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sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Guiné 63/74 - P16468: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (48): O filme das cartas de amor e guerra de António Lobo Antunes, realizado por Ivo M. Ferreira


Fotograma do filme "Cartas da Guerra",  do realizador portuguiês Ivo M. Ferreira, em exibição nos cinemas. Diversos "clips" (vídeos) podem ser vistos aui, no sítio O Som e a Fúria 

Sinopse

"1971. António vê a sua vida brutalmente interrompida quando é incorporado no exército português, para servir como médico numa das piores zonas da guerra colonial – o Leste de Angola. Longe de tudo que ama, escreve cartas à mulher à medida que se afunda num cenário de crescente violência. Enquanto percorre diversos aquartelamentos, apaixona-se por África e amadurece politicamente. A seu lado, uma geração desespera pelo regresso. Na incerteza dos acontecimentos de guerra, apenas as cartas o podem fazer sobreviver."



1. Mensagem do Antº Rosinha


[ Antº Rosinha é um dos nossos 'mais velhos', andou por Angola, nas décadas de 50/60/70, do século passado, fez o serviço militar em Angola, foi fur mil, em 1961/62, diz que foi 'colon' até 1974... 'Retornado', andou por aí (, com passagem pelo Brasil), até ir conhecer a 'pátria de Cabral', a Guiné-Bissau, onde foi 'cooperante', tendo trabalhado largos anos (1987/93) como topógrafo da TECNIL, a empresa que abriu todas ou quase todas as estradas que conhecemos na Guiné, antes e depois da 'independência'; é colunista do nosso blogue com a série 'Caderno de notas de um mais velho']

Data: 9 de setembro de 2016 às 00:02

Assunto: O Filme das Cartas de Lobo Antunes


Não sei será tão útil a publicação... Mas aqui vão as minhas impressões [, depois de ver o filme, "Cartas da Guerra", de Ivo M. Ferreira, baseado nas cartas que o António Lobo Antunes escreveu à mulher durante a guerra colonial].

Foi uma maneira muito interessante de pôr no cinema o espírito de revolta contra a guerra, nas cartas de amor, e dor da separação de um jovem casal.

O suplício da separação conjugal que aquela guerra provocou no médico sente-se permanentemente na voz permanente feminina (falha aí alguma coisa, apetecia que falasse em inglês e termos as legendas em Português) e num major, que desesperado pede ao médico para lhe inventar uma doença que o devolvesse para o ente querido.

Ora quando o major está desesperado, imagina-se que a tropa toda em geral estará no mesmo estado de espírito.

A fotografia dos quartéis retrata bem o espírito claustrofóbico dos 100 x 100 de arame farpado no meu entender e penso que ALA [, António Lobo Antunes,] também sente da mesma maneira a «preto e branco»

Mas embora para ALA aquilo tudo fosse o Cú de Judas nas cartas e no resto, a fotografia faz o gosto ao espírito negativista da guerra e da terra, do autor das cartas, e aquelas paisagens parecem mesmo um fim do mundo a «preto e branco», o que na realidade é a parte totalmente irreal, pois que ao mostrarem alguns elefantes a banharem-se num rio, que possivelmente será na reserva de caça da Cameia, rio Cassai com quedas maior que o Corubal, paraísos na terra, onde algumas anharas se veem secas num tom a preto e branco, são iguais às maiores bolanhas da Guiné mas com rios de grandes caudais de água limpíssima (e com diamantes), a imagem, tirando uma viagem de helicóptero, não dá ideia da beleza da região.

Portanto aqueles espaços abertos do leste de Angola (cús de Judas), muita água, muita caça muito verde, no filme parece mesmo uma terra triste, pobre e de miséria como refere algures, nas cartas ALA.

Fui ouvir novamente a «cumprimentação»,  as «mantenhas» à maneira do leste dos quiocos, o «moio» que ALA já usava na psico-social.

O médico também se viu de G3 na mão em patrulha a pé, e bolsa de primeiros socorros a tiracolo que na minha guerra de 13 anos nunca tinha visto.

Vemos um soldado atingido nas costas e perde a vida e há feridos e mortos numa mina.

Há uma sanzala queimada, também entram flechas, mas houve um fuzilamento, se não interpretei errado, o que pensava eu que nenhum comandante de batalhão permitia (vivia eu, enganado ?).

Todos estes acontecimentos, com a voz feminina permanentemente a ler as cartas e alguma música de fundo.

Li o livro, não me lembro que fale no elemento "lavadeira",  no filme também não se vê nenhum tropa a dar a roupa a nenhuma lavadeira.

O único assédio que se vê foi de um branco (civil, colonialista) num bar levar um nega da garota, «calcinha»,  "nem qui fossis tinenti".

Há uma cena que não interpretei completamente que é um militar completamente despido, fugir de arma na mão para dentro da mata. Vê-se a seguir militares a percorrer a pé e de Jeep campos e rios,
penso que seria à procura desse nu foragido.

Uma coisa que não se vê, foi ninguém ir de férias ou de folga à cidade mais próxima ou à capital, o que era prática frequente na tropa em Angola.

E os 24 meses obrigatórios não eram passados no "mato", pelo menos alguns meses eram as companhias transferidas para as capitais de distrito sendo que em geral era para Luanda e Sul de Angola. Esse pormenor não se vê no filme mas é mencionado no livro das cartas.

O essencial das cartas está lá.

Não se vê uma lerpa na caserna, só se vê uma suecada ou bisca, num descanso da patrulha.

A intensidade da guerra está bastante bem representada para o que se ouvia dizer naquele tempo.

Como repito às vezes, aqueles domínios também foram meus e nunca ouvi lá um tiro.

Não creio que vá ter muitos jovens a ver o filme, é mais gente que andou lá ou senhoras, antigas madrinhas de guerra.

Pena passar desapercebida a qualidade literária.

Cumprimentos
Antº Rosinha

______________

Nota do editor:

Último poste da série > 10 de agosto de 2016 > Guiné 63/74 - P16379; Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (47): todas as colonizações são más, até aquelas que os portugueses começaram... e outros, "brancos, amarelos e negros" estão continuando... E vivam os guaranis do Brasil que se recusam a ir aos Jogos Olímpicos do Rio 2016

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Guiné 63/74 - P16379; Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (47): todas as colonizações são más, até aquelas que os portugueses começaram... e outros, "brancos, amarelos e negros" estão continuando... E vivam os guaranis do Brasil que se recusam a ir aos Jogos Olímpicos do Rio 2016


 Capa de publicação conjunta do IBDE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e a FUNAI - Fundação Naciobnal do Índio, com dados sonbre o censo Demográfico de 2010. Disponível aqui em formato pdf


["O Censo Demográfico 2010 contabilizou a população indígena com base nas pessoas que se declararam indígenas no quesito cor ou raça e para os residentes em Terras Indígenas que não se declararam, mas se consideraram indígenas. O Censo 2010 revelou que, das 896 mil pessoas que se declaravam ou se consideravam indígenas, 572 mil ou 63,8 %, viviam na área rural e 517 mil, ou 57,5 %, moravam em Terras Indígenas oficialmente reconhecidas"].


Mensagem: António Rosinha  | Data: 9 de agosto de 2016 às 23:40

Assunto: Todas as colonizações são más, até aquelas que os portugueses começaram... e outros, "brancos, amarelos e negros" estão continuando,.,



Talvez as colonizações entre os povos, sejam inevitáveis, ontem hoje e  amanhã, talvez seja um "mal necessário", mas que são um mal isso são.

Os homens apenas deviam colonizar (dominar, explorar) terras  desabitadas, isto é, nunca dominar nem explorar ninguém,

Por exemplo, o caso daquilo que geograficamente é Portugal  Continental, que foi colonizado por Romanos, Mussulmanos e hoje nem se sabe que idiomas se falavam por aqui, não há direito que alguns homens  estranhos nos obriguem a ser igual a eles, na fé, na fala, no vestir,  no casar e no habitar, quando estamos na nossa terra e não na terra  deles e em que a própria cultura e história passada desaparece, isso tudo vai acontecer em imensos territórios colonizados onde também vai
desaparecer a história e a língua actual, apesar dos conhecimentos  técnicos modernos.

Colonizar é sempre um conflito entre quem o pratica e quem o suporta.

O caso da Guiné, é um exemplo (suave) daquilo em que África colonizada  se vem «metamorfoseando», com muitas inadaptações.

Embora a Guiné seja vítima do trauma da colonização e consequentemente  do trauma da descolonização e se lhe atribua internacionalmente uma  imagem de ingovernabilidade (Estado falhado) talvez haja países ainda  mais complicados em África e mesmo na América latina.

No caso da Guiné, houve a colonização portuguesa, seguida de uma  autêntica «reciclagem colonial» protagonizada por inúmeros países, com  especial protagonismo da Suécia e União Soviética, até estes  desistirem e sobressaírem outros países e organismos vários não  governamentais com o mesmo entusiasmo a "ajudar" na reciclagem  colonial, mas com outros nomes.

Pelo menos tal como fizemos nós, os Portugueses e Caboverdeanos,  na  Guiné Bissau, e a seguir vieram muitos outros (Suécia, Rússia,  França, EUA, etc.=, que segundo essa gente foram ensinar os Guineenses,  aquilo que os Portugueses não ensinaram em 500 anos, como diz toda a  gente aos guineenses durante os últimos 40 anos, tudo foi errado e  até criminoso, mas pior, quando é ensinar à pressão e à pressa  obrigar a aceitar religiões políticas e usos e costumes, totalmente  estranhos às pessoas atingidas, aí a violência é ainda maior..

Também no caso da colonização cristã e árabe na África subsariana,  (ou mesmo nas Américas com os índios) foi tudo muito mau, e a nossa  geração ainda testemunhou ou participou em alguma dessa colonização,  pelo menos 13 dos 500 anos que os portugueses andaram pelo além-mar.

Foi tudo tão mau nas colonizações, que ainda hoje, que se disputam no  Rio de Janeiro os jogos olímpicos (gregos)e até hoje ainda não vimos  nenhum atleta Guarani,  dono do "tchon" do Maracanã, candidato a  medalhas.  no entanto já não se pode dizer o mesmo de imensos  afro-americanos e africanos, que assimiliraram e se submeteram a toda  a cultura greco-romana que portugueses e outros europeus inculcaram  nesse povo.

Os Guaranis preferiram morrer do que ser brasileiros, correr os 100  metros em 10 segundos, morar numa favela, ou dançar o samba no  carnaval nem falar Carioca

Os homens, no mundo inteiro, deviam poder viajar, comunicar entre si,  aceitar a presença do outro, mas nunca impôr a própria vida à vida  dos outros, quer seja à força com guerra, ou na conversa e na
corrupção, que foram sempre os processos mais usados.

Se os Guaranis quisessem correr no Maracanã, em Jacarepaguá ou em  Itaguaí, à caça ou fazer canoagem à pesca na baia da Guanabara, porquê  aquela confusão dos jogos olímpicos de betão armado, com o mundo  inteiro a poluir um dos lugares mais belos do mundo?

O mundo cristão querer impôr aos africanos subsarianos e índios, que  nem sabiam quem era Cristo, leis e hábitos que já nem os cristãos  respeitam hoje, foi demais.

Vejamos, proibir a poligamia, obrigar a cobrir o corpo com roupas,  substituir as palhotas por casas de pedra, abandonar feitiçarias e  muitas outros hábitos que os próprios cristãos hoje, até adoptam para
eles próprios, todas essas imposições foi muito violento  psicologicamente, quando não fisicamente, com castigos corporais.

Apesar de hoje, certas maneiras europeias e árabes modernas queiram  ser impostas "como sendo direitos humanos" em África, e muitos velhos  régulos africanos não gostem nem compreendam, e vão ter que adoptar como foi com as religiões da idade média, isso também é colonialismo
imposto.

Agora o moderno são a burka e a homossexualidade e outras novidades a  chegar a África ainda a viver em palhotas, mas já com telemóveis e TV  a explicar, isso também é colonialismo.

Pior do que explorar as riquezas naturais das terras dos africanos ou  dos índios das Américas, ou mesmo das tribos do Médio Oriente é querer  convencer esses povos que a civilização deles é inferior à de outros  povos e convencê-los a trocar os valores da sua cultura pela cultura do outro, seja ele colono, benemérito, doador, cooperante ou dador, é  tudo colonizar.

Existe um complexo de inferioridade encaixado na memória de alguns  povos de ex-colónias lusófonas, que praticamente não se dá nas  ex-colónias francófonas e anglófonas.
É-lhe dito aos Guineenses, Angolanos e todos os outros, que além de  terem suportado a colonização imposta pelos portugueses, ainda têm que  sofrer a tal espécie de «reciclagem colonial» imposta por outros que  vêm « ajudar» a completar o desenvolvimento que a "incapacidade  colonial" portuguesa não conseguiu fazer em condições nas antigas colónias.

É um fenómeno que se dá também no Brasil, em que o povão chega (hoje  2000 DC) a levar uma ensaboadela cerebral de tal ordem, em que  suportando toda a espécie de exploração económica e de corrupção  governativa e toda a violência de um capitalismo internacional e  levados a aceitar tudo como uma fatalidade porque:

Tiveram o azar de "ser colonizados pelos atrasados portugas que  roubaram todo o ouro, mataram os indíos, amancebaram-se com mulatas e  negas" e deixaram o país cair nesta desgraça, que até tinha
potencialidades para ser mais importante que a América do Norte (EUA)

No Brasil, o termo de comparação preferido são sempre os EUA, faz  parte da ensaboadela cerebral.

Isto também é uma reciclagem colonial.

Haverá sempre povos a quererem sobreporem-se a outros, e nem sempre  haverá "alguém que diz não".

Como também fui colonialista, (funcionário da Administração colonial  em Angola), gostei de ser um portuga, fraco colonialista e também  participei na reciclagem colonial juntamente com alemães, franceses e  suecos e italianos na Guiné Bissau, assino aquilo que escrevo e a que  assisti, até no Maracanã vi o Pélé, e nem um Guarani vi naquele  estádio cheio.

Cumprimentos e só publiquem se não escandalizar ninguém

_______________

Nota do editor:

Último poste da série  > 25 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16331: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (46): Quando Bismarck, Leopoldo II e as outras potências, Inglaterra e França (Cecil Rodhes e outros) dividiram África em Berlim, estavam-se nas tintas para os africanos... Ensaiaram depois o neocolonialismo a que chamaram independência

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Guiné 63/74 - P16331: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (46): Quando Bismarck, Leopoldo II e as outras potências, Inglaterra e França (Cecil Rodhes e outros) dividiram África em Berlim, estavam-se nas tintas para os africanos... Ensaiaram depois o neocolonialismo a que chamaram independências e

1. Comentário de António Rosinha ao poste P16322(*)



[Foto à esquerda: Antº Rosinha: (i)  é um dos nossos 'mais velhos', membro ´senior da Tabanca Grande;
(ii) andou por Angola, nas décadas de 50/60/70, do século passado;
(iii) fez o serviço militar em Angola, foi fur mil, em 1961/62, (iv) diz que foi 'colon' até 1974;
(v) 'retornado', andou por aí (, com passagem pelo Brasil):
(vi) até ir conhecer a 'pátria de Cabral', a Guiné-Bissau, onde foi 'cooperante', tendo trabalhado largos anos (1987/93) como topógrafo da TECNIL, a empresa que abriu todas ou quase todas as estradas que conhecemos na Guiné, antes e depois da 'independência'; 
(vii) é colunista do nosso blogue com a série 'Caderno de notas de um mais velho'] (**`*)



Talvez a Diamang fosse em Angola a única Companhia que melhor imitava as grandes companhias inglesas, alemãs, belgas e francesas em África.

Quando Bismarck, Leopoldo II e as outras potências, Inglaterra e França (Cecil Rodhes e outros) dividiram África em Berlim, era simplesmente para dividir a exploração dos recursos naturais, ouro diamantes, volfrâmio, madeiras e o que aparecesse.

Estavam-se nas tintas para os africanos, nem para escravos os queriam, pois estes já estavam a ficar muito exigentes, já queriam trocar a tanga de pele de gazela por tirylene, e a querer uma retrete para o preto ao lado da do branco,  além da escola para o preto ao lado da do branco.

Então ensaiaram o neocolonialismo a que chamaram independências e abandoram em África os pobres dos portugas sozinhos que foram os últimos europeus, (Europeus?, só se forem de segunda, dizem aqueles sacanas), a sair de África e a deixar os diamantes sem sangue, a ficar como todos os outros diamantes, petróleos e volfrâmios completamente ensanguentados.

Honra a [Nelson] Mandela que não deixou que os boers fossem expulsos de sopetão e as riquezas continuam na África do Sul.

Sorte dos sul-africanos e azar das zebras, búfalos e girafas da Rodésia, Zimbabué de Mugabe, que já vende em leilão todos os animais das reservas de caça por falta de água, que morrem à sede (jornais)

A guerra de Pirada e Guidaje visava principalmente a Lunda do Comandante Vilhena, pai do museu do Dundo e os Bothas da África do Sul, o cone de África.

Os Guineenses eram, e são o mexilhão.

JD, é difícil explicar, mas sabes que também não leio pela tua cartilha, és mais Norton e Galvão,  como eram muitos imperialistas.  eu sou mais Antoninho da calçada.

Nós nunca podiamos imitar aqueles grandes exploradores.

Fui teu colega 1 mês, comia no refeitório dos solteiros no Cafunfo, já contei. (**)

Grandes e complicadas vidas, mas que mundo estuporado.

Não deixemos cair a "peteca" (como dizem os brasileiros). Falta muito para contar o fim dos impérios!

Antº Rosinha (***)

_____________



(**) Vd, poste de  19 de janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12603: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (30): Só os diamantes são eternos... Ou: hoje ainda se esconde se são os "restos mortais" do Império ou do Eusébio que se votaram no parlamento, para o Panteão.


(...) Amigo José M. Diniz (e penso que me estou a dirigir a C. Martins também), eu andei na Lunda na tropa e a fazer uma estrada na região de Henrique de Carvalho.

E para a Diamang estive em Cafunfo (1970) a fazer uma picada entre uma futuro lavandaria e um rio que foi desviado para exploração.

Estive perto de um mês a conviver com algarvios exclusivamente, no refeitório dos solteiros, que trabalhavam numa lavandaria no Cafunfo.

Era um mundo à parte dentro de Angola e da própria Lunda. Não havia minhotos, beirões, transmontanos nem das Ilhas, e o meu contacto profissional era com um homem chamado Bastos, alentejano, de Elvas (?) e conheci e trabalhei recentemente com um neto desse homem (há 10 anos, antes de me reformar).

Diniz, afinal também estavas informado e encostado, meu malandro. Será que havia segregação nos seleccionados para funcionários da Diamang? (...) 

(***) Os últimos postes da série, desde 2014 (há um nº, o 42, repetido, por lapso):

12 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16079: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (45): A brutal emboscada do dia 22/3/1974, na estrada (alcatroada, construida pela TECNIL ) Piche-Nova Lamego: só por negligência, propositada ou intencional ou casual, estes casos podiam acontecer... É coincidência apenas, ou as Forças Armadas só já estavam preocupadas com outros valores?...

3 de maio 2016 > Guiné 63/74 - P16044: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (44): Os desentendimentos constantes entre alguns PALOP e Portugal... A luta continua.!...


30 de março de 2016 > Guiné 63/74 - P15913: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (43): Os receios europeus de um antigo colonialista português, gen Norton de Matos, em dezembro de 1943


22 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15781: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): A unidade que os cabo-verdianos ajudaram a criar


5 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15748: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): As riquezas das matéria primas africanas e as fantasias criadas


16 de janeiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15623: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (41): o que foi mais devastador para o PAIGC foi precisamente a campanha psicológica spinolista por uma "Guiné Melhor"


9 de dezembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15464: Caderno de Notas de um Mais Velho (40): "A colónia onde todas as Fatumata tinham de se chamar Maria" -Guiné Bissau (Sobre a reportagem do jornal Público)

30 de novembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15428: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (39): 'Colon' e 'retornado'... É difícil de transmitir o que se passou e se sentiu... Os estudiosos metem os pés pelas mãos quando abrem boca.

8 de agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P14985: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (38): é possível barrar a emigração a muitos milhões de jovens africanos sem perspectiva de vida? Nem Luís Cabral conseguiu fechar as entradas na Praça de Bissau...


7 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14583: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (37): Sempre houve emigrantes europeus para África, agora dá-se o inverso


29 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14202: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (36): Fazendo votos para que o tchon Manjaco, o tchon Fula, o tchon Pepel e o tchon do Largo São Domingos se entendam sempre como nestes últimos 40 anos.


12 de dezembro de 2014 > Guiné 63/74 - P14015: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (35): IMPÉRIO sem TAP versus TAP sem IMPÉRIO


25 de abril de 2014 > Guiné 63/74 - P13040: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (34): Ramos Horta & Ana Gomes hoje na Guiné-Bissau como ontem em Timor, uma dupla guerreira, sem armas de fogo, que está a fazer um belo e corajoso trabalho pela paz e pela lusofonia


10 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12817 : Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (33): O racismo mal disfarçado na África Lusófona, tão complicado e difícil de contornar como a divisão étnica tradicional
26 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12777: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (32): Mário Coluna (1935-2014) na verdadeira nação "Arco-Íris" (Portugal e Ultramar e a sua selecção de futebol)


3 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12668: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (31): Natália Correia e os filhos dos retornados (vingativos)


19 de janeiro de 2014 > 63/74 - P12603: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (30): Só os diamantes são eternos... Ou: hoje ainda se esconde se são os "restos mortais" do Império ou do Eusébio que se votaram no parlamento, para o Panteão.


10 de janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12568: Caderno de notas de um mais velho (Antº Rosinha) (29): O que os rapazes dos cachecóis precisam de saber: que o Eusébio foi um português muito especial, que ajudou a escrever uma página muito especial da história de Portugal, da Europa e de África...

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Guiné 63/74 - P16079: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (45): A brutal emboscada do dia 22/3/1974, na estrada (alcatroada, construida pela TECNIL ) Piche-Nova Lamego: só por negligência, propositada ou intencional ou casual, estes casos podiam acontecer... É coincidência apenas, ou as Forças Armadas só já estavam preocupadas com outros valores?...

Colagem de comentários do Antº Rosinha e do nosso editor LG ao poste P16074 (*):

[ Antº Rosinha é um dos nossos 'mais velhos', andou por Angola, nas décadas de 50/60/70, do século passado, fez o serviço militar em Angola, foi fur mil, em 1961/62, diz que foi 'colon' até 1974... 'Retornado', andou por aí (, com passagem pelo Brasil), até ir conhecer a 'pátria de Cabral', a Guiné-Bissau, onde foi 'cooperante', tendo trabalhado largos anos (1987/93) como topógrafo da TECNIL, a empresa que abriu todas ou quase todas as estradas que conhecemos na Guiné, antes e depois da 'independência'; é colunista do nosso blogue com a série 'Caderno de notas de um mais velho']



A. Escreveu o nosso editor LG, em comentário ao poste  P16074 (*):

Pessoalmente, acho estranho que esta brutal emboscada na estrada de Piche-Nova Lamego, em pleno coração da zona leste, em pleno "chão fula", o dos nossos leais e bravos fulas, envolvendo forças da nossa cavalaria (com as famosas e, afinal, dececionantes "chaimites"), a um mês do 25 de abril de 1974, seja tão pouco falada, comentada, divulgada...

Quem poderia e deveria escrever, não escreve, por razões que desconhecemos... Se calhar, inibição, pudor, raiva... Eu sei lá!... Resta-nos este relato de antologia, de um obscuro furriel miliciano de engenharia, o Manuel Pedro Santos, que temos de pôr na galeria dos nossos mártires e heróis... Felizmente ele sobreviveu (e espero que ainda esteja vivo!) para nos contar como foi o inferno, às 8 e meia da manhã, desse trágico dia 22 de março de 1974, no troço Bentem-Camabajá da estrada (alcatroada) de Piche-Nova Lamego...

Mesmo assim, com 200 e tal atacantes, "entrincheirados", e armados de RPG, o PAIGC tinha a "obrigação" de massacrar todos os "tugas" e os seus "cães" que iam na coluna... "Guerra é guerra, camaradas"... E foi feia, brutal, essa maldita guerra... Ainda dizem que foi uma guerra de "baixa intensidade", a da Guiné, dizem os senhores historiadores engravatados da nossa universidade que nunca sentiram, nas "putas das narinas", o cheiro da carne humana assada...

Por favor, camaradas, tragam mais testemunhos sobre estes e outros momentos marcantes do nosso calvário de 13 anos!... Quantos de vocês não passaram, tranquilamente, quase em passeio turístico, por este troço da estrada de Nova Lamego - Piche!...

Acrescentem estes topónimos ao nosso martirológio: Bentém, Camajabá... Ninguém mais vai lembrá-los dentro em breve!

Resta-nos honrar a memória dos nossos camaradas, metropolitanos e guineenses, que lá ficaram, na estrada alcatroada de Piche - Nova Lamego, a 10 km depois de Bentém, antes de Camabajá, às 8h30 do dia 22 de março de 1974... Lembremos aqui os nomes desses bravos camaradas: (i) do Esquadrão de Reconhecimento de Cavalaria, EREC 8840/72 (Bafatá, 1973/74): os fur mil cav José António da Costa Teixeira, natural de Lousada, e Manuel Joaquim Sá Soares, natural de Santo Tirso; os 2 sold cav, João da Costa Araújo, natural de Ponte Lima; e Victor Manuel de Jesus Paiva, natural de Castelo Branco; (ii) e ainda, os soldados, do recrutamento local, Bailó Baldé, natural de Nova Lamego, sol at inf, CCAÇ 21; e Bambo Nanqui, natural de Fulacunda, sold at art, 12º Pel Art / GAC 7.


Guiné > s/l > 1972 > Uma viatura blindada Chaimite V200. Foto de António Rogério Rodrigues Moura [ARRM], 1972.

Fonte: Portal Prof 2000 > Aveiro e Cultura > Arquivo Digital (Com a devida vénia...)


B. Agora comento eu, Antº Rosinha, ex-topógrafo da TECNIL, que conheci  a Guiné-Bissau do Luís Cabral e do 'Nino Vieira', de 1987 a 1993:

"110 abrigos e outra grande quantidade de guerrilheiros em cima de mangueiros. O número de guerrilheiros estimou-se entre duzentos e duzentos e cinquenta elementos..."

Uma concentração desta envergadura naquele lugar fula, e naquela data, algo já estava a "falhar" das chefias.

Já perto dessa altura, na mesma estrada em construção, uma camião da TECNIL foi atingido por uma bazucada, "tipo brincadeira",  do PAIGC. Contaram depois os guerrilheiros que alguns disfarçados à civil pediram boleia no fim do dia para o Gabu, foi-lhe negada pelo motorista, e na hora de partir, uma bazooka acertou na porta do mesmo motorista guineense, que "muri".

Luís Graça, eu digo sempre, há uns anitos, que este blogue vai ajudar a contar a história do princípio, do meio e do fim da Guerra do Ultramar, a guerra que nós fizemos.

Sobre esta estrada de Piche, já aqui já foi mencionado este caso do único ataque às máquinas da TECNIL, praticamente em toda a guerra.

Luís Graça, só por negligência, propositada ou intencional ou casual, estes casos podiam acontecer. É coincidência apenas, ou as Forças Armadas só já estavam preocupadas com outros valores?

Claro que andamos aqui, também para compreendermos quem fomos, quem somos, e quem viremos a ser.


C. Novo comenatário do editor LG:

Quem somos nós para "julgarmos" os nossos camaradas ?... Admito que, nessa altura, com estrada alcatroada, a malta andasse mais "descontraída"... Fiz muitas vezes Bambadinca-Bafatá-Bambadinca também "numa boa"... Não aconteceu nada no meu tempo, para além de desastres rodoviárias, por excesso de velocidade...

Enfim, já cá tenho o Perintrep com informação sobre o dia 22/3/1974, facultado pelo meu amigo cor art ref Nuno Rubim... A emboscada foi às 7h45 (e não 8h30). Tivemos 5 mortos (e não 6...), 5 feridos graves e 11 feridos ligeiros... (Menos feridos do que é relatado pelo fur mil do BENG 447. o Manuel Pedro Santos, que ia na coluna)... Foram destruídas 3 viaturas: 1 Chaimite, 1 White, 1 Berliet...

Concordo contigo, Rosinha: 200 gajos de farda amarela a movimentarem-se em "pleno coração fula", deviam dar muito nas vistas... São 5 ou 6 bigrupos!... O PAIGC andava desfalcadíssimo, uma operação destas implica também uma grande logística...

Suspeito destes números que podem estar inflacionados pelo comando do batalhão, o BCAÇ 3883... Era preciso "arranjar" explicações fáceis, que os trutas em Bissau "engoliam"; quem estava no mato também tinha os seus trunfos, ou seja, maneiras de "sacudir a água do capote"; por certo que o ten cor do BCAÇ 3883 (**)  não foi fazer o reconhecimento "in loco"... Também apanhei uma violenta emboscada, no mato, com 6 mortos e 9 feridos graves (26/11/1970, no Xime)... Foi preciso arranjar "bodes expiatórios" e explicações mirabolantes... para descartar erros de comando...

De qualquer modo, o desguarnecimento do leste, a sul da estrada Piche-Nova Lamego, a ausência de uma zona tampão (perdida com a retirada de Beli, Madina do Boé, Cheche, e tabancas em autodefesa como Padada, Madina Xaquili, etc.), a par da proximidade com a fronteira, podem explicar também as facilidades de aproximação do IN a colunas de rotina, como esta...

Depois da emboscadas, a força atacante teve por certo que dispersar, por causa da aviação, que deve ter vindo em socorro das NT... A força inimiga veio fortemente armada, com armas automáticas, RPG2, RPG7 e morteiro 60...

Mas a lealdade dos fulas do Gabu não era a mesma dos fulas de Bafatá, dos regulados de Badora e Cossé... A CCAÇ 21 andou pelo nordeste nesta fase e havia indícios de que o PAIGC estava intimidar e a dividir os fulas... E havia fulas (do Gabu e do Senegal) na guerrilha... No meu tempo, era impossível: nunca soubemos de nenhum, nunca apanhámos nenhum, no setor L1 (Bambadinca): eram balantas, mandingas e beafadas...

Tenho que ver quando foi o ataque ao pessoal e máquinas daTecnil, no troço Piche-Buruntuma... Nas vésperas do natal de 1970, na construção do troço anterior, Nova Lamego-Piche, a TECNIL já havia sofrido 9 mortos...

A malta que estava na Ponte Caium (3º Gr Comb, os"Fantasmas do Leste", da CCAÇ 3546, Piche, 1972/74) também sofreu, no troço entre a Ponte e Piche, uma violenta emboscada em 14/6/1973, tendo morrido 5 camaradas nossos, em condições atrozes: o 1º cabo Torrão, e os sold Gonçalves ["Charlot"], Fernandes, Santos e Dani Silva. Ainda está de pé (!), na ponte, o monumento erigido pelos sobreviventes à memória dos camaradas mortos...



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Pormenor do mapa geral da província > Escala 1/500 mil (1961) > O traçado da antiga estrada Nova Lamego - Piche - Buruntuma. A distância entre Nova Lamego e Piche seria de 30/35 km. A emboscada de 22/3/1974 (na época seca)  deu-se na nova estrada, alcatroada, construída pela TECNIL, e cujo traçado não era muito diferente do antigo, A emboscada deu-se a meio caminho entre Piche (sede do BCAÇ 3883, 1972/74) e Nova Lamego, no troço Bentem - Cambajã  (,não confundir com Camajabá, entre Piche e Ponte Caium).

Infogravura: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2016)


D. Comentário final de Antº Rosinha

Luís, eu não julgo ninguém, jamais me ouvirás julgar seja quem for. Eu sou daqueles que assumo que fomos nós todos que fomos revolucionários, reaccionários. que fomos simultaneamente salazaristas e anti-salazaristas, colonialistas e anti-colonialistas.

Imagina que eu era de armas pesadas, mas cheguei a fazer[, em Angola,]  de vagomestre,  e até "gamei" como os outros que não se livram da fama, portanto também sou corrupto!

Mas, factos são factos, e temos que analisar os factos.

Como vi a guerra aqui no blogue, melhor do que se estivéssemos lá, porque aqui é desbobinada em câmara lenta, e durante 13 anos vivi a guerra em Angola,  de barraca de campanha às costas de carregadores "contratados", daqueles que "comiam fuba podre, peixe podre", como diz o poeta/colonialista/transmontano/revolucionário [, António Jacinto,][***),. tenho, ou melhor temos, que deixar cair as nossas asinhas, e analisar friamente os factos.

E digo isto, se queremos respeitar a memória principalmente, daqueles que morreram sem nunca vestirem uma farda da mocidade portuguesa, alguns nem aprenderam o que eram as cinco quinas da camisa verde, nem aprenderam qual era a capital da Guiné, quando tinham 10 anos e nem sabiam quem foi Camões, ao contrário dos Comandantes.

Luís Graça, estamos a falar de um lugar de mata relativamente esparsa, a pouco mais de meia hora de Gabu, penso que era sede de Batalhão, já não haveria serviço de informações ao menos? Sem Spínola já se teria começado a desistir sem responsabilidades assumidas?

Luís Graça, como estamos a falar dos "finalmentes,  chegaram a cair mísseis sobre Bissau perto da Dicol e da Central Eléctrica, falava-se que Manuel dos Santos (Manecas) teria lançado esses objectos a partir de Cumeré, será que se chegou a um ponto que por lá por cima se tinha caído já na total desistência irresponsável?

É que tanto para avançar como para recuar, os comandantes têm que o fazer com as devidas responsabilidades, e cautelas, e até para improvisar que é a nossa tradicional competência, tem que ser bem feito.

Se insinuo aqui que já poderia haver relaxamento, mesmo que em vez de duzentos e cinquenta fossem só cinquenta guerrilheiros, num lugar plano e bastante aberto, com uma estrada em construção, uma pista de aviação no Gabú, junto a uma sede de Batalhão, e parece que nem teria havido resultados de uma (inexistente) reacção, o que é que podemos, a sangue frio, sentados ao computador, e depois de tudo o que se seguiu militarmente passados um mês ou dois, quem é que me pode alcunhar de "má língua",  de "fala barato",  "armado em juiz"?

Estou só a tentar ligar os acontecimentos. 
Antº Rosinha (****)
_______________

Notas do editor:

(*) 10 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16074: Na festa dos 12 anos, "manga de tempo", do nosso blogue (11): Honrando os nossos "mais velhos": Fernando Valente (Magro), cap mil art, BENG 474 (Bissau, 1970/72), que faz hoje 80 anos... Tem 60 meses / 5 anos de serviço militar, e mais 5 manos que serviram a Pátria em Angola, Guiné e Moçambique... Recorda-se também aqui o relevante papel da engenharia militar na Guiné, através do BENG 447

(**) O BCAÇ 3883 foi mobilizado pelo RI 2, tendo partido para a Guiné, de avião, em Março de 1972 (o comando e a CCS em 19/3/1972; a CCAÇ 3544, a 20; a CCAÇ 3545, a 22; e a CCAÇ 3546 a 23). A CCS ficou sediada em Piche.

 O comandante de batalhão era o Ten Cor Inf Manuel António Dantas.  O comandante da CCAÇ 3546 (Piche, Cambor, Ponte Caium e Camajabá) era o Cap QEO José Carlos Duarte Ferreira. As outras companhias do BCAÇ 3883 eram a CCAÇ 3544 (Buruntuma e Piche; teve dois comandantes: Cap Mil Inf Luís Manuel Teixeira Neves de Carvalho; Cap Mil Inf José Carlos Guerra Nunes) e a CCAÇ 3545 (Canquelifá e Piche; comandante, Cap Mil Inf Fernando Peixinho de Cristo).

O batalhão regressou a casa, de avião, em Junho de 1974. Tem página no Facebook.

(***) Letra de António Jacinto (depois musicada por Rui Mingas, aqui na voz de Lura, 2009)

Monangambé

Naquela roça grande
não tem chuva,
é o suor do meu rosto
que rega as plantações;
Naquela roça grande
tem café maduro
e aquele vermelho-cereja
são gotas do meu sangue,
feitas seiva.

O café vai ser torrado,
pisado, torturado,
vai ficar negro,
negro da cor do contratado.
Negro da cor do contratado!

Perguntem às aves que cantam,
aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:

Quem se levanta cedo?
Quem vai à tonga?
Quem traz pela estrada longa
a tipóia ou o cacho de dendém?
Quem capina e em paga recebe desdém,
fuba podre, peixe podre,
panos ruins, cinquenta angolares,
"porrada se refilares"?

Quem?
Quem faz o milho crescer
e os laranjais florescer?
Quem?
Quem dá dinheiro para o patrão comprar
máquinas, carros, senhoras
e cabeças de pretos para os motores?

Quem faz o branco prosperar,
ter barriga grande,
ter dinheiro?
Quem?

E as aves que cantam,
os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão:

- "Monangambééé..."

Ah! Deixem-me ao menos subir às palmeiras,
deixem-me beber maruvo
e esquecer diluído
nas minhas bebedeiras.

- "Monangambéé...'"

António Jacinto (1924-1992) (Poemas, 1961)

(Com a devida vénia ao blogue O Castendo, de António Vilarigues)

terça-feira, 3 de maio de 2016

Guiné 63/74 - P16044: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (44): Os desentendimentos constantes entre alguns PALOP e Portugal... A luta continua.!...

1. Mensagem de António Rosinha;

[um dos nossos 'mais velhos', que andou por Angola, nas décadas de 50/60/70, do século passado... Fez o serviço militar em Angola, foi fur mil, em 1961/62, diz que foi 'colon' até 1974... 'Retornado', andou por aí (, com passagem pelo Brasil), até ir conhecer a 'pátria de Cabral', a Guiné-Bissau, onde foi 'cooperante', tendo trabalhado largos anos (1987/93) como topógrafo da TECNIL, a empresa que abriu todas ou quase todas as estradas que conhecemos na Guiné, antes e depois da 'independência'; é colunista do nosso blogue com a série 'Caderno de notas de um mais velho']

Data: 22 de abril de 2016 às 22:32

Assunto: Os desentendimentos constantes entre alguns PALOP e Portugal... A luta continua!


Lembramo-nos há uns anos no Estádio do Sporting do encontro "amigável" da Selecção Portuguesa e da Angolana com as canelas do Figo e do João Pinto e Cia, de um lado e do outro, Mantorras e as canelas dos "Meninos do Huambo".

Aquilo deu para o torto, e já não havia mais bola, só havia canelas.

Isto é um exemplo para se  tentar compreender  porquê, tantos desentendimentos entre nós e eles/eles e nós.

Podemos afirmar à partida, que é difícil vencer  complexos  e  melindres.

E os piores complexos, são provocados pelo facto de os políticos portugueses só falarem português, não sabem falar nem quimbundo, nem balanta nem landim, daí não entenderem nada de nada, mesmo com 500 anos  a ir e a vir.

E  os políticos desses países africanos, todos falam português mais os próprios idiomas, portanto têm  muito mais acuidade para dar a volta aos acontecimentos e defender e usar qualquer tipo de verdades  que entenderem, mesmo que sejam demagogias puras.

Já houve atritos e dificuldades de entendimento diplomático com Angola, com a Guiné e com Moçambique por várias vezes, desde as independências até hoje.

Aparecem os casos mais incríveis, que até parece  que nos damos todos "irmamente como inimigos"

Sendo que o relacionamento com Angola, o mais intenso com Portugal, é o mais notório.

Exemplos imensos, foram casos para resolver a devolução da Barragem Cabora Bassa aos Moçambicanos, vários anos e vários governos com avanços e recuos  intermináveis e montes de prejuízo para quem tinha os custos da manutenção da barragem (Portugal)

Com a Guiné também problemas múltiplos (Por amor a L. Cabral, contra Nino, zanga por M. Soares reclamar contra os fuzilamentos, tensões com a Guiiné/ Senegal em 1998,  e ainda há dois ou três anos, por causa de Cadogo, quase de relações cortadas).

Com Angola, é um caso mais bicudo, porque quanto maior a nau, maior a tormenta. Se durante a guerra angolana, algum político português apoiava um dos  lados, o outro reclamava que os portugueses ainda se " julgam"  imperialistas, racistas e colonialistas, e vice-versa, vira  o disco e toca a mesma.

Veio a paz, e agora, se não é o BESA  é outro banco qualquer, e se não é o Bloco é o Luaty, e se não é a Isabel  são os Espanhóis,  e se não houver mais nada para  discutir, põe-se em cima da mesa o racismo tuga, se este seria melhor ou pior que o apartheid dos outros colonialistas.

Este eterno complexo da " incipiente" colonização/exploração portuguesa que deixa complexados colonialistas e colonizadores, que nalguns casos nem  sabemos bem quem é que esteve de um lado ou do outro, quem é que explorou quem,  se   o preto ou o branco em África se o brasuca ou o portuga no Brasil, e é tal o complexo, que no fim de cada melindre diplomático fica-se sempre naquela do "pergunta o roto ao nu" porque não te vestes tu?

É muito difícil aos governos portugueses, uns a traz dos outros, evitares estes e outros constantes atritos com os governos do MPLA, PAIGC, e FRELIMO,  e ninguém se questiona porquê.

Quando as respostas seriam simples, muito simples, sendo que a principal é a falta de saber falar de igual para igual, quer de um lado quer do outro.

Mas a maior dificuldade está do lado português porque a maioria dos políticos portugueses, sem sentirem, estão muito virados para a Europa e de costas para os nossos 500 anos de Ultramar.

Esta minha conversa é conversa de RETORNADO, que voltarei ao tema , se interessar ao blogue, pois há muitas desmistificações a fazer com as demagogias dos anti-colonialismos demagógicos que baralharam todas as partes.

Até à próxima se o assunto interessar para a história da guerra da Guiné, porque "a luta continua" e está para durar.

Cumprimentos

Antº Rosinha

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quarta-feira, 30 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15913: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (43): Os receios europeus de um antigo colonialista português, gen Norton de Matos, em dezembro de 1943

1. Mensagem do Antº Rosinho, um dos nossos 'mais velhos', que andou por Angola, nas décadas de 50/60/70, do século passado... Fez o serviço militar em Angola,  foi fur mil, em 1961/62,  diz que  foi 'colon' até 1974... 'Retornado', andou por aí (, com passagem pelo Brasil), até ir conhecer a 'pátria de Cabral', a Guiné-Bissau, onde foi 'cooperante', tendo trabalhado largos anos (1987/93) como topógrafo da TECNIL, a empresa que abriu todas ou quase todas as estradas que conhecemos na Guiné, antes e depois da 'independência'...


Data: 23 de março de 2016 às 19:32
Assunto: Os receios europeus de um antigo colonialista português, o limiano gen Norton de Matos (dezembro de 1943)


Sobre a II Grande Guerra, Norton de Matos (*) escreveu isto,  em livro que o nosso confrade de tertúlia JD [José Dinis] me proporcionou [ J. Norton de Matos - Memórias e trabalhos da minha vida, 4 volumes. Lisboa: Editora  Marítimo-Colonial, 1944-1945]:




José Norton de Matos (1867-1955), general e político português.   1 junho de 1917. Fonte: Hemeroteca Digital - "Portugal na Guerra :  revista quinzenal illustrada" (n.º 1, 1 Jun. 1917)
Autor: Garcez. Foto do domínio público [, tem mais de 70 anos]. Cortesia de Wikimedia Commons



" (...) Muito receio que se a guerra não acabar por todo o ano que vem (1944),  desapareçam por completo as forças capazes de lhe pôr fim por meio de um armistício e da paz que se lhe deverá seguir. Será então a continuação da luta, cada vez mais desordenada, até à aniquilação de todos os combatentes. A desordem e a anarquia a seguir para presidirem à queda das civilizações." (...)

" (... )Há até hoje duas grandes nações vencidas, a França e a Itália" (...)


" (...) "Não creio que à Alemanha só duas coisas possam acontecer, a vitória ou o desaparecimento. O desaparecimento ou aniquilação somente se darão, como acima disse, se a guerra se prolongar até que deixem de existir as forças de paz. Mas esse eclipse abrangeria então todos os povos da Europa." (...)

(...) "Para a Europa deixaria por muitos séculos qualquer missão histórica. Mas para a Europa inteira e não apenas para três nações europeias."



Eu, "colon", tertuliano, membro da Tabanca Grande, apenas quero lembrar que em dezembro de 1943, quando Norton de Matos [, Ponte Lima, 1867 - Ponte de Lima, 1955] disse isto, faltava meio ano para o princípio do fim, quando aconteceu exactamente o célebre dia D, desembarque na Normandia (ainda não havia túnel mo canal da Mancha).

Este dia D ditou aquilo que Norton de Matos temia, não houve paz, e deu-se a aniquilação da Alemanha, digo eu.

E,  como o general dizia, seria também "um eclipse de todos os povos da Europa".

Só trago isto para o blogue por 2 (dois) motivos:

(i) ser oportuno lembrar que a Europa indefesa e impotente de hoje é a continuação da Europa daquele tempo, e anda tudo ligado;

(ii) sabemos que o estado de impotência em que os países da Europa ficaram,   levou a que, por exemplo,  a França não conseguisse,  a seguir, dominar militarmente na Indochina a sublevação político-ideológica que viria a humilhar o exército Francês e mais tarde provocar o que seria a Guerra do Vietname, e em seguida o desastre de vários anos na Argélia e, por vários anos ainda,  uma descolonização imprópria, na África subsariana, com guerras intertribais, se iria reflectir mesmo em Paris, com imensos atritos raciais, e tribais e culturais.

E a Inglaterra e a Bélgica não se sentiram com resistência para continuar a suportar as "rebeldias" tribais e raciais e as ideologias internacionalistas, em colónias como a Nigéria, Quénia ou Congo e Ruanda, etc.

Daí o desastre das descolonizações africanas totalmente inadequadas,  cujas consequências negativas  também atingiram a própria Europa.

Volto ao general que ainda no mesmo capítulo vaticina (, palavra minha,) que,  caso aconteça o pior, ficariam os "povos das Américas e da Ásia" a substituir os Europeus. (O livro foi editado em 1944, a guerra ainda continuava).

Norton de Matos era um homem admirado por muitos africanistas portugueses em Angola e Moçambique e na Índia, pelas suas ideias coloniais.

Norton de Matos, antissalazarista incondicional, tinha uma ideia da II Grande Guerra e sobre as suas consequências se não houvesse acordos de paz, ideias semelhantes a Salazar.

Os anticolonialistas detestam um e o outro, sendo que há antissalazaristas, algum ainda vivos, que dizem que Salazar devia ter entrado na II Guerra,  como tínhamos entrado na I Grande Guerra.

Vou continuar a ler o livro do Norton de Matos (1944) e vou olhando para os noticiários (2016) e vou comparando o angolano Fernando Peyroteo [1918-1978], o moçambicano Eusébio [1942-2014] e o madeirense Ronaldo [n. 1985, tem costela caboverdiana].

Cumprimentos e que o Google não tire a paciência ao Luís Graça.
___________________

Notas do editor:

(*) Vd. biografia deste grande português no poste de  26 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12902 Agenda cultural (306): Vila Nova de Famalicão > Ciclo de Conferências 2014 > Ideias e práticas do colonialismo português: dos fins do séc. XIX até 1974 > 4 de abril de 2014, 21h30 > Conferência do doutor Sérgio Neto (CEIS20/UC): "De Goa a Luanda, pensamento e acção de Norton de Matos"

(**) Último poste da série > 22 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15781: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): A unidade que os cabo-verdianos ajudaram a criar

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15781: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): A unidade que os cabo-verdianos ajudaram a criar

1. Texto do Antº Rosinho, enviado ontem, domingo, a que se seguiu o comentário de hoje ao poste P15778 (*),  e que diz:

Não é a propósito mas uso este meio
para aconselhar 
que leiam a entrevista de Pedro Pires
no Diário de Notícias de hoje
["Aceitar o uso da violência foi uma decisão difícil",
DN, 22/2/2016; entrevista por Mariana Pereira].
Esta gente continua a não se abrir (meias mentiras), aos 81 anos, 
e,  passados mais de 40 anos,
esta meia dúzia de cabo-verdianos do PAIGC,
continuam a não ser sinceros.
Nem quando ali afirma que foi doloroso pegar em armas.
Na entrevista nem se aborda o assassinato de Amílcar, 
que não deve ter sido tão doloroso para essa gente.
Luís Graça, ainda bem, que te enviei o mail sobre o sonho de Cabral, 
10 horas antes de ler esta entrevista.
Menciona, porque sou eu só contra o cinismo.
Desculpa,  Luís, e o Doutor Gardette, 
um médico colonial com fama em Bissau de um grande humanista, 
de certeza que era contra as armas apontadas 
aos guineenses do lado de lá da fronteira.


[, António Rosinha, foto à esquerda: 
emigrou para Angola nos anos 50, 
 fez o serviço militar obrigatório nessa  sua segunda terra,  
que ele muito amou, 
foi fur mil em 1961/62; 
saiu de Angola com a independência, 
emigrou para o Brasil;
e finalmente foi topógrafo da TECNIL, 
como "cooperante", na Guiné-Bissau, em 1979/93; 
é um "ex-colon e retornado" (sic), 
como ele gosta de dizer 
com a sabedoria, 
a bonomia 
e o sentido de humor de quem viveu  várias vidas 
e, felizmente, está vivo para as contar; 
é membro sénior da Tabanca Grande, 
um dos nossos "mais velhos" ,
a quem a sabedoria africana manda respeitar e saber ouvir]


2. Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): A unidade que os cabo-verdianos ajudaram a criar

Ou a UNIDADE onde Amílcar Cabral se inspirou para imaginar a tal Unidade Guiné-Cabo Verde, (im) possível pós-independência.

 Talvez para quem não foi Retornado como eu, com vários anos de Angola, e muitos anos na Guiné pós-independência, não compreenda e até duvide  daquilo que afirmo.

 Existia uma Unidade Guiné-Cabo Verde, uma Unidade Angola-Cabo Verde, uma Unidade São Tomé-Cabo Nerde e com pouca intensidade uma Unidade Moçambique-Cabo Verde.

 As gerações de Amílcar Cabral, Pedro Pires, Mário Wilson, Bana, para falar só de gente que todos conhecem, conheceram bem, muito bem, melhor que eu , que essas Unidades existiam, tanto nos diversos territórios Ultramarinos portugueses como mantinham também essa unidade entre si, aqueles que residiam, estudavam, ou jogavam à bola, aqui na Metrópole.

E foi baseado nessas Unidades que Amílcar chegou a sonhar que era possível a tal almejada  Unidade Guiné-Cabo Verde.

Fur mil Rosinha, Luanda, 1961
 Devo ser eu a primeira pessoa a  escrever isto, mas garanto que não sou o primeiro africanista ou quem viveu por lá a pensar assim.

 Essa Unidade que todos os Cabo-verdianos antigos conheceram, era “caldeada” naquilo que, e aqui muita gente diz que não existiu, ou então deprecia, o chamado LUSOTROPICALISMO.

 E foi nessa Unidade, que surgem irmanados internacionalmente, os embriões dos movimentos  ( hermons)que deram origem aos  actuais Partidos que dominam e governam os vários PALOP: PAIGC, MPLA, MSLPT, e FRELIMO.

 O PAICV aparece posteriormente como sabemos e já alterna no poder em Cabo Verde.

O próprio Amílcar Cabral participa na fundação do MPLA com os angolanos. E até um angolano,  dos irmãos Pinto de Andrade,  chega a pertencer a um governo de Luís Cabral na Guiné.

 E toda a gente em Angola  diz que José Eduardo dos Santos, angolano, é filho de Sãotomenses.

Tantos as Ilhas de Cabo Verde como de São Tomé conheciam e usufruíam bem dessa Unidade.
Eram muitos milhares de cabo-verdianos que viviam nas grandes cidades de Angola, antes e depois de 1961 com a guerra do Ultramar. E também muitos em São Tomé, que ficaram por lá esquecidos numa grande  miséria por Cabo Verde e Portugal, pós-independência  (reportagem na televisão há poucos anos).

 Esse sentido de Unidade que existia  nos anos 50,  era tão natural e tranquila e num ambiente de paz de tantos anos (a pacificação já tinha terminado havia alguns anos) que se uniram para formar aqueles movimentos dentro do mesmo espírito  ideológico e um grande sentido de irmandade.

 Parecia fácil a sonhada independência  “que nós governamos melhor os nossos riquíssimos países do que os portugueses que só nos atrasam", era uma frase feita em Luanda por brancos e mestiços e negros da cidade de Luanda, nados e criados nas Áfricas, com algum apoio de uns tantos politizados metropolitanos,  por simples anti-salazarismo.

 Era esta a ideia geral que imperava nos anos 50 em muitíssima gente em todas as ex-colónias, e assim se uniram esses  hermons numa ideia comum, luta comum pela independência.

 Até que…aparece uma guerra que surpreendeu toda a gente, a UPA com o seu tribalismo, racismo e separatismo,  Congo, Norte de Angola  e o resto.

 Esta surpresa não foi apenas pela chacina dos fazendeiros brancos do Café do Congo, mas também para essa maioria de irmãos unidos, onde muitos entusiastas das independências, e muitos anti-salazaristas fizeram uma giratória de 180 graus, e tanto cabo-verdianos e angolanos ou ficaram “em cima do muro” ou abertamente puseram-se ao lado do exército colonial.

E quando Amílcar Cabral e aquelas elites irmãs, independentistas avançam em  Angola, Guiné e Moçambique, embora bem organizados devido à sua capacidade, já não contavam com quantidades nem multidões, e como todos sabemos, no caso de cabo-verdianos do PAIGC eram mesmo um número reduzidíssimo.

Essas Umidades  coloniais  e anti-coloniais conheci e vivenciei.

 Era uma Unidade bonita, rica, feliz com muita vida, sentia-se no ar, nas cidades, nas fazendas de café, sisal, praias, campos de futebol e outros desportos.

 Mas essa Unidade após 1961, com a Guerra do Ultramar, ficou muito confusa, e aquela minoria dos movimentos, como nunca conseguiram cativar o povo para o seu lado, foi à base de armas na mão que se conseguiram impor… ao próprio povo.

 E como dentro dos próprios partidos houve enormes chacinas não se pode mais falar em qualquer sentido de Unidade.

Essa Unidade que Amílcar conheceu e viveu, não existe mais, e não sei mesmo se na CPLP existe algum sentimento  que se possa chamar Unidade.

Para terminar, digo que me lembrei de escrever isto, porque hoje, 21, Domingo, li num jornal que Portugal ainda deporta gente para Cabo Verde.

Deporta Cabo-verdianos, não li tudo, fiquei sem saber se foram deportados para a ilha do Tarrafal ou para Santiago. 

Cumprimentos para toda a gente,
Antº Rosinha (**)

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(**) 15 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15748: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): As riquezas das matéria primas africanas e as fantasias criadas

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15748: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (42): As riquezas das matéria primas africanas e as fantasias criadas

1. Texto do Antº Rosinha:

[, foto à direita: emigrou para Angola nos anos 50, foi fur mil em 1961/62; saiu de Angola com a independência, emigrou para o Brasil e finalmente foi topógrafo da TECNIL, "cooperante", na Guiné-Bissau, em 1979/93; é um "ex-colon e retornado", como ele gosta de dizer com a sabedoria, bonomia e o sentido de humor de quem tem várias vidas para contar; é membro sénior da Tabanca Grande]



Data: 12 de fevereiro de 2016 às 15:47
Assunto: As riquezas das matéria primas Africanas e as fantasias criadas


Ou seja, falemos de coisas que toda a gente fala, mas que os responsáveis não  abordam  politicamente, menorizando um assunto imensamente importante e grave.

Toda a África daqueles anos em que nós aqui andámos por lá, era alvo  de enorme atenção mundial quanto às suas riquezas por explorar.

Falava-se no ouro da África do Sul, uma realidade e que muita gente acreditava que todos os países africanos só precisavam de "brancos" ou "amarelos" para explorar da mesma maneira que faziam os boeres e o explorador Rhodes.

No nosso caso, de portugueses das riquezas do azeitinho, do vinhinho, e da corticinha, queixávamo-nos da culpa do atrasado do Salazar, que  escondia as riquezas das colónias para ninguém cobiçar o que era nosso.

Tudo isto não é novidade para quase ninguém, mas estas coisas ouvidas em Angola antes e durante a guerra,  por independentistas tipo pessoas em que podemos enquadrar gente como  os futuros dirigentes do MPLA e PAIGC, servia para aliciar os nativos, e  principalmente quem vivia nas cidades, criados, serventes nas obras, vendedores de jornais e pipocas, estudantes nas escolas e liceus, e em geral todos os jovens citadinos.

Todos, menos os velhos sobas e régulos que desconfiavam das farturas, e sabemos que uma grande maioria pagou com a vida e a destruição e perseguição, principalmente em Angola com 3 movimentos inimigos.

Mas nós, muito  povo português da metrópole, caíamos também nessa cantilena, das riquezas e diamantes a pontapé, e até hoje passados 40 anos muito patinho ainda escorregou na casca da banana, alguns até foram ao parlamento explicar aos deputados para onde foi tanto dinheiro.

Na Guiné, essa miragem das riquezas «escondidas» também foi vendida e de que maneira. Estrangeiro que chegasse a Bissau, nos primeiros vários anos após a independência com partido único, PAIGC, verificava que  essa fantasia das riquezas escondidas, ainda era vendida entre os jovens e principalmente entre a Juventude Amílcar Cabral (JAC).

E, embora Amílcar Cabral chamasse à atenção,  em discursos, que não queria uma Guiné igual aos países que continuavam  a ser explorados  por neocolonialistas, não evitou que o PAIGC criasse macaquinhos na cabeça de toda a gente.

Então estava criada uma ideia na cabeça de toda a gente, em Bissau, que a Guiné estava deitada sobre um enorme lençol de petróleo, e um grande travesseiro de fosfatos, que os portugueses escondiam.

Como tal, nem era  preciso semear o arrozinho, a mancarrazinha e o cajuzinho!,,, Alguém viria para explorar aquelas riquezas e era a felicidade total.

E assistiu-se vários anos a uma Guiné absolutamente paralizada, sem produzir nada, à espera das ofertas de dadores e doadores que tudo o que enviavam era distribuído entre os "membru" do partido, ou exportado para os vizinhos, e o povo naquela fome.

Outra ideia criada pelo PAIGC, e que  todas as ex-colónias alimentam, até os brasileiros, era que os portugueses, atrasados, não deram educação e ensino, por isso "estamos atrasados".

E os dadores e doadores vai  de recuperar o atraso dos portugueses,  a fazer com bolsas de estudo doutores e engenheiros como uma linha de montagem, e não havia mais  jovens  que quisesse permanecer na sua tabanca original, nem para criar vaca ou cultivar arroz.

Ora, como até agora não apareceram as tais riquezas que Salazar «escondeu»,  e é aí que eu quero chegar, podemos hoje, 40 anos após a independência, contraditoriamente, podemos confirmar que hoje os guineenses são dos povos menos pobres da toda a África e precisamente por essas riquezas continuarem escondidas.

Mais pobres que a Guiné são os Estados petrolíficos e diamantinos, como Angola, os Congos , Nigéria, Serra Leoa e muitos  outros, em que têm enormes cidades  com milhões de jovens a vaguear pelas ruas, sem qualquer perspectiva de vida, quer na agricultura, que ninguém produz porque há dinheiro para importar, nem na construção e indústria porque há dinheiro para pagar a portugueses e chineses e franceses e brasileiros fazerem, nem nas escolas porque não adianta estudar porque vêm engenheiros e doutores  europeus, chineses e  americanos  e ocupam os bons lugares de trabalho.

Um caso paradigmático quanto às riquezas petrolíferas é São Tomé, que são duas ilhas num mar de petróleo. E fantasiando riquezas mirabolantes, abandonaram aquelas maravilhosas e modelares fazendas de cacau do "colon" explorador, e agora estão esperando que um branco qualquer venha restaurar a exploração cacaueira, já passaram 40 anos.

Todos os países europeu coloniais sabiam das riquezas que havia naquelas colónias, e a melhor e mais económica e  "humana" maneira  de explorar essas riquezas, era a independência.

Mas,  exceptuando nós portugueses e os brancos do apartheid sul-africanos e rodesianos é que de uma maneira ou outra lutaram contra a demagogia de libertadores irresponsáveis daqueles "ventos da história", que ajudados pelo cinismo de neocolonialistas, iludiram com fantasias mirabolantes milhões de jovens que hoje (os pretos velhos nunca acreditaram) estão completamente desorientados.

Muitos desses jovens estão há vários anos  junto ao funil da mancha, outros no arame farpado de Ceuta, outros na Tunísia a olhar para Lampedusa. Estão a perguntar de quem é a responsabilidade sobre o desaparecimento daquelas riquezas, porque a eles não calhou nada.

Sabemos que África tem regiões com muitas riquezas naturais, mas sabemos que há outras tão pobres que nem a água das chuvas é regular. E podem nem ser essas as que vivem pior, Cabo Verde é um exemplo. Mas Cabo Verde é um caso africano à parte, não tem as mesmas contradições  da maioria dos outros países. Para os cabo-verdianos, o que conta são as únicas riquezas que têm: O seu tchon e as pessoas.

Nós,  portugueses, como os mais antigos colonizadores em África, bons ou maus colonizadores,  (não há colonizadores bons, mas dizem alguns guineenses que os franceses colonizam melhor que os portugueses),  temos obrigação, através dos que andámos na Guerra do Ultramar, escrever na história da África e da Europa que lutámos enquanto pudemos contra o caos daquelas descolonizações, que de terras onde não havia fome, hoje há fome, guerra, diamantes, petróleo, abandono e invasões indiscriminadas, até de religiões estranhas vindas de todas as latitudes, e não sabemos onde as coisas vão parar.

E uma das causas de muitos problemas africanos, são mesmo as riquezas «escondidas». A Europa, como vizinha de África,  e com algum sentimento de culpa, vai (está) a sentir na pele o que aí vem.

Cumprimentos

 Antº Rosinha



Suécia > s/l > s/d > Visita de uma delegação de um país africano... Segundo indicação do Cherno Baldé,  pelas vestes e traços fisionómicos, seriam representantes do povo massai, seminómadas; são menos de um milhão, e vivem no Quénia e no norte da Tanzânia.

Foto do arquivo de José Belo (sem indicação da fonte).
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Nota do editor:

Último poste da série > 16 de janeiro de 2016  > Guiné 63/74 - P15623: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (41): o que foi mais devastador para o PAIGC foi precisamente a campanha psicológica spinolista por uma "Guiné Melhor"


sábado, 16 de janeiro de 2016

Guiné 63/74 - P15623: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (41): o que foi mais devastador para o PAIGC foi precisamente a campanha psicológica spinolista por uma "Guiné Melhor"

Dois comentários (*) de António Rosinha: 

[, foto à direita: emigrou para Angola nos anos 50, foi fur mil em 1961/62; saiu de Angola com a independência, emigrou para o Brasil e finalmente foi topógrafo da TECNIL, Guiné-Bissau, em 1979/93; é um "ex-colon e retornado", como ele gosta de dizer com a sabedoria, bonomia e o sentido de humor de quem tem várias vidas para contar; é membro sénior da Tabanca Grande]: 


1. O impacto destes panfletos eram de uma ingenuidade tremenda, cujos efeitos pretendidos seria mínimo (*).

Talvez em conjunto com a política de Spínola da "Guiné melhor" ajudasse um pouquinho, nas cidades e vilas. Quem sabia ler no mato em português? Alguns chefes do PAIGC. Daí a tradução era ao gosto de cada um.

Em Angola havia uma comunicação oral multilingue através de rádio, comerciantes, administrativos, fazendeiros e mesmo militares brancos que já tinham sido nados e criados nos muceques e junto de sanzalas onde se falava africanês.

Daí o insucesso político e social redundante do MPLA, UPA e UNITA, só lá foram a ferro e fogo (30 anos).

Também os cabo-verdianos do PAIGC com o crioulo se perderam naquele labirinto étnico.
Amílcar Cabral ganhou em todos os campos, mesmo em Lisboa, mas não ganhou na terra dele.
Para mal dos guineenses, e dos angolanos de quem também era fundador do MPLA. Para mal, porque a guerra continua, é uma babilónia custa a entenderem-se.
...E parecia tudo tão fácil, em 1960!

2. Eu quando digo que em Angola tínhamos a "arma do domínio das línguas tribais", sei que na Guiné não havia essa arma.

José Câmara e Torcato Mendonça, na Guiné não havia essa arma nem nas mãos do "colon" metropolitano nem do "colon" cabo-verdiano (aí o maior fracasso de Amílcar Cabral e Luís Cabral, que de uma maneira ou outra não alcançaram o objectivo pessoal a tal UNIDADE Guiné-Cabo Verde).

Devido à "invenção" do crioulo, ninguém queria saber das línguas étnicas, muitas, e com reduzido número de falantes cada uma.
O que não acontecia em Angola, onde havia muitos milhares de falantes em etnias do tamanho de meio Portugal ou mesmo do tamanho de Portugal (bailundos)
E onde muitos brancos e mestiços nascidos ou residentes tinham que assumir naturalmente essas línguas, há muitos anos.

Ainda após a independência, na Guiné é necessário frequentemente tradutores/intérpretes para transmitir os discursos e palestras dos governantes em cada região.

Em Angola qualquer chefe de posto, comerciante, fazendeiro e muitos tropas, falavam uma e mais línguas.

Tive colegas de profissão, brancos e mestiços, que falavam corretamente duas e mais línguas, o que não era comum acontecer com os próprios chamados indígenas que só falavam a própria língua.

Claro que contra os canhões e morteiros russos e cubanos não há diálogo que funcione nem em balanta nem crioulo nem francês nem bailundo.

Mas para dissuadir naquele tempo as populações, fosse na Guiné ou em Angola, a melhor arma era usar a língua dessa população.

E essa arma das línguas foi usada em Angola em todas as frentes, governadores de distrito, comerciantes, pide e chefes de posto e militares, testemunhei ao vivo.

Mas também testemunhei na Guiné, pela boca do povo, que o que foi mais devastador para o PAIGC foi precisamente a campanha psicológica spinolista por uma "Guiné Melhor". Ou seja,  o tal diálogo (e obras) com o povo, em crioulo/português, que se fosse nas línguas nativas, digo eu, o efeito desmultiplicava-se indefinidamente.

Era surpreendente a empatia das populações indígenas do interior de Angola quando contactadas por estranhos, na sua própria língua.

Era como se houvesse um efeito hipnótico, é a melhor maneira que tenho para explicar situações que vi.
E, em surdina para o PAIGC não ouvir, ouvi em Bissau, guineenses falarem de Spínola como se fosse alguém por quem podiam dar a vida.

Ainda haverá um dia algum guineense, escritor que escreva livremente, sem complexos aquilo que se passou do lado deles, sobre todos os pontos de vista, porque do nosso lado (ex-metrópole) já está ficando tudo bem esmiuçado para quem venha historiar. (**)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 14 de janeiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15619: Álbum fotográfico de Alfredo Reis (ex-alf mil, CART 1690, Geba, 1967/69) (5): Os nossos cartazes de propaganda

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Guiné 63/74 - P15464: Caderno de Notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (40): "A colónia onde todas as Fatumata tinham de se chamar Maria" -Guiné Bissau (Sobre a reportagem do jornal Público)

1. Mensagem do Antº Rosinha

[, foto à esquerda: emigrou para Angola nos anos 50, foi  fur mil em 1961/62; saiu de Angola com a independência, emigrou para o Brasil e finalmente foi topógrafo da TECNIL, Guiné-Bissau, em 1979/93;  é um "ex-colon e retornado", como ele gosta de dizer com a sabedoria, bonomia e o sentido de humor de quem tem várias vidas para contar; é membro sénior da Tabanca Grande]: 


Data: 8 de dezembro de 2015 às 00:09

Assunto: A colónia onde todas as Fatumata tinham de se chamar Maria - Guiné Bissau (Sobre a a reportagem do jornal Público)


Luís e Carlos, só se não houver inconveniente...

Interessantíssima esta reportagem que Carlos Vinhal enviou para  conhecimento do pessoal da Tabanca Grande [ "A colónia onde todas as Fatumata tinham de se chamar Maria", de Joana Gorjão Henriques (texto), Adriano Miranda (fotos) e Frederico Batista (vídeo), Público, 6 de dezembro de 2015 (Série especial: Racismo português)].

Esta reportagem pouco traz de novo para quem antigamente ouvia as emissoras rádio Pequim, rádio Moscovo, rádio Praga, Deutsche Welle, etc., em programas em português do MPLA,  PAIGC e FRELIMO.

A maior diferença de discurso, está entre o anti-colonialismo primário e demagógico daqueles movimentos, e aqui sobressai apenas a crítica aos defeitos da colonização portuguesa.

O que é mais estranho é que as pessoas, filhos das "vítimas" do colonialismo, africanos dos PALOP em geral, continuem passivamente a não se descolonizarem mais radicalmente, ao ponto de abusarem, hoje, cada vez mais de "perucas" e a viver em cubatas de vários pisos ( Prédios enormes no caso de Luanda). A preferir viver em andares sem quintal, sem a antiga tradicional qualidade de vida familiar africana,

Não resisto a respigar uns tópicos dessa reportagem e entre parênteses fazer os meus comentários um tanto levianamente, porque colaborei e vi fazer essa tão má e tão pouco intensa colonização (parece que se diz "colonização suave"). 

Aliás, se qualquer colonização fosse boa, ninguém queria ser descolonizado, antes pelo contrário. Era caso para dizer vai chamar pai a outro, de um lado , ou vai chamar filho a outro, do outro lado E como sei que se foi difícil ser colonizado, também muito difícil era colonizar.
.
A prova que era difícil colonizar, é que os Europeus desistiram bem cedo dessa colonização, e com certeza aos olhos de muitos africanos antigos, até teria sido cedo demais, que pensam isso mas não dizem.

Então lá vão os tópicos que me chamaram mais a atenção, nessa grande reportagem, e que alguns são bem genuínos, outros "assim-assim". (Entre parênteses é explicação minha, que fui cólon em Luanda muitos anos)

A colónia onde todas as Fatumata tinham de se chamar Maria. (Também se chamavam Domingas ou Segunda, talvez inspirados no inglês Robinson Crusoe com o seu Fryday)

Nos tempos do colonialismo português, o guineense tinha de vestir-se como um europeu para provar que tinha direito a ser cidadão.(Aqui haveria mesmo discriminação, ficavam isentas dessa obrigação as bajudas bijagós com as saias de palha? )

As mulheres tinham de desfrisar o cabelo, desfazer as tranças africanas. (Era o colono a ditar moda.)

A separação entre os guineenses e portugueses era real. (Só na praça o guineense não podia viver, porque na tabanca o português entrava e saía quando queria.)

Ninguém podia atravessar descalço a fronteira que dava acesso a Bissau.
(Chapa Bissau)(eram manias de colonos que na terrinha até andavam sempre descalços.)

Num exemplar da Caderneta do Indígena vêem-se várias folhas, cada uma com itens que alguém preencheria: as características, o imposto indígena, a contribuição braçal, castigos e condenações…(Era um autêntico cartão de cidadão com registo criminal.)

Os velhos contam que, quando se abriam as estradas, as pessoas eram obrigadas a ir trabalhar. (Com a agravante de só os brancos é que tinham automóvel.),

Quem eram os administradores? Raramente eram os lisboetas, os minhotos — muitas vezes eram os cabo-verdianos. (Pois, como além de administradores, também os dirigentes do PAIGC, Amílcar e os outros eram berdianos, imagina-se a indignação dos guineenses, não serem pioneiros nem na colonização nem na descolonização.) 

Não fez uma única amiga nesse tempo. Quando ia de férias para o Norte, o pai guiando o seu Cadillac, havia sempre uma pequena multidão de curiosos atrás, tinham de fechar os vidros :"olha o preto, olha o preto, olha o preto", gritavam. Eram os anos 1960, a época de um "Portugal tacanho". E ignorante. A mentalidade dos portugueses na Guiné-Bissau não era muito diferente. (Refere-se aos tugas colonos que tínhamos abandonado as cabrinhas, vindo a escorregar por uma tábua, embarcámos em Alcântara num porão de navio e regressámos de Cadillac, com uma prole mestiça, hoje já não somos ignorantes e vamos para Bissau via Dakar de Jeep e para Luanda de avião e vimos sem Cadillac e sem prole.... E se fosse agora não se dizia "olha o preto" dizia-se "olha mais um escarumba".)

A maior parte do tempo o mestiço está a ter de provar que é tão guineense como os pretos. (O racismo dos pretos chegou ao ponto de em Luanda, no 25 de Abril,  dizerem que os brancos vão para a terrinha, os mestiços não têm terra, vão para o mar.)

A teoria do luso-tropicalismo de Gilberto Freyre (1900-1987) suportou a ideologia do Estado Novo sobre a excepcionalidade portuguesa de estar nos trópicos. (Ideologia do Estado Novo, do Estado velho, de Marquês de Pombal, de António Vieira, de Sá da Bandeira e continuará cada vez mais.)

P.S. - Não menciono o nome dos vários entrevistados nesta reportagem, para não aumentar muito o poste

Cumprimentos

Antº Rosinha


Angola >  Agosto de 1935 > Visita à Fazenda Tentativa,  no âmbito do 1º Cruzeiro de Férias às Colónias de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Princípe e Angola, uma inciativa da revista O Mundo Português, que juntou cerca de duas centenas de "estudantes, professores, médicos, engenheiros, advogados, artistas, escritores, industriais e comeriantes"...

O director cultural do cruzeiro foi o  prof doutor Marcelo Caetano (1906-1980), então um jovem entusiasta do Estado Novo e doutrinador do corporativismo.(Será comisário da Mocidade Portuguesa em 1940 e ministro das colónias em 1944, até chegar a sucessor de Salazar, de 1968 a 1974).

Esta "revista de cultura e propaganda, arte e literatura coloniais" era dirigida pro Augusto Cunha, sendo propriedade da Agência Geral das Colónias e do Secretariado da Propaganda Nacional.

Fonte: O Mundo Português, vol II, nºs 21-22, setembro-outubro de 1935 (Exemplar oferecido ao nosso blogue por Mário Beja Santos; foto da autoria de Sam Payo, digitalizada e editada por L.G.; reproduzida com a devida vénia).
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