segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13806: Notas de leitura (645): “Cidade e Império, Dinâmicas coloniais e reconfigurações pós-coloniais”, organizadores Nuno Domingos e Elsa Peralta, Coleção História e Sociedade, Edições 70 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Março de 2014:

Queridos amigos,
Temos aqui uma visão sequencial do desenvolvimento urbano de Luanda e Lourenço Marques, mas os olhares dos historiadores, sociólogos e antropólogos convocados nesta publicação vão do antes ao depois, há um estudo interessantíssimo sobre o que se passou no norte de Angola a seguir aos acontecimentos de 1961, quando se tratou do planeamento urbanístico para os milhares de foragidos que entretanto regressaram; e há a Lisboa dos anos 1940 e 1950 e 1960, A Casa dos Estudantes do Império, o impacto da cidade nesses africanos já tocados pela ideia independentista e pan-africana; e o depois do termo do império, o modo como os guineenses procuraram vínculos de pertença na área metropolitana de Lisboa.
Muito interessante.

Um abraço do
Mário


As cidades do Império Português e depois

Beja Santos

O livro intitula-se “Cidade e Império, Dinâmicas coloniais e reconfigurações pós-coloniais”, os organizadores são Nuno Domingos e Elsa Peralta, Coleção História e Sociedade, Edições 70, 2013. Reúne estudos de historiadores, antropólogos, especialistas em estudos pós-coloniais e outros cientistas sociais. Os organizadores explicam o objetivo da obra: “O estudo do urbano permite identificar o modo como a dinâmica de urbanização colonial e pós-colonial no espaço português se integra num conjunto de tendências que acompanha o sistema-mundial (…) As cidades coloniais constituem-se como centros de administração e de poder colonial e como locais de fluxo e bens e serviços. São importantes locais de transferência da cultural imperial e capitalista moderna para novos espaços. Não obstante, o urbano colonial e pós-colonial governado por Portugal foi e é também um espaço de criação de autonomias, de projetos e resistências, de circulação de pessoas, hábitos, ideias, de apropriação e adoção de práticas e representações”. Em sequência, o autor encontrará o estudo de cidades africanas do colonialismo português, as lógicas do ordenamento do território e da integração social, cidades com um centro europeu ou “civilizado” e uma grande e precária periferia, o típico universo africano. Os organizadores observam que “A influência política de outras potências coloniais, bem como de organizações internacionais, sobre o rumo do colonialismo português, a presença de inúmeros estrangeiros no quadro de decisão institucional económica e política e a influência dos quadros económicos regionais revelam que o colonialismo era um projeto global. As redes urbanas africanas, as que ligavam, por exemplo, Moçambique e Angola à África do Sul, à Rodésia ou ao Congo, criaram autonomias próprias que reproduziam o ritmo do colonialismo internacional”. Mas a experiência imperial teve uma poderosa ressonância no tecido metropolitano, basta pensar nos importantes fluxos migratórios e no pós-colonial emergiu uma cultura nostálgica, há imigrantes cabo-verdianos, angolanos, guineenses e são-tomenses, sobretudo, temos hoje uma cidadania lusófona e nas cidades pós-coloniais replicam-se formas de organização que recordam o sistema colonial urbano. A memória imperial tem mais significado do que muitos pensam, envolve narrativas como o Mosteiro dos Jerónimos, o Padrão dos Descobrimentos, a Expo 98, por exemplo.

Os investigadores que intervêm neste livro asseguram capítulos sobre a presença portuguesa em África no século XX, caso de Luanda e Lourenço Marques; fala-se da reação portuguesa aos levantamentos no Norte de Angola, em 1961, e, como escrevem os organizadores “Dos relatórios políticos e administrativos, emerge uma conceção estatal das populações locais. Enuncia-se a lógica do exercício político que junta a coerção e a violência a técnicas de urbanização, de reordenamento do território e de povoamento”; fala-se de Mueda, no Norte de Moçambique, sobre o que sobrou das antigas cidades da Índia portuguesa no final do século XIX, a partir do olhar de um historiador goês estabelecido em Bombaim. Noutro ângulo, impõe-se olhar para Lisboa onde, a partir da década de 1940, onde se juntou um grupo de estudantes das colónias africanas. Escreve-se o seguinte: “O espaço criado pelo Estado Novo para formar elites coloniais, a Casa dos Estudantes do Império (1944-1965) foi para estudantes, tais como Mário Pinto de Andrade, Alda Espírito Santo, Eduardo Mondlane, Agostinho Neto, Noémia de Souza e Amílcar Cabral, o local de maturação de um conjunto de ideias sobre a condição dos seus territórios e populações. A Lisboa triste do salazarismo surgia para estes jovens como uma zona de contacto, um espaço moderno de leituras e partilhas. A geografia da cidade ficou marcada por um conjunto de percursos africanos, de encontros políticos, consumos literários e trocas teóricas que circulavam por cidades europeias: a negritude, o pan-africanismo, o marxismo, o nacionalismo. No coração do Império colonial português, mau grado as diferenças que os separavam – a origem, a cor da pele, a classe social – os estudantes discutiram o futuro do continente africano que dispensava tanto a soberania portuguesa como a dos outros Impérios coloniais”.

E chegamos à Lisboa contemporânea, a partir de 1975 o legado do poder colonial passou a ser manifestamente visível nas pessoas, nos restaurantes, nos novos hábitos, nos alimentos importados. São populações emigrantes que procuram adaptar-se e conquistar o seu lugar na cidade, trazem saberes e procuram avidamente a coesão étnica ou a imisção sem complexos, nasceram barracas, procedeu-se à autoconstrução, organizaram-se guetos, estabeleceram-se ágoras, os guineenses podem ser vistos a qualquer hora do dia no largo de S. Domingos. Bairros degradados tornaram-se nos espaços de acolhimento desses novos migrantes.

Enfim, o leitor parte pelas construções coloniais, visita as casas angolanas e aprecia a atitude colonizadora em diferentes regiões, pode comparar com as habitações destinadas aos funcionários coloniais, apreciar a evolução da arquitetura angolana; segue-se Lourenço Marques, também uma cidade segregada com os seus organismos e o seu sistema de coerção; os acontecimentos de 1961, no Norte de Angola, dão azo a perceber como o regime se viu obrigado a criar novos mecanismos de controlo da vida social indígena, assistia-se ao retorno inesperado de milhares de africanos “das matas”, havia que estabelecer uma nova política habitacional e de vigilância. O leitor não ficará insensível à visita ao Império Português da Índia na segunda metade do século XIX, é uma viagem espantosa, a que nos proporciona o goês Gerson da Cunha. Lisboa, ao tempo da Casa dos Estudantes do Império, é um local de encontros que irão preparar as lutas de libertação, aqui se adquiriu consciência de que estavam a germinar sonhos nacionais e afiliações transnacionais, dois nomes sonantes do independentismo, Mário Pinto de Andrade e Amílcar Cabral, aparecem por Lisboa, aqui debatem com os outros a luta que os espera. E daqui partem para outros lugares: Mário Pinto de Andrade e Marcelino dos Santos irão até Paris, Lúcio Lara e Viriato da Cruz até a Alemanha, Cabral circulará por Londres, irá até ao Norte de África e daqui partirá para Conacri, todos estes dirigentes se irão encontrar temporariamente em Argel, Rabat, Cairo, Adis-Abeba, Tunes, Acra ou Dar es Salam. E chegada a independência, cresceu a diáspora, o leitor irá encontrar várias ideias de África em Lisboa, por exemplo, vivências habitacionais como em tabancas, surgirá o fenómeno da “barraca pós-colonial”. Está concluído o ciclo à volta da cidade como objeto de investigação desde as sociedades coloniais até ao desabamento nas metrópoles em contextos pós-coloniais. Um estudo profundo, original, que seguramente catapultará novos estudos. Magistralmente organizado e de uma inegável polivalência para os estudos sobre o Império português e o depois.
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Nota do editor

Último poste da série de 24 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13793: Notas de leitura (644): "O Mundo em AZERT - cadernos de um repórter”, por Cáceres Monteiro, edições O Jornal e Círculo de Leitores, 1984 (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P13805: A propósito de paludismo... Ou melhor, do sezonismo, que era o termo que tradicionalmente se usava entre nós, na metrópole, até finais dos anos 60 (Parte I) (Luís Graça)


Portugal > Direção-Geral de Saúde > Instituto de Mariologia > Cartaz nº 1

Portugal > Direção-Geral de Saúde > Instituto de Mariologia > Cartaz nº 2


Dois cartazes da Direção  Geral de Saúde, dos anos 40, 
que integravam uma campanha de luta contra o sezonismo (ou malária).

Fonte: Cortesia de  © INSA > Museu da Saúde (2014)  [Edição: LG]



Estação para o Estudo do Sezonismo, Águas de Moura, Palmela, anos 1930

Fonte: Cortesia de © INSA > Museu da Saúde (2014) [Edição de LG]


1. O paludismo, a malária ou o sezonismo eram endémicos em Portugal até aos anos 60, nomeadamente na regiões onde se cultivava o arroz, do Mondego até ao sul ... Não era uma doença estritamente tropical!... Hoje está erradicada em Portugal  (bem como no sul da Europa) mas, com as alterações climáticas a nível mundial, nada nos garante que não venha a ser, outra vez, um problema de saúde pública, daqui a algumas décadas...

Num  artigo meu, de 1999, sobre a História da Saúde e Segurança no Trabalho: 1.2. O Embrionário Desenvolvimento da Saúde Pública no Portugal Oitocentista [, disponível aqui, n aminha página profissional, Saúde e Trabalho, ] escrevi o seguinte:

(...) Menos mortíferas, mas com efeitos igualmente nefastos no nível de saúde das populações, eram as febres intermitentes (ou sezonismo), geralmente associadas à malária ou paludismo, nas regiões onde se praticava a cultura do arroz (bacias hidrográficas do Mondego, do Tejo, do Sado, vale do Sorraia, etc.) bem como ao tráfico de escravos africanos.

Em 1851, J. F. Henriques Nogueira escrevia sobre este mal endémico o seguinte: "Quem há que não conheça os estragos que em mais de metade do nosso país produzem as febres intermitentes ou sezões ? Povoações temos onde na queda do Estio só aparecem rostos magros e macilentos, e pobres doentes, embrulhados em mantas e estirados ao sol (...).

"Dê-se água de boa qualidade às povoações sequiosas, e onde a não houver filtre-se cuidadosamente. Encanem-se os rios; sangrem-se os charcos e pauis: cubra-se de arvoredo o terreno, que se enxugar - e por este modo, com que bastante lucra a agricultura, ter-se-á convertido em salubre, ou incomparavelmente menos doentia uma localidade sezonática" (In: Estudos sobre a Reforma em Portugal, 1851) (...)


Em conclusão: o termo sezonático já era usado, em 1851. E em 1903 há uma referência explícita ao "sezonismo" como matéria ensinada no curso de medicina sanitária, criado em 1903, no ãmbito da reforma da saúde pública em Portugal (1899-1901), liderada por Ricardo Jorge.(1858-1939).

2. Vejamos o que dizem os dicionários:
sezonismo | s. m.

s e·zo·nis·mo (sezão + -ismo) > substantivo masculino  > Doença infecciosa causada por parasitas do sangue do género Plasmodium, transmitida ao homem pelo mosquito anófele, que se manifesta geralmente por sezões. = IMPALUDISMO, MALÁRIA, PALUDISMO

"sezonismo", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam.pt/DLPO/sezonismo [consultado em 26-10-2014].


Sezão | s. f.

se·zão  > substantivo feminino > Acesso de febre, intermitente ou periódica, precedido de frio e de calafrios.Confrontar: sazão.

"sezão", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, http://www.priberam.pt/DLPO/sez%C3%A3o [consultado em 26-10-2014].



Capa de um precioso folheto da DGS - Direção Geral de Saúide, do ínício dos anos 70, guardado pelo nosso camarada António Tavares [ex-fur mil, CCS/BCAÇ 2912,Galomaro, 1970/72]... O seu processo na subdelegação de saúde de Gondomar, nos Serviços de Higiene Rural e Defesa Anti-Sezonática (sic) era o nº 155/4/72.  Em março de 1972,  o Tavares regressou da Guiné e em abril teve paludismo, o que o levou a consultar aqueles serviços de saúde (*).

3. O termo sezonismo  é usado pelo legislador, em vez de malária ou paludismo, até aos anos 60:

Portaria n.º 18143 

[ Reproduzido, com a devida vénia, do sítio Legislação.org]

Diário da República > Ministério da Saúde e Assistência
Quarta-feira 21 de Dezembro de 1960
294/60 SÉRIE I ( páginas 2798 a 2798 )

TEXTO :

Portaria n.º 18143
Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Saúde e Assistência, aprovar, em seguimento da proposta da Direcção-Geral de Saúde, nos termos do n.º 1 da base IX da Lei n.º 2036, de 9 de Agosto de 1949, e depois de ouvido o Conselho Superior de Higiene e Assistência Social, a seguinte tabela das doenças contagiosas de declaração obrigatória:

1 - Ancilostomíase.
2 - Bilharzíase.
3 - Brucelose (febre ondulante).
4 - Carbúnculo.
5 - Cólera.
6 - Difteria.
7 - Disenterias bacilar e amebiana.
8 - Encefalite infecciosa aguda.
9 - Escarlatina.
10 - Espiroquetose ictero-hemorrágica.
11 - Febre-amarela.
12 - Febres recorrentes.
13 - Febres tifóides e paratifóides.
14 - Hepatite epidémica.
15 - Kala-azar.
16 - Lepra.
17 - Meningite cerebrospinal.
18 - Peste.
19 - Poliomielite.
20 - Psitacose humana.
21 - Raiva.
22 - Sezonismo.
23 - Sodoku.
24 - Tétano.
25 - Tifo exantemático e outras ricketsioses.
26 - Tosse convulsa.
27 - Tracoma.
28 - Tuberculose do aparelho respiratório e outras formas de tuberculose.
29 - Varíola (ou variolóide) e alastrim.
30 - Doenças venéreas em período de contágio: sífilis, blenorragia, cancro mole, linfogranuloma (doenças de Nicolas-Favre).

A presente tabela entrará em vigor em 1 de Janeiro de 1961 e substitui a que foi publicada pela Portaria n.º 16523, de 27 de Dezembro de 1957. A declaração é obrigatória tanto em casos de doença como nos casos de óbito.

Ministério da Saúde e Assistência, 21 de Dezembro de 1960. - O Ministro da Saúde e Assistência, Henrique de Miranda Vasconcelos Martins de Carvalho.

4. Cartazes da Direção-Geral da Saúde [, DGS,] , início da década de 1940

Dimensões: A. 80,50 cm x L. 60,50 [Vd., as duas primeiras imagens acima]

O Instituto de Malariologia [. criado em 1938, em Águas de Moura, a que ficará para sempre ligado o nome do prof Francisco Cambournac, 1903-1998]  empreendeu várias estratégias para proteção das populações, entre as quais se destacam o tratamento e a profilaxia medicamentosa, o combate ao mosquito Anopheles e as campanhas de sensibilização para prevenção da doença.

A proteção dos núcleos habitacionais foi outra das medidas adotadas, e que se refletiu na aplicação de redes nas portas e janelas bem como na colocação de portais na entrada das casas, com guarda-vento e porta de rede metálica de um milímetro. A estas medidas juntou-se o tratamento dos domicílios com inseticida, verificando-se que eram raros os Anopheles encontrados no interior dessas casas e, consequentemente, o número de casos de malária diminuía.

O cartaz [nº 2]  apresenta uma mulher em primeiro plano, com indumentária rural e, em segundo plano, um berço com criança deitada, protegida por uma rede mosquiteira imprópria, pelo que ambos se mostram doentes.

O cartaz [nº 1]  por seu turno, mostra uma mulher, de perfil, com ar saudável e alegre com junto de um berço com criança deitada, protegida por uma rede mosquiteira em boas condições.

Com estes cartazes, a DGS pretendia transmitir uma mensagem simples, mas eficaz, que alertava para a necessidade de proteção das crianças, neste caso através da aplicação de mosquiteiros nos berços.
Os cartazes foram encomendados pela Direção-Geral da Saúde a um artista plástico no início dos anos de 1940, os quais apresentavam as normas recomendadas de colocação de redes mosquiteiras nos lares e o uso de repelentes.

Estes cartazes integram a coleção da Malária, dedicada ao papel Instituto de Malariologia no estudo, combate e tratamento da Malária.

Fonte: Adaptado com a devida vénia do sítio do  Instituto Nacionald e Saúde Doutor  Ricardo Jorge > Museu da Saúde > (#071) PEÇA DO MÊS - JUNHO 2014

(Continua)
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Nota do editor:

Vd. último poste relacionado com o tema do paludismo:  26 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13803: A propósito de paludismo... Quando dispensava de saídas difíceis e quando até atacava na metrópole (Abel Santos / António Tavares)


Guiné 63/74 - P13804: (Ex)citações (243): Comentário ao artigo "Guiné, Guileje e o desnorte do reino" publicado em O Adamastor (1) (Coutinho e Lima)

1. Mensagem do nosso camarada Alexandre Coutinho e Lima, Coronel de Art.ª Reformado (ex-Cap Art.ª, CMDT da CART 494, Gadamael, 1963/65; Adjunto da Repartição de Operações do COM-CHEFE das FA da Guiné entre 1968 e 1970 e ex-Major Art.ª, CMDT do COP 5, Guileje, 1972/73), com data de 22 de Outubro de 2014:

Assunto: Artigo "Guiné, Guileje e o desnorte do reino", do Sr. TC Brandão Ferreira (BF)

Caro Amigo
Junto envio um comentário sobre o artigo em epígrafe.
As razões por que escrevi este comentário são porque me assiste o direito de resposta e porque "quem não se sente não é filho de boa gente" e eu prezo muito a memória dos meus pais.
Embora o artigo em questão tenha sido publicado no blogue do Sr. TC BF, considero mais adequada a publicação do meu comentário no nosso, para assim todos os tabanqueiros dele tomarem conhecimento.

Um abraço amigo
Coutinho e Lima


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2. Nota prévia do editor

A retirada do Guileje está mais que debatida, aqui no nosso Blogue e não só, mas não queremos privar o Cor Coutinho e Lima do direito de resposta, utilizando um meio semelhante àquele onde foi publicado o artigo em causa.

Para contextualizar a resposta, o artigo pode ser lido no Blogue O Adamastor.
O comentário do camarada Coutinho e Lima, por ser algo extenso, vai ser publicado em duas partes. CV

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1.ª Parte do Comentário ao artigo
"Guiné, Guileje e o desnorte do reino" (1)

Há umas semanas, fazendo uma pesquisa no Google, sob a rubrica “retirada de Guileje – comentários”, encontrei um artigo, com o título referido acima, da autoria do Sr. Ten. Cor. Pil Av. (Ref.) Brandão Ferreira, com data de 22 JUN 2013, publicado no seu blogue Novo Adamastor. Neste, o Autor apresenta-se como Comandante de Linha Aérea e Mestre em Estratégia.

Antes de entrar na análise do artigo indicado, importa referir que o Sr. Ten. Cor. nasceu em Setembro de 1973; por esse facto, na data de 25 de Abril de 1974 (referido, na sua escrita, como “21/4”, o que, só por si, tem o seu significado), tinha 20 anos, estando portanto no início da sua vida militar. Por esta razão, não pôde participar na guerra – Angola, Guiné e Moçambique; em consequência, a sua experiência nestas guerras é igual a ZERO. Não obstante este facto, não se coíbe de fazer afirmações sobre a nossa guerra em África, como se tratasse de um catedrático na matéria, com longa experiência no campo de batalha. Talvez o Curso de Comandante de Linha Aérea e o Mestrado em Estratégia o tenham habilitado com as ferramentas necessárias para perorar sobre assuntos que desconhece.
“Presunção e água benta cada qual toma a que quer”.

No que diz respeito a experiência de guerra, devo informar que cumpri 3 comissões, por imposição, na Guiné: a 1ª. (63/65), comandando a Companhia de Artilharia 494 (CART 494), que esteve em Ganjola (Norte de Catió), desde Setembro a Dezembro de 1963; em Gadamael, com um destacamento em Ganturé, desde Dezembro de 1963 até Maio de 1965; todas estas localidades, foram ocupadas pela primeira vez, pela CART 494. Além da missão prioritária, que era a actividade de contra-subversão, contra um inimigo bastante aguerrido, a Companhia teve que construir 3 aquartelamentos, partindo praticamente do zero.

 Na 2.ª Comissão (68/70), fui colocado no Quartel General do Comando Chefe das Forças Armadas da Guiné, em Bissau. Não se pense que esta colocação foi consequência de alguma “cunha”; na verdade estava habilitado com o Curso de Observador Aéreo de Artilharia (COAA), frequentado em Vendas Novas e Tancos, em 1958; o COAA era especialidade de mobilização (já o era em 63), razão pela qual tive esta colocação. Refiro que o Sr. Comandante Chefe era, durante toda esta Comissão, o Sr. General António de Spínola.

Na 3.ª Comissão (72/74), com o posto de Major, fui mobilizado, em rendição individual, de novo para a Guiné; de SET a DEZ 72, prestei serviço no Centro de Instrução Militar (CIM) em Bolama; de JAN a MAI 73, fui Comandante do Comando Operacional nº. 5 (COP 5), em Guileje; de MAI 73 a MAI 74, estive na situação preventiva, em Bissau, como consequência de ter decidido efectuar a Retirada de Guileje. Regressei a Lisboa, em 12 MAI 74.

Portanto, comparando a minha experiência de combate e a do Sr. Ten. Cor. Brandão Ferreira estamos conversados.

Depois de ler o artigo do Sr. Ten. Cor., que contem algumas, poucas, afirmações verdadeiras, tem, porém, muitas mentiras, imprecisões e omissões, fica claro que o articulista não conhece, verdadeiramente, o que se passou e, presumo que não leu o meu livro “A Retirada de Guileje”, pois se o tivesse feito, não dizia tantas asneiras.
Felizmente que, depois do 25 de Abril de 1974, há liberdade de expressão e, em consequência, também há liberdade para a ASNEIRA.

Vou agora analisar o conteúdo do artigo em causa, nesta 1.ª Parte apenas no que respeita à retirada de Guileje; na 2.ª Parte abordarei os aspectos relativos a Guidage e Gadamael, assim como referirei documentos relacionados com a guerra dos 3 G – Guidage, Guileje e Gadamael.

Começo com a seguinte referência:

“…e ao mito que se veio a criar que a guerra na Guiné estava perdida…”

Sobre este “mito”, reporto-me ao livro MARECHAL COSTA GOMES – No centro da tempestade, da autoria de LUIS NUNO RODRIGUES (pág. 101 a 103), referindo uma viagem, em JUN 73 à Guiné:

“… A posição de Costa Gomes relativamente à situação no teatro de operações da Guiné era bastante clara. Na sua opinião, o “desenvolvimento da manobra em curso” e a “manutenção do actual dispositivo” só seria possível mediante a “disponibilidade de volumosos meios adicionais que permitissem o reforço adequado das guarnições de fronteira”. Nisso concordava com Spínola. No entanto, nas condições existentes em Portugal, tanto humanas como materiais, a Guiné não poderia contar com o “reforço adequado de meios por absoluta impossibilidade de os fornecer actualmente”. A solução, sob o ponto de vista militar, passaria pela “adopção de uma manobra visando o encurtamento de área efectivamente ocupada, evitando-se desse modo a contingência de aniquilamento das guarnições de fronteira que se impõe a todo o transe evitar, atentas as repercussões militares e políticas externas e internas”.

De acordo com Costa Gomes, esta modificação do dispositivo implicava a retirada de todas as forças colocadas nas fronteiras para uma zona onde não pudessem ser “vítimas” dos “chamados morteiros de 120”, uma arma terrível, utilizada pelo PAIGC “com muita facilidade”.

…Na sua opinião, a Guiné era “defensável” caso o dispositivo fosse modificado, retirando para o interior as guarnições militares que estavam a defender as povoações localizadas junto à fronteira. Tudo isto, porém, na condição de o PAIGC não utilizar os Migs que se sabia possuir. 
Deste modo, se o PAIGC viesse a dispor doa aviões Migs poderia bombardear Bissau, “nós perderíamos imediatamente a guerra.”

Relativamente aos meios aéreos de que o PAIGC dispunha nessa altura, transcreve-se o que o  Sr. Chefe da Repartição de Informações do Comandante Chefe afirmou, na Reunião de Comandos, realizada em Bissau, em 15 MAI 73:

“…Para complementar o quadro da evolução do potencial material do In, resta acrescentar, no que se refere a meios aéreos, que o PAIGC dispõe já de 4 aviões ligeiros e aguarda o fornecimento de mais 6 de tipo não revelado, contando já com 28 pilotos…
    
…no quadro do potencial aéreo inimigo, os meios que a REP GUINE pode empenhar e em relação aos quais se refere:

- A recente chegada de 6 pilotos estrangeiros (líbios e argelinos) à REP GUINE para substituir, nos MIG-15 e MIG-17, os pilotos guineanos cuja imperícia se revelou em alguns acidentes.

- A chegada à REP GUINE de 2 helicópteros MI-8 em fins de Abril.

- A promessa da REP GUINE ceder uma pista ao PAIGC para manobra dos seus aviões.”

Pelo que fica escrito, parece que não se tratava propriamente de um “mito”.

Continuando com as afirmações do Sr. Ten. Cor.:

“No meio da ofensiva referida veio a ter destaque, pelas piores razões, o abandono do quartel do quartel e povoação de Guileje, no dia 22 de Maio.
Piores razões, porque marca uma página negra da História Militar Portuguesa, dado que uma guarnição que estanho longe de ser batida, quebrou o dever militar, ao abandonar a sua área de operações sem ordem para o fazer e sem razão que o justificasse. A única que o fez em 13 anos de combate.”

“Pelas piores razões”, é a opinião do Sr. Ten. Cor., mas não é, seguramente, a da esmagadora maioria (com uma única excepção) dos militares que estavam em Guileje, que, para mim, é incomensuravelmente a mais importante.

Felizmente não é o Sr. Ten. Cor. que faz a História Militar Portuguesa e por isso vamos esperar  para ver se os historiadores consideram o facto “uma página negra”.

A guarnição, contrariamente ao articulista afirma (até parece que estava lá…), “estando longe de ser batida”, estava, com toda a certeza, muito próxima de ficar completamente cercada pelo PAIGC (o cerco estaria completo no dia 22 MAI 73).

Não considero que tenha quebrado “o dever militar”, porque, alem de não estar vedada a retirada (só o estaria se a Missão fosse “defesa a todo o custo”, o que não era o caso), esta foi efectuada “sem ordem para o fazer”, pelo facto de o quartel ter ficado privado de qualquer meio de comunicação, porque o centro de comunicações foi totalmente destruído pela flagelação sofrida na tarde do dia 21 MAI 73.

Tenho sérias dúvidas que o abandono de Guileje tenha sido o único; o Sr. Ten. Cor. contradiz-se, quando refere em (1) que em 30/1/73 (enganou-se no ano, pois foi em 74 e não em 73), também foi abandonado Copá; não tenho a certeza se também o quartel de Canquelifá não terá sido também abandonado e em seguida reocupado em 74.

Continuando a análise, afirma o Sr. Ten. Cor:

“Depois de abandonar o serviço activo, escreveu um livro, profere conferências e entra em debates, no sentido de descrever o que se passou, explicar as razões por que tomou a decisão que tomou e insurgindo-se contra o processo de que foi alvo”

Será que só o Sr. Ten. Cor. está autorizado a escrever, proferir conferências e entrar em debates? Continuarei a fazê-lo, quando para isso for solicitado, mesmo com a sua discordância.

Nunca me insurgi contra o processo de que fui alvo (isto é mais uma invenção do Sr. Ten. Cor.), porque sabia que a instauração de um auto de corpo de delito era inevitável.

O que censuro, com a maior veemência, é a maneira, verdadeiramente tendenciosa, como o mesmo processo foi levado a efeito. Sabe-se que o objectivo primário da investigação é o apuramento da verdade; seguramente, não foi esta a preocupação do Sr. Oficial da Polícia Judiciária Militar (PJM) – Sr. Brigadeiro Leitão Marques; não sei se este recebeu algumas orientações específicas para conduzir o processo, nem isso interessa muito. O Sr. Brigadeiro foi o único responsável pela forma como dirigiu a investigação, da qual resultou a intenção deliberada de me acusar.

No processo, podem verificar-se várias anomalias, apontadas no meu livro. Indico algumas:

- Depoimentos contraditórios de duas testemunhas, sobre a destruição dos carros sanitários, sem que o Sr. Oficial da PJM tenha feito qualquer diligência para esclarecer o assunto.

- Não aceitação da procuração em que eu nomeava meus defensores 4 Advogados, Oficiais Milicianos, todos a prestar serviço militar na Guiné, prejudicando assim a minha defesa.

- O interrogatório que o Sr. Brigadeiro Leitão Marques fez à testemunha, Sr. Ten. Cor. Pinto de Almeida, Chefe da Repartição de Operações do Comando Chefe (pág 692 a 697 do processo), em que nem uma pergunta foi feita sobre os acontecimentos ocorridos em Guileje; todas as perguntas versaram sobre o que ocorrera em Guidage.

Sobre este último assunto escrevi no meu livro:

“Após ter feito a primeira leitura do depoimento do S. Chefe da Repartição, fiquei com dúvidas se teria lido bem. Voltei a ler, com toda a atenção, e fiquei perplexo e estupefacto; na realidade, o caso não era para menos; não é que, tratando-se de um processo sobre a retirada de Guileje, o Sr. Oficial da PJM não formulou nenhuma pergunta acerca do objecto dos autos!

Isto tem um nome, que é DESONESTIDADE INTELECTUAL.”

A testemunha podia, por sua iniciativa, fazer declarações sobre Guileje, mas assim não entendeu.

Não tenho qualquer dúvida, que se tratou de UM VERDADEIRO CONLUIO ENTRE O SR. OFICIAL DA PJM E A TESTEMUNHA, o que considero gravíssimo, especialmente por se ter verificado no Exército Português.

Continuando a análise do artigo, o Sr. Ten. Cor. Afirma:

“ Foram escolhidas pois estavam mesmo junto à fronteira…”

Referia-se a Guidage e Guileje; enquanto que a primeira localidade está mesmo na fronteira, já Guileje dista da dita fronteira, cerca de 8 quilómetros, em linha recta, o que significa que, mais uma vez, não sabe do que estava a falar.

“No meio desta ofensiva séria, foi atacado o aquartelamento de Guileje, no dia 18 de Maio, possivelmente como diversão, para obrigar forças que estavam a auxiliar Guidage.”

A “ofensiva séria” era em Guidage, podendo por isso entender-se que, em Guileje, a “ofensiva era a brincar…”. No mínimo, haja respeito por quem lá estava.

Não admira que o Sr. Ten. Cor. confunda tudo, porque da guerra da Guiné, não percebe nada.

Para seu esclarecimento, devo informá-lo que, pelo chamado “corredor de Guileje”, que vindo da República da Guiné Conacri, passava bem longe do aquartelamento de Guileje, o PAIGC fazia entrar cerca de 60/70% dos abastecimentos, de toda a ordem, para todo o nosso território. Daí a importância atribuída pelo In à nossa presença, o que fez com que preparasse, com muitos meses de antecedência um “ataque com toda a força a Guileje”, na própria expressão do PAIGC.

Não tenho qualquer dúvida que o ataque a Guidage (de acordo com informações recolhidas no Simpósio Internacional de Guileje, em Mar 2008, em Bissau, devia ter início ao mesmo tempo que o ataque a Guileje e só não houve simultaneidade porque, no primeiro caso, foram detectados pelas NT, as comunicações do In, obrigando este a desencadear o ataque mais cedo), era uma manobra de diversão, sendo o ataque a Guileje a acção principal. A intenção do PAIGC era obrigar o Comando Chefe , em Bissau, a socorrer as duas guarnições, tendo que repartir as suas reservas. Para o In, a actuação do Sr. General Spínola não podia ser-lhe mais favorável, ao hipotecar praticamente todas as suas reservas no socorro a Guidage. Mais à frente voltarei a este assunto.

“A guarnição do Comando Operacional 5 sofreu um morto e dois feridos. O Comandante, Major Coutinho e Lima, decidiu ir a Bissau expor a situação. Regressou no dia seguinte e tomou a decisão de abandonar o quartel, levando consigo toda a população para Gadamael- Porto, uma povoação a poucos quilómetros.”

Esta narrativa (como agora se diz) do Sr. Ten. Cor., muito sintética, sobre o que se passou em Guileje, fica muito aquém da realidade, além de incluir várias incorreções e deturpação dos factos. Passo a esclarecer.

As baixas sofridas pelas NT, na emboscada de 18 MAI 73, foram: um morto, sete feridos graves e quatro feridos ligeiros (e não um morto e dois feridos).

Não decidi ir a Bissau, conforme afirma o Sr. Ten. Cor.

Após a emboscada montada pelo In, impedindo, pela primeira vez, a realização da coluna de reabastecimento, tive a noção perfeita de que estávamos perante uma situação grave. Nestas condições, enviei, em 18 MAI 73, às 09H05, uma mensagem RELÂMPAGO (a de maior prioridade, sendo as prioridades seguintes: IMEDIATO, URGENTE e ROTINA), para a REP/OPER, com o seguinte texto:

VIRTUDE FORTE EMBOSCADA COLUNA HOJE SOLICITO VINDA ESTE DELEGADO ESSA DELEGADO COAT”. (COAT = Comando Aero-Táctico da Força Aérea)

Quando enviei esta mensagem, não sabia ainda que a Força Aérea não ia a Guileje, o que vim a verificar depois.

A resposta foi dada, no mesmo dia, às 13H13, com uma mensagem IMEDIATO:

“ REF S/…AGUARDA-SE ENVIO RELIM” (RELIM= Relatório Imediato).

Às15H10, enviei nova mensagem RELÂMPAGO:

“ S/…INFO RELIM INSUFICIENTE. ASSUNTO TRATAR DIZ RESPEITO FALTA APOIOS EFECTIVOS REALIZAÇÃO COLNS FACE POTENCIAL IN. SOLICITO INFORME ESTA VIA QUANDO VÊM DELEGADOS.

Continuando sem resposta da REP/OPER, enviei nova mensagem RELÂMPAGO, às 22H45 desse dia 18MAI:

“M/…SOLICITO RESPOSTA ESTA VIA POIS TENHO POSSIBILIDADE SEGUIR MANHÃ 19 MAI GADAMAEL PORTO.”

Preocupado com a vinda os delegados, enviei em 19 MAI, às 03H50, a mensagem RELÂMPAGO:

CASO HAJA DIFICULDADE VINDA DELEGADOS SOLICITO AUTORIZAÇÃO IDA BISSAU E TRANSPORTE PARTIR GADAMAEL PORTO FIM EXPOR SITUAÇÃO.”

Esta mensagem foi respondida, no mesmo dia, às 11H11 (07H21 depois, o que é um exagero, inadmissível, para responder a uma mensagem RELÂMPAGO):

“ REF S/… DE 19 MAI 73, SITUAÇÃO LOCAL NÃO ACONSELHA SAÍDA DEMORADA DO SECTOR. ESTE TENTOU IR MAS FAEREA SO VAI GADAMAEL EMERGENCIA, EXPONHA SITUAÇÃO ESTA VIA.”

Esta mensagem foi enviada apenas para o COP 5 (Guileje), onde a REP/OPER sabia que eu não estava, o que demonstra a maneira desleixada (para não ser mais contundente), como o assunto foi tratado; o procedimento correcto era enviar a mensagem também para Gadamael e Cacine, havendo assim a certeza que eu a receberia, na hora.

Em consequência, só tive conhecimento do seu teor no dia 20 MAI, pelas 03H00, quando foi retransmitida de Guileje para Cacine, onde eu me encontrava.

Tendo chegado a Cacine na manhã do dia 19 MAI, donde foram evacuados os feridos pela Força Aérea (a REP/OPER não se lembrou de utilizar este transporte para enviar os delegados que eu, insistentemente pedia), e não recebendo resposta de Bissau (recordo que a mensagem acima só foi do meu conhecimento no dia seguinte), desesperado com tanta negligência, fui tentando resolver a situação, inclusivamente solicitando transporte ao Comando de Defesa Marítima, que tinha um avião à sua disposição, o que não foi possível.

Entretanto Guileje estava sujeito à acção do In, com flagelações de dia e de noite.

No dia 20 MAI, às 03H20, após tomar conhecimento da mensagem da REP/OPER do dia 19 MAI, (11H11), pelas razões apontadas, enviei, de Cacine, a seguinte mensagem RELÂMPAGO:

“ SUA…DE 19 MAI 73 CMDT PRESENTE NESTA INFORMA NECESSITA UMA COMPANHIA TROPA ESPECIAL FIM EFECTUAR REFORÇO TEMPORÁRIO REABASTECIMENTO GUILEJE. NECESSÁRIO TAMBÉM REFORÇO VIATS E ESTIVADORES. VIRTUDE SE ENCONTRAR NESTA JULGA ACONSELHÁVEL IR BISSAU REGRESSANDO IMEDIATAMENTE”.

No dia 20 MAI, à tarde, veio finamente a Cacine um helicóptero, que me transportou para Bissau.

Pelo que fica escrito, espero que o Sr. Ten. Cor. se convença que não decidi ir a Bissau.

“Do que se sabe o General Spínola …e não lhe explicou nada. Podia ter-lhe dito…eu agora não lhe posso valer pois tenho todas as minhas reservas empenhadas (o que era verdade), volte para lá, aguente-se, que logo que possa envio-lhe auxílio”.

Realmente o Sr. General Spínola não me explicou nada. Contrariamente ao que afirma o Sr. Ten. Cor., não é verdade que todas as reservas estivessem empenhadas. Conforme se pode verificar pelo depoimento do Sr. Chefe de Repartição de Operações, já indicado atrás, em resposta à pergunta do Sr. Oficial da PJM:

“… qual a situação das reservas do TO em vinte de Maio de mil novecentos e setenta e três…”, a resposta foi:

“…A trigésima quinta de Comandos encontrava-se em Bissau com a missão de segurança ao Palácio do Governo. …A Companhia de Caçadores Paraquedistas cento e vinte e um encontrava-se em Bissau em descanso desde vinte de Abril de mil novecentos e setenta e três.”

Portanto, se o Sr. General Spínola quisesse (e não quis), podia reforçar Guileje, de imediato, com a 35ª. Companhia de Comandos (depois de substituída na missão que lhe estava atribuída, o que não era particularmente difícil) e com a Companhia de Paraquedistas 121; refere-se que, esta Companhia foi reforçar Guidage, desde as 17H00 do dia 20 MAI 73 (ironicamente, depois de eu ter pedido reforço- ver mensagem anterior, enviada às 03H20 desse mesmo dia 20- esta Compª foi mandada para Guidage) até às 15H00 do dia 31 MAI73.

O argumento de que não havia reservas para reforçar Guileje, como se vê, é verdadeiramente falacioso. Acrescenta-se que estavam, em 20 MAI 73, em Cufar, as Companhias de Paraquedistas 122 e 123 (Sector do COP 4), que quinze dias mais tarde, foram reforçar Gadamael. Estas duas Companhias também podiam socorrer Guileje, de imediato, se recebessem essa missão do Comandante Chefe.

Se o Sr. General tivesse dito (e não disse), …”logo que possa envio-lhe auxílio”, isto equivaleria a dizer que a guerra, em Guileje, poderia esperar. Na prática, foi o que o Sr. General determinou, com a sua decisão de não atribuir qualquer reforço. Esqueceu-se foi do PORMENOR do envio de uma mensagem RELÂMPAGO, de teor semelhante ao seguinte:

“ Para o Comandante Zona Sul PAIGC – Nino Vieira
VIRTUDE TER TODAS MINHAS RESERVAS EMPENHADAS GUIDAGE, SOLICITO PARAGEM TEMPORÁRIA VOSSA ACÇÃO GUILEJE. LOGO QUE RESOLVA PROBLEMA NORTE, INFORMAREI ESTA VIA.
       António de Spínola

Talvez Nino Vieira tivesse sido sensível à solicitação!

(Continua)
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Nota do editor

Último poste dasérie de 21 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13776: (Ex)citações (242): Água da bolanha... quem a não bebeu ?!... Abastecimento na poça da Tabanca de Padada, dia 15JUN69 (Fernando Gouveia)

domingo, 26 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13803: A propósito de paludismo... Quando dispensava de saídas difíceis e quando até atacava na metrópole (Abel Santos / António Tavares)


1. Mensagem do nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), com data de 24 de Outubro de 2014:

Amigo e camarada Carlos,
Envio-te esta pequena resenha sobre o paludismo que atacou alguns camaradas nossos no teatro operacional da Guiné, no qual também fui um dos afectados (apesar de ser consumidor da Pirimetamina), mas que até foi meu aliado nessa altura.

No longínquo ano de 1967 mês de Dezembro, estando a CART 1742, da qual eu fazia parte, posicionada em Nova Lamego no chamado quartel de baixo, no dia 14 do mês de natal de 1967 sou confrontado com uma mudança brusca de temperatura após o almoço dando baixa à enfermaria, local onde o Furriel Enfermeiro Lopes (técnico de farmácia na vida civil na cidade do Porto) me aplicou de imediato a (mezinha) injecção da ordem. Ao fim de três dias tudo tinha passado e fui dado como operacional.

Mas, como disse atrás, o paludismo foi meu aliado, já que no dia 17 o comandante da Companhia, Capitão Cohen, manda formar a tropa e escolhe metade do grupo de combate a dedo, onde o primeiro a ser escolhido fui eu, para irmos a Sinchã Jobel, na mata do Oio, conjuntamente com a CART 1690 e o Pel Mil 110, executar uma batida na região, com o fim de desalojar o IN que possuía base nesse local. Como ia dizendo, o paludismo interferiu a meu favor, manifestando a minha incapacidade através da voz do Furriel Enfermeiro Lopes.
- O Abel está com o paludismo, meu capitão
- Então que vá para a caserna. - E eu fui, pudera.

O segundo caso de paludismo aconteceu após a minha chegada a casa na primeira semana, mas tudo foi resolvido rapidamente, já que eu era portador de um contacto telefónico dos serviços de doenças tropicais e infecto-contagiosas, que na altura (1969) estava instalado em Ermesinde (Porto), que acorreram imediatamente após o telefonema, e assim ao fim de uma semana estava novamente operacional.

Espero com este relato ter contribuído para a temática sobre o paludismo.

Sem mais, um grande abraço a toda tertúlia.
Abel Santos.

Nova Lamego, Natal de 1967. Na foto, em primeiro plano: Abel Santos, Oliveira e Aníbal. De pé, atrás: O Fur Mil Enf Lopes distribuindo os célebres comprimidos preventivos do paludismo.

Foto ©: Abel Santos

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2. Mensagem do nosso camarada António Tavares (ex-Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72), com data de 25 de Outubro de 2014:

Camarigos,
Já escrevi que estive mal com o paludismo quer no CTIGuiné quer no Porto, em Agosto de 1971.
Sim, até na minha terra fui vítima do paludismo.
Terminei a comissão em 23 de Março de 1972. Em Abril de 1972 fui a uma consulta médica de especialidade na Direcção Geral de Saúde. Cumpri sempre a prescrição médica e respectivos exames auxiliares. Procedimento que me conduziu à erradicação da doença.
O meu Processo nos Serviços de Higiene Rural e Defesa Anti-Sezonática, situada em Gondomar, tinha o número 155/4/72.
Porquê em Gondomar? Talvez por ser à época uma zona rural.



Depois de ter lido no blogue bons textos sobre o tema e também com a finalidade de não me repetir é a imagem acima e o seu conteúdo que merece atenção.
(Texto escrito de acordo com a antiga ortografia)

Um abraço do
António Tavares
Foz do Douro,
Sábado 25 de Outubro de 2014
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 Nota do editor

Último poste sobre a temática do paludismo >  25 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13799: A propósito de paludismo... e da arte de bem guerrear (Mário Migueis da Silva, ex-Fur Mil Rec Inf, Bissau, Bambadinca e Saltinho, 1970/72)

Guiné 63/74 - P13802: Memória dos lugares (276): Jugudul, abril de 2006, na casa do saudoso Manuel Simões (1941-2014) (fotos de A. Marques Lopes, Xico Allen, Inês Allen e Hugo Costa)


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >    A estrada Jugudul-Bambadinca que tanto "suor, sangue e lágrimas" custou, em 1973/74... 


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >  Ao centro,o dono da casa, Manuel Simões (1941-2014), tendo à sua direita o A. Marques Lopes.


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >  Da direita para a esquerda, o Manuel Simões (1941-2014), o Manuel Casimiro, o Manuel Costa, o Armindo Pereira e o A. Marques Lopes


 Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >  Da direita para a esquerda, o Manuel Simões (1941-2014), o Saagum, o  Manuel Casimiro e  o Manuel Costa.


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >   Foto de grupo, vendo-se de pé o Hugo Costa, filho do Albano Costa, e sentada a comer, no sofá, a Inês Allen, filha do Xico Allen (aqui de costas, à direita, tendo à sua esquerda o Saagum, também de costas)


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >  O Manuel Simões (1941-2014) fazendo as honras ao leitão à moda de Jugudul... Em primeiro plano, o Hugo Costa (à direita), e o Armindo Pereira (à esquerda), ladeado pelo António Almeida

Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudual > Abril de 2006 >  O "senhor leitão"...


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >  Na hora do café e digestivos, da direita para a esquerda,, o Manuel Casimiro, o Manuel Costa, o Armindo Pereira e o A. Marques Lopes.


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >  Da direita para a esquerda, o  António Almeida, o Armindo Pereira,  o Manuel Costa, o Manuel Simões e o Manuel Casimiro 


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >  Da direita para a esquerda, o António Almeida, o Manuel Casimiro e  o Manuel Costa


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >   A única mulher do grupo, com o seu recente penteado africano, feito em Bissau: a Inês Allen


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 > A Inês Allen


Guiné-Bissau > Região do Oio > Jugudul > Abril de 2006 >  A Inês Allen e o António Almeida .

Fotos: © A. Marques Lopes (2006). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: LG]

1. Jugudul, abril de 2006, uma paragem na casa do Manuel Simões (1941-2014). Fotos, recentemente chegados ao nosso blogyue, enviadas pelo A. Marqies Lopes, grã-tabanqueiro da primeira hora. e tiradas a a várias mãos:  A. Marques Lopes, Inês Allen, Hugo Costa e Xico Allen... 

Esta foi a primeira vez viagem que o A. Marques Lopes fez à Guiné-Bissau, por terra, de jipe, Já lá tinha estado em 1998. 

É uma viagem memorável,  que está bem documentada na nossa I Série:  "Do Porto a Bissau"  foram publicados 26 postes, o último dos quais é relativo a este  almoço de leitão oferecido pelo saudoso Manuel Simões, nascido em Bolama, em 1941 e recentemente falecido, na sua casa, em Jugudul.  O Hugo Costa fez também, por sua conta, uma notável reportagem fotográfica, já publicada no blogue.

Verificamos agora que estes sete magníficos do Porto não estão todos na lista de A a Z dos membros da Tabanca Grande ou nem sequer têm uma simples marcador no nosso blogue (caso do Armindo Pereira e do Manuel Casimiro). . É uma injustiça que temos de reparar...

O Manuel Simões (1941-2014) era amigo do Xico Allen, que integra o grupo de sete companheiros que saíram do Porto e onde se incluíam, além dos já mencionados, o Armindo Pereira, esteve em Jumbembem (a norte de Farim, região do Oio, e já era repetente nestas idas à Guiné, acompanhando  o Xico Allen), o Manuel Casimiro (o mais gordinho e bem disposto) e o Manuel Costa (o mais novo e calvo, primo do Albano Costa, que  esteve em Canjambari, a oeste de Farim, na região do Oio, e em Chugué, a norte de Bedanda, na região de Quínara)

Ao grupo iria juntar-se, vindos de avião, o António de Almeida e o José Clímaco Saagum, ambos pertencentes à CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69).


2. Recordo que o organizador desta viagem, em abril de 2006,  foi o Xico Allen [ex-1.º cabo at inf,  CCAÇ 3566, Os Metralhas, Empada, 1972/74]. Levou o jipe, que lá ficaria para futuras viagens. O grupo regressaria depois de avião.

O Xico Allen, nosso grã-tabanqueiro desde 2006, foi um dos primeiros de nós, ex-combatentes,  a voltar à Guiné, depois da independência. E nos últimos anos chegou mesmo a lá viver. De acordo com as memórias da Zélia Allen, também nossa tabanqueira, o casal Allen visitou a Guiné do pós-guerra, em abril de 1992 (eles os dois, mais um outro casal, o Artur Ribeiro e a esposa). Voltaram em 1994 lá voltaram, desta vez foram 3 casais e conseguiram ir a Empada, onde o Xico tinha feito a sua comissão.

Uma terceira viagem foi em 1996 e uma quarta em 1998. Temos vários fotos dessa viagem, em que o Xico (e a Zélia) foram inclusive a Madina do Boé. Depois disso, o Xico passou a lá ir regularmente.

Por sua vez,o Albano Costa, pai do Hugo, tinha lá estado em novembro de 2000 (, incluindo o Armindo Pereira,  o Manuel Casimiro, o Manuel Costa e mais uma vez o Xico Allen). Foi a sua primeira e única vez. Fotógrafo profissional, fez uma excelente cobertura fotográfica da viagem, ele e o filho, Hugo Costa, percorrendo a Guiné de lés a lés, incluindo uma ida a Guidaje, onde ele fizera a sua comissão. (Foi 1º cabo at inf, CCAÇ 4150, Guidaje, Bigene, Binta, 1973/74).

O Xico Allen, injustamente, não aparece, aqui, de frente nestas fotos de Jugudul... (LG)
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Nota do editor:

Último poste da série >  14 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13735: Memória dos lugares (275): Jumbembem, ao tempo da CCAÇ 2548, 1969/71 (Carlos Silva)

sábado, 25 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13801: Agenda cultural (346): Lançamento do livro "Quatro Rios e um Destino", de Fernando de Jesus Sousa, dia 30 de Outubro de 2014, pelas 14h30, no Auditório Jorge Maurício, Associação dos Deficientes das Forças Armadas em Lisboa

1. CONVITE PARA O LANÇAMENTO DO LIVRO "QUATRO RIOS E UM DESTINO", DE AUTORIA DO NOSSO CAMARADA FERNANDO DE JESUS SOUSA, EX-1.º CABO DA CCAÇ 6, BEDANDA, 1970/71, DIA 30 DE OUTUBRO DE 2014, ÀS 14H30,  NO AUDITÓRIO JORGE MAURÍCIO, ASSOCIAÇÃO DOS DEFICIENTES DAS FORÇAS ARMADAS, AV. PADRE CRUZ, EDIFÍCIO ADFA, LISBOA


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Nota do editor

Último poste da série de 23 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13789: Agenda cultural (345): Doclisboa'14: hoje, no Cinema Ideal (Rua do Loreto, Lisboa), o documentário oficial sobre os campos nazis, encomendado em abril de 1945, esquecido durante anos e só agora recuperado na sua versão integral... "Nunca os meus olhos viram nada assim" (António Araújo, historiador)

Guiné 63/74 - P13800: Bom ou mau tempo na bolanha (72): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (12) (Tony Borié)

Septuagésimo primeiro episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGRU 16, Mansoa, 1964/66.




Relato do décimo segundo dia de viagem

Foi dos dias mais pacatos, céu azul, bom tempo, só vendo paisagem e sem qualquer sobressalto, o clima polar, a latitude 66° 33’, tinha ficado lá no norte.

No hotel pertencente à tal rede, na cidade Wasilla, que por acaso é a cidade onde vive uma personagem bastante popular, a senhora Sarah Palin, que já foi governadora do estado do Alaska, cuja foto correu mundo. Muitas senhoras a copiaram, com uns óculos de estilo e uma cara simpática, que até o Partido Republicano a nomeou para concorrer às eleições para vice-presidente dos USA. Aqui, continuavam a gostar de nós, pois além de nos fazerem sempre um preço de amigos, serviram-nos um pequeno almoço que era quase um jantar.



Rumo ao sul, já a manhã ia um pouco alta, a cidade de Anchorage, era já ali, parámos na entrada junto da placa que dava as boas-vindas à cidade, tirámos fotos, fomos ver o “Ship Creek”, que é um rio do Alasca que brota das “Montanhas Chugach” em Cook Inlet, ali no porto de Anchorage, na foz do Ship Creek, que deu o seu nome "Knik Anchorage", à cidade de Anchorage que foi crescendo nas suas proximidades, já por lá havia alguns pescadores, todavia disseram-nos que o salmão ainda não tinha subido.


A cidade de Anchorage mostrava bem a presença russa, no centro-sul do Alasca, no século dezanove, quando em 1867 o secretário de estado William Seward intermediou um acordo para a compra do Alasca, ao endividado Império Russo por US$ 7,2 milhões, algo como dois centavos de dólar por acre. O negócio foi muito criticado por políticos e pela população em geral, como a "loucura de Seward", pois ia comprar a "caixa gelada de Seward" e "Walrussia". Todavia em 1888 foi descoberto ouro no “Turnagain Arm”, na região da enseada de “Cook”.


Em 1912, o Alasca tornou-se um território dos USA e Anchorage, ao contrário de todas as outras cidades grandes no Alasca ao sul da Faixa de Brooks, não era nem pesqueira nem um campo de mineração. A área de dezenas de quilómetros de Anchorage é estéril de minerais metálicos economicamente importantes e, não havia, naquele tempo, frota de pesca operando fora de Anchorage.

Foi estabelecida em 1914 como um porto de construção de caminhos-de-ferro para o “Alaska Railroad’, que foi construído entre 1915 e 1923, sendo na área de “Ship Creek Landing” onde se localizava o quartel principal dos caminhos-de-ferro, que rapidamente se tornou uma cidade de tendas. Depois disso, a cidade sofreu uma grande transformação com o desenvolvimento do caminho de ferro, com a chegada de bases militares e, mais tarde, com o tráfrgo no Aeroporto Internacional Ted Stevens, sendo a cidade de Anchorage, incorporada no ano de 1920.

Em 1964, ano em que chegámos à província da Guiné, com aquela farda amarela, servindo a “Muito Digna e Orgulhosa Pátria Amada”, como me dizia o professor Silvério, nos anos cinquenta, no segundo andar da escola fria do Adro, em Águeda, aquela cidade foi atingida pelo Terramoto de “Good Friday” (Semana Santa), ou “Grande Terremoto do Alasca”, com uma magnitude de 9.2, que matou 115 pessoas e provocou um prejuízo de 1.8 bilhões de dólares. O terramoto durou cerca de 5 minutos, e as construções que não cederam nos primeiros tremores, ruíram com os movimentos incessantes. Foi o segundo maior sismo da história mundial e a reconstrução dominou a cidade em meados dos anos 60.

Continuámos visitando a cidade, mas nunca parando, pois com uma caravana atrelada ao Jeep, dentro da cidade era difícil o estacionamento e, pelas informações que tínhamos, existe por aqui algum crime, talvez não seja verdadeiramente crime, é a falta de ocupação dos naturais, por tal motivo não era muito recomendável estacionar, pelo menos nas áreas circundantes da cidade, pois podia-se ver grupos de pessoas, em especial na área da foz do “Ship Creek”, sem qualquer ocupação, dando a entender que viviam por ali, talvez na esperança de alguma oportunidade para enriquecer o seu miserável património.

Mas deixemos esses pormenores, o que os nossos companheiros devem querer saber é o que os nossos olhos viram, em outras palavras, viajar connosco e isso é o que vamos fazer.
Sempre rumo ao sul, seguindo na estrada número 1, o tempo estava bom, o céu azul, com um cenário que podia ser pintado, pois as montanhas de “Chugach” estavam de um lado e a linha do caminho de ferro, quase sobre a água da baía de “Turnagain Arm”, do outro.


Umas horas depois éramos passageiros de um barco que navegava por um pequeno lago, onde uma simpática rapariga, com feições de esquimó, nos explicava alguns pormenores do “Portage Glacier”, que é uma massa de gelo, compactada e cristalizada, que desce da montanha, caindo sobre o lago, na área de “Chugach National Forest”, entre montanhas. A neve que o compõe anda por lá há milhares de anos, tem aproximadamente 14 milhas, (23 quilómetros) de comprimento e está conectado a mais cinco “glacieres”, que se escondem também por entre montanhas.


Quando erguíamos os olhos, avistávamos neve e gelo. À nossa frente a paisagem era de floresta, com árvores verdes a circundarem a estrada que passava por muitos ribeiros e lagos. Agora era rumo ao sul, entrando na província do Kenai, onde existe uma área em que se viaja por mais de 100 milhas sem estações de serviço, mas a estrada é de alcatrão, em muito bom estado.


Continuando sempre na estrada número 1, chamada também “Sterling Highway”, podemos avistar, do outro lado do “Cook Inlet”, onde a baía já é bastante larga, algumas montanhas cobertas de neve com o cume a fumegar, sinal de que são vulcões adormecidos.


Saindo da estrada, aqui e ali, para apreciar a paisagem, passando por algumas pontes, muitas são mesmo obras de arte, vendo pequenas embarcações descarregando e limpando peixe. "Águias de colarinho branco”, aproximavam-se enquanto se limpava o peixe.


Assim, fomos seguindo até à cidade Homer onde, antes de procurar um parque de campismo, vendo um cenário de mar e montanha, logo à saída de Cook Inlet, em Kachemak Bay, existe um complexo de 7 vivendas, casas em madeira de troncos, com dois andares, simples, com todas as facilidades incluídas, a parte de trás tem um pequena área coberta, com cadeiras, onde se pode presenciar um cenário de mar e montanha mais lindo e completo, que em toda a nossa vida, que já é um pouco longa, vimos. São alugadas ao dia ou à semana e, como já eram quase onze horas da noite, embora ainda fosse dia, por curiosidade, perguntámos qual o preço do seu aluguer, a pessoa responsável, uma senhora, sorrindo, com aquele sorriso gaiato de esquimó, nos disse que ainda tinha uma vaga, dado ao adiantado da hora nos fazia um preço especial, para aquela noite, que era maior do que uma normal família, talvez com dois filhos, podia gastar para viver razoavelmente durante duas ou três semanas.

Dormimos próximo, num parque de campismo do estado, cozinhando a nossa refeição, ocupando um espaço com uma vista privilegiada, quase igual à das casas, em troncos em madeira, por apenas $10.00, que colocámos num apropriado envelope, oferecendo de ajuda, para a manutenção do parque.

Neste dia, esquecendo o miserável dia anterior, pois por aqui, já é “sul do Alaska”, percorremos apenas 297 milhas, num cenário de floresta, montanhas, glaciares, lagos, alguns ribeiros, mar, zonas piscatórias, alguns animais e aves selvagens, o céu quase sempre azul, com o preço da gasolina variando entre $4.22 e $4.37 o galão, que são aproximadamente 4 litros.

Tony Borie, Agosto de 2014
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Nota do editor

Último poste da série de 18 de Outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13754: Bom ou mau tempo na bolanha (70): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (11) (Tony Borié)

Guiné 63/74 - P13799: A propósito de paludismo... e da arte de bem guerrear (Mário Migueis da Silva, ex-Fur Mil Rec Inf, Bissau, Bambadinca e Saltinho, 1970/72)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Migueis da Silva (ex-Fur Mil Rec Inf, Bissau, Bambadinca e Saltinho, 1970/72), com data de 23 de Outubro de 2014:


Meus caros:
Para matar saudades, estou a anexar o meu contributo para o tema em epígrafe.

Um abraço tão grande e forte como a estima e a consideração que me mereceis.
Mário Migueis


A PROPÓSITO DE PALUDISMO
por Mário Migueis da Silva 

[, membro da Tabanca Grande, desde 16/4/2009: recorde-se o seu BI:  (i) Furriel Miliciano
com a especialidade de Reconhecimento e Informação, esteve na CCS/QG (Bissau),  em em diligência na CCS/BART 2917 (Bambadinca, Novembro 70-Janeiro 71),  CCaç 2701 e CCaç 3890 / Saltinho (Março 71 a Outubro 72)]

Tendo decidido que, a partir de agora, vou fazer um pequeno esforço para tentar ultrapassar tão rapidamente quanto possível as mil e uma entradas da feraz caneta do nosso distinto tabanqueiro Mário Beja Santos, nem sempre beneficiária dos meus encómios, mas nem por isso desmerecedora – ela, a caneta – da minha vénia a tanto engenho e farto saber, vou, desde já, aproveitar o ensejo do tema apresentado pelo nosso não menos estimado Rui Vieira Coelho - que, por sinal, foi médico em Galomaro, sede dos dois últimos batalhões em que estive em diligência – para partilhar uma pequena amostra do que foi a minha luta incessante contra o famigerado paludismo, ainda hoje responsável por milhões de baixas neste “mundo do Senhor”.

O encontro de apresentação, ou seja, a primeira manifestação do dito deu-se, por alturas de Março de 1971, em Bissau, onde me encontrava em formação na Repartição de Informações do Comando-Chefe, onde estava colocado. Começou com uns arrepios e, daí a nada, estava com uma temperatura diabólica, o que me levou a uma consulta médica na Amura, à qual se seguiu uma outra na enfermaria do QG, que era a minha unidade, em virtude de os meus camaradas de quarto no “Palácio das Confusões” terem ficado alarmados com a evolução – para pior – do meu estado de saúde. Mas, não havia razões para tanto susto: com a terapêutica da ordem, decorridos cerca de oito dias, pouco mais que pele e osso, e agarradinho às paredes ou a um ombro amigo para não me estatelar no chão, tal era a fraqueza das minhas pobres canetas, lá consegui chegar ao Clube Militar de Sargentos, que, providencialmente, era ali mesmo ao pé, para uma primeira refeição após o já inesperado ressurgimento.

A umas bolachinhas com Fanta natural, seguiram-se umas sandes com umas coca-colas e, finalmente, uns camarões de fazer queimar a beiça, acompanhados de umas cervejas fresquinhas e retemperadoras. Tinha, assim, levado de vencida este nosso primeiro embate, e o que achei de mais curioso, em termos de sintomatologia, foi, de permeio com as terríveis dores de cabeça, corpo dolorido, febre altíssima, falta de apetite, vómitos e mal-estar geral, a sensação de que cada fio do meu cabelo estava implantado numa chaga.

Dito isto, passemos, desde já, à quarta ou quinta experiência, que não haveria papel que chegasse nem paciência que vos sobrasse para tanto relato, se eu me perdesse agora, por aqui, a contar tudo, tim-tim por tim-tim.

Estava eu no Saltinho, e tinha terminado há muito pouco tempo o período de sobreposição das duas companhias de caçadores minhas anfitriãs: a “2701”, dos “velhinhos” do capitão Carlos Clemente, e a “3490”, do capitão miliciano Dário Lourenço, com quem eu ficara, de castigo – mentira!...

Ao entardecer de mais um dia de muito sol e boa disposição, fui tomar o meu habitual banho numa das piscinas naturais do Corubal, a pouco mais de cinquenta metros do arame da nossa posição militar. Lá de cima da rocha mais alta, que eu não fazia aquilo por menos, mergulho como uma bala nas águas mornas e suaves do pacato rio, e, emergindo com a potência de mais que muitos cavalos-vapor, dou meia dúzia de braçadas até à margem. É aí que, acto imediato, e embora fizesse ainda bastante calor, sinto aqueles arrepios – sempre eles! – que me fizeram encolher, apanhar a toalha e regressar “a casa”, a rogar pragas à minha pouca sorte: não havia dúvidas nenhumas, aí estava o paludismo, uma vez mais!...


Uma bela imagem do Rio Corubal, no Saltinho. 

Foto retirada da página Encore de L'audace do nosso camarada Paulo Santiago, com a devida vénia


Já a bater o dente, fui directo ao Henrique Custódio, furriel (miliciano) enfermeiro, a quem não dei hipóteses de paninhos quentes:
- Dá-me já uma dessas injecções de cavalo, que esta merda não vai com comprimidos nem afins!....

Não passara ainda meia hora, deitava eu contas à minha triste sina de paciente dos pântanos compulsivo, quando chegam, em passo de corrida, dois elementos da população de Madina Bucô, a darem conta de que, nas imediações da sua tabanca, a cerca de oito quilómetros de distância do Saltinho, tinham sido detectados “turras” – eh, pá!... -, em preparativos para um ataque pela calada da noite.

Em resposta – pois claro! -, prepara-se para avançar o pelotão de intervenção, que, com os seus homens já instalados em três “burrinhos”, aguarda a ordem de “siiiiga!...”. É quando o furriel enfermeiro, que estava sentado ao lado do Elói, outro furriel miliciano de elevado gabarito, salta do pequeno camião e se dirige a mim, perguntando-me com um espanto de espantar:
- Como é, não vens connosco, meu sacana?!...
- Sacana?!... Sacana és tu, meu malandro do caraças!... Então, acabaste de me dar a puta da injecção para o paludismo e queres que vá convosco prá rambóia?!... Desta vez, ides ter que passar sem mim.



Guiné> Zona leste > Setor L5 (Galomaro) > CART 3490 > Saltinho, 1972, época das chuvas

Foto: © Mário Migueis (2009). Todos os direitos reservados


E, assim foi. Daquela feita, consideradas as condições de periclitante saúde, não fui, armado em rambo, para a coboiada. E, afinal, até nem fui preciso para nada, porque, felizmente, não houve ataque nenhum aos nossos amigos fulas e o Henrique Custódio, de quem já me tornara um bom amigo, pôde, na madrugada do dia seguinte, regressar são e salvo, para poder acompanhar convenientemente os efeitos do “soro cavalar” administrado.

Mas, entretanto… Entretanto, pouco faltaria para a meia-noite no quartel do Saltinho – e penso que em Madina Bucô também -, estava eu no gabinete do comandante da companhia, que funcionava simultaneamente como sala de informações. Só, sentado à secretária, cabeça caída sobre o tampo alagado com os suores de gelo que me faziam tremer de frio e morrer de calor, aguardava a morte.

Assim, com a febre a atacar-me impiedosamente, fui surpreendido por aqueles estampidos secos, que nada tinham de familiares. “Devo estar com alucinações!”, pensei. Só que, ao primeiro estalo, seguiu-se, segundos depois, uma surda explosão que me pareceu bastante mais distante. Mas, não pestanejei sequer, até porque estava com os olhos bem colados às pálpebras, coitaditas, mais mortas que vivas. Já ao terceiro – alto lá!, que, pelos vistos, a coisa era para durar - soergui ligeiramente a cabeça e passei a mão direita pela testa ensopada e pegajosa. E ia a coisa já no quarto ou quinto – palavra de honra que não contei! -, quando tive a percepção de que cessara o ruído – tom, tom, tom - do enorme gerador, acomodado no outro lado da parada.

Com um esforço pouco menos que titânico, consigo levantar duas ou três pestanas da vista melhor colocada e reparo que a lâmpada do tecto se extinguira e que a grande ventoinha de estimação dava os últimos suspiros. É, então, que me atrevo, aos tropeços e às apalpadelas, a fazer os dois metros que me separam da porta, para espreitar, a tentar perceber o que se passa. Não foi preciso muito tempo para isso, pois a explicação estava ali, diante dos meus olhos vermelhos e cansados: dos lados de Aldeia Formosa, a meio caminho dos dez quilómetros em linha recta que separavam os dois aquartelamentos - por aí -, partiam, em direcção a norte, projecteis tracejantes – luminosos, pois, - com uma trajectória curva de longo alcance, tendo eu estimado que os impactos se estariam a verificar a cerca de 20 quilómetros de distância a norte da zona de lançamento.

Comigo de novo todo encolhido, cabeça em fogo sobre o tampo da secretária, eis que irrompem na escuridão da sala, mansa e quieta, a pobrezita, que não fazia mal a ninguém, três ou quatro tigres de Mampa…, quer-se dizer, três ou quatro tigres da Malásia, que, de lanterna em punho, se vêm colocar desrespeitosamente de costas para mim. Aos saltos de nervosismo, ganas, enfim, de entrar em acção, “dá cá a lanterna, passa-me essa merda”, apontam o foco de luz para a tela plastificada que cobre completamente toda a parede de cinco por três.
 - É dali, é dali!..., - exclama o alferes Rainha, que substituía o capitão Dário, ausente em Bissau ou coisa assim.
- É mais abaixo, Rainha! – agora, o alferes Armandino, com a sua voz roufenha e aparentemente mais calma, apontando para o número 44, envolto por um circulo a vermelhão, na carta de tiro do morteiro de maior alcance de que dispúnhamos na unidade.
- Não, não, Armandino, o tiro sai mais a sul! – insiste o Rainha, brandindo a lanterna, impaciente.
- Tás enganado, Rainha, mas pronto, faz lá como tu quiseres – concede, por fim, o Armandino, a ajeitar o quico e a puxar o cinto das calças para cima, preparando-se já para sair com os restantes invasores, rumo ao espaldão do “10.7”.
- Amanda-se prós dois, pronto!... Fogo pró trinta e pró quarenta e quatro!... - resolve o Rainha, que, para além de mais velho, tem todo o aspecto e os tiques de ser o mais belicoso.


Guiné> Zona leste > Setor L5 (Galomaro) > CART 3490 > Saltinho, s/d. c. 1971/72... O Miguéis (, aqui conhecido por Silva,) sentado no "tigre" qye encimava o monumentos aos mortos da CCAÇ 2406 (Olossato e Saltinho, 1968/70), companhia do meu tempo e que era conhecida como os "tigres do Saltinho" (fizemos operações juntos) (LG)

Foto: © Mário Migueis (2009). Todos os direitos reservados [Edição: LG]

Não aguentei mais tanta impetuosidade, tanta vontade de fazer ronco:
- Fogo o caralho!... – resmunguei com quanta força me permitia a debilidade da minha carcaça em brasa. “Ó, cum caraças!”, só não se atiraram ao chão, porque começaram a tropeçar uns nos outros, em direcção à porta por onde antes entraram de rompante e dispostos a pôr tudo a ferro e fogo.

A áspera caralhada, assim disparada do escuro, à falsa fé sem ninguém contar, tivera o efeito de uma granada que nos cai aos pés. O Armandino foi o primeiro a reagir e, apanhando a lanterna ainda acesa que o Rainha deixara cair com o susto, vira-a para mim e consegue titubear:
- Ai é você?!...
- Pôrra, Migueis, que susto do caraças!... Você não está a ouvir os rebentamentos?!... – esganiça o Rainha, mais magro e descorado ainda do que em tempos de paz.
- É claro que estou, mas isso não é nada connosco!...
- Mas deve ser com o quartel de Buba, ou coisa assim!... – justificava-se e tentava impor-se o comandante em exercício, perante o saber de experiência feita do furriel de informações.
- Qual Buba, qual quê!... Alguém pediu fogo de apoio?!... – perguntei, agora com a cabeça fora da carapaça, e a procurar levantar-me da cadeira, onde estava literalmente colado.
- P´ra já, não, mas…
- Ai, não?... Então, deixem-se estar mas é quietos, senão os gajos viram-se p´ra cá e ainda nos rebentam com a puta da ponte!

Estava escrito que ainda não era daquela que os indómitos periquitos haviam de fazer o gosto ao dedo, e eu, logo que me recompus, e na sequência da mensagem que o SIM oportunamente fizera seguir para o Comando-Chefe, elaborei o relatório de informações respectivo, onde, nos “Ensinamentos Colhidos”, que, normalmente, ultimavam o texto, omiti, por incúria, o que de mais importante se extraíra de tão alvoroçada experiência: “O paludismo pode funcionar como agente dissuasor do gasto excessivo de munições, que tantos sacrifícios custam ao erário do nosso depauperado povo”.

Dias mais tarde, chegar-nos-iam notícias recortadas provenientes da República da Guiné, dando conta de que o PAIGC tinha recebido recentemente alguns carros de combate (tanques) da União Soviética, os quais haviam chegado a Conakry por via marítima e depois seguido para Kandiafara, principal base logística do IN, onde se mantinham. Os carros de combate – referiam ainda as mesmas fontes - tinham sido, entretanto, testados junto à linha de fronteira, para os lados do Saltinho, ou seja, acrescentei eu, tinham utilizado abusivamente a nossa carreira de tiro, sabedores que eram, porventura, de que eu, o maior da cantareira, estava a braços com as febres dos pauis.

In “A Arte de Bem Guerrear”, autoria cá do rapaz, a publicar brevemente

Esposende, 22/10/2014

Um abraço muito amigo,
Mário Migueis