sexta-feira, 18 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13412: Blogoterapia (255): Em homenagem a dois transmontanos, bravos soldados, o José Tomás Costa (CCAÇ 2533, Canjambari e Farim, 1969/71), e o Tomás Baptista, meu irmão (Moçambique, 1966/68) [Francisco Baptista, ex-alf mil inf, CCAÇ 2616 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72)]

Francisco Baptista
1. A propósito da figura do José Tomás Costa (*), de quem publicámos dois pequenos textos, e que foi sold at inf da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71), transmontano, que não sabia ler nem, escrever quando foi para a tropa, outro transmontano, o nosso grã-tabanaqueiro Francisco Baptista [, ex-alf mil inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72)] , escrebeu o seguinte:

O José Câmara por algumas intervenções que já li no blogue reconheço que é dos maiores humanistas da
Tabanca Grande.

O Carvalho de Mampatá, fez um comentário tão perfeito que a mim tirou-me as palavras, se eu as conseguisse encontrar. Porém o Carvalho  tem um defeito que é exceder-se ao ouvir falar em Trás-os-Montes. Eu perdoo-te mas os outros camaradas não sei.

 O Luís Graça, já todos o sabemos,  é o santo ou feiticeiro que tem sempre a palavra certa para todas as ocasiões.

Ao Joaquim Luís Fernandes, camarada muito sensível, aplica-se bem o verso da Fado Tropical do Chico Buarque da Holanda: "Sabe no fundo eu  sou um sentimental".

Por mim digo que como transmontano, orgulhoso das minhas origens, por vezes um pouco só nesta Tabanca Grande, senti um grande orgulho ao ler as crónicas e as experiências do José Tomás da Costa.

Tomás, se me leres, quero dizer-te que tu apesar de aprenderes a ler e escrever tarde, aprendeste depressa a lição e sabes expressar-te como poucos. Falas com emoção, quando referes a tua família e com humanidade quando referes as gentes da Guiné. Tomás, gostei muito dos teus textos, tu com outras condições e motivações podias escrever um grande livro.

Conheci outro Tomás, em Brunhoso, na minha aldeia, era três anos mais velho do que eu. Foi um grande amigo, com quem passei bons e maus momentos. Juntos passámos muitos momentos de trabalho e outros de  borga. Ele, como mais velho, apesar das nossas quezílias frequentes, convidava-me sempre para todas as farras que organizava com amigos. Muitas vezes eram linguiças ou salpicões que roubávamos no fumeiro da nossa casa e iamos comer com três ou quatro amigos para uma casa desabitada que tinha sido duns avós. Fumeiro dessa qualidade é muito  difícil encontrar hoje. A minha mãe nunca se queixou da falta deles e lembro-me que uma vez roubamos-lhe o salpicão maior. Os transmontanos do nosso tempo sabem qual é. Eu não o digo porque tem um nome pouco simpático, apesar de normalmente ser também o mais saboroso. Em dias de festa da terra, a mesa em nossa casa estava sempre posta. O Tomás levava sempre, durante a tarde e a noite, muitos amigos das  terras próximas para comerem. Hábitos antigos de hospitalidade que a minha mãe encarava com simpatia e naturalidade 

Era temperamental e excessivo na amizade e na festa que ela podia proporcionar. Um pouco diferente dele e com alguns conflitos, de proximidade e  temperamentos, sei há muitos anos que foi um grande amigo que tive e  que perdi. Em 1966 foi como soldado para o norte de Moçambique, Mocimboa da Praia, na fronteira com a Tanzânia. Escreveu-me alguns aerogramas onde falava da vida difícil que tinha por lá. Falava também duma correspondente brasileira que penso que seria a única que tinha.

Quando regressou, após 28 meses. trouxe muito chá, trouxe um gravador de cassetes, novidade em nossa casa. Trouxe ainda fotos que me mostrou da correspondente do Brasil. Gostei da fotografia, achei que a moça era linda, feita de uma mistura de raças, india, africana e europeia. Leu-me cartas dela, havendo somente uma relação de amizade entre eles, era meiga e sedutora como se isso fizesse parte da sua natureza. Talvez nesse tempo se ele tivesse asas teria ido conhecê-la ao Brasil. As viagens intercontinentais eram caras e não havia dinheiro para  elas. 

Tantos conterrâneos nossos que imigraram para lá e nunca mais voltaram à terra. Nesses tempos de miséria as familias que emigravam para o Brasil despediam-se para sempre, até à eternidade. 

Este Tomás Baptista, como é fácil adivinhar, era meu irmão, o irmão masculino que pela idade tive mais próximo de mim. Tivemos os nossos choques e desentendimentos mas sempre houve uma grande amizade entre nós. Era um homem muito trabalhador, temperamental e folgazão. Porque não estudou, trabalhou muito como lavrador em benefício da comunidade familiar.
Infelizmente, morreu cedo, com 53 anos, há 16 anos, duma doença que o fez sofrer muito, durante meses. Paz à sua alma!

Este texto escrevo-o em homenagem a ele e ao camarada transmontano, José Tomás Costa

Para os camaradas da Tabanca que gostem de fado, descobri um da  Celeste Rodrigues que se chama "Praia de Outono" [,Música de Nóbrega e Sousa e poema de David Mourao Ferreira,] acho-o também  bastante adequado à nossa idade.

A todos um grande abraço,
Francisco Baptista (**)
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Notas do editor:

(*)~Vd. comentário do Francisco Baptista ao poste de 16 de julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13404: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XVI: A "sorte de um soldado", transmontano, que não sabia ler nem escrever quando foi incorporado (José Tomás Costa, sold at inf, 1º pelotão)

Guiné 63/74 - P13411: Notas de leitura (613): “Wellington, Spínola e Petraeus, o Comando Holístico da Guerra”, por Nuno Lemos Pires (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Julho de 2014:

Queridos amigos,

O coronel Lemos Pires, traça, neste seu documento académico (prova de doutoramento) hipóteses quanto à teoria do comando holístico da guerra, selecionou três líderes militares de valor indiscutível e questiona até que ponto foram bem ou mal sucedidos no comando holístico, ou seja, na capacidade de fazer convergir as forças militares e paramilitares envolvidas em estreita coordenação com os meios governamentais disponíveis, conseguindo coerência entre a política, as operações e a tática, gerindo todas estas dimensões em tempo oportuno.

Compreensivelmente, escolhi Spínola como a figura de análise.

O que o coronel Lemos Pires nos diz de modo algum nos surpreende: o comando holístico falhou quando Marcello Caetano entrou em conflito aberto com Spínola.

Um abraço do
Mário


Wellington, Spínola e Petraeus, O Comando Holístico da Guerra*

Beja Santos

“Wellington, Spínola e Petraeus, o Comando Holístico da Guerra”, por Nuno Lemos Pires, Nexo Literário, 2014, é um livro que resulta da adaptação da tese de doutoramento do autor em História, Defesa e Relações Internacionais. A questão central é, naturalmente, a defesa que o autor faz do comando holístico da guerra que apresenta sumariamente assim: “Entender uma situação de guerra implica ter uma visão completa e abrangente de todos os fatores envolvidos. Quem recebe a responsabilidade de comandar o esforço de guerra de uma nação, coligação ou aliança deve ter uma visão holística que lhe possibilite usar todos os meios possíveis na implementação de uma política abrangente, global e completa. O comando holístico da guerra desenvolve-se em quatro dimensões principais: a primeira advém da natureza das estruturas das forças envolvidas, armadas e de segurança, militares e paramilitares; a segunda abrange a coordenação entre organizações civis e militares, governamentais, não-governamentais e privadas, entre organizações internacionais e os vários Estados, coligações e alianças; a terceira trata da coerência entre a política, a estratégia, as operações e a tática; a quarta, do tempo, engloba as políticas decididas e as estratégias delas decorrentes, que têm de ser pensadas, concorrentemente, para ou antes, o durante e o pós-guerra”.

Como observa o autor, Wellington tentou, desde o início da Guerra Peninsular, exercer o comando e controlo de todas as foças que combatiam em Portugal. Spínola, como governador e comandante-chefe da Guiné, contou com um abrangente “Estado-Maior” representando variadas áreas da governação e da chefia militar propriamente dita, que lhe permitiu exercer um comando convergente de todas as ações das Forças Armadas, de segurança, das componentes civis e militares do seu governo; Petraeus foi comandante no Iraque e das forças norte-americanas no Afeganistão, buscou a unidade de esforços numa visão holística na condução da guerra. Três comandantes em conflitos sem qualquer ligação e em períodos temporais distintos, mas que visaram de ter o comando do esforço de guerra de modo holístico.

Para o autor, analisando o pensamento e a obra de Spínola, é indispensável, a moldura dos contextos internacional e nacional em que se inseriu a guerra de África para se entender a preparação e o entendimento que o general deu ao comando holístico: os esforços imprimidos junto das populações locais (a ação psicossocial, o apoio às autoridades civis); a africanização, política e militar, da guerra; como, no exercício de governador e comandante-chefe procurou e exerceu a unidades de esforços. Vejamos concretamente o que resultou e aonde falhou o comando holístico na Guiné, ao tempo de Spínola.

O objetivo último do general era o de consolidar a adesão das populações. Desde a primeira hora que chegou à Guiné, em Maio de 1968, que ele verificou que a guerra não podia ser ganha exclusivamente pelas forças das armas. O PAIGC desenvolvera uma estratégia de implantação e intimidação que deixava prever as maiores dificuldades na solução militar, acrescendo que o seu armamento, desde cedo, passou a ser melhor que o utilizado pelos portugueses, basta pensar-se nas metralhadores, nas bazucas e nos morteiros 120. Deu a maior importância à propaganda, contrapropaganda e informação, toda a ação psicossocial revertia para assistência sanitária, educativa e económica. A religião muçulmana em nenhuma circunstância foi hostilizada. Spínola falava constantemente na Guiné para os guinéus, assim abriu fraturas insanáveis entre guineenses e cabo-verdianos. O apoio às populações locais tornou-se um imperativo. Os programas radiofónicos procuravam atingir os guineenses que estavam nos países limítrofes, de modo a abalar as convicções das populações em fuga ou ao abrigo do PAIGC. Os Congressos do Povo foram uma das realizações mais inovadoras de Spínola, garantiam uma ampla participação dos representantes das populações. Foram construídas muitas mesquitas. Procurou-se negociar com fações do PAIGC o seu ingresso nas Forças Armadas portuguesas, operação manchada pelo chamado massacre dos majores em 20 de Abril de 1970.

Spínola e o Secretário-Geral da Guiné, Pedro Cardoso, tinham um excelente entendimento. Fizeram-se escolas, estradas, aldeamentos ouvindo as populações. Foi encorajada a autodefesa dessas mesmas populações e deu-se uma africanização militar com milícias, pelotões e companhias de caçadores, comandos e fuzileiros. E o problema da unidade de comando entre as componentes civis e militares cedo ficou resolvido. Então, o que falhou no comando holístico? As progressivas más relações entre Marcello Caetano e Spínola. Quando Caetano recusou terminantemente que Spínola continuasse conversações com Senghor, caminhou-se paulatinamente para a guerra, Spínola cria uma solução política para a Guiné, Caetano considerava-a de todo inadmissível. 1973 foi um ano decisivo: Amílcar Cabral, o único interlocutor possível de Spínola, foi assassinado em Conacri; entraram em campo os mísseis terra-ar, as forças do PAIGC envolveram-se em operações de cerco que arrasaram o moral das tropas portuguesas. E perdido o comando holístico, a Guiné ficou à deriva, Spínola desforra-se escrevendo as suas teses no livro Portugal e o Futuro, que contribuiu para baquear o regime.

O livro de Nuno Lemos Pires levanta hipóteses que podem estimular o debate sobre algo que tem estado obscurecido entre nós, a teoria geral do comando holístico da guerra, é uma investigação original que assegura uma leitura estimulante e uma reflexão oportuna.
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Nota do editor

(*) Vd. poste de 8 DE JULHO DE 2014 > Guiné 63/74 - P13375: Agenda cultural (332): Lançamento do livro "Wellington, Spínola e Petraeus: O Comando Holístico da Guerra", do Cor Nuno Correia Barrento de Lemos Pires, dia 16 de Julho de 2014, pelas 18h15, na Academia Militar em Lisboa

Último poste da série de 15 DE JULHO DE 2014 > Guiné 63/74 - P13401: Notas de leitura (612): "O Arauto" noticia a primeira ida para o ar da Emissora da Guiné, em meados de Março de 1953 (Lucinda Aranha)

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13410: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (3): A Xerazade de Teixeira Pinto... (António Graça de Abreu, ex-alf mil, CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74)

1. Mensagem do nosso camarada e amigo António Graça de Abreu [, ex-alf mil, CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74] [, foto à direita, em Cufar, c. 1973/74]

Data: 15 de Julho de 2014 às 00:16

Assunto: Libanesa bonita

Meu caro Luís

Está no meu Diário a 1 de Janeiro de 1973, em Teixeira Pinto

Acredito que tenha sido exactamente assim. Não escrevi de memória. Com todo o respeito pelas mulheres libanesas, iguais ou mais bonitas do que as mulheres de todo o mundo, Creio que é de publicar.

Forte abraço,
António Graça de Abreu

2. Excerto de Diário da Guiné - Lama, Sangue e Água Pura, de António Graça de Abreu. Lisboa: Guerra e Paz, Editores. 2007.


[Foto à esquerda,. capa do livro, Guerra e Paz Editores, SA (2007), com a devida vénia]

Canchungo, 1 de Janeiro de 1973

Ontem à noite houve corrida de São Silvestre organizada pela Acção Psicológica do CAOP 1. Às nove e meia da noite, tínhamos noventa figurões equipados, com postura de grandes atletas, a dar três voltas à avenida principal. Fui assistir na companhia do alferes Paiva, da 38ª de Comandos [1].

Mas ele tinha outra ideia, sub-reptícia, fixa. Quase em segredo, queria-me mostrar a sua namorada (?) libanesa, uma mulher solteira, com quase cinquenta anos convencida que tem vinte e dois, e que atrai os homens. Vive no centro da vila, na praça Dr. Oliveira Salazar com a família de comerciantes vindos do Líbano. Como é que esta gente veio parar à Guiné? (*)

A senhora pinta o cabelo – uma tenebrosa cabeleira loira, – pinta os olhos, pinta os lábios, pinta as unhas, pinta tudo. Usa uns brincos de folheta vindos de Salamanca, Espanha – diz ela, – tem a cara envelhecida coberta de cremes e pós. É um mamarracho digno de exposição. O Paiva, pouco mais de vinte anos garbosos e valentes, conduziu-me até casa dela, queria que eu a conhecesse. A mulher recebeu-nos como se tivessem chegado dois príncipes da Pérsia. Cumprimentei-a e vim educadamente embora. O alferes Paiva, Comando, capaz de todos os gestos heróicos, ficou lá a desmaquilhar suavemente a dama libanesa. (**)

À meia-noite, em casa do capitão Pancada abriram-se umas garrafinhas de Magos e de champanhe. O Pancada e o alferes Gamelas têm consigo as esposas, simpáticas, bonitas, ambas de nome Helena. Estavam felizes, dançavam enlaçados, beijavam-se. Na sala havia mais quatro homens casados com as mulheres em Portugal. Olhávamos uns para os outros, mastigávamos em seco, sorumbáticos, tristes. Éramos o alferes Teixeira, um excelente rapaz do Batalhão 3863, o alferes Tomé, meu companheiro de quarto, o furriel Rodrigues também do Batalhão, e eu.

Depois do “réveillon chez Pancada”, o Tomé foi ainda beber com os alferes Comandos – não sei se o Paiva já voltara do seu sortilégio libanês, – e regressou às tantas ao quarto, a gatinhar, a gritar a frase do costume “Tirem-me daqui, tirem-me daqui!”.

[1] Para a história da 38º. Companhia de Comandos, ver Resenha, 7º vol., tomo II, pag. 536.
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Notas do editor:

(**) Xerazade de Teixeira Pinto; o subtítulo, irónico,  é da responsabilidade do editor.

Consulta da Infopédia:

(...) "Xerazade: Filha de um vizir, Xerazade é uma princesa bela e sagaz que, sob ameaça de morte, consegue distrair o rei Shahriyârnarrando-lhe os contos que constituem As Mil e Uma Noites. Esta personagem tornou-se um símbolo do Oriente muçulmano, fantástico e voluptuoso, tal como o imaginou romanticamente a Europa após a leitura da famosa coletâneade histórias. A figura de Xerazade inspirou diversas obras, tais como o ballet oriental de Léon Bakst, em 1908, e o de Michel Fokine, em 1910." [... Sem esquecer a popularíssima suite sinfónica para orquestra, nº 35, do genial compositor russo Rimsky-Korsakov, Scheherazade, de 1888, baseada no livro de As Mil e Uma Noites... Pode ser ouvida aqui, no You Tube... LG].

Fonte: Xerazade. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2014. [Consult. 2014-07-17].
Disponível em http://www.infopedia.pt/$xerazade,2

Guiné 63/74 - P13409: Lembrete (5): Hoje é dia de encontro da Magnífica Tabanca da Linha, no restaurante Oitavos, estrada do Guincho, Cascais!


1. Hoje,  5ª feira. 17 de Julho de 2014, é dia de marcar presença no encontro da Magnífica Tabanca da Linha,

Recorde-se o anúncio feito em devido tempo, pelo nosso camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679,Bajocunda, 1970/71):
(1) O restaurante, privativo, é o  Oitavos [, foto à esquerda, de Manuel Resende], que fica na estrada do Guincho, Cascais, "um local de extraordinário recorte paisagístico";

(ii) Os magníficos tabanqueiros da Tabanca da Linha podem trazer  os fatos de banho e, se chegarem com antecedência suficiente, podem banhar-se nas águas revigorantes da praia do Guincho;

(ii) Como de costume, os camaradas podem (e devem)  fazer-se acompanhar das suas beldades,  e no intervalo do repasto  espraiar o seu olhar pelos horizontes vastos e inspiradores do Atlântico, fazendo contas à vida; 

(iv) O repasto constará de opulento e divinal arroz de marisco,  tudo ao módico preço de 15 morteiradas, bazucadas, obusadas ou equivalente, sem cargas suplementares, o que em tempo de guerra é de se louvar e tirar o quico ao vaguemestre e o oficial de operações;

(v) A Tabanca Grande saúda o régulo da Magnífica Tabanca da Linha, Jorge Rosales, o seu secretário Zé Manel Dins e os demais camaradas e amigos, hoje presentes no Guincho; infelizmente, o editor-chefe do blogue  e a a sua motorista privativa não poderão, desta vez, sentar-se à mesa da Magnífica Tabanca da Linha, por razões de natureza ainda fisiátricas (dele, não dela): esperam poder fazê-lo na rentrée, em setembro ou outubro.  (A boa notícia é que o nosso editor acaba de ter alta médica, devendo considerar-se doravante apto para retomar a função locomotora, sem ajuda das suas amigas canadianas)... (LG)

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Nota do editor:

Guiné 63/74 - P13408: Parabéns a você (763): Álvaro Basto, ex-Fur Mil Enf da CART 3492 (Guiné, 1971/74) e José Manuel Pechorro, ex-1.º Cabo Cripto da CCAÇ 19 (Guiné, 1971/73)


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Nota do editor

Último poste da série de 13 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13393: Parabéns a você (762): António Tavares, ex-Fur Mil SAM do BCAÇ 2912 (Guiné, 1970/72) e Rogério Ferreira, ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2658 (Guiné, 1970/71)

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13407: (In)citações (67): A Exposição Colonial Portuguesa de 1934 versus A literatura sobre os "impérios europeus" (Mário Beja Santos / Carlos Nery / José Brás)

O belo Palácio de Cristal do Porto (1865-1951) derrubado para dar lugar ao Pavilhão dos Desportos, rebaptizado mais tarde como Pavilhão Rosa Mota

Foto: Com a devida vénia a Skyscrapercity

A propósito da mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos, que encaminhei para a tertúlia, onde se incluía uma ligação ao sítio da Hemeroteca da Câmara Municipal de Lisboa, mais propriamente dito à Exposição Colonial Portuguesa de 1934, levada a efeito no Palácio de Cristal do Porto, salientamos estas duas reacções:



1. Do nosso camarada Carlos Nery, via facebook:

A propósito da chamada de atenção do camarada Beja Santos informo-te de que estive nessa exposição como se pode ver no Album junto...



Sou eu com um ano de idade... Quanto à moça africana ponho a hipótese de ser uma Bijagós. Os Bijagós são uma das mais antigas etnias da Guiné. Vivem ainda numa sociedade matriarcal, como outrora acontecia um pouco generalizadamente em África.

Para se ter uma ideia do que foi esta Exposição e avaliar a capacidade organizativa de Henrique Galvão (mais tarde opositor do regime e protagonista do assalto ao paquete Santa Maria) tem sentido "navegar" no blogue do porto e não só

Carlos Nery


2. Noutro sentido, talvez como contraponto, esta reacção do nosso camarada José Brás de quem não tínhamos notícias há algum tempo:

Carlos, meu amigo
É sempre de grande utilidade ter um documento destes ao nosso dispor como "Memoria" da História Oficia.
Entretanto, porque sabemos que a História Oficial é sempre um produto de homens, escrita pelos vencedores em cada contexto, coisa que a aproxima, no mínimo de verdadeira ficção, ainda que muito duvidoso de que camaradas em número significativo se venham a interessar por isto, aconselharia a dar nota também de pubicações como "Exterminem Todas as Bestas" de Sven Lindqvist, ou o próximo "Racisms: from the crusades to the twentieth century" (Princeton University Press), do português Francisco Bethencourt, radicado em Inglaterra como professor de história, a sair brevemente no Brasil e ainda sem editora em Portugal. A publicação da sua entrevista a Isabel Salema, acho que seria também um bom serviço ao Blogue no alargamento da visão sobre o nosso passado como povo.

Um abraço camarada
José Brás



3. Comentários de Carlos Vinhal

i) Ao camarada Carlos Nery o nosso obrigado por ter "representado", em 1934, no Porto, o Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné no evento tão importante, para a época, que foi a Exposição Colonial Portuguesa.

ii) Ao nosso camarada José Brás o nosso obrigado por estar sempre atento ao nosso Blogue e pelas suas intervenções sempre oportunas e construtivas.
Seguindo a sua sugestão, e uma vez que se tinha em carteira, para reenvio à tertúlia, a entrevista que Francisco Bethencourt deu à jornalista Isabel Salema, chegada ao Blogue via Mário Beja Santos, a mesma foi de imediato difundida.
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de Junho de 2014 > Guiné 63/74 - P13275: (In)citações (66): Sobre o 10 de Junho, Dia da Raça (José Manuel Matos Dinis)

Guiné 63/74 - P13406: Memórias de Gabú (José Saúde) (40): Libaneses!

O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem



AS MINHAS MEMÓRIAS DE GABU


Libaneses 

Desafiando a distância no tempo, proponho-me embarcar com suavidade no repto lançado pelo nosso camarada e editor do blogue, Luís Graça, trazendo à opinião pública a questão dos libaneses que viviam na Guiné na época em que cada um de nós cumprimos a nossa comissão militar naquela antiga província ultramarina. 

Nomes? Não sei! Sei, e disso tenho absoluta certeza, que em Nova Lamego, urbe onde cumpri a minha comissão, os libaneses detinham maioritariamente o poder comercial. Afáveis, como era costume, prontificavam-se em servir com gentileza a tropa branca.

Recordo que o recheio de uma loja libanesa oferecia imensas opções de compra. Naquele espaço existiam qualificáveis objetos que colocavam infinitos desejos num mancebo sem medo que vivia num mundo de arriscados sonhos, sendo absolutamente previsível que a sua bagagem de regresso à metrópole fosse recheada de muitas ofertas para as namoradas, família e amigos. 

Tudo era novidade. E os libaneses eram perfeitos sabichões na arte de aliciar o cliente que vivia um momento eufórico e vislumbrando no horizonte o fim da guerra na Guiné.

Eu fui um desses clientes que se predispôs a comprar não só ilusões mas outros bens que se assumiram como essenciais ao longo da minha comissão por terras guineenses.

Neste contexto, cito a exemplaridade que a máquina fotográfica comprada quando cheguei a Nova Lamego, e numa loja de libaneses, me facultou para a minha última obra denominada GUINÉ-BISSAU AS MINHAS MEMÓRIAS DE GABU. 

Eis a narrativa quando cito no livro a sua afetividade para um camarada que conheceu a guerra e a paz. 

A minha máquina fotográfica Olympus
Obrigado pelas tuas imagens 

Olho, hoje, para ti e relembro os momentos em que foste, para mim, uma insofismável companheira! Comprei-te numa loja de libaneses, em Nova Lamego. A aquisição baseou-se, essencialmente, sobre uma carência pressupostamente sentida quando ostentava, ainda, a alcunha de piriquito. Optei, no ato compra, pela marca que já conhecia e fiz menção que o seu manuseamento fosse o mais simples possível. Vislumbrava no horizonte que poderias, em momentos crucias, debitares imagens capitais para mais tarde recordar. 

Seguias viagem no bolso do camuflado e a tua humilde ação apresentou-se, a espaços, importante para a reposição de reproduções que nos leva a viajar nas asas do vento e trazer à memória pedaços de indeléveis recordações. O seu aspeto simples, e de mecânica sumária, jamais me deu o mínimo de problemas ou/e de preocupações. Ou seja, a minha Olympus era uma máquina divinal. Não recordo o seu custo exato. Talvez uns quinhentos ou setecentos e cinquenta mil réis. 

Afirmo, por outro lado, que a generalidade dos documentos visualizados nesta obra, tiveram como base aquele pequeno brinquedo que teimosamente acostou junto a este combatente - sem nome - que prestou serviço militar em território da Guiné. 

O clique não obedecia a cuidados antecipados. A visualização do objetivo não apresentava dificuldades pré concebidas. Colocava a máquina na posição de automática e saía, normalmente, uma imagem de se lhe tirar o chapéu. Com ela, a minha Olympus, recolhi pormenores de gentes que viviam no meio de duas frentes de guerra que impunham leis horrendas no terreno. 

Recolhi imagens de crianças que muito cedo se habituaram a ouvir os sons horripilantes das armas de fogo que serviam simplesmente para matar outros homens considerados inimigos. Imagens de homens e de mulheres grandes que serviam, por vezes, de fúteis objetos. Em prol da sobrevivência tudo se aceitavam. 

A guerra, a tal maldita guerra, traçava horizontes deveras débeis. Melhor, medonhos. 

Gentes que caminhavam para o campo com uma aparente ligeireza. Pareciam conhecer, e bem, os trilhos do medo. E tudo se conjugava numa irreverente certeza: a população era um alvo apetecível para as duas frentes de guerra no terreno. E o povo sabia que eram seres importantes num xadrez de incertezas. 

A minha Olympus acumulava, pausadamente, registos que nos fazem recuar no tempo e trazer à estampa nacos de memórias inesquecíveis. Fomos combatentes na Guiné. 

Convivemos, no meu caso, com a guerra e a paz. Conhecemos o odor da desgraça. Vimos companheiros perderem a vida em plena juventude e a defenderem interesses alheios. 

Estropiados que sempre reclamaram uma maior justiça social. Outros que ainda coabitam com traumas psíquicos de um conflito que lhes quebrou uma vida saudável. Outros que tentam passar imunes a problemas mentais que sistematicamente lhes causam problemas no seio familiar ou na comunidade. 

Enfim, um rol de odores de um tempo sem tempo que desafiou gerações transversais e que nos obrigou a combater num conflito sem rumo. 

À minha Olympus, que continuo a guardar devotamente no baú da saudade, vai o meu muito obrigado. 

Um abraço, camaradas
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523

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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em:

27 DE ABRIL DE 2014 > Guiné 63/74 - P13052: Memórias de Gabú (José Saúde) (39): A guerra de além-mar 40 depois… Calar é resignar! 


Guiné 63/74 - P13405: Tantas vidas (Gil da Silva Duarte / Virgínio Briote) (2): As nossas mulheres: carta de uma mãe a Sua Excelência o Minstro do Exército, datada de 4 de fevereiro de 1963, intercedendo por um filho que acabava de ser mobilizado para o CTIG, depois de um outro ter sido morto em Angola, em 23 de abril de 1963...



Portugal > Finais dos anos 50 >  "Fotografia de mães e filhos, em finais dos anos 50, com a guerra já no horizonte. Todos esses rapazes foram para África: um para a Guiné, e dois para Moçambique, regressando um destes paraplégico".

Foto (e legenda): © Virgínio Briote  (2014). Todos os direitos reservados [Edição: L.G.]


1. Mensagem do nosso editor (jubilado) Virgínio Briote, e referência incontornável do nosso blogue, para o qual entrou na data já distante de 23/10/2005 (*):

Data: 16 de Julho de 2014 às 14:43

Assunto: As nossas Mulheres

 Caros Luís e Carlos,

Dei agora com uma carta que, naqueles tempos, me foi entregue em Brá. É evidente que os nomes estão omitidos, mas a carta é verdadeira. Devolvi-a ao filho da Senhora que a escreveu há pouco mais de meia dúzia de anos, estava a Mãe ainda viva! 

Anexo uma fotografia de mães e filhos, em finais dos anos 50, com a guerra já no horizonte. Todos esses rapazes foram para África. Um para a Guiné, e dois para Moçambique, regressando um destes paraplégico.

Um abraço do VB

[, Virgínio Briote, ex-alf il cmd, cmtd Gr Diabólicos, CCmds, CTIG, Brá, 1965/67: , foto à esquerda, c. 1965]


2. Carta ao Ministro do Exército

Exmo Senhor Ministro de Exército

Excelência,

Venho respeitosamente dirigir-me a Vossa Excelência expondo-lhe o seguinte.

Sou mãe do 2º Sargento Mil ..., morto em Angola, no Quitexe, em 23 de Abril de 1963. Após 22 meses (?) ao serviço da Pátria, o meu filho, que era a luz dos meus olhos lá se ficou.

Hoje tive conhecimento que outro meu filho, o 1º Cabo Mil ..., acaba de ser mobilizado para a Guiné, para onde parte no dia 9 deste mês.

Sou pobre, se não ia pessoalmente, de joelhos, pedir a Vossa Excelência que tenha pena de mim. Com a morte do meu ... nunca mais fui a mesma. Se há pessoas desamparadas da sorte, uma delas sou eu, perdi completamente o gosto por viver.

Não choro os meus filhos à Pátria, choro sim a sua morte quando vejo companheiros deles, depois de apurados, descerem aos hospitais militares e ficarem livres. Não ensino procedimentos destes aos meus filhos, custar-me-ia muito vê-los tomar atitudes idênticas.

Mas apelo ao coração, que presumo ser bom, de Vossa Excelência, que certamente também é Pai. A metrópole é também a nossa Pátria e o meu filho ficaria aqui a cumprir o tempo necessário e não mo mandaria para longe entrar em combates.

Há seis anos, o meu marido teve uma trombose. Vive, mas é um doente, e com tudo isto vejo agravar o seu sofrimento.

Não me convenço que meu filho…vá para tão longe. E pelos seus filhos, peço-lhe que mo deixe ficar. Vossa Excelência terá a certeza que eu terei mais meia dúzia de anos de vida, nunca mais de alegria, mas para melhor poder amparar o meu marido e meus filhos, para os quais sempre tenho vivido.

Julgo bater à porta de Deus e a Ele fico a pedir para que Vossa Excelência e Família tenham uma vida cheia de saúde e felicidade.

Respeitosamente de Vossa Excelência

Maria……

4 de Fevereiro de 1965.

3. Comentário de L.G.:

No passado dia 10, mandei ao VB a seguinte mensagem:

(...) Em boa forma ? È só para te recordar o desafio que te lancei há tempos, e reiterei em Monte Real, no IX Encontro Nacional da Tabanca Grande... Não nos sacas aí, do teu baú, uns tantos textos (meia dúzia...) para dar continuidade a esta série, "Tantas Vidas" ? !...

Estamos com 200 mil visualizações por mês... Vem o verão, e é preciso alimentar o blogue... sobretudo em agosto... Há muitos camaradas, "periquitos", que nunca tiveram oportunidade de ler o teu blogue Tantas Vidas (**), há muito desativado,,, Pensa também nesta malta,que está a chegar ao nosso blogue... Quando cá chegaste éramos meia dúzia de "tertulianos", hoje somos 662" (...).


A resposta não tardou, comunicando-me que o assunto não estava esquecido, e mandando-me duas colaborações, a começar por este texto que acima publicamos, o que vem reforçar a minha esperanção, e mais do que isso, convição de que os nossos leitores vão poder ter o privilégio de ler ou reler alguns dos melhores textos da série "Tantas Vidas" do Gil Duarte & Companhia... (Gil Duarte é uma espécie de "alter ego" do VB)...

(...) Os textos do Tantas Vidas? Nunca mais peguei neles, tenho-os arquivado no portátil, julgo que fiz a cópia total do blogue mas nem tenho a certeza de que o tenha copiado todo. No PC fiquei com alguns textos que copiei e antes de os publicarmos tenho que os voltar a ler, corrigir, ordenar e completar, uma vez que fechei o blogue em princípios de 2005! Mas podemos voltar a pegar no assunto. (...).

Por estes dias, o VB e a Irene estarão  de visita à "família americana" (filha, genro e netos), em Seatle... Desejo-lhes calorosos  encontros e que bons ventos os tragam de novo à doce casa e à querida pátria, como diria o grande Ulisses, o homérico  guerreiro que levou 10 anos da sua vida a regressar à sua amada Ítaca, depois da guerra de Troia.

4. Adenda posterior, do VB,  ao poste (com referência à carta e à foto):


Não fosse a pressa, a história para ficar completa devia tê-la contado assim: a carta foi certamente enviada para o ME que a deve ter remetido para o QG/CTIG. Aqui deve ter estado parada uns tempos até ter sido enviada para Brá, uma vez que era lá que se encontrava o filho (elemento do meu grupo) da Senhora que escreveu a carta. 

O então Cmdt da CCmds do CTIG entregou-ma em mão com a indicação "desenrasque-se" e que agisse em conformidade com o estado anímico e físico do referido militar. Muitos anos depois, 2002/03, quando estava em casa dos meus Pais a ver e limpar os papeis e fotos que tinha trazido de lá, dei com essa carta. 

Depois entrei em contacto com o meu antigo Camarada e combinei encontrar-me com ele e passei-lhe para as mãos a carta que a Mãe tinha escrito em 1965. Foi com as lágrimas nos olhos que reconheceu a letra da Mãe e me disse que ainda era viva.

Era assim que eu devia ter relatado este facto.
O meu irmão Rui é o pequeno da ponta esquerda da foto, de boné. Foi atingido por estilhaços de uma granada de morteiro que rebentou no parapeito do telhado sobre o qual se encontrava, no Chai, Macomia, em Junho de 1973, salvo erro.
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Guiné 63/74 - P13404: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XVI: A "sorte de um soldado", transmontano, que não sabia ler nem escrever quando foi incorporado (José Tomás Costa, sold at inf, 1º pelotão)


Guiné > região do Oio > Canjambari > CCAÇ 2533 (1969/71) > "Picagem até Jumbembem". Imnagem inserida a pág. 69, do livro "Histórias da CCAÇ 2533".






1. Histórias da CCAÇ 2533 > Parte XVI (José Tomás Costa, sold at inf, 1º pelotão):

Continuamos a publicar as "histórias da CCAÇ 2533", a partir do livro editado pelo ex-1º cabo quarteleiro, Joaquim Lessa, e impresso na Tipografia Lessa, na Maia (115 pp. + 30 pp, inumeradas, de fotografias). (*)

Registe-se, como facto digno de nota, que esta publicação é uma obra coletiva, feita com a participação de diversos ex-militares  (oficiais, sargentos e praças) da companhia.

A brochura  chegou-nos às mãos, em suporte digital, através do Luís Nascimento, que vive em Viseu, e que também nos facultou um exemplar em papel. Até ao momento, ele é o único representante da CCAÇ 2533, na nossa Tabanca Grande, apesar dos convites, públicos, que temos feito aos autores cujas histórias vamos publicando.

[Foto à esquerda: o ex-1º cabo cripto Luís Nascimento, em dia de chuva, em Canjambari, c. 1969/70]

Temos autorização do editor e autores para dar a conhecer, a um público mais vasto de amigos e camaradas da Guiné, as aventuras e desventuras vividas pelo pessoal da CCAÇ 2533, companhia independente que esteve sediada em Canjambari e Farim, região do Oio, ao serviço do BCAÇ 2879, o batalhão dos Cobras (Farim, 1969/71).

Desta vez publicamos  2 pequenas histórias, contadas pelo sold at inf José Tomás Costa, que foi ferido em combate já para o fim da comissão: (i) nós e as minas (p. 69); e (ii)  a sorte de um soldado (p.70)...
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terça-feira, 15 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13403: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (2): O meu Natal de 1965 em Bissorã, na casa do sr. Michel, bebendo whisky do bom... (Manuel Joaquim, ex-fur mil armas pesadas, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67)


Aerograma enviado pelo Manuel Joaquim à sua namorada: "Bissorã, 25 dez65" e onde fala sua festa de natal, oferecida à tropa,  pelo decano dos comerciante libaneses de Bissorã...

Foto: © Manuel Joaquim  (2012). Todos os direitos reservados. (Edição: L.G.)

1. Excerto de um poste do Manuel Joaquim (ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissau,Bissorã e Mansabá, 1965/67)(*)

Na noite de Natal de 65, o decano dos comerciantes libaneses, sr. Michel (**), acho que era este o seu nome, preparou uma recepção na sua casa, para a qual convidou os comandantes das companhias alocadas em Bissorã, CART  643 e CCAÇ  1419, seus oficiais e 1.ºs sargentos e sendo o restante pessoal militar representado por um furriel e por um praça de cada uma das companhias. Posso estar enganado,  mas é a ideia que tenho.

Da CCAÇ 1419 fui eu o furriel escolhido. Não sei se “de motu proprio” ou cumprindo decisão superior, o 1º sargewnto  da companhia fez-me o convite que eu aceitei, algo contrariado, após alguma insistência.

Para a ocasião vesti o meu fato “de ir à missa” comprado na  então famosa casa de moda da baixa lisboeta, a Casa Africana, uns dias antes de embarcar. “Ótimo para usar em África”, disse-me o vendedor em resposta à minha inicial informação de que estava prestes a embarcar para a Guiné e precisava de um fato para levar.

[Imagem à direita: Cartaz publicitário da eitinta Casa Africana, uma loja emblemática da Rua Augusta, em Lisboa]

E lá fui de fatinho azul-ténue, muito leve, com risquinhas verticais pretas e muito finas. A confraternização correu bem. Houve “comes e bebes” e muita conversa, geral e particular, entre os convidados e o dono da casa.

Recordo bem a qualidade do uísque, uma maravilha, do resto tenho noção vaga duma conversa do anfitrião discorrendo sobre as suas relações com personagens conhecidas na política e na sociedade empresarial, tanto na Guiné como em Portugal (no Continente, como então se dizia).

Não sei que idade teria o sr. Michel mas para mim era um homem já idoso, um senhor culto, bem viajado, bom conversador e de óptimo trato. Penso que teria sido, antes da guerra, um grande comerciante. Em 1965 a sua actividade comercial já estava muito reduzida.

Havia música mas não havia “garotas”! A animação não foi muita mas deve ter havido alguma já que o evento durou umas boas horas. O certo é que não me lembro dela. Talvez por causa do meu estado de espírito naquela altura como se pode adivinhar pela breve referência que fiz ao assunto num aerograma enviado à namorada:

(…) “Há por aqui umas famílias de emigrantes libaneses que nos proporcionaram umas festazinhas agradáveis na quadra que passou há pouco. Mas o sofrimento cá anda roendo a alma. E para muitos de nós a bebedeira foi a fuga. O whisky aqui é barato. Assim a bebedeira fica barata também.” (…)

Uma nota final: Interessante o lembrar-me ainda hoje da qualidade do uísque do sr. Michel e não me lembrar de muitas outras coisas mais importantes. Pensando bem, compreendo. Pois para quem andava afogando mágoas, eu por exemplo, curtindo alegrias e lavando o estômago com VAT69, J. Walker red label e outros deste género, encontrar e saborear o uísque do velho libanês foi um momento inolvidável. Aquilo não era uísque, aquilo é que era whisky!

Manuel Joaquim


Ferreira do Alentejo > Figueira de Cavaleiros > 25 de Setembro de 2010 > Jantar em casa do Jacinto Cristina   > Até à última gota de... uísque. Buchanan's, from Scotland, for the Portuguese Armed Forces... with love... Esta foi comprada em Bissau, em Junho de 1974, e aberta no nosso primeiro encontro, na festa de anos da filha do Jacinto, em Março passado. Na Guiné, aprendemos  a distinguir o bom "scotch whisky" do "uísque marado de Sacavém" que se bebia nas noites de Lisboa e arredores, nos anos 60/70,nos primeiros bares de alterne que apareceram...

Foto: © Luís Graça (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 21 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10839: Conto de Natal (9): O meu Natal de 1965 em Bissorã (Manuel Joaquim)

(**)  Vd. poste de 15 de julho de  2014 > Guiné 63/74 - P13400: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (1): Quem eram, onde viviam e trabalhavam, quando chegaram, etc. Propostas de TPC estival: factos, gentes, histórias, fotos...

Guiné 63/74 - P13402: Convívios (613): IX Encontro do pessoal da CART 3521, levado a efeito no passado dia 7 de Junho de 2014 (Henrique Castro)

1. Mensagem do nosso camarada Henrique Martins de Castro (ex-Soldado Condutor Auto, CART 3521, Piche, Bafatá e Safim, 1971/74), com data de hoje, 15 de Julho de 2014:

Camarada Vinhal.
Mais uma vez e pela última organizei, no passado 07/06/14, um convívio da CART 3521. Devido à atual conjuntura económica, ao falecimento de alguns camaradas e à falta de vontade de mais de 70% dos ex-militares em estarem presentes, estiveram 19 e as respetivas famílias, e apesar de no convite informar que tinha para oferecer 2 DVD, um com um filme feito por mim na Guiné e o nosso primeiro encontro e outro com 2 horas de gravação com o 1.º, 2.º, 3.º e 4.º encontros, o 7.º está gravado no Youtube, assim como o 9.º, estou desanimado e resolvi encerrar este ciclo.

Agradeço que publiques estas fotos no blogue e que escrevas também que o filme está no Youtube. Para ser visto basta escrever CART 3521.

Henrique Castro


Vídeo do IX Encontro do pessoal da CART 3521 alojado no Youtube

Bolo comemorativo do Encontro da CART 3521

O camarada Vieira e o Comandante da CART 3521

O casal Magalhães, sentados, e a esposa do Coimbra

 A viúva do falecido camarada Massarelos e a esposa do Henrique Castro
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Nota do editor

Último poste da série de 9 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13384: Convívios (612): Mais um Encontro da Magnífica Tabanca da Linha, dia 17 de Julho de 2014, em Cascais (José Manuel Matos Dinis)

Guiné 63/74 - P13401: Notas de leitura (612): "O Arauto" noticia a primeira ida para o ar da Emissora da Guiné, em meados de Março de 1953 (Lucinda Aranha)

1. Mensagem da nossa amiga tertuliana Lucinda Aranha, filha de Manuel Joaquim, empresário e caçador em Cabo Verde (1929/1943) e Guiné (1943/1973), com data de 10 de Julho de 2014:

Olá Carlos
1. Só hoje vi a recensão do Beja Santos ao art. de Teresa Montenegro e Carlos Morais sobre os Djumbai. É um assunto de que me falou há pouco tempo o Tony Tcheka e que me interessa para o livro que estou a escrever. Vou procurar a revista para tentar ler o art. na íntegra.

2. Estou muito interessada em saber o ano em que o Kumba Ialá veio para Loulé. Será que o Cherno Baldé me saberá dizer?

3. No decorrer das minhas investigações encontrei informações sobre os inícios da Emissora da Guiné. Não sei se vos interessa mas de qualquer modo envio-vos.

Lucinda


A Emissora da Guiné

A Emissora da Guiné foi para o ar, pela primeira vez, em meados de Março de 53. Funcionava então durante duas horas por dia com início às 20h30m. Tinha uma programação ambiciosa e bastante variada para o tempo que estava no ar a qual chegou a ser publicada com todo o detalhe diariamente pelo jornal da terra, O Arauto. Uma das rubricas de maior sucesso foi a de música de dança que está logo presente na programação do 1.º dia de emissão. A título de exemplo, transcrevo do jornal dois programas. O primeiro respeita ao dia 17 de Março, provavelmente o dia de abertura e o segundo ao dia 21 do mesmo mês.



1. Dia 17 de Março de 1953

NOVIDADES QUE INTERESSAM A TODOS PROGRAMA DA EMISSORA DA GUINÉ 
(20,30 h.— 22 h. / 51,37 m.)

20,33 h.— ORQUESTRAS LIGEIRAS:
Canaro—Luis Rovira—João Nobre—Artie Shaw
20,45 h.— PRIMEIRO NOTICIÁRIO
20,50 h. – Interpretações de Carlo Buti e de Lucienne Delyle
21,00 h. – MÚSICA DE CÂMARA: Quinteto em lá maior de Shubert
21,15 h. – CANÇONETISTAS PORTUGUESES:
Julia barroso—Tony de matos—Maria de Lurdes
F. José—Maria Clara—José António e Margarida Amaral
21,50 h.— MÚSICA PARA DANÇAR

2. Dia 21 de Março de 1953

UTILIDADES QUE A TODOS INTERESSAM
OUÇA HOJE NA EMISSORA DA GUINÉ
(20,30 h.—22 h. /51,37 m.)

20,33 h. – Cançonetas americanas:
Dany Kay and his sisters; Dorothy Squires;
Paul Rbeson; Bing Crosby.
20,45 h. – PRIMEIRO NOTICIÁRIO
20,50 h. – Artistas Italianos:
Emilio Levi; Carlo Butti; Tito Scippa; Caruso.
21,00 h. – O artista da Semana. MARIA DE LURDES
Alcobaça; Leiria; Mulher Pequenina;
Moleirinha; Rosinhas de Toucar.
21,15 h. – SEGUNDO NOTICIÁRIO
21,25 h. – Música Variada:
Ana Mª Gonzalez; G. Boulanger; Mª Clara;
Tino Rossi; Manuel Monteiro e outros.
21,50 h. – Música de dança
22,00 h. – HINO NACIONAL e Fecho da Estação.

Na data do seu décimo aniversário, segundo O Arauto de 15 de Março de 63, a emissora duplicou o seu tempo de emissão diário. Cresceram então as expectativas, havendo quem defendesse que se devia optar por programas ao vivo, inspirados nos modelos metropolitanos de modo a fazer despertar vocações na rádio. Sonhou-se com o teatro radiofónico, com um concurso de revelações, tipo programa de variedades com conjuntos e artistas locais, com um prémio votado pelos ouvintes e patrocinado pelos anunciantes. De forma não inocente, motivada pela conjuntura de guerra, houve quem propusesse a abertura diária da emissão com uma gravação do hino nacional tocado por instrumentistas mandingas ou fulas como já acontecia em Moçambique com os tocadores de marimba de Zavala. Também a guerra da libertação explica a propaganda veiculada pela Emissora Nacional com início nesse mesmo ano de 63. Mensalmente, passou a transmitir o programa A Presença da Guiné de produção da Emissora Provincial. Deste modo, os portugueses da metrópole ficariam a conhecer a labuta e o empenho dos «seus irmãos da Guiné Portuguesa» nas palavras do governador Vasco Rodrigues.

Lucinda
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13398: Notas de leitura (611): "Estados de Alma: cem sonetos de vida e amor", por Tomás Paquete (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P13400: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (1): Quem eram, onde viviam e trabalhavam, quando chegaram, etc. Propostas de TPC estival: factos, gentes, histórias, fotos... precisam-se!

1. Amigos e camaradas da Tabanca Grande e demais leitores:

Estamos já em plena "época estival" e o blogue ressente-se da falta de colaboração... O Carlos Vinhal costuma queixar-se, nesta altura do ano, de ter pouco trabalho... Por outro lado, em agosto  o blogue, as férias e a praia são três coisas que não combinam bem... Eu, LG,  ainda estou no ativo e vou tirar férias em agosto (altura em que o meu estaminé fecha, parcialmente, durante 2 semanas...).

À boa maneira dos senhores professores, vamos  pedir-vos  um TPC, trabalho de casa, para alimentar o blogue durante a canícula... O tema é: "Os libaneses da Guiné"...

(i) Uma questão interessante é a de se saber quantos libaneses viviam na Guiné, antes e durante a guerra colonial (1963/74); .

(ii) Algumas famílias terão ficado por lá mesmo depois da independência, ou emigraram, para lá a seguir; se sim, quantas ? onde ? [Lemos, numa reportagem do jornal Expresso, de 2006, que seriam uns 200, a maior parte concentrados em Bissau];  (*)

(iii) Do nosso tempo estão sinalizados (ou têm sido referidos)  alguns comerciantes libaneses, ou de origem libanesa, em Bissau, Bafatá, Xitole, Gondomar e outros sítios:

(a) Bissau > Na baixa, havia as lojas do Taufik Saad, do Azis Harfouche, do Mamud el Awar;

(b) Bafatá > As "manas libanesas";

(c) Xitole > Jamil Nasser;

(d) Nova Lamego > (?)

(e) Bissorã > (?)

(f) Teixeira Pinto / Canchungo > (?)

(g) Xime > Amin (?)

(h) Gondomar > Regala (?)

(i) Catió > ?

(j) Piche > Taufick ?

(iv) Não há estatísticas... Ou há ?  De qualquer modo, a diáspora libanesa é já muito antiga, e remonta aos seus antepassados fenícios que chegaram à nossa costa, atlântica,  muitos séculos antes de Cristo... Calcula-se que, para uma população atual de 4,4 milhões a viver no Líbano [, "Lebanon", em inglês], haja o dobro ou o até o triplo de libaneses, ou seus descendentes, pelo mundo fora, com destaque para o Brasil (5 a 7 milhões), a Argentina, os EUA,a Venezuela, a Austrália, etc. Mas também países árabes, África ocidental francófona (Costa do Marfim, Senegal, Guiné-Bissau...).

(v) Antiga colónia ou protetorado francês, depois da desintegração do império otamano, o Líbano alcançou a independência em 1943; as tropas francesas sairam de lá em 1946; e  a emigração para a África Ocidental francófona deve ser dessa época, ou até anterior (antes e depois da I Guerra Mundial); em geral, são cristãos, mas também muçulmanos xiitas, os que emigram, e são reconhecidos como uma comunidade próspera e influente, de gente que se dedica ao comércio (veja-se  o caso do Brasil);

(vi) Quando é que os libeneses começaram a vir para a Guiné ? [O Expresso diz que foi há mais de 120 anos] (*);

(vii) Não sei se o Joaquim Mexia Alves e outros camaradas que privaram com o Jamil Nasser (**), no Xitole, têm alguma informação sobre a história da família, sua chegada à Guiné, etc.

(viii) Alguns foram nossos camaradas como o cap grad comando Zacarias Saiegh, por exemplo, tendo começado como fur mil do Pel Caç Nat 52,antes e ingressar na 1ª CCmds Africanos.


2. Quem quer dar uma ajudinha para este TPC coletivo ?

Boas férias para quem for de férias, bom descanso para quem ficar em casa... Passear, a pé, é importante... Mas também conviver, pensar, ler, escrever... e blogar!

Um abraço (ativo, produtivo, saudável, camarigo...) para todos. Luís Graça, Carlos Vinhal e demais equipa.
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Notas do editor:

(*) Vd. excerto de reportagem, Expresso, de 7/972006 (Os libaneses na actual  Guiné-Bissau")

(...) O cônsul do Líbano em Bissau, o comerciante Hassib el Awar, garante que os "sirianus" – como eram conhecidos os libaneses antes da independência da Guiné-Bissau – estão cá há pelo menos 120 anos. Este druzo de 73 anos, natural da região de Baabda, no centro do Líbano e a 40 quilómetros de Beirute, sabe do que fala. Chegou à ex-Guiné Portuguesa em 1949, para trabalhar com o tio, de quem herdou a "Casa Mamud el Awar", loja que ainda hoje conserva o mesmo nome.

Hoje, o cônsul tem um registo de apenas 200 libaneses. Mas supõe-se que são muito mais, na maioria muçulmanos, xiitas. Discretos, por vezes, não hesitam em exibir as suas preferências políticas, como durante o recente conflito com Israel, em que o restaurante "Ali Baba", em Bissau ostentou um retrato de Hassan Nasrallah, líder do Hezbollah.

Os irmãos Mazeh, xiitas, instalados a partir dos anos 90, abriram a primeira fábrica de espuma da capital guineense, onde está o grosso dos libaneses. Mas ainda há um punhado de comerciantes nas regiões. É o caso de Abibe Fares, ex- colaborador do general Aoun, que vive em Bissorã, no Norte. Outro apoiante do líder cristão, Ghassam S. Makarem, um famoso jornalista, explora duas papelarias em Bissau.

As diferenças confessionais não impedem a comunidade de coabitar. Em Julho, cristãos e muçulmanos organizaram uma marcha de protesto contra a ofensiva israelita no sul do Líbano. Mas difícil é manter a associação local, que apenas funcionou um ano.(...)


(**) Vd. poste de 8 de julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13378: No 25 de abril eu estava em...(24): Xitole, e foi o comerciante libanês Jamil Nasser quem me deu a notícia, ouvida na BBC, na sua emissão em árabe (José Zeferino, ex-alf mil at inf, 2ª CCAÇ / BCAÇ 4616, Xitole, 1973/74)

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13399: Efemérides (164): O Ramadão de 1970 em Paunca (Abílio Duarte, ex-fur mil art, CART 2479 / CART 11, Os Lacraus, Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paunca, 1969/70)









Guiné > Zona Leste > Setor L6 (Pirada) > Paunca >  CART 2479 / CART 11 (Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/71) > Cerimónia do Ramadão de 1970 em Paunca. Nesse ano o Ramadão começou a 31 de outubro e terminou a 30 de novembro.

Fotos: © Abílio Duarte (2014). Todos os direitos reservados. (Edição:  L.G.)

1. Está a decorrer desde 29 de junho e vai  até 28 de julho, no mundo ilsâmico, a festa do Ramadão, o  nono mês do calendário muçulmano, durante  o qual os crentes praticam o seu jejum ritual,   um dos cinco pilares do Islão.

A palavra Ramadão vem do árabe "ramida", “ser ardente”,  palavra talvez associada ao facto de o Islão ter celebrado este jejum pela primeira vez no período mais quente do ano. Em termos simples, para um crente é um tempo cracterizado por : (i)  renovação da fé; (ii) prática mais intensa da caridade; (iii) vivência profunda da fraternidade; (iv) reforço  dos valores da vida familiar; (v) aior proximidade aos valores sagrados; (vi) leitura mais assídua do Alcorão; (vii)  freqüência da mesquita; (viii) correção pessoal e autodomínio.

No Alcorão, é  o único mês  que vem mencionado pelo nome. É o  mês em que foi revelado o Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos.

Durante a guerra colonial, os preceitos deste mês (e nomeadamente o jejum durante o dia)  era escrupulosamente respeitado pelos nossos soldados muçulmanos do recrutamente local, e pelas milícias, e muito possivelmente pelos guerrilheiros do PAIGC que eram islamizados (caso dos beafadas, mandingas, fulas, nalus, balantas manés...). Mas em geral os nossos graduados (a começar pelos oficiais) não tinham grande sensibilidade para o problema, e sobretudo para o potencial conflito entre a exigências da atividade operacional e as restrições alimentares impostas pelo  Ramadão.

Na CCAÇ 12, o jejum era respeitado, tanto quanto me lembro pelos nossos soldados. Ainda este ano, durante o Campeonato Mundial de Futebol, se levantou de novo a polémica sobre a religião e o futebol, a propósito da seleção nacional argelina de futebol, por causa da imposição do jejum durante o Ramadão, incompatível, em princípio, com a prática da alta competição desportiva.

2. Publicam-se em cima fotos do Ramadão de 1970,  em Paunca, na zona leste,, uma ceriomónia que era seguida à distância, com respeito e curiosidade, pelos militares portugueses metropolitanos.

As fotos são do Abilio Duarte [ex-fur mil art, CART 2479 (que em janeiro de 1970 deu origem à CART 11, Os Lacraus, que por sua vez em junho de 1972 passou a designar-se CCAÇ 11), Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paunca, 1969/70; bancário reformado). Foram enviadas em 12 do corrente com a seguinte nota:

(...) "Nesta época de Ramadão, junto te envio umas fotos que tirei em Paunca no Ramadão de 1970. Nestas cerimónias esteve presente um alto dignitário, e que,  segundo me disseram, viera da Mauritânia, e andou naquele períoao do, pelo Senegal e terras do Leste da Guiné, em actividade religiosa.

"Não te incomodo mais, e mais uma vez os meus agradecimentos pela existência do Blog."

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Nota do editior:

Último poste da série > 12 de junho de 2014 > Guiné 63/74 - P13273: Efemérides (163): O 10 de junho de 2014 em Belém, Lisboa... Um dos fotógrafos da Tabanca Grande estava lá (Jorge Canhão)

Guiné 63/74 - P13398: Notas de leitura (611): "Estados de Alma: cem sonetos de vida e amor", por Tomás Paquete (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Janeiro de 2014:

Queridos amigos,
Tomás Paquete tem nas veias sangue guineense, cabo-verdiano e são-tomense, nado e criado em Lisboa, assumiu depois as suas origens africanas e partiu para a Guiné-Bissau.
Como funcionário das Nações Unidas tem corrido Seca e Meca e Olivais de Santarém, ásias, américas e áfricas.
A sua poesia não é rotulável, é quase académico, oscila entre o gosto popular e o romantismo desabrido. Uma poesia cosmopolita de quem calcorreou muito mundo e descobriu as âncoras do amor e as desvela, com alegria e exaltação.

Um abraço do
Mário


Estados de Alma: Cem sonetos de vida e amor

Beja Santos

Tomás Paquete apresenta-se como produto da multiculturalidade lusófona, filho de pai guineense, mãe cabo-verdiana e avô paterno são-tomense. Nasceu em Lisboa e passou a juventude entre a Amadora e a capital. Frequentou os liceus Pedro Nunes e Passos Manuel e as Oficinas de São José. Foi funcionário do Instituto Nacional de Estatística e partiu para a Guiné-Bissau depois de assumir as suas origens africanas, foi professor e depois diretor-adjunto do Internato Domingos Ramos, no Boé. Foi seguidamente produtor e chefe do departamento de produção da Rádio Nacional da Guiné-Bissau. Participou na primeira antologia poética da Guiné-Bissau, “Mantenhas para Quem Luta”, 1977, tem vasto currículo ao serviço das Nações Unidas.

“Estados de Alma” é o seu primeiro livro de poesia. Como prefacia António Soares Lopes Jr. (Tony Tcheka), este livro marca a rotura do poeta com o passado, este conteúdo de sonetos medularmente românticos nada tem a ver com a longa luta de libertação nacional, é uma extensa e avassaladora crónica de amor, escrito por vezes num ritmo febril, por vezes mais distenso, elegíaco, temente das perdas desses amores, lançando apelos confessionais, desculpando-se, sofrendo, vitoriando as coisas do amor.

Sempre 14 versos, sonetos que cuidam da rima, métrica rigorosa. Um português castigado, depurado, saltitando entre o gosto popular e o evanescente ultrarromantismo, sem tibiezas. Assim, um poeta raro, indiferente à escola, ao estilo castigado, ao pendor académico. Poesia de consagração, de concelebração, de cântico da dor, de promessa, de registo da mulher que transformou a existência do poeta, ode à sensualidade, pranto na hora da despedida, registo da angústia nos diferentes momentos da incerteza. Fala-se do amor mulato, dos tons mate, da sensaboria do amor vertigem, curtíssimo. Trata-se de uma longa crónica de amor e de alguém que buscou e encontrou um porto de abrigo, que faz confissões ao Tejo, que tem nostalgia das ruas de Lisboa, que lança promessas e que se despede com versos feitos vida, com esta delicadeza e esta intemporalidade:

Vieste num belo formato, nada pequenina,
lembra-me o galão do mata bicho, morena.
Pele delicada em porcelana, tal loiça da china,
que até o tocar-te, não vás partires-te, me dá pena.

Vestida ou não em roupa muito ou pouco fina,
tens sempre um porte real e a voz amena.
E ao teres sido assim pensada e criada, menina,
ao teu corpo só poderiam ter dado uma alma divina.

A água de dois rios famosos fizeram-te, soberana
e quantas esperanças desfeitas, de quem queria
ocultar a beleza, que é, do Nilo e Tejo, a predileta.

Se tudo em ti, é tão sublime, apesar de humana,
espero que percebas, que és a minha única moradia,
e que um dia, transformes os versos, na vida, deste poeta.

Tomás Paquete apresenta-se assim numa toada vibrante, a pulsão é mesmo a paixão ardente. Vale a pena regressar a Tony Tcheka e ao que ele pensa destes estados de alma: “Descortina-se por entre as palavras rimadas, eivadas de estética e ternura, uma musa inspiradora à qual o autor também dedica muitos dos textos escritos num hiato de dois anos. Outros motivos vão aparecendo à medida que a esteira de sentimentos se alarga e abrange outros espaços físicos e geográficos. Ainda quando fala de lagos, rios e montanhas que foi conhecendo por esse mundo fora, é o amor sublime aos cantos”. Ingénuo nesta sua vivacidade de contar, atento à melodia dos sons, este seu livro é a exaltação pelo amor descoberto, nada mais que a vida e o amor se atravessam nesta poesia simples e calorosa.
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Nota do editor

Último poste da série de 11 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13389: Notas de leitura (610): "Exploradores Portugueses e Reis Africanos, Viagens ao Coração de África no Século XIX", por Frederico Delgado Rosa e Filipe Verde (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P13397: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (26): O Honório que eu conheci em Angola e em Cabo Verde (Albertino da Silva, West Palm Beach, Florida, USA, antigo piloto dos TACV, em 1979/80)

1. Mensagem do nosso leitor, residente em WestPalm Beach, Florida, EUA, Albertino Dasilva

Data: 13 de Julho de 2014 às 07:14

Assunto: O Piloto Honorio...

Hoje li um boletim no www.barrosbrito.com, acerca do Piloto Honório [Brito da Costa, nascido na Praia, Cabo Verde, em 28/8/1941; foto à direita, cortesia da página do da família Barros Brito ](*).

O Honório era mulato. Filho de um advogado preto de Cabo Verde. A sua mãe era branca, não sei se nascida na cidade da Praia.

Eu conheci a mãe do Honório.

Eu fui Piloto dos TACV [, Transportes Aéreos de Cabo Verde,] cerca de dois anos (em 1979 e1980). Eu tenho agora 68 anos. Vim de Angola e foi em Luanda que conheci o Honório quando ele saiu da Força Aérea. O Honório fez pulverização aérea nas fazendas de Malange... e depois trabalhou nos Táxis Aéreos em Luanda até à  Independência; tendo regressado a Cabo Verde com medo do MPLA.

Quando chegou a Cabo Verde, o Governo inicial da Independência que tinha um ramo associado aos cubanos, mandou prender o Honório. Pois era um Governo do PAIGC contra o qual o Honório bombardeou na Guiné.

Depois de largos meses na prisão, a sua mãe que por acaso era amiga do Presidente Aristides Pereira (PAIGC),  lá conseguiu que o Honório fosse libertado e depois de uma recuperação de longos meses ele foi admitido nos TACV.

O piloto Alexandre Pina Ferreira, que foi colega do Honório na Força Aérea (neste caso,  em Angola) deu-lhe a mão e ajudou o Honório a entrar na companhia.

Em Luanda éramos todos amigos e sempre prontos aos copos... lá no Baleizão... e uns valentes churrascos com bom vinho e cerveja,  não esquecendo as mulatas bonitas que por lá andavam...
Pois eu também era piloto em Angola e o Alexandre Ferreira também me chamou para trabalhar nos TACV, onde estive 2 anos.

Depois disso vim para os EUA e aqui estou há 32 anos, agora reformado na Flórida.

Tenho um filho (Paulo da Silva) que agora voa nos 777 da US Airways (International).

Soube que o Honório teria morrido antes de 1990. E também o Alexandre Ferreira se passou [...].

Claro que o Honório ainda era meio maluco lá na cidade da Praia. Eu fui co-piloto de alguns voos onde ele era comandante. Confesso que não era nada fácil entendê-lo [...].

Na Praia, quando eu lá estive, assisti a várias palhaçadas...
O Honorio tinha um cão Pastor Alemão... como ele se esquecia de dar comida ao cão, o bicho ia definhando lentamente... E um dia o cão morreu mesmo. O Honório sai-se com esta: 
- Então agora que ele se habituou a não comer é que morre ?!... Tenho que treinar outro cão...

Havia muitas histórias do Honorio lá na Praia.

Ele tinha um feitio que não se explica muito bem... Foi o único filho e muito mimado. Depois deixou Cabo Verde para ir para a Escola Agrícola. Como sabemos, la há bom vinho e presunto... Pois também se contam muitas histórias da sua estadia lá em Santarém...

Pois se esta informação pode ser acrescentada lá na sua página,  pode elucidar alguma gente do tempo da guerra. Mas não ponha lá esta história toda...

Albertino da Silva
West Palm Beach, Florida, USA
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Nota do editor:

Último poste da série > 16 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12306: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (25): O Honório e a minha cabeçada no painel de instrumentos, no T6, que fazia a proteção à coluna logística que ia para Beli... (Vítor Oliveira, ex-1º cabo melec, BA 12, Bissalanca, 1967/69)