quarta-feira, 13 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20968: FAP (118): O último voo do «T-6 1795» em Canquelifá, e a morte do fur mil pil Alberto Soares Moutinho, em 4/12/1969 (Jorge Araújo)



Foto 1 - Vista aérea do Aquartelamento de Canquelifá [Foto de Joaquim Bernardo Silva, ex-Alf Mil da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4610/73 (Maio/1974)]



Foto 2 - Exemplo de um T-6 (matrícula 1783); 



 Geografia da Região Leste da Guiné, por onde circulou o contingente da CART 2439 (1968/70), com destaque para Canquelifá, local da queda do «T-6 1795», em 4 de Dezembro de 1969.

 

Jorge Araújo, ex-fur mil op esp / ranger, CART 3494 / BART 3873 (Xime e Mansambo, 1972/1974); um homem das Arábias... doutorado pela Universidade de León (Espanha) (2009), em Ciências da Actividade Física e do Desporto; professor universitário, no ISMAT (Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes), Portimão, Grupo Lusófona; vive entre entre Almada e Abu Dhabi; autor da série "(D)o outro lado do combate"; nosso coeditor.


4 DE DEZEMBRO DE 1969:
O ÚLTIMO VOO DO «T-6 1795» EM CANQUELIFÁ
E A MORTE DO FUR PIL  ALBERTO SOARES MOUTINHO 

1.   - INTRODUÇÃO

O acidente que envolveu a queda do «T-6 1795», da qual resultou a morte do camarada da BA 12 (Bissalanca), Fur Mil Pil Alberto Soares Moutinho, natural de Lourosa, Município de Santa Maria da Feira, ocorrido em 04 de Dezembro de 1969, 5.ª feira, em Canquelifá, localidade da Zona Leste do território da Guiné, já aqui foi aflorado em 18 de Fevereiro de 2016, no P15764.

Passados que estão quatro anos dessa primeira abordagem, divulgada pelo camarada Valdemar Queiroz, da CART 2479/CART 11 (1969/70) através de uma imagem sua, e em função de novos dados historiográficos localizados em literatura especializada, que abaixo se identifica, tomei a iniciativa de os partilhar no Fórum, para que deles tenham conhecimento e, quem sabe, de a eles puderem adicionar algo mais.

2.   - A CART 2439 - EM CANQUILIFÁ À DATA DO ACIDENTE

2.1 - A MOBILIZAÇÃO PARA O CTIG

Mobilizada pelo Regimento de Artilharia Ligeira N.º 5 [RAL 5], de Penafiel, para servir na província ultramarina da Guiné, a Companhia de Artilharia 2439 (CART 2439), a segunda de três unidades de quadrícula do Batalhão de Artilharia 2857, liderado pelo TCor Art José João Neves Cardoso, embarcou em Lisboa, no Cais da Rocha, em 09 de Novembro de 1968, sábado, sob o comando do Cap Mil Art António Regêncio Martins Ferreira, seguindo viagem a bordo do N/M "UÍGE" rumo a Bissau [CTIG], onde chegou seis dias depois.

2.2 - SÍNTESE DA MOBILIDADE OPERACIONAL


Decorridos dez dias após a sua chegada a Bissau, a CART 2439 seguiu em 26Nov68 para Canquelifá, a fim de render a CART 1689 [01Mai67-02Mar69, do Cap Art Manuel de Azevedo Moreira Maia (1.º); Cap Inf Martinho de Sousa Pereira (2.º) e Cap Art Rui Manuel Viana de Andrade Cardoso (3.º)], tendo assumido, em 01Dez68, a responsabilidade do respectivo subsector, com um Gr Comb destacado em Dunane e ficando integrada no dispositivo e manobra do seu batalhão [BART 2857]. 

Em 03Abr68 o Gr Comb destacado em Dunane recolheu à sede da subunidade, tendo sido deslocado por curtos períodos para Piche, em reforço da guarnição local. Em 21Ago70, foi rendida no subsector pela CCAV 2748 [23Jul70-19Jun72: do Cap Cav José Eduardo Castro Neves] e deslocou-se para Bissau, por fracções, a fim de aguardar o embarque de regresso, tendo entretanto dois Grs Comb permanecido na Zona Leste, em reforço temporário das guarnições de Nova Lamego e Canquelifá, até 20Set70.

3.   - O ACIDENTE EM 04 DE DEZEMBRO DE 1969 – 5.ª FEIRA
- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


3.1 – IMAGEM DOS DESTROÇOS DO «T-6 1795» EM CANQUELIFÁ




Foto 3 – Destroços do «T-6 1795» atingido em 4 de Dezembro de 1969, em Canquelifá, onde faleceu o Fur Mil Pil Alberto Soares Moutinho; in: https://www.facebook.com/photo?fbid=2505778952831540&set=g.116432285047990, com a devida vénia.

3.2 - NO BLOGUE «ACIDENTES DE AVIAÇÃO MILITAR» - [Aqueles que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando]

Na consulta ao sítio electrónico acima, aí se refere que a queda da aeronave ficou a dever-se ao facto de ter sido "atingida por tiros de antiaérea", conforme prova abaixo.



 com a devida vénia.

3.3 - NO LIVRO "ACIDENTES MORTAIS EM AERONAVES – 1917-2016", DA AUTORIA DO GENERAL PILAV JORGE MANUEL BROCHADO DE MIRANDA

No trabalho em título, que está disponível no Arquivo Histórico da Força Aérea, com data de Setembro de 2016, o autor chama a atenção, quanto ao seu valor científico, "que as fontes de história que registaram acidentes de aeronaves são essencialmente os "Processos de Segurança de Voo (SV)", mas por má elaboração ou falta de dados nem sempre aparecem elementos essenciais para a caracterização do acidente e das suas causas, ou, na falta destes, a imaginação entrou à solta e deu curso à fantasia. Vão, todavia, aparecendo, aqui e além, fora das fontes citadas, referências a acidentes que vem completar, por vezes, as informações incompletas ou mal descritas dos documentos oficiais" (p 5).

No caso em apreço, as causas do acidente são descritas do seguinte modo: "após descolar de Canquelifá incendiou-se e explodiu em voo atingido pela AAA", conforme se reproduz abaixo.



 com a devida vénia.

3.4 - NO P15764, DE 18 DE FEVEREIRO DE 2016

No poste identificado acima, tendo a sua génese nos comentários ao P15758, onde se reproduz a mesma imagem abaixo, encontramos dois depoimentos sobre esta ocorrência, respectivamente dos camaradas Abílio Duarte (ex-Fur Mil da CART 11, Nova Lamego e Paunca, 1969/70) e do José Manuel Matos Diniz (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), que recuperamos. 

Pretende-se, assim, alargar o quadro da "objectividade histórica", através da revisão da análise documental, em que a informação a que se teve acesso, do passado, permite o seu cruzamento na busca da verdade, ainda que parcial.



Foto 4 - Canquelifá (1970) – Foto do Valdemar Queiroz (CART 2479/CART 11 (1969/70) junto à carcaça (destroços) do T-6 1795 que se despenhou em 04Dez69.

3.4.1 - DEPOIMENTO DE ABÍLIO DUARTE

"A carcaça do avião, que aparece na foto, é o resto de um T-6 [1795].

Aquele avião despenhou-se em Canquelifá [04Dez69], quando pretendia sair daquele destacamento para uma operação, no sector. Lembro-me muito bem deste acontecimento, porque no dia anterior, o piloto aviador [Fur Mil Pil Alberto Soares Moutinho] que faleceu, tinha estado connosco na nossa messe em Nova Lamego, penso que era amigo do nosso furriel Pais (mecânico), lá de Espinho, e jantou com a malta. Muita tristeza. Foi a nossa sina".

3.4.2 - DEPOIMENTO DE JOSÉ MANUEL MATOS DINIZ

"Estive por duas vezes em Canquelifá por períodos de uma semana cada, talvez a partir de Abril de 1970. Sobre o acidente do T-6 [1795; em 04Dez69] ouvi [dizer] que o piloto teria sido festejado pelo seu aniversário [?], e que se bebeu alegremente. O avião levantou, mas em vez de tomar o rumo para Bissau, o piloto terá querido fazer uma manobra de agradecimento [?], um looping que acabou na grande árvore que havia no centro da localidade. Obviamente não posso jurar que foi assim".

3.5 - OUTRAS INFORMAÇÕES RELEVANTES - NT

Foram feitas pesquisas quanto à eventualidade de existem outras mortes associadas ao acidente, ocorridas nesta região, nomeadamente a nível do Exército, mas nada consta nos documentos oficiais.

Por outro lado, também não encontrámos referências relevantes sobre a actividade operacional da CART 2439, durante este período na região, com recurso a apoio aéreo.
Na ausência de mais informações esclarecedoras sobre este acidente, uma das fontes credíveis são os elementos da CART 2439, em particular os que estiveram envolvidos no socorro.

Aguardamos pela chegada de mais comentários a este propósito, mesmo sabendo que, na "fita do tempo", estamos a uma distância superior a cinquenta anos.
Fontes consultadas: as referidas em cada caso.
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
08MAI2020

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Nota do editor:

terça-feira, 12 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20967: FAP (117): Bombardeamentos noturnos, nos T6, em setembro de 1973 (Gil Moutinho, ex- fir mil pil, BA 12, Bissalanca, 1972/73; régulo da Tabanca dos Melros, Fânzeres, Gondomar)

1. Comentário do Gil Moutinho ao poste P20965 (*):

[à esquerda, o nosso grã-tabanqueiro Gil Moutinho, ex-fur nul piloto aviador, BA12, Bissalanca, 1972/73, é um dos régulos da Tabanca dos Melros:  mantém a parte agrícola  da sua quinta e faz a gestão do restaurante Choupal dos Melros, em Fânzeres, Gondomar, especializado em eventos (casamentos, batizados, festas)]


Ao ler referência aos bombardeamentos noturnos, e não havendo referência aos T6 "Roncos" nessa matéria, lembro que a 24 e 27 Setembro de 1973 participei em missões noturnas ATIP [, Ataque Independente Preparado],  em parelha.

Foram algumas experiências e não tiveram muita repetição, não sei quantas missões se fizeram.

Os bombardeamentos não eram em picada mas em linha de vôo,e tínhamos algum receio que as bombas ficassem presas ao avião pelas cavilhas das espoletas, e seria um problema.

A eficácia seria duvidosa e nós dizíamos que era para gastar stocks e chatear o IN.

Também de dia continuaram os bombardeamentos mas a grande altitude e com pouca precisão.
Achegas que vão surgindo das memórias

Gil Moutinho
 
PS - Por favor, não generalizem o meu comentário destes bombardeamentos pontuais e digamos experimentais, passando para toda a actuação da FA num período difícil para todos.

Ainda vejo muitos "bem hajam" à FAP, seja nos bombardeamentos, de apoio nos embrulhanços, seja  nas evacuações. Os factos da saga do ten pilav Castro Gil,  de Copá a Piche,  são reais, não romanceados!
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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 11 de maio de 2020 > Guiné 61/74 - P20965: FAP (116): O último ano do Fiat G-91 - II (e última) Parte (José Matos)


(...) Operações nocturnas 

As missões de Fiat à noite são executadas com luzes de posição apagadas. Esta restrição implicava que a força atacante não fosse superior a 2 caças e que a actuação, no local de acção, obedecesse a um rígido sistema de escalonamento em altitude, tanto na fase da entrada como na da saída dos passes de tiro e à selecção de um ponto em terra bem conhecido para a reunião e regresso à base, dos aviões.

Quanto ao apoio, este era relativamente fácil de prestar, porque o clarão do disparo das armas da guerrilha, denunciava a sua posição no terreno. No local de acção, o primeiro jacto a entrar tinha, por isso, grande probabilidade de infligir danos ao inimigo. Fizeram-se saídas desta natureza a favor de Gadamael Porto e outra em apoio de Cufar. (...)

Em relação ao C-47, foi engendrado um visor a partir de um derivómetro usado no DC-3 Skymaster, que media ângulos na horizontal e na vertical. Ao fim de alguns voos gerou-se uma tabela de tiro e a aeronave entrou em acção, a coberto da noite. O avião adaptado era, habitualmente, usado em missões de reconhecimento fotográfico e tinha, por isso, uma abertura no dorso inferior traseiro, para instalação da máquina fotográfica. Era por essa abertura que os militares a bordo lançavam manualmente bombas de 15 kg. Os voos eram habitualmente feitos a 10 000 pés (3000 metros) fazendo bombardeamento de área. (...).

A estreia do C-47 nesta função acontece em Setembro de 1973 com 3 acções/3 saídas nocturnas, continuando em Novembro com 5 acções/5 saídas e em Dezembro com 12 acções/12 saídas.[35]

Podemos agora ver pela análise dos SITREPS (“Situation Report”) da época que o número de acções aéreas de ataque do G.91 aumenta de forma consistente a partir de Agosto de 73, atingindo o pico máximo em Outubro (126 acções). (...)


Guiné 61/74 - P20966: Memórias de um Soldado Maqueiro (Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS / BCAÇ 2845) (6): Composição da CCAÇ 2367/BCAÇ 2845

1. Mensagem do nosso camarada Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845 (Teixeira Pinto, 1968/70), com data de 6 de Maio de 2020:

Boa tarde Carlos Vinhal
Mais trabalho para ti e para a Tabanca. Para completar o BCAÇ 2845, envio a composição das CCAÇ 2367 e CCAÇ 2368.
Tenho acompanhado tudo que na Tabanca é publicado e, claro está, gosto de nela passar algum tempo.
De momento resta-me enviar um abraço para todos, especialmente para vocês Chefes de Tabanca.


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Nota do editor

Último poste da série de 5 de maio de 2020 > Guiné 61/74 - P20945: Memórias de um Soldado Maqueiro (Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS / BCAÇ 2845) (5): Composição da CCAÇ 2366/BCAÇ 2845

segunda-feira, 11 de maio de 2020

Guiné 61/74 - P20965: FAP (116): O último ano do Fiat G-91 - II (e última) Parte (José Matos)



Fig. 9 - O primeiro Fiat G.91 a ganhar a nova pintura verde escura para evitar o míssil. Infografia: Paulo Alegria. 


O último ano do Fiat G.91 na Guiné
por José Matos
,

[Publicado originalmente na
Revista Militar N.º 4 – abril 2020, pp. 395-414-
Cortesia do autor e editor]





José Matos [, foto à direita]: 

(i) investigador independente em História Militar, tem feito pesquisas sobre as operações da Força Aérea na Guerra Colonial portuguesa, principalmente na Guiné;

(ii) é  colaborador regular em revistas europeias de aviação militar e de temas navais;

(iii) colaborou nos livros “A Força Aérea no Fim do Império” (Lisboa, Âncora Editora, 2018) e "A Guerra e as Guerras Coloniais na África Subsariana" (Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2019);

(iv) é autor, com Luís Barroso, do livro, a sair brevemente, "Nos meandros da guerra: o Estado Novo e a África do Sul na defesa da Guiné" (Lisboa, Editora Caleidoscópio, 2020).

(v) é  membro da nossa Tabanca Grande desde 7 de setembro de 2015, tendo cerca de 3 dezenas e meia de referências no nosso blogue]


II (e última parte) (*)

Operações nocturnas 

As missões de Fiat à noite são executadas com luzes de posição apagadas. Esta restrição implicava que a força atacante não fosse superior a 2 caças e que a actuação, no local de acção, obedecesse a um rígido sistema de escalonamento em altitude, tanto na fase da entrada como na da saída dos passes de tiro e à selecção de um ponto em terra bem conhecido para a reunião e regresso à base, dos aviões.

Quanto ao apoio, este era relativamente fácil de prestar, porque o clarão do disparo das armas da guerrilha, denunciava a sua posição no terreno. No local de acção, o primeiro jacto a entrar tinha, por isso, grande probabilidade de infligir danos ao inimigo. Fizeram-se saídas desta natureza a favor de Gadamael Porto e outra em apoio de Cufar.[33]

Em relação ao C-47, foi engendrado um visor a partir de um derivómetro usado no DC-3 Skymaster, que media ângulos na horizontal e na vertical. Ao fim de alguns voos gerou-se uma tabela de tiro e a aeronave entrou em acção, a coberto da noite. O avião adaptado era, habitualmente, usado em missões de reconhecimento fotográfico e tinha, por isso, uma abertura no dorso inferior traseiro, para instalação da máquina fotográfica. Era por essa abertura que os militares a bordo lançavam manualmente bombas de 15 kg. Os voos eram habitualmente feitos a 10 000 pés (3000 metros) fazendo bombardeamento de área. [34] 


A estreia do C-47 nesta função acontece em Setembro de 1973 com 3 acções/3 saídas nocturnas, continuando em Novembro com 5 acções/5 saídas e em Dezembro com 12 acções/12 saídas.[35]

Podemos agora ver pela análise dos SITREPS (“Situation Report”) da época que o número de acções aéreas de ataque do G.91 aumenta de forma consistente a partir de Agosto de 73, atingindo o pico máximo em Outubro (126 acções).[36]





Fig 6 - Fiat G-91: ações aéreas de ataque (1973)


A partir da análise do gráfico [Fig nº 6], constatamos que o número de missões ATIP (Ataque Independente Preparado) é significativo, a partir de Julho (49) sendo durante o resto do ano superior ao mês de Março, ou seja, antes do aparecimento do míssil. As missões ATAP (Ataque de Apoio Próximo) atingem um pico em Maio/Junho, durante a crise militar de Guidage, Guileje e Gadamael, baixando depois durante o resto do ano. Quanto às missões ATIR (Ataque Independente em Reconhecimento) desaparecem praticamente durante o ano.

Ataques a Kandiafara 

Em Agosto, o Tenente-Coronel Fernando de Jesus Vasquez substitui o Major Pedroso de Almeida no comando do GO1201. Um mês depois da sua chegada, os Fiat são empenhados em várias missões de bombardeamento a Kandiafara, na Guiné-Conakry. Estas missões começam no início de Setembro e intensificam-se a meio do mês, quando os “Tigres” bombardeiam esta base várias vezes, apesar da forte oposição das antiaéreas.[37] Num destes ataques, a 20 de Setembro, é morto um oficial cubano, o Tenente Raúl Pérez Abad, que apoiava as forças do PAIGC.[38]

Entretanto, a 1 de Setembro, a Força Aérea perde mais um G.91, mas, desta vez, por razões desconhecidas. O Fiat 5416 era pilotado pelo Capitão Carlos Wanzeller e participava numa missão de bombardeamento em apoio a uma helicolocação, usando bombas de 750 libras (340 kg). 


Durante o passe de bombardeamento e após largar a primeira bomba, o avião de Wanzeller enrola bruscamente para a esquerda até uma posição invertida, ficando o piloto sujeito a uma aceleração excessiva e sem controlo do avião. Após a perda momentânea de consciência, Wanzeller ejecta-se, sendo recuperado posteriormente por um helicóptero que procedia às helicolocações. Na investigação que é feita ao acidente não se consegue apurar o motivo da perda de controlo do avião, ficando o piloto ilibado de qualquer responsabilidade. [39]

No seguimento deste incidente, o Comando da Zona Aérea solicita a substituição do Fiat acidentado, sendo decidido que o avião 5439, previsto sair de IRAN 
[Inspect and Repair As Necessary] em Fevereiro de 1974 para a BA5, seja atribuído à ZACVG. 

No entanto, o chefe da 3ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea (EMFA), Coronel Costa Gomes (um veterano da guerra na Guiné), salienta “que tal decisão irá afectar a já difícil situação da Base Aérea nº 5, no que respeita à preparação operacional de pilotos de G.91 para o Ultramar.” 

Atendendo que a BA5 dispunha apenas de 5 Fiat (3 disponíveis) e que, provavelmente, todas as futuras substituições só poderiam ser realizadas recorrendo aos restantes aviões que estavam em Monte Real, Costa Gomes considera oportuno que seja revisto o problema da preparação operacional em Fiat na BA5, cada vez com menos aviões para essa função. [40] O problema agrava-se no mês seguinte com a perda de outro caça na Guiné.


Ejecção na selva 

A 4 de Outubro, os “Tigres” perdem o Fiat (5409), no norte da Guiné, na região de Jagali, a sul do rio Cacheu, perto da mata do Tancroal. Na manhã desse dia, dois G.91 descolam da BA12 rumo ao norte, pilotados, respectivamente, pelo Capitão Alberto Cruz e pelo Coronel Lemos Ferreira, na altura Comandante da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné (ZACVG). Cada avião transportava nas asas 2 bombas de fragmentação de 200 Kg e 4 bombas de demolição de 50 Kg, além das munições habituais nas metralhadoras do nariz. 


O tempo estava encoberto por nuvens altas, mas a zona suspeita distava apenas 50 quilómetros de Bissau e em 15 minutos de voo a parelha estava sobre a mata do Tancroal à procura de vestígios da guerrilha. O ponto de convergência de alguns trilhos suspeitos é assumido como alvo e a zona é de imediato bombardeada pelos dois aviões. Os dois jactos atacam o alvo de forma desfasada no tempo para que cada um possa vigiar a recuperação do outro e avisá-lo em caso de disparo do míssil e atacar o local de lançamento. 


Depois de largadas as bombas, o Capitão Alberto Cruz mergulha em ângulo de picada de 60º para metralhar a posição suspeita e de repente sente um grande estrondo e percebe que qualquer coisa de grave aconteceu ao G.91. O avião vibra com tanta violência que o piloto bate constantemente com o capacete na “cannopy” e a consola do Fiat mostra luzes acesas por todos os lados. De repente, o G.91 entra numa espiral descontrolada e o piloto perde completamente a visão à sua volta e decide ejectar-se. 


A ejecção ocorre a cerca de 400 nós (740 km/h), ou seja, muito perto do limite do cabo de disparo do pára-quedas de abertura que é de 470 nós (870 km/h). É uma ejecção violenta, tão violenta que o piloto perde o capacete e os sentidos, durante algum tempo, e sofre também uma forte compressão na coluna. A descida até ao solo é rápida. Em pouco mais de 15 segundos, o piloto aterra na floresta, mas fica pendurado numa árvore a cerca de 5 metros do solo. 


Perante a situação, deixa o paraquedas deslizar suavemente até que a cerca de 2 metros de altura cai desamparado no chão. Logo de imediato sente dores nas costas, além de um joelho dorido e de perda de visão no olho esquerdo, magoado durante a ejecção. Mas a velha cadeira Martin-Baker salvou-lhe a vida. Recupera da queda e ouve vozes dos guerrilheiros ou da população; discretamente desloca-se a custo para uma clareira, onde fica à espera de ser recolhido. [Fig. nº 7]




Fig. 7 - Capitão Alberto Cruz na Guiné.

Crédito fotográfico: Alberto Cruz 



O líder da parelha alerta Bissalanca e dois Fiat de prevenção acompanhados por dois helicópteros Alouette III armados com canhões de 20 mm partem imediatamente da base para fazer a recuperação. O primeiro G.91 chega rapidamente ao local, mas com receio de ser localizado pela guerrilha, o piloto não emite qualquer sinal luminoso. 

Passados 35 minutos, os Alouette III começam a sobrevoar a área e é nessa altura que o Capitão Cruz lança um flare que é visto por um dos helicópteros, sendo então recuperado. De regresso à base, é elaborado o relatório do que se passou em que o motivo do incidente é atribuído a “causas indeterminadas”. 


De facto, o Coronel Lemos Ferreira que estava no outro Fiat não viu qualquer míssil e o Capitão Cruz fica com a ideia de que pode ter sido o painel das metralhadoras do lado esquerdo que se abriu durante o voo, pois na inspecção que tinha feito antes de levantar voo tinha notado alguma folga neste painel. 

A suspeita do piloto leva a FAP a consultar o construtor do avião (a Dornier), que informa que “os painéis laterais de armamento já se abriram, em alguns casos, mas durante a fase de descolagem” existindo nesses casos “uma tendência de o avião enrolar para o lado oposto ao da abertura, tornando-se crítico o controlo direccional. A firma construtora especificou que no caso particular da perda do painel lateral de armamento em voo, o centro de gravidade deslocar-se-á significativamente para trás, desconhecendo-se qual a alteração da estabilidade da aeronave.”[41]

Entretanto, em Bissalanca, todos os Fiat são inspeccionados detectando-se fracturas nas longarinas da chapa pára-fogo das metralhadoras e também nos ailerons, o que obriga à respectiva reparação em todos os aviões. [42]


Os receios da época seca 

Com o início da época seca (Dezembro-Maio), as chefias militares na Guiné registam um crescendo progressivo da actividade da guerrilha, depois de alguns meses de baixa actividade (principalmente Outubro e Novembro de 73). Esperam obviamente por outro ataque de grande envergadura contra as guarnições de fronteira, sendo Bigene, Guidage, Copá, Canquelifá, Buruntuma e Gadamael, os alvos mais prováveis. Há também o receio de acções de fogo sobre núcleos populacionais importantes, como o caso de Bissau, Bafatá ou Farim. [43] 

Mas nada disso acontece. Durante toda a época seca, o PAIGC não volta a lançar ataques de grande envergadura como os de Guidage, Guileje ou Gadamael, no entanto, concentra a sua acção sobre Copá e Canquelifá na frente leste junto à fronteira com o Senegal e a Guiné-Conakry.[44] Em apoio a estas acções, os guerrilheiros continuam a usar mísseis, mas sem grandes resultados. Entre finais de Abril até Dezembro de 1973, são detectados 15 disparos contra os “Tigres”, mas sem consequências.[45]


Em busca de novos Fiat 


Em Dezembro de 1973, a Força Aérea recebe informações de que a Luftwaffe pretende desactivar durante o ano de 1974, 50 a 60 jactos Fiat G.91 R/3 com uma média de 1800 a 2000 horas de voo havendo interesse da parte portuguesa em comprar alguns destes caças para reforçar a frota da FAP.[46] 


O problema é que o Governo de Bona não pretende vender os aviões a qualquer país estrangeiro, com o receio que o destino final seja sempre Portugal. A venda de armas a Portugal é um tema politicamente sensível na Alemanha, desde que o G.91 do Tenente-Coronel Almeida Brito apareceu nos jornais alemães como sendo de origem germânica, o que gerou críticas contra o Governo. [47] 


Desta forma, torna-se impossível a compra dos aviões na Alemanha. O Chefe do Estado-Maior da Força Aérea (CEMFA), General Tello Polleri, ainda tenta explorar, junto de Espanha, a possibilidade destes aviões serem comprados pelas Construcciones Aeronáutica S.A (CASA), para depois serem vendidos a Portugal, mas sem sucesso.[48] 


Ao mesmo tempo, o Governo português tem em curso negociações para a compra de caças Mirage em França, mas o negócio esbarra na intransigência francesa de não permitir que os Mirage sejam usados na Guiné ou em Cabo Verde, uma exigência que dificulta um acordo entre Paris e Lisboa. [49]

A falta de novos Fiat preocupa a Força Aérea e a 3ª Repartição do EMFA produz, em Fevereiro de 1974, um estudo sintético sobre o problema em que considera que, face ao número de aviões existentes (31 unidades) e tendo em conta a depreciação da frota por acidentes e acção do inimigo, a FAP precisa de mais 25 aviões e 28 motores que deviam ser adquiridos nos dois anos seguintes. 


Na altura, a ZACVG dispunha de 11 caças, a 3ª Região Aérea em Moçambique de 16 e a BA5 de 4, embora estivesse previsto o reforço da 3ª RA com mais 4 jactos, ficando Monte Real sem qualquer avião para treino operacional.[50]


A fuga espectacular de Castro Gil 

Com o início de 1974, a guerrilha começa a tentar penetrar na zona nordeste da Guiné aumentando a pressão sobre Copá com bombardeamentos de artilharia. A resposta portuguesa passa pela utilização do C-47, em bombardeamentos nocturnos e do Fiat G.91, durante o dia. 

Na tarde de 31 de Janeiro de 1974, acontece um desses ataques e a BA12 recebe um pedido de apoio de fogo do quartel de Canquelifá, na fronteira norte com o Senegal. Em resposta, dois G.91 descolam de Bissalanca rumo à zona flagelada. Assim que os aviões começam a sobrevoar a área de Canquelifá, os guerrilheiros suspendem o ataque e os pilotos pedem aos militares do Exército, as referências necessárias para bombardear as posições da artilharia. 


O primeiro Fiat, pilotado pelo Tenente-Coronel Jesus Vasquez, efectua o seu bombardeamento sem qualquer reacção antiaérea, mas quando o segundo Fiat, pilotado pelo Tenente Castro Gil, executa a mesma acção é atingido por um míssil quando recupera do passe e despenha-se perto do território do Senegal. Castro Gil ejecta-se e aterra perto das linhas inimigas. A proximidade da noite não permite que seja desencadeada uma operação de regaste e o líder da parelha, após ter informado a base, regressa à BA12, que, entretanto, coloca em marcha os planos para o inevitável resgate. 


Para a operação, são mobilizados os comandos africanos de Marcelino da Mata e dois pelotões de pára-quedistas, que iriam descolar logo de manhã cedo para Nova Lamego, de onde iriam de helicóptero para a zona onde o piloto português caíra. Um C-47 fora também colocado no ar, sobrevoando a zona de Canquelifá para que Castro Gil percebesse que a Força Aérea o iria resgatar assim que possível. 


O piloto, depois de chegar ao solo e vendo-se numa zona queimada pelos bombardeamentos da guerrilha decide afastar-se para norte, para o lado do Senegal, de forma a despistar a guerrilha. Munido de uma bússola, esgueirou-se pela cinza de forma a não deixar grande rasto e caminhou o mais que pôde para não ser encontrado pelos guerrilheiros. Já depois do raiar do dia, mudou de direcção para sul, em busca da estrada alcatroada de Buruntuma-Piche-Nova Lamego. O plano de Castro Gil era chegar ao quartel de Piche.

O raiar do dia trouxe também o início das operações do Exército português. Os homens de Marcelino da Mata foram colocados no terreno e encontraram o que restava do pára-quedas e do assento ejectável, mas sem sinal do piloto. 

Entretanto, um pequeno DO-27 de reconhecimento foi colocado no ar também para procurar o piloto que,  ao ver o avião, lançou um very-light, mas desesperado, apercebeu-se que a tripulação não o vira, e o monomotor a hélice afastou-se do local onde estava. Foi um rude golpe, sobretudo tendo em conta que já se afligia com sede e calor. Mesmo assim, não desistiu e resolveu prosseguir com o seu próprio plano. 





Fig. 8 – Regresso do Tenente Castro Gil a Bissalanca. Crédito fotográfico: Grupo Operacional 1201. 



Ao fim de muitas horas, acabou por encontrar uma tabanca. Escondido entre a vegetação, estudou os habitantes para se certificar de que eram de confiança. Ao fim de uma hora, decidiu arriscar, indo ter com uma mulher para lhe pedir água. Estava agora rodeado pela população, que se revelou amigável e pediu a um habitante local para ser levado para o quartel de Piche. O homem surgiu com uma bicicleta de assento atrás e mandou Castro Gil instalar-se e arrancou a pedalar em direcção ao sul. 

No caminho, ainda passou por dois homens armados, caminhando em sentido inverso, que o condutor da bicicleta cumprimentou sem levantar qualquer suspeita. No espírito de Castro Gil ficou a dúvida se os homens seriam milícias de um destacamento existente entre Piche e Canquelifá (Dunane) ou dois guerrilheiros que teriam andado à sua procura e regressavam ao seu acampamento.

Enquanto isto se dava, a equipa de resgaste prosseguia a sua missão durante o dia, na zona de Canquelifá, mas sem encontrar vestígios do piloto.

Só ao final do dia é que receberam uma comunicação de Piche que dizia, em termos muito simples, que o piloto tinha chegado ao quartel, de bicicleta! [51]


Sistemas antimísseis 

Na altura em que Castro Gil foi abatido existiam já contactos para adquirir, em França, uma tinta de baixa reflexão de tonalidade verde escura para evitar o míssil. O primeiro Fiat a ganhar esta nova pintura foi o 5401, que estava em Monte Real na BA5, sendo transferido para a Guiné em Março de 1974. [52] [Fig. nº 9]

A Força Aérea procura também equipar os Fiat com um sistema antimíssil do tipo flare a comprar nos EUA e o ministro da Defesa, Silva Cunha, autoriza, em Fevereiro de 1974, a compra de dispersores de flares para instalar no G-91.[53] O modelo escolhido é o TRACOR TBC-72 de fabrico americano semelhante ao AN/ALE-40 da mesma empresa. A ideia era instalar 4 dispersores por avião junto ao bordo de fuga dos suportes internos. Os TBC-72 permitem a utilização, não só de artifícios iluminantes, como também de “chaff” (limalha de perturbação de radar).

Em Abril, são feitas diligências junto da embaixada portuguesa em Washington para saber da possibilidade da venda de tal equipamento pelos americanos, mas com o 25 de Abril e o fim do regime, a compra perde sentido.[54]


O fim da guerra 


A actividade operacional dos “Tigres” em 1974 vai decrescendo nos primeiros meses do ano até à revolução de Abril. Mesmo assim, a média mensal é de 140 horas/voo, ou seja, superior aos 10 meses anteriores (130 horas/voo).[55] De Janeiro a Abril de 1974, são detectados disparos de 11 mísseis contra os Fiat, mas com excepção do abate de Castro Gil, nenhum Strela atinge os jactos. [56]

Apesar do 25 de Abril e da mudança do regime em Lisboa, a guerra não acaba de imediato e os Fiat continuam a voar nos céus da Guiné. Bettencourt Rodrigues é demitido das suas funções e chamado a Lisboa, sendo substituído pelo Tenente-Coronel Mateus da Silva e depois pelo Tenente-Coronel graduado em Brigadeiro, Carlos Fabião, que toma posse em Bissau, a 8 de Maio.[57] Na Força Aérea, o Tenente-Coronel Vasquez continua no comando do GO1201, não havendo qualquer mudança.

No início de Maio, os G.91 ainda efectuam algumas missões de ataque e uma de apoio próximo em Mamboncó,[58] mas com o cessar-fogo acordado em Dacar em meados de Maio, as operações ofensivas cessam na Guiné.[59] Os “Tigres” ficam limitados a missões de vigilância até à independência da Guiné. Terminava assim a vida operacional do Fiat neste território africano.

José Matos

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O autor agradece ao Arquivo da Defesa Nacional, ao Arquivo Histórico-Militar e à Torre do Tombo, as facilidades concedidas para esta investigação. Ao TGen Fernando de Jesus Vasquez, ao TGen António Martins de Matos e ao Maj Alberto Cruz a leitura e informações prestadas. 
 

[Revisão / fixação de texto para efeitos de publicação neste blogue: LG]
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Referências:


[33] Informação prestada ao autor pelo General Fernando de Jesus Vasquez.

[34] Informação prestada ao autor pelo General Fernando de Jesus Vasquez.

[35] Análise dos Sitreps Circunstanciados n.º 40/73 e 46/73 a 52/73 do COMZAVERDEGUINÉ, Bissau, ADN/F2/16/87

[36] SITREPS do COMZAVERDEGUINÉ, ADN/F2/16/87 e 88.

[37] SITREPS nº 36-39/73 do COMZAVERDEGUINÉ, Bissau, ADN/F2/16/88.

[38] Hernández, op. cit., p. 237.

[39] Informação n.º 166 da 3ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea, Assunto: Acidentes com as aeronaves Fiat n.º 5416 em 1 Set. 73 e 5409 em 4 Out. 73, 22 de Abril de 1974, Serviço de Documentação da Força Aérea/Arquivo Histórico (SDFA/AH).

[40] Informação nº 287 da 3ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea, Assunto: Aviões Fiat G-91 da ZACVG, 10 de Setembro de 1973, SDFA/AH-SEA/Guiné 1964-1974/Fiat Processo 430.121.

[41] Informação nº 166, ibidem.

[42] Informação prestada ao autor pelo Capitão Alberto Cruz e pelo General Lemos Ferreira e Informação n.º 166, ibidem.

[43] Relatório da situação militar no TO Guiné, período de Outubro 73 a Janeiro de 74, Conselho Superior de Defesa, ADN F3/15/32/41.

[44] Idem, ibidem.

[45] Correia, José Manuel, Strela: A Ameaça ao Domínio dos céus no Ultramar Português, 2ª parte, Mais Alto n.º 393 Setembro/Outubro 2011, p. 28.

[46] Memorando do Estado-Maior da Força Aérea, 25 de Janeiro de 1974, SDFA/AH, 3ª Divisão/EMFA 71/74, Processo 400.121.

[47] Carta de Alberto Maria Bravo & Filhos, Assunto: Aviões G-91, 4 de Dezembro de 1973, Arquivo Histórico Diplomático (AHD) PEA 655.

[48] Carta do Secretário de Estado da Aeronáutica para o General Enrique Jimenez Benamu, 25 de Fevereiro de 1974, AHD PEA 655.

[49] Matos, José, A história secreta dos Mirage Portugueses, 2ª parte, Revista Mais Alto nº 401, Jan/Fev. 2013, pp. 25-29.

[50] Informação nº 44/A da 3ª Repartição do Estado-Maior da Força Aérea, Assunto: Recompletamento da Frota de Aviões Fiat G-91, 2 de Fevereiro de 1974, SDFA/AH-SEA/Guiné 1964-1974/Fiat Processo 430.121.

[51] Informação prestada ao autor pelo General Jesus Vasquez.

[52] Correia, op. cit., p. 31.

[53] Informação n.º 355 da Secretaria de Estado da Aeronáutica, Assunto: Equipamento antimíssil Strela (TRACOR), 18 de Abril de 1974, ADN/F3/7/13/5.

[54] Nota secreta do Director Geral do MNE para o Embaixador de Portugal em Washington, Assunto: Aquisição de equipamento antimíssil Strela, 22 de Abril de 1974, ADN /F3/7/13/5.

[55] Análise dos Sitreps Circunstanciados n.º 1/74 a 17/74 do COMZAVERDEGUINÉ, Bissau, ADN/F2/16/89 e AHM/DIV/2/4/295/3.

[56] Correia, op. cit., p. 28.

[57] Silva, António Duarte, A Independência da Guiné-Bissau e a Descolonização Portuguesa, Edições Afrontamento, Lisboa, 1997, pp. 179-180.

[58] SITREPS Circunstanciados n.º 18 e 19/74 do COMZAVERDEGUINÉ, AHM/DIV/2/4/295/3.

[59] Silva, op. cit., pp. 227-228.

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Nota do editor:

Último poste da série > 11 de maio de  2020 > Guiné 61/74 - P20963: FAP (115): O último ano do Fiat G-91 - Parte I (José Matos)

Guiné 61/74 - P20964: Notas de leitura (1283): “Amílcar Cabral, Vida e morte de um revolucionário africano”, por Julião Soares Sousa; edição revista, corrigida e aumentada, edição de autor, 2016 (1) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Março de 2017:

Queridos amigos,
Não se pode estudar o período da luta armada na Guiné sem consultar um conjunto de obras-chave, onde se incluem nomes como Julião Soares Sousa, Leopoldo Amado, António Duarte Silva, entre outros. Em língua portuguesa, não há livro mais rigoroso que esta biografia que Julião Soares Sousa escreveu sobre Cabral, investigação exaustiva, com arquivos, entrevistas, sempre no afã de procurar e encontrar provas novas. Livro bastante incómodo para os hagiógrafos e beatos do líder fundador. Fica-se com o retrato de um jovem educado em ambiente cabo-verdiano, numa cultura tipicamente ocidental, mas já evado de preocupações sociais, que reformula o seu pensamento no ambiente de Lisboa, que volta à Guiné e percorre o território, ali descobre a razão porque vai lutar e fundar, seguramente em 1959, um partido revolucionário com uma base ideológica singular: uma vanguarda pequeno-burguesa local à frente de um proletariado agrícola, coisa impensável para o marxismo leninismo canónico.

Um abraço do
Mário


Amílcar Cabral visto por Julião Soares Sousa: 
Uma biografia incontornável, agora revista e aumentada (1)

Beja Santos

Julião Soares Sousa
“Amílcar Cabral, Vida e morte de um revolucionário africano”,[1] edição revista, corrigida e aumentada, edição de autor, 2016: tenho para mim que é a biografia do líder histórico do PAIGC, escrita em língua portuguesa, que nenhum estudioso ou interessado na história da Guiné-Bissau ou nas lutas de libertação que ali se travaram pode dispensar. Nenhum outro investigador de Amílcar Cabral coligiu tanta documentação, desfez mitos e quimeras e enquadrou com perspicácia e isenção o homem, a sua ideologia, a sua causa, nos tempos e na circunstância em que atuou e em que perdeu vida, assassinado pelos seus próprios companheiros de luta.

É por isso um documento incontornável, atendendo que o biografado não só fundou e liderou o PAIGC como, pelo pensamento e ação, está consagrado como um dos políticos africanos de renome internacional. Julião Soares Sousa recorda que nas últimas décadas a investigação sobre esta grande figura do século XX tem aberto novas perspetivas de análise, graças à abertura de arquivos que estavam inacessíveis. O investigador sentiu-se estimulado a fazer uma nova leitura cruzada sobre o assassinato de Cabral, é este o capítulo mais alargado nesta edição revista.

A abordagem da estrutura da biografia não conheceu mudanças de tomo. No primeiro capítulo da parte primeira (da formação do homem à conquista da liderança do movimento de libertação da Guiné e de Cabo Verde) temos a infância de Cabral passada na Guiné, onde nasceu, em 1924, a sua deslocação para Cabo Verde, em 1932, fará aqui o liceu, conhecerá o desvelo sem tréguas da mãe, Iva Pinhel Évora, veremos nascer o seu estro poético e seu olhar em torno da condição cabo-verdiana. Recebe uma bolsa e irá estudar para Lisboa, o mundo está em estrepitosa mudança, emerge um radicalismo ideológico, nos meios que vai frequentar discute-se o nacionalismo africano, põe-se em causa o colonialismo. Segue-se o capítulo segundo, Cabral faz a sua aprendizagem política em Lisboa, torna-se engenheiro e parte para a Guiné, vai trabalhar na granja de Pessubé e acompanhado pela mulher procederá ao recenseamento agrícola, operação que o fará conhecer todo o território do futuro país. Em 1955, abandona a Guiné e volta a Lisboa. Vejamos o que demais relevante trata Julião Soares Sousa no seu estudo incontornável.

Quando Cabral nasce Bafatá, Juvenal Cabral é professor em Geba e depois Bafatá. Iva seria uma pequena proprietária, em Cabo Verde vê-la-emos no desempenho de trabalhos muito humildes, será ela a pagar os estudos do filho. Em Cabo Verde, Juvenal Cabral contrairá nova relação, ao contrário do que sugere certa hagiografia, a influência de Juvenal Cabral não foi tão relevante como a apregoada, a gratidão pela mãe aparece inequivocamente testemunhada na página do seu livro de curso: “Para ti mãe Iva,/Eu deixo uma parcela/Do meu livro de curso…/Para ti, que foste a estrela/Da minha infância agreste./A tua alma viva/E o teu amor profundo,/Aceita este tributo,/Que tudo quanto eu fora,/Será do teu amor,/-Tua carne, Mãe, teu fruto!”.

Julião Soares Sousa enquadra a formação do jovem estudante, Cabral denota aí as bases da sua cultura portuguesa, que jamais renegará. Em Lisboa conhecerá novo ambiente. Fica atento ao MUD – Movimento de Unidade Democrática, contacta regularmente com a Esquerda portuguesa e vai firmando a opinião de que a luta antifascista não está verdadeiramente motivada para a luta anticolonial. O autor aborda as influências literárias, ideológicas e culturais, o pendor marxista começa a germinar. Afluem a Portugal cada vez mais africanos, as discussões sobre a independência das colónias africanas ganha expressão. O autor desvela a vida do Centro de Estudos Africanos, a par das atividades da Casa dos Estudantes do Império.

Em 1950, Cabral terminou o seu curso, dois anos depois defendeu a sua tese de tirocínio, é reconhecido como especialista em erosão de solos. Há anos que se sente atraído por África, apresenta candidaturas, é aceite para um lugar disponível de Engenheiro Agrónomo na Repartição Técnica dos Serviços Agrícolas e Florestais da Guiné, desembarca a 21 de Setembro de 1952, a mulher junta-se-lhe em Novembro. Os grupos oposicionistas de Bissau vivem dentro dos princípios da luta antifascista, Cabral está motivado pela luta nacionalista, deixa o antifascismo para os oposicionistas portugueses. Torna-se um comunicador brilhante ao nível da sua profissão, tenta criar o Clube Desportivo em Bissau, a Administração não dá seguimento. Aspeto curioso sublinhado pelo autor, a pretensão baseava-se num clube exclusivamente para guineenses, põe-se a dúvida se nesta fase Cabral ainda não tinha urdido a tese da unidade Guiné-Cabo Verde. O autor esclarece outras coisas, como a alegada fundação do MING por Cabral ou a ele se tenha associado. Põe-se como hipótese que tanto o Partido Socialista da Guiné como o MING tiveram vidas efémeras. Em Março de 1955, Cabral e a mulher regressam a Portugal, vêm doentes, certos hagiógrafos têm escrito que foram expulsos ou perseguidos, não há provas, no entanto a ficha de Cabral na PIDE começa a crescer.

A vida profissional de Cabral vai aproximá-lo de Angola, da convergência com outras lutas anticoloniais, encontra-se em Paris com dirigentes angolanos, são-tomenses e moçambicanos. Sobre a fundação do PAI (Partido Africano pela Independência da Guiné e de Cabo Verde) em 1956, o autor põe sérias reservas quanto à natureza do partido criado e não vê hipóteses de Cabral lá ter estado presente. Não há uma só menção na correspondência trocada entre Cabral e outros camaradas revolucionários da fundação do PAI em 1956. Recorde-se que o mesmo se passa com a data da fundação do MPLA, sobre a qual há manifesta controvérsia.

Em Setembro de 1959, Cabral está comprovadamente em Bissau, inteirou-se da agitação política existente e do massacre do Pidjiquiti, contactando com a única organização política existente em Bissau, o Movimento de Libertação para a Guiné, onde pontifica Rafael Barbosa. Acorda-se na necessidade de uma estratégica, Cabral e Rafael Barbosa são as duas figuras chave para o impulso dinâmico do partido. Criou-se uma organização clandestina, definiram-se propósitos. Ainda hoje há muitas nebulosas sobre quem são os fundadores e alegados fundadores do PAI, futuro PAIGC. Já no exílio, e sobretudo a partir de Conacri, onde funciona o seu escritório e a escola piloto, Cabral vai contactar outras organizações nacionalistas da Guiné e Cabo Verde. A luta vai arrancar, a sua liderança, gradualmente, ir-se-á impondo.

(Continua)
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Notas do editor

[1] - Vd. poste de 22 DE NOVEMBRO DE 2016 > Guiné 63/74 - P16746: Agenda cultural (521): "Amílcar Cabral (1924-1973): vida e morte de um revolucionário africano", nova edição, revista, corrigida e aumentada (622 pp.): convite da embaixada guineense para o lançamento do livro do prof doutor Julião Soares Sousa, na Universidade Lusófona, Lisboa, sábado, dia 26, às 15h00

Último poste da série de 4 de maio de 2020 > Guiné 61/74 - P20939: Notas de leitura (1282): “Corações Irritáveis”, por João Paulo Guerra, Clube de Autor, 2016 (Mário Beja Santos)