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quarta-feira, 3 de junho de 2009

Guiné 63/74 – P4455: Estórias cabralianas (50): Alfero, de Lisboa p'ra mim um Fato de Abade (Jorge Cabral)

Guiné > Zona Leste > Nova Lamego > Canjadude > CCAÇ 5 (1968/70) > O Alferes Capelão Libório, açoriano, celebrando missa, em 12 de Maio de 1969, num altar improvisado, e acolitado pelo ex-Fur Mil Trms Inf José Martins (*)

Foto: © José Martins (2006). Direitos reservados


O Jorge Cabral (no lado direito), fotografado com o Puim (ao centro) e o Durães (à esquerda), no 3º Convívio do pessoal da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) e subunidades adidas, em 16 de Maio de 2009, em Viana do Castelo (**).

Foto: © Benjamim Durães (2009). Direitos reservados

1. Mensagem, de ontem, do Jorge Cabral:

Caros Amigos!

Desde Dezembro de 2005 que diariamente consulto este nosso Blogue. São já duas comissões e estou pronto e meter o chico para muitas mais…

Gosto de tudo, mesmo do que não gosto… e só lamento não serem mais os Camaradas a intervir. O não saber mexer no bicho-computador não serve de desculpa, pois podem recorrer aos filhos ou aos netos…

Infelizmente a minha vida profissional não me dá tempo para comentar tudo o que queria e era muito… Talvez a partir de 2010…

Na Guiné vivi sempre em Destacamentos [Fá e Missirá], pelo que mesmo em Bambadinca fui apenas visita… embora assídua e às vezes copofónica. Quanto a Bafatá só lá ia, desenfiado e à pressa, frequentando damas, o Teófilo e as Libanesas. (Nunca comi, por exemplo, o famoso bife da Transmontana).

Ainda assim, conheci a Ritinha, cujo pai, a certa altura, pretendeu pôr de namoro com o Furriel Branquinho… e claro também o Xame, o Homem dos dentes de ouro, ao qual cheguei a solicitar orçamento.

Não fui Comando, nem Ranger, mas pertenci a uma tropa muito especial. Dos meus Soldados, Sambaros, Dembas, Mamadus, Alfas, Djangos, Abdulais, Chernos… guardo as melhores recordações e conservo na cintura o ronco-mezinha, que eles me ofereceram no Xime, quando de partida para a minha primeira operação.

No dia 16 de Maio último, lá estive em Meadela com a malta do [BART] 2917, tendo então oportunidade de abraçar o Padre Puím e relembrar-lhe a missa que ele rezou em Missirá.

A propósito, envio estória

Abraços Grandes
Jorge Cabral

P.S.: Conheci bem o Luís Cabral [1931-2009]. Estive com ele, aqui em Lisboa, algumas vezes. Falámos da Guiné, dos Irãs, do Macaréu e principalmente dos Cabrais. Tal como eu, chamava-se Almeida Cabral. Descobrimos um antepassado comum – um tal Padre Cabral, que teve vinte e um filhos em Cabo Verde. Era um Homem simpático e afável. Quanto ao mais, a História o julgará… JC


Fotografia do Cónego, guineense, nascido em Bissau, Marcelino Marques de Barros (1844-1928). Documento extraído do artigo "Antiguidades do Ultramar: II. Organizações das Missões da Guiné (Projecto de 1880)", por António Lourenço Farinha, antigo missionário em Moçambique. In: O Missionário Católico, de 1931, p. 155. (***)

Imagem: © Beja Santos / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008). Direitos reservados.


2. Estórias cabralianas (50) > FATO DE ABADE
por Jorge Cabral (****)

- Meu Alferes! Meu Alferes! Já chegou o Senhor Abade!

O cozinheiro Teixeirinha, todo eufórico, gritava, à porta do meu abrigo.

- Abade - pensei comigo - , o Puím?

Magro, simples, humilde, o único Capelão que conheci na Guiné, viera de sintex e, antecipando-se, não esperara por ninguém, entrando no Quartel. Logo após o descanso, a missa foi celebrada, mesmo ao lado da Cantina, no local da Escola. Fiéis, sete, dois comungantes e o Padre, de paramentos verdes.

Uma missa em Missirá devia ser novidade, mas os Africanos, respeitosos, apenas de longe observaram. Foi em Dezembro de 1970 e logo no mês seguinte eram as minhas férias.

Antes da partida, como de costume, soldados e milícias, fizeram uma longa fila, a fim de pedirem, o que queriam da Metrópole. Pulseiras de prata, fios de ouro, uma gabardine, botões de punho, máquinas fotográficas… porque para eles, ao Alfero em Lisboa tudo seria possível.

A encerrar a fila, surgiu o Sitafá, um puto que vivia connosco desde Fá, ajudando na cozinha… e cuja ambição era ser Comando Africano.

Estranhei vê-lo e indaguei no gozo:
– E tu, Sitafá? Se calhar queres que te traga uma bajuda?!...

Timidamente, o rapaz balbuciou:
– Alfero, eu queria um Fato de Abade.

© Jorge Cabral (2009)
________

Notas de M.R.:

(*) Vd. poste de 12 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLVI: Procissão em Canjadude ou devoção mariana em tempo de guerra (José Martins)

(...) Todas as unidades a nível de batalhão ou escalão superior incluíam no seu quadro de pessoal um sacerdote católico romano que, depois de uma breve instrução militar na Academia Militar e graduado no posto de Alferes, acompanhava as unidades combatentes para África, para as apoiar moral e religiosamente durante a sua comissão de serviço

Na zona onde se encontrava a minha companhia, Nova Lamego, o capelão do batalhão ali estacionado e que dirigia a actividade daquele sector, era o padre Libório, natural dos Açores, que, na sua missão de visitas de rotina a todos os destacamentos da área do Batalhão, se encontrava a passar uns tempos em Canjadude.

Na manhã de 12 de Maio de 1969, logo ao pequeno almoço, confidenciou que gostaria de fazer uma cerimónia especial nesse dia, já que se celebrava o 51º aniversário da primeira aparição, em Fátima, de Nossa Senhora aos pastorinhos. (...)

(**) Vd. poste de 18 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4372: Convívios (131): CCS / BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), com o Arsénio Puim e os filhos do Carlos Rebelo (Benjamim Durães)

(***) Vd. poste de 17 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3642: Historiografia da presença portuguesa (14): A exótica Bissau do Séc. XVII e o papel de D. Frei Vitoriano Portuense (Beja Santos

(****) Vd. poste anterior, desta série em:

12 de Maio de 2009> Guiné 63/74 - P4326: Estórias cabralianas (49): Cariño mio... Muy cerca de ti, el ultimo subteniente romántico (Jorge Cabral)

(...) Dois dias depois de chegado a Bambadinca em meados de Junho de 69, fui mandado montar segurança no Mato Cão. Periquitíssimo, cumpri todas as regras, vigiando a mata de costas para o rio, sem sequer reparar na beleza da paisagem.

Mal sabia então, que ali havia de voltar dezenas de vezes, durante o ano que passei em Missirá. Pelo menos uma ida por semana para ver passar o Barco, no que se transformou numa quase agradável rotina.(...)

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Guiné 63/74 - P3607: Historiografia da Presença Portuguesa em África (12): Cónego Marcelino Marques de Barros (1844-1928) (Beja Santos)



Dois documentos extraídos do artigo "Antiguidades do Ultramar: II. Organizações das Missões da Guiné (Projecto de 1880)", por António Lourenço Farinha, antigo missionário em Moçambique. In: O Missionário Católico, de 1931, p. 155. Fotografia do Cónego Marcelino Marques de Barros (1844-1928) e início de uma pequena resenha biográfica.


Imagens: © Beja Santos / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008). Direitos reservados


1. Mensagem do Beja Santos, de 29 de Setembro último:

Historiografia da presença portuguesa (*) > Cónego Marcelino Marques de Barros, uma das glórias da Guiné

A história cultural de Guiné-Bissau tem algumas figuras incontornáveis e uma delas é Marcelino Marques de Barros[ 1844-1928] (**), que foi Vigário Geral, sócio correspondente da Sociedade de Geografia de Lisboa, onde publicou alguns dos seus mais brilhantes trabalhos.

Natural de Bissau, onde nasceu em 1844, estudou em Cernache do Bonjardim, no Colégio das Missões, onde se preparou para ser missionário. Em 1868 trabalhou entre os Felupes, no norte. Após 11 anos de trabalho exaustivo, voltou a Portugal em 1867 e daqui regressou à Guiné por onde se conservou por mais 7 anos.

Voltou ao colégio que o educou e aqui escreveu obras de uma importância transcendente para o conhecimento da corografia, línguas nativas, plantas medicinais, topografia, hidrografia, usos e costumes, dicionário de crioulo e uma colectânea de contos, parábolas e cantigas dos nativos, que a critica literária do seu tempo, (finais do século 19, princípios do século 20) elogiou entusiasticamente.

Encontrei em O Missionário Católico, de Março de 1931, uma das raras fotografias do Cónego e um texto de um importante historiador das missões portugueses, Padre António Lourenço Farinha, acerca de um projecto datado de 1880, de autoria de Marcelino Marques Barros, referente à organização das Missões da Guiné e dirigido ao Bispo da Diocese de Cabo Verde.

Como é muito próprio da sua personalidade, o prelado identifica logo a região: a Guiné e os seus rios; as ilhas e o arquipélago dos Bijagós; os povos (Ariatas, Felupes, Mandingas, Fulas, Banhuns, Cassangas, Papéis, Balantas, Bijagós, Biafadas e Nalus), as freguesias, as pontas. Refere os grumetes (***) como a parte da população mais capaz de aderir ao catolicismo, chama-lhes mesmo "o verdadeiro povo português indígena, e o que mais tem concorrido para engrossar todos os nossos presídios ou vilas contra as quais se revoltam tantas quantas vezes se julgam nos seus interesses ou interesses dos seus avós feridos".

É para estes e para os animistas que o prelado envia um projecto das organizações católicas. Vale a pena apreciar o teor da sua proposta, sinteticamente.:

(i) Os párocos e vigários deveriam ser formados num Seminário Diocesano, e ser oriundos da Guiné;

(ii) Os jovens seriam inicialmente educados num pequeno colégio, todos os régulos deveriam enviar 2 ou 3 dos seus filhos para o Colégio Central das Missões, no Reino;

(iii) Aqui deveriam aprender a falar correctamente o português e também medicina e agricultura;

(iv) Viriam depois para a Guiné acompanhados de mestres de ofícios, como pedreiros, carpinteiros e ferreiros, de preferência europeus;

(v) Como os povos guineenses adoram música, nenhum missionário poderia vir para estas paragens sem saber tocar harmónio, harpa ou flauta;

(vi) Os candidatos a missionário deviam ser escolhidos preferencialmente entre Felupes, Papéis, Bijagós, Balantas e Biafadas, visto serem estas as nações que mais se facilmente se cristianizam;

(vii) Certamente recordado da boa recepção que encontrou entre os Felupes, descreve e região como apropriada para o primeiro esforço missionário; fala de aspectos administrativos, logísticos e organizacionais que, como é óbvio, não tem para aqui interesse; e entre alguns aspectos dignos de investigação, o prelado refere "a ponta de S. António, junto ao reino do Xime, cujo a mina de ouro fez a fortuna dos espanhóis noutras eras e cujo príncipe Manuel Maneu, filho de Galen e de Arajé foi por mim baptizado aos 19 dias do mês de Setembro de 1871".

Fora do contexto desta carta, o padre António Lourenço Farinha diz que a Guiné, por motivos de insalubridade, nunca foi muito cobiçada pelos missionários desde os primeiros séculos da colonização, e desenvolve argumentos sobre a missionação da Guiné cujo teor deixaremos para mais adiante, quando aqui se falar de um conjunto de investigações do Almirante Avelino Teixeira da Mota subordinadas ao título "As Viagens do Bispo D. Frei Vitoriano Portuense à Guiné".

Beja Santos (*** *)
__________

Notas de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 9 de Dezembro de 2008 >Guiné 63/74 - P3589: Historiografia da presença portuguesa (11): Filatelia do 5º Centenário da Descoberta do Território, 1446/1946 (Beja Santos)

(**) Vd. também os seguintes sítios:

Dioceses da Guiné-Bissau > Evangelização > História

Instituto Camões > Leopoldo Amado > A Literatura Colonial Guineense

União dos Escritores Angolanos > Jurema José de Oliveira > As Literaturas Africanas e o Jornalismo no Período Colonial

(***) Do Ing. groom mate, rapaz ajudante; s. m.,
praça de marinha de graduação inferior a marinheiro e superior a aluno marinheiro;
habitante de Cacheu, na Guiné-Bissau.(Fonte: Priberam Informática)

Vd. também Vidas Alternativas > Beja Santos > A GUINÉ DOS GRUMETES, DOS ESCRAVOS E DOS PRESÍDIOS

(****) Vd. ainda os postes de:

14 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3316: O meu baptismo de fogo (9): Missirá, Cuor, 6 de Setembro de 1968 (Beja Santos)

14 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3206: Antropologia (11): O Crioulo da Guiné. Mário Beja Santos.