terça-feira, 21 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14912: Recortes de imprensa (73): Duas guerras na fronteira dos felupes, artigo de Pedro Rosa Mendes no jornal Público de 19 de Fevereiro de 1999 (António Martins de Matos)

1. Mensagem do nosso camarada António Martins de Matos, TenGen Pilav Ref (ex-Tenente Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74), com data de 19 de Julho de 2015:

Caros amigos
Ao passarinhar pela internete encontrei este texto de 19-02-1999 e da autoria de Pedro Rosa Mendes.
Assunto tabu ou no mínimo reservado, tem muito a ver com a posição do Senegal no "nosso" conflito.

Abraços
AMM

************

Duas guerras na fronteira dos felupes

Pedro Rosa Mendes, em Suzana 
19/02/1999

Na fronteira com Casamansa, vê-se melhor que há duas guerras que são a mesma. O Senegal bombardeia do lado guineense, os guerrilheiros descem a Bissau para enfrentar o exército de Dacar e refugiados encontram-se fugindo em direcções opostas. "Quando acabar aqui, vai ser ainda pior do lado de lá."

Às sete da manhã, quando o sol está prestes a entrar na igreja, o padre José Fumagalli toca o primeiro hino no pequeno órgão electrónico que pôs ao canto do altar. Na mochila trouxe também o missal em língua felupe, as hóstias, o cálice e a caixinha de cinzas para verter sobre a cabeça dos fiéis. Ainda antes de a missa começar, o missionário acompanha já com o corpo - calça tamancos brancos - o ritmo dos tambores que dois rapazes aqueceram numa fogueira, para lhes tirar a humidade da noite.
A fronteira do Senegal fica perto e, sobre ela, ouviu-se horas antes o estrondo de uma outra guerra - que é a mesma que se combate lá longe em Bissau.
Na região noroeste da Guiné, ao longo da fronteira com o Sul do Senegal, é mais difícil do que em Bissau distinguir o conflito guineense de um outro, mais antigo, iniciado há década e meia pelos guerrilheiros independentistas do Movimento Democrático de Libertação de Casamansa (MDLC).

Pelas picadas da região de Suzana e Varela, guerrilheiros senegaleses pedem boleia para Bissalanca - na linha da frente dos revoltosos guineenses -, circulando por tabancas que servem de retaguarda ao MDLC e que o exército de Dacar fustigou várias vezes desde Junho passado.
A linha de fronteira guineense é, para Dacar, mais uma frente de combate contra a Junta Militar, e esta semana foi possível ouvir em Suzana o som da artilharia pesada do lado senegalês. Já não se ouve "aquele maldito avião senegalês que bombardeava as tabancas do lado guineense, de Bijene a Varela", explica o padre Fumagalli, "porque a Junta montou uma rede de mísseis Strella".
A guerra de Casamansa, porém, continua a marcar o quotidiano do Norte da Guiné. "A situação humanitária não parece grave. Não parece. Mas isso é um engano", diz o missionário italiano, que chegou à Guiné há mais de 40 anos e conhece por dentro a sociedade felupe. "A desnutrição das crianças neste meio não se vê por uma questão cultural dos felupes, que garantem que os mais novos comem mesmo que mais ninguém coma. Mas há muita escassez de alimentos. O padre Fumagalli recorda que "os refugiados de Bissau", um terço da população do país que se espalhou pelas tabancas do interior, "não ficaram em campos: alojaram-se em casa de parentes e há residências que quadruplicaram o número de bocas. As reservas de comida foram partilhadas com quem chegou."

Desde o início do conflito, houve apenas duas distribuições de alimentos no Noroeste, uma em Agosto, da Cooperação Portuguesa, e outra do Programa Alimentar Mundial, através da Cruz Vermelha, em Outubro - quatro meses depois do eclodir da crise. "O pouco arroz que os habitantes daqui tinham não é suficiente para ter uma reserva e a chuva, que foi abundante noutras zonas da Guiné, não deu em Suzana-Varela."  O padre Fumagalli prevê que em Maio ou Junho próximos as populações não terão já alimentos, ainda por cima a mais de meio ano da próxima colheita e na altura mais intensa de preparação dos campos. "Estarão a trabalhar sem comer", avisa o missionário, contrariando a ideia de relativo desafogo que as agências humanitárias têm do que se passa em Suzana. "Dentro de três meses, a situação será muito mais dramática do que até agora. "Os bombardeamentos senegaleses provocaram também o abandono de muitos terrenos férteis ao longo da fronteiras, o que explica que, apesar de haver mais braços com a vaga de deslocados, o ano agrícola tenha sido pobre.

A vida em Suzana-Varela é actualmente perturbada por uma dupla crise: há uma vaga de refugiados na Baixa Casamansa - cerca de 30 mil, segundo várias organizações humanitárias - e parte deles atravessou para tabancas guineenses, "porque as pessoas estão fartas de guerra e porque, como se diz, Guiné e Casamansa são peixes que nadam na mesma água", explica José Fumagalli. O padre considera que do lado senegalês "a situação está cada vez mais pesada. O Alto Comissariado da ONU para os Refugiados nunca mais apareceu desde o início da guerra".
"Nós ajudámos gente de Casamansa" nos últimos meses, conta um felupe que combateu no exército colonial português, António Sitanhebé. "Houve gente que se refugiou directamente nas nossas casas. Demos-lhes arroz mas depois preferimos dar-lhes terras e palmeiras para furar." António Sitanhebé vive na tabanca de Cassalol, na estrada de Suzana para Varela. Um bombardeamento aéreo senegalês matou uma mulher e feriu gravemente outra, no Verão passado.

Acontece, por causa de incidentes como esse, que tabancas fronteiriças do lado guineense sofrem uma sangria de população, que foge para norte. Foi isso que fez a mulher de Ricardo Ampaboine, um felupe de Suzana que, no início da revolta de Ansumane Mané, decidiu alistar-se nas forças da Junta. A mulher de Ricardo está ou em Ziguinchor, principal cidade de Casamansa, ou algures na Gâmbia, porque Ricardo tem família em três países. Para ele, a descida a Bissau para combater as forças lealistas e o exército senegalês foi apenas natural. "Nós e os de Casamansa somos irmãos", justifica Ricardo. "Quando a guerra da Guiné acabar", assegura António Sitanhebé, "a do lado senegalês será ainda mais forte, até Casamansa conseguir a independência."

Com a devida vénia ao jornal Público
____________

Nota do editor

Último poste da série de 8 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14231: Recortes de imprensa (72): Portugual e Espanha: parecenças e diferenças... Esterótipos: (i) "Portugueses, pocos, pero locos"; (ii) "De Espanha nem bom vento nem bom casamento...

Guiné 63/74 - P14911: Convívios (697): Encontro do pessoal da CCAÇ 3327, dias 24 e 25 de Julho de 2015, em Fazenda, Laje das Flores, Ilha das Flores, Açores (José da Câmara)

1. Mensagem do nosso camarada José da Câmara (ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73), com data de 20 de Julho de 2015:

Queridos amigos, 
Infelizmente tenho tido algumas dificuldades em mandar o programa para o nosso convívio. 
Para já, isto é o melhor que podemos fazer. Se houver necessidade de ajustamentos isso será feito de acordo com as necessidades do momento. 

A volta à ilha, cortesia da Câmara Municipal, só poderá contar com 16 lugares. Daí pedir-vos que aqueles que tenham carro o usem para podermos estar todos juntos. 

Nas Lajes das Flores, o Restaurante Hélio, ao cima da Avenida do Emigrante e o Café junto do Porto das Lajes, serão os locais de encontro durante a semana, a partir de amanhã. 

Sejam bem vindos ao Conselho das Lajes das Flores e ao convívio da CCAÇ 3327. 

Um grande abraço. 
José Câmara 
Casa: 292 593 282 
Telemóvel: 917 784 544 

____________

Nota do editor

Último poste da série de 15 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14881: Convívios (696): Rescaldo do encontro do pessoal da CART 6250/72, levado a efeito no passado dia 11 de Julho em Oliveira do Bairro (António Murta)

Guiné 63/74 - P14910: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (12): De 26 de Maio a 8 de Junho de 1973

1. Em mensagem do dia 17 de Julho de 2015, o nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), enviou-nos mais uma página do seu Caderno de Memórias.


CADERNO DE MEMÓRIAS
A. MURTA – GUINÉ, 1973-74 

12 - De 26 de Maio a 8 de Junho de 1973

26 de Maio de 1973 - (sábado) - Cumbijã

À tarde houve uma flagelação a Aldeia Formosa mas sem danos. Usaram canhão sem recuo e foguetões 122. Só para instabilizar e dizer “estamos aqui”. Onde será a próxima?

Face à nossa deplorável situação em Cumbijã, com o prolongar de uma estadia para a qual não vínhamos preparados, resolvi enviar uma carta ao nosso Comandante em Aldeia Formosa:

“26.05.73, Cumbijã.
 Exmo. Cmdt.
 Antes de mais, peço desculpa pelo modo pouco formal de me dirigir a V. Exa., mas limitações circunstanciais obrigaram a que assim fosse.
A seguir, quero apelar para a sua pessoa, como responsável e influente, para que, independentemente de quaisquer movimentos tácticos das tropas ou meras operações, nos possa dispensar ou fazer render com a maior brevidade possível, pois se torna pior, a cada dia, a nossa estadia aqui.
Vínhamos preparados para estar fora de Nhala durante 3 dias e já faz hoje 12 dias que aqui vegetamos, sem nos lavar convenientemente e sem nunca mudar de farda, suportando um serviço, por vezes sobrecarregado, para quem está em tão precárias condições.
Ontem, pelas 23h30, chegou aqui a CCAV 51 que, com toda a razão, fez sair das suas tendas os homens dos dois grupos de Nhala, forçando-os a dormir ao ar livre, suportando nessas condições o temporal que pouco depois se abateu sobre Cumbijã.
O pessoal, além do descontentamento justificado, pelos indícios, está em vias de esgotamento físico.
Agradeço antecipadamente, enviando-lhe os meus respeitosos cumprimentos.
Alf. Mil. António M. Murta Cavaleiro.”

Foi portador desta carta o furriel Guimarães “velhinho” da CCAÇ 3400 de Nhala que está aqui em Cumbijã a comandar o seu grupo, junto do meu. Mas a carta nunca chegou ao destino porque ele, à passagem por Mampatá, falou com o Cap. Marcelino e este expôs o problema (deve ter lido a carta), ao Cmdt. Intº Major DM. Resultou. Não é por acaso que a “velhice é um posto! À tarde fomos para Mampatá, onde dormimos.

[Hoje, parece redundante, depois do que foi descrito antes sobre a nossa situação, a transcrição desta carta que nem chegou ao destino mas, por outro lado, dá bem a ideia de até onde eu estava disposto a ir para ser ouvido, sob pena de deixar agravar o estado físico e emocional de todo o pelotão. Ou permitir que se sublevassem].


27 de Maio de 1973 – (domingo) – A dança dos pelotões

Nhacobá voltou a ser flagelada com morteiro 82, tendo a habitual resposta da nossa artilharia.
Finalmente, vamos para Nhala. Saímos cedo de Mampatá e à chegada tive um enorme desapontamento. Na mesma coluna em que chegámos, partiriam os grupos dos alferes C. L. e do J. A. C. P. acompanhados do capitão B. da C.
Vou passar aqui algum tempo sem nada de especial para fazer. Vou-me ocupar a ler e a fazer fotografia. Há já algum tempo, em sociedade com Alf. J. A. C. P., comprei um estúdio de fotografia que pertencia a três furriéis da Companhia que viemos render, a CCAÇ 3400.


30 de Maio de 1973 – (quarta-feira) – O regresso ao inferno

Três dias volvidos após a chegada a Nhala, e eis que somos recambiados com destino a Mampatá. Recebi a mensagem e fiquei quase em estado de choque. Nunca a minha revolta esteve num patamar tão alto.
Feitos os preparativos, partimos depois do almoço, mas chegámos tarde a Mampatá. Portanto, está aqui toda a Companhia excepto o grupo da Formação (?).

À chegada aqui, soube uma triste notícia relacionada com um caso ocorrido em Aldeia Formosa entre o pessoal da 3.ª CCAÇ do meu Batalhão: um soldado, uma semana depois de ter tido uma discussão com um camarada acerca de futebol, foi à cama onde este dormia e matou-o com vários tiros de G3. Não consigo (nem conseguiu ninguém), achar uma explicação para o incidente. Se foi só por causa do futebol, foi simplesmente absurdo e lamentável.

Soube ainda que, afinal, Guidage também foi abandonada e depois ocupada pelo PAIGC. Quanto a Guilege, onde aconteceu o mesmo, já tinha a confirmação há algum tempo. Por tudo isto a situação está tão grave, principalmente nesta zona.


31 de Maio de 1973 – (quinta-feira) – A morte do Régulo

A zona de Nhacobá teve uma flagelação muito breve com morteirada.
Esta madrugada fui acordado pelo choro colectivo da população de Mampatá: morreu um homem que muito estimavam. Era o régulo Aliu Baldé de Mampatá e das populações de Aldeia Formosa e outras da região, e seu representante nas Assembleias do Povo em Bissau, além de comandante com o posto de alferes de uma Companhia de Milícias distribuída pela zona. Morreu de doença em Bissau, onde se havia deslocado para a referida assembleia, última ocorrida.

Saí com o grupo às 6 da manhã para a estrada com a missão de fazer protecção às máquinas da Engenharia, relativamente perto de Cumbijã. À chegada ali, começou a chover torrencialmente e foi debaixo de chuva gelada que nos mantivemos durante algumas horas. Depois, mais duas horas molhados até que a roupa secasse no corpo, agora sob um calor abrasador e húmido, apesar do sol encoberto. Diria mesmo que estávamos expostos ao vapor de uma panela de pressão. De regresso a Mampatá entrei de serviço ao aquartelamento.


1 de Junho de 1973 – (sexta-feira) – A “festa” IN tem-me passado ao lado

Da História da Unidade de BCAÇ 4513:
“JUN,01 – Tornou a haver flagelação a Nhacobá com morteiro 82 e RPG da região de SAMENAU.
- Um GR COMB / 1.ª CCAÇ teve contacto IN ao montar segurança próxima ao destacamento de Cumbijã. As nossas tropas sofreram um ferido grave".

Do meu diário:
Estou, portanto, de serviço ao aquartelamento de Mampatá. Todos os grupos restantes da minha Companhia saíram para missões de protecção às obras da estrada e aos destacamentos, em virtude de uma visita do Gen. Spínola, que não se chegou a verificar.
Entre elementos de um dos grupos da 1.ª CCaç do capitão B. D., emboscados aqui na zona, verificou-se um grave incidente [que não é mencionado na História da Unidade]: um soldado disparou um tiro para algo que viu mexer no mato, e logo vários camaradas desencadearam fogo sobre ele, supondo tratar-se de um ataque IN. Talvez que as distâncias que os separavam fossem exageradas ou, ainda, que tivessem (...). O que é certo, é que o soldado que disparou primeiro levou vários tiros numa perna, partindo-lhe a tíbia e furando-lhe o perónio. Depois do incidente, foi evacuado.

À tarde verificaram-se aqui as cerimónias fúnebres do Régulo Aliu Baldé, de cariz muçulmano e militar. Compareceram nas mesmas, o Comandante do Batalhão Ten Cor C. A. S. R., o 2.º Comandante Major D. M., Alferes Capelão e outros. Formou-se um pelotão de milícias comandado pelo meu camarada Alf Câmara, que rendeu as devidas honras militares ao morto.


2 de Junho de 1973 – (sábado) – Dia de descanso. 

Nada de especial a assinalar.


3 de Junho de 1973 – (domingo) – Cumbijã flagelada.

Cumbijã voltou a ser flagelada com 20 granadas de morteiro 82 mas sem consequências. [Da H. da Unidade].


6 de Junho de 1973 – (quarta-feira) – Visita do General Spínola.

Mais uma vez foram montados dispositivos de segurança entre Cumbijã e Nhacobá para acautelar a visita do Comandante-Chefe Gen. Spínola e, mais uma vez, esta não se realizou. [Extracto da H. da Unidade BCaç3852].


8 de Junho de 1973 – (sexta-feira) – Entrada inopinada em Nhacobá.

Da História da Unidade do BCAÇ 4513:
“JUN, 08 – A partir desta data forças do BCAÇ passaram a ser empenhadas na protecção do Destacamento de Engenharia na estrada CUMBIJÃ-NHACOBÁ.
- Forças da 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513 encontraram em Nhacobá um saco contendo documentos IN em região GUILEGE 3 F 9-34, possivelmente abandonado quando da operação BALANÇO FINAL”.

Do meu diário:
Há vários dias que não registo o que quer que seja, mas porque nada tem havido de interesse, quase sempre a rotina, ou seja: fazer serviço aqui em Mampatá, fazer segurança às máquinas na estrada, tanto na frente como na retaguarda, etc.
Só ontem me desviei um pouco dessa rotina, para mal dos meus pecados, pois fui com o grupo escoltar a coluna Aldeia Formosa-Buba e volta. Foi um dia extenuante, quer pela dura viagem na picada em péssimo estado, quer pelos problemas com o pessoal que não depende de mim e, até, pelo excessivo calor suportado até às 14 horas aproximadamente, logo seguido de forte ventania e chuva muito fria.

Hoje, a saída daqui de Mampatá, fez-se, como sempre, por volta das 6h30, utilizando a coluna vinda diariamente de Aldeia Formosa com tropas e com a Engenharia. Da minha Companhia apenas ficou o 1.º GC, seguindo os restantes três comandados pelo Cap B. da C. com a missão de fazerem protecção às máquinas na frente de trabalhos.
Descemos das viaturas onde finda actualmente o alcatroamento, seguindo depois em fila indiana pela berma esquerda da estrada, picando sempre. Mais uma vez se me prende a atenção no espectáculo que é o movimento deste cordão humano, interminável e vagaroso que, contudo, parece ameaçador, tanto pelas fisionomias ásperas dos homens como pela quantidade de armas que carregam. Até à frente de trabalhos andámos cerca de 5 quilómetros mas, ainda a meio do caminho, quando seriam umas 7h30 da manhã, já o suor nos escorria abundantemente por todo o corpo, salgando-nos os olhos e atraindo a mosquitada.

Chegados onde actualmente estão os trabalhos de desmatação, montámos uma frente de protecção às máquinas que ali trabalham e que chegariam pouco depois de nós. Finalmente o pessoal teve oportunidade de descansar um pouco da longa caminhada, sobrecarregados e com a responsabilidade da picagem por onde passarão as máquinas e o resto do pessoal. Missão ingrata, porque essa pista lateral à estrada, para além do imenso pó, é de terras soltas, propícia à instalação de minas.

[Numa tarde, certamente muito depois desta data, ao fazermos o mesmo percurso, eu ia fixado na equipa de picagem à minha frente e comecei a ficar tão tenso e constrangido, – a imaginar que num instante, um daqueles homens, muito menos preparados do que eu, poderia ir pelos ares com o deflagrar de uma mina —, que mandei parar o grupo, tirei a pica a um deles e avancei eu no seu lugar, recomendando que os de trás pusessem os pés nas pegadas dos da frente. Eu ia com um presságio que não se confirmou, felizmente. Não é bravata, não, meus caros... Naquela situação de tensão, (houve muitas outras e isto não me aconteceu), com todos os sentidos num alerta esgotante, mais o sentimento de apreensão que eu levava, se acontecesse algo a um daqueles homens, eu não dormiria mais no resto da minha vida. Tive situações em que podiam ter sido atingidos homens com minas que nos escaparam à detecção, dentro de Nhacobá, por exemplo, mas isso é completamente diferente. Não sei se registei o episódio acabado de referir no meu caderno em data que ignoro, por isso aqui fica, para que não se julgue que apenas sentíamos calor, frio e as picadas dos mosquitos...].

A mata que estão a abrir aqui na frente de trabalhos, vai bater na extremidade direita das tabancas de Nhacobá, e é aqui que vai passar, definitivamente, a nova estrada, apesar de estar uma picada já aberta para o lado esquerdo, por onde chegaram, pela primeira vez, as nossas tropas quando se verificaram os contactos a que me referi há algum tempo atrás.

Por erro ou ignorância do ponto da situação no local, íamos com ordens de ficar pouco além da frente de trabalhos e antes de Nhacobá uns 300 a 400 metros. Porém, como a frente de trabalhos está a apenas 200 metros de Nhacobá, vimo-nos forçados a instalar o pessoal numa linha paralela às tabancas e distante destas, apenas 20 metros escassos, de terreno desarborizado que vigiávamos a partir da orla da mata onde havíamos chegado.

1973 - Nhacobá: algumas tabancas limítrofes.
Foto: © António Murta

A antiga base IN e as suas tabancas estavam mergulhadas num silêncio sepulcral, parte delas na penumbra sob as copas das árvores, o que inspirava um ar de mistério e de respeito. Mas despertava-nos um sentimento misto de apreensão e curiosidade, por desconhecermos se estariam por ali, ou na zona, tropas IN mas, também, porque ainda não tínhamos tido oportunidade de, com tempo, vasculhar o sítio e as coisas que, não há muito, eram do nosso inimigo. Contudo, havia ordens rígidas dos “crânios” para que ninguém se aproximasse de Nhacobá sem tropas a nível de duas companhias, ou seja, com efectivos de 400 homens ou mais. Como tudo isto é incrível e ridículo!... E nós ali estávamos com cerca de 70 homens.

Não tardou nada que chegassem até às nossas posições, as máquinas que abriam a estrada e simultaneamente desmatavam lateralmente uma larga faixa, arrancando pela raiz árvores de qualquer porte. O empreiteiro civil expôs-nos o problema: ou mandávamos vir mais tropas, ou íamos nós com o pessoal que tínhamos fazer um reconhecimento às tabancas, pois que ele tinha de avançar com as máquinas até à enorme bolanha do outro lado de Nhacobá. Ficámos, assim, num dilema de difícil solução. Então eu pedi ao Cap. B. da C. que me autorizasse a ir sozinho às tabancas fazer o reconhecimento, ao que ele acedeu com algumas reservas e muitas apreensões, lembrando-me os eventuais perigos. Mas, que fazer? A outra alternativa, impensável, era fazer parar os trabalhos da estrada, a meio do dia, e comunicar superiormente a necessidade de mais tropa.

Avancei de bagabaga em bagabaga, sempre providenciais [para todas as partes, digo eu, hoje], até menos de 10 metros das primeiras tabancas. Pareceu-me tudo vazio e sem constituir perigo para se avançar, excepto no respeitante a minas. Voltei para trás e avisei todo o pessoal instalado, para que não houvesse erros fatais, de que ia fazer a entrada nas tabancas com o meu camarada Alf. C. L. e três dos seus homens de pica em punho. Desloquei-me o mais possível para a direita, onde ficava a tabanca mais próxima e comecei por aí, levando na mão esquerda uma pica e na direita a G3. Ao meu lado seguia o C. L. com os seus homens picando sempre. Entrámos na primeira palhota, na segunda, terceira e assim por diante. Uma ou outra tinha porta e estava fechada, o que me obrigou a passar a lâmina da faca de mato pelas frestas, para a detecção de eventuais fios de armadilhas. Mas não. Nem havia no interior vestígios recentes. Tão pouco em toda a zona. Nem objectos esquecidos que tivessem pertencido ao PAIGC, porque aquando da primeira entrada ali das nossas tropas, quando se verificaram os contactos, e nas entradas seguintes, tudo foi levado pelos militares como recordação ou como material e bens a serem declarados.

Regressámos para junto do pessoal e informei o capitão de que podíamos avançar à vontade, (eu era o responsável da Companhia pelas minas e armadilhas), mas já nessa altura as máquinas investiam contra o matagal, arrancando tudo, até mesmo junto de algumas tabancas. Eram quase 12 horas quando o pessoal se fixou na orla da mata, entre as tabancas e a grande bolanha do outro lado de Nhacobá. Aproveitei para passar de novo tudo a pente fino, num reconhecimento feito a meias com o meu furriel JMP. Nada encontrámos de especial, para além de um celeiro ainda com bastante arroz em casca, já referenciado pela CCAV 51, uma granada defensiva das nossas que não explodiu e que eu desarmei desenroscando-lhe a cabeça para a guardar sem perigo, vários estilhaços das nossas granadas de obus, grande quantidade de recipientes de barro, na maioria partidos, várias latas de ração de combate de origem russa, restos de medicamentos e dois abrigos subterrâneos com uma resistência que eu calculo a toda a prova.

Depois disto, resolvi descansar um bocado e comer a minha ração de combate. Estava nestes preparos quando apareceu o meu camarada C. L. trazendo na mão uma enorme mochila que tinha sido encontrada por um homem do seu grupo, pendurada numa árvore e devidamente camuflada. Isto foi, sem dúvida, o acontecimento do dia: continha vários livros e grande quantidade de cartas, documentos, um mapa da Guiné e um planisfério, ambos de origem russa. [Foi algum deste material que eu recolhi por não ter interesse militar e que eu, há tempos, ofereci à nossa Tabanca e foi publicado].

Pelo que vi, alguns destes documentos e cartas, vão ter muito interesse para o nosso Comando, devido à importância do que revelam. Entre tudo isso encontrámos algumas fotografias de africanos tiradas na URSS, assim como documentos e processos disciplinares do tribunal das chamadas áreas libertadas, como pude ver nos cabeçalhos impressos desses documentos. Vi também alguns apontamentos sobre as características da nossa espingarda metralhadora HK 21 e sobre material de guerra do PAIGC.

Depois de tudo remexido havia que enviar aquilo para Aldeia Formosa na Chaimite que, por acaso, ali se encontrava. O Cap. B. da C. fez então recolher toda a papelada que circulava pelas mãos do pessoal, mas não conseguiu evitar que eu guardasse 3 pequenos livros e outros papeis, bem como o mapa da Guiné, [que ficou com o meu espólio em Nhala, aquando da minha vinda de férias sem regresso]. Os livrinhos, em português, têm os seguintes títulos: “Solidariedade”- Boletim de Informação publicada pela Agência de Imprensa NOVOSTI, (2 exemplares, sendo um de 1969 e outro de 1971), e “Palavras de Ordem Gerais”, de Amílcar Cabral.

Cerca das 14 horas regressámos a Cumbijã, novamente a pé, numa dolorosa caminhada por causa do calor e da sede. De Cumbijã regressámos a Mampatá nas Berliet.

(continua)

Texto e foto: © António Murta
____________

Nota do editor

Último poste da série de 14 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14877: Caderno de Memórias de A. Murta, ex-Alf Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (11): 23 e 24 de Maio de 1973

Guiné 63/74 - P14909: Memória dos lugares (308): Rios ? Subi o Geba até Bambadinca, naveguei no Bichaque e no Cumbijã, fui atacado no Cacheu, andei no Cacine e no Sapo... (António Dâmaso, srgt PQ, BCP 12, BA 12, Bissalanca, 1972/74)... O rio da minha tabanca, o Olossato (Paulo Salgado,ex-alf mil cav, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72)



Guiné-Bissau > Região do Oio > Olossato > Rio Olossato > 2006 

Foto: © Paulo Salgado (2006). Todos os direitos reservados [Edição: LG]




Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CCAÇ 3518 (1970/74) > Album fotográfico do nosso saudoso camarada  Daniel Matos (1951-2011) >  Foto 44 > "Cais de Gadamael, num momento de descarga do batelão (BM3), que nos abastecia e que ali deixava os produtos que transportaríamos nas colunas para Guileje... O rio que banhava Gadamael Porto era o Sapo, afluente do Rio Cacine, "

Foto (e legenda): © Daniel Matos (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados [Edição: LG]
  


1. Mensagem de António Dâmaso, srg mor PQ ref [BCP 12, BA 12, Bissalanca, 1972/74]

Data: 2 de julho de 2015 às 14:12

Assunto: Sondagem sobre ss nossos rios da Guiné

Ilustres camaradas!


Obrigado pelo convite para participar, mas o inquérito  (*) não me permite dizer "o que me vai na alma".

Das várias vezes que estive no Ultramar, fui um privilegiado por ter sido sempre transportado de avião.

Quanto a deslocações na Guiné, até certo ponto também usufruí desse privilégio.

Em 9 ou 10 de julho de 1969, subi o rio Geba até Bambadinca, neste trajeto lembro-me de ter passado por um estreito e de ter esperado que a maré enchesse, pelo menos isto é o que eu retenho em todos os meus sonhos de guerras travadas.

Mais tarde, em dezembro de 1972, naveguei no Bichaque e no Cumbijã.

Em Maio de !973, no Cacheu, por duas vezes onde fui envolvido no ataque do Patrulha.

Em Junho e Julho de 1973, naveguei no Cacine e no afluente [, Rio Sapo que banha] Gadamael Porto por quatro vezes.

Isto foi a minha passagem por rios da Guiné.

Um abraço

A. Dâmaso


2. Mensagem de Paulo Salgado, com data de 3 jul 2015 06:20


[ foto à esquerda: Paulo Salgado, ex-Alf Mil, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72. administrador hospitalar reformado; cooperante na Guiné-Bissau e em Angola]


Caros bloguistas, caro Luís,

Como podeis pensar apenas na grandeza, na extensão (quase todos os que indicais...)?

Há um pequeno rio que serpenteia entre arvoredo frondoso, que recebe as crianças, jovens brincando na água, que devolve tranquilidade a quem, por certo, se aventurou a navegar numa canoa...é o rio Olossato, que corre na povoação com o mesmo nome.

Registai: Olossato. (**)

Saudações bloguistas


Paulo Salgado
______________

Notas do editor;

(*) Último poste da série > 20 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14903: Memória dos lugares (305): O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba (António Murta)

(*) Vd, poste de 19 de fevereiro de  2006 > Guiné 63/74 - P548: Do Larinho ao Olossato ( Blogue de Paulo Salgado)

Guiné 63/74 - P14908: Consultório militar de José Martins (14): Restrições à consulta dos processos de casos disciplinares / justiça militar


O nosso colaborador permanente José Martins no seu escritório em 2006. É um homem organizado, metódico, persistente e um camarada generoso... Foi revisor oficial de contas noutra encarnação. Perguntem-lhe qualquer coisa sobre a vossa história militar, que ele responde... Responde sempre, mesmo que não seja logo, porque são ínvios os caminhos dos arquivos... (LG)


1. Pedido, com data de 17/6/2015 (*):

Zé Martins: Será que os processos de justiça militar existem em arquivo, e nomeadamente no Arquico Histórico-Militar ? E será que podem ser consultados, mesmo com restrições ? Haverá estatísticas sobre a justiça militar no tempo da guerra colonial ?

Vê se me sabes responder... É um pedido para o teu "consultório militar"... 

Um alfabravo. Luis

2. Resposta:

Enviado: terça-feira, 14 de Julho de 2015 23:23

 Viva,  Luis

Só hoje fui ao AHM para consultar alguns documentos:

(i) o pedido do Ley Garcia (**), que tentei aprofundar mais, mas sem resultado;
(ii) uma pesquisa sobre um Cirurgião Militar, que esteve em Leiria no inicio do século XX, no Hospital Militar;

(iii) pesquisa sobre um tia-avô da minha mulher;

(iv) caso dos Processos Disciplinares.

Conclusão: estão no AHM, mas não podem ser consultados se:

(i) se tiverem matéria criminal ou que ponha em causa o bom nome do indivíduo;

(ii) que ainda não tenham decorridos 50 anos após a morte do réu;

(iii) que sejam descendentes do próprio.

Eu próprio deixei, à condição, um pedido para consultar um processo transitado em julgado em Maio de 1923, dum tio. Após de me perguntarem se o réu ainda era vivo (foi há 92 anos), se a esposa era viva ou se tinha filhos, aceitaram o pedido porque, na prática, lhes disse a data do julgamento, o tribunal, o "crime" de que era acusado e a sentença aplicada, assim como a data de execução da mesma.

Resultado: Ainda é TABU.
Abraço
Zé Martins

Guiné 63/74 - P14907: Consultório militar de José Martins (13): Quem procura sempre alcança: aqui vai, camarada Ley Garcia, presidente do Núcleo de Leiria da LC: o camarada que o Manuel da Conceição Neves, que vive em França, procura, é o ex-1º cabo radiomontador Manuel Avelino Marques Ferreira, EREC 693 (Bafatá, 1964/66)

I. Mensagem de ontem do nosso camarada e colaborador permanente José Martins (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70):

Camarigos:

É com grato prazer que respondo a questão formulada pelo nosso camarada Ley Garcia, a quem é enviada também, através da resposta hoje recebida do Arquivo Geral do Exército.

O Manuel Neves já pode tentar encontar o seu amigo.

Numa pesquisa efectuada na Net não encontrei qualquer referência ao "procurado".

Abraço para todos,
Zé Martins

PS - Mais um "caso" resolvido. Que venham mais. Estamos cá para isso. Tenho que revelar que, quer o AGE [Arquivo Geral do Exército] quer o AHM [Arquivo Histórico Militar], me têm ajudado a resolver muitas questões e, sobretudo, pedidos. (*)


II.  Historial (abreviado) da consulta:

(i) Pedido do Ley Garcia [, Presidente do Núcleo de Leiria da Liga dos Combatentes ]:

Liga Leiria <leiriliga@gmail.com>
Data: 2 de junho de 2015 às 15:28
Assunto: Procura camarada da Guiné

Bom dia caro Luís Graça e camaradas da Guiné,

Um sócio nosso, Manuel Conceição Neves, nº 1049/64, procura um camarada do tempo da Guiné que esteve nos anos 1964 a 1966 em Bafatá, no Esquadrão de Cavalaria 8 - 693.

Não se recorda do nome, mas trata-se do 1º Cabo 1048/64, Rádio Montador que era da Anadia ou de Cantanhede (Ourives). Se por acaso conseguir identificá-lo e obter o contacto, agradecemos.

Um abraço
Ley Garcia
(Presidente do Núcleo de Leiria da Liga dos Combatentes e participo nalguns convívios da Tabanca do Centro) 


(ii) Mail do Zé Martins de 12 do corrente:

Caríssimos

Conforme prometido, estive ontem do Arquivo Histórico Militar, para analisar a História do Esquadrão de Cavalaria nº 693. a que pertenceu o nosso camarada Manuel da Conceição Neves.

Esperava encontrar a listagem de todos os elementos que a compunham, o que não sucedeu, visto na pasta estarem apenas: 9 (nove) páginas sobre situação de material, instalações e informações variadas; 4 (quatro) páginas sobre Baixas, Punições, Louvores e Condecorações; 2 (duas) páginas de operações, mas da autoria do Agrupamento 24.

Não havendo listagens dos elementos ou a listagem de atribuição da Medalha das Campanhas, que seria a alternativa, solicitamos o processo do BCaç 506, Batalhão a que o Esquadrão ficou adido operacionalmente.

Poderia ser que no processo, caso houvesse, que tivesse transcrito o nome dos elementos. Infelizmente não existe História da Unidade. Apenas existe correspondência do Batalhão com outras entidades.

Resta solicitar aos editores a publicação de um apelo, para ver se aparece alguém desta Unidade ou, de um dos batalhões a que esteve ligado operacionalmente, já que, é muito provável que o Rádiomontador do EREC 693, prestasse serviço nas oficinas rádio do mesmo.

Infelizmente são as noticias que tenho.

Abraço
Zé Martins


(iii) Pedido do Zé Martins, de 14 do corrente,  ao Arquivo Geral do Exército (AGE):

Data: 14 Jul 2015 22:37:21 +0100

De: JOSEsmmartins@sapo.pt
Assunto: Consulta de identidade
Para: arqgex@mail.exercito.pt

Exmº Senhor Director

Um conterrâneo meu, residente em França, e combatente na Guiné integrado no Esquadrão de Reconhecimento nº 693, de nome Manuel Conceição Neves e com o número de identificação 1049/64.

O meu amigo pretendia saber o nome do seu camarada de Esquadrão, 1º Cabo Rádio Montador com o nº 1048/64, pois não se recorda do nome, e gostava de o visitar na próxima vinda a Portugal.

Consultei a História da Unidade no Arquivo Histórico Militar, mas a mesma não tem qualquer relação nominal dos militares que a constituíram, assim como não há referências à relação do pessoal deste Esquadrão, nas HU dos batalhões de que esteve dependente.

Suponho que a hipótese que se coloca é a de consultar as Ordens de Serviço do Esquadrão de Reconhecimento nº 693, pois lá deverá constar a listagem de militares apresentados e a passagem à disponibilidade, pelo que solicito o obséquio de mandar proceder a esta pesquisa ou, em alternativa, autorizar-me a consultar as referidas ordens de serviço.

Aguardando as v/ notícias, apresento os meus cumprimentos
José da Silva Marcelino Martins


(iv) Resposta do Arquivo Geral do Exército:

N/Referência: E-mail N.º 066@/P165/SDG/AGE de 20 de julho de 2015.
S/Referência: E-mail de 14 de julho de 2015.

Exmo. Sr. José da Silva Marcelino Martins (JOSEsmmartins@sapo.pt)

1. Através do Sr.º José da Silva Marcelino Martins foi pedido para o Sr. Manuel da Conceição Neves o nome de um seu camarada que tinha o número 1048/64, o qual foi identificado como sendo o 1.º CABO MANUEL AVELINO MARQUES FERREIRA.

2. Mais informa este Arquivo que não dispomos de moradas de antigos combatentes e que a informação aqui prestada tenha como destino, unicamente e exclusivamente, o Sr. Manuel da Conceição Neves que fez parte da Esquadrão de Reconhecimento N.º 693.

Com os melhores cumprimentos,
O Chefe em Exercício de Funções
Marcelo Hernâni de Teves Borges
Maj SGE
__________________

Notas do editor:

Último poste da série > 10 de dezembro de 2014 >  Guiné 63/74 - P14000: Consultório militar de José Martins (12): Resenhas da CCAÇ 4150/73, COMBIS e Companhia de Terminal

Guiné 63/74 - P14906: (De)caras (23): Chefes de posto administrativo, no Cacheu, lembro-me de dois, com quem convivi, naturais de Cabo Verde, como eu: (i) Vicente Andrade; e (ii) Jorge Miranda Lima, casado com uma sobrinha do Amílcar Cabral; ambos tiiveram problemas com a PIDE/DGS, e o segundo conheceu a Ilha das Galinhas (António Medina, ex-fur mil, CART 527, 1963/65)


Foto nº 1 


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4

Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Cacheu > 14 de Fevereiro de 2005 > Imagens da cidade de Cacheu (fotos nº 1 e 2) e do forte quinhentista (fotos nº 3 e 4),  depois de restaurado e reabilitado. O forte,  na margem sul do rio Cacheu, no século XVI, dava protecção a uma das mais importantes feitorias no Noroeste da Guiné.

Álbum fotográfico do José Couto (ex-furriel milicano de transmissões, CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego). As fotos chegaram-nos através do Constantino (ou Tino) Neves, camarada do José Couto, e nosso grã-tabanqueiro de longa data.

Fotos: © José Couto / Tino Neves (2006). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem: LG]

1. Mensagem do nosso camarada, que vive nos EUA, António C. Medina

[, foto à direita,  o camarada Antonio C[ândido da Silva]. Medina, ex-fur mil inf, CART 527, Teixeira Pinto, Bachile, Calequisse, Cacheu,Pelundo, Jolmete e Caió, 1963/65; natural de Santo Antão, Cabo Verde, foi funcionário do BNU, Bissau, de 1967 a 1974; vive hoje nos EUA desde 1980; é nosso grã-tabanqueiro desde 1/2/2014]


Data: 17 de julho de 2015 às 03:43
Assunto: Memória dos lugares.


Para Luís Graça e António Bastos:

Até que enfim,  acabo de sair desse meu ostracismo, esperando poder ser útil em esclarecer o assunto levantado pelo nosso camarada Bastos. (*)

Claro que sim, o Bastos afirma,  e com razão,  que, para se deslocar a Coboiana [, ou Caboiana], se passaria por Churro onde se seguia a picada para se deslocar àquele local, depois de muita caminhada passando por outras tabancas que de memória já não me lembro dos nomes.

Quanto a Chefes de Posto Administrativo,  apenas me lembro apenas de dois naturais de Cabo Verde:

(i) Vicente Andrade,  colocado em Cacheu, no ano de 1964,  que depois passou para o quadro das Alfândegas em Bissau, preso por algum tempo pela PIDE/DGS; e outro

(ii) Jorge Miranda Lima, casado com uma sobrinha de Amílcar Cabral, preso por boa temporada na Ilha das Galinhas,  no Arquipélago de Bijagóss  pela PIDE, onde foi torturado,  para depois ser nomeado Chefe de Posto em Cacheu. 

Crachá da CART 527 (1963/65)
Com esses dois mantive sempre bom relacionamento,  sem política pelo meio, até que regressei em 1965 para Lisboa.

Concordo plenamente que prestemos uma devida vénia às nossas mulheres que, com o seu trabalho no Movimento Nacional Feminino, contribuiram para minimizar ao soldado as dificuldades com que vivia numa guerra indesejada.

No que diz respeito às "más línguas",  não me recordo de nenhum Chefe de Posto em  Cacheu casado com portuguesa de Lisboa, com quem andasse eu em petiscos e copos quase que diariamente, até porque fui sempre respeitador e respeitado, seguidor dos deveres militares.

Para os camaradas Luis Graça e António Bastos um grande abraço do Medina.



_________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 13 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14871: Memória dos lugares (304): Sobre a tabanca de Caboiana, e sobre o chefe de posto de Cacheu, que era caboverdiano, o nosso camarada António Medina (,ex-fur mil CART 527, 1963/65, a viver nos EUA,) pode dar esclarecimentos adicionais (António Bastos, ex-1º cabo, Pel Caç Ind 953, 1964/66)

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14905: Nas férias do verão de 2015, mandem-nos um bate-estradas (10): Não, nunca percebi para que serviam os CTT no CTIG... Notícias de Alhandra, da minha família, por ocasião da tragédia, as grandes inundações, de 25 para 26 de novembro de 1967, que atingiram a Grande Lisboa, recebi-as através de telegrama militar... (Mário Gaspar, ex-fur mil at art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)






As notícias, mesmo censuradas, da tragédia que se abateu sobre a grande Lisboa na noite de 25 para 26 de novembro de 1967... Capas do Diário de Lisboa. Cortesia da Fundação Mário Soares > Fundo:  DRR - Documentos Ruelle Ramos



1. "Bate-estradas" do Mário Gaspar (*)


[ Mário Gaspar, foto atual à direita; ex-fur mil at art, minas e armadilhas, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68; e, como ele gosta de lembrar, Lapidador Principal de Primeira de Diamantes, reformado; e ainda cofundador e dirigente da associaçºao APOIAR]:



 Data: 18 de julho de 2015 às 01:04

Assunto: Os CTT para Telefonar

Comrades:

Nos dias 19 e 20 de Novembro de 1967, participei na "Operação Raiana. Missão: Executar um golpe de mão ao acampamento de Boror. Não se chegou a descobrir o objectivo. No dia 26 de Novembro, dormindo na cama ao lado do Furriel Mecânico José Manuel Guerreiro Justo, e tendo este comprado um rádio onde ouvíamos somente Guiné Conacri, mexendo por mero acaso nos botões, oiço uma rádio portuguesa, dando notícias da nossa terra.

Contente, mas logo amargurado quando tenho conhecimento não existirem notícias animadoras. Pelo contrário acontecera uma tragédia, as inundações da Grande Lisboa, com indicações de muitos mortos e feridos e o dramatismo de algumas povoações terem sido tragadas pelas enxurradas e inundações (**).

Tudo se iniciara por volta das 19 horas. Parecia mais tratar-se de um milagre, estar a escutar, e com nitidez notícias de Portugal, nós escondidos naquele recanto no sul da Guiné – ouvi falar em Alhandra – povoação em que vivia, portanto terra onde viviam os meus pais e igualmente um irmão. Falavam para além de Lisboa escutava os nomes das vilas, entre outras de Odivelas, Loures, Alenquer, Vila Franca de Xira, Povos, e muito mais.

Parecia estar a ser atacado pelo PAIGC. Então escutava o nome de Alhandra. Recordava os anos passados, em que as cheias levavam água ao interior da vila. Cheguei a andar de botins altos e alguns barcos percorrem as ruas mais encostadas ao Tejo. Durante anos acostumei-me à ideia de ver todas as portas dos rés-chão tapadas com tábuas seguras com lama. Falava-se em enxurradas de lama que soterraram terras.

Fiquei atordoado, e resolvi falar com o Comandante da Companhia o Capitão Miliciano de Infantaria Manuel Francisco Fernandes de Mansilha. Fiquei admiradíssimo depois de contar o que se passava, tendo dito não ter notícias da família e saber que Alhandra tinha alguns mortos, o Capitão disse para ir com ele e enviámos um telegrama para os meus pais. Desconhecia essa possibilidade. Mas foi verdade.

Depois de sofrer,  recebo então um Telegrama onde a minha mãe dizia para estar sossegado por a água não ter chegado a atingir a casa. Na Praça 7 de Março em Alhandra está marcada a altura das águas neste dia fatídico para inúmeros portugueses. Portanto a minha casa, embora não tenha chegado ao 1.º andar, esteve muito perto. Curioso, nunca perguntei como a minha mãe se deslocou aos Correios,  se era uma zona inundadíssima. Recebi o tal telegrama, desta vez o sistema funcionou. O rádio de plástico do meu amigo algarvio, de Loulé,e Furriel Miliciano Justo, foi justo em informar-me desta tragédia. Ainda o ouvimos, mas depois voltam músicas de Guiné Conacri e muitas mornas e coladeras.

Notícias? O correio atrasado. Muito atrasado sem justificação. Isolados, com o mato à vista, paliçadas, abrigos e arame farpado. Telefonar? Telefonava na esquina da morança do Mamadu? Ou no Baldé? O meu telefone era a cerveja, falava dela, falava com ela e palava por causa dela. O que ingeri devia dar inundação se o seu líquido colocado numa piscina Olímpica.

Tive azar e sorte também. O azar é para esquecer, a sorte foi ter dinheiro para gozar licença na minha terra. Gozei mesmo, gastei bem, não me arrependo. Para mim a licença de Setembro/ Outubro de 1967 foi uma coroa de glória. Já estava em guerra, sabia o que ela era. Para mim era a despedida. Aproveitei aqueles 35 dias como os derradeiros dias da minha vida. Chegado a Bissau, escrevi quando se falava já naquela que seria a "Operação Revistar", para alguém – possuo essa carta mas não lhe toco mais – pois escrevi isto: – "Estou farto de Bissau, aqui só se fala em guerra". O que significa que antes desejava a guerra do que falar dela. Fui, entrei em Gadamael numa avioneta, mas nem vi os Correios, nem muito menos o telefone. O único privilégio que gozei, nos domingos ia até o Posto Rádio saber notícias do futebol em Alhandra. Na Aldeia Formosa estava o meu amigo Cordeiro, era radiotelegrafista e sabia o resultado do Alhandra.

Acho que fomos muito maltratados por não haver vontade de dar uma resposta adequada a nós que estávamos desterrados nos confins do mundo, antes, no cu do mundo. Muito pouca vontade, depois com a agravante de sermos obrigados ir buscar o Correio a Sangonhá para nos castigarem com patrulhas, quando nas vésperas tínhamos patrulhado a zona. Éramos uns imbecis e com a agravante de não termos a equivalência à tropa de elite – "Os Especiais". Olha porra! Mas sou também "Especial", "Tropa Especial", até tinha uma treta que se lia: – "Minas e Armadilhas".

Lembro-me dos Correios de Bissau, existia de facto a possibilidade de se pernoitar na cama de uma das suas funcionárias. No guiché assustei-me e desisti dessa noite entre lençóis. Foram poucos os dias de Bissau. E mesmo na cidade nunca fiz um telefonema. Fui ameaçado de castigo. Em Setembro de 1967 um Senhor Coronel disse-me após dois ou três dias seguidos no Café Benfica, estava fardado:
– Onde está, em que quartel?

Respondi-lhe que estava "no mato, em Gadamael Porto". Insistiu:
– Quem é o seu Comandante de Companhia?

Como não havia telefone em Gadamael, só respondi que era o Capitão Mansilha. Respondeu conhecê-lo e enviou cumprimentos. E se não fosse da Companhia… Estava tramado. Logo de seguida, na Agência de Viagens Sagres, estava eu e o meu amigo Jorge a tratar da documentação para entrarmos de licença, era no dia seguinte. Entraram três Capitães, passado algum tempo, berrou um deles:
– Os nossos Furriéis desconhecem os postos! Não cumprimentam? – Respondi:
– Então bom dia!

O meu amigo Jorge, a uns dias de concluir a comissão, após o almoço de despedida, trazia um garrafão de 5 litros de verde. Mesmo defronte do Hotel Portugal, completamente embriagado, agarra nas divisas e pisa-as. Aparece a Polícia Militar, comandada por um Furriel Miliciano. Segue na nossa direcção. Olho para o Jorge e para o Furriel da PM e digo-lhe:
– Vai-te embora, nada vistes, vira as costas.

Olha para mim… Respondo:
– Olha para a esquerda! – E à esquerda, e na esplanada, toda a CART 1659 se colocou de pé. A PM desandou. Não usávamos o telefone, que no mato não existia.

Cumprimentos aos Camaradas Combatentes.

Mário Vitorino Gaspar

____________


(**) Vd. entre outros recortes de imprensa:

DN - Diário de Notícias > 25 de novembro de 2007 

Nunca choveu tanto como em 67
por KÁTIA CATULO

(...) Cheias de 1967 - Memória. Mais de 700 pessoas terão morrido nas cheias que, no dia 25 de Novembro de 1967, apanharam desprevenidas as populações que viviam na região da Grande Lisboa. DN ouviu os relatos dos sobreviventes que têm memórias tão vivas como há 40 anos.

Cinco horas de chuvas torrenciais mergulharam a Grande Lisboa na maior inundação que a região alguma vez conheceu. Faz hoje 40 anos que as cheias de 1967 provocaram mais de 700 mortos e cerca de 1100 desalojados em Lisboa, Loures, Odivelas, Vila Franca de Xira e Alenquer. A enxurrada matou famílias inteiras, arrastou carros, árvores e animais e destruiu pontes, estradas e casas.

A chuva atingiu entre as 19.00 e a meia- -noite do dia 25 de Novembro as zonas baixas dos quatro concelhos da Grande Lisboa, mas só na manhã seguinte é que os portugueses se depararam com a verdadeira dimensão da tragédia. Urmeira, Póvoa de Santo Adrião, Frielas - povoações da bacia do rio Trancão-, e a Quinta dos Silvados, em Odivelas, foram os aglomerados urbanos mais atingidos. As casas eram de madeira e centenas de moradores foram engolidos pelas águas.

Lisboa, por seu turno, ficou irreconhecível. A Avenida de Ceuta, em Alcântara, esteve submersa e o mar de lama desceu até à Avenida da Índia. A água entrou em todas as bifurcações, subiu e desceu escadarias, derrubou as portas de tabernas, lojas e rés-do-chão, arrastando mesas, cadeiras, bilhas de gás, contentores e bidões da estação ferroviária.

Perto das 23.00 a chuva caiu ainda com mais força e as enxurradas atingiram um carro que circulava na Rua de Alcântara, encurralando os três ocupantes. O repórter do DN que na altura acompanhou as inundações, em Alcântara, conta que um soldado mergulhou nas águas e conseguiu retirar os três passageiros, minutos antes de o carro ser arrastado. Interrupções no trânsito sucederam-se desde a Avenida 24 de Julho ao Campo Pequeno, da zona do aeroporto da Portela à Avenida Almirante Reis, da Baixa a Santa Apolónia. Na Praça de Espanha e na Avenida da Liberdade, só se passava de barco e, na estação de caminhos-de-ferro, centenas de pessoas ficaram retidas nas carruagens porque a água submergiu as linhas.

O regime salazarista tentou minimizar os impactos das chuvas, mas as suas repercussões atravessaram fronteiras e desencadearam um movimento de solidariedade internacional. Chegaram donativos dos governos britânico e italiano, do Principado do Mónaco e até o chefe do Estado francês, o general De Gaulle, contribuiu com uma "dádiva pessoal" de 30 mil francos (900 euros, no câmbio da época). O apoio em meios sanitários veio de França, Suíça e sobretudo de Espanha, que ofereceu mil doses de vacina contra a febre tifóide. (...)

Guiné 63/74 - P14904: Lembrete (12): Repasto da Magnífica Tabanca da Linha, em Oitavos, Guincho, Cascais, dia 23, 5ª feira... O prazo de inscrição termina hoje à meia-noite... Espera-se meia centena de convivas, entre eles, três "periquitos": (i) o mítico comandante Pombo; (ii) a sua dedicada filha Maria João; e (iii) o maj gen PQ Avelar de Sousa (que foi cmdt da CCP 123 / BCP 12, 1972/74)

1. A pedido da "troika" que agora comanda as "tropas" da Magnífica Tabanca da Linha (Jorge Rosales, José Manuel Matos Diniz e Manuel Resende; há ainda um quarto elemento, o "lassa" Mário Fitas, que está no "back office"...), serve o presente lembrete (*) para... lembrar que:

Comandante Pombo aos comandos de um Cessna dos TAAG,
c. 1972/74. Foto do Álvaro Basto
(i) realiza-se no próximo dia 23, 5ª feira, mais um almoço convívio da Tabanca da Linha (, magnífica, sulista, mas não elistista: basta dizer que aqui os chefes são sempre mais do que... os índios) (**)

(ii) espera-se cerca de meia centena de convivas, o que é bom, tendo em conta que já estamos em período de férias de verão (para os felizardos que as têm);

(ii) entre os "periquitos", vamos ter, entre outras, a feliz presença do mítico comandante Pombo. da sua dedicada filha Maria João Rodrigues Pombo e do major general PQ Avelar de Sousa (ex-cmdt da CCP 123/BCP, Bissalanca, BA 12, 1972/74);

(iiii) camaradas e amigos que ainda queiram inscrever-se, têm o dia de hoje para o fazer através do nº de telemóvel 919 458 210 que o Manuel Resende põe amavelmente à vossa disposição:

(iv) recorde-se que o local de encontro é no Restaurante panorâmico Oitavos, estrada do Guicnho, Cascais... na Quinta da Marinha.[Vd. localização no Google].



Manuel Resende, um rapaz da linha
2. Localização do restaurante Oitavos 

Situa-se numa rua que vai  no sentido Cascais-Guincho: 
(a) depois de ultrapassado o farol da Guia e as bombas; 

(b) corta-se  na 3ª. derivação à direita (à esquerda é sempre mar), e está assinalada numa indicação em frente a um forte antigo da Guarda Fiscal; 

(c) sobe-se essa rua pela esquerda até ao final; (d) aqui há um largo espaço de estacionamento, encimado pelo restaurante de Oitavos;

 (e) atenção: antes do estacionamento há um desvio à direita para o hotel, a que não se deve dar importância... 

A "memória descritiva" do sítio é feita pelo 1º secretário da Magnífica Tabanca da Linha; ele omitiu a referência à Quinta da Marinha,,, para não assustar os novatos: 

(i) a vista do sítio é deslumbrante; 

(ii) a comidinha cinco estrelas; 

(iii) o preço ?... mais barato que na messe do céu; 

(iv) os tabanqueiros são do melhor; 

(v) o régulo... é o nosso veteraníssimo e popular Jorge Rosales; 

(vi) o Matos Diniz, além de (co)mandar, faz a cobertura jornalística: as suas reportagems são já peças de antologia; 

(vii) por fim, mas não menos importante, o Manuel Resende, por delegação do 1º secretário,  é o sete em um: faz o marketing e as relações públicass, recebe as chamadas de telmóvel e os emails, faz as inscrições, fala com o cozinheiro, recebe os convidados, está atento aos detalhes, e por fim faz, de m´+aquina em punho, a competente e completíssima cobertura fotográfica do evento social.

Guiné 63/74 - P14903: Memória dos lugares (307): O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba (1) (António Murta)

1. Mensagem do nosso camarada António Murta, ex-Alf Mil Inf.ª Minas e Armadilhas da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74), com data de 1 de Julho de 2015:

Camaradas Luís Graça e Carlos Vinhal
Sobre a temática dos rios, de tantos encantamentos e infortúnios, comuns a quase todos nós, não sou muito versado, pois só um conheci pela proximidade e, ainda assim, sem grandes intimidades, tendo espreitado outro apenas duas vezes. Contudo, pelas experiências que me proporcionaram, não queria deixar de os referir.

António Murta


RIO GRANDE DE BUBA E RIO CORUBAL (1)

RIO GRANDE DE BUBA (1)

O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba, grande via de comunicação para pessoas, mercadorias e equipamentos militares. Era a ligação para o Mundo a partir destes confins perdidos, para as cargas pesadas e os contingentes militares impossíveis de deslocar por via aérea. Mas era também, à falta de melhor, o parque aquático onde muitos se refrescavam e pescavam - que não eu -, fazendo de Buba uma espécie de estância balnear, única em toda a zona. Isso implicava alguns riscos e retraía os menos afoitos, mas, logo após o estabelecimento da paz em Abril de 1974, chegámos a fazer várias deslocações a Buba só para o pessoal se refrescar.
Não posso dizer que conhecia bem este rio, pois só o naveguei uma vez e de noite. Também a visão que dele se tinha a partir do cais de Buba era relativamente limitada e, depois de banalizada, deixava-nos indiferentes às suas escassas belezas, tirando um ou outro pôr-do-sol mais flamejante.



Rio Buba em Buba, 1973-74



Rio Buba, 1974 – Descarga de LDG e embarque de Companhia (?) que terminou a sua comissão.


Rio Buba em Buba, 1974 – LDG faz-se à viagem.


Rio Buba em Buba, 1974 – A ingrata missão do meu Grupo: carregar do chão os víveres desordenados para as viaturas. 

Rio Buba em Buba, 1974 – Eu, a montar segurança para o banho tranquilo da rapaziada.

(Continua)

Texto e fotos: © António Murta
____________

 Nota do editor

Último poste da série de 13 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14871: Memória dos lugares (304): Sobre a tabanca de Caboiana, e sobre o chefe de posto de Cacheu, que era caboverdiano, o nosso camarada António Medina (,ex-fur mil CART 527, 1963/65, a viver nos EUA,) pode dar esclarecimentos adicionais (António Bastos, ex-1º cabo, Pel Caç Ind 953, 1964/66)

Guiné 63/74 - P14902: Notas de leitura (738): “Lugar de Massacre", de José Martins Garcia (2): Regressar à leitura de um dos livros indiscutíveis da guerra da Guiné (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Agosto de 2014:

Queridos amigos,
“Lugar de Massacre” é o primeiro título sonante da literatura da guerra da Guiné, após o 25 de Abril.
É uma carpintaria original, uma miscigenação de vários géneros literários, há para ali um controlo profundo de um mestre da língua que ondula entre o português vernáculo, o surrealismo, o humor trauliteiro, a paródia aos falsos valores ancestrais, o desnudar cruel dos horrores da guerra.
Pela sua complexidade, por ser uma página trágica do lugar e do tempo de massacre, continua a ser alvo de investigações universitárias, lá se vão descobrindo novas dimensões deste romance incómodo, subversivo, mordaz.

Um abraço do
Mário


Lugar de Massacre, de José Martins Garcia (2): Regressar à leitura de um dos livros indiscutíveis da guerra da Guiné

Beja Santos

“Lugar de Massacre”, de José Martins Garcia, é obra cimeira da literatura da guerra. Cáustica, niilista, libelo dolorosíssimo, com recursos à linguagem encriptada, rememoração autobiográfica, impôs-se desde a primeira hora pela sua originalidade, por gritar em voz alta o nome dos lugares e dos tempos de massacre.

Demolidor com os valores passadistas, é nesse contexto que podemos observar os comportamentos burlescos dos condes d’Avince e d’Enxeque, que têm sempre na boca os valores da glória de Portugal e anunciam que estão em missão civilizadora e na prática são duas futilidades a brincar aos valores de antanho. A atmosfera do Quartel-General é de paródia, de orgia romana. Em contraponto, Pierre Avince, sempre a arrastar uma velha mala, espoleta a inquietação cultural entre os condes. Depois de uma festa em que os condes viram a mobília do quarto partida, Pierre Avince convida-os para o almoço do seu aniversário, nova borrasca, acaba tudo em bebedeira monumental, ausência ao serviço, o comandante Pássaro em raiva rubra. A propósito do sucessor do comandante Pássaro, José Martins Garcia destila o seu fel sobre a dimensão tacanha e burocrática do militar:

“Não foi a um ser verdadeiramente humano que o comandante Pássaro cedeu a chefia. Não se tratava também de um longilíneo pássaro triste, nem de uma consciência empenhada no dever, nem de um guerreiro nostálgico de brocados, nem de um recalcitrante enfastiado por disciplinas de caixa e tambor. Não era um eleito por capacidades insondáveis, não era um perito em matemáticas ou em fuga de ideias. Não era nada disso. Quebrara bravamente um pé. Não em combate. Mas em exemplificações para instruendo. Também na pança e nas nádegas se lhe infiltrara o micróbio da demissão. Sedentário, transferindo para tarefas menos ginasticadas, engordara. Ainda angélico nas pupilas azuis, crescera nas nádegas roliças, na cara bolachuda, no tronco, no alto e no baixo, a ponto por vezes de lhe terem chamado chimpanzé. Capitão Oliveira”.

A atmosfera de bacanal irá manter-se, há para ali amores inconversáveis entre oficiais e praças, o capitão Oliveira e o conde d’Avince andam ciumentos, disputam o mesmo efebo. Pierre Avince anda por Catió, não se mistura com estes ardores de paixão. Numa vinda a Bissau temo-lo novamente a protagonizar uma bebedeira monumental. As orgias sucedem-se. Pierre d’Avince parte para Bafatá e daqui para a Ponta do Inglês, o que aqui se passa é descrito com a irreverência e no tom delirante do costume. Mas é neste contexto que o escritor nos deixa uma página belíssima:
 “Frente ao rio barrento, com o mato pelas costas e ruídos inquietos pelas noites iguais, desenrolavam-se os dias de degredo, com a estritamente indispensável vigilância e a excessos de memória nas palavras cada vez mais ásperas. A saída única era à beira-rio, se a Marinha tivesse tempo ou propósito de ali mandar uma lancha. Mas constava ninguém apreciar essas paragens, que bem interiores ao mapa da Guiné-Bissau, constituíam na realidade o último enclave do ocupante, tomando por referência o largo afluente de nome Corubal. Daí para sul - dizia-se -, embarcação que ousasse adiantar-se saía rendilhada de bala inimiga, como já se provara. E em terra, nas picadas que tinham ligado a Ponta ao Xime e ao Xitole, o matagal apagara o trilho humano, dando por zero a parte colonizadora da civilização.
Havia três meses que aquele Destacamento de quarenta humanos ali encontrara abrigos e arame-farpado e ali se exercitava na espera, numa inquietação sem finalidade senão a de sonhar a evasão. Para além da vedação, percorriam, bem armados, uns cinquenta metros, para alcançarem água vagamente potável, tendo o cuidado de se abastecerem pela manhã, visto já terem notado, na lama fresca, pegadas de pé descalço. Ou fantasmas ali se dessedentavam, ou outra gente, invisível e talvez atenta, ali se abastecia. E o Anatólio, o furriel de poucas falas, não se entendia a si próprio quando afirmava querer e não querer conhecer esses fantasmas, quem sabe se homens menos loucos que os enclausurados brancos da Ponta do Inglês.
Reinava o sol sobre os perdidos defensores da cerca e então algum sorriso lhes sublinhava as falas. Mas vinha a noite e os receios aos montes acidulavam os gestos com que baralhavam as sebentas cartas e as davam a rostos apreensivos de tanto jogarem sem só uma certeza. E quando o vento sarcástico da história lhes fundiam mais uma lâmpada amarelenta, falavam de socorro e reabastecimento, culpando da solidão e da escassez de tudo o encarregado das transmissões”.

Com um domínio absoluto sobre o absurdo, assim termina o capítulo:
“No dia seguinte, Pierre e os seus dois auxiliares entraram, com o estúpido material que lhes coubera em sorte, numa lancha da Marinha, ali por acaso. Beberam água fresca e adormeceram. O Destacamento da Ponta do Inglês foi atacado poucas horas depois. Entre mortos e feridos muita gente escapou”.

Pierre d’Avince segue para São Domingos, no jogo das cartas ficará eternamente endividado, melhor dito fica a dever o vencimento de um ano. Pierre já não é produto do delírio literário, conversa com familiares mortos, são sonhos em que fala do tráfico de escravos, da polícia de choque que entrou no estádio universitário, o que nos remete para a crise académica de 1962. Prosseguem as conversas com os antepassados mortos, a sombra do passado também é dada pelo alferes Teive, no Sedengal, não longe de São Domingos, e temos mais uma comicidade com a velha aristocracia:
“O alferes Teive era ferozmente monárquico. Em 1578, no desgraçado dia da batalha de Alcácer Quibir, Dom Diogo de Teive, cheio de areia histórica, largara o ‘Ter! Ter!’ – brado com o qual, segundo os historiadores providencialistas, Deus pusera termo à loucura sebastiânica. O alferes Teive cuja paixão na vida civil fora a Heráldica, achava-se na posse de valiosos documentos que demonstrariam, uma vez revistos e conjugados, ser falsa a atribuição do tal desastrado brado ao heróico Dom Diogo de Teive. Dizendo isto, o alferes sacudiu o mindinho ornado de velhíssimo brasão”.
É por estas paragens que Pierre encontra as personagens mais simpáticas da obra, o capitão Camilo e um agente técnico mulato. Questionado por Pierre, responde que ninguém lhe faz mal, ele trabalha para o desenvolvimento da Guiné, diz ter andando na escola com Amílcar Cabral. Pierre diz-lhe de forma cortante que ele trabalha para o ocupante e o outro retorquiu:
“Não. Trabalho para a Guiné. O país fica, os governos mudam”.
O caminho para o delírio prossegue, Pierre vai ver com os seus olhos tabancas destruídas, seguramente que o PAIGC não está inocente, em chão felupe vê miséria indescritível, vê doença, vê superstição:
“De fora, vinha a lamúria dos felupes, encaminhando os mortos para o paraíso felupe. O deus felupe em nada se distinguia do deus da baga-baga, esse deus que ordena às formigas a construção de catedrais. Sombreado pelo compasso do tambor, o cântico fúnebre toda a santa-noite uivava encomendando a peste ao deus felupe”.

A guerra anda à solta, há minas e sinistrados, Pierre, combalido, regressa a Bissau e baixa aos serviços da neuropsiquiatria. Assiste à chegada dos helicópteros, grita pela Pátria no seu desperdício, vendo tanto sofrimento que acode àquele hospital militar, está seguramente louco, este doutor em letras, cirurgião dos fados soterrados em letra morta. Endoidece no lugar de massacre. Para que conste.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 17 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14891: Notas de leitura (737): “Lugar de Massacre", de José Martins Garcia (1): Regressar à leitura de um dos livros indiscutíveis da guerra da Guiné (Mário Beja Santos)

Guiné 63/73 - P14901: Inquérito online: Mais de 54% do pessoal nunca telefonou para a metrópole, durante a comissão, usando os CTT... Resultados preliminares (n=81), quando faltam 4 dias para "encerrar as urnas"...



Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > Edifício dos CTT... Ficava na tabanca de Bambadinca, nas imediações do quartel. Segundo recorda o Beja Santos, o nome da empregada dos CTT era a Dona Leontina ("uma gentil senhora com quem se apalavrava o dia e a hora para telefonar para Lisboa"). 

Sou dos que, a maioria, nunca lá foi telefonar, pelo que não me lembro da senhora. Presumo que  fosse caboverdiana, tal como a professora, a Dona Violante, e o chefe de posto (de quem também não me lembro o nome).

Lamentavelmente não convivivíamos, os civis e os militares. em Bambadinca, nomeadamente com a pequena comunidade caboverdiana. Havia preconceitos de parte a parte. As NT punham  em dúvida a lealdade dos caboverdianos em relação às autoridades portuguesas... Por outro lado, os comandos de batalhão tinham pouca ou nenhuma sensibilidade "sociocultural",,,

 Foto do álbum do José Carlos Lopes, ex-fur mil amanuense, com a especialidade de contabilidade e pagadoria, especialidade essa que ele nunca exerceu (na prática, foi o homem dos reabastecimentos do batalhão, o BCAÇ 2852).

Foto: © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. (Edição  e legendagem: LG.)


SONDAGEM: "NA GUINÉ, DURANTE A COMISSÃO, UTILIZEI OS CTT PARA TELEFONAR PARA CASA"

1. Sim, em Bissau > 19 (23,5%)

2. Sim, fora de Bissau  > 13 (16%)

3. Sim, em Bissau e fora de Bissau  > 5 (6,2%)

4. Não, nunca utilizei  > 44 (54,3%)

5. Já não me lembro  > 0 (0%)


Votos apurados (às 21h45, domingo, 19/7/2015): 81
Dias que restam para votar: 4