quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14169: Historiografia da presença portuguesa em África (51): Revista de Turismo, jan-fev 1956, número especial dedicado à então província portuguesa da Guiné: anúncios de casas comerciais - Parte III (Mário Vasconcelos)






1. Mais alguns anúncios de casas comerciais, da Guiné, que foram publicados na revista Turismo, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2.


Tudo indica que, neste nº especial da revista, dedicado à província portuguesa da Guiné) (*), toda a gente tenha querido "aparecer na fotografia". Referimo-nos às "forças vivas" da colópnia, e nomeadamente as da esfera económica, os pequenos comerciantes e demais empresários, portugueses, caboverdianos e libaneses, que operavam na Guiné.
Na amostra de hoje, temos: 

(i) o José Zauad (que, pelo apelido, parece ser libanês),  que tinha estabelecimento comercial em Campeane, na região de Tombali!...

(ii) o Armindo G. Ferreira, estabelecido em Cadique, Catió, também na região de Tombali;

(iii) o José David Doutel, de Cadique. Salancaur, Catió, região de Tombali;

(iv) e, pro fim, o António R. Silva Ribeiro, que seria de Bissorã, e não de Comissorã (mais do que provável gralha tipográfica).

Todos se dedicavam ao "comércio geral: compra e venda de produtos da província"... Em 1956, era já "politicamente correto", escrever-se "província" e não "colónia", como mandava a reforma administrativa ultramarina de 1951.

 Como temos vindo a observar, estes anúncios são um preciosidade, pelas inesperadas informações que nos trazem de gentes e de lugares que vão ser varridos pela guerra, oficial ou oficiosamente iniciada em  Tite, região de Quínara, em 23 de janeiro de 1963...

Refletem, por outro lado,  o clima de relativa tranquilidade e prosperidade em que então se vivia, em 1956... No texto a seguir, apresentam-se alguns dados sobre a economia da época, de acordo com a citada revista Turismo, de jan/fev de 1956. 

O grosso das exportações  (87%, em tonelagem) ía para duas oleaginosas, o amendoim e o coconote. Por outro lado, numa década (1941-1950), as importações passavam de 49 mil contos para 128 mil (um aumento de 260%). As exportações, por sua vez,  passavam, no mesmo período, de  65 mil para 118 mil contos (um aumento de 180%).

[Foto à direita: Mário Vasconcelos, ex-alf mil trms, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72, Mansoa, e Cumeré, 1973/74]


Fotos: © Mário Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]

Guiné 63/74 - P14168: Parabéns a você (848): João Graça, Amigo Grã-Tabanqueiro, Médico e músico que já visitou e trabalhou na Guiné-Bissau

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Nota do editor

Último poste da série de 19 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P14161: Parabéns a você (847): José Crisóstomo Lucas, ex-Alf Mil Op Esp da CCAÇ 2617 (Guiné, 1969/71) e Manuel Mata, ex-1.º Cabo Apont de Armas Pesadas do Esq Rec Fox 2640 (Guiné, 1969/71)

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14167: Historiografia da presença portuguesa em África (50): Revista de Turismo, jan-fev 1956, número especial dedicado à então província portuguesa da Guiné: anúncios de casas comerciais - Parte II (Mário Vasconcelos)













1. Mais alguns das dezenas de anúncios de casas comerciais inseridos na revista Turismo, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2 (nº especial dedicado à província portuguesa da Guiné) (*). 

 Não havia, nessa época, de relativa paz e prosperidade, apenas "comerciantes do mato" (desde Ingoré, na região do Cacheu, a Darsalame, na região de Quínara) que se dedicavam à "compra e venda de produtos da província" (e que eram bem poucos: arroz, mancarra, coconote...). 

Também vamos encontrar, sobretudo em Bissau, casas com bons instalações, e edfícios recentes, que se dedicam ao comércio "por grosso e atacado", de artigos nacionais e estrangeiros, com secções como vestuário (fazendas, camisaria, chapelaria),  mas também  bijuteria, brinquedos, papelaria, etc., como era o caso da casa Salgado & Tomé, em Bissau (foto acima). 

Por sua vez, o A. V. d' Oliveira & Ca. tinha armazém e escritório em Bissau, com filiais em Bafatá, Mansoa, Bissorã, Bula e Cacheu. Também se dedicava ao "comércio geral" e ao "import/export"...

E em Bolama, ficamos a saber que havia A Competidora, de António de Almeida, que importava e vendia sobretudo "materiais de construção", ams também "artigos de papelaria" e "material fotográfico".

Para além do comércio, por grosso ou a retalha, também há pequenas indústrias: é o caso da "serração mecânica" de Manuel de Jesus Morais, "exportador de madeiras", em Bubor, Farim.


[Foto à esquerda: Mário Vasconcelos, ex-alf mil trms, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72, Mansoa, eCumeré, 1973/74]

Estes anúncios refletem inegavelmente  o clima de relativa prosperidade económica  e paz, que a província vivia em meados da década de 1950... A partir de 1961 (com os antecimentos em Angola e na Índia Portuguesa) e provavelmente já antes, com os acontecimentos de 3 de agosto de 1959 (no cais do Pidjiguiti), muitos dcstes comerciantes acabam por se retirar das zonas mais isoladas do interior, e fixam-se em Bissau ou regressam à metrópole...

Recorde-se que faz 52 anos, no próximo dia 23 de janeiro de 2015, que se iniciou oficialmente a guerra de guerrilha com o ataque a Tite...


Fotos: © Mário Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]

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Guiné 63/74 - P14166: Notas de leitura (672): Do livro "Família Coelho", edição de autor, 2014, de José Eduardo Reis Oliveira (JERO) (4): Como era Alcobaça nos tempos dos primeiros Coelhos

 


1. Do livro, Família Coelho,(*) da autoria do nosso camarada José Eduardo Oliveira (JERO) (ex- Fur Mil da CCAÇ 675, Quinhamel, Binta e Farim, 1964/66), aqui fica mais um apontamento, ainda dedicado a Alcobaça.



Parte IV

Que figuras notáveis: - É o tempo de (entre outros) Manuel Vieira Natividade (que nasceu em 1860 no Casal do Rei), do Dr. Brilhante, do Dr. Décio Sanches Ferreira, de António de Sousa Neves. Joaquim Ferreira de Araújo, que em 1878 é o fundador da Companhia de Fiação e Tecidos de Alcobaça, é também figura de destaque na sociedade alcobacense.

Que qualidade de vida: - O estado moral e intelectual da maioria moradores era baixo.
Em geral não eram letrados e o pouco tempo livre, depois das suas duras ocupações diárias, era passado em tabernas.
Quem tinha posses, ou necessidade de viajar, apanhava os carros da Mala Posta, na Rua D. Pedro V. Uma viagem à Batalha, com partida de diligência, frente ao Hotel Alcobacense, demorava duas horas e custava 3.000 réis (3$000).


O Asilo da Infância Desvalida de Álvaro Possolo prestava serviços humanitários e dava assistência às crianças. Desde 1888 funcionava a Associação dos Bombeiros Voluntários de Alcobaça, de que foi 1.º Comandante Manuel Vieira Natividade.



O Hospital da Misericórdia de Alcobaça, inaugurado em 15 de Agosto de 1890, passa por grandes dificuldades económicas em 1900.


Em redor do coreto do “Rossio” já havia 22 candeeiros com luz eléctrica.
Em 30 de Abril de 1899 as gentes de Alcobaça viram passar pela primeira vez um automóvel!

Que hábitos: - Só nas famílias abastadas havia alguma convivência entre senhoras e meninas, através de reuniões em casa de uns e de outros.

Nas classes mais elevadas os homens, depois do trabalho, iam para as boticas e não é difícil adivinhar quem frequentaria os saraus literários, o teatro e os bailes de máscaras.


Nas classes baixas os homens trabalhavam de sol a sol, faziam umas “libações” no “pós-laboral” e seguiam para casa normalmente “entornados” onde os esperavam as mulheres e os filhos, eventualmente candidatos a uns sopapos para “animar” o serão! As mulheres tinham filhos, criavam-nos como podiam e, sempre que tinham algum tempo disponível, “faziam meia“ e juntavam-se para conversar. Para “teatro” bastavam-lhes as “comédias” e os “dramas“ diários, embora um grupo teatral alcobacense – Grupo Dramático Villa Nova – tivesse conseguido grande aceitação junto de uma população menos favorecida mas, nem por isso, menos ávida de conhecimento.

E os nossos COELHOS?

No “moinho do Couto” trabalhava-se bastante. A roda vertical, exterior ao edifício, era movimentada dia e noite, pelo rio.


A moagem funcionava no piso térreo e a habitação era no primeiro piso. No piso térreo, iluminados por uma pequena janela, alinhavam-se quatro pares de mós, duas para o trigo, talhadas em calcário (as alveiras) e duas para o milho, talhadas em granito (as segundeiras)

E nos primeiros anos do novo século chega ao fim a vida do “Casal Fundador". Em 1901 morre a “Avó” ROSA MARIA, de que infelizmente pouco se sabe.)

É o ano em que chegaram a Alcobaça os refugiados boers da Guerra do Transvaal).

E cinco anos depois, em 1906, deixa o mundo dos vivos o Avô Porraditas com 80 anos de idade. Uma vida de trabalho e canseiras iniciada ao som dos assobios dos búzios de barro presos nas espias das velas brancas de linho dos Moinhos de Alqueidão da Serra e terminada junto às águas calmas do Rio Alcoa, em terras de Santa Maria de Alcobaça.


Os “sete magníficos” começam a voar sozinhos, ou melhor, porque são COELHOS ganham direito às suas raízes... enfrentando a vida sem desfalecimentos – a maioria deles à martelada porque... trabalham a arte do ferro... e são bons no seu ofício.

Serralheiros e, nos intervalos, bombistas: Quatro irmãos (o Joaquim, o Zé “Preto”, o Júlio e o António “Russo” ), hábeis serralheiros, com oficina na Rua Frei Estêvão Martins, viveram intensamente os tempos conturbados do assalto ao Quartel em Janeiro de 1919.


A página 137, do livro de Bernardo e Silvino Villa Nova, “Breve História de Alcobaça” é referido que em 11 de Janeiro de 1919, civis armados, auxiliados por oficiais revoltosos de Regimento de Artilharia 1, aquartelado em Alcobaça, tomaram posse do quartel, prenderam o Comandante e alguns oficiais e seguiram para Santarém, principal núcleo do movimento revoltoso.

No dia 13 seguinte, encontrando-se Alcobaça desguarnecida, entrou nela tropa de Infantaria 7, fiel ao Governo, tendo-se seguido a prisão de largas dezenas de pessoas... e até 24 do mesmo mês viveu-se um regime de terror, com violação de domicílios e atropelos vários.

Pois também os quatro irmãos da nossa história e a sua oficina estivaram na mira das forças da ordem de então por terem sido denunciados por inimigos políticos. Eram acusados do fabrico de bombas para a revolução.

Foi um elemento da GNR, que no final da busca, certamente cansado, enfarruscado e desiludido por nada ter encontrado que proferiu a frase que veio a tornar conhecida a oficina dos 4 irmãos:
- Que oficina danada!...


Quanto às bombas elas estavam lá perto, dentro de um cesto que, preso por um arame, estava mergulhado nas águas escuras do Rio Baça que passava nas traseiras da oficina.


Se têm aberto a janela enferrujada das traseiras e puxado o arame estes nossos parentes teriam ido mesmo presos. Parafraseando a histórica expressão do soldado da GNR tiveram uma sorte danada!... O dia a dia da oficina era duro, trabalhando-se de sol a sol, recebendo-se à semana por conta das obras encomendadas.


Vestiam fatos de ganga, fechados até ao pescoço, e protegiam a cabeça com bonés com pala de oleado.

Pela ordem natural das coisas estes nossos COELHOS da primeira Geração vão envelhecendo junto dos COELHOS da segunda geração, que se fazem à vida desfrutando... novos tempos... num Portugal e numa Alcobaça um pouco melhor da que tiveram seus Pais e Avós.
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Notas do editor

(*) Poste anterior de 14 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14149: Notas de leitura (670): Do livro "Família Coelho", edição de autor, 2014, de José Eduardo Reis Oliveira (JERO) (3): Como era Alcobaça em 1890

Último poste da série de 19 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14163: Notas de leitura (671): “O Império da Visão, fotografia no contexto colonial português (1860-1960)”, com organização de Filipa Lowndes Vicente, Edições 70, 2014 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P14165: Memória dos lugares (283): Gadamael... O enigma do acrónimo ou sigla ASCO que consta de um edifício em ruínas (que era messe de oficiais no tempo da CART 2410...) pode estar decifrado: trata-se de uma filial da empresa sírio-libanesa Aly Souleiman & Companhia (Luís Graça / Mário Vasconcelos)


 Um dos muitos anúncios de casas comerciais que existiam na Guiné em 1956. A empresa  Aly Souleiman & Companhia, com sede em Bissau, tinha filiais em diversos  pontos do território da Guiné, de norte a sul, ncluindo Bafatá e Gadamael. "Aly Souleiman  (apelido grafado à francesa...),  e não "Ali Suleimane" (à portuguesa) era um  próspero comerciante sírio-libanês.

 O acrónimo da empresa era ASCO, tal como o seu endereço telegráfico... Algumas das mais importantes empresas estrangeiras, e nomeadamente as de origem francesas, com negócios no Senegal e na Guiné portuguesa, usavam acrónimos: NOSOCO, SCOA, CFAO... Está, definitivamente, explicado o  mistério do acrónimo ASCO que aparece num edifício de Gadamael, e sobre o qual já especulámos bastante


Foto: © Màrio Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Foto: © Màrio Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]




Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CART 2410 (1968/69) > Messe e quarto de sargentos... Neste edificio funcionou a filial da empresa ASCO - Aly Souleiman & Companhia...  A misteriosa sigla, A.S.C.O., já lá estava nessa época, e continua lá. (*)

Foto (legenda): © Luís Guerreiro (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Gadamael Porto > 10 de Outbro de 2010 > Detalhe  de um edifício abandonado, possivelmente dos anos 30/40 do Séc. XX > "Antiga messe de oficiais e depois hospital", escreve o Pepito, na legenda... Surpreendente foi, para  nós, a sigla ou acrónimo A.S.C.O. que encima a parte superior da parede lateral do edifício, com as letras ainda perfeitamente legíveis e bem conservadas, contrariamente ao resto do edifício, em ruínas... Tudo indica que essas letras tenham sido fixadas na parede em data posterior à construção do edifício (**),

Foto: © Pepito / AD -Acção para o Desenvolvimento (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


1. Já aqui publicámos vários postes sobre esta sigla misteriosa... A hipótese de ser de uma casa comercial que por aqui terá existido antes da guerra, já tinha sido ventilada... 

Ontem, ao editar o poste P14164, e ser confrontado com o anúncio da casa comercial Aly Souleiman & Companhia, fez-se-me  luz e exclamei:

"Eureka!... Está decifrado o enigma da palavara ASCO erm Gadamael!"...

Este anúncio veio publicado na revista "Turismo", edição de janeiro/fevereiro de 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2 (número temático dedicado à Guiné, então a atravessar um período de expansão comercial, havendo lojas por todo o território).

Este e muitos mais anúncios de casas comerciais foram-nos facultados, para apreciação e eventual publicação,  pelo nosso camarada Mário Vasconcelos (***). 

A princípio era uma pista, mais concreta e verosímil... Mas havia um pequeno problema: qual o significado do O final ?... A sigla ou acrómimo aparece na parede sob a forma de quatro letras, separadas por um ponto: A. S. C. O. Trata-se seguramente de abreviaturas... Poderia ser Aly Souleiman & Companhia ?

Hoje não temos dúvida: na sequência de uma análise mais atenta e detalhada do anúncio  comercial , de 1956, verificamos que a sigla ASCO   é o endereço telegráfico da firma! (****)

Há uma diferença entre sigla e acrónimo:

Sigla é o vocábulo formado com as letras ou sílabas iniciais de uma sequência de palavras e que geralmente se pronuncia soletrando o nome de cada letra (ex.: UE = União Europeia; FMI= Fundo Monetário Internacional; OMS = Organização Mundial de Saúde; PAIGC=Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde; UNL = Universidade NOVA de Lisboa)

Citação: "sigla", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://www.priberam.pt/dlpo/sigla [consultado em 20-09-2017].

Acrónimo é a alavra formada com as letras ou sílabas iniciais de uma sequência de palavras, pronunciada sem soletração das letras que a compõem (ex: OVNI = Objecto voador não identificado, PALOP = País africano de língua oficial portuguesa; FRELIMO=Frente de Libertação de Moçambique).

"acrónimo", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://www.priberam.pt/dlpo/acr%C3%B3nimo [consultado em 20-09-2017].
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Guiné 63/74 - P14164: Historiografia da presença portuguesa em África (49): Revista de Turismo, jan-fev 1956, nº especial dedicado à então província portuguesa da Guiné: anúncios de casas comerciais - Parte I (Mário Vasconcelos)












Alguns das dezenas de anúncios de casas comerciais inseridos na revista Turismo, jan/fev 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2, nº especial dedicado à província portuguesa da Guiné. Alguns dos nomes são-nos familiares: por ex,, (i) o António Amante Rosa, de Fulacunda, que era pai do nosso camarada Manuel Amante Rosa, e que depois mais tarde será armador, com barcos que faziam o  rio Geba, mas também a ligação de Bissau com os Bijagós;  (ii) Inácio Júlio Semedo, de Bambadinca, pai de  Inácio Semedo Júnior (ex-guerrilheiro e quadro do PAIGC, ex-embaixador aposentado, com residência em Lisboa, em 2008); (iii) José Gardette Correia, de Bissorã, pai do Manuel Gardete Correia (médico)...  Por outro lado, os libaneses tem eram comerciantes com forte implantação no território; a empresa Aly Souleimane & Ca, de importação e exportação, com sede em Bissau, tinha nada mais nada menos do que 15 filiais no território: desde Bambadinca a Contuboel, desde Farim a Gadamael...

Estes anúncios não deixam de refletir o clima de relativa prosperidade económica da província que se vivia nos meados da década de 1950, ainda longe das ameaças da guerra... Recorde-se que faz 52 anos, no próximo dia 23 de janeiro de 2015, que se iniciou oficialmente a guerra de guerrilha com o ataque a Tite.

Fotos: © Màrio Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição: LG]


1. Mensagem, com data de ontem, do nosso camarada Mário Vasconcelos  [, ex-alf mil trms, CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, COT 9 e CCS/BCAÇ 4612/72, Mansoa, e Cumeré, 1973/74; foto atual à esquerda]:


Tenho em posse a revista TURISMO, publicada em Janeiro/Fevereiro de 1956, ano XVIII, 2ª série, nº 2, a qual refere ser um número especial dedicado à (então) Província da Guiné. [Foto da capa, a seguir].

Nas voltas que o tempo tece, fui descobri-la no espólio de meu pai- que
Deus o tenha em descanso merecido - e que, quem diria, só agora se encontra como elo de ligação ao meu tempo de serviço militar por tais paragens. Paragens estas, forçadas, mas que me têm dado, fortificados e inesquecíveis laços de amizade com muitos camaradas, que de outro modo não existiriam.

Pena tenho de a não ter levado comigo, quando mobilizado, pois poderia ter-me permitido constatar, in loco, algumas das notícias publicadas e abrir-me à recolha de dados que estiveram presentes e não foram apreciados devidamente, nomeadamente os aspectos étnicos e as transformações havidas.

Farei referência, futura, a alguns escritos então publicados (se for de interesse geral), mas, por agora limito-me a aspectos de economia local (década de 1941-1950) bem como a menção (passe a publicidade) de vários anúncios de casas comerciais desse tempo, e tentar fazer luz, sobre se algumas destas existem no real ou apenas em memórias.

Mais certo será que a grande maioria, se não a sua totalidade, tenham perecido no tempo. Bem vistas as coisas, mais de um bom punhado de anos são passados.

Deixo aos editores, como não poderia ser de outro modo, o interesse de, total ou parcialmente, proceder à publicação.

Com um alfa bravo me despeço de todos os camarigos.

Mário Vasconcelos

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Guiné 63/74 - P14163: Notas de leitura (671): “O Império da Visão, fotografia no contexto colonial português (1860-1960)”, com organização de Filipa Lowndes Vicente, Edições 70, 2014 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Janeiro de 2015:

Queridos amigos,
“O Império da Visão” é um documento extraordinário, ao longo das suas 500 páginas ficamos a entender como entre 1860 e 1960 a fotografia foi o principal modo de tornar o mundo visível, uma imagem que jaz nos arquivos coloniais do presente e sobre a qual a nova historiografia tem muito a apostar: são momentos preciosos que falam da antropologia e da etnografia, da botânica e da medicina tropicais, de exploradores e de exposições, de denúncias do colonialismo, das revistas, da literatura, dos aparatos imperiais.
Uma obra que desvela a estetização do colonial graças a uma laboriosa investigação em bibliotecas e arquivos públicos. É o princípio da aventura, pois quando estes investigadores descobrirem o nosso blogue irão ficar siderados com o nosso acervo, passe a imodéstia com que invoco o nosso orgulho coletivo.

Um abraço do
Mário


Memória e fotografia no contexto da guerra da Guiné

Beja Santos

“O Império da Visão, fotografia no contexto colonial português (1860-1960)”, com organização de Filipa Lowndes Vicente, Edições 70, 2014, é um empreendimento científico extraordinário. O que se diz na contracapa é elucidativo: “A fotografia não foi uma mera ilustração das colónias. A fotografia criou experiências coloniais. Os estudos recentes sobre colonialismo reconhecem como, ao lado da documentação escrita, as imagens são determinantes para se compreenderem e estudarem os impérios. Nas histórias entrelaçadas entre o império e a visão que se contam neste livro, destacam-se alguns temas: a fotografia usada como um instrumento inseparável dos vários saberes científicos que usaram as colónias como laboratório, da história natural à antropologia ou à medicina; fotografia como afirmação do poder; a fotografia apropriada pelos sujeitos colonizados, como também pelos europeus anticolonialistas, enquanto forma de resistência, no forjar de identidades nacionais”.

Trata-se de uma empolgante viagem onde a Guiné é largamente necessitada: logo na missão antropológica e etnológica da Guiné (1946-1947), que teve à cabeça o prof. Mendes Corrêa e as suas teses raciais hoje totalmente destituídas de fundamento; viagens dos régulos da Guiné a propósito das idas a Meca, bem como participação de guineenses nas exposições coloniais; e as imagens de guineenses combatentes de um lado e do outro enquanto meio de memória da guerra. É este o último tema que trazemos à consideração do leitor. Autora do artigo, Catarina Laranjeiro, dá-nos conta de que a prática fotográfica era frequente nos rituais associados à vida militar portuguesa (caso dos juramentos de bandeira, provas de recruta, imagens captadas em formaturas em Bolama, etc.) e do lado da guerrilha existe um apreciável acervo fotográfico relacionado com reportagens de jornalistas estrangeiros em bases dos PAIGC ou missões diplomáticas do PAIGC junto de países apoiantes. A autora entrevistou pessoas de um lado e do outro. Constata que um bom número de dirigentes do PAIGC era constituído por pessoas conhecidas por assimilados e cita dois excertos de entrevista: “Eu sou de uma família, parte de pai francês mestiço, parte de mãe negra, mas com meios de fortuna e preparação. Porque o meu avô, pai da minha mãe, negro, mandou educar os filhos todos em Portugal, e tinha fortuna…" e: “Fui estudar primeiro na Faculdade de Ciências e depois no Técnico (em Lisboa) e com os outros jovens cabo-verdianos e guineenses desenvolvemos uma atividade política que veio a desembocar na criação de um comité do PAIGC em Lisboa (…). Eu como tinha problemas de serviço militar, abandonei Portugal. Vou para Paris, e é aí que eu conheço Amílcar Cabral”.

Estes comandantes da luta, diz a autora, tornaram-se parte da nova elite nacional e ocupou lugar dos antigos governantes portugueses, todas as residências de Bissau que pertenciam à administração colonial passaram para as mãos desta elite. Diz a autora: “As fotografias que me mostravam eram fotografias de um mundo que já não existe: um bloco de Leste que apoiava incondicionalmente a libertação das colónias africanas e que espalhava o ideal marxista-leninista”. E mais adiante: “Foi ao fim de algumas entrevistas que me apercebi que este exercício era absolutamente inútil”. Porque tudo era silêncio perante um passado que perdera significado. E há mais: “Estes homens e mulheres são políticos formados em países como a antiga URSS, Cuba ou Checoslováquia. Ao longo das minhas entrevistas, mesmo sem a presença das fotografias, não consegui que tivessem o mínimo de espontaneidade. Cada palavra ou frase já tinha sido dita antes, ensaiada”.

Passando para os combatentes do exército colonial português, a autora também confessa que também aqui as coisas não correram bem. Pediu apoio logístico à embaixada de Portugal e foi-lhe cedido um espaço no Centro Cultural Português. Nesse edifício trabalhava o sargento Viana que era o seu interlocutor privilegiado com a Liga dos Antigos Combatentes. Ela via uma fila enorme de gente de todas as manhãs à porta da embaixada. O sargento Viana pô-la em contacto com a liga dos antigos combatentes. E ficou atónita pois logo na primeira entrevista o seu interlocutor pediu-lhe para pressionar o sargento Viana para lhe assinar a documentação que lhe permitisse ir para Portugal. E não esconde a sua deceção: "todos os antigos combatentes estavam comigo com a esperança que, de alguma forma, a colaboração com a minha investigação lhes trouxesse algum benefício. Eu apenas me propus a ouvir a sua história e eles pediam-me apoio, num discurso impregnado de uma hierarquia colonialista, no qual o branco é que detém o poder. Aproveitar-me da sua situação para recolher dados para a minha investigação seria uma enorme falta de ética". Descobriu que os seus interlocutores tinham feito desparecer as fotografias, a seguir à independência os antigos combatentes guineenses procuraram desembaraçar-se de documentos, fotografias de todo o tipo. Um dos entrevistados não lhe escondeu a sua mágoa e deixou um alerta: “Nem que morramos todos, os nossos filhos ficarão cá a lutar pelos direitos dos seus pais”. E a autora conclui: “A memória das lutas de libertação vive uma parábola análoga à de outros movimentos emancipadores, na medida em que a sua memória pública desapareceu. Hoje o povo guineense não é visto como um povo que conduziu uma luta bem-sucedida contra o regime colonial. Tal como outros movimentos emancipadores africanos contra o imperialismo, este também foi silenciado e recoberto por outras representações africanas do mundo. Hoje, o povo da Guiné-Bissau é outra vez vítima, na medida em que continua a ser objeto de salvamento. Por seu turno, os países europeus, outrora colonizadores, como Portugal, continuam a cumprir a sua ‘missão civilizadora’, agora envolta na capa ideológica do apoio ao desenvolvimento”.

E dei comigo a pensar quando estive na Guiné em 2010 para me despedir dos meus antigos soldados, as precauções com que tiravam do vestuário sacos de plástico de onde saiam, por vezes em retalhos, os seus documentos militares, incluindo a caderneta, as folhas com louvores, e sorriam, era impossível que nosso alfero não viesse de longe sem trazer as boas notícias da pensão digna depois de tanto sofrimento… E como doía ter que explicar, uma, duas, três, muitas vezes, que infelizmente eu não tinha poder para contrariar a indiferença da História.
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 Nota do editor

Último poste da série de 14 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14149: Notas de leitura (670): Do livro "Família Coelho", edição de autor, 2014, de José Eduardo Reis Oliveira (JERO) (3): Como era Alcobaça em 1890