quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18293: Historiografia da presença portuguesa em África (108): Origem da palavra Guiné na revista O Mundo Português, editada pela Agência Geral das Colónias (Mário Beja Santos)




1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Dezembro de 2017:

Queridos amigos,
O artigo do padre Dias está bem fundamentado dentro de um determinado quadro lógico em que ele extrapola Djennê para Guiné. Não é de excluir esta possibilidade, dezenas de outros investigadores fizeram outras abordagens, para sermos francos ninguém pode por as mãos no lume sobre a versão fidedigna.
Não resta sombra de dúvida que Azurara demarca os territórios dos Azenegues (o fim da Mauritânia) da Terra dos Negros e fala claramente na Guiné, mas nunca diz a origem da palavra. Aquele mundo opulento de Tungubutú e Djennê esteve permanentemente sujeito a conquistas e pilhagens e desmoronou-se definitivamente com a chegada dos europeus, que alteraram as rotas comerciais e tomaram conta do tráfico de escravos.

Um abraço do
Mário


Origem da palavra Guiné 

Beja Santos

Não é a primeira vez que aqui se faz referência à revista O Mundo Português, intitulada revista de cultura e propaganda, arte e literatura coloniais, editada pela Agência Geral das Colónias, e onde se encontra informação de muito interesse. No número de Dezembro de 1938 insere-se um artigo assinado pelo padre António Joaquim Dias sobre a origem da palavra Guiné. Convém informar previamente o leitor que ainda hoje não existe consenso, a despeito de muita investigação e posição categóricas sobre a proveniência da palavra. Tudo quanto este investigador escreve tem erudição e rigor, mostra-se convicto mas estudiosos seguintes não confirmaram os termos apodíticos que ele aqui utiliza. Mas é um belo artigo, como se segue:
“A partir do século XIII, duas povoações do Sudão Ocidental desfrutaram um grande predomínio comercial e político: Tungubutú ou Tombuctú e Djennê.
A primeira, fundada no século XII pelos Tuaregues, Berberes, postada no limite da zona fértil sudanesa, à entrada do Sara, e quase debruçada sobre o rio Níger, ocupava posição privilegiada. A segunda deve a fundação aos Saracolés, pelos anos de 1250. Ficava perto da margem esquerda do Bani, o grande afluente do Níger.
Na vida da velha Tungubutú sobressaem dois períodos notáveis, pelo esplendor político, comercial, demográfico, intelectual mesmo arquitetónico. Marca-os o domínio dos Mandingas (1325-1435) e dos Sôngoi (1493-1528). Semelhante esplendor atraiu numerosos mercadores estrangeiros, sobretudo Berberes, que ali vendiam tecidos da Europa e produtos vários. A Tungubutú afluíram letrados muçulmanos, artistas numerosos e tecelões. Judeus e sábios islamitas viviam em quarteirões reservados. Manuscritos árabes, provenientes do Norte de África eram disputados a peso de ouro. Abundavam cereais, leite, gado, manteiga e sal-gema das minas de Tegaza. Sobre o casario de tijolo cozido, elevava-se a mesquita magnífica, cuja construção demorara 40 anos.
Também Djennê possui pergaminhos valiosos. Durante mais de do0is séculos, desfrutou vida rica, independente e próspera. Este pequeno país estendia-se do Bani ao Debo e de Diafarabê à falésia de Bandiagara".

Azurara parece ignorar aqueles dois centros do Sudão Ocidental. Conhece um único reino da terra dos negros, Méli. Máli ou Méli é o nome dado pelos autores dados e cronistas sudaneses ora ao império Mandinga, ora a uma ou outra das suas sucessivas capitais. Tal império estendia-se do alto Níger até Siguiri.

Por meados do século XIV, o império de Méli absorvera muito outros reinos, nomeadamente o de Tungubutú. Djennê, porém, conseguira manter-se independente, sem embargo das tentativas dos Mandingas para a dominarem. O imperador Mandinga esteve em relações amistosas com os sultões brancos da África do Norte, caso de Marrocos. Méli conheceu então os seus dias felizes mas depois de os Tuaregues se reapossaram de Tungubutú, em 1435, viram-se na necessidade de pedir a proteção do rei português D. João II.

Azurara deve ter redigido os capítulos 77 e 78 da crónica da Guiné sobre informações antiquadas ou erróneas, possivelmente baseou-se nas informações do explorador João Fernandes.

Segundo Diogo Gomes, tivemos conhecimento do Sudão antes dos Descobrimentos haverem atingido do Cabo Branco, e anos antes da estadia de João Fernandes no Rio do Ouro (1444). Em 1441, Antão Gonçalves e Nuno Tristão obtiveram os primeiros indígenas da África Ocidental e deles as primeiras notícias a respeito da ignota África aquém-Bojador.

Após o descobrimento de Arguim, e mormente depois de construído o castelo daquela ilha, traficámos largamente com os mercadores sudaneses. Di-lo Cadamosto ao descrever detalhadamente o comércio ativo que ali fazíamos em 1455. Diogo Gomes corrobora as afirmações de Cadamosto relativamente ao comércio entre Arguim e Tunbugutú. Lendo-se o relato Esmeraldo de situ orbis, de Duarte Pacheco, parece poder deduzir-se ser Tunbugutú mais habitada de Berberes e de Mouros marroquinos do que de negros, sucedendo precisamente o contrário em Djennê. Pacheco diz esta última povoada de negros. Julgo poder asseverar que, anteriormente à nossa avançada para Sul do Golfe de Arguim, nossos descobridores e primeiros mercadores supunham Djennê o verdadeiro chão dos negros. Dali nos terão vindo os primeiros a Arguim, através do comércio a Tunbugutú ou mesmo a Djennê. Os próprios escravos obtidos, interrogados sobre o nome da sua pátria, dir-se-iam naturalmente oriundos de Djennê, que, entre nós ficou sendo, por antonomásia, a terra dos negros. E a estes demos então o nome de Djenéus, forma rapidamente transformada em guinéus. As formas atuais de Guiné e guinéus são já usadas por Azurara.

Depois do descobrimento do Senegal e de vermos os indígenas deste litoral Jalofo tão negros como os que recebíamos do Sudão em Arguim, estendemos aqueles o nome de Guinéus, perpetuado até nossos dias; por Guiné ficou sendo conhecida toda a terra dos negros desta zona africana.

O autor da crónica da Guiné, que muitas vezes chamara Mouros aos Berberes e aos avermelhados Tuaregues como aos negros, discrimina bem, desde certa data o chão dos Mouros, a Mauritânia, da terra dos negros. Ocupando-se da viagem de Dinis Dias ao chão guineense, assevera que ele “nunca quis amainar, até que passou a terra dos Mouros, e chegou à terra dos negros que são chamados guinéus”. Pela primeira vez, Azurara marca a separação geográfica clássica entre Berberes da Mauritânia e os negros, depois reproduzida por Cadamosto, por João de Barros, por Duarte Pacheco, por André Alvares de Almada e ainda outros.

João de Barros observa ter sido Djennê, outrora, mais célebre de que Tungubutú e que esta é a cidade principal das que marginam o rio Senegal. O cronista confunde o Senegal com o Níger, mas é bem explícito acerca da origem da palavra Guiné. Barros dá a entender que povos vários, indígenas, traficavam connosco em Arguim. Declina os nomes deles, todos ou quase todos ainda identificáveis e relacionados com os mercadores de Djennê.

Tudo isto prova, suficientemente, a identificação e assimilação de Djennê como sinónimo da terra dos negros, como base etimológica, histórca e geográfica da palavra Guiné, em uso desde o século XV.

Tungubutú e Djennê figuram ainda nos mapas de África. Tunbugutú constitui hoje apenas uma recordação do passado relativamente glorioso e brilhante, desfeito pelo tempo. Imponente outrora, guarda dessa imponência toda somente altíssima torre, de perto de 53 metros, que vigia, como velho e gigantesco cipreste, as ruínas mais ou menos majestosas, da vetusta cidade adormecida.

Sobre uma falésia, divisam-se também as ruínas impressionantes de Djennê, outrora capital de grande e próspero império, cujos palácios, desmantelados, nitidamente inspirados na arquitetura berbere, sonham com o esplendor de antanho.



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Nota do editor

Último poste da série de 16 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18218: Historiografia da presença portuguesa em África (107): Alfa Moló (c 1820-1881) e Mussá Moló (1846-1931), heróis de todos os fulas, tanto dos fulas-pretos (antigos servos) como dos fulas-forros (antigos senhores), uns e outros oprimidos pelos mandingas (Cherno Baldé, Bissau)

terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18292: (Ex)citações (328): Em 1973, um soldado podia gastar entre 1/5 a 1/3 do pré, em cerveja... Em Fulacunda, na 3ª CART / BART 6520/72, a média do consumo mensal era de 75/80 cervejas "per capita"


Guiné > Nota de 50 escudos (pesos), verso. Banco emissor: BNU - Banco Nacional Ultramarino. No câmbio e no comércio, em relação ao escudo da metrópole, emitido pelo Banco de Portugal, havia uma quebra de 10%... Ou seja: 100 pesos (escudos do BNU) só valiam 90 escudos (do Banco de Portugal)... Recorde-se que o BNU foi criado em 1864 como Banco Emissor para as ex-colónias portuguesas (, tendo também exercido funções de banco de fomento e comercial no país e no estrangeiro; vd,. aqui a sua história).

Uma nota destas, em 1969, dava para comprar, na cantina do Zé Soldado, cerca de 14 cervejas de 0,33 l. Mas em 1973 só dava para 12,5.

Foto: © Sousa de Castro (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Nesta matéria, ele é uma autoridade, o nosso 1º cabo cond auto  José Claudino Silva, da 3ª CART /BART 6250/72 (Fulacunda, 1972/74): promovido pelo 1º sargento a cabo dos reabastecimentos, compete-lhe controlar o "stock" de bebidas e não deixar o pessoal morrer de sede... 

Escassos meses depois da chegada (em finais de junho de 1972), "os serrotes de Fulacunda" passam, em outubro, a consumir 12 mil cervejas por mês (*), o que para uma companhia de quadrícula (150/160 homens) é obra... Mas não temos termos de comparação com outros sítios da Guiné, com mais facilidades de reabstecimento (por ex., Bambadinca).

Feitas as contas por alto, este valor dá uma média de 75/80 cervejas por cabeça, e por mês (não sendo possível distinguir entre garrafas de 0,6 l e 0,33 l)... A cerveja no meu tempo (1969/71) era a 3$50, se não erro (e de acordo com a informação do Humberto Reis). As duas marcas eram a Sagres e a Cristal, em garrafa de 33 cl (, a "basuca" era mais cara, e a "enlatada" também...). 

De qualquer modo, modo lá se ia 1/5 a 1/3 do pré de um soldado (que era 900$00, enquanto um 1º cabo ganhava 1200$00).

Estamos a falar de uma média estatística: 2 a 3 cervejas por dia, em média,  é perfeitamente aceitável, se considerarmos as condições (de clima e de guerra) que enfrentávamos na Guiné. Temos, por outro lado, que considerar o número (desconhecido) dos abstémios... e o consumo de outras bebidas (coca-cola, uísque, vinho...). Provavelmente não se bebia mais cerveja porque o "patacão" não chegava, nem muito menos havia capacidade de frio... Como muitos de nós diziam, "a cerveja quente sabia a mijo"...

Já agora reproduz-se  aqui, de novo,   um interessante documento que é o  "Rol das despesas mensais de um soldado". Permite-nos  reconstituir, de certo modo, o quotidiano e o padrão de consumo de um soldado-tipo. Não temos  a certeza se a situação se reportava à Guiné ou outro TO (Angola ou Moçambique). Para o caso, também não interessa muito. De qualquer modo diz respeito a narço de 1973.

Encontrámos esta informação numa nota de despesa, fotografada, que consta de um livro de que é primeiro autor o nosso grã-tabanqueiro Renato Monteiro, ex-fur mil art (CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego e Piche, 1969; e CART 2520, Xime e Enxalé, 1969/70).


Despesa do 3 [março]/1973:


Cerveja > 54 x 6$00 = 324$00 [=54 x 0,6 l= 32, 4 litros]
Cerveja > 24 x 4$00 = 92$00 [= 24 x 0,33 l= 7,92 litros]
Floid (sic) = 55$00
Pasta p/ dentes = 18$00
1 frasco de cola = 30$00
1 bloco de escrever = 15$00
1 lata de fruta = 11$00
1 garrafa de Porto = 55$00
Sabão = 7$00
Selos = 30$00
Envelopes = 8$00
Fotos = 44$00
Carne patoscada (sic) = 77$00
Vagaço (sic) = 14$00
1 lata de leite = 8$00
Subtotal = 788$00
FIO (sic) = 750$00
Despesa total = 1538$00

1/4/1973
Assinatura ilegível

[ Fonte: Monteiro, R.; Farinha, L. - Guerra colonial: fotobiografia. Lisboa: Círculo de Leitores / D. Quixote. 1990, p. 223.]

Estes valores acima referidos são já reveladores da crise que, no 1º trimestre de 1973, afectava já a economia portuguesa bem como das pressões inflacionistas. Repare-se, em todo o caso, que numa despesa mensal de 788$00 (, equivalente hoje a 164, 26 euros)  pouco restava do pré do soldado do Ultramar, uma parte do qual era de resto depositado na Metrópole.

Do total do consumo mensal (788$00), 52.8% ia para a cerveja! Convertidos em litros, dá mais de 40 por mês... Se este fosse o "comportamento típico" do nosso Zé Soldado, o consumo anual de cerveja devia ultrapassar os 300 litros "per capita", admitindo-se  que na época das chuvas se bebia menos...

Havia dois tipos de garrafa: a de 0,6 litros (a chamada bazuca, na Guiné) e a de 0,33 l. Em 1973, o preço era, respetivamente, 4$00 e 6$00 (0,83 euros e 1, 25 euros, respetivamente, a preços atuais).


2. Já agora, vamos rever os preços de alguns bens de consumo, na época, bem como outros valores de referência (vencimentos, por exemplo).

O Sousa de Castro diz-nos que no seu tempo (1972/74) "não era muito diferente: os preços que se praticavam, eram mais ou menos os mesmos" [que em  1969/71]...

"Puxando um pouco pela memória, eu como 1º cabo radiotelegrafista ganhava 1.500$00, sendo 1.200$00 por ser 1º cabo e mais 300$00, de prémio de especialidade." [, tudo somado, 1500$00 em 1973, era o equivalente, a preços de hoje,  a 312,67 €].

 "Por lavar a roupa, como cabo pagava 60 pesos [, em 1973]", informa o Sousa de Castro.[=12, 51 euros ]

Em 1969, recordo-me que os soldados da minha CCAÇ 12 (que eram praças de 2ª classe, oriundos do recrutamento local), recebiam de pré 600 pesos/mês [=181, 92 €], além de mais uma diária de 24$50 [=7,43€] por serem desarranchados. 600 pesos deviam dar para comprar duas sacas de arroz de 100 kg cada...

Elementos fornecidos por outros camaradas (**):

Rui Santos:

No meu tempo (1963/1965) comprava 12 ovos por um peso, um cabrito por 10 pesos, 11 frangos por um quilo de tabaco em folha (2 pesos)mais tarde, lá para o termo da comissão um cabrito um cabrito ultrapassava os 150 pesos, uma vaca de 700 pesos passou a mais de 1.000, e ... uma dúzia de ovos ... 12 pesos, era a inflação galopante, pois pudera .... 100 pesos eram manga de patacão.


José Casimiro de Carvalho:

100 pesos dava para comprar uma garrafa de Old Parr (em 1972/74).  Eu, como furriel, ganhava por mês entre 5400$00 e 6240$00 (isto já em 1974).

Humberto Reis:

Das chamadas Meninas & Vinho Verde [já] não me lembro, mas dos produtos que eu mais consumia, entre 69 e 71, não me esqueci:

- Um maço de SG Filtro: 2,5 pesos (sempre que saía para o mato levava 3 a 4 maços para 2 dias);
- Uma garrafa de whisky novo (J. Walker Juanito Camiñante de 5 anos, rótulo vermelho, JB): 48,50 pesos;
- Idem, de 12 anos, J. Walker rótulo preto, Dimple, Antiquary: 98,50
- Idem, de 15 anos, Monkhs, Old Parr: 103,50;

Mais concretamente, o Humberto Reis escreveu:

"Um whisky, no bar da messe, eram 2,50 pesos sem água de sifão e com água eram 3,00 pesos;
Sei bem, isso não me esqueceu, que o uísque era mais barato que a cervejola : 2$50, simples, contra 3$00 ou 3$50, além de que dava direito, o whisky, a gelo. As cervejas nunca estavam suficientemente geladas pois os frigoríficos da messe, a petróleo, não tinham poder de resposta para a quantidade de pedidos.

"Quanto à lerpa, ou ramim, uma noite boa, ou má, poderia dar (valor médio) 200 a 300 pesos para a lerpa e 50 a 100 para o ramim."


Luís Graça:

"Para uma família africana cem pessos era muito dinheiro... Para a maior parte dos nossos militares, era muito dinheiro... Uma lavadeira em Bambadinca devia receber, no meu tempo (1969/71) 100 pesos por mês (, era quanto eu pagava à minha)...

Com a inflação provocada pela guerra (era tudo importado!), houve uma progressiva degradação dos preços...e dos rendimentos. O problema agrava-se a partir de 1973, com a chamada crise petrolífera...

Recorde-se que em 1973 os países árabes organizados na OPEP aumentararam o preço do petróleo em mais de 400% como forma de protesto pelo apoio norte-americano a Israel durante a Guerra do Yom Kippur... A nossa economia foi muito afetada...E a inflação disparou"...

Jorge Picado:

(...) "Apontamento que resistiu ao tempo, referente ao mês de junho [de 1970]: Total abonos:13900$00; total descontos; 8967$00; a receber 4932$00. Nos abonos estão incluidos 4000$00, relativos aos abonos de família (já tinha os 4 filhos), de março, abril, maio e junho. [de 1970]". (...)

(...) "Vencimentos a receber em agosto em virtude do aumento: março-julho [1970]: 10500$00;

Fev 1326$00; total 11826$00; descontos Cx Geral Aposentações; 710$00; Imposto de selo -12$00; a receber (líquido): 11104$00" [, o equivalente a 3.226,56 €, a preços de hoje].
E mesmo assim, morríamos de sede na Guiné! (***)

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22 de abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6212: O 6º aniversário do nosso blogue (12): Cem pesos ? Manga de patacão, pessoal! ( Luís Graça / Humberto Reis / A. Marques Lopes / Afonso Sousa / Jorge Santos / Luís Carvalhido / Sousa de Castro)

22 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6209: Eu, capitão miliciano, me confesso (3): Falando de patacão... (Jorge Picado)

1 de agosto de  2005 > Guiné 63/74 - P132: Cem pesos, manga de patacão, pessoal! (2)

(***) Último poste da série > 27 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18020: (Ex)citações (327): MiG russos e pilotos do PAIGC: mitos e realidades (José Matos / C. Martins / Cherno Baldé / Luís Graça)

Guiné 61/74 - P18291: Convívios (839): XII Encontro dos Combatentes da Guerra do Ultramar do Concelho de Matosinhos, dia 3 de Março de 2018 em Leça da Palmeira (Carlos Vinhal)


No próximo dia 3 de Março, os Combatentes do Concelho de Matosinhos da Guerra do Ultramar (Angola, Guiné e Moçambique, 1961/74) vão realizar o seu XII Almoço/Convívio em Leça da Palmeira.

O programa do dia começa às 11h30 com uma Missa de Sufrágio pelos camaradas e amigos falecidos em campanha, e já na vida civil, na Igreja dos Franciscanos, em Leça da Palmeira.

O almoço será servido às 13 horas no Tryp Porto Expo Hotel, junto à Exponor, com o mesmo preço do ano passado, 20,00€.

Antes do almoço proceder-se-á à habitual foto de família para memória futura.

Passa palavra e traz o teu camarada e amigo. Traz a tua boina e as tuas insígnias.

As inscrições, extensivas aos nossos familiares, deverão ser feitas impreterivelmente até ao dia 28 de Fevereiro (quarta-feira) para o email combatentesdematosinhos@gmail.com ou para os números 916 032 220 (Vinhal) e 969 023 731 (Agostinho).

A partir da data limite, as inscrições ficarão sujeitas à aceitação por parte do hotel.

A comissão organizadora
Abel Santos
José Francisco Oliveira
Ribeiro Agostinho
Carlos Vinhal
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Nota do editor

Último poste da série de 18 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18224: Convívios (838): 35º almoço-convívio dos "magníficos" da Tabanca da Linha, desta vez abrilhantado com a presença de mais de uma dúzia de "periquitos", incluindo cinco "bandalhos" do Bando do Café Progresso, Porto... As primeiras fotos

Guiné 61/74 - P18290: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (1): Em Setúbal, o restaurante "Baluarte do Sado", peixinho grelhado, pois claro!...(Hélder Sousa / Luís Graça)


Setúbal > Mercado do Livramento > 3 de fevereiro de 2018 > É uma festa"... Inaugurado em 1930, e construído em estilo "art déco", é um dos ex-libris da cidade... O mercado do peixe, ao sábado, em especial, é uma espectáculo ao vivo!... Em primeiro plano, uma das esculturas de Augusto Cid, a vendedeira de criação (aves e ovos).


Setúbal > Mercado do Livramento > 3 de fevereiro de 2018 >  Um dos painéis de azulejos da entrada principal.


Setúbal > Mercado do Livramento > 3 de fevereiro de 2018 >  Painel de azulejos, da parede do fundo, junto às bancas de peixe. Cenas do mar, do estuário do Sado e dos campos...



Setúbal > Mercado do Livramento > 3 de fevereiro de 2018 >  Percebes do alto mar... Ao sábado os preços inflacionam-se, devido à procura externa... Aqui há de tudo, do camarão de rabo azul à lagosta e ao lavagante, mas o que ainda mais enche o olho é o peixe fresco, dos salmonetes às cabeças de cherne!...



Setúbal > Mercado do Livramento > 3 de fevereiro de 2018 >  Sapateiras  vivinhas da costa...



Setúbal > Mercado do Livramento > 3 de fevereiro de 2018 >  O espadarte...


Setúbal > Mercado do Livramento > 3 de fevereiro de 2018 >  As mangas sem fios... que não são seguramente de Setúbal nem da Guiné...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Vamos inaugurar uma nova série: "No céu não há disto...Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande"...

A ideia ocorreu-me há dias, quando me convidaram para ir a Setúbal para um almoço de aniversário... Fazia anos (, vinte e seis, ) o filho de um casal nosso amigo, meu e da Alice. Setúbal é peixe e marisco, pois claro, mesmo que o rapaz seja da geração do "fast food", das batatas fritas e dos hambúrgueres (sic) (assim é que se escreve, em bom português)... 

O rapaz é aquariano, como eu, tem a sorte de não fazer anos no píncaro do verão, altura em que eu fujo da ponte 25 de Abril, da Caparica, de Setúbal, da canícula e de tudo o que aponta para o sul, o sal, o sol... (A2, A12...). 

Foi no sábado passado, não era de prever uma enchente, mesmo com sol de inverno,  mas, pelo sim, pelo não, era conveniente reservar mesa para sete. Em que restaurante, Zé António ? Os meus amigos ainda estavam em Lisboa, quando eu e a Alice chegávamos à terra do Bocage. Pois que escolham à vontade, queremos é peixinho do bom, a saber a mar, e não a aquário... 

Os meus amigos acabavam de me passar a bola, e eu não os queria dececionar. Ainda por cima gente da Costa Nova... Falo do Zé António Paradela, meu amigo, meu "mano" e nosso grã-tabanqueiro. Mas eu não tinha sequer feito o trabalho de casa, o TPC, como costumo fazer antes de ir almoçar ou jantar fora: ver na Net os sítios mais convenientes para se comer, as comidinhas, a relação preço/qualidade, o que fazer depois do almoço, os percursos, etc. 

E para mais não tinha trazido comigo o meu PC!...  Não gosto de fazer consultas à Net através do telemóvel... Sou um tosco com o telemóvel... detesto o telemóvel... Bem, a solução, ali à mão de semear, era chatear o meu amigo, camarada e ilustre régulo da Tabanca de Setúbal, o Hélder Sousa...

Por azar, não tinha o número dele no meu telemóvel, tinha havido,  há uns tempos atrás,  uma troca de cartões entre mim e a Alice. Eu fiquei com a lista dela, e ela com a minha!... O telélé da Alice tinha, felizmente,  na lista o número do Hélder... Fizemos então uma chamada, ainda  dentro do carro... E nada, silêncio do outro lado da linha. Às 11 e picos já são horas de estar de pé, para mais em terra de gente laboriosa, mesmo ao sábado que é o dia de descanso do Senhor... Podia, o senhor engenheiro estar a tomar o seu duche de sábado de manhã... Ter ido ao SPA... Estar a dar formação... Ir à missa era menos provável... Bem, volta a ligar-se dentro de minutos...

E desta vez ele atendeu mesmo,  mas com a voz baixa: eh!, pá, estou em Lisboa, num reunião da secção regional sul da Ordem dos Engenheiros Técnicos...Já me esquecia que ele pertencia a uma lista candidata aos órgãos sociais da sua Ordem... Eh!, pá desculpa lá, não estou a reconhecer este número!... Como já estou meio surdo, gritei-lhe: é o número da Alice, do Luís Graça, da Tabanca Grande, desculpa tu o mau jeito... Tá-se mesmo a ver que o nosso camarada Hélder estava longe de me imaginar, a mim e à Alice,  por aquelas bandas e àquela hora...

E lá fomos trocando uns mimos, até eu chegar à questão central: onde é que se come à maneira na tua terra ?...E onde é que tu e a Alice estão? Eh,pá, aqui parados, estacionados, por detrás do mercado do Livramento e do Pingo Doce...Não precisas de ir mais longe, tens já aí o "Baluarte do Sado"... Peixinho  fresco, grelhadinhos, sardinha assada no verão...Boa relação qualidade / preço... Pronto, não digas mais, não te maces, vou já lá marcar uma mesa para a 1 da tarde, redonda, 7 pessoas... E desculpa lá qualquer coisinha... Talvez a gente ainda se veja logo à tarde, quando regressar de Lisboa... Obrigado, mas não precisas, estou numa festa de anos, fica para a próxima...

Como havia tempo de sobra, fomos visitar o mercado do Livramento que é um regalo para os cinco sentidos... É um dos pontos obrigatórias de qualquer visita a Setúbal, exceto à segunda feira que está fechado, como todos os mercados tradicionais...De preferência, venham ao sábado, e cedo... Ao meio dia já começam a desmontar a tenda, os vendedores de peixe, feito o negócio...

Fui ver as bancas do peixe e marisco, fotografei os azulejos todos, apreciei o vaivém de gente que entra e sai, procurei não perder pitada da "idiossincrasia" dos/as setubalenses que ali ganham a vida...Mas, ó querida, essas mangas sem fios não serão transgénicas ?... Ó cavalheiro, vê-se mesmo que é turista!... Não me venha cá estragar o negócio!... Qual transgénicas, qual carapuça, chupe-me aqui este mel... e deu-me um bocado de manga sem fios na ponta de um palito...Enfim, gente autêntica, que tem sempre a resposta pronta na ponta da língua, afiada, com todos os ss e rr... E diz a filha ao lado: Ainda tenho muito que aprender com a minha mãe...(que a punha a filha a um canto, medida de alto a baixo...).

Mas vamos ao almocinho, que já são horas, depois de algumas comprinhas feitas... O que é vamos pedir ? Para entrada uns camarões à guilho (num molhinho com pão frito) e depois uma cataplana de peixe para 3 pessoas, um sargo grelhado para mim e uma posta de cherne também grelhadinha para a Alice, que está meio adoentada... E para os nossos jovens (o aniversariante e um amigo), o costume, umas "febras" de porco com arroz e batatas fritas e uma saladinha... No fim, temos um bolinho de anos, que é para cantar os parabéns a você, que o rapaz faz 26 primaveras e é do Benfica...

Ó queridos, mas a gente aqui faz tudo na hora!... Podiam ter pedido a cataplana na altura em que reservaram a mesa,,, É coisa para demorar 40 a 45 minutos... Venha a cataplana, até lá, vamos petiscando. E, oiça, mande-nos um "Terras do Pó", branco, fresquinho, da Ermelinda Freitas, que é cá da terra, isto é, da península...

E pronto, a cataplana chegou "just in time", eu e a Alice fomos para os grelhadinhos... A banca de peixe do restaurante é um regalo para a vista, variada e colorida, como não se vê em muitos restauarantes XPTO do "Boa Coma e Boa Mesa" do Expresso, rapaziada que come com garfo e faca, nunca lhe passou seguramemte  pelos dentes a "bianda" da Guiné nem conheceu os "petiscos" dos nossos "vagomestres"... 

O serviço é simpatiquíssimo e eficiente, a casa estava cheia (2 salas, uma delas para fumadores), o ambiente é familiar,  ruidoso como convém, onde há povo, onde há "tugas"... As moças andam todas numa fona, mas a cozinha despacha bem e depressa... Nada de requintes, as próprias instalações têm o ar típico de muitos restaurantes à beira mar, de "design" popular(ucho)... O peixe do dia anda na casa dos 40 euros /quilo (com exceção do cherne que ontem estava no "super" do Corte Inglês a 60 e tal, e chega aos restaurantes dos ricos a centos e tais...).

Não sei quanto é que o meu amigo Paradela pagou mas não deve a extravagância do rebento aniversariante ter ultrapassado os 20 euros por cabeça, sem sobremesa... ( A sobremesa foi o bolo de anos, revestido com o emblema do Benfica, coitada da Helena, que nos serviu, e que é ferrenha do Setúbal, nunca lhe tinha acontecido fazer um frete daqueles, atravessar a sala com a "águia nas mãos"!...O que uma mulher faz para ganhar a vida!).

O "Baluarte do Sado" (com cerca de duas dezenas de anos de existência)  está provado e aprovado, camarada e amigo Hélder, engenheiro de energia e sistemas de potência, cistagano de nascimento, transtagano por casamento...  Sei que não há conflito de interesses, gostas de lá ir e recomendas aos teus amigos, com o único senão do verão, em que o povo faz bicha à porta do "Baluarte do Sado"...

Para os nossos leitores aqui ficam as coordenadas do "Baluarte do Sado":

O que se recomenda: cataplana de peixe / caldeiradas, choco frito, peixe grelhado (, afinal, a comida mais primitiva do mundo, mas o "grelhar peixe"  tem os seus segredos...);
Horário: das 10h00 às 17h00 (isto quer dizer, que não há jantares!);
Localização: Praça da República, 1, Setúbal 2900-587, Portugal;
Parque de estacionamento: público;
Multibanco: tem;
Telefone +351 265 238 780;
Tem página no Facebook.

PS - Uma chamada de atenção para o incauto turista que vem do Norte:  o "choco frito" é uma das especialidades da terra, mas o choco que aqui se frita e come não é de cá, é da... África do Sul e de Marrocos... Duro que nem cornos, servido em pedaços industriais... No "Baluarte do Sado" não sei como é... Prefiro o "choquinho frito" do meu amigo Vitor, do Peraltabar, na praia da Peralta, Lourinhã (108 km a norte), a quem, de resto,  já dediquei em tempos uns versinhos (*)... Mas nisto de comes & bebes, as paixões não se discutem: eu detesto peixe cru, outros lambem-se por lampreia, outros ainda dão a volta ao bilhar grande só para comer peixe seco... Os fãs do "Choco Frito" de Setúbal também direito à mesa... Logo, nossos companheiros e confrades são, que no céu não há disto... (dizem que há outras "iguarias", eu não sei, afinal nunca ninguém lá foi e voltou)...


2. Quanto aos nossos "vagomestres", aqui chamados à colação... Deixem-me recordá-los: tínhamos com eles uma relação de amor & ódio... 

Dar de comer a milhares e milhares de homens em guerra, no TO da Guiné, entre 1961 e 1974, não era tarefa fácil... Eram escassos os frescos, a carne era um luxo, e o peixe... resumia-se ao bacalhau, seco e feio, que nos chegava, de vez em quando, pela Intendência... Não havia câmaras frigoríficas, só coisas em lata e pó...

Em suma, passava-se fome na Guiné, nos nossos aquartelamentos e destacamentos, já não falo nas tabancas em autodefesa para onde éramos mandados às vezes, uma secção ou duas para reforçar o seu dispositivo de defesa... Os nossos soldados raparam fome, os graduados, esses, tinham um pouco mais de privilégios e de alternativas

Coitados dos nossos "vagomestres", entalados entre o "nosso primeiro" que era uma espécie de ministro das finanças da  companhia, e o batalhão de intendência que, de Bissau, nos fazia chegar os víveres, da cerveja ao chispe de porco, das batatas (um luxo!) às salsichas, da farinha para cozer o pão à massa, dos grelos em pó às conservas... 

A indústria conserveira deve ter ganho rios de dinheiro com a p... da guerra. Além dos mixordeiros do vinho a martelo que nos impingiram muito falso vinho verde... gaseificado à pressão, e vendido a peso de ouro!

Ainda me interrogo: como é que a minha/nossa geração suportou aquela maldita guerra ?!

Coitados dos nossos "vagomestres", obrigados a dar-nos massa com "estilhaços de frango", ou, invariavelmente arroz com filetes de cavala ou ainda arroz com salsichas... Hoje, voltei a comer conservas, sobretudo das boas, das nossas, mas durante anos e anos a fio não podia sequer suportar o seu cheiro... Conservas, salsichas, macarrão, chispe de porco... Como foi possível fazer uma guerra com a "barriga a dar horas" ?... 

No mato, em operações, muitos de nós estavam dois ou mais dias sem comer, porque eram incapazes de tragar as horríveis rações que nos davam... Eu pessoalmente nem sequer as levava para o mato!... Levei uma vez: ia ficando louco com a sede, provocada pelos "enlatados" e os "açucarados" (marmelada, fruta cristalizada)... Nunca mais quis a m... da ração de combate. 

Alguém fez fortuna com as rações de combate, intragáveis, que nos impingiam no TO da Guiné!... E nunca houve "levantamento de rancho" contra as malditas rações... O povo era manso...e tinha boa boca!

Claro que havia dias de festa!... Claro que havia dias em que se tirava a barriga de misérias!... Quando se arranjava um cabritinho ou um leitão, ou uns quilos de camarão ou lagostim do rio Geba...Ou quando o pai do Tony Levezinho lhe mandava, pelo barco da Sacor, a sua encomendida, em geral "bacalhau do especial" da Terra Nova...

É por estas e por outras que a gente tem o direito de, nesta caserna virtual,  mandar uns "bitaites" bem humorados e desabafar, sem risco de ser acusado de blasfémia: "Come, camarada, que no céu não há disto"...

Esperamos doravante que haja mais gente ("vagomestres da Tabanca Grande")  a ajudar a escrever roteiro gastronómico do país & arredores, respondendo ao nosso desafio: "diz-me lá, camarada, onde é que se come bem... e barato, na tua terra ?!"... De Ponta de Lima a Bissau, de Olhão ao Mindelo, todas as sugestões dos nossos "vagomestres", serão bem vindas... De resto, em matéria de comes & bebes, o "império" continua de pé, do Minho a Timor, o mesmo é dizer, o "império à mesa", da cachupa ao arroz de lampreia, das ameijoas à Bulhão Pato ao chabéu de galinha...

PS - A expressão "coma, que no céu não há disto", usava-a eu, muitas vezes, com o meu pai, mesmo na fase terminal da sua doença (,morreu de cancro no estômago, perto dos 92 anos)... A maior alegria, nessa altura, em que ele estava já num lar (entre 2008 e 2012), era levá-lo a almoçar fora, ao sábado (, peixinho, pois claro!, nunca vi aquele homem a comer um bife!), e depois beber um café e um cheirinho à beira mar... onde íamos os dois "lavar a vista"... 

Que saudades, meu pai, meu velho, meu camarada!...

3. Mais restaurantes em Setúbal

No "cartanito" que me deram, verifiquei que há mais dois restaurantes, do mesmo grupo, proprietário ou gerência... Tomem boa nota:

Baluarte da Avenida - Peixe grelhado | Av Luisa Todi 524, 2900-456 Setúbal | telef  265 573 470

Estuário do Sado - Choco frito e caldeiradas | R Guilherme Gomes Fernandes, 47 , 290-395 Setúbal | telef  265 573 068 (Aberto todos os dias da semana).
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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 3 de agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13459: Manuscrito(s) (Luís Graça) (38): Que viva la (mo)vida... e o choco frito do Bar da Peralta!

Guiné 61/74 - P18289: Parabéns a você (1387): Ana Duarte, Amiga Grã-Tabanqueira; Fernando Franco, ex-1.º Cabo Caixeiro do PINT 9288; Hugo Moura Ferreira, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1621 (Guiné, 1966/68) e José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70)




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Nota do editor

Último poste da série de 4 de Fevereiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18282: Parabéns a você (1386): Cap Inf Ref José Belo, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70) e Mário Silva Bravo, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 6 (Guiné, 1971/72)

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Guiné 61/74 - P18288: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (48): pedido de ajuda aos antigos antigos e atuais moradores de Lisboa: quem se lembra dos prédios dos nºs 36 da Rua de Santa Marta, e 50 da Rua Rodrigo da Fonseca, as duas últimas morada da "mindjer grandi" Maria Graça de Pina (Ludmila A. Ferreira, Cabo Verde)

1. Mensagem da nossa já conhecida leitora Ludmila A. Ferreira, que vive em Cabo Verde, filha de mãe cabo-verdiana e pai guineense, e que anda em busca de informações sobre o passado da "mindjer grandi" Maria da Graça de Pina [Monteiro]  (*)

Data: 15 de janeiro de 2018 às 18:16

Assunto: Pedido de ajuda aos antigos antigos e atuais moradores de Lisboa

Maria Graça de Pina (n. 1900)
Caros Amigos

A minha questão vai para os antigos moradores de Lisboa e não só.

Depois de uma longa pesquisa consegui encontrar dois endereço em Lisboa onde, segundo a Torre do Tombo, foram a ultima morada da Maria Graça de Pina e um familiar e gostaria de saber se alguém conhecia essas ruas em 1976 e que tipo de habitação estavam nesses endereços.

Tudo que consegui foi que na rua Santa Marta nº 56 seria  o convento Santa Joana.

Rua Rodrigo da Fonseca nº 50 (hoje segundo a minha pesquisa no Google esta lá um hotel).

Rua da Santa Marta nº 56 (Convento Santa Joana?).

Agradeceria qualquer informação.

Mantenhas,
Ludmila Ferreira


2. Nota do editor Luís Graça:
Palácio dos Condes de Redondo. Foto: cortesia de SIPA 

O atual nº 56 da Rua de Santa Marta corresponde hoje à UAL - Universidade Autónoma de Lisboa.  Esta universidade privada, a mais antiga do país, foi criada em 1985. Está instalada, a sede, no antigo Palácio dos Condes do Redondo (e não convento de Santa Joana...).

É um edifício do séc. XVII, de resto classificado, desde 1974, como imóvel de interesse público. É possível que em 1976 estivesse ocupado por pessoas que tenham vindo das antigas colónias portuguesas (os "retornados"). Não tenho informação precisa a esse respeito... O palácio tem acessos através da Rua de Santa Marta e da Rua do Conde Redondo.

Sobreviveu ao terramoto de 1755 e em meados do séc. XX, "sendo proprietária a condessa de Arnoso, o palácio chegou a albergar instituições de assistência social, 2 escolas primárias e vários estabelecimentos comerciais, além de funcionar como habitação para famílias pobres". (Fonte:  SIPA - Sistema de Informação para o Património Arquitetónico)

Quanto à Rua Rodrigo da Fonseca, nº 50, não tenho nenhuma pista. Posso só confirmar que nos nºs 44-50 está lá o Hotel Clarion Suites Lisboa. Pode ser que algum dos nossos leitores possam ajudar a nossa leitora e amiga Ludmila Ferreira. Infelizmente o "camartelo camarário" mal dá tempo para se escrever a história das ruas das nossas cidades... Talvez pesquisando em imagens da "Lisboa antiga", se consiga obter mais informação sobre este nº (50) da Rua Rodrigo da Fonseca de há 40 anos atrás... Ponha como hipótese que esse bloco da Rua Rodrigo da Fonseca estivesse já degradado em 1976 e fosse ocupado por famílias pobres. Sabemos que nessa rua ocorreu, em 16 de março de 1973,  um explosão de uma bomba, numa dependência do exército, como protesto contra a guerra colonial...

Matenhas.
Luís Graça
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Nota do editor:

(*) Vd. postes de:

11 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17755: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (46): A "mindjer grandi" Maria da Graça de Pina Monteiro, nascida em 1900, e que viveu em Bissau e em Bafatá (Ludmila Ferreira, Cabo Verde)

13 de setembro de 2017 >  Guiné 61/74 - P17764: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (47): A "mindjer grandi" Maria da Graça de Pina Monteiro, nascida em 1900, e que viveu em Bissau e em Bafatá... Notícias de Edmond Malaval, empregado da "Maison Garnier", em Bafatá, c. 1918, e de sua filha Ana Malaval (Ludmila Ferreira, Cabo Verde)

uiné 61/74 - P18287: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XIV: o dia em que eu queria ir de motorizada, de Bissau a Mansoa... e a Mansabá!



Foto nº 3 A > Guiné 61/74  > Região de Bissau > Bissau >  CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > O alf mil SAM Virgílio Teixeira,  de motorizada às portas de Bissau, na estrada para o aeroporo de Bissalanca


Foto nº 3 > Guiné 61/74  > Região de Bissau > Bissau >  CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > O alf mil SAM Virgíluio Teixeira,  de motorizada às portas de Bissau, na estrada para o aeroporo de Bissalanca


Foto nº 1 A > Guiné 61/74  > Região de Bissau >  CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 11 de março de 1968 > Safim > O alf mil SAM Virgílio Teixeira de motorizada, em Safim, a caminmho de Nhracra e Mansoa.


Foto nº 1  > Guiné 61/74  > Região de Bissau >  CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 11 de março de 1968 > Safim >  O alf mil SAM Virgílio Teixeira de motorizada, em Safim, a caminmho de Nhracra e Mansoa.



 Foto nº 2 A   > Guiné 61/74  > Região de Bissau >  CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 11 de março de 1968 > Safim > O alf mil SAM Virgílio Teixeira, na esplanada.


Foto nº 2  > Guiné 61/74  > Região de Bissau > CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 11 de março de 1968 > Safim > O alf mil SAM Virgílio Teixeira na esplanada.


 Foto nº 21  > Guiné 61/74  > Região de Bissau > CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 11 de março de 1968 > O alf mil SAM Virgílio Teixeira de motorizada, em Safim, a caminho de Nhacra.


Foto nº 21 A  > Guiné 61/74  > Região de Bissau > Bissau >  CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 11 de março de 1968 > O alf mil SAM Virgílio, Teixeira de motorizada, em Safim, a caminmho de Nhacra.


 Foto nº 4  > Guiné 61/74  > Região de Bissau > CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 11 de março de 1968 >  Safim > O alf mil SAM Virgílio, Teixeira de motorizada,  na estrada de Safim-Nhacra-Bula.



Foto nº 4A>  > Guiné 61/74  > Região de Bissau > CCS/BCAÇ 1933 ( Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > 11 de março de 1968 > Safim > O alf mil SAM Virgílio, Teixeira de motorizada,  na estrada de Nhacra-Bula. Placas à esquerda indicando: (i) Bula; e (ii) Poto João Landim.

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Carta geral da província (1961) > Escala 1/500 mil > Bissau e povoaçõs a norte: Safim, Landinm, Bula; Nhacra, Mansoa, Mansabá...

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2018)



I. Continuação da publicação do álbum fotográfico do nosso camarada Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69), e que vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado [, foto atual à direita].


Mensagem de 29 de janeiro último:

Caros amigos Luís Graça e Carlos Vinhal:

Agora lembrei-me, após ver que vocês andaram por Mansabá {, io Carlos Vinhal,] e Bambadinca ], o Luís Graça,] , e aproveitando este dia de sol, fui pesquisar nas muitas fotos que tenho já digitalizadas, mas faltam a maioria delas ainda. Saquei algumas das viagens que queria fazer até Mansoa e Mansabá, que são estas o objectivo destes postes, e vou enviar já algumas, para recordar essas datas.

Vou ver se consigo ainda enviar as viagens, ou seja, 'os cruzeiros azuis do Douro' , uma no Rio Geba acima em 4 de outubro de 1967 quando fomos para Nova Lamego e fizemos o transbordo dos barcos para os camiões da coluna militar que nos levou até ao destino, depois tenho outras em 26 de fevereiro de 1968 no regresso e pelos mesmos caminhos, e mais tarde, finais de março de 68, Rio Cacheu acima até São Domingos. Foram também o meu Baptismo de andar de barco fluvial, depois nunca mais parei.

Vai junto a este email uma descrição sintética, e algumas fotos, falta a maioria que a seu tempo enviarei para publicação.

Um abraço,

Ab,

Virgilio


Guiné > Região do Òio > Mansoa > 1968 > CCAÇ 2405 (1968/70) > O Alf Mil Inf Paulo Raposo, membro sénior da nossa Tabanca Grande, junto à placa toponímica que indicava as localidades mais próximas: para oeste e sudoeste, Encheia (a 18 km), Nhacra (a 28 km), Bissau (a 49 km)...; para leste sudeste e nordeste:  Porto Gole ( a 28 km), Enxalé (a 50 km), Bambadinca (a 65 km), Bafatá (a 93 km)...

Foto (e legenda): © Paulo Raposo (2006). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


II. Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira >  O dia em que queria ir a Mansoa e Mansabá de motorizada

Anotações:

Um dia de Domingo estava em Bissau, e como muitas vezes fazia era ir até Safim, havia lá uma esplanada que servia bom camarão e ostras, depois seguia para Nhacra para ir até à Piscina, tinha lá uma Companhia de Cavalaria, não me lembro o número.

Umas vezes ia acompanhado na mesma motorizada, outras vezes fomos dois, cada um na sua motorizada, ambas minhas, mas em geral ia sozinho, quando não havia mais ninguém.

Assim foi um dia, talvez em 11-03-68, tinha uma obsessão por Mansoa e Mansaba, então vou feito tolo sozinho, depósito cheio, na minha motorizada, ou Honda ou Peugeot, ambas só de dar gás, não havia mudanças.

Saia de Bissau, em direcção a Bissalanca, depois continuava até Safim, ainda se viam alguns veículos civis ou militares, mas poucos, a estrada era asfaltada, mas só Tabanca de um lado e de outro. Após o petisco em Safim, lá fui em direcção a Nhacra, dei uns saltos, tenho imensas fotos destas aventuras, mas estão no lote de mais umas 500 fotos a digitalizar, mais tarde faço essa reportagem, depois de as numerar e legendar, para já tenho apenas estas disponíveis.

Mas como devia estar com níveis alcoólicos elevados, resolvi que tinha de ir até Mansoa, o meu objectivo era Mansaba, tinha isso na mente, era o nome que me chamava a atenção.

Meti-me à estrada até à Ponte sobre o Rio Mansoa, João Landim salvo erro. Para passar na jangada, porque a ponte estava inoperacional, tive de dizer à tropa para onde ia, quem era e o que ia fazer. Expliquei-lhes, estava à civil e sem documentação, não valeu nada explicar, porque me mandaram para trás, dali para a frente só com segurança ou em coluna militar.

Ainda tentei mais tarde, mas só após voltar a ver as fotos vou saber ao certo, por agora não me lembro, e não vou inventar.

Mas nunca cheguei até Mansabá, nem Mansoa, fiquei perto, porque fui interceptado na estrada e mandado regressar a Bissau.

Diziam,  e com razão, que eu devia estar pirado da cabeça.

As fotos, poucas, não dizem muito. Umas em Safim, outras em Nhacra e outra em Bissau.

Virgílio Teixeira

Em, 29-01-2018

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Guiné 61/74 - P18286: Notas de leitura (1038): “Modelo Político Unificador, Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau”, por Livonildo Francisco Mendes; Chiado Editora, 2015 (3) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Janeiro de 2018:

Queridos amigos,
Não duvido que todos os acontecimentos inerentes à luta armada e as décadas de vida atribulada da República da Guiné-Bissau suscitem forte atração para os estudos da ciência política. O Dr. Livonildo tem sobejas reticências sobre a prática do Partido-Estado, o PAIGC, imputa-lhe graves responsabilidades nos desastres do país. Reflete sobre a liderança que ocorreu desde a luta armada, passando pelo afastamento dos cabo-verdianos, passando pelo período cesarista de Nino Vieira que uniu o que Amílcar Cabral separara, a subordinação do poder militar ao poder político passou, depois do golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980 por um longo ciclo de equívocos, ainda não completamente dissipados depois das eleições de 2014.
Não se pode dizer que o autor não investigou, resta deixar para último texto o que ele nos vai propor como novo paradigma de governação na Guiné-Bissau. Desconfio que poucos considerarão úteis tais propostas, do modo como ele as formula.

Um abraço do
Mário


Uma proposta para novo modelo de governação na Guiné-Bissau (3)

Beja Santos

A obra intitula-se “Modelo Político Unificador, Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau”, por Livonildo Francisco Mendes, Chiado Editora, 2015. O autor concluiu a licenciatura e o mestrado em Sociologia pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e em 2014 terminou o doutoramento em Ciência Política, Cidadania e Relações Internacionais pela Universidade Lusófona do Porto. A dissertação e a tese serviram de base a este livro, que é prefaciado por António José Fernandes, professor catedrático de Ciência Política.

O autor tenta interpretar a crise de liderança em que vive permanentemente a Guiné-Bissau, analisa o conceito de Estado falhado, e dá a palavra ao investigador guineense Kafft Kosta, doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, a ele se deverá uma teoria jurídico-política que pode ser designada ideologicamente por kafftianismo. O que é? Advoga que não são ignorados os riscos de instabilidade política e social. Este potencial risco deverá ser tido em conta na construção do sistema, a tradição política profunda e estruturada do povo é fundamental para que o Estado goze de governabilidade. E afirma que a proposta de Kafft Kosta é uma das mais inovadoras que surgiu nos últimos tempos em relação à reforma das estruturas sociais, culturais, económicas, políticas e militares da Guiné-Bissau. Kafft Kosta defende a criação de uma instituição, uma espécie de segunda câmara parlamentar composta pelos antigos Presidentes da República e pelas autoridades indígenas que teria um número reduzido de membros na sua composição. Em caso de crise, esta “segunda câmara” poderia fundar-se com a Assembleia Nacional. Kafft Kosta estudara o poder no “Chão Manjaco”, uma sociedade estratificada de acordo com os estatutos profissionais de cada família, tem castas e classes. Para este autor, o caminho preferencial passa por desdramatizar a realidade étnica, aceitando-a frontalmente, é necessário um equilíbrio inteligente entre o poder e a etnicidade. Ao que parece os políticos guineenses ficaram profundamente céticos face a estas propostas, não houve consenso para a criação de uma segunda câmara, o doutor Livonildo pretende fazer um ponto de situação:
“A proposta kafftiana tem um acolhimento sintonizado entre um certo Setor Intelectual Português Europeu (SIPE) e uma parte da Classe Intelectual Guineense Africana (CIGA). É pena que não nos explique quem é este setor e quem é esta classe intelectual. O SIPE persiste em tentar convencer a CIGA de que o regime político democrático não é um regime típico para a Guiné-Bissau, com os seus muitos grupos étnicos. Para este SIPE, o conveniente seria que esta SIGA optasse por um modelo de enquadramento de régulos/chefes tradicionais que correspondesse à sua realidade, em que a diáspora guineense constituiria um campo de recrutamento importante. O SIPE defende que as sucessivas lutas, por vezes violentas, entre lideranças políticas demonstra também a inadaptação da aplicação do modelo político ocidentalizado a uma realidade cultural muito específica”.
A CIGA estará premiável ao modelo kafftiano. Para que o cenário fique ainda mais complexo, entrou em cena com outras propostas, como as de Julião Soares Sousa e a de Alfredo Handem, são ouvidos vários régulos, desvela-se a política do Botswana e estabelecem-se as diferenças com a Guiné-Bissau.

O Dr. Livonildo teima em chamar a Cacheu a primeira capital da Guiné Portuguesa, um dia terá a bondade de nos explicar como desencantou este facto que toda a historiografia até agora desconhecia. Indo de conjetura em conjetura, ocorre-lhe dizer o seguinte:  
“Se alguns indivíduos guineenses que usufruíram da socialização europeia e que tenham mais habilitações podem encontrar no cenário da ressurreição étnica/tribal uma oportunidade para se assumir como elementos-chave dos órgãos do Poder, tal como acontecia com os cabo-verdianos residentes na Guiné-Bissau nas épocas anteriores à independência nacional, então este fenómeno legitimaria na Guiné-Bissau o velho sonho de Portugal antes das independências que consistia em conceder as antigas colónias aos mestiços de portugueses que serviriam de representantes dos interesses de Portugal”.
Toda esta deambulação serve para quê? Para que o autor venha provar com o seu novo modelo de governação que é possível estabilizar e desenvolver a Guiné-Bissau com a inclusão dos aspetos positivos das diferentes tradições que compõem a Babel guineense.

E muito antes que o modelo venha à tona, é-nos contada a história da democracia da Guiné-Bissau, com o concurso da ciência política, como se chega ao Estado, o território, o aparelho do poder, as categorias de Estados modernos, os Estados federais e as respetivas teorias, o Estado unitário, centralizado e descentralizado, a função legislativa, o que distingue o regime do sistema político, são referidas as grandes revoluções dos séculos XVI e XVIII, fala-se de John Locke, Montesquieu, Jean-Jacques Rousseau, Alexis de Tocqueville, diz-se mais adiante que muitos dos países africanos deram provas de terem democracias saudáveis e com reformas surpreendentes, caso do Senegal, Cabo Verde e Botswana.

Após tão culta deambulação é feita a pergunta: qual é o sistema político do governo guineense? Então fala-se dos sistemas políticos do governo, como funcionam os parlamentos, se existe só uma ou duas câmaras, se há câmaras altas, se os senadores são eleitos por sufrágio direto ou indireto, o que são sistemas legislativos unicamerais, como funciona o sistema presidencialista, de novo é interpelado o Kafft Kosta que terá disto que todas as violações das leis da Guiné-Bissau incitaram-no a fazer a seguinte pergunta: por que não a opção clara por um sistema presidencialista? Segue-se uma prolonga viagem sobre benefícios e desvantagens do presidencialismo e semipresidencialismo, vem à baila referir o sistema político português, que terá servido de referência para o modelo constitucional guineense.

Entende o autor, de seguida, questionar quais são os principais sistemas de partidos políticos que existem do ponto de vista da ciência política, fala das respetivas classificações, são citados inúmeros especialistas, descrita a história da abertura democrática na Guiné-Bissau, que ocorreu em 1991, a Carta dos 121, quando surgiram os partidos políticos que vieram concorrer com o PAIGC, sempre aqui tratado como o Partido-Estado. A essas 40 forças política partidárias o Dr. Livonildo chama partidos-clones, fabricados pelo PAIGC, na sua esmagadora maioria os políticos eram provenientes do PAIGC. E ficamos a saber mais:  
“Estes indivíduos têm como objetivo principal a execução de sabotagens e fornecimento de informações, acabando, na melhor das hipóteses por funcionar como cláusula-travão para a não existência de uma verdadeira oposição política na Guiné-Bissau. O facto de existirem mais de 40 partidos políticos num cenário em que o PAIGC se torna imprescindível à governação, num país com mais de 30 grupos étnicos e 100 subgrupos étnicos, leva-nos a admitir a existência de um fenómeno do tipo de multipartidarismo de partido dominante na Guiné-Bissau".
Segue-se a análise dos contenciosos eleitorais, devido à natureza dos sufrágios que a constituição dispõe, casos de primeira e segunda volta, reflete-se sobre o defeito da representação proporcional segundo o método de Hondt, o que é voto sincero e voto estratégico, e para além dos grupos políticos os parapolíticos, e tece as seguintes considerações:
“Face ao contexto político da Guiné-Bissau, os grupos de pressão/interesse e os grupos parapolíticos funcionam quase da mesma maneira. Isto porque a política é o principal canal de sobrevivência para a esmagadora maioria dos guineenses. Existem muitos partidos políticos que têm características típicas de atuações dos grupos de pressão. Tudo porque há um Partido-Estado cujo monopólio político faz com que todos os guineenses sejam do PAIGC. É por estas razões que não se pode, do ponto de vista da ciência política, falar verdadeiramente da sociedade civil, da imparcialidade, da independência de muitos intelectuais guineenses, devido à falta de honestidade naquilo que eles transparecem”.
E para remate destas centenas de páginas sobre a história, a guerra colonial, a caracterização política e social da Guiné, a liderança e a tradição, profere o autor:  
“A implementação da democracia na Guiné-Bissau não resolveu os problemas do passado. Por isso, é necessário organizar o país em prol de todos os guineenses e criar um modelo de governação que é um conjunto de instrumentos que integram os principais órgãos do aparelho de poder do Estado”.
É a reflexão que se segue, em que o autor apresenta o seu modelo de governação.

(Continua)
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Nota do editor

Poste anterior de 29 de janeiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18266: Notas de leitura (1036): “Modelo Político Unificador, Novo Paradigma de Governação na Guiné-Bissau”, por Livonildo Francisco Mendes; Chiado Editora, 2015 (2) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 2 de fevereiro de 2018 > Guiné 61/74 - P18279: Notas de leitura (1037): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (20) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P18285: Um conto de Natal (24): Zé, o soldado de barro (Mário Gaspar, ex-fur mil at art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)

1. Mensagem do nosso camarada e grã-tabanqueiro Mário Gaspar, com data de 31 de janeiro último:

[foto atual à esquerda; ex-fur mil at art, minas e armadilhas, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68; e, como ele gosta de lembrar, Lapidador Principal de Primeira de Diamantes, reformado; e ainda cofundador e dirigente da associação APOIAR; tem tem c. 100 referências no nosso blogue]

Caros Camaradas:

Depois de me reiniciar na escrita, escrevi muitos textos, todos publicados. Encontrei este “Soldado de Barro” que provocou críticas em alguns combatentes.

Inicialmente pensei escrever um texto para crianças, mas em cima da hora surgiu a dificuldade de publicar no jornal APOIAR no fim de ano, um texto de Natal, estando com o “Soldado de Barro” entre os dedos dei uma volta de 360% e saiu este conto de Natal.

Tenho andado às voltas no computador e vou encontrando imensos textos, alguns nem foram publicados.

Tive conhecimento que o Grande Soldado da minha Companhia (CART 1659),  António Pais Cabral n.º 06653066 e Apontador de Metralhadora.  faleceu. Estivemos muitas vezes em Operações, nunca quis ajuda de ninguém, era um jovem com menos de 40 quilos, transportava não só a MG como fitas para a mesma e pelo menos duas granadas de morteiro. No Almoço de Confraternização compareceu, tinha 110/120 quilos e o ano passado faltou, estava num Lar.

Em 2010 este “Soldado de Barro” saiu no jornal da ADFA: – “ELO”. Assinado: Mário Vitorino Gaspar, associado nº 15159.

Podem publicar no Blogue. A minha saúde é péssima.

Um abraço para o Blogue

Mário Vitorino Gaspar



2. Um conto de Natal (23) > Zé, o Soldado de Barro 

por Mário Vitorino Gaspar, associado nº 15159


Era uma vez um velhinho, muito velhinho, de nome Pinheiro. Morava naquela olaria, também ela muito velha, herdada de seu pai, feita de pedra já carcomida pelos anos. Situava­‑se numa zona muito isolada, onde só se ouvia o chilrear dos passarinhos e o sussurro do vento, murmurando nas paredes da casa, também ela velha, longe da povoação mais próxima.

O velhinho Pinheiro vivia muito só. Perdera a mulher há uns anos. Para ele, uma eternidade. Não tinha ninguém. A sua fortuna era as mãos queimadas pelo barro quente. Fazia com elas uns pífaros, muitos bonecos e outras peças que serviam para ornamentar os presépios – jumentos, o Menino Jesus nas palhinhas, José e Maria. Vendia pouco, porque só há um Natal no ano. Assim ele vivia também de alguma coisa que retirava da terra. Pois o amigo de toda a gente boa da terra principiou a sua obra, talvez a mais grandiosa: um soldado em barro.

Os traços do rosto eram belos e os olhos grandes, saltavam daquela imponente imagem de barro. Terminada a obra, depois de noites consecutivas sem se deitar, o velhinho oleiro sentou­‑se junto daquele monumento em barro. Teria por volta de um metro e oitenta. Era um grande homem, mas estava nu.
– Ti Pinheiro, que faz? – perguntou o seu vizinho e amigo Manel, que o visitava com frequência. O sonhador Pinheiro, porque a vida também é um sonho, com ar altivo, retorquiu:
– Mane! Este é o meu soldado!
– Mas ele não está fardado, Ó Ti Pinheiro! – respondeu prontamente, com uma certa angústia no olhar.

Mirava de alto a baixo a grandiosa está­tua, que mais parecia sorrir­‑lhes com um ar inocente. O velhinho Pinheiro algo comovido, respondeu, depois de passar a sua mão direita, acostumada a moldar o barro, pela cabeça do recém­‑nascido Zezinho:
– O Chico, o filho do João da Burra, regressou há bem pouco dessa guerra em África. Quero pedir­‑lhe que me dê uma daquelas fardas manchadas de verde que eles vestem.
– Não percebo para que servem as guerras!

Apontando para o telhado com o indicador direito, baixou o braço repentinamente:
– As guerras só servem para matar os nossos rapazitos, porque aquela terra não é nossa. Olha que quem te fala sabe bem o que diz. Sou muito velho, já passei as passas do Algarve. Foram também a 1.ª e 2.ª Guerra Mundial. Nem sei às vezes quantos anos tenho. A nossa terra é aqui, esta é que é a nossa terra. O filho do João da Burra parece que vem inteiro. Agora os outros!?  Vê bem quantos desta terriola vieram na madeira dos caixões? Olha que o filho do Ti Jaquim da Ponte desapareceu lá em Angola. Coitada da mãe. Parece que morreu com o filho. E o nosso João da Burra?  Como ele andava!
– Mas se pensa desse modo, porque fez isto que diz que é um sol­dado?
– O pacato do boneco até parece ter vida – respondeu o Ti Manel algo confuso.

Sentindo­‑se questionado, sabendo ser extremamente difícil com­preender as razões que ele próprio não percebia, o oleiro levantou­‑se com certa dificuldade do banco de madeira e abraçou o imenso monte de barro moldado pelas suas mãos, também enormes:
– Sei que ninguém nesta terra me compreende. Vão saber desta minha criação, mas eu nunca tive um filho. 

Após um momento de reflexão, continuou:
– Pois este é o meu filho, é o José...

Via­‑se no olhar daquele velho oleiro uma alegria mágica, algo de inexplicável, parecendo ter retornado aos seus vinte, trinta anos. Era um homem novo e com sonhos.  A verdade era que aquele grandalhão boneco, como por artes mági­cas, começou a andar e sorriu. O sorriso ainda gaiato. Ti Manel, assustado, dirigiu­‑se para a porta daquela casa de pedra já muito velha.

Olhando para trás já sem medo, disse:
– O seu filho, o Zezinho, já anda e tem movimentos como gente.

O velho Pinheiro agarrou­‑se ao seu filho chorando. Era a sua criação, com a ajuda divina, transformado num ser humano.  Ninguém por momentos falou. Instalou­‑se um silêncio, interrompido por uma voz desconhecida, uma voz forte de quem sabe o que quer da vida:
– Ó pai! – deslocando­‑se junto do espelho velho, continuou: – mas eu estou nu, sou um soldado sem farda! 

Envergonhado, tapou o sexo com as suas mãos enormes cruzadas. A vida renascia daquele barro esculpido. Era o Zé, o Zezinho que falava. 

Aquele barro falava. Com uma incontida emoção o pai Pinheiro, não deixando de abraçar o filho que continuava com as duas mãos sobre o sexo, diz:
– Dá­‑nos essa manta que está sobre a arca!

Depois de receber aquela manta de retalhos das mãos do Manel, cobriu as costas do filho, aquela sua criação feita verdade.  O tempo foi passando e o Zé já era soldado, nascera soldado. É que ninguém deveria negá­‑lo, era um soldado de corpo e alma, e ainda por cima. Toda a gente da povoação sabia serem os moços da terra e vizinhança, na grande maioria, analfabetos.

Naquele momento era um português, igualzinho a qualquer outro só com uma pequena diferença: – fora moldado pelas mãos de artista do Ti Pinheiro e transformado em ser humano, mas soldado. Não o soldadinho de chumbo ou o Pinóquio das histórias de encantar, mas o soldado de barro do oleiro. Era de tal modo igual a um soldado, que conhecia tudo sobre os mili­tares. Marchava, tinha uma ótima preparação física, não se notando sequer o cansaço quando fazia quilómetros, e bastantes, em volta do povoado.  Falava de armas, deixando as pessoas à sua volta admiradas. É que nascera soldado. Até tinha um camuflado. 

 Gostava muito do pai e falava da mãe que não tinha. A mãe Gertrudes, esposa já falecida do oleiro Pinheiro. O velhinho Pinheiro sentia­‑se alegre e mais novo, mas por vezes punha­‑se a pensar com os seus botões:
– O meu Zé é militar, vai deixar de ser meu. Vou ter de o registar, dar­‑lhe um nome.  Tem que ir “às sortes” porque nasceu soldado. E ainda para tristeza minha, os moços daqui ficam todos apurados para o serviço militar. Quando lhe toco é realmente um ser humano. Mas há qualquer coisa que não com­preendo. Ao mesmo tempo ele é de barro. Não é como nós e, ainda por cima, nasceu soldado.

Um dia, há sempre um dia, o Zé partiu para a tropa. Fez a recruta, a espe­cialidade. Era o melhor soldado entre os soldados. Mas sempre soldado.  Só que, semelhante a outro qualquer ser vivo, não se cansava, não chorava e era disciplinado. O velhinho Pinheiro quando o via em casa, nas dispensas de fins-de-semana, questionava­‑se:
– Terei sido castigado por desejar ter um filho? Queria um filho, que a minha Gertrudes, Deus tenha a sua alma em descanso, nunca me deu. Tenho um filho que nasceu militar. Tenho um filho que é soldado.

O velhote, por um instante ficou como que paralisado.  O Zé é mobilizado para a Guiné. O velhinho Pinheiro chorou. As lágrimas caiam pelo rosto gretado, para cima do barro que amassava. Não tinha interesse pelo trabalho. O momento era péssimo, porque se aproximava o Natal e tinha muitas encomendas.

Estando em casa de licença, o Zé acompanhava o pai e tentava convencê­‑lo que tudo correria bem. Mas o velho oleiro não se conformava. Aquele rapaz não era como os outros. Era de barro, o seu amado filho. Corria o risco de se quebrar.

Foram uns dias amargos, bem amargos. O pai ficou mais ligado ao filho do que nunca. Era o seu filho, não carne da sua carne, mas também da sua carne.  Chegou o dia do embarque e o velho oleiro lá partiu para o cais de Alcântara, em Lisboa.  Esteve uns breves momentos com o seu Zé, soldado de barro. O seu filho afastou­‑se lentamente, olhando­‑o profundamente. Não chorava. Come­çaram a formar­‑se os Batalhões e as Companhias. Alinhados. Lá estava o seu Zé na formatura. Era o mais belo dos soldados, pensou o velho oleiro.

Apetecia­‑lhe gritar:
– Este é o meu filho!

Depois de algum tempo todos começam a embarcar. O barulho, um imenso barulho, instala­‑se no cais, pequeno para tanta gente:
– Meu filho!? – diz alguém repleto de angústia.

Foi o toque mágico. Os gritos não chegavam para sarar as feridas. Era um quadro difícil de explicar. Os lenços seguros nas mãos e içados nos braços, pareciam exigir misericórdia. Uma nuvem trágica de cores pintava aquele cais de medo. O velho oleiro parava no tempo olhando o barco que começava a progredir nas águas sujas, tentando ver ainda o seu Zé.

Aquela amálgama de barulho ensurdecedor partia­‑se. Ouvia­‑se dis­tintamente o grito do cais e do barco que desaparecia quase na linha do mar, bem ao fundo. O tempo passou. A ligação era o aerograma. Mas o Zé não escrevia, não sabia ler nem escrever. Era um outro soldado, também José de seu nome, quem escrevia as letras para o velhinho muito velhinho:
– Estou bem, meu pai!

Aproximava­‑se o Natal e nem uma carta. Nem sequer um aerograma. Véspera de Natal, Natal, e o José não dava notícias.

Um dia o velho oleiro, enquanto trabalhava, vê pela janela aproximar­‑se o carteiro da terra. Vinha de bicicleta na mão:
– É um telegrama! – diz o homem do correio daquela terriola:
– Dá cá! – responde o velho Pinheiro, limpando as mãos às calças sujas e segurando de imediato aquele papel branco com ambas as mãos:
– O meu Zé morreu! – diz chorando.

O muito velho oleiro morreu passados dias. Não tivera Natal. O Zé morrera na noite de Natal.

O Zé era de barro, como os outros Zés soldados, e partiu­‑se, nem os cacos se aproveitaram. O soldado de barro é sempre de barro. E o barro parte­‑se.  Por tal motivo é que existem por esse mundo fora ruas com os nomes de soldados de barro, feitos heróis esquecidos.  É de barro o soldado. Os soldados de barro dessa guerra, que ainda sobrevivem. Andam por aí feitos em cacos. Fisicamente e psiquicamente.
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Nota do editor: