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segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Guiné 61/74 - P19402: Guerra colonial - cronologia(s) - Parte II: A nova "união sagrada": "A Pátria deve estar, em todas as circunstâncias, acima do regime"... mas "o regime [também] deve estar, em todas as circunstâncias, à altura da Pátria" (Diário de Lisboa, 18 de março de 1961)



[Fundação Mário Soares > Portal Casa Comum > Pasta: 06541.079.17211 > Título: Diário de Lisboa > Número: 13743 > Ano: 40 > Data: Sábado, 18 de Março de 1961 > Directores: Director: Norberto Lopes; Director Adjunto: Mário Neves > Edição: 2ª edição > Observações: Inclui supl. "Diário de Lisboa Magazine", "Diário de Lisboa Juvenil" > .Fundo: DRR - Documentos Ruella Ramos. (Com a devida vénia...)


Citação:
(1961), "Diário de Lisboa", nº 13743, Ano 40, Sábado, 18 de Março de 1961, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_16336 (2019-1-9)



1. Uma espécie de  "união sagrada", 45 anos depois do 13º governo da I Primeira República, liderado por António José de Almeida para fazer face à declaração de guerra da Alemanha em 1916 contra Portugal...

"A Pátria deve estar, em todas as circunstâncias, acima do regime"... mas "o regime [também] deve estar, em todas as circunstâncias, à altura da Pátria" (Diário de Lisboa, 18 de março de 1961). A nota do dia ("O mal e a caramunha"), do "Diário de Lisboa", de 19 de março de 1961, deve ser entendida como "uma no cravo e outra na... censura". O jornalista Norberto Lopes, desassombrado, transmontano, conhecedor de África (, contrariamente ao Salazar...), não pode deixar de ser o autor desta espécie de "editorial", disfarçada de "nota do dia"...

Jornal independente, conotado com as correntes ditas moderadas da chamada oposição democrática ao Regime do Estado Novo, o "Diário de Lisboa" era um dos jornais mais vigiados pelos coronéis da censura... Daí não surpreender este apelo, subliminar, não já a uma "nova união sagrada", impensável com Salazar, mas a um pacto (provisório) de regime para o país, em uníssono, dar uma resposta firme e imediata à insurreição desencadeada pela UPA  - União dos Povos de Angola (mais tarde, FNLA - Frente Nacional de Libertação de Angola] no norte de Angola...

Salazar teve de resolver alguns "problemas domésticos" (e nomeadamente a tentativa de golpe de Estado palaciano do seu ministro da defesa, o gen Botelho Moniz, que ingenuamente esperava o apoio dos americanos...),  antes de tentar galvanizar e mobilizar a Nação para a resposta, já tardia, que as populações angolanas exigiam: a frase histórica, "Para Angola, rapidamente e em força" é  de... 13 de abril de 1961... E o primeiro continente para reforço da guarnição militar de Angola só lá vai chegar em 1 de maio de 1961: "Chegada a Luanda dos primeiros contingentes transportados por via marítima [BCAÇ 88, BCAÇ 92, CART 85, CART 86, CART 87, CART 100]." (1)

O seu primeiro biógrafo, académico,  historiador encartado, mas "estangeirado", diz  seguinte sobre ele, Salazar:

"Sobre o prisma da retórica do regime, o maior fracasso de Salazar ao longo das suas quatro décadas no poder terá sido a sua incapacidade de proteger a população branca e os seus trabalhadores no Norte de Angola em 1961". 

(In; Menezes, Filipe Ribeiro de  -  Salazar : uma biografia política ; trad. do ingl.,  Teresa Casal. Alfragide : Dom Quixote,  D.L. 2014, [Expresso], vol . 6, p. 13.)

De qualquer modo, parece que ninguém estava preparado para a guerra que se seguiu, guerra colonial para uns, guerra do ultramar para outros.. Não apenas o exército português, como os movimentos nacionalistas que reivindicam hoje o protagonismo da história da luta pela independência de Angola: o MPLA em 4 de fevereiro, a UPA em 15 de março de 1961, sem esquecer a Unita (que surgirá mais tarde)...

Por outro lado, em 1961, o regime beneficiou do "efeito de choque" que foram as notícias, trágicas, que chegavam de Angola, com algum atraso, à metrópole, e que alguns tiveram mais "liberdade" do que outros para publicar... (A censura tinha vários pesos e medidos, conforme os jornais diários, a maioria "afeta" ao poder vigente: O Século, o Diário de Notícias, etc. Apesar de 1961 ser o "annus horribilis" de Salazar, terá havido um certo  cerrar de fileiras das elites políticas, incluindo as do "reviralho", à volta do "para Angola, rapidamente e em força"... E o tema tornou-se "tabu"... A malta do "reviralho" bem quis levantar, timidamente, o "problema do ultramar" nas eleições de 1965 para a Assembleia Nacional, mas levou logo nas orelhas, e enfiou a viola no saco, deixando a União Nacional a falar a uma só voz... Até outubro de 1969...

Nessa época, em março de 1961,  muitos de nós, ainda usavam o bibe da escola e jogavam ao pião... Acabou também para sobrar, "aquela guerra",  para nós que nem sequer sabíamos onde ficava o "ultramar", Nambuangongo ou Guileje, Pedra Verde ou Fiofioli ... LG
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Nota do editor:

Último poste da série > 9  de janeiro de  2019 > Guiné 61/74 - P19385: Guerra colonial - cronologia(s) - Parte I: 1961, Angola

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Guiné 61/74 - P19394: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte V: ten cav Jorge Manuel Cabeleira Filipe (Marinha Grande, 1935 - Luanda, 1961)







1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975, na guerra do ultramar.

Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972. Foi cadete-aluno nº 45/63, do corpo de alunis da Academia Militar.




O ten cav Jorge Manuel Cabeleira Filipe foi o quarto oficial, oriundo da Escola do Exército, a morrer em combate em Angola, em 1961.

Lisboa > Academia Militar > Palácio da Bemposta ou Paço da Raínha, na Rua do Paço da Rainha > Festival Todos , 7ª edição, 2015 > 12 de setembro de 2015 > Visita guiada, pelo cor art ref Vitor Marçal Lourenço, professor da Academia Militar.


É aqui a sede da Academia Militar (, antiga Escola do Exército, fundada en 1837), que tem como patrono o general Bernardo de Sá Nogueira, Marquês de Sá da Bandeira. Há também um polo na Amadora.

O seu lema é: "Dulce et decorum est pro Patria mori" (em português: É doce e honroso morrer pela Pátria: o verso em latim é de uma ode do poeta romano Horácio, do séc. I a.C.; "patria", em latim, a cada dos pais - "patres" -  ou dos antepassados...).

Na escadaria de acesso ao piso superior (biblioteca. museu, galeria de comandantes...) estão inscritos os nomes dos antigos alunos mortos durante a guerra colonial (1961/74), nos vários teatros de operações. Neste excerto do mural, estão so nomes dos 4 primeiros.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].
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Nota do editor:

Último poste da série > 10 de janeiro de  2019 > Guiné 61/74 - P19390: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte IV: Manuel Jorge Mota Costa (Porto, 1937 - Bongo, Angola, 1961)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Guiné 61/74 - P19385: Guerra colonial - cronologia(s) - Parte I: 1961, Angola







Diário de Lisboa, 18 de março de 1961

[Fundação Mário Soares > Portal Casa Comum > Pasta: 06541.079.17211 > Título: Diário de Lisboa > Número: 13743 > Ano: 40 > Data: Sábado, 18 de Março de 1961 >  Directores: Director: Norberto Lopes; Director Adjunto: Mário Neves > Edição: 2ª edição > Observações: Inclui supl. "Diário de Lisboa Magazine", "Diário de Lisboa Juvenil" > .Fundo: DRR - Documentos Ruella Ramos. (Com a devida vénia...)

Citação:
(1961), "Diário de Lisboa", nº 13743, Ano 40, Sábado, 18 de Março de 1961, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_16336 (2019-1-9)


Guerra Colonial > Cronologia > Angola > 1961

Camaradas: muitos de nós éramos adolescentes quando começou a guerra colonial.  Eu tinha 14 anos, e os terríveis acontecimentos do Norte de Angola, meio percebidos nos títulos e entrelinhas dos jornais, e nas lacónicas notícias da Rádio e da Televisão,  perturbaram-me profundamente. Senti que "aquela guerra" ia sobrar para mim e para toda a minha geração... (Outros eram ainda muito mais novos: 13, 12, 11, 10, 9 anos..., não tinham consciência da gravidade do momento, até à altura dos seus irmãos mais velhos serem mobilizados para Angola, respondendo à célebre ordem, tardia, de Salazar, de 14 de abril de 1961: "Para Angola, rapidamente e em força"...; na véspera, tinha havido a tentativa de golpe de Estado palaciano do gen Botelho Moniz, ministro da defesa... Salazar antecipou-se, remodelou o Governo, autonomeou-se ministro da Defesa e "decapitou" as chefias das forças armadas; estava traçado o destino da "guerra do ultramar", que se iria prolongar por 13  dolorosos e inúteis anos até 25 de Abril de 1974.)

Em 31 de maio de 1969, oito depois, com 22 anos, eu estou a desembarcar em Bissau e vou integrar uma das companhias da "nova força africana" do general Spínola... Muitos de nós  (para não falar dos nossos filhos e entos, e da generalidade dos portugueses) ainda hoje sabemos pouco do que se passou em Angola, em 1961... Daí a a oportunidade desta síntese cronológica. Não será a única, é a que estava mais à mão... Mas temos alguns camaradas, mais velhos, que são contemporâneos dos acontecimentos, e que têm o privilégio de poder falar na primeira pessoa do singular... Eles que nos contem as suas histórias. LG



1961-02-04

Revolta em Luanda, com ataques à Casa de Reclusão, ao quartel da PSP e à Emissora Nacional, acção considerada como o início da luta armada em Angola, de iniciativa de (, ou atribuída a ou, mais tarde, reivindicada por) o MPLA - Movimento Para a Libertação de Angola.

1961-02-07

Primeira aterragem na pistam construção, do Negaje, em Angola. Esta data passou a ser o Dia da Unidade do AB3 - Aeródromo Base 3.

1961-03-15

Partida de Lisboa de quatro companhias de caçadores para reforço da guarnição de Angola: CCAÇ 66 / 5ª CCE, R 10, Aveiro; CCAÇ 67 / 6ª CCE, RI 10, Aveiro; CCAÇ 78 / 7ª CCE, BC 5, Lisboa; CCAÇ 82 / 9ª CCEm RI 14, Faro.

1961-03-15

["O Dia do Terror".] Início de uma rebelião, planeada e/ou coordenada pela UPA - União dos Povos de Angola, de Holden Roberto (1923-2007), no Norte de Angola, na região dos Dembos, que levou ao massacre indiscriminado de colonos portugueses e de populações negras, causando centenas de vítimas (em termos de vítimas mortais desta barbárie, fala-se em 800 europeus e 6000 africanos, mas os números ainda hoje são controversos). Dias antes, a 7 de março, os EUA tinham informado o Ministério da Defesa sobre a decisão da UPA em desencadear o terror na noite de 15 de março, instrumentalizando as populações locais,   informação que o comando militar de Angola terá menosprezado. Holden Roberto (1923-2007), o histórico dirigente da UPA, tinha na altura o apoio público e notório da administração Kennedy.


1961-03-16

Ataques dos elementos sublevados do Norte de Angola a algumas povoações, como Carmona, Aldeia Viçosa e Bessa Monteiro


1961-03-16

Chegada a Luanda da primeira companhia de pára-quedistas

1961-03-17

Primeiro comunicado oficial sobre os acontecimentos do Norte de Angola. Versão "soft"... Em 15 de março Salazar tinha decidido o "blackout" noticioso, mas acabou por ser completamente ultrapassado pelos acontecimentos: os jornais e as rádios de Angola não paravam de dar grande cobertura aos acontecimentos que dilaceravam o território...

1961-03-18

Início da actuação da Força Aérea, que dispunha poucos meios,  no Norte de Angola

1961-03-21

Chegada, a Luanda, do almirante Lopes Alves, ministro do Ultramar

1961-03-21

Evacuação de mais de 3500 portugueses residentes no Norte de Angola para Luanda, através de ponte aérea


1961-03-28

Constituição, em Angola, do primeiro corpo de voluntários civis armados, para actuação no Norte de Angola, dando origem mais tarde à OPVDCA - Organização Provincial de Voluntários de Defesa Civil de Angola.
  

1961-04-02

Emboscada, na sanzala de  Cólua, Aldeia Vicosa,  Uíge, a uma coluna militar portuguesa, sendo mortos nove militares, dos quais dois oficiais, capitão de infantaria Abílio Eurico Castelo da Silva (1925-1961) e tenente de infantaria Jofre Ferreira Prazeres (1932-1961), ambos naturais de Chaves. (*)


1961-04-10

Ataque à povoação de Úcua, na estrada Luanda-Carmona, com o massacre de 13 brancos

1961-04-10

Primeiro ataque a trabalhadores bailundos de uma fazenda na área do Quitexe

1961-04-11

Ataque a uma patrulha portuguesa próximo de Tando Zinge, Cabinda


1961-04-12

Ataque à povoação de Lucunga, com massacre da maior parte dos seus habitantes brancos


1961-04-13

Ataque de guerrilheiros provenientes do Congo-Brazzaville a Bucanzau, em Cabinda


1961-04-15

Reunião do primeiro Conselho Superior Militar, presidido por Salazar, para tratar do envio de reforços militares para Angola


1961-04-16

Partida dos primeiros contingentes militares, para Angola, formados por pára-quedistas, por via aérea: a 1ª CCP, seguindo-se em abril, a 2ª CCP, e em maio a 3ª CCP [futuro BCP nº 21, criado em 8 de maio]


1961-04-21

Partida dos primeiros contingentes militares para Angola (via marítima)


1961-04-23

Partida de uma companhia de legionários para Angola [A Legião Portuguesa acabou por se limitar à defesa de instalações de uma empresa...]


1961-04-30

Fim do cerco à povoação de Mucaba, depois da intervenção da Força Aérea, que utilizou bombas de napalme de 90 kg.


1961-05-01

Chegada a Luanda dos primeiros contingentes transportados por via marítima [BCAÇ 88, BCAÇ 92, CART 85, CART 86, CART 87, CART 100].


1961-05-02

Ataque a Sanza Pombo e novos ataques a Mucaba e à Damba, no Norte de Angola


1961-05-04

Ataque ao Songo, a norte de Carmona


1961-05-08

Ataques a Sanza Pombo, Úcua, Santa Cruz, Macocola e Bungo, com utilização de novas armas


1961-05-21

Ataque frustrado ao nó de comunicações do Toto, a sul de Bembe


1961-05-24

Ataque a Quimbele durante treze horas consecutivas


1961-05-24

Ataque ao posto de Porto Rico, próximo de Santo António do Zaire, com utilização de armas automáticas

1961-05-26

Ataque a Quimbele, durante 13 horas consecutivas, um dos mais violentos na altura.

1961-05-31

Chegada do Batalhão de Caçadores 88 à Damba. Em 14 de maio, o BCAÇ 96 já tinha seguido para Úcua e o BCAÇ 109 para Ambrizete.


1961-06-02

Ataques a várias fazendas em torno de Carmona, Negaje e Ambriz


1961-06-08

Primeiro avião da Força Aérea, um PV-2,  desaparecido em Angola, com três tripulantes a bordo


1961-06-14

Reocupação do Tomboco por uma força da Marinha


1961-06-19

Ataque dos guerrilheiros da UPA à vila de Ambriz, com utilização de armas automáticas

1961-06-24

Reocupação de Cuimba, a este de São Salvador do Congo


1961-06-30

Primeiro comunicado oficial das Forças Armadas, referindo a morte de 50 militares entre 4 de Fevereiro e 30 de Junho em Angola


1961-07-01

Operações do Exército e Força Aérea na serra da Canda, para reabertura da chamada 'estrada do café'


1961-07-07

Comunicado das Forças Armadas sobre as actividades dos meses de Maio e Junho, no Norte de Angola

1961-07-15

Morte de seis militares em Quicabo, na sequência da operação de reocupação de Nambuangongo.


1961-07-18

Início da operação, pelo BCAÇ 96,  de cerco a Nambuangongo, ocupada pelos rebeldes desde o início da sublevação em Angola. Prolonga-se até 9 de agosto (Operação Viriato, uma das mais emblemáticas da guerra do Ultramar.)


1961-08-04

Ocupação de Zala e Quicunzo pelas forças portuguesas, que progridem para Nambuangongo


1961-08-07

Declaração do ministro do Exército à emissora oficial de Angola, onde afirma que aos 'terroristas' se colocava apenas um dilema: 'Rendição incondicional ou aniquilamento total'


1961-08-11

Primeira operação militar com lançamento de pára-quedistas, efectuado sobre a região de Quipedro, em Angola


1961-08-17

Primeira utilização operacional dos aviões caças-bombardeiros F84, a partir da Base Aérea de Luanda


1961-08-24

Início de uma operação conjunta, com aviação, pára-quedistas e forças terrestres, na serra da Canda


1961-09-10

Início da operação militar conjunta que conduz à reocupação da 'Pedra Verde'


1961-09-16

Desordem entre militares pára-quedistas e elementos da polícia, em Luanda, de que resultou um morto e vários feridos, e que ficou conhecido como 'Incidente da Versalhes'


1961-09-16

Entrada das tropas portuguesas na Pedra Verde


1961-10-07

Discurso de Venâncio Deslandes, a dar por findas as operações militares no Norte de Angola, passando-se à fase das operações de polícia


1961-11-10

Desastre de aviação do Chitado, em que morreu o general Silva Freire, comandante da Região Militar de Angola, e mais 14 militares do Exército e da Força Aérea


1961-11-14

Partida do primeiro destacamento de fuzileiros especiais para Angola


1961-11-27

Anúncio, pelo governador-geral de Angola, de 'nova actividade terrorista' no Norte do território

1961-12-02

Expulsão de Portugal de quatro missionários norte-americanos, acusados de apoio aos movimentos angolanos

1961-12-31

No final do ano de 1961, havia cerca de 33 mil homens no território, enquanto se reforçavam também as guarnições militares da Guiné e de Moçambique.


Fonte: Excerto de  Guerra Colonial 1961-1974 > Cronologia, com a devida vénia...

Para mais detalhe e cronologia nacional, vd. Carlos Matos Gomes e Aniceto Afonso - Os Anos da Guerra Colonial, vol. 2 - 1961: o princípio do fim do império. Lisboa: Quidnovi, 2009.

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Nota do editor:

(*) Vd. postes de:

8 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19381: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte II: Abílio Eurico Castelo da Silva, cap inf (Chaves, 1925 - Cólua, Angola, 1961)

Guiné 61/74 - P19384: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte III: Jofre Ferreira Prazeres, ten inf (Vidago, Chaves, 1932 - Cólua, Angola, 1961)






1. Continuação da publicação série respeitante biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975..


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Nota do editor:

Postes anteriores da série > 


8 de janeiro de 2019 > Guiné 61/74 - P19381: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte II: Abílio Eurico Castelo da Silva, cap inf (Chaves, 1925 - Cólua, Angola, 1961)

sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

Guiné 61/74 - P19264: Notas de leitura (1128): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (63) (Mário Beja Santos)

Selo Comemorativo do I Centenário do BNU


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Abril de 2018:

Queridos amigos,

Estamos pois em 1961, na China formam-se os jovens quadros do PAIGC, em Conacri Amílcar Cabral teria a escola-piloto, acolhe aqueles que Rafael Barbosa envia para a luta armada, há grande tensão com outros partidos e grupos hostis ao PAIGC, gente que consegue apoio e granjeia simpatias junto de acólitos de Sekou Touré. 

No Senegal, as simpatias de Senghor não apontam para o PAIGC, os Manjacos do Movimento de Libertação da Guiné [MLG]têm carta livre para agir, e vão mesmo agir, ao longo do segundo semestre de 1961, a correspondência do gerente de Bissau isso certifica.

Em março de 1962, o PAIGC dentro da Guiné sofre um grande abalo, alguns dos melhores quadros são apanhados com a boca na botija. O gerente de Bissau prevê um período de apaziguamento, está redondamente enganado, a subversão do Sul vai pôr a vida das pessoas em bolandas, nunca mais o Sul será o mesmo.

Um abraço do
Mário


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (63)

Beja Santos

1961 marca o início das hostilidades na Guiné, o Movimento de Libertação da Guiné  (MLG), orientado por Manjacos, muitos deles a residir no Senegal, procuram antecipar-se ao PAIGC, o seu grande rival. Temos notícias dos acontecimentos por carta confidencial dirigida ao governo do BNU pelo gerente de Bissau em 21 de julho:

“Por informações fidedignas, colhidas em meio competentes, informamos V. Exas. de que na madrugada de ontem se verificou um assalto à povoação de S. Domingos, que dista 130 km de Bissau, visando especialmente o edifício onde está instalado um pelotão de tropas europeias e indígenas.

Pela escuridão da noite, não foi possível calcular o número de assaltantes. Supõe-se que tenham sido cerca de 50, pela diversidade de pontos por onde partiam os disparos. Os bandoleiros usavam caçadeiras de zagalotes e apenas por este facto ficaram feridos 3 soldados, um com gravidade.

O ataque foi prontamente repelido. Não se conseguiu fazer qualquer prisioneiro, nem apurar o número de feridos ou mortos, porque os bandoleiros levaram-nos para o território vizinho, certamente para não serem identificados eles ou a família. São, todavia, portugueses, pelas frases que foram ouvidas alguns, quando atingidos pelas balas dos nossos soldados.

Uma hora depois da refrega, tudo voltou à normalidade, mas foram imediatamente enviados reforços. Não se nota que o criminoso acto tenha tido qualquer reflexo na população indígena ou europeia, que se mostra confiante.

As autoridades redobraram de vigilância, especialmente junto à fronteira, mas estranha-se que o miserável ataque tenha partido de um território com quem mantemos relações de amizade, e não da fronteira da Guiné de Sekou Touré”.

O Movimento de Libertação da Guiné andou dias depois a praticar vandalismo em Susana e Varela, deu sinais de atividade nos meses seguintes, queimando pontões, incendiando armazéns. No acervo documental do Arquivo Histórico do BNU encontra-se um interessante relatório relativo ao saque e incêndio de Guidaje, tem a data de 18 de novembro de 1961 e foi elaborado pela gerência da Sociedade Comercial Ultramarina em Bissau.

Leia-se a introdução, abona alguns dados relevantes:

“Começadas em Julho as incursões no norte da Província, na sequência já conhecida de S. Domingos, Varela e Susana, e a relativa falta de apoio militar naquela zona, o nosso encarregado de Ingoré apresentou-se em Bissau dada a insegurança da área, que está guarnecida apenas com um pelotão indígena, do qual uma secção era destacada para servir Bigene, e do qual dois ou três soldados tinham desertado levando consigo as espingardas.

Após conversa com V. Ex.ª o Governador que garantiu ao signatário que o Ingoré acabara de ser fortemente reforçado e que na véspera não houvera qualquer incidente, enviámos um empregado para o Ingoré, acompanhado do Sr. Manuel de Figueiredo que levou instruções e plenos poderes para decidir em face da situação sobre a atitude a tomar. Analisada localmente a situação, o Sr. Figueiredo determinou a continuação da actividade com abaixamento de stock.

Em conversa havida anteriormente com Sua Ex.ª o Governador, este chamou a nossa atenção para absoluta necessidade de se manter a vida normal da Província a todo o custo, não se deviam diminuir os stocks, ao qual lhe respondemos que os montantes de stocks nada tinham como movimento comercial dada a existência sempre de quantidades de mercadoria em depósito durante a época das chuvas, que de qualquer modo não valia a pena arriscar.

Em 9 de Agosto, fomos apresentar cumprimentos, nas instalações do BNU, ao Sr. Dr. Castro Fernandes, nosso Exm.º Presidente da Mesa da Assembleia Geral, que aproveitou a oportunidade para reafirmar a necessidade expressa por sua Ex.ª o Governador, preconizando mesmo que o Governo da Província estabelecesse sanções severas contra qualquer das firmas grandes que reduzisse a sua actividade, fechando sucursais, por motivos da situação existente, dadas as perturbações que daí poderiam advir. Disse S. Ex.ª também que não devíamos reduzir os stocks. Por outro lado, afirmou da necessidade dos indivíduos se manterem na Província com as suas famílias, mulheres e crianças, mantendo-se o regime normal de vida anterior aos incidentes. Declarou-nos que estava disposto até a vir todos os meses estar na Província com a sua esposa e filha”.

O que se vai seguir no relatório é um caso exemplar de suspeição por rumor ou boato ou mesmo ajuste de contas, bem típico de uma atmosfera em que os protagonistas sentem que a paz vivida abriu fissuras, e que se temem traições ou graves infidelidades.

O gerente da Sociedade desloca-se a Farim onde fizera concentrar os empregados de Bigene e Guidage, procura dar apoio moral e dar conhecimento da orientação a seguir, determinando que certas mercadorias seriam transferidas para Bissau através de Farim. Estamos em 15 de agosto e o Governador chama de novo o gerente da Sociedade à noite. O Chefe de Gabinete do Governador mostrou ao gerente um telegrama acabado de receber do Administrador de Farim pedindo a transferência do encarregado da Sociedade em Guidage, “dada a colaboração que vinha fazendo com o inimigo, vendendo-lhe arroz, gasolina, etc., recebendo em casa as autoridades da localidade senegalesa de Tanafe, promovendo reuniões noturnas, etc.”. O gerente reage apontando os inconvenientes de tal transferência. E o gerente é convidado a ir averiguar os factos a Guidage, o gerente contesta. A 16 de agosto chega um telegrama de Farim transmitindo o pedido do Administrador para transferir o empregado de Guidage. Nova conversa com o Governador, é sugerido que o empregado venha a Bissau imediatamente para se ajuizar da sua boa ou má-fé, seria a PIDE a proceder a averiguações.

A 18 de agosto o empregado de Guidage chegou a Bissau.

“Demos-lhe conhecimento das suspeitas que a seu respeito tinham sido levantadas e procurámos inteirar-nos da situação. Nada de concreto pudemos apurar do empregado, a não ser o que já sabíamos, que comprara durante a campanha cerca de 400 toneladas de mancarra. O empregado mostrou-se alarmado, declarou que as afirmações feitas eram redonda mentira com excepção evidente da parte das vendas por quanto não recebera ordens de ninguém para deixar de vender aos clientes que se apresentavam ao balcão, ainda que soubesse que viviam além-fronteiras. Se estes ultrapassavam a fronteira, nada lhe podiam imputar uma vez que não é a ele que lhe compete a vigilância da fronteira. Quanto a fazer reuniões nocturnas em sua casa e ausentar-se de Guidage durante a noite, desafiava quem quer que fosse a prová-lo. Quanto a receber em sua casa indivíduos do lado de lá da fronteira, sendo a única casa da localidade com condições e até dada a ausência de outros comerciantes, como sempre, a quem lhe apareceu para comer qualquer coisa ou que vindo a Guidage e que consigo contactara, dera comida ou oferecera um uísque. Na realidade, entre essas pessoas contava-se até o enfermeiro de Tanafe que viera a Guidage ver um doente ou até mesmo fazer uma autópsia e que teve de dormir em sua casa”.

Este imbróglio terá novos desenvolvimentos, desconfiança de um, desconfiança de outro, até o irmão do empregado de Guidage acabará por ser ouvido, entretanto haverá saque e incêndio em Guidage, os assaltantes, diz o relatório, eram Manjacos, Mandingas e Balantas-mané, estavam armados com carabinas de calibre militar de 7,7 mm e espingardas de caça calibre 12.

Em 16 de março de 1962 a confidencial enviada de Bissau para Lisboa refere dados que são bem conhecidos e historicamente relevantes:

“Levamos ao conhecimento de V. Exas. que na madrugada de terça-feira, dia 13, agentes da PIDE em colaboração com os Serviços Secretos do Exército assaltaram uma casa num dos bairros indígenas da cidade, prendendo os principais responsáveis na Guiné, do chamado ‘Partido Africano Independente da Guiné e Cabo Verde’, célula comunista dirigida e orientada por Amílcar Cabral, refugiado em Conacri.

Eram cinco os dirigentes que se encontravam reunidos, conseguindo um deles iludir a vigilância dos guardas e evadir-se de forma audaciosa, rompendo por um cordão de caçadores especiais que estabeleciam o dispositivo de segurança em redor da casa.

Nos dias imediatos sucederam-se várias prisões, entre elas a do contínuo do nosso Banco, Inácio Soares de Carvalho, que foi ontem detido, dia 15, pelas 8,15 horas.

Vário material subversivo foi apanhado, que conduzirá à detenção de mais elementos, tanto residindo nesta cidade como espalhados pela Província. Envolvidos no assunto encontram-se alguns régulos, cuja detenção ainda não foi feita.

Do material apreendido constam:

- Um plano de ataque a organismos oficiais e casas comerciais, a fazer por elementos disfarçados djilas transportando balaios contendo armas;
- Plantas do Quartel de Santa Luzia, aeroporto, Associação Comercial, Pastelaria Império, cinema, BNU, Casa Gouveia, Sociedade Comercial Ultramarina, Barbosas e Ctª., Alfândega, etc.;
- Uma planta do local ainda não identificado onde se encontram escondidas algumas armas;
- Ficheiro contendo nomes e fotografias;
- Máquinas de escrever, arquivos, etc.;
- Vária correspondência de Amílcar Cabral, contendo instruções e normas de orientação.

O material apreendido permite supor que esta célula comunista levou, pelo menos, dois anos a organizar-se.

A sua descoberta e eliminação afasta, também, por muito tempo, o perigo de qualquer actividade terrorista, sendo difícil reorganizarem-se por estes tempos mais próximos.

Entre os detidos figuram alguns polícias indígenas da PSP, nenhum deles, porém, fazendo parte da Esquadra que fornece os efectivos de vigilância e defesa do edifício do Banco.

Juntamos o crachá utilizado pelos elementos do Partido, que nos foi cedido pela PIDE.

Deverão ser longas as diligências da PIDE para a conclusão do caso, mas logo que estejamos na posse de mais informes, transmiti-lo-emos a V. Exas.”

Enganava-se o gerente de Bissau quanto ao afastamento de perigo nos tempos mais próximos devido à prisão dos dirigentes do PAIGC no interior da Guiné. Em 26 de junho de 1962 vai dar notícia de que o Sul está em plena efervescência.

(Continua)



Imagem retirada do livro 'Portugal no Ultramar', 1954, Edições Sotramel - Sociedade de Comércio e Propaganda, Lda com o apoio na cedência de fotos da Agência Geral do Ultramar.


Imagem retirada do livro 'Portugal no Ultramar', 1954, Edições Sotramel - Sociedade de Comércio e Propaganda, Lda com o apoio na cedência de fotos da Agência Geral do Ultramar. 


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Notas do editor:

Poste anterior de 30 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19246: Notas de leitura (1126): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (62) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de > Guiné 61/74 - P19253: Notas de leitura (1127): “Lineages of State Fragility, Rural Civil Society in Guinea-Bissau”, por Joshua B. Forrest; Ohio University Press, 2003 (4) (Mário Beja Santos)

domingo, 28 de outubro de 2018

Guiné 61/74 - P19142: Manuscrito(s) (Luís Graça) 147): Tinha 14 anos em 1961, o "annus horribilis" de Salazar e da Nação... Depois do desastre da Índia, em 18-19 de dezembro de 1961 e de cinco meses de cativeiro, o general Vassalo e Silva e outros oficiais foram expulsos das Forças Armadas, em 22 de março de 1963... Era um aviso sério para os que combatiam em África.



Primeira página do "Diário de Lisboa", de 22 de março de 1963. O jornalismo, censurado, que se fazia em Portugal, o jornalismo das notas oficiosas e dos comunicados do Governo.


Citação:
(1963), "Diário de Lisboa", nº 14464, Ano 42, Sexta, 22 de Março de 1963, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_15253 (2018-10-28)

(Fonte: Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivis > Fundo: Documentos Ruella Ramos)


O gen Vassalo e Silva, no cativeiro. Foto do Paris Match,
c. 19 de dezembro de 1961.
 Fonte: A toponímia de Lisboa 
(com a  devida vénia...)
1. Com a devia vénia, ao autor do  blogue Archive of Goan Writing Portuguese [Arquivo de Escritos Goeses em Português],  Paulo Melo e Castro,  leitor de Estudos Portugueses [Portuguese Studies],  Universidade de Leeds,  Departamento de Espanhol, Português e Estudos Latino-Americanos [ Department of Spanish, Portuguese and Latin American Studies]...

O blogue esteve ativo desde dezembro de 2010 até abril de 2015. Foram publicados 460 postes, neste período, com destaque para os anos de 2011 (n=212),  212 (n=127) e 2013 (n=86).

Fomos lá descobrir este inesperado poema, da autoria de Khnata Kharana Kabba, datado de 1980, e em que se defende o general Vassalo e Silva (Torres Novas, 1899 - Lisboa, 1985),  o último governador de Estado Português da Índia,  que se rendeu às forças indianas 36 horas depois da invasão dos territórios de Goa, Damão e Diu, contrariando ordens terminantes do chefe do Governo Português, para resistir até ao último homem... É, como se sabe,  um episódio patético da nossa história do séc. XX, que abriu uma crise grave entre o regime do Estado Novo e as Forças Arnadas.

Este poema terá aparecido na imprensa goesa em 1980. O seu autor, que se expressa em português quase perfeito, é um  nacionalista, indiano de origem goesa, mas que nem sequer tem um nome português. Aqui fica, para conhecimento e apreciação, crítica, dos nossos leitores:



Archive of Goana Writing Portuguese

Monday, 22 August 2011

Khanta Kharma Kabha:

Os que [se] opõem ao Camões ou Vassalo e [Silva,
Só por não serem indianos, mas portugueses,
Saibam que eles só merecem um Viva!,
Por serem amigos de Goa e dos Goeses.

Foi Vassalo quem salvou a nossa Goa
Das ordens da sua destruição
E, quando regressou a Lisboa,
Sofreu a sua condenação.

Não é verdadeiro nacionalista
Quem não o souber admitir e homenagear
E, na sua estreiteza de vista,
Não [o] reconhecer como “political-sufferer”.
Camões, Shakespeare ou Tagore,
Qualquer deles é indiano e universal,
Não há lugar, portanto, para o rancor
Contra Camões por ser de Portugal.



[Revisão e fixação de texto: LG. Nota: "political-sufferer": vítima da política e dos políticos, da injsutiça social e económica, etc.; expressão muito usada na Índia]


2. Comentário de LG:

Eu tinha 14 anos em 1961, ia fazer 15, em 29 de janeiro de 1962... e já  "sabia" que ia parar a África como soldado do Império... quando chegasse a minha vez. Premonições... Lia os jornais, ouvia rádio, via a televisão... Seguia com apreensão o que se passava em Angola, na Índia, na Metrópole... Hoje, tenho a convicção de que foi um "annus horribilis" paar todos nós, e não apenas para o regime...

Manuel  António Vassalo e Silva (Torres Novas, 1899 - Lisboa, 1985), general do exército, foi o último Governador  do Estado Português,e comandante-chefe das forças armadas naquele território, aquando da invasão, pela União Indiana. em 18 de dezembro de 1961.

Uma invasão, de resto, há muito anunciada..., por uma força caricatamente desmesurada (um exército de 45 homens; 1 porta-aviões, 1 cruzador, 3 contra-torpedeiro e 4 fragatas; 50 caças e bombardeiros), contra um punhado de homens mal armados e mal equipados, que estavam a mnaius de 8300 km de distância de casa...

Em 36 horas foi posto  um fim à presença histórica dos portugueses, no subcontinente indiano, de quase 5 séculos (desde 1492, o ano da chegada de Vasco da Gana à Índia). (*)

Vassalo e Silva desobedeceu às ordens de Salazar para lutasse até ao último homem. Ao render-se, salvou cerca de 3300  vidas, a sua e as dos seus subordinados (que vão ficar 5 meses em cativeiro, bem como evitou o massacre da população e a destruição do património de Goa, Damão e Diu (. hoje classificado pela UNESCO como como património mundial da  humanidade, as Igrejas e os Conventos de Goa). É isso que o poema celebra.

Em 22 de março de 1963, Vassalo e Silva (, que ficará com a alcunha do "Vacilo e Salva", entre os  seus homens, )  é  expulso das Forças Armadas Portuguesas. Será reabilitado a seguir ao 25 de Abril de 1974.  A História o julgará.  A História nos julgará. Afinal os regimes, mais do que os povos, precisam de heróis, mártires e vilões... (**)
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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

17 de dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9219: Efemérides (82): A invasão da Índia Portuguesa em 18 de Dezembro de 1961 (José Martins)

(...) No inicio de 1961, o Coronel Francisco da Costa Gomes, na sua qualidade de Subsecretário de Estado do Exército (56.º Ministério, cargo que ocupou de 14 de Agosto de 1958 a 13 de Abril de 1961), sugeriu a redução dos efectivos naquelas paragens [Goa, Damão e Diu]  para cerca de 3.500 homens, em virtude de se ter constatado que aquele território seria indefensável, perante uma, mais que provável, invasão. Esses efectivos foram deslocados para África, onde se tinham iniciados os conflitos que se prolongariam por cerca de treze anos, e que se propagou a três frentes de combate.

Com uma guarnição de pequena dimensão, mal armada e pouco municiada, dá inicio a alguns combates esporádicos, com forças da União Indiana, em 17 de Dezembro de 1961. Porém, no dia 18, uma força de cerca de 45.000 homens, mantendo na retaguarda como reserva cerca de mais 25.000, dá inicio à invasão simultânea dos três territórios ainda em poder efectivo de Portugal. (...)

(...) 19 de Dezembro de 1961 – O contingente português acabou por se render, tendo o governador, general Vassalo e Silva, ordenado a “suspensão de fogo” às suas tropas. Mais de três mil militares portugueses foram feitos prisioneiros, entre eles o próprio Comandante. O Presidente do Conselho, Dr. Oliveira Salazar que queria “Só soldados e marinheiros vitoriosos ou mortos”, puniu e perseguiu alguns dos oficiais em serviço na Índia, o que abriu dolorosa ferida nas Forças Armadas Portuguesas e foi uma das raízes do derrube do regime Salazar, doze anos depois da queda de Goa, Damão e Diu. (...)


(...) Recorde-se que a generalidade dos antigos prisioneiros da Índia (cerca de 3500) foram, no regresso á Pátria, mal tratados, humilhados, abandonados, ostracisados, esquecidos... Para o regime político da época, e para sua opinião pública, eles pura e simplesmente deveriam ter-se deixado imolar no altar da Pátria na defesa da Índia Portuguesa, a "joia da coroa". Por não ter sabido resistir, até á última gota de sangue, Vassalo e Silva, o governador geral da Índia e comandante chefe da simbólica força expedicionária estacionada nos territórios de Goa, Damão e Diu, fui expulso do exército... (...)


(...) Em memória dos camaradas de armas tombados em nome de Portugal, deixamos o registo dos seus nomes, para que a História e os Homens, os não esqueçam, e não se tornem em SOLDADOS ESQUECIDOS:

Militares tombados em Defesa da Índia Portuguesa

Abel Araújo Bastos – Soldado
Abel dos Santos Rito Ribeiro – Alferes Miliciano de Infantaria
Alberto Santiago de Carvalho – Tenente Infantaria
Aníbal dos Santos Fernandes Jardino – Marinheiro
António Baptista Xavier - 1.º Cabo
António Crispim de Oliveira Godinho - 1.º Cabo
António Duarte Santa Rita - 1.º Sargento da Armada
António Fernando Ferreira da Silva - 1.º Cabo
António Ferreira – Marinheiro
António José Abreu Abrantes – Alferes Miliciano Infantaria
António Lopes Gonçalves Pereira – Alferes Miliciano Engenharia
Cândido Tavares Dias da Silva - 1.º Cabo
Damuno Vassu Canencar – Soldado
Fernando José das Neves Moura Costa - Soldado
Jacinto João Guerreiro – Soldado
João Paulo de Noronha - Guarda 2.ª classe
Jorge Manuel Catalão de Oliveira e Carmo - 2º Tenente Armada
José A. Ramiro da Fonseca - Furriel Miliciano
José Manuel Rosário da Piedade - 1.º Grumete Armada
Joviano Fonseca - Guarda-Auxiliar
Lino Gonçalves Fernandes - 1.º Cabo
Manuel Sardinha Mexia – Soldado
Mário Bernardino dos Santos – Soldado
Paulo Pedro do Rosário - Guarda Rural
Tiburcio Machado - Guarda-Rural

OBS: Esta lista pode estar incompleta.

Os Soldados da Índia só foram “reabilitados” do ostracismo a que foram votados, após o 25 de Abril. Todos os prisioneiros de guerra, foram condecorados com a Medalha de Reconhecimento  (...)  em 03 de Maio de 2003, pelo então Ministro de Estado e da Defesa Nacional Dr. Paulo Portas. (...)

(**) Último poste da série >  26 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19138: Manucrito(s) (Luís Graça) (146): Tinha eu sete anos quando começou a guerra colonial, com a invasão e a ocupação dos "anexos" de Dadrá e Nagar-Aveli, Estado Português da Índia, em 22 de julho de 1954...

sábado, 2 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18704: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XXXIII: Como se faz um alferes miliciano do Serviço de Administração Militar (I)


Foto nº 9 > – Nas instalações da EPAM [, Escola Prática de Administração Militar], no Lumiar, em Lisboa: o meu último dia de Cadete... No dia seguinte seria promovido a aspirantes miliciano com divisas na diagonal, e direito a continência. Estava vestido com a farda nº 1 daquela época. Fins de Junho de 67.


Foto nº 10 > A minha foto tirada para o Bilhete de Identidade Militar, já como alferes miliciano, uns dias antes de embarcar para a Guiné. Porto, Setembro de 1967.

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Virgílio Teixeira (*), ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69); natural do Porto, vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado; tem 56 referências no nosso blogue.

GUINÉ 1967 /69 1967/69  > ÁLBUM DE TEMAS >  T001 – SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO  > CURSO DE OFICIAIS MILICIANOS  (COM)  > EPI | MAFRA; EPAM | LUMIAR, LISBOA  - Parte I


Virgílio Teixeira, hoje
(i) Como cheguei a Alferes Miliciano SAM (Serviço de Administração Militar)

Este devia ser o primeiro tema da minha participação no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, isto é, a incorporação militar, a instrução básica, o juramento de bandeira, a especialidade, a promoção a aspirante miliciano, os Estágios, a mobilização e a integração no Batalhão de Caçadores 1933 em Santa Margarida.

Mas,  como não foi, vai agora e ainda com tempo, pois tenho inesgotáveis temas para participar, não falando da vida ‘pós serviço militar’ que não é para aqui chamada.

Assim:

Com os meus 18 anos, isto é,  em 1961,  vou dar os chamados ‘sinais’ na minha Junta de Freguesia de Paranhos,  no Porto. Neste ano,  e na altura dos sinais, já tinha rebentado a guerra em Angola – a 4 de Fevereiro (em Luanda) e  a 15 de Março de 1961 (no noroeste),  com a ‘matança’ dos inocentes. 

O meu irmão mais velho – um ano e meio de diferença  - estava já na Índia há mais de um ano, pois a rebelião tinha também começado, em Dadra e Nagar Aveli, com os "satiagrás" a fazer o mesmo papel que futuramente coube aos nossos terroristas na nossa guerra de África. 

O meu pai já lá tinha estado na Índia, entre 1955 e 1958, no início da rebelião, por isso estou muito familiarizado com estas guerras todas. Nesse ano, em 18 de Dezembro de 1961, a União Indiana invadiu os territórios do Estado Português da Índia – Goa, Damão e Diu -, e fez prisioneiros os militares que lá estavam a cumprir o serviço, entre eles o meu irmão, sargento Rádio Montador. 

Esteve cinco meses em cativeiro no campo de concentração de Pondá, e curiosamente li aqui um artigo sobre este tema, e ele esteve a dois passos da relatada tentativa de fuzilamento de uma quantidade enorme de militares, por causa de uma fuga abortada de alguns, e depois um padre capelão veio salvar tudo [, Joaquim Ferreira da Silva, jesuita,d e Santo Tirso], temos na memória de estarem todos perfilados, e os "shiks" com as metralhadoras apontadas à espera da ordem de disparar. 

Tudo acabou em bem, tendo o meu irmão e restantes prisioneiros sido libertados em Maio de 1962, quando a guerra em Angola já estava em força com os primeiros contingentes militares a embarcar para lá. 

O espectro de vir a fazer o serviço militar como soldado tomou conta de mim. Tinha de dar a volta a isto.  Quando fui dar os 'sinais', isto é, em Junho de 1961, tive de dar as habilitações literárias. Apesar de estar a frequentar um curso comercial à noite, já no 4º ano, ainda não o tinha completado, pelo que o diploma que tinha para apresentar era apenas o da 4ª classe, nada mais.

Em 1962 começam a aparecer os primeiros mortos, militares, e dá-se um volte-face na minha vida. Como já conhecia o que era ser militar, pois passava alguns tempos nos quartéis onde o meu pai prestava serviço, e em especial a vida de um soldado, passou-me um clique pela cabeça, ‘eu tinha de ir fazer a tropa como oficial miliciano’... Era outra coisa, e ganhava mais. Eu já trabalhava de dia e estudava à noite. Não tinha muito tempo, mas imaginei, fiz as contas e atirei-me de cabeça.

Em poucos meses tinha de fazer um exame de admissão ao Instituto Comercial do Porto, pois tinha sido lançada uma experiência no ensino, com um curso de 2 anos, que daria equivalência ao 7º ano do Liceu, habilitação  mínima para ser admitido no COM.

Mas,  para esse exame, tinha de ter o 2º ano dos liceus, que nunca frequentei, pois quando acabei a primária, fui logo trabalhar, e aos 14 anos inscrevi-me no curso comercial, mas à noite, as matérias eram diferentes, e muito pouco sabia, pois a escola comercial tinha um curriculum escolar muito diferente dos liceus. 

Então preparo-me sozinho para esse exame do 2º ano liceal na época normal, e ao mesmo tempo começo em força a estudar tudo o que era do 5º ano, para fazer a admissão ao Instituto,  na 2ª época de Setembro de 1962.

Não sabia uma única palavra de Inglês, não sabia Física, nem Química, nem Ciências, nem Desenho, tinha umas noções de Português, Francês, Geografia, História e pouco mais. Uma senhora minha vizinha, ex-professora de Letras, oferece-se para me dar explicações de Inglês e aproveitei também para receber umas de Português, e não pagava nada, nem podia pagar.

Faltava-me a Matemática, o que eu sabia da escola comercial era cálculo comercial e aritmética, mas nada de Álgebra, Geometria e coisas dessas do liceu. Um amigo, que já frequentava a faculdade de economia, prontificou-se a dar-me umas explicações de Matemática num café ali para os lados do Campo Lindo, onde ele morava. Em pouco tempo consegui ‘perceber’ a matemática, e já não tinha problemas com isso, já sabia tudo até ao 5º ano.

As lições de Inglês e Português continuavam a bom ritmo e também absorvi rápido, porque era individual e intensivo, ao fim da tarde e fins de semana.  Veio a época de fazer o exame do 2º ano em Junho de 1962, e lá fui, tive algumas dificuldades em Desenho, pois nunca tinha feito ou estudado nada sobre desenho.

Mas safei-me e passei no exame do 2º ano liceal. Com esse diploma já me vou inscrever no exame de admissão ao Instituto Comercial. Ainda tinha uns dois meses e meio até lá, ia fazer na época de Setembro.

Mas o meu trabalho continuava, os horários mantinham-se por isso a alternativa era fazer verdadeiras maratonas e muitas directas com alguns, mas poucos que me acompanharam mas acabaram de desistir, não aguentaram este ‘ritmo’ alucinante. Estudava só nos cafés, com predominância do Café Cenáculo, inaugurado em 11 de Novembro de 1961. Era a minha sala de aulas e explicações, ficava sempre até fechar, já depois das 2 horas da manhã.

Na época de Setembro de 1962, faço o exame de admissão, e fico espantado comigo mesmo, pois tirei média acima de 14 valores, o que me dava acesso imediato á matrícula, sem fazer exames orais, que para mim era uma praga, não gostava nada.

Assim já tenho o 5º ano do Liceu, já podia ir para o Curso de Sargentos Milicianos (CSM)  Mas havia um preço a pagar, tive um esgotamento cerebral, não dormia, tinha de tomar comprimidos para não dormir e estudar até esgotar, todos os sítios e minutos eram para estudar, não comia muito bem, e perdi muito peso, fiquei esgotado, e comecei a tomar comprimidos de ‘ferro’ pela primeira vez.

Com 19 anos, em Outubro de 1962 inscrevo-me no Instituto, no 1º ano do ‘curso de acesso ao ensino superior’, era assim que se chamava. Só frequentava as aulas fora dos horários de trabalho, isto é das 8 às 10, e depois das 18 horas da tarde.

Era o curso da noite, sem rodeios nem vergonhas, era assim e ponto final. Tinha de competir com aqueles que tiveram um ciclo normal, com idades 2 a 3 anos mais novos, e todo o tempo do mundo para estudar. Comigo também entraram mais uns tantos, todos também com idades de adulto, para os cursos da noite, mas os exames eram feitos ao mesmo tempo dos de dia, não havia distinções nenhumas, nem benesses.

E aos 20 anos, em meados de 1963, vou à primeira inspecção militar, ali para os lados das Taipas,  na Cordoaria,  no Porto, onde existia um quartel velho. Ainda estava a frequentar o 1º ano do Instituto, ou seja o equivalente ao 6º ano do liceu.

Como pesava apenas uns 43 kg, os médicos acharam por bem mandar-me para casa e engordar um pouco mais. Fiquei adiado um ano. Foi-me dado logo o primeiro número de identificação militar – NIM – 00439364. Os dois últimos dígitos significam e ano previsto da minha incorporação – 1964 – o que não veio a acontecer.

Não sei porque fui adiado, mas hoje imagino que a tropa nessa altura não tinha muita gente letrada, para sargentos e oficiais milicianos, e eu tinha uma grande vantagem competitiva, frequentava um curso da área comercial, cujo objectivo era o curso de Economia, e tinha já nessa altura, em 1963, quase 9 anos de trabalho regular dentro da mesma área do curso que frequentava, uma área administrativa. E pessoal para servir como operacionais não faltava, era preciso quadros e técnicos, e havia aqui uma possibilidade comigo, penso eu agora, sem saber nada do que se passou.

Voltei no ano de 1964, novamente em meados desse ano e,  como estava mais ou menos na mesma, já não havia direito a mais um adiamento, por isso sou considerado ‘apto’ para toda o serviço militar e mantive o mesmo NIM, que viria a ser alterado.

Nesta época já estava praticamente feito o 7º ano, por isso já pertencia à próxima incorporação de Janeiro de 1965, para o Curso de Oficiais Milicianos (COM).

Acabei o Instituto também com média superior a 14 valores e assim entro directamente para a Universidade, sem precisar de exame de admissão, a que todos estavam sujeitos se não tivessem essa média do 7º ano.

Em Setembro de 1964 inscrevi-me no 1º ano do curso de Economia da Faculdade de Economia da Universidade do Porto. Um feito que sempre o considerei épico, para pessoas vindas da minha classe social, uma vez que nunca nasci num berço de ouro.

E o trabalho tem de continuar, pois é preciso pagar os estudos, e isso é tudo por minha conta, também é verdade que ganhava bem, acima da média, pois já exercia funções importantes nas empresas, apesar da pouca idade e habilitações básicas.

Novamente dou início a um novo curso, agora um curso superior, nas velhas instalações da Faculdade de Economia, na Praça dos Leões,  no Porto, em duas salas emprestadas pela Faculdade de Ciências, a Economia era um curso novo no Porto.

Mas não ia, ou ia muito raramente às aulas teóricas, porque eram em horário laboral, e eu estava matriculado como aluno ‘extraordinário’, que significava,  em termos mais práticos, alunos da noite, ou alunos de... segunda categoria.

Tinha aulas práticas obrigatórias das 8 às 10 da manhã, e depois da 6 horas da tarde. Os exames e provas correntes eram todas em conjunto, não havia distinções. Foi muito difícil, como também já havia sido no anterior Instituto Comercial, a cabeça estava cansada, tomava muitos comprimidos para as dores de cabeça – ainda me lembro do Optalidon, entretanto retirado do mercado. Passei a usar óculos devido ao cansaço da vista, mas lá fui por diante.

Conheci muita gente que mais tarde viria a ocupar os cargos mais importantes na administração e no Estado. Não vou mencionar ninguém porque não é importante agora. Não ganhei amizades nem confiança com esta gente, pois mal nos encontrávamos, só por mero acaso, nas aulas práticas para todos.

Entretanto já estava apurado, e pensei noutra possibilidade, já que aqui estou, com 21 anos em 1964, estou no 1º ano, mais 5 anos faço o curso, e em 1970, com 26 anos, estou a tempo de ir para a tropa, e se assim pensei assim executei. Pedi adiamento na incorporação do próximo ano de 1965, o ano normal da minha incorporação.

Faço o primeiro e segundo ano do curso, e já estamos em Setembro de 1966.  Mas surgem imprevistos, já conhecia a minha namorada, a estava perdido por ela, e com vontade de casar, e neste andar só com 30 anos lá chegaria e era tarde demais para mim, para ela não tanto, que tinha menos 5 anos, ainda ia a tempo com 25 anos.

E, afinal,  para quê?

Nunca tinha pensado chegar tão longe, havia outros, muitos outros problemas, isto que contei não foi assim tão fácil, na vida nada foi fácil para mim, eu tive de subir a pulso, nunca recebi nada de ninguém, nunca herdei um tostão até o dia de hoje. Mas,  como estas coisas, estas ‘histórias’ andam a percorrer as redes sociais, eu não queria adiantar muito mais, toda a gente tem acesso a estes conteúdos, e não quero, e muito menos a minha mulher que não gosta mesmo nada de redes sociais, mas tudo está já escrito no meu livro ‘não editado’ “A Minha Vida” (, está fechado a 7 chaves).

Assim,  num laivo de mais uma loucura das minhas, vou a Lisboa ao Ministério da Defesa Nacional, informando que queria desistir dos adiamentos, isto por volta de Novembro a Dezembro de 1966, e queria ser incorporada na próxima molhada.

E ainda avisei que, se não fosse feita a minha vontade, poderia até desertar. Não levaram a sério, senão metiam-me na gaiola. Assim ainda antes do Natal de 1966 já estou a receber a Guia de Marcha para Mafra, no dia 3 de Janeiro de 1967, teria de me apresentar pela 8 horas da manhã.

Ia fazer nesse mês os meus 24 anos, e nessa altura era uma idade ainda muito jovem, não se sabia de nada daquilo que os meus netos hoje sabem. Os tempos mudaram.

Um amigo meu com quem fiz algumas incursões pelo país, à boleia, de capa e batina, ele frequentava Direito em Coimbra, só viria a ir para a tropa muito mais tarde, e estava na Guiné no QG – no serviço de Justiça -, já era juiz de Direito, e com 31 anos estava lá no tal dia do golpe de estado do 25A4, e eu já estava casado e com 3 filhos menores. Este meu amigo é hoje ainda Juiz Conselheiro na Relação de Lisboa.

Em termos de comparação, os tempos em que os meus filhos estudaram, as mordomias que tiveram, os cursos superiores que frequentaram, os carros que tiveram para irem para as suas universidades, isto era tudo pago do meu bolso, não havia ajudas do Estado, também diga-se que nessa altura não me custava assim muito, pois trabalhava muito e ganhava bem.

Mas a vida dos meus netos, comparada com a minha e da minha mulher, é a noite do dia, não há termo de comparação, não é só com os meus, foi tudo com a maioria dos filhos da revolução. O país e o mundo mudaram muito nestes últimos 50 anos.

Quis exprimir isto para se ver até que ponto a força de vontade leva tudo à frente, não tive ajudas familiares, bem pelo contrário, acho que nunca acreditaram no que eu seria capaz de fazer, nem mais tarde reconheceram até onde cheguei. São coisas pessoais que estão encravadas na garganta como espinhas, por isso passemos à frente.

Fui para a tropa tirar o curso de oficiais milicianos porque fixei este objectivo que tinha de alcançar, não desisti nunca, não havia espaço temporal para nada, a não ser estudar e fazer exames. Devorava livros e Sebentas, decorei tudo, e agora a minha memória vai-me atraiçoando.

Gostava que em devido tempo, a minha família, pais, irmãos, conjugues, tivessem reconhecido esta façanha, mas não. Acho que ficou a inveja, e sei do que falo.

É desta forma que começa assim a minha saga, a vida militar, que viria a alterar por completo a minha forma de ser, de pensar, de agir, a irritabilidade e agressividade fáceis, importar-me apenas comigo e da minha nova família, a superproteção que imponho a mim próprio, a minha incapacidade de poder ver as consequências dos meus actos, devido ao excesso de fármacos que vou tomando diariamente até hoje, seguindo a minha própria automedicação.

Não vou continuar, ficamos por aqui e vou fazer os meus comentários às poucas fotos que tenho da minha vida militar até chegar à Guiné, e como nunca tive uma máquina fotográfica, estas fotos devem ter sido fornecidas pelos fotógrafos que acompanhavam a tropa e ganhavam a sua vida com este trabalho.

(Continua) 
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Nota do editor: