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domingo, 8 de dezembro de 2019

Guiné 61/74 - P20427: Da Suécia com saudade (62)... E agora também dos States, Florida, Key West... A catarse do Império... O lugar do Portugal de hoje, tanto na Europa como no mundo, é que deveria ser assunto de discussões acaloradas (José Belo)


Anúncio dos Cimentos Liz, no jormal "Acção Colonial - Jornal de Informação e Propaganda das Colónias". Número Comemorativo da Exposição Colonial do Porto, 1934. Diretor: Frederico Filipe. Fonte: Cortesia de Hemeroteca Digital, Câmara Municipal de Lisboa.

"A história da marca dos cimentos Liz inicia-se em Portugal, no ano de 1918, quando o empresário português Henrique Araújo de Sommer funda, na localidade de Maceira-Liz, em Portugal, a Empresa de Cimentos de Leiria.

"Nessa época, ter tecnologia para a fabricação do cimento era fundamental, por isso, a empresa investiu no que havia de mais moderno ao instalar os fornos horizontais rotativos. Em 1923, as obras da fábrica da Empresa de Cimentos de Leiria foram concluídas e a produção entrou em pleno funcionamento.

"O sucesso da empresa permitiu que o empresário António de Sommer Champalimaud expandisse, em 1942, a marca do cimentos Liz e instalasse fábricas e empreendimentos em Moçambique e Angola.

"Outro marco na história da marca Liz foi a instalação do maior forno de cimento do mundo, na Companhia de Cimentos Tejo, em Alhanda, em Portugal. Além disso, foram instalados 19 fornos de cimento nas sete fábricas do grupo que eram responsáveis por produzir sete milhões de toneladas de cimento por ano." 

Fonte: Cimentos Liz > Perfil > Nossa Marca.

1. Mensagem de José Belo:

(i) régulo da Tabanca da Lapónia, membro da Tabanca Grande, tem 135 referências no nosso blogue:

(ii) jurista, vive na Suécia há mais de 4 décadas, e onde constituiu família: continua a ter uma pontinha de orgulho nas suas velhas raízes portuguesas: "Com netos sueco-americanos, o sangue Lusitano vai-se diluindo cada vez mais. Mas, como dizem os Lusíadas... 'Se mais mundos houvera, lá chegara'...".

(iii) foi alf mil inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, cap inf ref;

(iv) reparte os dias do ano entre a Suécia, o círculo polar ártico,  e Key West, na Flórida, EUA, onde a família tem negócios.



De: Joseph Belo
Enviado: 6 de dezembro de 2019 14:35
Assunto: Catarse

Meu caro  neo-avô Luís:

Aqui segue um texto escrito como comentário mas aparentemente demasiado longo no contexto.
Fica à...opiniäo dos editores.(*)

Quando o "Mítico Império" é referido no blogue em termos menos ortodoxos (**),  surgem de imediato pontos de vista intempestivos. Intempestivos por desnecessários.

Mais näo se trata do que trocas de ideias e opiniöes entre camaradas que procuram analisar os assuntos,  apresentando autores com diferentes leituras dos mesmos.

As nossas geracöes foram educadas desde os primeiros bancos escolares na ideia, criada por iluminados intelectuais e historiadores do governo da ditadura, de um mítico império constituído unicamente por heróis universais, santos missionários, e comerciantes de honestidade virginal.b  O Infante D.Henrique será um bom exemplo da mitologia de entäo.

Esta bonita, mas menos verdadeira, visão do império foi fácil de incutir nos  n espíritos jovens das nossas gerações.

Mais tarde fomos aprendendo que os que se atreviam a outras leituras da História Oficial (!)......acabavam mal.

Este "acabar mal ", mesmo que näo abertamente consciencializado por muitos, acabou por criar a tal unidade "patrioteira" à volta de um assunto incriticável por.... sacro.

Quem se dê ao trabalho de aprofundar o que foi a expansão (e influência) do pequeno povo de Portugal pelo mundo de entäo, sentirá näo só orgulho pela extensão do mesmo como pelas raízes ainda hoje bem vivas em locais dos mais inesperados.

Ao mesmo tempo surge a curiosidade de se compreender como tal foi possível. Os erros cometidos nesta "gesta" do império foram certamente muitos e graves.. Mas näo se deve esquecer que deverão ser analisados com os "olhos" e valores da época,e não com os valores dados actualmente como correctos para situações täo díspares.

E a vinganca póstuma do "saloiísmo-iluminado" do período da ditadura está no facto de muitos de nós não terem até agora conseguido a tal, e täo saudável ,"catarsis" libertadora dos mitos....por definição... näo factuais.

Continua-se a olhar sempre para o que "teremos sido",  sem nunca desejar-se verdadeiramente olhar para o que "somos" hoje.

Um povo que se respeite,  deverá sentir orgulho na sua História,nos seus heróis,nos seus mortos.
A nossa História é de tal modo rica que näo necessita de mitos e falsidades criados por oportunistas patrioteiros para a "valorizar".

Mas, e ao orgulharmo-nos dos mortos,  näo se deverá também sentir orgulho nos vivos? O lugar do Portugal de hoje (!), tanto na Europa como no mundo, é que deveria ser assunto de discussões acaloradas. 

Os antigos? São factos já gravados nas pedras. Foram o que foram. Não serão leituras revisionistas da História que os vão alterar.

Um abraço do J. Belo


2. Significado de catarse (LG)

catarse | s. f.
ca·tar·se |z|
(grego kátharsis, -eós, purificação)

substantivo feminino

1. [Filosofia] Palavra pela qual Aristóteles designa a "purificação" sentida pelos espectadores durante e após uma representação dramática.

2. [Psicanálise] Método psicanalítico que consiste em trazer à consciência recordações recalcadas.

3. [Psicanálise] Libertação de emoção ou sentimento que sofreu repressão.

4. [Medicina] Evacuação dos intestinos.

"catarse", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org/catarse [consultado em 08-12-2019].
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Notas do editor:

(*) Último poste da séruie 2 de dezembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20408: Da Suécia com saudade (61)... E agora também dos States, Florida, Key West... Carta aberta aos Editores e Camaradas da Tabanca Grande: o que todos (!) temos em comum é termos participado, cada um de seu modo e à sua maneira, na experiência incrível que foi a guerra da Guiné... Por favor, não caiamos na perigosa tentação de nos dividirmos em operacionais... e não operacionais (José Belo)

sábado, 1 de julho de 2017

Guiné 61/74 - P17533: Falsificações da história (3): (i) Oliveira Muzanty foi um governador-geral controverso; (ii) nunca houve nenhuma coluna de operações proveniente da metrópole em 1891; (iii) aventuras e desventuras no Oio do "herói" Graça Falcão... (Armando Tavares da Silva, historiador)


Guiné > Região de Bafatá > Bafatá > c. 1970 > Parque da cidade com a estátua de Oliveira Muzanty (governador-geral, 1907-1909) e, ao fundo, a Casa Gouveia.

Foto: © Benjamim Durães (2011). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. O historiador Armando Tavares da Silva mandou-nos os seguintes comentários ao poste P17532, sobre o trabalho de António dos Anjos “Resumo do que era a Guiné há vinte anos…” (edição de autor, Bragança, 1937). (*)

[Foto à direita: Armando Tavares da Silva, membro da nossa Tabanca Grande, autor de “A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar (1878-1926)” (Porto: Caminhos Romanos, 2016, 972 pp.). ]


 (i) A demarcação das fronteiras da Guiné

No início do Post apresenta-se uma imagem da estátua de Oliveira Muzanty erigida em Bafatá. A inclusão desta imagem neste Post leva-me a um comentário. Eu creio que essa estátua se destinou mais a homenagear o oficial que desempenhou um papel importante na chefia da parte portuguesa da comissão luso-francesa que procedeu à demarcação das fronteiras da Guiné, do que o governador a quem esteve confiado o território entre 1906 e Janeiro de 1909.

Nesta qualidade [, como governador,]  a sua actuação não deixou boas recordações nem resultados úteis, tendo mesmo no final do seu mandato sido objecto de fortes críticas. Muitas das campanhas militares que empreendeu, ou redundaram num efectivo fracasso, ou foram desnecessárias.

Notemos que a inutilidade da campanha de Muzanty de 1908 em Bissau fora também referida no relatório de inspecção das alfândegas da Guiné, a que procedera o comissário Henrique Gonçalves Cardoso em 1912, e que determinou uma reorganização destes serviços. No índice do relatório, na parte referente à apreciação da vida da província, são mencionados os seguintes parágrafos: “As guerras de Bissau”, “A intriga dos proprietários em Bissau”, “Necessidade de pacificação de Bissau”, “A campanha de 1908 foi inútil”. 

Caso curioso é o facto de as páginas deste relatório que conteriam estes parágrafos, não se encontrarem presentes no relatório, fazendo crer terem dele sido removidas propositadamente, talvez para esconder factos que alguém desejaria que ficassem desconhecidos.

A efectiva demarcação das fronteiras da Guiné para dar cumprimento às disposições da Convenção de Maio de 1886 desenvolveu-se em várias fases. A primeira decorreu entre Janeiro e Março de 1888, e nela foi feita a demarcação da fronteira sul, sem que problemas de maior tivessem sido levantados. Porém, a demarcação da fronteira norte vai ser fonte de dificuldades, pois obrigava Portugal a abandonar Zeguichor [, Ziguinchor ou Zinguinchor], facto contra o qual várias vozes se levantaram, originando resistências e um atraso nessa entrega, que só ocorrerá em 12 de Abril.

Após esta entrega, os trabalhos de demarcação ficam suspensos, pois a França pretendia agora que se fizesse uma alteração à Convenção de 1886, substituindo o cabo Roxo pela ponta Varela, donde partiria a linha de fronteira, o que não fora aceite. Parecia, de resto, que, conseguida a ocupação de Zeguichor, os franceses se desinteressaram de prosseguir os trabalhos de demarcação.

Estes só serão retomados no começo do ano de 1900, passados mais de 10 anos desde os trabalhos daquela primeira missão, e na sequência de uma série de diligências iniciadas com a apresentação, pelo governo português, junto do governo francês, de uma proposta com aquele objectivo, no início de 1898.


(ii) O papel do 2º tenente João Augusto d'Oliveira Muzanty na chefia da parte portuguesa da comissão luso-francesa para a demarcação das fronteiras

É para chefiar a parte portuguesa desta segunda missão que é nomeado o 2.º-tenente João Augusto d’Oliveira Muzanty. Porém, os novos trabalhos de demarcação iniciam-se pela fronteira sul, uma vez que os franceses rejeitavam o traçado fixado pela comissão de 1888, realizado com base em cartas que apresentavam erros, colocando exigências que se traduziam para Portugal na perda de territórios no Forreá. Isto conduz à ruptura das negociações e à necessidade de um levantamento rigoroso das zonas fronteiriças, e a aceitar a cessão recíproca de territórios se indicações geográficas ou outras a tornassem indispensável e fosse justificada.

Os trabalhos só são retomados em Janeiro de 1901, ficando os delegados portugueses instruídos a cingir-se, tanto quanto possível, à Convenção de 1886, mantendo-se os pontos iniciais da fronteira sobre o litoral, tanto ao norte como ao sul, nela mencionados, de modo a não diminuir a extensão da costa portuguesa. A fronteira sul ficará demarcada em Maio desse ano.

Os trabalhos de demarcação só serão retomados em finais de 1902, e Oliveira Muzanty mantinha-se a chefiar a delegação portuguesa. Novamente devido a inexactidões das cartas, nomeadamente ao facto de se ter reconhecido que, de acordo com estas, Cadé ficaria dentro do território português, contrariando os termos da Convenção de 1886, foi necessário proceder a compensações territoriais. Os trabalhos desta nova comissão ficam concluídos em Maio de 1903.

Só em Janeiro de 1904 serão retomados os trabalhos de demarcação da parte mais importante, a fronteira entre o Casamansa e o rio Cacheu, que obrigava ao levantamento destes rios, o qual fica terminado em Maio. Reiniciados no final de 1904, depois de passada a época das chuvas, virão finalmente a terminar em Abril do mesmo ano, com a colocação de um marco no cabo Roxo. Terminava assim um longo período, durante o qual a chefia da delegação portuguesa nestas comissões estivera confiada a Oliveira Muzanty.


(iii) O opúsculo de António dos Anjos contém inúmeras inexatidões, erros e omissões

O trabalho de António dos Anjos pretende transmitir a ideia de que foram múltiplas as dificuldades que se depararam às autoridades no estabelecimento de uma administração no território e, sobre este aspecto, cumpre o objectivo. Porém, devo advertir o leitor de que este trabalho contém muitas inexactidões, podendo criar uma ideia errada de alguns dos acontecimentos que procura relatar. O que é natural, pois o próprio diz “não consultei relatórios nem Boletins Oficiais”, baseando-se no que ouvira, e também no que tinha visto depois de chegar à colónia em 1911. E sabe-se quanto a transmissão oral do conhecimento leva à adulteração dos factos.

Não vamos ser exaustivos na análise do que escreve António dos Anjos. Digamos, como exemplo, que menciona a ida para a Guiné de uma coluna de operações proveniente da metrópole, aquando dos problemas de Bissau de 1891. Ora, o que é facto, é que nenhum contingente metropolitano foi enviado para Bissau nessa altura. Foram os efectivos lá existentes que protagonizaram os acontecimentos da altura.

Mas há uma parte do escrito de António dos Anjos que merece um comentário mais desenvolvido, pelas convicções que transmite e por me parecer estar bastante longe da realidade dos factos. Diz respeito ao que se passou no Oio em Março de 1897, na desastrada incursão desencadeada por Graça Falcão.


(iv) O mito do herói Graça Falcão

Jaime Augusto da Graça Falcão (e não António) tem um extenso historial desde que, como alferes, foi transferido de Angola para a Guiné por questões disciplinares em 1892, até ao momento em que, em 1926, foi aposentado compulsivamente pelo governador Vellez Caroço, por desrespeito a este. Extenso historial que não vou aqui desenvolver, acrescentando apenas que durante este período foi expulso por três vezes da Guiné, tendo a sua liberdade de movimentos na Guiné sido coarctada uma outra vez.

Digamos que a operação que ele promoveu no Oio em Março de 1897, que já tinha sido precedida de outra incursão entre Janeiro e Fevereiro do mesmo ano, que se saldara num “revés” e que o governador Pedro Inácio de Gouveia mandara sindicar, foi realizada à revelia deste, e para a qual não tinha autorização, deixando de cumprir a determinação de que os comandantes militares estavam proibidos de sair das sedes dos comandos sem ordem ou licença. 

Responsável por este desastre é também o 1.º tenente Álvaro Herculano da Cunha que, como delegado do governo no presídio de Farim, determinara a 6 de Março a organização de uma coluna de operações do Oio. Nesta incursão perderam a vida dois oficiais, dois sargentos além de vários soldados. Uma tentativa do governador de última hora, ao tomar conhecimento, através das autoridades do Senegal, de que os oincas pretendiam a paz, não resultou, alegadamente por tal intervenção ter chegado ao conhecimento de Herculano da Cunha e Falcão depois de iniciado o ataque.

Este lamentável episódio, deu origem a dois autos de averiguações, quatro relatórios, em que se procurava fazer luz sobre as razões últimas que levaram Graça Falcão a invadir o Oio, servindo-se de uma força apreciável de auxiliares.

Os relatos que até agora têm sido feitos sobre este incidente, tendentes a transformar Graça Falcão num herói, e a enaltecer o facto de este ter escapado com vida, desconhecem toda a realidade envolvida nesta lamentável aventura não autorizada, e cuja realização parece que fora previamente decidida. (**)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 29 de junho de  2017 > Guiné 61/74 - P17523: "Resumo do que era a Guiné Portuguesa há vinte anos e o que é hoje", de autoria do 2.º Sargento Reformado António dos Anjos, 1937, Tipografia Académica, Bragança (1) (Alberto Nascimento, ex-Sold. Cond. Auto da CCAÇ 84, 1961/63)

(**) Último poste da série > 31 de maio de 2017 > Guiné 61/74 - P17417: Falsificações da história (2): o ataque a Bambadinca em 28/5/1969: eu estava lá !... e vou enviar em breve um texto conjunto com o Fernando Calado com a nossa versão dos acontecimentos (Ismael Augusto, ex-alf mil manut, CCS/BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70)

quarta-feira, 31 de maio de 2017

Guiné 61/74 - P17417: Falsificações da história (2): o ataque a Bambadinca em 28/5/1969: eu estava lá !... e vou enviar em breve um texto conjunto com o Fernando Calado com a nossa versão dos acontecimentos (Ismael Augusto, ex-alf mil manut, CCS/BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70)



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > Da esquerda para a direita: o fur mil José Carlos Rodrigues Lopes, dos reabastecimentos, um mecânico (que não consigo identificar) , o Ismael Quitério Augusto (que estava de oficial de dia, como se fica a saber pela braçadeira vermelha), e o 2º sargento Daniel (se não erro: 2º srgt mecânico auto Rui Quintino Guerreiro Daniel).(*)

No Pelotão de Manutenção, constituído por 32 militares, havia um oficial de manutenção (o Ismael Augusto), um 2º srgt mecânico auto (o Daniel), um fur mil mec auto (o Herculano José Duarte Coelho), dois 1ºs cabos mec auto (João de Matos Alexandre e António Luis S. Serafim), mais três soldados mec auto (Amável Rodrigues Martins, Rodrigo Leite Sousa Osório e Virgílio Correia dos Santos)... Tinha ainda um 1º cabo bate-chapas (o Otacílio Luz Henriques, mais conhecido por "Chapinhas"), um correeiro estofador (1º cabo Norberto Xavier da Silva) e ainda um mecânico electro auto (Vieira João Ferraz). Os restantes dezanoveeram condutores auto: primeiros cabos (2) e soldados (17)...

Foto: © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem: Blogue Luís Graça.)



1. Mensagem de ontem, do Ismael Augusto, membro da nossa Tabanca Grande, cmdt do pelotão de manutenção, CCS/BCAÇ 2852 (Bambadinca, 2852),

Amigo e Camarada Luis Graça:

Tenho lido as versões mais disparatadas sobre o ataque, ou flagelação a Bambadinca. Esta é a mais fantasiosa. Não tem pés nem cabeça. (**)

Mantive-me em silêncio por considerar que cada um tem direito ás suas versões, vividas ou ouvidas de terceiros e também por saber que a memória muitas vezes atraiçoa. Também mantive o silêncio por considerar que haveria temas mais relevantes.

Mas sempre e apesar de tudo entendi que um dia talvez fosse o tempo de dizer alguma coisa.

Como perguntaria o saudoso Batista Bastos, se por acaso entrevistasse alguém sobre este tema "Onde é que estava no 28 de Maio de 1969, quando do ataque a Bambadinca? " Se a pergunta me fosse dirigida diria, como muitos outros amigos, eu estava lá, em Bambadinca.

O único mérito desta afirmação é que de facto estava lá.

Vou enviar em breve um texto conjunto com o Fernando Calado, que também lá estava e que se não for completo, terá o mérito de conter o essencial do que aconteceu.

Acrescentarei uma história, que acho divertida, que me foi contada na mesma Bambadinca, em Junho de 1995, por um antigo comandante do PAIGC, que comandava um bi-grupo na noite do ataque.

Até lá um grande abraço e os parabéns sempre renovados pelo excelente trabalho que tu e toda a equipa do blogue vem fazendo. A reconstrução das memórias é uma tarefa sem preço.

Ismael Augusto

2. Comentário do editor LG:

Obrigado, Ismael... Fico radiante com o teu mail e o prometido texto a quatro mãos...

Estou de acordo que se publiquem todas as versões, porque os olhos e os ouvidos de cada um são únicos... Mas, no teu/meu/nosso blogue, há o saudável princípio do contraditório... Sem
triangulação de fontes e saturação de versões não há "verdade histórica"...

Gostava de saber mais sobre este repórter de guerra, Al J. Venter (**), que devia ser próximo, política e ideologicamente, do regime de então... Só sei que ele visitou Bambadinca um ano depois do ataque, já vocês, a malta do BCAÇ 2852,  deviam estar em casa...

Arranjei esta série ("Falsificações da história") justamente para podermos rebater, com elegância e sentido de humor, aldrabices e fanfarronices que por aí se escrevem, a par de lapsos, imprecisões, erros... de um lado e do outro. Estamos a falar de "factos históricos", não de leituras da história: aí cada um lê ca história com os "óculos" que tem, ou seja, com suas "grelhas de leitura"...

Há imprecisões factuais que persistem, deliberadamente ou não,  e que acabam por serem fixadas na literatura, na comunicação social, na Net, etc. . Uma delas foi Madina do Boé, como local da proclamação (unilateral) da independência da Guiné-Bissau, em 24/9/1973... O nosso blogue já publicou postes suficientes para corrigir este "erro toponímico"... Outro mito que persiste é o início da guerra na Guiné em 23/1/1963, com o ataque a Tite...Ora o terror e o contraterror, a guerra subserviva e contrassubersiva, em suma, a guerra colonial, já tinha começado há muito mais tempo, e envolveu inicialmente outros atores para além do PAIGC...

Temos o "dever de memória", de ambos os lados... As nossas histórias, mesmo com h pequeno, fazem parte da história comum, com H grande, dos nossos dois povos e países...

________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 14 de março de 2013 > Guiné 63/74 - P11249: Tabanca Grande (390): Ismael Augusto (ex-alf mil manut, CCS/BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70), novo grã-tabanqueiro, nº 609

domingo, 28 de maio de 2017

Guiné 61/74 - P17405: Falsificações da história (1): a fantasiosa versão do repórter de guerra e escritor sul-africano Al J. Venter sobre o ataque a Bambadinca em 28/5/1969


Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > O alf mil  trms Fernando Calado, de braço ao peito, junto à parede, crivada de estilhaços de granada de morteiro, das instalações do comando, messe e dormitórios de oficiais e sargentos, na sequência do ataque de 28 de maio de 1969.

Esta era a parte exterior dos quartos dos oficiais (vd. ponto 6 da foto aérea abaixo reproduzida),  que dava para as valas, o arame farpado e a bolanha, nas traseiras do edifício do comando... Era uma parte mais exposta, uma vez que o ataque partiu do lado da pista de aviação.

Pelo menos aqui, caíram duas morteiradas:

(i) Uma das morteiradas atingiu o quarto onde dormia, com outros camaradas,  o fur mil amanuense José Carlos Lopes. Tinha acabado de sair.. Ainda hoje conserva um lençol crivado de estilhaços... Está vivo por uma fração de segundos... (Bancário reformado do BNU, vive em Linda a Velha e é membro da nossa Tabanca Grande.);

(ii) Outra morteirada atingiu o quarto onde dormia o Fernando Calado e o Ismael Augusto.  O Fernando ainda apanhou o efeito de sopro, tendo sido menos lesto que o Ismael, a sair logo que rebentou a "trovoada"...

Também podia ter "lerpado", como a gente dizia na época... Apesar de tudo, a sorte (ou a má pontaria dos artilheiros da força atacante, estimada em 100 homens, o que equivalente a 3 bigrupos) protegeu os nossos camaradas da CCS/BCAÇ 2852 e subunidades adidas (, entre elas, o Pel Caç Nat 63 cujos soldados, guineenses, dormiam a essa hora, com as suas bajudas, nas duas tabancas de Bambadinca, e que portanto estavam fora do arame farpado)...

Na foto acima , o Fernando Calado, membro da nossa Tabanca Grande (tal como o Ismael Augusto), traz o braço ao peito, não por se ter ferido no ataque mas sim por o ter partido antes, num desafio de... futebol. Infelizmente  temos poucas fotos dos efeitos (de resto, pouco visíveis) deste ataque.

Foto: © Fernando Calado (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  Invólucros de granadas de canhão s/r, deixadas na orla da mata contígua à pista de aviação, na noite do ataque a Bambadinca, 28 de maio de 1969... Ainda tenho bem presente, na minha memória, estes "objetos" de guerra, na nossa passagem por Bambadinca, a caminho de Contuboel, em 2 de junho de 1969...



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > Bidões de combustível atingidos pelo fogo do IN, no ataque da noite de 28 de maio de 1969. Recorde-se aqui o sistema de cores dos nossos bidões de combustíveis e lubrificantes: Vermelho (gasolina), verde claro (petróleo branco), azul (gasóleo), amarelo (óleos)...No caso dos combustíveis para aeronaves, os bidões também eram verde-claro, mas de tampa (topo do bidão) de cor branca.

Fotos: © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > c. 1970 > Vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido leste-oeste, ou seja, do lado da grande bolanha de Bambadinca

Do lado esquerdo da imagem, para oeste, era a pista de aviação (1) e o cruzamento das estradas para Nhabijões (a oeste), o Xime (a sudoeste) e Mansambo e Xitole (a sudeste). Vê-se ainda uma nesga do heliporto (2) e o campo de futebol (3). A CCAÇ 12 (julho de 1969/março de 1971) começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento "roubado" à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole.

De acordo com a fotografia, em frente, pode ver-se o conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão (5) e as instalações de oficiais (6) e sargentos (7), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9). As messes de oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum (10).  Na noite de 28 de maio de 1969, uma granada de morteiro explodiu no ponto 7.

Do lado direito, ao fundo, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá. O aquartelamento de Bambadinca situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste). São visíveis as valas de protecção (22), abertas ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24). A luz eléctrica era produzida por gerador... Junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o abrigo da metralhadora pesada Browning (25). Em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses 14).

A caserna das praças da CCS (11) ficava do lado oeste, junto ao campo de futebol (3). Julgava-se que o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler ficava instalado no edifício (12), que ficava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U. Mais à direita, situava-se a capela (13) e a secretaria da CCAÇ 12 (14). Creio que por detrás ficava o refeitório das praças. Em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17).

Do lado leste do aquartelamento, tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais (18), a escola primária antiga (19) e depósito da água (de que se vê apenas uma nesga). Ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto, e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do alf mil António Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12).

Esta reconstituição foi feita por Humberto Reis, Gabriel Gonçalves e Luís Graça.

Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Já muito se escreveu aqui sobre o célebre ataque a Bambadinca em 28 de maio de 1969 (*), por coincidência uma data simbólica para o regime político então em vigor: em 28 de maio de 1926 deu-se um golpe de Estado que pôs fim à I República, instaurou a Ditadura Militar e institucionalizou o Estado Novo, derrubado 48 anos depois, em 25 de abril de 1974.

A data nunca foi esquecida por quem, como o Fernando Calado e o Ismael Augusto, estava em Bambadinca nessa noite e foi brutalmente acordado pelas explosões dos canhões sem recuo e dos morteiros 82, e pelas rajadas de armas automáticas... 

O simbolismo da data é reforçado pelo facto de tudo ter acontecido  pouco mais de dois meses depois da grande Op Lança Afiada, em que as NT varreram  toda a margem direita do Rio Corubal, desde a foz do mítico rio até à floresta do Fiofioli, considerado um bastião do PAIGC. Cerca de 4 mil almas deveriam viver, sob controlo do PAIGC, desde o início da guerra, nos subsetores do Xime e do Xitole. Cerca de 1300 homens, entre militares e carregadores civis. participaram nesta grande "operação de limpeza". de 10 dias, que não se voltaria a repetir, no setor L1.

Refeito dos desaires sofridos (nomedamente, a desarticulação e/ou destruição de boa parte dos seus meios logísticos, incluindo moranças e meios de subsistência da guerrilha e das populações sob o seu controlo: toneladas de arroz, dezenas e dezenas de cabeças de gado, centenas de galináceos e porcos...), o PAIGC decidiu atacar em força Bambadinca, porta de entrada da zona keste. 

Na história do BCAÇ 2852, o ataque (ou melhor, "flagelação") a Bambadinca é dado em três linhas, em estilo seco, telegráfico:

"Em 28 [de Maio de 1969], às 00H25, um Gr In de mais de 100 elementos flagelou com 3 Can s/r, Mort 82, LGFog, ML, MP e PM, durante cerca de 40 minutos, o aquartelamento de Bambadinca, causando 2 feridos ligeiros. " (...).


2. Sobre este ataque a Bambadinca lemos há dias o seguinte excerto da versão contada pelo escritor e jornalista sul-africano Al J. Venter que, em missão de reportagem à Guiné,  visitou o aquartelamento, um ano depois, já no tempo do BART 2917 (1970/72) e que falou, entre outros com o comandante de batalhão. O excerto é reproduzido pelo nosso crítico literário, Mário Beja Santos (**):


(...) “O último ataque [a Bambadinca] ocorrera exatamente um ano antes de eu chegar: um grupo infiltrado tinha-se dirigido para Norte do outro lado da fronteira  [com a República da Guiné-Conacri] a partir de Kandiafara [corredor de Guileje] para tentar cortar a estrada de Bafatá. 

"Num final da tarde, os guerrilheiros atacaram Bambadinca a partir do outro lado do rio [ Corubal ? ],  retirando-se depois para uma posição pré-determinada, onde esperaram pelo dia seguinte antes de se juntarem a outros dois grupos. Esta força combinada iria então atacar outras posições durante o assalto. Foi então que algo correu mal. 

"Um grupo de pisteiros da força atacante colidiu com uma patrulha de Bambadinca e foi capturada intacta, sem ter sido disparado um único tiro. Um dos homens era um alto oficial do PAIGC. 

"Os quatro homens foram levados de helicóptero para Bambadinca onde foi oferecida ao oficial a opção de contar tudo ou aceitar as consequências. Era uma situação sem saída, e o rebelde foi suficientemente inteligente para aceitar”. (...)

O referido ataque a Bambadinca foi a 28/5/1969 (ou "flagelação", segundo a história da unidade...), estava o Mário Beja Santos em Missirá, a comandar o Pel Caç Nat 52,  e eu a chegar a Bissau no "Niassa", ainda deu no dia 2 de junho, ao passar por lá, vindo de Bissau de LDG até ao Xime, a caminho de Contuboel, para ver os estragos (relativamente poucos... ) mas sobretudo sentir as reações e emoções da malta da CCS/BCAÇ 2852 e subunidades adidas...

Ora eu nunca ouvi esta versão Al J. Venter / Domingos Magalhães Filipe, ou a melhor, a versão contada pelo comandante do BART 2917 (que rendeu o BCAÇ 2852) e registada pelo escritor e jornalista sul-alfricana... Será que o inglês do Magalhães Filipe e o português do Venter eram assim tão maus ?

Parece que alguém está a delirar... ou trocou as cassetes... ou está deliberadamente a falsificar a história. Não fazemos "juízos de valor", interessa-nos apenas a verdade dos factos.

Recorde-se que o BART 2917 chegou a Bambadinca em finais de maio de 1970... O BART 2917 foi mobilizado pelo RAP 2. Embarcou para a Guiné em 17/5/1970 e regressou à Metrópole em 24/3/1972. Foi colocado no Sector L1, em Bambadinca, substituindo o BCAÇ 2852 (1968/70). O seu primeiro comandante foi o ten cor art Domingos Magalhães Filipe. Unidades de
quadrícula: CART 2714 (Mansambo); CART 2715 (Xime; teve 5 ncomandantes); e CART 2716 (Xitole).

O Venter deve, portanto, ter falado, talvez em junho ou mesmo princípios de junho de 1970, com o então ten cor art Domingos Magalhães Filipe, que irá ser substituído pelo famoso ten cor inf Polidoro Monteiro. O Spínola, recorde-se, pôs-lhe os "patins"...

Por que não me parecia que esta história tivesse pés e cabeça, confrontei alguns camaradas de Bambadinca desse tempo, e nomeadamente   o Fernando Calado e o Ismael Augusto, dois bem colocados oficiais milicianos da CCS/BCAÇ 2852, ambos membros da nossa Tabanca Grande.

Mais uma vez o Fernando Calado, que foi  alf mil trms (e, portanto, um oficial bem por dentro do sistema de informação e comunicação do setor L1) contou-me ao telefone a sua versão, que vem desmentir a versão do Al J. Venter / Domingos Magalhães Filipe,  e que ele prometeu passar a escrito, para "memória futura":

(i) o relato do escritor sul-africano Al J. Venter é uma falsificação da história;

(ii) ele e o Ismael já estavam deitados, o ataque terá sido perto da 1 hora da noite; e apanhou toda a cheia desprevenida;

(iii) a sorte de Bambadinca foi os canhões s/r (ele diz que eram seis, a história da unidade fala em três...) ao fazerem tiro direto, no fundo da pista, se terem enterrado ligeiramente (, estava-se já na época das chuvas), pelo que as canhoadas passaram a razar as instalações do quartel; mais certeiras foram algumas morteiradas que fizeram estragados (inckuindo nos quartos dos sargentos);

(iv) não houve prisioneiros nenhuns, nem muito menos foi apanhado à unha nenhuma figura grada do PAIGC; em suma, ninguém foi trazido de helicóptero para Bambadinca para ser interrogado;;

(v) o comandante do BCAÇ 2852, ten cor Manuel Maria Pimentel Basto (, de alcunha, o "Pimbas"),  não estava em Bambadinca nem ele nem a esposa; [o que é difícil de comfirmar a partir da história da unidade: a 14 de maio, o cor Hélio Felgas, cmdt do Comando de Agrupamento 2957 (Bafatá) tinha, juntamente com o ten cor Pimentel Basto, visitado Mansambo, Ponte dos Fulas, Xitole, Saltinho, Quirafo, Dulombi e Galomaro; e a 25, Bambadinca tinah sido visitada pelo Cmdt Militar e e pelo Cmdt Agr 2957; onde é que poderia estar o Pimentel Basto em 28 ? Em Bissau ?]

(vi) a única senhora que vivia no quartel era a esposa do tenente SGE Manuel Antunes Pinheiro, o chefe de secretaria do comando do BCAÇ 2852, e que era açoriano (se não erro);

(vii) o Fernando Calado conirma que houve algumas "cenas de histeria" a nível do comando de Bambadinca... (entre o major  inf Viriato Amílcar Pires da Silva, oficil de op inf, e o 2º cmdt, o maj inf Manuel Domingues Duarte Bispo).

Sabemos, pela história da unidade, que a 2 de junho de 1969, cinco depois do ataque a Bambadicna,os destacamentos de milícias e tabancas autodefesa de Amedalai,  Dembataco e Moricanhe foram flagelados, durante a noite, em simultâneo por 3 grupos não estimados, usando um arsenal impressionante: 7 canhões s/r, 8 mort 82, 13 LGFog, metralhadoras pesadas 12.7, além de armas automáticas, "causando 1 morto e 3 feridos milícias, 1 morto e 4 feridos civis, e danos materiais nas tabancas"... O mês de junho de 1969, já em plena época das chuvas,  foi, de resto, um mês de intensa atividade operacional do PAIGC no setor L1...

Para o comando e CCS do BCAÇ 2852, houve de imediato consequência deste ousado ataque do PAIGC:

(i) ainda em maio  o maj op info Herberto Alfredo do Amaral Sampaio vem substituir o maj Manuel Domingues Duarte Bispo, "transferido para o QG" (sic);

(ii) em julho o ten cor Pimentel Basto, "transferido por motivos disciplinares" (sic), é substituído pelo ten cor inf Jovelino Pamplona Corte Real;

(iii) em agosto, o cap inf Eugénio Batista Neves, cmdt da CCS, é também "transferido por motivos disciplinares", sendo substituído pelo cap art António Dias Lopes (que fica pouco tempo em Bamabadinca: logo em setembro é também substituido, pelos mesmos motivos, pelo cap inf Manuel Maria Fontes Figueiras);

(iv) nesse mesmo mês de setembro, chega a vez do maj inf Viriato Amílcar Pires da Silva: "transferido por motivos disciplinares", é substituído pelo maj art Ângelo Augusto Cunha Ribeiro, o nosso conhecido "major elétrico"...

Em suma, o comando do BCAÇ 2852 é completamente "decapitado" devido ao ataque a Bambadinca de 28/5/1969... que não conseguiu prever e para o qual também não se preparou convenientemente (em termos de defesa e de resposta)...



Lisboa > Casa do Alentejo > 26 de outubro de 2013 > Sessão de lançamento do livro do José Saúde, "Guiné-Bissau, as minhas memórias de Gabu, 1973/74" (Beja: CCA - Cooperativa Editorial Alentejana, 170 pp. + c. 50 fotos) > Aspeto parcial da assistência: em primeiro plano, o Fernando Calado  e o Ismael Augusto, dois oficiais milicianos da CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) que estava em Bambadinca na noite do ataque do PAIGC, em 28/5/1969; o primeiro era o oficial de transmissões e o segundo o oficial de manutenção.

Foto (e legenda) : © Luís Graça (2013). Todos os direitos reservados



3. Seria interessante que os camaradas da CCS/BART 2917 se lembrassem da visita deste jornalista e escritor Al J. Venter, a Bambadinca, logo no início da comissão, portanto em finais de maio ou princípios de  junho de 1970.

Eu estava lá e não dei por nada, mas também não admira, já que a malta da CCAÇ 12 andava sempre por fora, no mato... Mas, de vez em quando, apareciam por Bambadincas jornalistas e personalidades estrangeiras que em geral "simpatizavam" com o regime de então... Eram visitas discretas, a maioria da malta não se apercebia... Vinham de heli ou DO 27 diretamente de Bissau, com carta branca do Spínola... Lembro-me de um grão-duque qualquer, com um título pomposo... mas também de dignitários religiosos muçulmanos... como o Cherno Rachid...


Em 28/5/1969, as forças que estavam em Bambadinca, sede do setor L1 eram as seguintes:

(i) o comando e a CCS/BCAÇ 2852;

(ii) o Pel Caç Nat 63;

(iii) o Pel Rec Daimler 2046;

e (iv) o Pel Mort 2106 (com secções destacadas em Xime, Mansambo, Xitole e Saltinho.

No total seriam apenas 200 homens em armas...Só a partir de 18 de julho de 1969, Bambadinca passa a ter a mais 160 homens, a CCAÇ 2590 (futura CCAÇ 12), constituída por 60 graduados e especialistas metropolitanos e 100 praça do recrutamento local...

Por sua vez, as subunidades de quadrícula, no setor L1, em 28/5/1969, eram as seguintes:

(i) CART 1746 no Xime;

(ii) CART 2339 em Mansambo (irá depois. no dia seguinte, destacar um pelotão para a defesa da ponte do Rio Udunduma, na estrada Xime-Bambadinca, ponte que fora dinamitada e parcialmente destruída);

(iii) CART 2413 no Xitole (com um pelotão destacado na Ponte dos Fulas´);

(iv) CART 2405 em Galomaro (com um pelotão destacado em Samba Cumbera e outro, depois, na ponte do Rio Udunduma, e outro ainda, mas reduzido, em Fá Mandinga):

(v) CCAÇ 2406 no Saltinho  (com um pelotão depois destacado para a ponte do Rio Udunduma);

(vi) Pel Caç Nat 52 em Missirá;

(vii) o 8º Pel Art / BAC  (-) em Mansambo;

(viii) e pelotões de milícias em Missirá e Cansamange (101), Finete (102), Quirafo (103), Taibatá e Amedalai (104),  Dembataco e Amedalai (105=) Dulombi (144), Moricanhe (145),  Madina Bonco (146), Madina Xaquili (147)...



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  Ponte do Rio Udunduma, afluente do Rio Geba, na estrada Xime-Bambadinca > Possivelmente no(s) dia(s) seguinte(s) ao ataque ao quartel de Bambadinca, em 28 de maio de 1969. Nessa noite, esta ponte, vital para as comunicações com todo o leste da província (o eixo Xime-Bambadinca era a porta de entrada do leste), foi objeto do "trabalho" dos sapadores do PAIGC... Os estragos, embora visíveis, não abalaram felizmente a sua estrutura. Era uma bela ponte, em cimento armado, construída no início dos anos 50. Continuou a funcionar, sem quaisquer reparações por parte da engenharia militar... Passou a ser defendida permanentemente por um grupo de combate (que ia rodando pelas subunidades de quadrícula do batalhão e subunidades adidas), até à inauguração anos depois da nova estrada alcatroada Xime-Bambadinca.

Esta foto é "histórica". O José Carlos Lopes, furriel mil  amanuense do conselho administrativo da CCS/BCAÇ 2852, teve de "alinhar no mato", nesta dramática ocasião,  posando aqui para... a "posteridade".

Foto: © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. [Edição  e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]