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quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22748: (De)Caras (183): Revivendo e partilhando (João Crisóstomo, Nova Iorque, de Visita a Portugal)

1. Mensagem do nosso camarada João Crisóstomo, a residir em Nova Iorque, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67), enviada ao nosso Blogue em 16 de Novembro de 2021:

Caros camaradas,
Sempre que vou a Portugal uma das minhas prioridades é tentar contactar pessoalmente aqueles que me são queridos e a quem apenas consigo contactar por telefone ou E-mail durante todo o ano. Se a alguns consigo fazê-lo individualmente a maioria sejam estes membros de família, camaradas da Guiné ou simplesmente amizades feitas ao longo dos anos, apenas consigo fazê-lo em ocasiões pre-combinadas que me permitem ver e encontrar várias pessoas ao mesmo tempo.
Evidentemente que “férias em Portugal” quer dizer sempre viajar um pouco. E foi nestas viagens que tive ocasião de fazer algumas visitas já mencionadas em ocasiões anteriores quando tive a grande satisfação de visitar o Valdemar Queiroz e o Francisco Pinho da Costa. Este último nunca o tinha visto mais depois de termos sido vítimas duma mina, ocasião em que fracturou as pernas e foi evacuado para Bissau e depois para Portugal. Tive muita pena de não me ter sido possível visitar vários outros que sabia estarem com problemas de saúde ou outras razões que que não lhes permitiam deslocações. A alguns até já contactei depois de ter voltado a Nova Iorque. A outros farei o possível para os contactar brevemente, tanto mais que a época de Natal e Ano novo se aproximam.
Entretanto aqui estão algumas fotos, queridas todas pois são elos entre mim e outros que me são queridos.


Esta foto foi tirada no Algarve. O Henrique Matos encarregou-se de combinar com os outros três a melhor maneira de nos vermos e vieram os quatro ter comigo ao Hotel Vila Galé em Tavira onde eu e a Vilma, acompanhados pelo Rui e Virginia a quem tínhamos convencido a vir connosco, fizemos a nossa base nesses poucos dias no Algarve. A Vilma, convencida a ficar na foto para esta ficar mais bonita, foi depois ter com o Rui e Virginia. E nós cinco, - eu , Henrique Matos, Teixeira, Chico e Viegas - ( que faz hoje anos e a quem por telefone já dei um abraço, interrompendo o seu almoço com amigos) ficámos a matar saudades, revivendo momentos, partilhando notícias e lembrando camaradas; como sempre sucede nestas ocasiões.
Reviver a Guiné, pelo menos para mim, mas creio que é mais ou menos geral este sentir, não importa quantas vezes o fazemos, é quase sempre como se fosse a primeira vez depois das vividas experiências passadas. Doloroso porém quando aqueles camaradas que connosco viveram esses momentos não estão mais entre nós. Ao fim de duas horas e um abraço forte despedido-nos… "até à próxima vez, talvez no próximo ano, se Deus quiser”.

O claustro do convento de Varatojo foi o lugar de encontro com os meus familiares e amigos este ano. E porque entre os meus familiares tenho alguns que foram também meus camaradas na Guiné e outros que partilharam comigo as vivências de Seminário, na missa que precedeu o nosso encontro eu pedi ao Padre Melícias, celebrante para lembrar duma maneira abrangente todos os camaradas da Guiné ou de Seminário já falecidos. Como a foto revela foi pequeno o número de presentes este ano. Razões de idade, agora agravadas pela ainda presente covid assim o exigiram.

O viver próximo de Luís Graça, Rui Chamusco e a São, esposa do saudoso Eduardo Ferreira, facilitaram-me encontros e momentos daqueles que me fazem sentir o quão maravilhosa pode ser a vida de cada um de nós. Basta sabermos não perder as boas oportunidades. O sorriso na cara de cada um, incluindo em outros queridos/as presentes nesses momentos, dá bem idéia da amizade e alegria que todos sentíamos naquele momento.

Outros momentos me ficaram na memória e coração, mas que devida à minha pouca perícia em coisas digitais não me ficaram devidamente registados apesar das boas intenções nesse sentido. Mesmo sem as devidas fotos, recordo já com saudade os momentos com Manuel Leitão (o Mafra); as visitas ao Forte de Castro Marim, no Algarve, quase na fronteira com a Espanha, onde o Infante Dom Henrique que aí chegou a viver foi o primeiro Grão Mestre da Ordem de Cristo, herdeira dos privilégios e propriedades da extinta Ordem dos Templários.
Entre outros momentos dignos de registo lembro uma visita à Coudelaria de Alter do Chão com os seus famosos cavalos e a sua “escola de faisões", única no género em Portugal. No Crato fui encontrar o túmulo, original dizem, de Don Nuno Álvares Pereira… e em Castelo de Vide, graças a uma dica do Luís Graça, fui encontrar uma sinagoga e o que resta de uma povoação que recebeu milhares de refugiados aquando da instalação da Inquisição na Espanha.
E outros lugares que me fazem ver que cada vez que me desloco dum lado para outro o quanto há para conhecer e visitar.

Que ficam para a próxima vez, se Deus quiser.
João Crisóstomo, Nova Iorque

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Nota do editor

Último poste da série de 9 DE NOVEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22699: (De)Caras (182): os dois "ponteiros" de Bambadinca, o velho Brandão (da Ponta Brandão) e o histórico Inácio Semedo, de quem o Amílcar Cabral foi padrinho de casamento - II (e última) Parte

segunda-feira, 1 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22678: In Memoriam (417): Queta Baldé (1943-2021), ex-Soldado do Pel Caç Nat 52 e 2.ª CComandos Africana, falecido em Lisboa

IN MEMORIAM

Queta Baldé (1943-2021)

Ex-Soldado do Pel Caç Nat 52 e 2.ª CComandos Africana


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de hoje, 1 de Novembro de 2021:

Queta Baldé, o meu querido 126, o construtor do meu Diário da Guiné, deixou-nos

Mário Beja Santos

O confrade Carlos Silva telefonou-me no intervalo de um congresso de antigos combatentes, ali para a linha do Estoril, deu-me a saber que alguém fazia questão de me informar que falecera o Queta, pedi mais esclarecimentos, sim, era Queta Baldé, o 126, finda a sua comissão militar no Pel Caç Nat Nº 52 concorrera à 2ª Companhia de Comandos Africana, foi aceite, veio a independência, e correndo o risco de ser preso ou fuzilado conseguiu chegar ao Senegal e daqui a Marrocos, contou com a solicitude da Associação dos Comandos, veio para Portugal, instalou-se em Chelas J, veio a Cadi, apareceram os meninos, entrei em cena, a casa onde viviam tinha tanto bolor que se lavava com lixívia à segunda-feira e dois dias depois estava tudo enegrecido. Fizeram-se diligências, o menino mais velho tinha asma agravada, mudaram de casa. E sem obrigatoriedade de data o Queta era sempre uma presença no almoço dos bravos do pelotão, religiosamente bacalhau com batatas, vinha o Mamadu Camará, o Cherno, o Abudú, chegou a participar no repasto o Benjamim Lopes da Costa.

Quando, em 2006, tomei a decisão demencial de escrever os Diários da Guiné, perguntei ao Queta se me podia ajudar a ultrapassar o claro-escuro de certas situações que tínhamos vivido em Missirá. Acedeu prontamente, e passámos a ter encontros semanais na Praça Duque de Saldanha, ele saía da empresa onde fizera cerca de 12 horas de vigilância e começava a sabatina. Havia antecipadamente um telefonema para o pôr ao corrente das minhas dúvidas, quem era quem, que itinerário tínhamos seguido naquela volta junto ao rio Gambiel até Salá, se se recordava dos seis trajetos diferentes que nós utilizávamos para chegar a Mato de Cão sem pisar as picadas convencionais, se se lembrava da data em que tínhamos ido pela primeira vez ao Buruntoni… E cedo começou o meu deslumbramento com a sua memória de elefante.

Explicou-me ao detalhe como chegaram a Missirá para substituir a Companhia do Enxalé, como se constituíra o Pel Caç Nat 52 que tivera como seu primeiro comandante o Henrique Matos Francisco, as operações a Madina, as populações de Missirá e Finete, as múltiplas suspeitas de que o PAIGC não queria fazer grandes ondas na região porque tinha vias de abastecimento em direção a Mero e aos Nhabijões, e assim evitava conflitos, a partir do momento em que havia vigilância em Mato de Cão qualquer possível ataque ficava reservado a quem se posicionasse em Ponta Varela.

E saindo de um contexto geral, deixava-me de boca aberta com as horas a que saíamos para os patrulhamentos, sempre com a sua linguagem pausada ia ataviando os locais por onde passávamos, a descoberta dos trilhos usados pelas gentes de Madina e Belel, reproduzia emboscadas elencando o nome de quem lá tinha estado. Tentei pô-lo à prova e perguntei-lhe se se lembrava de uma emboscada lá para os lados de Chicri onde alguém perdera uma peça de roupa e exigia recuperá-la, não me deixou continuar, era a boina verde do Cabo Barbosa, sim, tínhamos saído dali a correr pela noite calada, no dia seguinte lá se descansou quem tinha perdido o fetiche da boina, e o Queta sentenciou: “Manga de canseira, mas que gente tão porreira, nosso alfero!”

Dei-lhe a alegria de ir visitar a Amedalai o seu filho mais velho, o Queta recusou-se a voltar à Guiné, a vida familiar também o deixou causticado, nos últimos anos vivia sozinho para os lados da Amadora, guardo dele um belo sorriso, um olhar translúcido, as suas mãos a afagar os livros que lhe oferecia, particularmente o segundo volume do Diário da Guiné em que ele aparece ao alto na fotografia tirada no dia de Natal de 1969 na ponte de Undunduma. Durante anos fez sala na Praça do Rossio, no último banco já perto do Largo de São Domingos, ali conversávamos, perguntando por este e aquele, não faltou às cerimónias fúnebres dos meus entes queridos. Foi adoecendo, mesmo antes da pandemia, arrastava-se, os telefonemas passaram a ser taciturnos, não tinha forças para vir comer o bacalhau, deixei de o ver no banco onde fazia sala, perguntava por ele, estava no hospital, o telefone deixou de atender.

E assim chegamos a mais uma perda irremediável, alguém que me deu o privilégio de uma estima recíproca, que funcionou como agente de informação e de vigilância na urdidura daqueles diários, estou a vê-lo a acariciar os livros, a ver os mapas do Cuor, de Bambadinca e do Xime, a recordar-me que começara a vida como tocador de batuque e assim percorrera a pé toda aquela região do Corubal até ao Xitole. Apaga-se mais uma luz daquele memorável palco onde construí a minha consciência de homem, e nada mais posso fazer de que vergar-me respeitosamente não só pela sua memória mas pelo seu contributo indefetível, como bravo soldado que foi, o 126, o companheiro que exigiu a minha presença em Lisboa em horas tão difíceis da sua vida, que me ofereceu a sua disponibilidade para que não faltasse a que dar a certidão da verdade naquele tempo de guerra que vivemos irmanados. Seguro que lá estás a sorrir à direita de Deus, aqui deixo esta nótula de quem fica profundamente desconfortado com a tua partida, abraço-te calorosamente, nha ermon, Mário


2008, o Henrique Matos Francisco e o Queta Baldé no lançamento do Tigre Vadio
A Missirá dos tempos em que o Pel Caç Nat 52 aqui chegou (1967)
25 de dezembro de 1969, ponte do rio Undunduma, o Queta Baldé está ao alto, primeiro Mamadu Djao com uma cana na mão, segue-se Jogo Baldé de não na anca, Queta Baldé imaculadamente fardado
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A tertúlia e os editores deste Blogue não podem deixar de associar à dor dos seus familiares e amigos na Guiné-Bissau e em Portugal pela perda deste seu ente querido, também nosso amigo e camarada de armas.

Mais um dos bravos irmãos naturais da Guiné que lutaram ao nosso lado e que nos deixa.

Um especial abraço ao Mário Beja Santos, seu comandante no Pel Caç Nat 52 e amigo pela vida fora, já que o Queta morou, desde a independência da Guiné-Bissau, sempre em Portugal, onde acaba de falecer.

A partir de hoje, o nosso camarada Queta Baldé, ficará, a título póstomo, a figurar na lista dos nossos amigos que da lei da morte já se libertaram. Tem o lugra nº 854.

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Nota do editor

Último poste da série de 25 DE OUTUBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22660: In Memoriam (416): Victor Barata (1951-2021), ex-1.º Cabo da FAP, Especialista de Instrumentos de Bordo, BA 12, Bissalanca, 1971/73; membro da Tabanca da Grande desde maio de 2006 e fundador, em junho de 2007, do blogue Especialistas da BA 12... Era um "Zé Especial", tratado com muito carinho por "Vitinho"... Velório: hoje, a partir das 16h00 em Campia; Vouzela; missa de corpo presente às 15h00 de amanhã, seguindo depois o féretro para a Casa Crematória de Viseu

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Guiné 61/74 - P22558: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte XIII: o fatídico dia 6 de outubro de 1966, duas minas A/C, dois mortos, no Mato Cão


Guiné > Zona Leste> Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá, Porto Gole, 1965/67)  > Estrada que atravessava a bolanha depois de Mato Cão  quando se vinha de Missirá para Enxalé



Guiné > Zona Leste> Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá, Porto Gole, 1965/67) > Ao meio, o furriel de transmissões, à direita de costas, o capitão Pires e à esquerda o fur mil op esp António dos Santos Mano, que irá morrer em 6/10/1966, na sequência de uma mina A/C, na estrada Missirá-Enxale.


Guiné > Zona Leste> Setor L1 > Bambadinca > CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá, Porto Gole, 1965/67) >Embora não possa pôr as mão no fogo sobre a sua exactidão, creio que foi este o Unimog  da coluna de 6 de outubro  que vinha a Missirá  a Enxalé. Eu estou nesta  foto ( em pé, o 3º da esquerda) que me parece ter sido tirada um dia quando eu estava em Missirá  antes do Zagalo .   

Fotos ( e legendas): © João Crisóstomo (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



João Crisóstomo
(a viver em Nova Iorque desde 1977)


1. Continuação da publicação da publicação das memórias do João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)


CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé,
Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história”
como eu a lembro e vivi
(João Crisóstomo, luso-americano,
ex-alf mil, Nova Iorque) (*)


Parte XIII: Um dia fatídico, 6 de outubro de 1966, duas minas A/C, dois mortos


Depois de 9 Set 1966 (o ataque a Enxalé):

Haverá com certeza muito a lembrar sobre a vida e actividades da CCaç 1439 depois do ataque a Enxalé. Recordo apenas de ter ficado surpreendido e consternado que o IN tivesse tido a coragem de vir atacar a própria Sede da Companhia, onde, pensávamos, estávamos bem seguros.

Lamentavelmente nem eu (mea culpa, mea culpa) nem ninguém mais teve o cuidado de pôr algo em papel para memória desses dias que se seguiuram e portanto nada mais me resta do que continuar esta “história da CC1439” como se tudo continuasse como antes e este ataque não tivesse acontecido. 

De facto, as várias minas de que fomos vítimas, a seguir, o ataque a Missirá e outros acontecimentos levam-me a concluir que este ataque a Enxalé é evidência de que o IN se sentia cada vez mais à vontade para se aproximar das NT, intensificar os seus ataques e aumentar o seu campo de acção. Foi isso que senti e mais tarde vim a confirmar ao ler o primeiro livro de Beja Santos ,“ Diário da Guiné, na Terra dos Soncó”.


Dia 23 de Setembro de 1966

Copio à letra o relatório:

(...) " Um grupo de combate da CCaç 1439 participou na Op Girândola que consistiu numa acção ofensiva na mata de Belel. As NT detectarm um acampamento IN o qual se encontrava abandonado. Foram destruidas as casas de mato e culturas, No regress as NT foram emboscadas duas vezes não tendo sofrido qualquer baixa." (...)

Não posso dizer as datas, mas sei que entre as muitas lacunas deste relatório contam-se muitas “patrulhas de reconhecimento” que fazíamos, e que não chegavam a receber o termo pomposo de “operações”. Umas fáceis e outras “menos fáceis”. 

Lembro de várias vezes termos permanecido , como que emboscados junto de picadas suspeitas de serem usadas pelo IN. Lembro de ter uma vez descansado ao fim do dia com a minha cabeca em cima de uma pedra antes de tomarmos posições para passar a noite junto a uma picada ; não sei se foi nesta mesma ocasião ou foi noutra em que fiquei numa depressão de terreno ( talvez fosse mesmo terreno de bolanha, não sei) e eu fiquei com água pela cintura, quase louco de frio,  esperando que o dia chegasse depressa e não aparecesse ninguém na picada.

Um destes casos, que não constam deste relatório, aconteceu nos dias 4 e 5 de Outubro. E creio que o efectivo das NT neste dia não era de um simples pelotão mas bem maior . A razão de eu lembrar este caso e não outros deve-se ao seu relacionamento com o dia fatídico de 6 de Outubro.



Guiné >Zona Leste> Sector L1 > Bambadinca > Estrada Enxalé-Missirá > Sítio do Mato Cão > 6 de Outubro de 1966 > Cratera povocada por uma mina A/C cuja explosão provocou a morte do Soldad Manuel Pacheco Pereira Junior, da CCaç 1439. Era natural de São Miguel, Açores. Os restos mortais (cerca de 3kg) ficaram no Cemitério de Bambadinca, Talhão Militar, Fileira 2, Campa 1, Guiné-Bissau. NO regresso de Missirá, a mesma coluna accionou outra mina A/C que decepou a perna do Fur Mil Op Esp António dos Santos Mano, acabando por morrer.

Foto (e legenda): © Henrique Matos (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Dia 6 de Outubro de 1966, um dia fatídico

Copio à letra o que consta no relatório: e escreverei depois “a minha versão” como as coisas se passaram, baseado na minha memória, por vezes bem fresca sobre casos como este, e também na memória de outros com quem tenho falado sobre o assunto.

(...) "As NT acionaram dois engenhos explosivos quando se efectuaram duas colunas, uma vinda de Missirá (para) Enxalé, e outra ao encontro da primeira. Os engenhos explosivos encontravam-se em pequenas poças de água, embora se tivesse os cuidados julgados necessaries na picada da estrada.

"Resultados dos dois engenhos explosivos:

Dois Unimogs destruidos
Uma espingarda G3 perdida em virtude de ter sido projectada para o Rio Geba.

Baixas sofridas pelas NT:

Furriel Mil António dos Santos Mano ( morto em combate) (**)

Soldado 203/65 Manuel Pacheco Pereira Jr. ( morto em combate) (***)

Furriel Mil ( Mec Auto) Octávio Albuquerque da Silva ( ferido)

1º cabo 7316565 Manuel Abreu Velosa 

1º cabo 3456665 José Firmino Quintal 

Soldado 9311265 Ernesto Camacho Rodrigues 

Sold 7317965 Manuel Correia

Sold 5974165 Francisco de Freitas Timóteo 

Sold 1011265 Manuel de Sousa Mendes

1º Cabo 9271565 José Ilídio Andrade Gouveia .

Soldado 8356465 Manuel Alves Junior

Sold 9805565 Agostinho Gerardo 

Sold cond auto  2630164 José Maria Mendes 

Sold cond auto5140464 Jerónimo Gonçalves Sadio 

Caç Nat Contratado Pucha Nanan, ferido

Foi detectado na região de Mato Cão uma armadilha antipessoal a qual foi destruida. Foi distinguido nesta acção o soldado telefonista 2642365 Júlio Martins Pereira, louvado pelo Cmdt Militar e condecorado.

Este foi um dia fatídico e traumático para todos e que todos mais ou menos lembram imediatamente quando se fala dele.

O Alferes Zagalo estava destacado neste momento em Missirá e precisava de reabastecimentos. Sabendo que o pessoal em Enxalé estava exausto e não podia fazer uma coluna para o abastecer, resolveu vir ele mesmo a Enxalé buscar o que precisava. A sua coluna constava de um jipe e um Unimog, com todo o pessoal que estes podiam transportar.

Antes de chegar a Mato Cão o Unimog pisou uma mina anticarro escondida numa poça de água. O jipe tinha-se desviado para evitar essa poça, precaução que o Unimog não teve.

Os resultados podem-se avaliar pelas fotos e pelo número de mortos e feridos. Entre estes o Furriel Mano. Como o Unimog vinha superlotado , ele vinha em cima do Unimog mas com a perna de fora e veio a falecer no local antes da chegada do helicóptero.

Houve ainda um outro morto, José Moreira, caçador nativo “contratado” e uma dezena de feridos, alguns deles com muita gravidade que foram evacuados para Bissau. A situação era desesperada e nem meios de comunicações para pedir auxílio tinham. Pelo que o soldado de comunicações Júlio Pereira que felizmente não estava ferido, pegou na sua G3 a tiracolo e foi a correr vários quilómetros , sujeitando-se a ser apanhado pelo IN em direcção a Finete, na margem do Geba, oposta a Bambadinca.

Aqui ,com a ajuda do pessoal amigo desta tabanca, conseguiu passar o Geba numa canoa e chegar a Bambadinca onde lhe facultaram um rádio para chamar os helicóperos e avisar Enxalé do sucedido.

 Em Enxalé esperávamos passar esse dia como um dia de descanso .O pessoal da Companhia tinha acabado de regressar duma dura saída ao mato ( embora nada conste no relatório) e estávamos todos exaustos. E de manhã ouvimos ao longe um estrondo, mas não fazíamos idéia do que fosse. Passado o que me perece ter sido mais de um hora recebemos notícia de que a coluna do Zagalo tinha sofrido uma mina, havia feridos e que os helicópteros já estavam a caminho.

Ficamos todos preocupados, incluindo o capitão Pires. Quando este disse que era preciso ir ao encontro da coluna para ajudar o Zagalo, eu ofereci-me. Ele aceitou logo e disse-me: “Eu sei que o pessoal está todo estafado. Pega em todo o pessoal de serviços que ficaram no quartel (nos dois dias anteriores) e vê se arranjas mais alguns voluntários. Se não arranjares voluntários, diz-me que eu arranjo-os."

Assim fiz e depois de ter dados instruções a todo pessoal de serviços, antes de perguntar a outros por voluntários,   eu chamei o meu pelotão, certo de que haveriam alguns que iriam comigo. Foi para mim uma sensacão tremenda quando, logo após eu ter dito o que precisava, eles barafustavam como se eu os tivesse ofendido; que não havia um nem dois e que iam todos . “O que é que o nosso alferes está a pensar da gente?” ouvi o “Figueira” a dizer para os outros .

E assim fomos, picadores à frente, um Unimog vazio a seguir e o resto da coluna atrás , caminhando tão ligeiro quanto possível. A região de Mato Cão é uma passagem muito perigosa: a estrada passa perto do Geba e do lado esquerdo há uma colina. Era sempre com o coração nas mãos que aí passava.

Por isso ao passar a bolanha que precede Mato Cão, já perto deste eu disse ao furriel Lopes: "Olha, Lopes, isto é mesmo um bom sítio para uma emboscada; eles sabem ( o IN) que a gente (ao ouvir o rebento duma mina) não deixa de vir e são capazes de estar à nossa espera. Pega na tua secção, sobe e faz um reconhecimento pela esquerda". 

Ele assim fez e a coluna continuou; e depois, logo passada a bolanha, de repente houve um grande estrondo e o Unimog deu um salto pelos ares. A mina, como o que sucedeu com a coluna do Zagalo, estava dentro duma poça de água e não foi detectada pelos picadores.

Imediatamente nos deitámos nas redondezas do buraco e do Unimog destruido, prontos a responder, mas nada sucedeu. E depois de algum tempo respirei fundo; ao fim e ao cabo podia ter sido muito pior, pensei eu: perdeu-se o Unimog, mas o importante é que não há mortos nem feridos. E não me recordo do que sucedeu a seguir, e o que foi o resto do dia, mas imagino (agora) o que terá sido para todos quando soubemos da morte do furriel Mano e dos vários feridos.

De volta no Enxalé, no dia seguinte fez-se a formatura geral de manhã. E parecia estar tudo certo, até que quando foi chamado o nome do Manuel Pacheco ( conhecido de todos como o Açoriano por ser dos Açores e o único soldado que não era madeirense) ele não respondeu. Perguntei se alguém o tinha visto ou se alguém sabia onde ele estava e foi então que alguém disse : "Quando o vi ontem a última vez ele estava a caminhar junto do Unimog… com certeza por não ter ouvido as intruções do furriel Lopes a cuja secção ele pertencia, ele estava junto do Unimog quando a mina rebentou"…

Imediatamente voltamos ao local (recordo que o Alferes Henrique Matos que estava naquele dia em Enxalé decidiu ir connnosco ) . Reproduzo o testemunho que sobre este momento ele deixou neste blogue, referindo-se ao Manuel Pacheco: no dia 10 de maio de 2008, poste P 2830 (***):

(...) "Quando digo pulverizado é o termo que melhor descreve a situação, pois sou um dos que andou à procura de restos do corpo e apenas encontrámos pequenos fragmentos de ossos com que fizemos um embrulho que pesava poucos quilos. Tem a sua campa em Bambadinca, como se pode ver na relação do Marques Lopes (...). A G3 dele nunca mais se viu, pensando-se que terá voado para o Geba que passa a não muitos metros de distância."

Mais informa ainda no poste P15998 (**), referenciando o lugar da sua sepultura: (...) "Era natural de São Miguel, Açores. Os restos mortais (cerca de 3 kg) ficaram no cemitério de Bambadinca, talhão militar, fileira 2, campa 1, Guiné-Bissau".

Como já está dito foram momentos tristes e difíceis estes,  em que com todo o respeito fomos juntando o que restava do nosso querido ‘Açoriano'. Lembro também o momento em que os seus restos sairam depois do Enxalé, num caixão normal, como se dentro estivessem uns restos mortais completos.

Durante esta busca pelos seus restos mortais e pela G3 que desapareceu , e que deve ter sido projectada com tanta violência que atingiu o Geba , mesmo ao lado da estrada, veio-se a descobrir uma mina antipessoal. A nossa sorte foi que alguém viu um fio, suspeitou e …lá estava uma mina, que foi destruida no mesmo momento.

16 e 27 de Outubro:

O relatório menciona a seguir três operações neste mês de Outubro de 1966:

Operação Grude a 16 de Outubro, 
Operação Grisu a 16 de Outubro 
Operação Giesta, a 27.

As três são descritas como “patrulhas de reconhecimento fluvial e terrestre ao longo do Rio Geba.” Sem qualquer acontecimento digno de nota. Mas há com certeza engano nas datas pois, tendo nós os forças divididas/destacadas em Missirá e Porto Gole, além de não podermos deixar Enxalé sem protecção, não me parece que fosse possível fazer duas operações no mesmo dia.

(Continua)

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quarta-feira, 7 de julho de 2021

Guiné 61/74 - P22348: (In)citações (188): Lembrando a nossa CCAÇ 1439 (João Crisóstomo, ex-Alf Mil Inf, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67)


1. Mensagem do nosso camarada João Crisóstomo, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67), enviada para conhecimento ao nosso Blogue em 3 de Julho de 2021:

Caríssimos,
Parece-me que estou a tentar fazer chover no molhado… mas sempre fui teimoso, que hei-de fazer? Eu sei que "estamos todos a ficar velhos para estas coisas”… mas, eu também estou e ainda sou capaz de arranjar tempo para o que acho vale a pena… e acreditem que por vezes tenho mesmo de me “de me dobrar e desdobrar”; embora eu, para me convencer tenha de dizer a mim mesmo que "quem trabalha por gosto não cansa…”

Tenho pena que a nossa CCAÇ 1439 esteja tão pouco representada em meios escritos. Para que a nossa CCAÇ 1439 num futuro próximo não passe quase despercebida será bom que mais alguém apareça e dê a cara.

Já vos falei do blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné. É mesmo uma pena que vocês, se ainda não o conhecem deixem de o fazer. O Beja Santos que esteve em Missirá depois de acabada a nossa “peregrinação”; o Henrique Matos que ainda esteve uns dias connosco em Enxalé antes de ir para para Porto Gole; o Júlio Martins Pereira e eu somos os únicos membros desta “tabanca “ que temos falado sobre a nossa estadia na Guiné. O Viegas também tem contribuído especialmente com fotos, mas não sei se alguma vez se chegou a inscrever.

Para tentar dar o meu contributo eu escrevi uma “crónica”: “Companhia de caçadores 1439. A sua história como a lembro e vivi” cópia da qual eu enviei para todos vocês, (creio eu que a receberam). Creio que todos vocês vão gostar de ler o que neste blogue, tem sido narrado e escrito especialmente pelo Beja Santos e Henrique Matos sobre tanta coisa que, eu sei, todos vocês gostam de recordar, embora muitos dos momentos e acontecimentos vividos tenham sido tristes e trágicos. Sei que vão gostar de lembrar, ao lerem os escritos de outros que nem da nossa companhia são a falarem dos lugares onde estivémos e por onde passamos, das situações quase idênticas… e dos nossos camaradas,  muitos deles já falecidos que merecem ser lembrados... Capitão Pires, Zagalo, o Mano, o Manuel Açoriano, Eduardo para falar dos que assim de repente me vieram à memória.

No blogue está descrito o que é preciso fazer e que é bem simples:
Basta ter sido combatente no TO da Guiné, entre 1961 e 1974, e mandar-nos duas fotos (uma atual e outra antiga) e um pequeno texto de apresentação do candidato (posto, especialidade, unidade, locais onde esteve, etc.)... Entra em contacto connosco, onde quer que estejas!... A Tabanca Grande é tua, este blogue é teu.

Os endereços E-mails que sugiro para o fazer (embora hajam mais): luis.graca.prof@gmail.com e, ou carlos.vinhal@gmail.com

Bom, vou ficar por aqui antes que me mandem ir dar uma curva… antes de desligar: o Júlio Pereira é o outro e único membro da nossa Companhia no blogue; mas por motivos de saúde não contacta mais o blogue. De vez em quando telefono-lhe (ele nasceu no mesmo dia mesmo ano que eu; e sofremos “minas" na Guiné no mesmo dia!). Sofreu um AVC e sofreu o COVID de que recuperou. Está em convalescença, mas estas coisas demoram sempre mais tempo a recuperar do que gostaríamos fosse.

Um grande abraço, com esperanças de que alguém apareça para eu não me sentir tão sozinho.

João Crisóstomo
Nova Iorque

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Nota do editor

Último poste da série de 2 DE JULHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22334: (In)citações (187): As tabernas de antigamente na minha aldeia, e a importância que elas tinham (António Eduardo Ferreira, ex-1.º Cabo CAR da CART 3493/BART 3873)

sexta-feira, 18 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22295: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (124): O "periquito" Henrique Matos, 1º cmdt do Pel Caç Nat 52, que eu conheci no Enxalé em 1966 (João Crisóstomo, Nova Iorque)


Foto 1 > Guiné > Zona Leste > Enxalé > 1966 > O meu Baptismo no Enxalé: (i) Ali sentado no meio, de camuflado ainda novo, pelo aspecto já devia estar bem tratado, com alguns elementos da CCAÇ 1439 (Enxalé, 1965/67) que me deixaram gratas recordações, (ii) a saber da esquerda para a direita: furriéis milicianos Passarinho, Lopes e o nosso Futebolista, infelizmente já falecido. 

A seguir enchendo a caneca, (iii)  está um madeirense e quem domina garrafa é o alf mil Sousa;  ao lado está  (iv) o fur mil Teixeira (actual Presidente da Junta de Freguesia da Sé, em Faro) e ainda a comer está um 2º Sargento que não me lembro o nome. 

Os restantes são (v)  militares madeirenses, da CCAÇ 1439.



Foto 2 > Primeira lição no Geba, eu, periquito, com os velhinhos da CCAÇ 1439 no Sintex, que até tinha um pequeno motor fora de borda e base para metralhadora



Foto 3 > Batelões a descer o Rio Geba. Como curiosidade, o último chamava-se Lisboa. 


Fotos (e legendas): © Henrique Matos (2007). Todos os direitos [Edição : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

 

1. Mensagem de João Crisóstomo (ex-alf mil, CCAÇ 1439, Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67)

Date: terça, 15/06/2021 à(s) 10:11
Subject: fotos...
 
Caro Henrique Matos,

São  03,48 AM. Não consigo dormir, o que me sucede muitas vezes. Coisas da idade porque vontade não me falta. E até  faço bem esforços nesse sentido, bem bizarros por vezes, por ter ouvido que isto e aquilo ajuda a vir o sono. Conselhos  nesse sentido não me faltam, pois como sabes a maior profissão   no mundo é a de médicos: todos e cada um de nós sabemos sempre qual a  mezinha a recomendar para os males dos outros, poções mágicas, exercícios variados como seja o de respirar desta maneira e daquela,  contar  de um a cem e repetir em línguas "estranhas"… etc etc  

Reccuso-me  abusar de  comprimidos  que podem ajudar uma vez mas são um perigo, como sabes.  O meu escape frequente é o nosso bom blogue, com grande incidência  nos assuntos e momentos que de alguma maneira nos dizem respeito  a nós  mesmos e aos nossos amigos, tenham sido  estes momentos vividos  na Guiné ou depois em Portugal, especialmente depois de ter conhecido e  entrado no nosso blogue Luis Graca e camaradas da Guiné.

Hoje decidi pesquisar dois nomes : "Luís Zagalo" e logo a seguir "Henrique Matos". 

Como sempre sucede  segue-se logo uma enxurrada  de emoções, saltitando de  um  poste  a outro. E por vezes aparece o desconhecido ou inesperado, como foi o caso de hoje ao deparar num poste com fotos do "granadeiro" da CCaç 1439 que ainda não tinha visto. 

E noutro poste (P2191)  (*)  uma foto muito boa que gostava muito de ter comigo. Podes fazer o favor de ma enviares por email? Tentei "pescá-la" e transportá-la para a Galeria  de fotos no meu computador, mas, como não percebo nada de coisas digitais,  estou farto de dar voltas e não consigo.

Sei que as coisas começam a melhorar em Portugal também; e começo a sonhar numa possibilidade de ir aí ainda este ano. Mas, porque  "gato escaldado de água fria tem medo",  vou conservando as minhas barbas molhadas , que na nossa idade todas as  precauções são poucas e esta história de "variantes" é razão para poucas aventuras. E ir a Portugal sem poder encontrar-me com os meus amigos (num possível encontro  em que as pessoas  tenham ainda medo de aparecer) está fora de questão. 

Por aqui, salvo uns ocasionais telefonemas , não tenho tido  contactos com "camaradas da Guiné", ou de outras paragens, desde que a pandemia começou. E  pelo que me têm feito compreender ainda é cedo para pensar em nos juntarmos pessoalmente, embora essa ideia já há muito   ande a rondar a porta. Demos tempo ao tempo.

Bom, vou pôr o computador de lado e  ver se consigo dormir algo, pouco que seja.
 Um abraço
joao


2. Comentário do editor:

João: Tempos duros estes, tu não dormes, e eu levanto-me de três em três horas... Temos que aprender a gerir as nossas mazelas da idade... Também muito folgaria em ver-te tão brevemente quanto possível pelas nossas Tabancas... Mas não me parece provável que ainda possa ser este ano,,,

Quanto às fotos que pedes ao "periquito" do Henrique Matos, que foi o primeiro  comandante do Pel Caç Nat 52 (Enxalé, 1966/68), eu mesmo tas vou enviar, por email, para o teu álbum de recordações. Para já, volto a republicá-las aqui, com melhor qualidade.

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(...) Caros tertulianos: Aqui vai um pequeno episódio a que chamei Baptismo no Enxalé (...). Saídos de Bolama no final de Agosto de 66 (...) , subimos o Geba numa LDM e depois de deixar os nossos companheiros do Pel Caç Nat 53 no Xime, chegamos a um lamaçal que era o local onde se desembarcava para o Enxalé e onde já nos esperava pessoal e viaturas da CCAÇ 1439 (madeirenses). 

O percurso relativamente curto foi picado e serviu para nos dar as primeiras imagens e contar algumas histórias ( pintadas de negro), sobressaindo um ataque que tinham sofrido recentemente sem grandes consequências. 

Com o capitão de férias, comandava a companhia o alf mil Freitas. A tarde ainda ia a meio e como tinhamos apanhado água durante a viagem, a primeira operação foi reunir o pessoal e proceder à limpeza do armamento. Estavamos ali sentados no chão com as G3 que nos tinham sido distribuídas em Bolama, novinhas em folha,  desmontadas, quando desata uma fogachada dos diabos e nós, apanhados como se costuma dizer com "as calças na mão", a correr como moscas tontas à procura dos abrigos. 

Assim como começou de repente, parou e era ver agora o pessoal velhinho a rir com este grande ronco. Afinal, tinham sido apenas umas rajadas já combinadas com o pessoal das guaritas, mas para nós, periquitos depenados, o som parecia amplificado e tivemos que aguentar com um risinho muito amarelo. 

Como é bom de ver, a festa só acabou no bar com o pessoal devidamente regado. Anexo uma foto do baptismo e outras do Enxalé. 

Grande abraço, Henrique Matos (...)


(**) Último poste da série > 9 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21876: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (121): Fui descobrir que o Hospital de Torres Vedras fica na Rua Aurélio Ricardo Belo, médico militar e arqueólogo [Fundão, 1877- Lisboa, 1961] (José Manuel Samouco, ex-fur mil, CCAÇ 2381, Os Maiorais, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70)

terça-feira, 18 de maio de 2021

Guiné 61/74 - P22210: CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): A “história” como eu a lembro e vivi (João Crisóstomo, ex-alf mil, Nova Iorque) - Parte VIII: A partir de outubro de 1965, em Enxalé e seus destacamentos, Porto Gole e Missirá

 



Guiné > Região de Bafatá > CCAÇ 1439 (1965/67) > 1965 > Bambadinca > Rio Geba > Cais fluvial e cambança, em canoa, para Finete (na margem direita)                         



Emblema da CC1439 que me foi dado na Madeira. Esteve comigo na Guiné 
e tem andado comigo pelos quarto cantos do mundo!

Fotos (e legtendas): © João Crisóstomo (2021. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Continuação da publicação da publicação das memórias do João Crisóstomo, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (1965/67)




CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, 
Porto Gole e Missirá, 1965/67) : a “história” 
como eu a lembro e vivi 
(João Crisóstomo, 
ex-alf mil, Nova Iorque)

Parte VIII: Dia 9 de Outubro de 1965: A CCaç 1439 em Enxalé (e seus destacamentos de Porto Gole e  Missirá)


Não foi de bom grado que recebi a notícia de que íamos para Enxalé na outra margem (,direita,) do Geba. No lado do Xime e Bambadinca havia pelo menos algumas possibilidades e certa facilidade de ir até Bafatá, pensava eu. Mas ir para Enxalé no outro lado do rio? Mas não tinha dizer na matéria e, resignado, para lá me mudei com a minha companhia.

Fiquei surpreendido por encontrar várias casas normais, construídas por antigos comerciantes que, adaptadas, ofereciam instalações razoáveis. Graças a este blogue, viria mais tarde a encontrar a dona das casas que aí nos serviram de messe, escritórios e residência, a Sra Helena do Enxalé, a Maria Helena Carvalho, que, além de membro da Tabanca Grande, se tornou uma amiga querida de todos os que têm a sorte de a conhecer.

Considero os primeiros meses aí passados quase que um tempo de aprendizagem, reconhecimento e adaptação. Os destacamentos de Missirá e Porto Gole “pertenciam ao Enxalé", pelo que os pelotões e seus respectivos comandantes, Alferes Freitas, Crisóstomo e Sousa se revezavam.

Porque não tive o cuidado de registar em agenda as datas certas das nossas “andanças", não tenho sequer maneira de poder dizer com certeza quem estava num lado ou outro em alguma data específica nos primeiros meses. Sei que estive destacado em Porto Gole em Janeiro/Fevereiro de 1966, mas não sei as datas certas; em fins de Fevereiro eu estava no Enxalé, pois não esqueço que fazia parte de uma operação onde sofremos muita sede , como consta no “Relatório”.

Como disse já, depois de 55 anos passados, não tenho dados suficientes , nem memória suficiente que me permita muito mais do que o que vem descrito no ‘Relatório”, a partir de fins de Maio de 1966. Por isso apenas mencionarei com maior detalhes ou destaque alguns casos “ especiais" na medida em que a minha memória ainda me permite fazê-lo. De resto farei um resumo de datas, dados e informação como vem no "Relatório#, para que conste.
  

   


Guiné > Região de Bafatá > CAÇ 1439 (1965/67) > Enxalé > Setembro de1966 >  Na messe”: 1-Cap Mil Amandio Pires; 2 Alf. Sousa 3 Alf Zagalo 4 Alf medico Paulo Petracki; 
5 Alf Henrique Matos, Cmdt Pel Caç Nat 52; 6 Alf mil Marchand, Matos Cmdt Pel Caç nat 54; 7 fur. Mil Antunes; 8 e 9 fur Monteiro e Altino, Pel Caç nat 52

Foto de fur Viegas. Legenda de Herique Matos  (editada por João Crisóstomo)



No  canto esquerdo  está o Sargento  Bicho; eu estou ao fundo de camisa branca



Ainda no Funchal, em vésperas do embarque para a Guiné,  Capitão Pires, que vai partir mais cedo,  espede-se dos seus quarto oificiais  Freitas, Crisóstomo. Sousa e Zagalo

O Monumento/recordação deixado em Enxalé... Na foto, Alferes Freitas, Capitão Pires e Alferes Sousa. O alferes Zagalo estava na altura em Missirá e o alferes Crisóstomo estava em Porto Gole


Novembro de 1965: dia 9


Patrulha de reconhecimento e batida ao Chão Balanta. durante este patrulhamento foi assinalado o clima de colaboração entre a populança balança e o IN, colaboração que se supõe ser devida à ameaça do IBN à população. Procurou-se cativar a simpatia da mesma população.

Novembro de 1965: dia 19

A CCaç 1439 realizou a Operação Fama, patrulha de reconhecimento e combate à região de Madina. O relato é extenso e pouco claro; antes confuso.

De facto o relato que se segue parece ser um jogo de "gato e rato” ou "agora atacas tu, agora ataco eu” sem qualquer encontros sérios a destacar. Não me recordo se fiz parte desta operação, mas creio que não. Não me iria com certeza esquecer do que consta deste relatório, um vez que menciona resultados de alguma envergadura , como seja a destruição de um acampamento de 70 casas (sic):

(...) " As nossas tropas foram detectadas por um sentinela avançado , tendo alertado o IN com disparos de P.M. (..). As nossas tropas aproximaram-se do objectivo sem encontrar qualquer resistência. O IB tinha-se furtado ao contacto, tendo dispersado. Destruído todo o acampamento IN, constituido por 70 casas e, batida toda a região, foram destruídas todas as culturas IN de mandioca,milho, arroz e bananeiras".

E o "agora atacas tu, agora ataco eu” continua sem qualquer gravidade de notar parece , embora mencione que "encontraram-se vestígios de baixas IN que posteriormente foram confirmadas por prisioneiros". E depois diz-se que "não houve baixas nas NT""-

Embora mencione a captura de tês prisioneiros, sendo um deles o próprio chefe da tabanca IN Albino Có, diz a seguir que "ss magros resultados obtidos são consequência da falta de um bom guia" e que "Nnesta operação houve uma perfeita colaboração com a forca aérea".


Novembro de 1965: dia 27

Patrulha de reconhecimento a Colicunda, Hafo(?) e Chombé . "Em Colicunda foram capturados dois indivíduos suspeitos, sendo um deles posto em liberdade e(o)outro feito prisioneiro."


Novembro de 1965: dia 29

Patrulha de reconhecimento, seguida de batida à zona de Cherel (sic): "por exploração imediata de notícias, a CCAL 1439 deslocou-se à regina de Cherel onde se suspeita existir uma tabanca não apresentada sob controle directo do IN. tendo-se detectado uma Tabanca fez-se o cerco e batida, capturando dois homens, três mulheres e quatro crianças.. Foi capturado o seguinte material: 1 pistola Ceska; 1 pente de munições de espingarda Mauser.

Foram destruidas 10 casas de mato além de varios utensílios domésticos que se tornavam impossível transportar bem como um campo de milho e arroz."

Dezembro de 1965: dia 22


"Realizou-se a Op Prova, patrulha de reconhecimento e combate à região de Madina, saindo de Missirá, picada de Bissá até Madina. Não foi detectado qualquer elemento IN nem vestígios de acampamento."

Fevereiro de 1966: dia 25

Lembro bem esta “operação” em que eu e o meu pelotão tomámos parte. O descrito no relatório é bastante objectivo e esclarecedor:

(...) "No dia 25 de Fevereiro de 1966 a CCaç 1439 realizou a Op Vigor que consistiu numa patrulha de reconhecimento e combate na região a N de Cherel. (...) O guia prisioneiro utilizado, ou mentiu ou não estava actualizado. (...)

De facto quase nada de extraordinário aconteceu, salvo ter-se encontrado um “acampamento IN ” abandonado havia muito tempo e logo a seguir outro acampamento que devia ter substituído o anterior, mas que também já estava abandonado há algum tempo.

(...) "Foi uma das operações que obrigou todo o pessoal a um grande desgaste físico devido à falta de água naquela região."

Esta Operação mereceu do Agrupamento 24 a seguinte referência: " Dadas as condições difíceis em que se desenvolveu a Operação— sob temperaturas escaldantes , --solicito que transmita às NT intervenientes o reconhecimento pelas suas boas qualidades militares e o espírito de muita compreensão e sacrifício."

Nota: Não foi só o calor e a falta de água. Foi também o seu longo tempo/duração, pois pernoitamos no mato e depois o caminho de volta não acabava mais. Recordo-me do quase desespero de todos, na ânsia de encontrar água, fosse de riacho ou um simples poço. 

Eu bem tentava motivar e inspirar confiança, mas eu próprio sofri a sede nessa operação. E não é fácil inspirar ou convencer alguém quando nós próprios somos os primeiros a precisar de acreditar e ser “convencidos”.  

Creio que foi nesta operação ( pois a situação de sede e falta de água sucedeu mais do que uma vez ) que encontrámos uma pequena, mas funda depressão no terreno, como que um lagosito pequeno; a cor da água era escura e num canto estava um macaco já em decomposição. Mas não houve hesitações: felizmente que, junto com a ração de combate toda a gente trazia os comprimidos para "purificação” de água, cujo nome não me lembro,. E foi encher os cantis e dar graças a Deus…



Junto estas duas fotos  quase como”homenagem" ao meu valente  guarda-costas de quem, acabado o meu serviço militar,  nunca mais soube  nada.  Pelo que lembro dele, opinião esta partilhada por outros que  o conheceram,  era um indivíduo de uma lealdade, altruísmo  e coragem  únicas; para mim mais do que um simples soldado guarda costas ele era um amigo. Jamais o  esquecerei.

sexta-feira, 9 de abril de 2021

Guiné 61/74 - P22087: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (85): respondendo ao pedido de colaboração da doutoranda Sílva Espírito-Santo, biógrafa de Cecília Supico Pinto (João Crisóstomo, Nova Iorque)


Foto nº 1 > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > O João Crisóstomo  e o Henrique Matos,o primeiro  comandante do Pel Caç Nat 52 (1966/68),  junto ao monumento comemoratvo dos 500 anos da chegada de Diogo Gomes ao Rio Geba


Foto nº 2 > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > 1966 > Visita da Cecília Supico Pinto


Foto nº 3 > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > 1966 >  Local de convívio da companhia: sentada, em segundo plano, a Cecília Supico Pinto; o capelão, de costas, dá-lhe as boas vindas; a sua secretária aparece èm primeiro plano, à esquerda.

 


Foto nº 4A  > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) >  Aerograma  > Resposta do Movimento Nacional Feminino a um pedido do João Crisóstomo. Tem a data do correio de Lisboa, 18 de novembro de 1965 [?]
 

Foto nº 4B  > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) >  Excerto do aerograma com resposta a um pedido do João Crisóstimi. Termina assim: "Com as nossas saudações académicas, Pela Secção de Apoio aos Milicianosm Maria do Rosário Domingues".


Foto nº 5 > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > Conteúdo do aerograma do MNF, datado de Lisboa, 17 de novembro de 1965



Foto nº 5A> Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > Conteúdo do aerograma do MNF, datado de Lisboa, 17 de novembro de 1965. Excerto.



Foto nº 5B > Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CCAÇ 1439 (1965/67) > Excerto aerograma do MNF, datado de Lisboa, 17 de novembro de 1965 e assinado por Maria Adelaide Sousa Secção de pedidos individuais.

Fotos (e legendas): © João Crisóstomo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



1. Mensagem de João Crisóstomo [, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (Xime, Bambadinca, Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67); é um luso-americano, natural de Paradas, A-dos-Cunhados, Torres Vedras; vive em Nova Iorque; e é um conhecido ativista de causas que muito nos dizem, a nós, portugueses: Foz Côa, Timor Leste, Aristides Sousa Mendes],


Date: domingo, 4/04/2021 à(s) 12:08
Subject: resposta ao pedido da Sílvia Espírito-Santis  a Luís Graça( blogue)
 

Prezada Sílvia,
 
Vi o seu pedido no blogue  e a resposta do Luís Graça (*).

Por razões evidentes  acredito que vai receber mais  respostas do que alguma vez imaginou. Aqui está a minha pequena colaboração. Limito-me a enviar alguma informação, 3 fotos e um documento que, pela suas perguntas,  acho mais pertinentes. 

Quanto às suas perguntas  "o que pensava", "o que sabia",   " como encarou as visitas", "efeitos nos ânimos" etc., deixarei que  outros, com mais facilidade  de expressão,  falem sobre isso, que o poderão fazer bem melhor do que eu.  
 
Eis aqui a minha resposta a algumas das suas questões:

(i) João Crisóstomo, residente em Nova Iorque, desde 1975;

(ii) Idade etc:  76 anos; nasci em Torres Vedras em Junho de 1944.

(iii) Serviço militar  como alferes miliciano. Entrada  em Mafra em 26 de Janeiro de 1964. Graduado  como  aspirante,  fui para  Beja onde preparei um pelotão; depois  fui para Lamego onde frequentei o curso de operações especiais (,tipo "Ranger") ; e daí fui para a Madeira em preparação para o Ultramar. Na ausência temporária do capitão da companhia,  fui eu que em 2 de Agosto de 1965  comandei esta companhia de madeirenses (CCaç 1439 ) na viagem para a Guiné,   aonde chegámos a 6 de Agosto de 1965. Regressámos a 18 de Abril de 1967.

(iv) Chegados a Bissau, fomos directamente para o Xime (agosto de 1965) ; um mês  depois, em Setembro, omos para Bambadinca e logo a seguir em Outubro fomos para Enxalé com os seus   destacamentos de Missirá  e Porto Gole.
 
(v) Em Porto Gole (, local onde os primeiros portugueses chegaram subindo o Rio Geba e onde se encontra um padrão alusivo, na data dos 500 anos da sua chegada, foto nº 1)  e onde estive várias vezes como comandante do destacamento, recebi a visita  [, em 1966,]  de Cecília Supico Pinto e sua assistente, trazida pelos fuzileiros devidamente acompanhada e protegida. Evidentemente que a visita, anunciada com antecedência,  trouxe aí nesse dia o comandante da Companhia, capelão e   médico do batalhão de Bafatá a que pertencíamos  e outros militares conforme foto que junto [, Foto nº 2].

(vi) As fotos nºs 2 e 3 foram dois dos momentos dessa visita. A 3ª foto (uma árvore frondosa, algumas mesas improvisadas, bancos feitos de troncos de cites, as paredes com fotos, recortes de jornais etc.) mostra o nosso local de lazer e diversão habitual ( e por este pode compreender o meu pedido ao movimento , conforme mencionado na resposta recebida, vd. Foto nº 5)  e foi neste local que demos as boas vindas à Supio Pinto( sentada num banco/cibe); a secretária  é a senhora de costas, no lado esquerdo da foto e comitiva.   O Capelão, de pé,  mesmo junto da Supico Pinto,  faz o seu discurso...  
 
 (vii) Consciente do papel  do Movimento,  cheguei mesmo a contactá-lo, pedindo suporte e apoio, na forma de presentes de Natal,  letras e músicas populares para ajudar com os nossos momentos de lazer  (quando os havia!), pois conhecidas canções populares  eram um meio que eu achava eficiente e usei várias vezes para  animar os meus soldados.
 
 Não sei se isto ajuda para o que pretende; espero não seja de todo irrelevante . Muitos outros lhe mandarão muito mais e melhor.

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21675: O meu Natal no mato (46): Depois do ataque a Missirá, na noite de 22 de dezembro de 1966, pouco havia para consoar... O meu caçador nativo Ananias Pereira Fernandes foi à caça, e fez um arroz com óleo de chabéu que estava divinal... O pior foi quando, no fim, mostrou a cabeça do macaco-cão... (José António Viegas, ex-fur mil, Pel Caç Nat 54, Enxalé, Missirá e Ilha das Galinhas, 1966/68)


Foto nº 2 A - O furriel mil Viegas, do Pel Caç Nat 54


Foto nº 1A - O alferes mil Freitas, da CCAÇ 1439, natural do Funchal


Foto nº 1 > Palhota dos Furriéis e o Alf Freitas da CCAÇ 1439


Foto nº 3 > Sítio do Unimog


Foto nº 4 > Depósito de géneros


Foto nº 1 > A nossa segunda residência


Guiné > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Missirá > Pel Caç Nat 54 > 1966


Fotos (e legendas): © José António Viegas (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso amigo e camarada José António Viegas [ fur mil do Pel Caç Nat 54, passou por vários "resorts" turisticos em 1966/68 (Mansabá, Enxalé, Missirá, Porto Gole, Bolama, Ilha das Cobras e, o mais exótico de todos, a Ilha das Galinhas, na altura, colónia penal); vive em Faro; é um dos régulos da Tabanca do Algarve; tem mais de 40 referências no nosso blogue]:


Data - segunda, 21/12, 23:58

Assunto . Missirá, 22 de Dezembro de 1966



22 de Dezembro 1966. 22h30 da noite estavam os 3 Furriéis conversando á espera do sono, eis que atravessa a palhota uma saraivada de balas incendiárias, tracejantes,  explosivas, um pouco acima dos mosquiteiros.

Fui pegar na G3,  meio vestido, a caminho do abrigo.  A palhota já ardia, no caminho duas morteiradas certeiras entram no depósito de géneros alimentícios, acertando no bidão de óleo e de azeite o que provocou um fogo de artifício. 

Já no abrigo ajudo o meu cabo a municiar a MG [42, a célebre metralhadora do exército alemão na II Guerra Mundial], no meio daquele fogacho ele diz que ouve falar espanhol, presume-se que estavam lá Cubanos .
,
O ataque já ia avançado e as nossas munições escasseando, o único Unimog que tínhamos estava debaixo de um embondeiro [, "cabaceira", em crioulo] e caia morteiradas junto, com as palhotas na maioria a arder.

Parecia Roma vista de Babandica , o condutor da CCAÇ 1439 arranca debaixo de fogo e põe o Unimog a trabalhar para o retirar da zona de fogo. Como ele estava a escape livre,  a barulheira foi muita e o IN, pensando que eram reforços, retirou.  Este soldado condutor foi condecorado com medalha de guerra de 4ª classe. 

Tendo ido montar emboscada em Mato Cão,  já calculando que a CCAÇ 1439, sediada em Enxalé,  viria em nosso socorro,  o que aconteceu,  e como tal caíram debaixo de fogo, não havendo feridos do nosso lado. Houve um tiro caricato no Furriel Monteirinho,  do Pel Caç Nat 52,  do Alf Matos [, o açoriano Henrique José de Matos Francisco] , que lhe passou no meio das nádegas deixando somente queimaduras. 

Ao nascer do dia, feito o balanço, tivemos dois mortos na população e alguns feridos ligeiros e muitas palhotas destruídas, alguns de nós ficaram só com a roupa que tínhamos no corpo.

Aproximava-se a véspera de Natal, e para o  rancho pouco havia... O meu cabo nativo Ananias Pereira Fernandes sugeriu que ia tentar caçar qualquer coisa e caçou,  arranjou óleo de chabéu e arroz e cozinhou uma maravilha que todos na messe gostaram, mas quando chegou a altura de mostrar o troféu,  a cabeça do macaco cão,  houve quem não aguentasse o estômago... Guardei essa caveira do macaco por anos.

E foi este o primeiro Natal na Guiné do Pel Caç Nat 54.

Foto 1 - Palhota dos Furriéis e o Alf Freitas da 1439
Foto 2 - A nossa segunda residência
Foto 3 - Sítio do Unimog
Foto 4 - Depósito de géneros

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Nota do editor:

Último poste da série > 25 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18137: O meu Natal no mato (45): Um Natal antecipado: 23 de dezembro de 1967 em Gadamael Porto (Mário Gaspar), ex-fur mil art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68)