sexta-feira, 21 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12876: Blogpoesia (381): O Dia Mundial da Poesia, 21 de Março de 2014, na nossa Tabanca Grande (XII): Nunca se está completamente vestido sem um sorriso (Fernando Gouveia)




Poema de Fernando Gouveia (2014)


1. Mensagem do Fernando Gouveia, associando-se à nossa iniciativa de celebrar o Dia Mundial da Poesia, uma maratona que já vai longa...


Luís:

Esperando que ainda vá a tempo de ser hoje publicada, neste Dia Mundial da Poesia, junto envio um poema construído sobre uma frase de uma canção de Little Orphan num musical da Broadway.

Como o poema tem laivos de Poesia Concreta vai como imagem e assim deve ser publicado.

Um abraço.

Fernando Gouveia 



Quinta do Paul, Ortigosa, Monte Real, Leiria > IV Encontro Nacional da Tabanca Grande > 20 de Junho de 2009 > Os então novos membros da nossa Tabanca Grande, Regina e Fernando Gouveia, um adorável casal, transmontano, do Porto, que fez uma comissão na Guiné (Bafatá, 1968/70). O Fernando foi Alf Mil Pel Rec Inf, Comando de Agrupamento 2957, Bafatá (1968/70) na altura em que era comandado pelo Cor Hélio Felgas, já falecido.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados.

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Nota do editor:

Úlrtimo poste da série > 21 de março de 2014 >  Guiné 63/74 - P12875: Blogpoesia (380): O Dia Mundial da Poesia, 21 de Março de 2014, na nossa Tabanca Grande (XI): Alberto Branquinho / Jorge Cabral / José Manuel Lopes (Josema)

Guiné 63/74 - P12875: Blogpoesia (380): O Dia Mundial da Poesia, 21 de Março de 2014, na nossa Tabanca Grande (XI): Alberto Branquinho / Jorge Cabral / José Manuel Lopes (Josema)

1. Alberto  Branquinho 


[ advogado, escritor, ex-alf mil op esp, CART 1689, , Catió, Cabedu,Gandembel e Canquelifá, 1967/69]


Luis: Correspondendo ao teu apelo, aqui vai um,  recentemente publicado no meu livro "QUASOUTONO?!".


BLOGUEMOS

Eu blogo
tu blog@s 
ele blog@
toda a gente 
mesmo os que não têm cão 
podem ter um blogue 
falando de coisas várias
ou do seu próprio umbigo

O blogue não ocupa espaço
não ladra
não comenão caga
(por vezes fede)

Vivam os blogues!
(sans blague...)


In: Branquinho, A. - QUASOUTONO?!, Lisboa, Edições Vírgula, 2004, 82 pp.



[ jurista, advogado de barra, docente universitário reformado, ex-alf mil at art, cmdt Pel Caç Nat 63, Fá Mandinga e Missirá, setor L1, Bambadinca, 1969/71]


Aí vai um poema escrito na Guiné. 

Abração,  J.Cabral



Modji Daaba


Modji Daaba no meu Lençol
Fecha o seu Corpo,
Como Flor,
Que teme o Sol.

Com medo e Dó,
Não dá. Empresta.
E desta noite,
Nada me resta.

Estou Só!

Fá, Nov.1969.
Jorge Cabral


[, vitivinicultor, duriense, ex-fur mil, CART 6250/72, Mampatá, 1972/74,  mais conhecido na região de Tombali pelo seu pseudónimo literário Josema...e por escrever um poema todos os dias; queimou mais de 2/3 da sua produção poética do tempo de guerra; este, que reproduzimos a seguir, foi um dos que escapou à fúria do poeta...]



Tenho saudades

tenho saudades
do amor que não se compra
daquele que se sente
o tal
que vem de dentro
e
que não acaba
com um orgasmo
não quero mais
ser
aquele que se vai
assim que se vem
não quero mais
ficar vazio
não quero mais
ficar sem eco
não quero mais
perder o elo
que me liga
a ela
seja ela quem for
não quero mais fazer amor
sem ter de oferecer uma flor.


josema
Bissau/1974

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Nota do editor:


Último poste da série > 21 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12873: Blogpoesia (379): O Dia Mundial da Poesia, 21 de Março de 2014, na nossa Tabanca Grande (X): "Canção", de Domingos Gonçalves (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546) e "Soneto de guerra", de Cândido Morais (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679)

Guiné 63/74 - P12874: Memórias da CCAÇ 2616 (Buba, 1970/71) (Francisco Baptista) (4): O respeito pela morte

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Baptista, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), com data de 13 de Março de 2014:


Memórias da CCAÇ 2616

4 - O RESPEITO PELA MORTE

O último semestre da CCaç 2616, em Buba, foi um tempo malfadado. Todos os tipos de azares e desgraças, aconteceram. Além dos habituais ataques de armas pesadas ao aquartelamento, que dado os abrigos e valas existentes, não representavam grande perigo, houve toda a sorte de acontecimentos funestos. A Companhia sofreu com tudo isso quatro mortos e cerca de 20 feridos, alguns graves.

Em abono da verdade um morto e muitos feridos pertenciam a um Pelotão doutra Companhia do Comando de Aldeia Formosa que estava a reforçar a nossa. Este acidente foi provocado por uma granada de lança-granadas-foguete que depois de se lhe retirar a segurança para a introduzir na arma, com alguma inclinação a um metro e pouco do chão podia explodir. Foi isso que aconteceu junto à arrecadação do material provocando a morte imediata dum soldado e ferimentos, alguns muito graves, em cerca de quinze outros camaradas. Essa granada, penso que fabricada no Braço de Prata, teve poucos meses de utilização pois terá provocado outros acidentes noutros quartéis.

Houve de tudo, desde minas anti-pessoais e anti-carro a reencontros com a guerrilha no mato a três acidentes graves com diferentes tipos de granadas.
Este rol de desgraças penso que começou quando o Albano morreu e dois amigos dele ficaram gravemente feridos com a explosão de uma granada de mão.
Deste acidente penso que terá havido duas versões pelo que me abstenho de contar qualquer delas. Foi um acidente infeliz como houve tantos na Guiné.

Muitas armas e material explosivo, por vezes pouco seguro, deficiente instrução militar. Meses de relativo relaxe em que parecia que a guerra já tinha acabado, alternados com dias agitados por disparos e rebentamentos. Meses dum sol tropical escaldante alternados com meses de aguaceiros sem fim. A maior parte dos camaradas confinados durante quase dois anos a viver no aquartelamento, sem possibilidade de poderem gozar férias. Tudo isto criava condições propícias a todo o tipo de acidentes.

O Albano era pescador de Setúbal tal como os outros dois camaradas. Era discreto, diligente, trabalhador, popular entre todos os militares do quartel. Era um tipo de homem capaz de se relacionar com todos os outros, acima ou abaixo da sua escala hierárquica ou social, sem fazer concessões a ninguém. Só homens superiores conseguem ter este comportamento, porque para lá dos seus conhecimentos literários, técnicos ou artísticos, conseguem ter a visão correta da miséria e da grandeza dos seus semelhantes.

Tendo a idade da maioria de todos nós revelava já ser um homem mais maduro. A isso não seria alheio o facto de já ser casado e ter duas filhas e como tal ter tido cedo responsabilidades que obrigam um homem a crescer.

Lembro-me do seu corpo estar depositado na pequena capela do quartel a aguardar transporte para Bissau. Penso nisso, no choque que a sua morte provocou em todos e apesar disso na solidão de morte do seu corpo, sozinho na capela, abandonado por todos. Olho para o monitor do computador e parece que me revejo a passar próximo da capela, que ficava ao lado da estrada que levava ao cais, em frente à messe de oficiais, a pensar que o meu comportamento e o dos outros não estava a ser correcto em relação o Albano.

Vinha-me à memória a morte dos meus avós e do meu padrinho, velados em casa sempre com tanta gente à sua volta, toda a aldeia, parentes e amigos das terras próximas a entrar e a sair para nos cumprimentar e rezar pelos morto. Lembrava-me principalmente do meu avô materno Francisco, um homem calmo, meigo, amigo de tratar da horta, e de ir à "venda" beber um copo com os amigos. Para mim foi o melhor homem que alguma vez conheci e sempre ouvi os maiores elogios acerca dele, bom homem e um lavrador dos melhores.

Assisti à sua morte, recordo tudo, desde o quarto em que estava deitado, às rezas antigas, que não conhecia, que a minha avó paterna fez. Recordo também que quando expirou, a minha avó mandou vir um pão (dos grandes pães que a minha mãe cozia) e foi partido em duas partes para dar a dois pobres. Depois do funeral a minha mãe mandou dar um quartilho de azeite a todas pessoas da aldeia que dele precisassem. Não sei ou já esqueci qual o significado daquele pão.

Lembro-me dessas noites longas de velório com a minha mãe, tias, primas e outras mulheres sentadas em redor da urna sempre a rezar terços. Os homens demoravam-se pouco, saiam e depois ficavam na rua a falar das colheitas, dos animais, enfim das vidas em geral.

Na morte do camarada Albano, em Buba, faltou o amor e compaixão das mulheres para dar sentido e dignidade à despedida.
Éramos homens e jovens, não dávamos valor às cerimonias e rituais que existem e sempre existiram em todos os tipos de sociedades e têm um papel importante para repor a paz e a harmonia entre os vivos e os mortos.

As mulheres conhecem todos esses mistérios, sabem falar com os mortos e não têm pudor em chorar e em manifestar as suas crenças e a sua fé. Como dizia o poeta Louis Aragon, a mulher é o futuro homem. Eu diria que ela é o princípio e o fim do homem pois é ela que lhe dá a vida e que no final o entrega e recomenda aos deuses.

Em Buba não tínhamos padre e não me recordo de alguém que o substituísse com uma mensagem de despedida que reunisse todos os militares do quartel ou pelo menos a Companhia. Sei lá, esse ou outro gesto, como toda a Companhia formada em silêncio em frente à capela onde estava o corpo.

Do que recordo, e aceito o contraditório de alguém que tenha memórias diferentes, os corpos dos outros camaradas tiveram o mesmo triste acompanhamento.

Um abraço a todos os camaradas
Francisco Baptista
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Nota do editor

Último poste da série de 27 DE DEZEMBRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P12513: Memórias da CCAÇ 2616 (Buba, 1970/71) (Francisco Baptista) (3): Ataques com armas pesadas ao quartel

Guiné 63/74 - P12873: Blogpoesia (379): O Dia Mundial da Poesia, 21 de Março de 2014, na nossa Tabanca Grande (X): "Canção", de Domingos Gonçalves (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546) e "Soneto de guerra", de Cândido Morais (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679)

1. Mensagem do nosso camarada Domingos Gonçalves, (ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887, Nova LamegoFá Mandinga e Binta, 1966/68):

Prezado Dr. Luís Graça:
Naqueles tempos a inspiração já escasseava. Ainda era, no entanto, suficiente para gravar no papel algumas quadras toscas.
Envio algumas.
Um abraço.


Canção

Quem repara na doçura do meu verso?
Eu não canto, senão para alegrar
A alma de quem sofrer e amar,
E em funda tristeza andar imerso.

Como a água que desliza num ribeiro,
Nas pedras a bater, leve e serena,
Seja minha canção assim amena,
E o meu verso, assim, fagueiro.

Alguém recordará a voz amada
A murmurar, baixinho, aos seu ouvidos,
Talvez exangue, triste e desolada,
Sonhos distantes, quase já perdidos.

Quem não sofreu a dor, o desengano?
Quem não viu a tristeza, nos seus dias?
Quem não teve ilusões fugidias,
E não sondou, do amor, o fundo arcano?

Viúva desolada, entristecida,
É filha da verdade a minha voz,
Alento para quem sofrer na vida
Alguma dor, demasiado atroz.

Prenúncio final, de uma vitória,
Do triunfo final, da irmã virtude,
Espalhe-se o meu canto na amplitude,
Alcance o homem bom, a maior glória.

Domingos Gonçalves
Mafra, Maio/1965

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1. Mensagem do nosso camarada Cândido Morais (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71):

Caro amigo
Um dia, para um livrito que produzi, incluí este soneto de guerra que nos retrata alguma coisa e que tenho todo o gosto em mandar-te, após ler o teu apelo:


Soneto de Guerra

O tempo parou e a folhagem densa
suspendeu também todo o movimento,
irmanando-se aos homens no momento
da angústia maior e mais intensa.

E todos os sons foram proibidos,
calando-se as aves sem detença,
porque pulsavam pela selva imensa
os medos doutros medos reprimidos.

Demorou o momento do trovão,
alvorada que ergueu, enfurecidos,
os rostos esmagados contra o chão.

Nos gestos maquinais, embrutecidos
o homem surgiu besta e a razão
cedeu ao mundo louco dos sentidos.

Cândido Morais
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Nota do editor

Último poste da série de 21 de Março de 2014 > Guiné 63/74 - P12871: Blogpoesia (378): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (IX): La crise, c'est fini, vive la poésie! (Luís Graça / Joana Graça)

Guiné 63/74 - P12872: Acordar memórias (Joaquim Luís Fernandes) (6): Porto do Carro, a minha aldeia, e Canchungo (ex-Teixeira Pinto), ontem e hoje

1. Sexto episódio da série "Acordar memórias" do nosso camarada Joaquim Luís Fernandes (ex-Alf Mil da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973 e Depósito de Adidos, Brá, 1974):


ACORDAR MEMÓRIAS

6 - Porto do Carro, a minha aldeia, e Canchungo (ex-Teixeira Pinto), ontem e hoje

A figura do ancião, da estória do porco abusivamente extorquido, com o seu olhar penetrante, tem-me acompanhado ao longo dos anos, fazendo-me lembrar pela semelhança, a figura de um outro ancião, da minha aldeia natal, Porto do Carro, quando ainda garoto de 7, 8, 9, 10 anos, me juntava com os outros garotos vizinhos, no largo do Casal das Pombas, palco de todas as brincadeiras e que confinava com o arneiro (quintal) pertença do “Ti Bajona”, o “homem grande daquela tabanca”. Parecia-me um gigante, com os seus pés sempre descalços e negros, as calças de cotim, que tinham sido cinzentas, com uns atilhos nos tornozelos e na cintura, camisa e colete escuros, barrete tão velho quanto desbotado, barba grande e pigarça. Uma figura que inspirava medo e respeito e que a garotada, evitava desafiar ou melindrar, não invadindo o seu espaço. Uma figura singular e tradicional nos usos e costumes, que ainda hoje, povoa as memórias dos garotos desse tempo.

Rapazinhos “djubis” no seu espaço e tempo de todas as brincadeiras, a lembrarem-me que poucos anos antes eu brincava como eles. Era só trocar a vaquita pela burrita e um pouco mais de roupa. (zona próxima do quartel)

Cais do rio Baboque em maré alta, próximo do quartel. Propiciava mergulhos aos “Djubis” e aos soldados algumas pescarias com o recurso do rebentar de uma granada. A recordar os meus tempos, na minha aldeia.

Há 55 anos, as ruas da minha aldeia, assim como o largo do Casal das Pombas, eram de terra batida. Não havia água canalizada, nem esgotos, nem tão pouco eletricidade, tal como ainda hoje nas tabancas de Canchungo. Também como ainda hoje em Canchungo, havia muitos meninos que brincavam na rua até noite dentro, em segurança, descalços, na terra batida, do largo do Casal das Pombas. (No meu ano, entrámos 22 para a primeira classe).

Hoje, as ruas e o largo do Casal das Pombas da minha aldeia estão asfaltados e limpos, têm água canalizada e esgotos, eletricidade e iluminação pública noturna, mas escasseiam os meninos. Algumas famílias continuam carenciadas mesmo que alguns calcem ténis de marca. Mas já não brincam na rua em segurança. E a escola, um dia destes fecha por falta de meninos.

Esta constatação, a par de outras, causa-me tristeza: ver o meu país a definhar, a envelhecer sem esperança. E não tinha que ser assim! Não foi com este futuro precário que a minha geração sonhou! Não foi para um país, com o presente e o futuro comprometido, adiado, como se afigura hoje, que trabalhámos, sofremos e lutámos!...

Mas... e os meninos de Canchungo?... Os que sobrevivem à subnutrição e à doença?...

Continuam a brincar descalços, na terra batida dos largos das suas tabancas, às escuras, tal como há 40 anos, quando eu me fazia criança e brincava com eles, nas suas rodas e eles me chamavam de manta, que eu usava como indumentária, a tiracolo e com que me agasalhava, nas frias noites e madrugadas, em voltas, nas proximidades de Canchungo, que penava, quando palmilhava ou me acoitava, mas sempre em vigilância, para que nenhum mal acontecesse.

Rapazinho que vinha recolher ao arame farpado, junto dos postos de sentinela, as sobras (restos) da comida que os soldados lhe davam. Perante a realidade que observava questionava-me: O que andamos nós aqui a fazer? Que guerra é esta? Como se não deve sentir revoltado este povo?... A nossa presença deverá ser uma afronta!...

Eu revivia e recordava os meus tempos de garoto, no largo do Casal das Pombas, brincando com os meus vizinhos, a correr atrás da bola... e dos sonhos... que quando fosse um homem haveria de ajudar a construir um mundo melhor, mais justo e fraterno. E aonde vão os sonhos?... Continua quase tudo do essencial por fazer: a justiça, a solidariedade...

A fotografia do Ioró Jaló, pela sua parecença com a do ancião da estória do porco, interpelou-me. Quem era este homem? Poderia ser seu filho, sobrinho... Só que no seu olhar não via o ódio e rancor que vi no do outro. Tão só súplica e complacência. Penso nele e em todos os outros na sua situação. Que herança madrasta, nós portugueses lhes legámos! E agora quem os ajuda e auxilia na sua penúria e sofrimento?...

Foto do Ioró Jaló, ex-milicia no Pelundo, (Vd. Postes P2451 ou P5414) 
(Com a devida vénia ao Dr. António A. Alves)

Fotos de: Mama Samba; José Ussumane Injai; Demba Injai; Joaquim Gomes; Bondon Monteiro. (Vd. P2451 ou P5414)
Com a devida vénia ao Dr. António Alberto Alves pelas fotos e bem haja pela iniciativa. Bem hajam todos os que têm ajudado, de algum modo, a minorar o seu sofrimento.

Portugal, enquanto país ocupante daqueles territórios durante 5 séculos, deveria e poderia ter feito mais e melhor do que fez! Será que ainda há condições, espaço de manobra e tempo, para ajudar aqueles povos a saírem da situação em que se encontram e alcançarem uma vida melhor, com paz, desenvolvimento e prosperidade? Assim o desejo e espero.

Gostaria de ter vida, saúde e alguns recursos económicos para poder fazer algo também. Tenho algumas ideias, mas sozinho pouco poderei fazer. Juntando-me a outros e organizados, poderíamos fazer mais. Por que não a “Tabanca Grande” ousar ir mais além? Ser mais interventiva na “coisa pública”; dar mais consequência e visibilidade aos afetos e que estes se concretizem em ações possíveis. Juntos e organizados, poderíamos fazer muito mais a favor do sofredor Povo da Guiné, que nos pede e espera ajuda. E de nós próprios.

Sei que o Blogue não é uma ONG, que há várias a trabalhar e a fazer bem o que podem e onde nos podemos inserir. A ação que preconizo para a “Tabanca Grande” seria de outro nível: vamos chamar-lhe “Grupo de Sensibilização e de Pressão” do maior alcance possível, ao nível político, diplomático... nas esferas nacional e internacional. Será sonhar muito alto?...

Imagem do “Google Maps” da Guiné Bissau, com especial incidência no Chão Manjaco por onde andei, das Ilhas de Pecixe e Jeta até ao Cacheu, que de algum modo conheci e criei laços. Tiveram nestes últimos 40 anos alguma expansão e transformação urbanística, mas continuam tão carentes como então, de desenvolvimento económico autossustentado. Têm alguns recursos, mas há tanto para fazer! Tenho algumas ideias e penso que não deveria deixá-las morrer ou enterrá-las comigo. Mas são tão grandes e eu sou tão limitado, que não sei! Veremos.
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Nota do editor:

Vd. postes da série de:

6 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12802: Acordar memórias (Joaquim Luís Fernandes) (1): Monte Real, 8 de Junho de 2013, o primeiro contacto com a Tertúlia

9 de Março de 2014 > Guiné 63/74 - P12812: Acordar memórias (Joaquim Luís Fernandes) (2): O primeiro contacto com a bibliografia da guerra colonial

12 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12828: Acordar memórias (Joaquim Luís Fernandes) (3) : As minhas pesquisas sobre Teixeira Pinto e o "Chão Manjaco"

15 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12841: Acordar memórias (Joaquim Luís Fernandes) (4): Teixeira Pinto, adaptação às pessoas e ao terreno

18 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12851: Acordar memórias (Joaquim Luís Fernandes) (5): O porco que não consegui comer

Guiné 63/74 - P12871: Blogpoesia (378): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (IX): La crise, c'est fini, vive la poésie! (Luís Graça / Joana Graça)


Joana Graça (2014) - Técnica mista, 30 x 40 cm.  S/ título (1)


Joana Graça (2014) - Técnica mista, 40 x 30 cm. S/ título (2).

Cortesia de © Joana Graça (2014). Todos os direitos reservados



la crise, c'est fini, vive la poésie!

[a crise acabou, viva a poesia!]

no verão,
entre cigarras e grilos,
éramos arquitetos esquilos,
desenhávamos à mão,
dedo a dedo,
frágeis barreiras de areia
contra a maré cheia
do medo.

em agosto,
ainda não se adivinhava setembro,
às portas do império,
as pousadas estavam repletas
e éramos deliciosa e inconscientemente felizes.

em damasco caíam bombas
e em lampedusa davam à costa
cadáveres subsarianos.


nas autoestradas do norte havia abatises,
o verão já era outono,
vindima, mosto,
passeávamos agora
com as nossas bicicletas,
à volta do círculo polar ártico,
furando o buraco do ozono.


definitivamente cancelámos
o nosso cruzeiro pelo adriático.

na rentrée,
rejubilámos,
os novos príncipes deste mundo
anunciavam a boa nova
pela têvê:
vem aí a retoma!


luís graça

Guiné 63/74 - P12870: Agenda cultural (305): O camarada "pifaniano" Silvério Dias, ex-1º srgt, locutor do PFA - Programa das Forças Armadas, e "poeta todos os dias", convida os poetas da Tabanca Grande para a sessão de hoje, "Há Poesia no CASO", ou seja, no Centro Acção Social de Oeiras, às 17h00

1. Duas mensagens do Silvério Dias, o ex-1º srgt, locutor do PIFAS,  que nos chegaram ontem, através do correio do Garcez Costa (que também Tony Sacavém):


(i) Saudações a todos os bons "tabanqueiros" na pessoa do "homem grande", Luís Graça, ao qual se deve o extraordinário "movimento da Tabanca Grande".

Desde já e lamentavelmente, muito em cima da hora, dou conta que amanhã, pelas 17H00, no Auditório Princesa Benedita, será levado a efeito, um evento de Poesia, aberto a todos os que queiram "dizer" o poeta da sua eleição.

Sem preciosismos, perfeitamente amadores, poetas da casa e seus convidados têm portas abertas para o convívio.

Quem não me conhece, terá o ensejo de aliar o tão "badalado Pifas" a um dos intervenientes que o celebrizou como Programa da Rádio na Guiné. Lá estarei, como mentor da Tertúlia, "Há Poesia no CASO".

A sigla traduz o Centro de Acção Social de Oeiras (IASFA) e situa-se junto à Escola Secundária Sebastião e Silva, em Oeiras, claro.

Para mais completa informação, sou o tal que se intitula, Poeta Todos os Dias. Se poetas, juntem-se a nós!

Abraço de camarada, Silvério Dias


(ii) O nosso furriel teve uma ideia brilhante e eu tentei corresponder em absoluto.Fiz aquele belo relato de circunstância e quando vou enviar, o mesmo é rejeitado por erro de endereço. Estou vendo mal mas não completamente ceguinho, e não descortinei o erro.

Assim, com toda a desenvoltura, "atirei" o texto ao Tony que por sua vez, com toda a sua capacidade, o remeterá ao Luís Graça. É possível?  Em boa verdade,  a tua ideia faz sentido, e antigos camaradas da Guiné serão muito bem-vindos ao COSFA.. Oxalá consigamos reunir uns quantos.

Lá te espero. E concordo que vás bem munido porque naquela Casa, dada a idade dos utentes, por vezes as presenças são escassas.

Guiné 63/74 - P12869: Blogpoesia (377): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (VIII): Pepito, o construtor de sonhos (José Teixeira, ONGD Tabanca Pequena, Matosinhos)


Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > O orgulho de saber escrever > Foi "foto da semana" na página oficial desta ONG > Data de Publicação > 7 de Fevereiro de 2010; Data da foto > 20 de Maio de 2008; Palavras-chave > Alfabetização... Possivelmente da autoria do Pepito...

Legenda: "É com muito orgulho que Bissam Galissa escreve o seu nome, materializando o sonho de toda a sua vida: ser alguém na sociedade, saber assinar e concitar o respeito de todos os membros da sua comunidade. No passado ela era obrigada a colocar a sua impressão digital em documentos e cartas, o que lhe provocava um grande mal-estar social no relacionamento com as outras pessoas. Hoje, ela sabe que tem todo o respeito do marido e dos filhos porque, como eles sabe ler uma carta sem ajuda de outros, não precisando de partilhar assuntos pessoais com mais ninguém e fazendo as próprias contas da sua actividade económica, a horticultura".

Foto: © AD - Acção para o Desenvolvimento (2010). Todos os direitos reservados




Guiné-Bisssau > Região de Tombali > Setor de Bedanda > Cananima, aldeia piscatória, na margem esquerda do Rio Cacine, frente à vila de  Cacine > 2 de Março de 2008 > Em primeiro plano, o Pepito observa a partida da canoa rumo a Cacine, tendo à sua direita o Zé Teixeira e, à esquerda, o Domingos Fonseca (que técnico da AD, do Programa Integrado de Cubucaré, ocupando-se me preferencialmente das acções ambientais em Cantanhez, nos domínios de ecoturismo, formação de professores de verificação ambiental, colecta de plantas medicinais e identificação de percursos naturais).

O Domingos foi um dos elementos-chave da organização (excepcional, impecável) que permitiu levar uma enorme caravana de jipes, de Bissau até ao Bissau, cerca de 600 quilómetros ida e volta, e largas dezenas de pessoas... Fomos a um sábado, dia 1 de Março, com várias paragens (Saltinho, Ponte Balana, Gandembel, Guileje), pernoita em Iemberém (sábado); no dia 2, domingo, visita a Iemberém, Madina do Cantanhez - Acampamento Osvaldo Vieira, almoço em Canima e visita a Cacine, e de novo pernoita em Iemberém... Segunda feira livre, com regresso a Bissau, antes das 17 horas, início do Simpósio, no Hotel Palace de Bissau.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados.


José Teixeira

["régulo" da Tabanca Pequena ONGD, parceira da ONGD AD - Acção para o Desenvolvimento, e nosso grã-tababnqueiro da primeira hora ]


Pepito, o construtor de Sonhos


“Desistir é perder, recomeçar é vencer” (Carlos Schwarz, 1949-2014)

Sentado à sombra de um mangueiro,
Ouvia serenamente o seu povo a sonhar,
E sonhava com ele, construindo –
Dava luz às suas ideias, 
alimentava os seus projetos,
Ouvindo –
E continuava a sonhar um mundo diferente,
Desafiava-os a seguir em frente,
Sorrindo –
Sorrisos de esperança repartidos
Como raios de sol suave e ardente,
Penetrante –
Fonte de vida. Alimento,
Para o seu povo, sedento
De paz, pão, trabalho e dignidade.
E assim, de mãos dadas com ele,
Ganhavam forças para construírem o caminho
De felicidade.

Partia, então no seu pesado passo,
De homem cansado de tanto lutar,
Saltando de tabanca em tabanca,
Leve como um passarinho a esvoaçar,
Construindo sonhos num país adiado,
Para o seu povo, que teima em acreditar
Que, consigo a seu lado, é possível a mudança.

O construtor de sonhos
Era para o seu povo da Guiné
Um sinal de esperança.



Guiné 63/74 - P12868: Blogpoesia (376): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (VII): Mário Tito e as saudades da pátria...

Mário Serra de Oliveira (ou Mário Tito)

[ex-1.º Cabo Escriturário, BA 12, Bissalanca, 1967/68; vive nos EUA; é autor de Palavras de um Defunto... Antes de o Ser (Lisboa: Chiado Editora, 2012, 542 pp, preço de capa 16€] (*)


Camarada Luis:

Aqui vai o meu contributo, sendo que, sábado dia 22, figuro com 2 poemas, um deles, o do anexo ("Aventureio nato"), no lancamento de um livro conjunto, no casino do Estoril Salão Prata e Preto ou Preto e Prata, pelas 16 horas. A edição é da Chiado Editora. Todos são bem vindos. Eu estarei ausente. Abraço a todos. (**)



AVENTUREIRO NATO

por Mário Tito


Dormindo sonhei que sonhava
Sonhos… de um amor profundo
Sobre a minha pátria amada,
Quando dormia, noutras partes do mundo.

Eram sonhos de saudade e nostalgia,
Difíceis de descrever em palavras,
Sonhando de noite e de dia,
Recordando as primeiras passadas.

Saudade das ruas e caminhos
E de ribeiros e riachos...
Saudade de poder ir aos ninhos,
Entre outros desacatos.

Saudade das moças da minha aldeia,
Algumas delas, lindas cachopas…
Saudade de ir às cerejas…
De preferência, que não fossem nossas.

Eram saudades infinitas, talvez,
O tema dos sonhos que eu tinha,
Acordando mais que uma vez,
Pela distância da Pátria linda.

Sonhava com o tempo de criança,
De pé descalço e maltrapilho,
Traquinices, como lembrança,
Aventureiro nato... de Portugal é filho!







______________

Notas do editor:

(*) O que diz a Chiado Editora sobre o Mário Tito:

(i) cresceu no Alcaide até cerca de 14 anos, ocasião em que foi para Lisboa a trabalhar como “marçano” numa mercearia;

(ii) posteriormente, enveredou pela indústria hoteleira, trabalhando em Lisboa, Algarve e Viana do Castelo;

(iii) ingressou no exército e, após recruta, foi transferido para a Força Aérea;

(iv) dali, foi mobilizado para África, Guiné, tendo cumprido a sua comissão em Bissau na Messe de Oficiais da FAP;

(v) assistiu ao 25 de Abril, período de transição para a independência;

(vi) antes de regressar definitivamente ao fim de 14 anos e meio,  trabalhou na Embaixada dos EUA em Bissau;

(vii) dali, embarcou num navio sismográfico, como cozinheiro chefe rumo a Inglaterra, Holanda, Escócia (Mar do Norte);


(viii) acabou de chegar aos Estados Unidos juntamente com sua esposa, ao serviço da embaixada de Portugal em Washington;

(ix) mais tarde, trabalhou cerca de 20 anos na Embaixada da Alemanha, também em Washington.

(**) Últimmo poste da série > 21 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12867: Blogpoesia (375): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (VI): Manuel Moreira (Bissorã e Xime, 1965/69) / Jaime Machado (Bambadinca, 1968/70)

Guiné 63/74 - P12867: Blogpoesia (375): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (VI): Manuel Moreira (Bissorã e Xime, 1967/69) / Jaime Machado (Bambadinca, 1968/70)


1. Manuel Moreira


[ex-1.º Cabo Mec Auto,

CART 1746, 
Bissorã, Ponta do Inglês e Xime
1967/69] 





2. Jaime Machado

[ex-Alf Mil Cav, 
Pel Rec Daimler 2046.
 Bambadinca, 1968/70]

Poema de amor, enviado do Sultanato do Omã, onde passei o dia do pai  [, 19 de março,] com o meu filho e meu neto. 

Abraço, Jaime



CONVERSA COM O MEU NETO


por Jaime Machado



QUANDO TUDO JÁ PARECIA UMA ROTINA,
COM A NOITE IGUAL AO DIA,
DISSERAM QUE NO VENTRE 
HAVIA UMA SEMENTE.
QUE GRANDE ALEGRIA!

E DEPOIS, ESPERANDO SEMPRE,
DIA APÓS DIA,
O VENTRE CRESCIA
CRESCIA A ALEGRIA!

JÁ CHEGAVA DE MORTES 
E DESNORTES!


E AGORA QUE VENS A CAMINHO,
CHORANDO BAIXINHO, 
SEM GRANDE PRANTO,
JÁ TE AMO TANTO.
DOU-TE TODO O MEU CARINHO, 
DE NOITE E DE DIA,
QUE GRANDE ALEGRIA!

E UM DIA DISSERAM QUE VAIS SER RAPAZ,
E SE NÃO FOSSES? 
QUE IMPORTARIA?
DE QUALQUER FORMA 
E EM QUALQUER MOMENTO
HAVERIA ALEGRIA E CONTENTAMENTO.

E UM DIA VOU VER-TE 
A CORRER PELO PÁTIO,
DE BICICLETA OU DE TROTINETA,
DE UM LADO PARA O OUTRO,
ESPERO ESTAR CÁ!

E NO OUTRO DIA
VOU VER-TE CAVALGAR
NO MEU DORSO VERGADO, 
EM DESLUMBRAMENTO,
SEM QUALQUER LAMENTO,
ESPERO ESTAR CÁ!

E AGORA QUE VAIS DESCANSAR
VOU ACABAR
ESTA ESPÉCIE DE VERSEJAR.

ATÉ AMANHÃ,
PELA MANHÃ,
É JÁ OUTRO DIA
QUE GRANDE ALEGRIA!


AGUDELA, 22 DE MARÇO DE 2009

AVÔ MITO

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Guiné 63/74 - P12866: Blogpoesia (374): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (V): Carlos Alberto Cruz (Catió e Cachil, 194/66) / Joaquim Mexia Alves (Xitole, Mato Cão, Mansoa, 1971/73)

1. Repto lançado ontem pelo nosso editor L.G.:

Amigos e camaradas, filhos, netos, bisnetos e por aí fora de Camões e dos nossos maiores bardos (e bardas)... Amanhã é dia mundial da poesia... E a gente não celebra ? Não há para aí uma cantiga de amigo, escondida no baú ? Ou uma cantiga de escárnio e maldizer ? Um soneto ? Uma simples quadra ?

Poetas da guerra, da paz, do amor, acordai!... Vamos lá mostarr esses talentos... Desculpem se o lembrete vem muito em cima da hora... Um alfabravo fraterno. Luís Graça



2. Carlos Alberto Cruz

[ex-Fur Mil da CCAÇ 617/BCAÇ 619, Catió e Cachil, 1964/66]

Meu caro Luis,Já que fui desafiado, atrevo-me a enviar-te algumas quadras que abrem o meu Álbum fotográfico e que rezam assim:

Tendes aqui retratado
Tudo o que foi bom momento.
Dos maus nada foi focado,
São presa do esquecimento.

Horas boas foram breves,
Mereceram ser ilustradas,
Tornaram muito mais leves
As más, longas e pesadas!

A juventude abnegada
Que era a desta geração,
P´las vitórias se afirmou.

Venceu, por margem folgada,
Toda a má disposição
Que nunca, nunca vingou!


Espero ter correspondido às expectativas neste dia em que estive presente no convívio da Magnífica Tabanca da LInha.

O Grã tabanqueiro n º 638, Cruz
CCAÇ 617, Catió, Cufar e Ilha de Como (1964/66)



Joaquim Mexia Alves, Monte Real, 1/9/2013,
homenagem aos antigos combatentes
da vila de Monte Real
Foto: Tabanca do Centro

3. Joaquim Mexia Alves

[ex-Alf Mil Op Esp/Ranger da CART 3492/BART 3873, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73]

"Prontos", toma lá Luís, com um abraço
Joaquim


DIA DA POESIA


Tenho uma rima em cada dedo
ou melhor,
em cada mão!

Quando escrevo tenho medo
de não passar ao papel,
o que me vai no coração!

Mas escrevo sem "parança"
quer de noite,
quer de dia,
na tristeza e na dor,
na alegria e no amor,
sempre cheio de esperança,
por isso escrevo estes versos
para o Dia da Poesia.


Monte Real, 20 de Março de 2014
__________________

Nota do editor:

Último poste da série > 21 de março de  2014 > Guiné 63/74 - P12865: Blogpoesia (373): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (IV):Revolta (José Brás)

Guiné 63/74 - P12865: Blogpoesia (373): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (IV): Revolta (José Brás)

José Brás [, ex-Fur Mil, CCAÇ 1622, Aldeia Formosae Mejo, 1966/68; escritor]

No Portugal que temos 
só me apetece esta, caro Luís.
Abraço. José Brás

Revolta

Por dentro de mim circulam revoltas
circula um vento agreste
feito de revoltas
que me fecham tantas vezes o sorriso
a vontade de ouvir
e de dizer
que fui
que sou
só porque digo que serei o que nem sei…

Chegam-me ainda
o seco som dos tiros
cheiros de enxofre
e de carne morta
tantos sons de nomes que perdi
porque de mim se perderam
na viscosidade quente das matas…

Chegam sons de pragas
e de choros
a visão de olhos vazios
no apelo da desistência
o bafo quente
húmido e podre do tarrafo
as febres da malária e da cólera…

A trovoada tropical
racha-me por dentro
queima-me tronco e folhas
de onde haviam de brotar risos

José Brás

_____________

Nota do editor:

Último poste da série >  21 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12863: Blogpoesia (372): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (III): Dois poemas do último livro, "Entre margens", Lua de Marfim Editora, 2013 (Regina Gouveia)

Guiné 63/74 - P12864: Notas de leitura (574): "Pai, tiveste medo?", por Catarina Gomes (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Março de 2014:

Queridos amigos,
É mesmo uma abordagem original, os filhos a questionar a guerra dos pais, a descodificar doenças ou silêncios pesados, à busca de identidade, a aprender que há dores irrepresentáveis, como ser filho de prisioneiro de guerra ou receber um dia um livro que o pai propositadamente elaborou sobre aquela comissão militar em que perdeu uma perna.
A Guiné tem aqui uma fatia de leão: o soldado Vítor Capítulo, resgatado na operação Mar Verde e que foi acolhido triunfalmente em Sesimbra, parecia o dia da procissão do Senhor Jesus das Chagas; o drama do pai de Alexandra Penteado que veio com stresse pós-traumático da Guiné e levou a vida familiar aos quintos dos infernos; a ternura de “I nha fidju”, Maria Júlia da Costa Deitado, filha ilegítima do Cabo FZE 9375 narra a sua história tocante, ninguém ficará insensível à majestade deste depoimento; Mariama Sambú filha de um piloto aviador da Guiné-Bissau que nasceu no mato, em 1973; Tiago Teixeira cresceu a ouvir falar de tabancas, de rebentamentos e do amor do pai a uma povoação, Mampatá, outra história edificante; um filho de João Bakar Jaló mantém um amor entranhado a alguém que ele trata como herói de Portugal.
São pedaços das memórias filiais que abrem a porta a um ângulo inédito de um tremendo conflito onde releva o amor filial, acima de tudo.
Não percam.

Um abraço do
Mário


Pai, tiveste medo?

Beja Santos

“Pai, tiveste medo?”, por Catarina Gomes, Matéria-Prima Edições, 2014, é uma abordagem original da história da guerra colonial, até hoje não enveredada: o registo de depoimentos de quem a descobriu através da memória dos pais. São relatos em que só o afetivo é enaltecido, não há território nem espaço de manobra para censuras, vitupérios ou ajustes de contas, nem remorsos. Para os filhos desses combatentes, parece que o tempo sarou feridas, limpou malquerenças. Em sequência, a autora, que soube timbrar todos estes relatos dentro de uma inequívoca atmosfera jornalística, põe a desfilar um prisioneiro de guerra que será resgatado em Conacri e recebido triunfalmente em Sesimbra; um fuzileiro sofredor de stresse pós-traumático e que pôs a família a viver num inferno; Marisa que descobre na mala do pai o imaginário de um militar que queria vencer a solidão e que escrevia febrilmente para várias madrinhas de guerra; Maria Júlia Deitado, filha ilegítima do cabo FZE 9375 demorou décadas a descobrir a sua mãe guineense, é talvez o relato mais empolgante deste encadeado de narrativas em que a guerra colonial é vista ao caleidoscópio pelos filhos dos combatentes de então...

Mas há mais, o leitor irá descobrir a importância de uma cabeça de veado embalsamada, Mariama tem a fotografia do seu pai tirada na União Soviética, Serifo Sambú era piloto aviador, Mariama vive em Portugal e gosta de saber que o seu pai tem um nome respeitado na Guiné; o filho de Hugo Ventura, piloto que desapareceu no ar, em Moçambique, sem deixar rasto, guarda o dossiê desse pai que perdeu quando tinha dois anos; um maqueiro à força na Guiné devotou-se a ajudar a população, em Mampatá, o filho, médico, fascinou-se com as histórias que o pai lhe contou na infância e juventude, pai e filho, cada um pelo seu próprio caminho, mantêm-se ligados à Guiné… e há o filho do mítico capitão João Bakar Jaló, Comandante da primeira Companhia de Comandos Africana; e há um militar que escreveu um livro sobre a sua experiência dolorosa, a guerra para ele acabou no dia em que perdeu uma perna; e há também uma paraquedista e há Pedro Luqueia de Santarém que foi apanhado em menino durante uma operação em Angola e que continua a ir aos almoços convívios do Esquadrão de Cavalaria 122, foram estes militares que o trouxeram…

Não é um livro sobre a história da guerra colonial, quem depôs para este livro nem conhece os outros. A jornalista foi à procura de histórias em que os filhos verrumaram túneis de escuridão, desafiaram silêncios, aprenderam a amar os pais graças a uma experiência que acabou por os deslumbrar.

Teresa Capítulo é filha do soldado Capítulo que foi prisioneiro do PAIGC em Conacri, conheceu 33 meses de cativeiro, foi liberto na operação Mar Verde. Resgatado, não pôde revelar a ninguém de que modo tinha sido resgatado e voltara a Portugal. “A 4 de dezembro de 1970, Sesimbra encheu-se de um mar de gente para o receber, tanto que mais parecia o dia procissão do Senhor Jesus das Chagas, padroeiro dos pescadores, assim lhe descreveram o acontecimento para que Teresa percebesse o tamanho da multidão que o esperava”. Pai e filha conversaram muito, há um álbum com as imagens desse tempo de guerra, antes do aprisionamento. E há os relatos da prisão. O pai prestou um depoimento, gravou-o em vídeo para a sua junta de freguesia. Ainda hoje em Sesimbra continua a ser conhecida como “a filha daquele rapaz que esteve lá fora, a filha daquele que esteve preso”.

Alexandra Penteado tem muitas memórias de um pai violento, ameaçador, só muito tarde descobriu que o pai era um veterano de guerra doente. Era o pai tinha sido um jovem cordial, brincalhão, foi para a Guiné como Fuzileiro Especial, depois tornou-se um farrapo. Quando o pai faleceu vítima de cancro do pulmão, em 2002, Alexandra juntou aqueles papéis e aquelas fotos, manteve-se indiferente aos ritos dos Fuzileiros que vieram ao funeral. Procurou decifrar o pai, já o desculpou. Nos dias em que o pai acordava a meio da noite a gritar “saiam senão mato-vos”, Alexandra vê a tentativa de proteger a família dele mesmo, é como se ainda tivesse consciência que não os devia magoar, mas talvez não passe de uma mera explicação de alguém que passou a vida a sofrer os danos colaterais de quem não assumia que estava doente…

“Pai, tiveste medo?”, é pungente, inspirador, no conteúdo e na forma. É uma coletânea de explorações que convidam a sondar o passado, a tentar entender por que razão se procuravam madrinhas de guerra porque se foi separado da mãe, como papéis, fotografais, histórias, memórias, tudo em confluência, ou quase, leva a que vejamos os nossos pais num outro tempo, hoje inapreensível. Como diz a autora, a guerra contada é muito diferente da que foi vivida. E é original porque rasga uma nova perspetiva sobre um conflito de antigos combatentes consigo próprios e que possui o condão de iluminar a ligação entre pais e filhos, durante e após a guerra colonial.
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Nota do editor

Último poste da série de 17 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12848: Notas de leitura (573): "Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa", por Pires Laranjeira e "Jornal Português" e a notícia do assassinato de Amílcar Cabral (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P12863: Blogpoesia (372): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (III): Dois poemas do último livro, "Entre margens", Lua de Marfim Editora, 2013 (Regina Gouveia)

1. Regina Gouveia

Caro Luís Graça

Aí vão dois do meu novo livro “Entre margens",   editado em 2013. Um, implicitamente, tem a ver com a guerra colonial , o outro não

Ab, Regina Gouveia

Cais

por Regina Gouveia

Na janela, a cortina rendada.
Através dela, navios que demandam o cais,
outros que partem.
Lenços brancos acenam da amurada
outros respondem acenando de terra.
Entre uns e outros, oceano e guerra.
Navego no navio da memória
delida pelo tempo, esse cavalo alado.
Na janela, cada dia mais puída a cortina rendada.
Através dela já não vislumbro
o inexistente cais, outrora imaginado.



Regina Gouveia, Bafatá, c. 1969/70.
Foto: Fernando Gouveia


(…) Com raiva, o poeta inicia a escrita como um rio desflorando o chão (…) Mia Couto


As rugas, no rosto, cavaram-nas lágrimas
a escorrer dos olhos que de amor choraram.
Os leitos dos rios, cavaram-nos águas,
violando os solos por onde passaram.
O poeta, um dia, juntou águas, dores,
lágrimas, amores
e fez poesia.

Fonte: Gouveia, R. - Entre Margens. Póvoa de Santa Iria: Lua de Marfim Editora, 2013.

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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12862: Blogpoesia (371): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (II)...Três poemas do 'Zorba' Mário Gaspar (CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)

Guiné 63/74 - P12862: Blogpoesia (371): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (II)...Três poemas do 'Zorba' Mário Gaspar (CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)

Mário Gaspar  [ex-Fur Mil At Art, MA, CART 1659, "Zorba", Gadamael e Ganturé, 1967/68]

Camaradas e Amigos da Tabanca Grande Luís e Carlos

Poesia ou poésia?...

Escritas duas oesias  em Gadamael Porto, tal e qual como saíram da caneta para o aerograma.
Não fiz emendas! Estão todas virgens. Uma delas, "Gadamael Porto ", foi elaborada cá, julgo que numa Terapia de Grupo.

Vão em anexo.

Um abraço
Mário Vitorino Gaspar, 
ex-Furriel Miliciano Mário Vitorino Gaspar
CART 1659 - ZORBA
 1967&68


(i) Gadamael Porto

por Mário Vitorino Gaspar

Gadamael Porto, nome de guerra,
no sul da longe Guiné, onde morrer,
enjaulado no porco cu desta terra,
sinto-me amargurar e escurecer.
E com o sangue jovem a ferver,
o mundo quase que me encerra.

Não sei bem o que querer!
Difícil vislumbrar o que vem:
– E não é com certeza um bem!
Nem de descanso uma singela hora!
Meu inútil sorriso, derradeiro?
Serei de mim. decerto, prisioneiro.

Simplesmente um homem que chora.
Corro e caio..., verifico estar perdido,
num oco de nada, imenso e indefinido.
Na mata e bolanha entre o capim, olhei,
Avistei uma multidão de nada, nem lei.
E em busca do amor, sempre à procura,
vislumbro a vastidão da noite escura.

Parvoíce ganhar da vida um segundo,
depois do último, lá bem no fundo!
E do primeiro me afastara, e perdera,
pelo tudo que acreditava, e não fizera.
Perdidos sonhos de quem sempre amou,
levados pela guerra que tudo me negou.

Quedo, me vejo quebrado a estagnar,
bem longe da vida, da paz e do amar.
Quanto espelha a minha mísera figura?
Jaz uma imagem de solidão e amargura,
Ergo-me, escarro e vomito a distância,
completamente destituído daquela ânsia.

E, quem me dera saber o meu nome!?
Matar da vida a sede e a fome,
do jovEm com a minha idade.
Eu que pretendia a eternidade,
que segurei os cornos do boi,
mísero, reles estátua de morto herói.

Quem sabe se do mundo? Cobarde… 



(ii) Zorba - Quão Vazia esta Vida que me Agonia

Por  Mário Vitorino Gaspar

Quão vazia esta vida que me agonia,
quão grande o meu sofrimento,
quase que nem uma folha mexia,
no fundo do meu pensamento.
É porque há algo errado em mim
que não consigo entender:
preso acorrentado, como num fortim,
morro decerto, padeço até ao fim.

Deturpem quem viver assim,
matem-no mas sem sofrimento,
porque faço por esquecer em mim
o meu próprio nascimento.

Para alguns a vida brilha como água,
límpida, inocente, cor esbranquiçada.
Sinto, sou mortal, enorme mágoa
da vida, que vivo, tão deturpada.

Posso perguntar, porque nascer?
Perguntar, porque vagabundear?
Seria preferível na lama morrer,
por tanto ter que suportar.
Mas virá das nuvens um abutre,
sequioso, de garras com carne morta,
ele decerto que também padece e nutre,
enorme sofrimento e o suporta.

Gadamael Porto (Guiné-Bissau), 
21 de Junho de 1967

(iii) Zorba - Zé do Mato


por Mário Vitorino Gaspar


Tendo um dia vindo para a Guiné,
com o seu multicolor fato,
todos diziam: - É o Zé!
que chegou agora ao mato.

Foi de Gadamael para Ganturé,
com as características pernas de pato.
Figura típica a do Zé:
- Olha, é o Zé do Mato.

Soldado corajoso, afamado:
Dó, ré, mi, eram notas,
mas acordeonista falhado,
este das pernas tortas.

Vai para o içar da bandeira,
não se pode pôr em sentido.
Será da bebedeira?
Ou talvez por estar bebido?

Pode ser das pernas tortas,
que o sentido não pode fazer,
com certeza, e tu te importas,
por ele tanto beber?

Gadamael, sem data

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Guiné 63/74 - P12861: Blogpoesia (370): O Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014, na nossa Tabanca Grande (I)... Gratidão (Juvenal Amado)

Juvenal Amado, 2013
1. Em mensagem do dia 20 de Março de 2014, e respondendo a um desafio dos nossos editores (*), o camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), mandou-nos este poema a propósito do Dia Mundial da Poesia que hoje se comemora:


GRATIDÃO

Sobre elas nada disse,
nada escrevi.
Com elas, por elas cheguei à idade adulta,
Com elas sou completo
Ao pé delas o Mar é mais verde,
o céu mais azul,
o Outono mais calmo
e o Inverno menos agreste.
Num ciclo incessante
amanhece,
entardece
e anoitece.
Sempre por elas regressam
as alvoradas perfumadas

Elas são o meu pilar,

A minha água límpida,
o vento que me projecta,
o fogo que me aquece
a voz que embala
e a luz dos meus dias

São o significado do meu remar

a razão da minha gratidão
É delas o amor que perdurará
E eu falo do que amo!

Juvenal Amado (**)
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Notas do editor

(*) Repto lançado ontem, pelo nosso editor L.G., com o objetivo de celebrarmos, de maneira festiva, na nossa Tabanca Grande, o Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2014::

Amigos e camaradas, filhos, netos, bisnetos e por aí fora de Camões e dos nossos maiores bardos (e bardas)... Amanhã é dia mundial da poesia... E a gente não celebra ? Não há para aí uma cantiga de amigo, escondida no baú ? Ou uma cantiga de escárnio e maldizer ? Um soneto ? Uma simples quadra ?

Poetas da guerra, da paz, do amor, acordai!... Vamos lá mostarr esses talentos... Desculpem se o lembrete vem muito em cima da hora... Um alfabravo fraterno. Luís Graça