terça-feira, 9 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11819: Bom ou mau tempo na bolanha (18): Aqueles olhos azuis! (Tony Borié)

Décimo oitavo episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.



Hoje até estava fresco pela manhã, bom para sair e ir dar um passeio pelas redondezas. O agora Tony assim fez. Caminhou à beira do canal onde existe um passeio longo que o contorna, com algumas flores e alguns bancos colocados estrategicamente, para os mais idosos e não só, se sentarem, e de onde se avista parte do canal e algumas terras alagadiças, selvagens, que se parecem muito às nossas conhecidas bolanhas. Vendo passar um grupo de pessoas, onde iam algumas raparigas afro-americanas, logo lhe veio à memória outras,uma das quais se chamava Cumba, e que era a sua lavadeira, que mais tarde veio a saber serem guerrilheiras, e que eram naturais, mas com olhos azuis, que diziam que talvez fossem descendentes dos padres, que antes dos militares, estavam estacionados na vila de Mansoa, num convento de uma ordem religiosa francesa, que mais tarde os militares ocuparam já em ruínas, mas que recuperaram, e onde estava instalado o comando do Batalhão de Artilharia “Águias Negras”.

Nessa altura, também andava por lá uma rapariga, que vivia entre a vila e a aldeia com casas cobertas de colmo, que existia perto do aquartelamento e da estrada que seguia para Mansabá, que pouco mais era do que um carreiro, filha de uma guineense e de pai era natural de Cabo Verde. Este tinha a profissão de marceneiro, e de um tronco de madeira fazia tábuas, tirantes, ripas, tudo a poder de um grande serrote que as suas mãos manuseavam. A rapariga, que devia de andar pela idade de quinze ou dezasseis anos, tinha uns olhos azuis com uma tonalidade verde, que sobressaiam e os cabelos eram entre o preto e o loiro, era bonita e alguns militares ficavam admirados com a sua beleza e comentavam no aquartelamento.

O Tony caminhou mais um pouco e sentou-se num desses bancos, e lá vem de novo ao seu pensamento aquela que quase todos vocês já conhecem. Sim, a menina Teresa, que deu muitas canseiras ao então Cifra, e que quando este chegou a Portugal lhe dava algum trabalho e “muitos favores”, pois era uma desavergonhada, como quase todos vocês se lembram. Mas voltando ao seu pensamento em Mansoa, o então Cifra foi ter com esse marceneiro para resolver o problema da menina Teresa, que era a execução de um “Falo”, ou seja um “Phallus”, ou mais propriamente um “Pénis” em madeira de ébano preta, que ela lhe pediu, e dizia que era para lhe dar melhor sorte na vida, pois era uma “solteirona”, que já tinha passado dos “cinquentas”. O marceneiro acabou por resolver o problema para alívio do Cifra e contentamento da menina Teresa.

Quando foi à oficina do artista não queria crer no que viu. A tal rapariga bonita, olhos azuis, com tonalidade verde, cabelos pretos e loiros, era um “esqueleto”, cara e corpo, seco e mirrado, sentada num banco, amparando-se com um pau, já sem parte dos pés, as pernas embrulhadas em farrapos e com feridas, alguns dedos das mãos estavam tesos e falava aos soluços, pois dava a entender que não podia mover a língua. Contudo os olhos ainda com algum brilho, estavam lá. O Cifra questionou o marceneiro sobre o estado deplorável da sua filha, e este contou-lhe que ela tinha muitas doenças, entre as quais a “lepra”. Que estava à espera de morrer. Que no aquartelamento já sabiam do seu estado de saúde, estando a ser medicada, embora se sabendo que não havia cura possível.

O Cifra ainda foi questionar o Pastilhas, que depois de saber de onde ele tinha vindo e do que tinha encomendado ao marceneiro, mostrou um sorriso malicioso e provocativo.

Depois do Cifra lhe perguntar se ele já sabia daquele caso, ele, então sim, olhou o Cifra, não com os tais olhos azuis, com tonalidade verde, da rapariga bonita, com cabelos pretos e loiros, que agora estava quase a morrer, com muitas doenças mais a doença da “lepra”, mas sim, com os seus olhos bondosos, que escondiam algumas lágrimas, e encolheu os ombros.
Devia de saber deste e de muitos casos, mas nada podia fazer, pois a falta de recursos naquele tempo era evidente, morria-se única e simplesmente, e como era seu hábito e sempre que via o Cifra, puxou-o para fora da enfermaria, talvez julgando que o Cifra tinha fumado algum cigarro feito à mão e que lhe ia roubar o frasco do álcool.

O agora Tony, com estes pensamentos, levantou-se, caminhou mais um pouco, olhou o horizonte, viu as horas, e pensou como o relógio, às vezes é tão lento.

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Nota do editor

Último poste da série de 4 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11801: Bom ou mau tempo na bolanha (17): O 4 de Julho nos Estados Unidos (Toni Borié)

Guiné 63/74 - P11818: Parabéns a você (600): Adriano Moreira, ex-Fur Mil Enf da CART 2412 (Guiné, 1968/70); Arménio Estorninho, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70) e Joaquim Carlos Peixoto, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3414 (Guiné, 1971/73)

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Nota do editor

Último poste da série de 8 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11811: Parabéns a você (599): José Zeferino, ex-Alf Mil Inf do BCAÇ 4616 (Guiné, 1973/74)

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11817: (Ex)citações (223): As lágrimas amargas do brig António de Spínola e do cor Hélio Felgas... "Presenciei-as no fim da Op Lança Afiada"... (António Azevedo Rodrigues, ex-1º cabo, Cmd Agrup 2957, Bafatá, 1968/70)... Ou não terá sido antes, na sequência do desastre do Rio Corubal, em Cheche, na retirada de Madina do Boé, em 6/2/1969 (Op Mabecos Bravios) ? No dia seguinte, Spínola deslocou-se a Nova Lamego, onde falou, às 12h00, aos sobreviventes da Op Mabecos Bravios...


Guiné > Zona leste > Comando de Agrupamento 2957 (Bafatá, 1968/70) > Guião. O Cmd Agr 2957 esteve em Bafatá, no período de Novembro de 1968 a Setembro de 1970. Os seus elementos metropolitanos sairam do ex-RAL 1 e embarcaram no T/T Uíge, em 9 de Novembro de 1968. O comandante do Cmd Agrup 2957 era o então cor Hélio Felgas [ 1920-2008], mais tarde substituído pelo cor Neves Cardoso. Na Tabanca Grande, temos dois camaradas que pertenceram ao Cmd Agr 2957: o António Azevedo Rodrigues e o Fernando Gouveia.

Foto: © António Azevedo Rodrtigues (2011). Todos os direitos reservados


1. Mensagem dirigida ao nosso camarada António Rodrigues:

De: Luís Graça
Data: 26 de Junho de 2013 às 18:44
Assunto:  Ex-1º.Cabo Rodrigues, Comando de  Agrupamento 2957, Bafatá, 1968/70 [, foto à esquerda]

António, camarada de Bafatá:

Como vai essa saúde ? Espero que bem... Tenho aqui uma questão a esclarecer contigo. Em 1/12/2010, publicaste na 1ª série do nosso blogue o seguinte comentário [,poste CXXXIII, ou seja, 133, de 2/8/2005]

Um dúvida minha: presenciaste esta cena no regresso da Op Lança Afiada (8 a 19 de março de 1969) ou da Op Mabecos Bravios (desastre no Cheche, Rio Corubal, na retirada de Madina do Boé, em 6/2/1969)...

O relatório da Op Lança Afiada foi escrito pelo então cor Hélio felgas e datilografado por ti... Confirmas ? Tens mais lembranças desta operação e da reação do coronel ? Tens mais fotos do teu Cmd Agrup 2957 ? Queria publicar um poste que estes teus pequenos comentários... Um abraço. Luis

No dia 27 de Maio de 2008,. o António Rodrigues mandara-nos uma primeira mensagem, entrando depois para a Tabanca Grande... Nessa mensagem apresentava-se como 1º cabo do Cmd Agrup 2958, que trabalhou "na parte de operações e informaçoes", e que "privou de perto" com o gen Spinola, cap (e mais tarde gen) Almeida Bruno, maj Carlos Saraiva (do batalhão de Lamego), cor Teixeira da Silva bem como o seu "grande amigo" cor (e mais tarde maj gen) Helio Felgas, na altura ainda vivo..,

"Tive a felicidade de no ano passado [, 2007,] ter uma conversa com ele ao telefone, e hoje lembrei-me dele mas como não sei da sude dele, até tenho receio de voltar a ligar e já não o encontrar, mas para agora, gostava de poder fazer parte desta terulia, pois só agora disporei de algum tempo que gostava de falar convosco se isso me for permitido, pois também tenho algumas boas/más recordações da Guiné, como por exemplo a operação Lança Afiada, que foi por mim escrita, e reescrita., não sei quantas vezes, mas isso fica para mais tarde, pois vi o Spinola a chorar em Bafatá com a barba por cortar de cinco dias e o Helio Felgas abraçado ao Teixeira da Silva, também a chorar" (...).

2. Resposta do António Rodrigues,  que vive em Vila Nova de Famalião, com data de  28 de Junho de 2013:

Eu estive nos preparativos da Operação Lança Afiada, fui eu e o 1º cabo Correia a dactilografar todos os documentos de toda a operação quer o antes, durante e depois da mesma. Essa operação marcou-me, e de que maneira, pois, como se pode imaginar, são 44 anos passados, e para quem chega em 15 de novembro de 1968 a Bafatá, ao Comando de Agrupamento nº 2957, designado CAGRUP 2957, e logo passados 4 meses ter de levar com uma operação deste calibre, depois de todos os dias receber na altura msg urg imediato confid e por aí, fora a descrever o que se passava na zona de Madina de Boé...

E a forma detalhada como foi planeada, num gabinete onde sempre marcava presença o brig Spinola, o cor Helio Felgas, o ten cor Teixeira da Silva, o major Carlos Saraiva, o cap Almeida Bruno, o tal do pingalim e óculos rayban à piloto, o alferes Fernando Gouveia, o alf Martins das transmissões, o fur Carlos Cocho e eu próprio 1º cabo escriturario para tudo tomar nota e datilografar e depois passar a stencil para policopiar em séries de 10/20 folhas para distribuir pelos chefes intervenientes na tal Op Lança Afiada...

É certo que datilografei mais uma série de operações mas esta foi a minha maior e mais marcante, pois esta nunca me passou vista fora, ficou me marcada para sempre e aqui e agora estou a viver 45º à sombra que ao sol não dá para imaginar o que la passei e saber ao minuto o que se estava a passar com uma série de rapazes da minha terra, Vila Nova de Famalicão, que comigo foram no Uíge. metidos como carne p'ra canhão, a 9 de novembro de 1968 e depois ter de escrever reescrever a história, viver e saber que morreu o soldado tal e tal e depois já do meu regresso, em 1973 no dia seguinte ao meu casamento saber que o meu irmão morreu em Moçambique... Fico por aqui, agora...

3. Comentário de L.G.:

Meu caro camarada de Bafatá, antes de mais um abraço solidário na dor, por teres perdido um mano, em em Moçambique, em 1973... Nunca nos tinhas dito nada sobre esta tragédia familiar.

Mas, voltando à Guiné do nosso tempo e à zona leste onde estivemos os dois... Continuo a pensar que a cena das lágrimas que tu descreves ocorreu no âmbito da Op Mabecos Bravios, já no final, em Nova Lamego, no dia 7/2/1969, e não no final da Op Lança Afiada, em 19/3/1969... Parece-me muito mais verosímil, e só prova que estes dois bravos guerreiros, António de Spínola e Hélio Felgas, eram afinal homens de carne e osso como nós, com emoções, com sentimentos, e independentemente do juízo que a História fizer deles...

Se calhar está na altura de reproduzirmos alguns postes, da I Série, sobre a Op Mabecos Bravios, Iniciada em 1 de Fevereiro de 1969, com a duração de 8 dias, tinha por missão retirar as nossas tropas de Madina do Boé. Tudo correu bem, até ao último dia, no regresso, na travessia, em jangada, do Rio Corubal, em
Cheche...

Talvez o Fernando Gouveia nos posso ajudar, com as suas memórias desse tempo.

PS - Recorde-se que Op Mabecos Bravios (destinada a cobrir a retirada das forças estacionadas em Madina do Boé) teve um desfecho trágico para 46 camaradas nossos, da CCAÇ 2405 (Galomaro) e da CCAÇ 1790 (Madina do Boé), mais um civil, guineense Na história do BCAÇ 2852 (Bambadinca,19768/70), lê-se resumida e cruamente, no final do rekatório da Op Mabecos Bravios (parte relatava ao Destacamento F, que era constituído pela CCAÇ 2405, sediada em Galomaro, e que pertencia ao BCAÇ 2852):

(...) "Durante a transposição do Corubal a jangada em que seguiam 4 Gr Comb [da CCAÇ 2405 e da CCAÇ 1790], respectivos comandos e tripulação afundou-se espectacularmente acerca de um terço da largura do rio, provocando o desaparecimento de 17 militares do Dest F  [, CCAÇ 2405,] e grandes quantidades de material perdido.

"Por voltas das 10.00h de D+ 4 [6 de Fevereiro] saímos de Cheche para Canjadude  que atingimos por volta das 16.30h com o pessoal deste Dest embarcado.

"Descansou-se e em D + 5 [7 de Fevereiro] às primeiras horas a coluna pôs-se em movimento para Nova Lamego que foi atingida por volta das 11.00h. Às 12.00h as tropas ouviram uma mensagem do Exmo. Comandante-Chefe que se deslocou propositadamente para a fazer.

"Permaneci em Nova Lamego para organizar a coluna do dia seguinte. Às primeiras horas de D + 6 [8 de Fevereiro] iniciei o movimento para Galomaro onde cheguei cerca das 10.30h." (...)
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Guiné 63/74 - P11816: Os nossos médicos (62): A minha CCAÇ 5, de recrutamento local, não tinha médico... Lembro-me, isso, sim, do saudoso srgt mil enf Cipriano Mendes Pereira (José Martins, Canjadude, 1968/70)

Resposta, de 13 de junho último, ao questionário sobre "os nossos méedicos", por parte do nosso colaborador permanente, camarada, amigo e tabanqueiro da primeira hora, José Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70) [Foto à esquerda]


Foto: © José Martins (2013) . Todos os direitos reservados.


(a) Quantos médicos seguiram com o teu batalhão, no barco?


R: Como fui em rendição individual e num barco de passageiros e carga, seguiam apenas duas tripulações de LDO (8 marinheiros e respectivas lanchas) e 4 Furriéis do Exercito, sendo um do QP (por acaso enfermeiro) com destino à CCaç 6 em Bedanda.


(b) Quantos médicos é que o teu batalhão teve e por quanto tempo?


R: A unidade era “do recrutamento provincial” e, portanto, não tinha médico. O Batalhão (a que a CCAÇ 5 estava adstrita e no período em que lá estive 2 batalhões), tinha apenas um médico.


(c) Lembras-te dos nomes de alguns? E lembras-te se já eram especialistas na vida civil? Lembras-te da idade?


R: Não me recordo dos nomes, já que não estava na sede do batalhão. Falava-se que o médico do primeiro batalhão, o  [BCAÇ] 2835, tinha a especialidade em ginecologia. Já não eram novos. Provavelmente tinham pedido adiamento para o serviço militar, o que levou à sua mobilização mais tardia. Para o final da minha comissão, apareceram médicos-piras, e aí um bocado mais novos (não esquecer que nós também havíamos envelhecido).



Guião do BCAÇ 2835: Mobilizado pelo RI 15, partiu para a Guiné em 17/1/1968 e regressou a 4/12/1969. Esteve em Bissau e Nova Lamego. Comandantes: ten cor inf Esteves Correia, maj  inf Cristiano Henrique da Silveira e Lorena,  e ten cor inf Manuel Maria Pimentel Bastos.  Subunidades de quadrícula: CCAÇ 2315 (Binar, Bissau, Mansoa, Mansabá, Mansoa, Nova Lamego, Dara, Madina Mandinga); CCAÇ 2316 (Bissau, Bula, Mejo, Guilejem, Gadamael, Bissau); e CCAÇ 2317 (Bissau, Bula, Mansabá, Guileje, Gandembel, Bula, Nova Lamego),


(d) Precisaste alguma vez de alguma consulta médica?

R: Nunca recorri a consultas médicas no batalhão.

(e) Estiveste alguma vez internado na enfermaria do aquartelamento (se é que existia)?


R: No período da minha permanência na companhia e no aquartelamento de Canjadude, a enfermaria começou por ser um tabanca (que ardeu ao esterilizarem seringas) tendo passado para o “armazém central” e mais tarde construída uma enfermaria para atendimento e internamento.


(f) Foste a alguma consulta de especialidade no HM 241?

R: Estive na consulta externa de medicina em Abril de 1970, mas não foi dado seguimento ao tratamento, uma vez que estava a cerca de um mês do fim da comissão, e o tratamento demoraria um a dois meses.


(g) Foste evacuado para a metrópole, para o HMP? Ou alguém da tua companhia ?


R: Não encontrei nos registos da companhia, apesar de pouco descritivos, qualquer referência a “evacuados” para Lisboa.


(h) Tiveste alguma problema de saúde que o teu médico ou o enfermeiro conseguiu resolver sem evacuação?


R: Nesse aspecto o Sargento Cipriano “era um às”. Normalmente resolvia os casos que lhe apareciam, mesmo de ordem da estomatologia.

Em matéria de evacuações só tive conhecimento de um, um caso de trigémeos, em Agosto de 68, em que foi pedida a evacuação da parturiente. Resultado: um nado-morto, um morto prematuro (não viveu oito dias), e o terceiro morreu, com cerca de um ano em Nova Lamego, vítima de atropelamento.

(i) O vosso posto sanitário também atendia a população local (se sim, como é mais o mais provável, há alguma estimativa da população que recorria aos serviços de saúde da tropa?)...

R: Toda a população frequentava a consulta “médica” do Sargento Cipriano, de etnia manjaca. Era o cipaio que controlava a “obrigatoriedade” desta medida.

Nota: Este inquérito foi respondido com o “conhecimento” do tempo em que lá estive. Não foram remetidos para a metrópole, ou pelo menos não estão disponíveis no AHM, os relatórios sanitários.
Em Agosto de 1974 foi destruída toda a documentação considerada “não relevante”. A documentação que veio para cá, muita foi “perdida” por roubo de bagagens, já em Lisboa.


Guiné > Zona Leste > Gabu > Canjadude > 1969 > CCAÇ 5 - Os Gatos Pretos (1968/70) > O Fur Mil Transmissões Martins com o seu amigo e camarada Cipriano Mendes Pereira (srgt mil enf), ,srgt mil enf), Cipriano) [Foto à direita] (*)

Foto: © José Martins (2006) . Todos os direitos reservados.

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Notas do editor:

(*) Cipriano Mendes Pereira: 2º Sargento Miliciano Enfermeiro, número mecanográfico 82034859, já se encontrava ao serviço da Companhia em finais de 1969, tendo assumido as funções de Comandante da Secção de Saúde.

Além das actividades inerentes à sua função, colaborou na construção do edifício destinado a Posto de Socorros e Enfermaria. Foi também professor das escolas primárias das crianças que residiam na povoação.

Foi abatido ao efectivo da Unidade em 10 de Outubro de 1970 por ter sido transferido para o Hospital Militar 241 / CTIG, em Bissau.

Veio a falecer em combate na noite de 16 de Novembro de 1970, durante a flagelação a Nova Lamego.



(**) Último poste da série > 8 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11815: Os nossos médicos (61): Lembrando o médico dr. Sousa Fernandes e o enfermeiro Silva Pinto (J. Crisóstomo Lucas, ex-alf mil, CCAÇ 2617, Magriços de Guileje, 1969/71)

Guiné 63/74 - P11815: Os nossos médicos (61): Lembrando o médico dr. Sousa Fernandes e o enfermeiro Silva Pinto (J. Crisóstomo Lucas, ex-alf mil, CCAÇ 2617, Magriços de Guileje, 1969/71)


José Crisóstomo Lucas [ ex alferes miliciano, de operações especiais, CCAÇ 2617, Magriços de Guileje, Pirada, Paunca, Guileje, 1969/71]

[Foto à esquerda: o J. C. Lucas, ao centro, entre o fur mil Abílio Pimentel e o piloto do Cessna]

1. Resposta ao questionário constante da nossa última sondagem (*)

ALGUM VEZ TIVESTE NECESSIDADE DE RECORRER AO MÉDICO OU AO ENFERMEIRO DA TUA COMPANHIA, NO TO DA GUINÉ ? (RESPOSTA MÚLTIPLA)

 1. Felizmente tinha (e temos) o enfermeiro sempre connosco, o grande Silva Pinto.

 2. Estávamos sempre com o saudoso dr Sousa Fernandes com quem passei a noite do 25/26 abril

3. Fui visto mais do que uma vez pelo médico. Muitas vezes. Quero lembrar que Guileje, no meu tempo [, CCAÇ 2617,] tempo tinha o dr. Sousa Fernandes permanentemente.

4/5. Fui visto mais do que uma vez pelo enfermeiro. Tal como o médico, ainda hoje trata de nós, em especial nos petiscos (leitão).

6/7. Se havia médico na minha companhia e batalhão  ? Já respondido atrás.

 8/9. Tive de passar pelo HM 241 (Bissau)...  sim, fui lá uma vez operado devido a um estilhaço (Fui lá fazer miniférias.

10/11.Felizmente nunca tive de ser evacuado para o HMP (Lisboa)

Bom trabalho J.C. Lucas (**)
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Guiné 63/74 - P11814: Notas de leitura (498): Guineidade e Africanidade, por Leopoldo Amado (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Março de 2013:

Queridos amigos,
Trata-se de uma coletânea para onde o autor fez convergir mais de 50 textos que vão desde notas avulsas, prefácios a trabalhos de maior fôlego, alguns deles já conhecidos no blogue.
Como cidadão, Leopoldo Amado não está esquecido do Estado disfuncional, mas é sem dúvida nas suas peças de análise que se torna de leitura pertinente (se não obrigatória) quando invoca as grandes questões da luta armada e as da literatura colonial e da guerra colonial. Exercício de cidadania e olhar do historiador, a conjugação é feliz e a leitura deixa-nos mais exigentes.

Um abraço do
Mário


Guineidade e Africanidade, por Leopoldo Amado (2)

Beja Santos

Trata-se de uma obra onde o historiador e nosso confrade Leopoldo Amado juntou cerca de 50 intervenções de diferente índole, optei por referir um conjunto de artigos de maior significado quanto às matérias para as quais o blogue está mais fadado, e assim farei referência a dois trabalhos “Simbólica do Pindjiquiti na ótica libertária da Guiné-Bissau” e “Diapasão e persistências na novíssima literatura de guerra colonial: o caso da Guiné-Bissau”. Convém recordar que estes ensaios foram publicados no nosso blogue.

O massacre de Pindjiquiti foi móbil utilizado na formação ideológica dos jovens quadros do PAIGC e, acima de tudo, forneceu ensinamentos para o quadro teórico de Cabral: a subversão não deveria partir das reivindicações urbanas mas sim do campesinato em condições tais que as forças armadas e as autoridades não pudessem debelar. Uma nota curiosa é de que Leopoldo Amado não refere, a propósito do massacre, o relatório elaborado na altura pelo Comando Marítimo da Defesa da Guiné, indiscutivelmente uma peça que não se pode subtrair à análise desses acontecimentos (“Fuzileiros – Factos e Feitos na Guerra de África, Crónica dos Feitos da Guiné”, por Luís Sanches de Baêna, Edições Inapa, 2006). Descreve a emergência no nacionalismo em África e na Guiné, o trabalho desenvolvido por Cabral entre 1953 e 1954, o aparecimento do PAI, do MLG (Movimento para a Independência da Guiné, o trabalho desenvolvido por Cabral já na clandestinidade, a sua vinda à Guiné em Setembro de 1959, os atos de subversão que ocorreram em Bissau em 1960, os documentos escritos por Cabral e endereçados ao governo português, reivindicando a independência do território, a tal propósito Leopoldo Amado observa que nesta fase o PAI optou sempre por enquadrar o seu substrato ideológico no espírito dos princípios da legalidade internacional, mormente nos postulados das Nações Unidas e dos Direitos Humanos, concluindo que “não foi por acaso que depois do Pindjiquiti o PAIGC logrou atingir uma assinalável mobilização que permitiu posteriormente desencadear a luta armada de libertação. Também não foi por acaso que no decorrer da guerra colonial, invariavelmente, o PAIGC normalmente assinalava a efeméride com ataques simultâneos a várias localidades, inclusivamente os centros urbanos, sobretudo a partir de 1968”.

Quanto ao seu ensaio sobre a novíssima literatura de guerra, publicado no nosso blogue em Outubro de 2008, Leopoldo Amado dá ênfase à obra de Armor Pires Mota, considerando-o a figura proeminente de literatura forjada no decurso da guerra colonial. Refere que “Tarrafo” é editado em 1970, a verdade é que a sua primeira edição é de 1965, logo retirada pela PIDE, enquanto todas as suas peças tinham sido publicadas entre 1963 e 1964 no jornal da Bairrada, acontecimento singularíssimo. E não é exato que a sua extensa obra apenas abarque a fase inicial da guerra, como é sabido “Estranha noiva de guerra” e “A cubana que dançava flamenco”, duas obras maiores de Armor Pires Mota extravasam essa temporalidade. Mas há um aspeto que se partilha com as suas observações, na fase inicial da sua obra é percetível que o autor se identificasse com a missão civilizadora de Portugal, ele próprio disse ter acreditado naquela guerra por nela residir “o mistério da continuidade da missão histórica-imperial de Portugal; numa fase posterior ao 25 de Abril, o autor envereda por enredos apologéticos da amizade “entre os portugueses de outrora e de hoje e os povos da Guiné-Bissau”. Sem nunca fazer qualquer referência aos escritos de Álvaro Guerra, Leopoldo Amado chama a atenção para o inquestionável valor literário do livro “O lugar de massacre”, de José Martins Garcia, obra que marca a nova literatura após o 25 de Abril.

Para Amado, esta nova literatura interpela inexoravelmente a consciência crítica portuguesa, propondo igualmente uma catarse no imaginário coletivo: “Dir-se-ia que estes literatos mais não fizeram (e vão ainda fazendo) do que interpelar a sua própria identidade por intermédio de um exercício que visa encontrar o seu próprio lugar numa sociedade que, consciente ou inconscientemente, os violentou física, social e psicologicamente”. Analisa igualmente as participações de Gustavo Pimenta (SairòmeM – Guerra Colonial, Palimage Editores, 1999) e Salgueiro Maia em “Capitão de Abril – Memórias da guerra do Ultramar e do 25 de Abril”, Editorial Notícias. E em seu critério entendeu que devia referir-se-me a propósito de um textinho por mim publicado em 1984 nos cadernos de Memórias da Guerra Colonial, Andrómeda Publicações e intitulado Fotografias a Preto e Branco: “Fotografias? Sim, mas também sinais trémulos de alegria incontida no sacrifício inútil. Estas fotografias a preto e branco são fogo e água. Crianças a caminho de homens. Defuntos despojados de olhos impávidos e conflitos sibilinos. Amigos de abandono. Peço-vos compreensão para estas fotografias. Nenhuma palavra, som, barco, amigo, amanhecente equatorial, falta aqui. O meu álbum é um viaduto aberto, dele bifurcam caminhos de laterite, florestas de galeria, sonhos aterradores e a majestade terrífica da selva (…) As minhas e as vossas fotografias gritam: não esmoreçam, na vossa bolanha continuai a lavrar. A minha câmara dispara fotografias em série, é a locomotiva e também luar textual. Cada fotografia é um concerto polar. Despeço-me desta poalha afetiva. Em cada fotografia deixo um poeta perene, atado ao peso do próprio feito. E porquê? Porque houve uma guerra onde preparámos a fotografia da paz. Não se mexam. Fixo-vos para todo o sempre (…).”

E depois dá a palavra a Marcos Vidigal que igualmente escreveu em Memórias da Guerra Colonial, Andrómeda Publicações, 1984, ressalta o conto intitulado “As clareiras das emboscadas” como exercício de sublimação coletiva onde a música dilui a separação entre oficiais, sargentos e praças, os contactos com as populações também indiciam que estes literatos-soldados tinham entrado num profundo processo de auto-consciencialização, todos eles forçados a permanecer longo tempo dentro do arame farpado, o que forçava ao estreitamento de relações e cita Carlos de Matos Gomes, dizendo que na Guiné “(…) a guerra tinha ultrapassado o limite. As duas últimas operações dos generais Spínola e Bethencourt Rodrigues envolveram vários batalhões, navios e outros meios próprios de uma guerra convencional. A situação invertera-se: eram os militares a colocar as minas e a rebentar pontes para que os guerrilheiros não chegassem aos seus quartéis (…)”. Chama a atenção para a narrativa apocalítica de Salgueiro Maia a propósito do cerco de Guidage, descrição mais brutal sob a guerra da Guiné nunca houve: “Pouco depois de ter chegado, novo contacto do PAIGC com outro bigrupo das NT. Dos primeiros contactos resultaram seis mortos para as NT, incluindo três milícias, vários feridos graves e o destroçar do bigrupo, que deixou no terreno os mortos com tiros de armas ligeiras. Na fração de segundo em que, deitado no chão, tento perceber o que está a acontecer, começamos a ouvir com que o barulho de aviões a jato. São os jatos do povo, foguetões de 122 mm, que o PAIGC atira para a povoação sede do batalhão. Como a guerra não é connosco, mando retirar. O ferido na perna é acondicionado com as roupas do morto e todos os panos disponíveis na caixa do Unimog. O cabo enfermeiro segue sentado a seu lado com um frasco de soro nas mãos. O morto é colocado ao lado, embrulhado num pano de tenda; tem o peito aberto, parece um porco no talho”. Ao concluir o seu ensaio, Leopoldo Amado assevera que a literatura de guerra conquistou um estatuto próprio no panorama literário português, encerra em si uma profunda observação sociológica, numa inextricável mescla em que o exotismo e o eivado realismo se confundem com mitos que roçam os limites do paroxismo.

“Guineidade e Africanidade”, por Leopoldo Amado, Edições Vieira da Silva, 2013, é uma obra indispensável para quem pretende conhecer com rigor a Guiné da luta armada, o seu conteúdo ideológico, e o depois, um Estado disfuncional e sequelas dignas de nota como a literatura produzida a pretexto de toda aquela guerra.
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Nota do editor

Poste anterior da série de 5 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11804: Notas de leitura (497): Guineidade e Africanidade, por Leopoldo Amado (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P11813: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (17): Ainda os fuzilamentos dos nossos camaradas guineenses: não podemos emendar a histstória, mas temos o direito à tristeza, à mágoa e á indignação (Jorge Cabral, ex-comdt do Pel Caç Nat 63, Fá Mandin ga e Missirá, 1969/71)


1. Reprodução de texto do Jorge Cabral, ex-comandante do Pel Caç Nat 63 (Bambadinca, Fá Mandinga, Missirá, 1969/71), e antigo docente da Universidade Lusófona, onde foi presidente do Instituto de Criminologia, especialista em direito penal, advogado e escritor. O texto, já publicado em 16 de m,aio de 2006, na I Série (*), vem a propósito do poste mais recente do António J.Pereira da Costa, P11810.


Amigo Luís,

Porque comandei um Pelotão de Caçadores Nativos [nº 63] e fui amigo de alguns Comandos Africanos, a questão dos fuzilamentos toca-me profundamente (**).

Já sabia que militares guineenses pertencentes às Companhias e Pelotões de Caçadores haviam sofrido a mesma sorte. Do meu Pelotão foram três, e embora já me tenha referido a este assunto, em colaboração anterior, considero-me obrigado a mais uma vez reflectir serenamente e com a objectividade possível.

Compreendo, aceito e comungo da emoção sentida por todos aqueles que partilharam perigos, cansaços e medos com os africanos, caindo nas mesmas emboscadas e defendendo quartéis comuns.

A emoção porém, ou a falta dela, não nos devem obnubilar a razão ou tolher o raciocínio, contribuindo para conclusões simplistas. Não foram patriotas portugueses que foram fuzilados, nem o lixo, até porque a todo o Homem é devido o respeito pela sua dignidade, inerente à condição humana. Foram Homens que foram fuzilados!

Quero acreditar que todos somos contra a pena de morte e que também repudiamos frontalmente que alguém possa ser condenado sem julgamento. O ter pertencido ao Exército Português foi considerado facto suficiente para consubstanciar o crime de traição. Não se apuraram as culpas individuais, nem a consciência da ilicitude, num Tribunal imparcial, que garantisse o Direito de Defesa, como deve acontecer em qualquer parte do Mundo.

Parece evidente que o ter sido torcionário, cortador de cabeças ou criminoso de guerra, constitui uma realidade diferente do ter servido rotineiramente, por necessidade de sobrevivência, num Pelotão ou numa Companhia de Caçadores Africanos.

Tinham todos os guineenses que integravam as tropas portuguesas a consciência de que estavam a trair a sua Pátria? Haviam todos interiorizado o conceito de Pátria? Porque serviam no Exército Português?

Ao longo dos tempos, nas Campanhas de Subjugação e Pacificação, os Portugueses contaram quase sempre com a ajuda dos Fulas, os quais combatiam ao serviço de Senhores da Guerra, enquadrados em unidades africanas, ou desempenhavam funções de auxiliares. Não lutavam por nenhuma Pátria, eram aliados dos Portugueses, contra Papeis, Balantas, Bijagós, Felupes ou Mandingas, os quais se batiam em defesa do seu chão, contra o pagamento de impostos ou o recrutamento forçado para as obras. A sede do poder e da riqueza, e a possibilidade do saque, justificava a aliança Portugueses-Fulas.

A ideia do Portugal plurirracial é contemporânea do início da Guerra Colonial. A substituição do termo Colónias pela designação Províncias Ultramarinas, foi expediente saloio, para enganar a Comunidade Internacional, e procurar legitimar a Guerra – Portugal não tinha Colónias e todos eram Portugueses. Todos sabemos que se tratava de uma ficção.

Nas Colónias vigorou o Estatuto do Indigenato, de acordo com o qual, só alguns eram considerados assimilados, usufruindo da cidadania. Os africanos foram sempre subalternizados, empregados em funções menores, ou enfeitados com cargos honoríficos como os oficiais de 2ª Linha.

Até aos anos 60, nenhum negro tinha acesso à frequência da Escola do Exército. É com a guerra que esta situação vai ser alterada. A necessidade de homens para combater determinou uma estratégia de africanização, que deu lugar à criação de unidades africanas, Companhias e Pelotões, de base étnica, e primeiramente comandadas por quadros europeus. (Quando tomei conta do meu Pelotão, tinha soldados balantas, bigajós, mandingas, papeis e fulas. No fim da comissão só existiam fulas).

A primeira Companhia, totalmente africana, foi a dos Comandos Africanos, cuja instrução acompanhei em Fá Madinga. Oficiais, sargentos, furriéis e praças, incluindo mecânicos, vaguemestres, enfermeiros, todos eram guineenses.

Entre os militares nativos do meu Pelotão, existiram os que apenas cumpriram o serviço militar obrigatório e passaram à disponibilidade, designadamente todos os cabos (Injai, Carlitos, João, Negado e outro de etnia Manjaca de que não recordo o nome). Nenhum deles era Fula. Os Fulas continuaram. Porquê? Que iriam fazer fora da Tropa? Como sobreviver? De que forma alimentariam as mulheres e os filhos? Não haviam os avós e os bisavós, combatido ao lado dos portugueses? E combatido contra quem? Contra Balantas, contra Mandingas, que agora estavam no P.A.I.G.C. Onde o conceito de Pátria? Qual Pátria?

Obviamente que o caso dos quadros dos Comandos Africanos é diferente. Para os meus amigos Saegue, Januário, Jamanca, Camará, Justo ou Sisseco, o ser oficial do Exército Português representava a ascensão social, mas também a desforra contra séculos de humilhação. Os portugueses precisavam deles. Afinal também os negros podiam comandar tão bem ou melhor do que os oficiais saídos da Academia Militar (é interessante assinalar que as reticências postas por eles à Operação Mar Verde, tiveram principalmente a ver com o uniforme: queriam ir, mas fardados de oficiais portugueses).

Que esperavam estes comandos no fim da Guerra? Não posso falar por todos. Mas conversei sobre o assunto muitas vezes com o Saegue, que acreditava numa solução política, numa independência negociada, na sua futura integração no Exército da Guiné Bissau, ou na sua vinda para Portugal, que ele conhecia, pois estudara em Santarém.

Só uma eufórica ingenuidade, pode ter permitido tão trágico quanto negligente abandono. Bastaria ter atentado no que sucedeu ao Januário, irmão de um quadro do PAIGC, que, tendo desertado em Conakry com o seu grupo de combate,  foi fuzilado, ele e os seus homens.

Não podemos emendar a História! E quanto à dramática morte de Amigos, ou de Homens com quem convivemos diariamente, assiste-nos o direito à tristeza e à mágoa, independentemente dos erros, que eles possam ter cometido.

Como sempre, um Grande, Grande Abraço,

Jorge (***)


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Nota do editor: 


(**) Vd., na I Série, mais postes sobre este tema dos fuzilamentos de antigos camaradas nossos, guineenses, no pós-independência.

Guiné 63/74 - P11812: Parabéns a você (599): José Zeferino, ex-Alf Mil Inf do BCAÇ 4616 (Guiné, 1973/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11791; Parabéns a você (598): António Nobre, ex-Fur Mil da CCAÇ 2464 (Guiné, 1969/70)

domingo, 7 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11811: Os nossos médicos (60): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (3): Binta e Jamba


1. Conclusão da publicação das memórias do ex-Alf Mil Médico Rui Vieira Coelho [foto actual à esquerda] que esteve integrado nos BCAÇ 3872 e 4518 (Galomaro, 1973/74), chegadas até nós através do nosso camarada Mário Vasconcelos, ex-Alf Mil TRMS do BCAÇ 3872.

Fica aqui o nosso obrigado ao camarada Mário Vasconcelos pela sua iniciativa, continuando nós a contar com a sua colaboração quer no envio de memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, assim como das suas.







O Dr. Rui Vieira Coelho numa cerimónia de fanado 

 Bajuda

Bajudas lavando roupa



Jamba com o Alf Mil Mário Vasconcelos
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Nota do editor

Vd. postes anteriores da série de:

5 de Julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11808: Os nossos médicos (58): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (1): Guiné I (Mário Vasconcelos / Rui Vieira Coelho)
e
6 de Julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11809: Os nossos médicos (59): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (2): Guiné II e III (Mário Vasconcelos / Rui Vieira Coelho)

sábado, 6 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11810: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (11): Ainda o poste do Cherno Baldé e outros



1. Mensagem do nosso camarada António José Pereira da Costa (Coronel de Art.ª Ref, ex-Alferes de Art.ª na CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69 e ex-Capitão de Art.ª e CMDT das CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74), com data de 20 de Fevereiro de 2013:

Aqui vai um texto que será para a minha Guerra a Petróleo.
Penso eu de que...

Um Ab.
António J. P. Costa


A MINHA GUERRA A PETRÓLEO

11 - AINDA O POSTE DO CHERNO BALDÉ E OUTROS

Fiquei deveras surpreendido com a reacção dos participantes no blog a um post onde se descrevia a morte, por fuzilamento, de dois guineenses – dos quais um ex-colaborador das NT durante a guerra colonial – na sequência de uma insubordinação de uma grupo de ex-milícias e ex-soldados do Exército Português, ocorrido em Cuntima, a 14 de Novembro de 1976.

Efectivamente, em pouco tempo, o número de comentários ultrapassou os quarenta e, curiosamente, muitos deles traduziam um antagonismo entre os participantes no blog que ia muito para além do simples comentário ao acontecimento que fora narrado. Na análise de alguns comentários detecta-se até uma espécie de sentimento de culpa que, pelo menos em relação a este facto concreto, não se justificará muito. Para além de estarmos perante algo que sucedeu já em plena independência da Guiné, no fundo, trata-se de uma reacção popular (violenta, é certo) a algo que deveria ser feito e não se fez, embora seja patente que os contestatários, em virtude da sua vivência anterior, não estariam muito dispostos a aceitar as determinações do novo poder. Era de esperar que assim fosse. O mais curioso é que o próprio narrador situa bem o sucedido numa linha de actuação do PAIGC, em relação às populações do país que se incumbiu de governar. Assim, chegado ao poder efectivo havia cerca de um ano (em 10 de Setembro de 1974) procurava afirmar-se nele, como seria lógico. Porém, essa afirmação seria feita não tanto numa acção positiva, materializada pela melhoria das condições de vida das populações, isto é, da acção governativa eficaz, mas antes e pelo contrário de uma acção repressiva que visava manter aquelas num estado de disciplina, mais ou menos imposta pela hierarquia que saíra da vitória na guerrilha.

Enfim, nada que pudesse ser da responsabilidade directa da “guerra” ou das actuações do Exército Português.

Donde veio então este debate de ideias inconciliáveis?

O PAIGC, como movimento guerrilheiro africano do final dos anos cinquenta do Séc. XX, apresentava as práticas de disciplina interna (a tal "disciplina revolucionária" que lhe conhecemos através da documentação de informações) que lhe garantiram a sobrevivência ao longo de uma guerra feroz e desgastante e que lhe teriam sido inculcadas pelos doutrinadores da URSS. Compreende-se. Assim como se deverá compreender que se tenha constituído, após a tomada do poder, como partido único, responsável pelo funcionamento da sociedade guineense. Não é justo que se exija a quem se expôs a tudo e arriscou tudo para tomar o poder que se vá sujeitar a um “referêndum” para partilhar o que tanto lhe custou a ganhar. Depois, com andar dos tempos, ainda se aceita a disputa política, mas naquele momento é sinceramente uma injustiça.

Conhecemos as características das lideranças africanas, quer naquele tempo, quer na actualidade. Porventura mais duras naquele tempo, quando era necessário levar para o combate e sofrimento alguns milhares de guineenses e evitar que desistissem da "luta". Muita da adesão popular foi coercivamente obtida, no início da “guerra”, e mantida por um policiamento apertadíssimo por parte das unidades do partido. Mas o que é inegável é que as deserções de combatentes e fugas da população foram raras, o que não significa que as populações a aceitassem livremente. Por outro lado, após a independência, estender a “disciplina revolucionária” a toda a população não era boa técnica, como já se começava a ver em todos os países onde a doutrina política apontava para o partido único. Além disso, o povo guineense permanecera na sua maior parte sob controlo e protecção das NT o que lhe concedeu um estatuto e condições de vida que o partido cada vez menos podia assegurar. Mas há um outro aspecto importante a considerar, na análise do problema. A ocupação pela força de dado um território (como o PAIGC sustentava que era a situação) nunca pode ser feita sem a colaboração de uma parte mais ou menos considerável da população. Não seria este exactamente o caso da Guiné. As autoridades locais que materializavam a acção do governo central só abusivamente podem ser consideradas como ocupantes, mas dispunham de um considerável número de apoiantes, alguns decididamente colaborantes, outros fazendo-o mais ou menos tacitamente. A retirada de um invasor deixa sempre para trás um número de “colaboracionistas” que não o acompanham na saída. Só a título de exemplo, recordemos a dramática saída dos sul-vietnamitas da embaixada dos Estados Unidos, em Saigão. As características da guerra subversiva aproximam-na muito de uma guerra civil que, frequentemente atinge graus elevados de violência, muitas vezes gratuita, e gera a existência de vencidos da guerra, ou seja, aqueles que combateram por uma causa, perderam a guerra, mas não abandonaram as suas convicções, constituindo-se sempre como resíduos de uma possível contestação aos vencedores.

E não se podem matar todos!...

Sinais dos tempos, pois antigamente e em muitas situações podiam exterminar-se na totalidade. A História está aí para no-lo mostrar e, com se sabe, quanto mais “velho” é um país mais fácil é recolher, no seu passado, bons e maus exemplos…

A retirada das Forças Armadas Portuguesas da Guiné foi feita sob diversas pressões das quais podemos referir apenas as duas principais: uma interna, consequência da fadiga e revolta inerentes a 13 anos de guerra que já fazia parte do nosso “dia-a-dia” e outra externa, proveniente do PAIGC que, nunca tendo esperado que a vitória lhe surgisse assim, ficou ébrio e nada mais queria do que assumir o poder. Claro que há aqui um erro de avaliação. O partido não tinha estruturas nem quadros que lhe permitissem desenvolver a sua acção político-administrativa e, mesmo tendo necessidade dela, a colaboração da administração portuguesa era a última que lhe conviria para o apoiar ou auxiliar.

É à luz destes dois parâmetros que deve ser vista a saída dos militares portugueses da Guiné, deixando para trás muitos guineenses que tinham colaborado, por vezes muito activamente, com as FA de Portugal.

Cheguei a admitir que a maturidade do partido e as raízes unitárias com que foi constituído poderiam ser a garantia de que o ambiente se pacificaria. Não me surpreendeu, por isso, que o PAIGC tivesse assumido como guineenses os “colaboracionistas com as FA” e/ou os “vencidos da guerra civil”. Confesso que tive dúvidas, pois conhecia aquele povo e o partido que tomara o poder, mas… podia ser que fosse assim.

Não contei com uma manobra (de longo alcance) do PAIGC que lhe permitiu constituir um bode expiatório para os seus falhanços e um exemplo para mostrar aos contestatários das suas opções políticas e económicas. Se os "traidores guineenses que tinham lutado do lado dos colonialistas” fossem considerados portugueses seriam intocáveis, por serem estrangeiros, e poderiam sair da Guiné se o desejassem ou serem a tal obrigados pelas novas autoridades. No fundo seria uma forma de punição: a perda da nacionalidade.

Esta actuação do PAIGC, ocorrida em Novembro de 1976, foi assim uma tentativa de disfarçar a sua incapacidade de reconstruir o país. Recorreu a demonstrações de força (esta e outras), a cargo de militantes seus de uma fidelidade canina, capazes de extrema violência, mas dotados de pouca cultura e abdicando do uso da inteligência. Aterrorizar as populações, especialmente as das áreas onde tinha menor implantação ou em que os contornos éticos lhe fossem mais dissonantes passou a ser possível. Se acrescentarmos a prepotência e as vaidades de quem tem “o rei na barriga”, temos todas as condições para que estas situações ocorressem e continuem a ocorrer. Agora, porém, a ligação ao colonialismo é mais difícil, mas é sempre possível de estabelecer. Como já disse, estes exemplos proliferaram por todo o continente na sequência das independências, ganhas ou concedidas, e, às vezes para meu desespero, eram bem previsíveis. Mas não era politicamente correcto anunciá-los…

Tenho para mim que se o Amílcar Cabral fosse vivo naquela altura – e até alguns anos depois – isto também sucederia. O ambiente e os factos, nomeadamente a cisão do partido em PAIG e PAICV confirmam o que digo.

Não vejo, por isso motivo para nos culpabilizarmos por este caso ou casos similares. Outra atitude do PAIGC, mais madura e justa, poderia tê-lo até dado a maior respeito interno e internacional. Era o que se esperava de um partido velho, com muito tempo de luta violenta e dotado de uma maior maturidade, o que não sucedera a tantos outros a quem a independência foi dada de bandeja. Mas a sua opção foi noutra e isso só aos guineenses diz respeito.

Admiti que o povo da Guiné poderia ganhar muito com a independência em áreas como a agricultura, pescas e pecuária, agora que apenas dependia de si mesmo para atingir os seus objectivos e afinal enganei-me.

Talvez seja sina da África ser governada por sistemas de partido único, constituídos por homens imbecis, ou até válidos e bem-intencionados, mas que rapidamente embrutecem e se tornam insuportáveis. Aí não posso, nem devo, nem quero fazer nada (para além de simples conselhos). Será uma espécie de via-sacra que os povos têm que seguir até que, a sua cultura e (porque não dizê-lo?) a sua maturidade lhes permitam reduzir, que não anular, este tipo de procedimentos.

Contudo, estávamos no Séc. XX (e agora já XXI) e, por isso, seria bom que cada povo aproveitasse a experiência dos outros e, pelo menos tentasse evitar cair nos erros cometidos. Não me sinto culpado de nada do que sucedeu na Guiné depois da independência e, muito mais agora que aquele povo “tomou o seu destino nas próprias mãos” há quase 40 anos (duas gerações). Limito-me a observar de longe e constatar que ali não houve excepção relativamente ao sucedido noutros países da mesma área geográfica.

Parece-me, isso sim, que, com a vitória, o PAIGC contraiu uma série de responsabilidades, nomeadamente no que respeita aos seus heróis e à sua história que é uma fracção já considerável da História da Guiné e que lhe deverá servir de arrimo ao seu percurso político.

Por favor não aceitem as culpas que não temos e se digladiem por causa delas.

Não esqueçam que, em Direito, os principais responsáveis são sempre os autores materiais do crime. O facto de existirem “condições” não quer dizer que o crime seja cometido.

António José P. da Costa
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Notas do editor

Ilustração retirada da História do BCAÇ 4612/72 (Mansoa, 1972/74), unidade que foi rendida pelo BCAÇ 4612/74 (Mansoa, 1974)... 
Um exemplar da história desta unidade, o BCAÇ 4612/72, foi-nos oferecido, em formato papel e em pdf, pelos nossos camaradas Agostinho Gaspar e Jorge Canhão (ex-Fur Mil 3ª C/BCAÇ 4612/72, Mansoa e Gadamael, 1972/74).
Este documento tem cerca de uma dúzia de interessantes (e raras) ilustrações, feitas por um ilustre desconhecido, a estilete sobre "stencil"...
Imagens: Cortesia de Jorge Canhão (2011).

Último poste da série de 28 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11172: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (9): A praxe da Ivone

Guiné 63/74 - P11809: Os nossos médicos (59): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (2): Guiné II e III

1. Continuação da publicação das memórias do ex-Alf Mil Médico Rui Vieira Coelho, BCAÇ 3872 e 4518 (Galomaro, 1973/74), chegadas até nós através do nosso camarada Mário Vasconcelos, ex-Alf Mil TRMS do BCAÇ 3872.



Galomaro > O Alf Mil Médico Rui Vieira Coelho e o Alf Mil TRMS Mário Vasconcelos

(Continua)
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Nota do editor

Primeiro poste da série de 5 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11808: Os nossos médicos (58): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (1): Guiné I (Mário Vasconcelos / Rui Vieira Coelho)

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11808: Os nossos médicos (58): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (1): Guiné I

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vasconcelos [foto à direita] (ex-Alf Mil TRMS, CCS/BCAÇ 3872 - Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72 - Mansoa, e Cumeré, nos anos de 1973/74), com data de 1 de Julho de 2013:

Caros camaradas:
Luís Graça, Carlos Vinhal e Magalhães Ribeiro.
Sou o tabanqueiro nº 615 - Mário Alberto Lage Sampaio de Vasconcelos.

Junto em anexo três blocos de texto (designados por Guiné I, II e III), de autoria do ex-alf médico Rui Vieira Coelho, licenciado pela faculdade de medicina do Porto, e especialidade hospitalar de Cirurgia Geral.
Este camarada e amigo, esteve colocado nos batalhões 3872 e 4518, sediados em Galomaro no período de 73/74.
Rendeu em 1973 o ex-alf méd António Manuel Pereira Coelho, igualmente pertencente ao BCAÇ 3872.
Igualmente junto outros dois textos, do mesmo autor e denominados Memórias da Guiné - 1973/74 (BINTA) e Galomaro 1973 (JAMBA).

Solicito a sua publicação, a seu pedido, pois não está inscrito como tabanqueiro, mas deu autorização das publicações.
A forma de publicação fica ao vosso critério, pois entendo alguma extenção na sua globalidade e /ou temas.
Até à sua publicação, ficarei ao dispor para eventuais necessidades e/ou esclarecimentos.

Abraço colectivo aos tabanqueiros-mores.
Mário Vasconcelos


2. Comentário do editor:
Vamos publicar os textos do Dr. Rui Vieira Coelho em três postes, começando pela "Guiné (Parte I)".

Ex-Alf Mil Médico Rui Vieira Coelho em Galomaro

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11796: Os nossos médicos (57): A CART 3493 nunca teve médico - diz António Eduardo Ferreira; resposta ao inquérito por Jorge Picado

Guiné 63/74 – P11807: Memórias de Gabú (José Saúde) (30): Rescaldo da apresentação de “AS MINHAS MEMÓRIAS DE GABU”, em Beja

1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos uma mensagem. 


Rescaldo da apresentação de “AS MINHAS MEMÓRIAS DE GABU”, em Beja

Registo positivo

Manuel Mantinhas, um inestimável amigo e também camarada de armas na Guiné, foi o meu “velho” companheiro que se ocupou, e muito bem, em traçar as linhas gerais sobre a apresentação da minha 5ª obra – GUINÉ-BISSAU AS MINHAS MEMÓRIAS DE GABU 1973/74 – no passado dia 4 de julho na Biblioteca Municipal de Beja, José Saramago.

O meu prezado amigo Mantinhas foi outrora camarada do nosso colaborar permanente Torcato Mendonça (blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné) durante a sua comissão militar na Guiné, sendo que a sua amizade permanece inalterável no tempo. Um facto por mim constatado e que muito me orgulhou, tendo em conta o espírito de camaradagem que a guerrilha guineense nos proporcionou.

O evento da apresentação do livro contou com uma plateia quase repleta, ressaltando do acontecimento um mote de amiudadas conversas que se estenderam ao longo de uma noite quente onde um possível “batalhão de mosquitos” deu uma apaziguada trégua.

Abordámos inquestionáveis situações sobre a temática exposta na obra, sabendo-se, porém, que a narração dos factos relatados cruza gerações e que todos partilhámos situações idênticas ou parecidas.

A curiosidade do tema despertou, também, um renovado interesse a alguns jovens presentes no anfiteatro que se extasiaram com a dissertação de homens que tão bem conheceram os horrores da guerra. Ficou ainda a certeza que enquanto essa geração que pisou o palco da guerrilha nas antigas províncias ultramarinas permanecer ao cimo deste cosmos terrestre, esse tema será por nós preservado e trazido à estampa sempre que necessário.

Aliás, nós, antigos combatentes, jamais deveremos deixar cair no limbo do esquecimento a passagem de parte de uma vida que nos foi atroz e que deixou marcas em jovens que se deparavam com rigor para enfrentar a construção de um futuro que se perspetiva risonho. E muitos foram aqueles que, infelizmente, ficaram pelo caminho. Outros existem que convivem ainda com graves sequelas.

“Filhos do Vento” foi uma proposta lançada por mim neste blogue que visou lembrar “frutos” que vieram à vida e que jamais conheceram os seus verdadeiros progenitores. A mãe, única tutora, encarregar-se-ia de lhe transmitir todo o seu amor, mas do pai nunca terão tido conhecimento. Partiu. Foi uma rajada de vento que se espalhou num horizonte nebuloso.

Esses “filhos do vento” que narro também nesta minha última obra, suscitaram motivos de interesse alargado. Catarina Gomes, jornalista de “O PÚBLICO”, trará à estampa no próximo dia 14 de julho de 2013, domingo, uma reportagem sobre o tema, sendo que o título foi por mim autorizado, dado que fui solicitado a emitir uma opinião sobre a razão da referida expressão. 

Continuemos, pois, a luta para reavivar memórias de gentes que lidaram com o imprevisto de uma guerra que a cada instante impunha quadrantes, quiçá desiguais, ao mais singular soldado enviado para as frentes de combate. 


Mesa - Dra. Paula Santos, responsável pela Biblioteca, eu, José Saúde e Manuel Mantinhas

Trocando impressões com Vítor Maio, antigo camarada na Guiné e Ranger 

Com José Guerreiro, um camarada que esteve na Guiné no início da guerra

Um abraço camaradas deste alentejano de gema, 
José Saúde 
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 
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Notas de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: