, Fátima de Portugal!

Catarina Meireles

Bafatá, 1 de Dezembro de 2009


3. Mensagem da Catarina Meireles (que foi minha aluna em 2007, na ENSP / Universidade NOVA de Lisboa), com data de 22 do corrente (, respondendo a uma mensagem minha, e ao meu comentário: "Catarina, que bom saber de si, ter notícias suas, sentir que continua a ser o mesmo maravilhoso ser humano que eu conheci há de mais uma boa dúzia de anos, não ?!"):

(...) Bom dia a todos! Estive lá, na mesma altura com do seu filho João. Fui algumas vezes, a Tabatô, por ser realmente perto de Bafatá. Lá vivi o Tabaski (matança do carneiro) de 2009... E partilhei consigo, Professor. Aldeia verdadeiramente especial, Pessoas incríveis... Ainda hoje as sinto.


E sabe o curioso? Em 2010 fui a Cabo Verde, à ilha da Boavista... E num dia a passear pela rua se vendedores de artesanato encontrei alguém... Um homem dessa aldeia de Tabatô - uma Alegria imensa para ambos!!!

Eu dei-lhe "notícias da terra", pois não ia lá há anos... Contei-lhe do terreiro, festas para turistas, do novo poço da aldeia, da escola, das filhas do primo Figgi...

Os dois, de lágrimas nos olhos e coração cheio, demos um Abraço que só a Fraternidade Universal pode entender!

Manga di  Mantenhas!
Que bom recordar depois de tantos anos... (parece que foi ontem) 

Ana Catarina Meireles (...)


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Notas do editor:

(*) Vd. postes de 


22 de novembro de  2021 > Guiné 61/74 - P22741: Memória dos lugares (431): Tabatô, a tabanca da utopia, a 10 km, a nordeste de Bafatá - Parte II

(**) Vd. Sylvain Paneton . Le balafon mandinka mori. Compte-rendu et perspectives de recherches et d’études en Guinée-Bissau. Dissertação de Mestrado de Artes em Musicologia
apresentada à Faculdade de Música da Universidade de Montreal, 1987  (Mimeo).

(****( Vd. poste de 8 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6695: Memória dos lugares (89): Bafatá, Tabatô, Tabaski 2009: Não há preto nem branco, somos todos irmãos, disse a Fátima de Portugal numa cadeia de união... (Catarina Meireles)

(****) Carolina Carret Höfs - Griots cosmopolitas : mobilidade e performance de artistas mandingas entre Lisboa e Guiné-Bissau. Tese de doutoramento em antropolgia social. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2014, 271 pp.  Disponível em https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/12136/1/ulsd068997_td_Carolina_Hofs.pdf